Entrevista de Raquel Zarattini Chebabi
Entrevistada por Lucas Torigoe
São Paulo, 15/06/2023
Projeto: Mulheres na Tecnologia
Entrevista número: MTS_HV005
Realizado por Museu da Pessoa
Revisado por Luiza Gallo
P/1 - A gente sempre começa com uma pergunta muito difícil. Qual é o seu nome completo, local e data de nascimento?
R - Meu nome é Raquel Zarattini Chebabi, eu nasci em Campinas, no dia 26 de setembro de 68.
P/1 - E os seus pais te contaram como foi o seu nascimento, a gestação, ou não?
R - Sim. Eu vim logo, assim, mais ou menos um ano depois que meus pais casaram, eles casaram bastante jovens. E o meu pai já foi trabalhar, ele é funcionário público, ele foi trabalhar em outra cidade e eles decidiram mesmo tentar filho e eu vim. São extremamente amorosos e eu acho que foi o nascimento tranquilo, esperado e gostoso. Eu tenho bons sentimentos em relação a isso.
P/1 - Conta um pouquinho da sua mãe, qual é o nome dela e da família dela, por favor?
R - A minha mãe chama Maria Amélia, ela vem de uma família de descendentes de italianos. Uma artista. Minha mãe trabalhou como professora, mas depois, ao longo da vida dela, ela é artista, fazia muita pintura e trabalhou a maior parte da vida dando aula de pintura, de artesanato e dentro de casa. Então, eu cresci no meio disso, de um monte de gente em casa, muita pintura, muita arte, muita coisa bonita.
P/1 - E o seu pai, qual o nome dele, de onde ele veio?
R - O meu pai chama Dagoberto, daí vem o Chebabi. E o Zarattini, italiano é dela. O Chebabi é Sírio, descendente de Sírio, filho único. E meu pai era funcionário público, fez direito e trabalhava nessa área. E do meu pai o que eu trago é muito da retidão de ser uma pessoa extremamente correta e justa e fazer as coisas direitinho e um tanto de brincadeiras e o humor dentro de casa, também vem dele, que ele foi muito, sempre muito querido afável e amoroso. E os dois estão vivos, graças a Deus.
P/1 - E você sabe...
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Entrevistada por Lucas Torigoe
São Paulo, 15/06/2023
Projeto: Mulheres na Tecnologia
Entrevista número: MTS_HV005
Realizado por Museu da Pessoa
Revisado por Luiza Gallo
P/1 - A gente sempre começa com uma pergunta muito difícil. Qual é o seu nome completo, local e data de nascimento?
R - Meu nome é Raquel Zarattini Chebabi, eu nasci em Campinas, no dia 26 de setembro de 68.
P/1 - E os seus pais te contaram como foi o seu nascimento, a gestação, ou não?
R - Sim. Eu vim logo, assim, mais ou menos um ano depois que meus pais casaram, eles casaram bastante jovens. E o meu pai já foi trabalhar, ele é funcionário público, ele foi trabalhar em outra cidade e eles decidiram mesmo tentar filho e eu vim. São extremamente amorosos e eu acho que foi o nascimento tranquilo, esperado e gostoso. Eu tenho bons sentimentos em relação a isso.
P/1 - Conta um pouquinho da sua mãe, qual é o nome dela e da família dela, por favor?
R - A minha mãe chama Maria Amélia, ela vem de uma família de descendentes de italianos. Uma artista. Minha mãe trabalhou como professora, mas depois, ao longo da vida dela, ela é artista, fazia muita pintura e trabalhou a maior parte da vida dando aula de pintura, de artesanato e dentro de casa. Então, eu cresci no meio disso, de um monte de gente em casa, muita pintura, muita arte, muita coisa bonita.
P/1 - E o seu pai, qual o nome dele, de onde ele veio?
R - O meu pai chama Dagoberto, daí vem o Chebabi. E o Zarattini, italiano é dela. O Chebabi é Sírio, descendente de Sírio, filho único. E meu pai era funcionário público, fez direito e trabalhava nessa área. E do meu pai o que eu trago é muito da retidão de ser uma pessoa extremamente correta e justa e fazer as coisas direitinho e um tanto de brincadeiras e o humor dentro de casa, também vem dele, que ele foi muito, sempre muito querido afável e amoroso. E os dois estão vivos, graças a Deus.
P/1 - E você sabe como eles se conheceram, por acaso?
R - Sei, minha mãe foi com uma amiga numa festa, na faculdade de Direito, onde meu pai estudava e daí eles se conheceram ali, através dessa amiga que apresentou um para o outro e a partir daí eles começaram a se encontrar.
P/1 - E você acha que eles são diferentes entre si, bastante, ou não?
R - São, são diferentes. Eles são tipo casal perfeito, aquele que todo mundo quer ter, tiveram um casamento muito, muito feliz e são diferentes. Meu pai gosta mais de sair, minha mãe gosta mais de ficar em casa, eles pensam muitas coisas diferentes. As pessoas perguntam como eles estão juntos há tanto tempo e eles sempre dizem… Enfim, acho que o que é mais forte deles é o respeito por essas diferenças, por essas individualidades que eles têm.
P/1 - Me conta uma coisa, quem são os Zarattini e quem são os Chebabi? O que seus antecedentes, os seus avós faziam, fazem. Conta como é essa história.
R - Os Zarattinis eu tenho mais contato, porque tem mais pessoas na família, minha mãe tem irmãos e daí tem primos, eu convivi muito, sempre com eles. Então, uma família com questões de italiano, assim, bastante fortes, sentem ainda com essa carga genética, eu acho, com alguns hábitos, ou com coisas que fazem, é interessante ver isso. E muita festa, muita comida, muitos encontros, muita gente, gente falando alto, então tem bastante disso. E do lado do meu pai, eu convive com os meus avós, mas só, porque como ele era filho único e parte da família também nem tá. Eu sou de Campinas, sempre cresci lá e parte da família nem tá lá também, então convive mais com eles. E duas mulheres também, as minhas avós, muito fortes, determinadas e de temperamento forte e alegre. Eu me espelho bastante nelas também.
P/1 - Quando você nasceu, foi em Campinas. Você morou em Campinas durante quanto tempo?
R - Eu moro em Campinas desde sempre. Eu já saí de Campinas a trabalho, já sai uma vez por questões de trabalho do marido e voltei. E já morei nos Estados Unidos por conta da minha pós-graduação e voltei. Aqui em São Paulo. Mas eu basicamente moro em Campinas.
P/1 - Entendi! E como foi a sua infância em Campinas? Como era Campinas nessa época, conta para mim?
R - Eu cresci na casa que os meus pais vivem até hoje. É um bairro, assim, tranquilo, não tinha assalto, não tinha excesso de carro e eu vivia na rua. Então, eu tava sempre brincando muito na rua, com muitos coleguinhas, muitos amiguinhos, aquela vida de tá solta, a casa aberta. Tenho muita memória dessas coisas de gente, muita gente em casa por causa das aulas da minha mãe, eu convivendo com essa arte toda. Estudei em colégio de freira, então também tinha essa coisa, apesar da liberdade de estar ali na rua e estar brincando muito, dos meus pais serem muito tranquilos, tinha um rigor bastante grande na escola. Então, estudava muito, eu sempre fui um pouco estudiosa demais, mas porque eu gostava e pelo rigor da escola também.
P/1 - Você tem irmãos?
R - Eu tenho um irmão, dois anos mais novo, que é advogado.
P/1 - Como é que era essa coisa de crescer com arte na sua casa, com pintura, o que você leva disso?
R - Era muito legal, era muito legal. Porque eu chegava da escola e a gente almoçava e minha mãe já começava a armar todo o esquema da sala, onde ela dava aula e começava a organizar o material e eu sempre fiz parte disso, de organizar esse material. Daí eu ia estudar e quando eu voltava, eu fazia tudo para ter um tempo para pintar junto e tratar com elas, para entender. Eu acho que isso foi forte, assim, para eu ter esse olhar para as coisas manuais, para as coisas artísticas e para conseguir entender diferentes formas de pensar, porque ninguém fazia nada igual. Às vezes, minha mãe de madrugada estava pintando e fazendo alguma coisa, eu ficava acompanhando. E tinha muita coisa de história de vida lá, que eu acho que vocês amariam. Porque é também um lugar, assim, onde as mulheres se encontravam, desabafavam, trocavam ideia sobre os filhos, pediam conselhos e tiravam dúvidas com outras mulheres sobre a vida. Então, eu acho que aquilo era muito poderoso, sabe? No sentido delas se ajudarem. Minha mãe tem amigas de vida inteira que se formaram ali dentro. Então, acho que como mulher, aquilo, sem eu ter consciência na época, foi me formando, sabe?
P/1 - E você lembra de algumas dessas mulheres que te marcou, alguma história que você ouviu que ficou mais na sua cabeça?
R - Nossa, que difícil!
P/1 - Se não tiver, tudo bem!
R - Acho que sim. Acho que é a que eu mais me interessava, tinha algumas mulheres, por exemplo, que tinha um filho e tinha mulheres que tinham oito filhos. Então, por exemplo, a Lia, que é uma grande amiga da minha mãe, tinha oito filhos. Então, aquelas curiosidades de como, nossa, como que faz para criar tantos filhos, com temperamentos, com características diferentes, como é que essa mulher dá conta de cozinhar para essa galera toda e ver se foi bem na escola e tal. Então, era gostoso ouvir essas histórias. Elas riam bastante e a tarde elas faziam um lanche, elas levavam comidinhas que elas tinham feito. Eu me impressiono com isso até hoje, que elas ainda tinham tempo para fazer o bolo para levar na aula. E isso era um convívio bem legal.
P/1 - E você pode descrever essa casa para mim?
R - É uma casa que tem mais de cinquenta anos. Entra e tem uma sala gostosa e grande, de estar e de jantar e depois tem uma sala que seria uma sala de almoço, que era onde a gente transformava o almoço, na escola. E uma varanda de luz, que também era transformada nessa escola, durante o período da tarde toda, a cozinha. E entrando, os tradicionais três quartos e dois banheiros, a suíte com banheiro, com dois quartos e um outro quarto de serviço, onde minha mãe, na época, guardava bastante os materiais todos também. E no quintal, um quintal gostoso, onde meu pai super fazia churrasco. E tem muitas plantas até hoje e chás e tudo mais.
P/1 - E a rua, qual é a rua, como era a rua na época?
R - Era uma rua onde as casas eram todas mais ou menos iguais, bastante árvores e infelizmente a gente… Algumas pessoas ainda moram lá, mas a gente, hoje, vê muita chave, muito cadeado, muita sensação de ter que correr para dentro. A gente vivia na rua, os pais chegavam do trabalho e a gente, às vezes, fazia pipoca e levava para o meio da rua e a gente, até escurecer, ficava lá. Eu tinha rede de vôlei, pendurava nas árvores, a gente jogava vôlei, os carros passavam por baixo. Então, a gente vivia lá em cima de bicicleta. Hoje as crianças não estão no meio da rua lá, mas ainda é uma rua bonita e algumas famílias ainda estão lá, os filhos dessas famílias ainda moram nessas casas hoje.
P/1 - E como é que era você na escola, você já falou um pouquinho, mas tinha alguma matéria que você gostava mais, alguma professora, freira, que te marcou mas nessa época?
R - Eu passei quinze anos no Imaculada, então eu entrei com quinze, acho que essa conta. E saí… Entrei com quinze, entrei com quatro para cinco, eu acho. Eu saí do Imaculada, eu sempre estava um ano adiantada, por causa da época que eu faço aniversário e tal. E eu saí direto para faculdade, com dezessete. Então, a conta não é quinze. Mas eu gostava de matemática, eu gostava muito, muito de matemática. Eu gostava muito de química, quando passei a ter química e física… Eu sofria muito com história e um pouco com geografia, eu não conseguia decorar, história não era para entender, era para decorar, então eu sofria, eu decorava, decorava, decorava e fazia a prova, tirava no máximo seis. Esquecia tudo, porque eu passava mal. Só que tudo que era relacionado à matemática. Português, eu amo português, eu sei um monte, porque eu adorava. Então, sim, eu tive professoras que me marcaram assim, muito legal. Biologia que eu também gostava, a Marisa. A professora de história me marcou porque eu sofria, apesar dela ser boa gente. E teve fase que eu chegava aí no outro horário da escola, para ensinar os meus coleguinhas, porque eu gostava demais. E depois, mais para frente, na história isso vai aparecer de um outro jeito. Eu sempre fui muito de exatas, assim, muito.
P/1 - Você tinha, nessa época, já alguma profissão que você queria fazer? Quando é que você começou a pensar nisso?
R - Eu queria ser bailarina, porque eu dançava. Então, eu fazia balé, eu fiz dez anos de balé, depois eu fiz aula de jazz, depois eu dei aula de dança. Eu achava… quando eu era criança eu achava que eu ia fazer isso. Eu fui entender que eu não ia fazer isso, acho que na hora de parar para pensar mesmo: “Nossa, daqui a pouco eu tenho que escolher uma profissão” e eu nem dançava mais, “e eu vou ter que escolher alguma área”. E no meu colégio tinha essa divisão de exatas, humanas e biológicas. E eu naturalmente fui para exatas e daí eu comecei a pesquisar o que eu poderia fazer com a matemática, física, que eu gostava tanto.
P/1 - Antes de falar sobre isso. Me fala como que era treinar, como que era dançar? Porque dizem que não é nem um pouco fácil, bailarina. Como era isso para você? Onde você dançava, onde você treinava?
R - Tinha escola em Campinas, a dona era a professora e a escola foi crescendo muito, ela começou pequenininha e foi crescendo. Ela era extremamente exigente também, mas eu tava acostumada, essa coisa de Imaculada, eu sempre fui muito responsável e tal, então, eu também estudava um pouco. Mas lá, engraçado, porque para dançar, eu não queria decorar nada, então quando eu tinha os testes, eu sofria, porque eu não queria fazer testes, eu queria dançar. Mas eu ia bem, porque eu gostava muito, acho que essas coisas de arte eu sempre gostei demais, então… Quando eu tive… quando eu tinha quantos anos? Por volta de quinze, dezesseis, alguma coisa assim, eu comecei a ter uma dor na coluna muito, muito séria, não consegui arrumar a minha cama que eu tinha dores nas costas muito fortes e daí eu descobri uma escoliose, o médico me colocou um aparelho que nem se usa mais, seríssimo. Eu fiquei pouquíssimo tempo com aquilo, eu não aguentei. Mas eu parei de dançar, ele mandou parar, daí eu fui obrigada a parar de dançar e fui fazer outras coisas depois para suprir essa minha necessidade. Mas eu acabei parando. Eu misturei um pouco as duas coisas agora, na tua pergunta.
P/1 - Era mais para saber como é que foi para você esse aprendizado. E como era você com seu irmão, nessa época? Como era a relação de vocês?
R - O Rogério, a gente, a gente é o protótipo dos irmãos que nasceram, assim, quase no mesmo dia, que tem o mesmo signo, que vieram da mesma casa, que quando você olha para os dois, assim, você fala: “São irmãos”. A gente é completamente diferente. A gente pensa muito diferente, a gente se dá bem, mas é muito engraçado o quanto nós somos diferentes. Nada que o Rogério faz e eu faço, são coisas semelhantes, é muito engraçado. Mas a gente se dá bem.
P/1 - Vocês brigavam nessa época?
R - Sim. Criança a gente brigava para caramba, bastante.
P/1 - E na escola, teve alguma história que te marcou mais, que quando você pensa, sempre lembra do dia, ou de um amigo, uma amiga, enfim, de uma turma?
R - Acho que tem bastante. Tem uma coisa na escola que era muito legal, que a gente podia passar o final de semana lá. Então, como era um colégio de freiras, eles tinham, chamava convívio, a gente podia ir no final de semana, ficar lá e daí tinha muita música, muita oração e muitas palestras, mas era uma oportunidade da gente dormir no colégio, tinha um certo mistério na casa das freiras e como elas viviam, então a gente ficava mais próximo delas e convivia numa outra situação e eu amava aquilo. Eu passava uns dias lá, isso era bem legal. Eu era muito rezadeira, tava sempre muito ali, eu gostava. Acho que tem as turmas, as turminhas, as panelinhas, eu acho que na minha área de exatas também a gente tinha uma turminha que se ajudava muito e que foi criando vínculos na hora de escolher faculdade, de ver o que a gente ia fazer e se ajudando. E tem amigos ali, amigos que eu tenho até hoje. Existe o grupo da escola, mês que vem a gente tem um encontro e eu vou encontrar, eu tenho amigas que eu conheço desde os quatro, cinco anos de idade. Então, ainda tem muita memória viva e gostosa.
P/1 - Você já entrou na faculdade com 17 anos?
R - É.
P/1 - Foi em 1985?
R - Meia.
P/1 - 86.
R - É!
P/1 - Você fez então a lista de faculdades, eu imagino. E o que você foi escolhendo e por quê? O que você foi pesquisando, nessa época?
R - Acho que ali tinha um boom, assim, do que seria a computação, as pessoas estavam falando muito nisso, muito forte. Em Campinas já tinha Análise de Sistemas na PUC e já tinha Ciências da Computação na Unicamp. E daí eu fui procurar saber o que era isso. Então, enquanto eu estava no ensino médio, ainda, eu comprei um computadorzinho, fui fazer aula de programação fora, para ver se realmente eu gostava disso. Fui conversar, eu tenho uma amiga que estudava comigo, a irmã dela entrou na faculdade, na PUC. Então, eu acho que eu fiz algumas conversas com ela para entender a diferença dos dois cursos, porque eu tentaria um, ou outro e eu fui entender a abordagem dos dois. Pensei em fazer arquitetura, sou apaixonada pelo assunto, eu fuço isso para caramba, adoro construção de casa e tal. Mas eu tinha a geometria espacial no colégio e eu era péssima, eu não tenho visão espacial nenhuma, eu me perco, se eu sair do banheiro do shopping eu não sei se eu vou para a direita ou à esquerda. E aquilo me assustou, entender que eu não entendia, que eu não tinha visão espacial, me fez fugir da faculdade de arquitetura. Que doido, parece que eu já tinha essa maturidade com quinze anos de idade. Daí as coisas que eu vi de programação e do que a computação poderia me trazer. Eu prestei as duas faculdades, mas eu queria mesmo era Análise [de Sistemas], eu não queria a Ciência [da Computação], na época.
P/1 - Por quê?
R - Porque a Análise parecia ser muito aplicada e a Ciência parecia ser alguma coisa ainda muito abstrata. E as pessoas falavam assim: “Olha, vai na Análise na PUC, porque você sai empregada, o pessoal de Computação está com dificuldade de se encaixar no mercado de trabalho, por causa da abordagem”. Então, na época, isso estava muito forte. E foi verdade, porque, assim, para a realidade que eu vi as pessoas ali da PUC. Nossa, eu saí empregada antes de me formar. E todo mundo, todo mundo saiu. Tem uma outra faculdade que eu cogitei em fazer, quase fiz psicologia, eu sou apaixonada por psicologia também, eu sou apaixonada por muita coisa. Só que eu achava aquilo muito legal, muito interessante, porque eu amo gente e daí eu falava: “Nossa, eu vou fazer Computação, e esse meu lado de amar a gente? O que eu faço com isso? E de querer entender as pessoas”. Daí eu fui numa feira de ciências na Unicamp, não era feira de ciências, era faculdade aberta, alguma coisa assim que deve existir até hoje. E eu passei, quando eu passei no estande da psicologia, tinha uma sala, que tinha um cachorro aberto, porque eles estudam anatomia. Quando eu entendi que eu ia ter que estudar anatomia, eu não entraria na sala e entendi que eu não queria fazer psicologia, porque eu não ia estudar anatomia de jeito nenhum. Eu não ia ver sangue de jeito nenhum. E daí eu desisti. Foi muito tranquilo desistir daquilo. Mas eu leio a respeito e procurei saber de outras formas, porque eu acho legal.
P/1 - Seus pais, eles te incentivaram, ou não? Você conversava com eles sobre isso, na época? O que eles achavam?
R - O meu pai, como eu era muito estudiosa, ele achava que eu devia ser juíza. Porque na área de direito, que era dele, ele falava, assim: “Você passa em qualquer concurso para juíza”. Eu falava: “Mas eu não quero julgar ninguém pai”. “Não, mas você tem que tentar alguma coisa assim. Porque aquilo que era mais difícil, na época, de passar, ele achava que eu ia passar. Então, na cabeça dele, ele me incentivava por isso. A minha mãe era mais light. Quando eu comecei a pensar em fazer isso, eles me incentivaram, claro, me deram um computador e me colocaram… os cursos que eu pedi para fazer, eles pagaram para mim, eles me incentivaram. Mas não era a área de conhecimento deles e nem de ninguém, eu não tinha referência nenhuma na família sobre isso. Então, foi um voo meio sozinho, no sentido de tentar entender o que era.
P/1 - É. Outra coisa, uma curiosidade com relação a isso hoje, você falou _______, né. Hoje é uma área que é basicamente imposta a todo mundo, você tem que lidar. E na época, como era tomar essa decisão de estudar computação, as pessoas entendiam o que que era? Como era isso?
R - Eu acho que tinha uma coisa de moda, eu acho que a computação sempre tem momentos de moda, como está tendo agora, por exemplo, uma onda diferente de inteligência artificial. Então, naquela época tinha uma coisa de moda, de cursos novos, de ser interessante fazer e tal. Tinha uma concorrência forte para entrar, então isso assustava um pouquinho, porque em relação a outros cursos, assustava um pouquinho para entrar. E tinha a coisa do masculino, feminino, tecnologia tinha uma cara meio de mais os meninos do que as meninas. Eu não liguei para isso. Hoje, quando as pessoas me perguntam, eu falo: “Nossa, nem enxerguei isso”. Eu só me preocupava muito, de ver que gente que estudava muito, tava concorrendo comigo, a minha preocupação era essa, de ser uma área que as pessoas que estudavam muito estavam correndo para ela.
P/1 - Então, na formação não foi nenhum empecilho essa discrepância, digamos assim?
R - Não! Não, acho que foi tudo muito natural, assim, para mim.
P/1 - Mas na sua sala tinha mais homens do que mulheres. Como que era proporção?
R - Tinha. Na minha sala ainda tinha bastante menina, tinha bastante menina. Tinha mais homens, mas tinha bastante menina. Agora, nos ambientes de trabalho que eu passei depois, cheguei a trabalhar em lugares que só tinha eu de mulher. Então, daí no mercado era bem diferente da minha sala de aula, especificamente.
P/1 - E quando você entrou, em 86, quais foram as aulas que você teve já no primeiro ano, nos primeiros anos? Como era a faculdade nessa época?
R - Tinha muitos cursos de programação, em si e de análise, da estrutura de análise de sistemas, de aplicações em empresas. Muitas aulas básicas de outros assuntos também, como direito, psicologia, tudo mais. Mas acho que o que era mais forte, assim, para mim, que eu notei, era análise de sistema propriamente dita, que era média e método e como você estruturar sistemas, dentro das empresas, diárias que às vezes não estavam com isso totalmente estruturadas. Isso eu me apaixonei, assim, de cara. Era bem interessante.
P/1 - Acho que a partir de agora, um pouquinho, as minhas perguntas podem soar meio esquisitas, porque eu não sei o termo, às vezes. Mas como eram as máquinas, os ______ da época? Onde vocês trabalhavam, em que software?
R - Nas empresas tinham os chamados CPDS, que era Centro de Processamento de Dados, acho que era isso. Nossa, não sei nem como que eu lembrei. E tinha _____, tinha softwares, acho que normais, que a gente desenvolvia softwares. Tem uma diferença muito grande, de que assim, existiam softwares que eram dedicados para determinados tipos de assuntos. Então, a gente desenvolvia muita coisa, diferente de, às vezes, hoje que já tem alguns softwares prontos para um determinado assunto. A gente customiza muito. Então, você entrava numa empresa, ela desenvolveu o software de RH, desenvolvia o software de finanças. A gente customizava isso tudo, muito. Então, era tudo muito na arte mesmo de fazer as coisas. Esse CPDS eram áreas gigantes, que tinham um monte de desenvolvedores de softwares, áreas diferentes para cada área dessa que eu mencionei. Era bem legal, dava para aprender muita coisa.
P/1 - Isso, você diz assim, dentro da faculdade, junto com professor, como que era essa dinâmica de aula, de laboratório?
R - Ah, tá! Isso que eu estou dizendo é dentro das empresas, onde a gente fazia estágio, onde ia trabalhar. Na faculdade tinha o laboratório, então conforme tinha projetos para desenvolver, trabalhos para fazer, a gente ia para o laboratório, que tinha os computadores lá e a gente trabalhava nos laboratórios.
P/1 - E assim como na escola, algum professor, professora, te marcou nesse período?
R - Eu tinha um professor, que ele era de análise de sistemas, que era a área que eu mais gostei. E ele era o meu chefe no meu primeiro emprego, coincidentemente. E aquilo foi bastante forte, porque às vezes eu estava ali fazendo aula, às vezes à noite, com ele, mas de dia ele me ensinava muito também. E isso foi muito legal, foi muito legal, porque eu aprendi muito. Eu ajudava ele a corrigir provas de vez em quando, não podia, mas ele me chamava. Ajudava a corrigir as provas da minha turma. E daí eu aprendi muito como ele fazia isso, era muito legal. E ele fumava muito, muito, muito, muito. Na época, as pessoas podiam fumar dentro do escritório, eu tinha horror daquilo, porque eu ficava cheirando cigarro. Eu nunca me conformei com as pessoas fumarem, assim, eu falava: “Não, não faz isso”. E eu estragava os cigarros dele, para ele não fumar, às vezes, eu brincava, falava: “Vamos brincar de agente secreto” e cortava o cigarro assim no meio. E ele falava: “Me deixa com isso”. E ele faleceu pouco tempo depois que eu saí de lá, com infarto, eu acho que o cigarro que acabou com ele mesmo. Mas, nossa, tenho memórias assim muito gostosas de ter aprendido muito, porque ele entendeu o quanto eu gostava do assunto, eu aprendi demais com ele. E acho que aprendi muito como ser professor também, que eu usei isso depois.
P/1 - Onde foi esse primeiro trabalho seu?
R - Eu fui para 3M, a 3M do Brasil, em Campinas. Eu fiz um ano de estágio e depois eu fiz um ano de estágio na Unicamp, durante a faculdade. E depois disso eu fui trabalhar na Rhodia, como efetiva mesmo.
P/1 - Então você já… É o que, 4 anos?
R - São quatro anos. Eu comecei a fazer estágio no terceiro. Fiz estágio no terceiro e no quarto ano de faculdade.
P/1 - Me conta um pouco da sua trajetória, então você começou com esse professor e foi seguindo a carreira. Como é que foi o seu segundo estágio, por exemplo?
R - O primeiro foi bem legal, nesse sentido, porque eu estava numa mega de uma empresa, uma multinacional. Porque na faculdade, nos dois primeiros anos, eles chamavam de integral, a gente tinha aula quase que o dia todo. Então, eu tive que transferir para a noite, para poder trabalhar de dia. A 3M, uma mega empresa, super legal, super estruturada, um monte de gente, aprendi muito lá, aprendi muito mesmo. Daí eles fecharam, teve uma crise, eles demitiram muitas pessoas, eles fecharam todos os estágios. Então, eu tinha quase prometido uma vaga lá e eu tive que sair. Daí eu fui para Unicamp e foi o oposto, porque eu fui trabalhar com um professor só, numa área só, no IMEC, que é uma área de estatísticas e computação. Com uma linguagem de computação só e trabalhar completamente sozinha. Então, eu fiquei muito sozinha e aprendi muito na marra, a desenvolver as coisas sozinhas e tal. Mas foi triste para mim, de estar só. Eu acho que isso dificultava meu aprendizado também. Mas, ok! Foi lá que me possibilitou depois conseguir o emprego que eu consegui na Rhodia, porque foi esse professor que me indicou para uma vaga na Rhodia e deu certo de eu ir para lá. Então, acho que lá para outubro, fim de setembro, outubro, no fim do ano que eu iria me formar, eu já fui trabalhar como efetiva na Rhodia, aqui em São Paulo.
P/1 - Você teve que se mudar ou você ia todo dia?
R - Eu ia voltava, eu ia e voltava de ônibus. Depois eu tentei, eu arrumei um apartamento em São Paulo e vim morar aqui por um tempo, não gostei da experiência e voltei para casa. E dois anos depois eu escolhi que eu não queria ficar nesse vai e vem, eu pedi demissão. Eu era muito feliz lá, mas eu pedi demissão porque eu não queria viver assim, naquele momento da minha vida, eu era muito nova, eu estava com vinte anos, não queria viver desse jeito.
P/1 - Você trabalhava do que lá, de analista de sistemas?
R - Analista de sistemas. E tem um detalhe, eu não gosto de programar. Então, durante esse período, eu fui descobrindo que eu não gosto de programar. E ninguém entende isso, como é que o analista de sistema… Eu falei: “Gente, eu gosto da estrutura”. Gostava da arquitetura, gostava de entrar em alguma coisa e falar assim: “Deixa eu descobrir como é que essa tecnologia pode melhorar esse negócio, esse assunto ou a vida dessa pessoa”. Eu gostava de estruturar isso. Eu gostava depois, eu gosto, depois de treinar as pessoas, de mostrar como é que funciona, o suporte. Tinha uma área na análise de sistemas que era suporte, que todo mundo achava que era secundária, porque todo mundo achava que o desenvolvimento era mais legal. Mas eu curti o suporte, porque eu curtia conversar com as pessoas. E eu fui descobrindo que eu não gostava de programar. Então, eu fui chaveando minha carreira nesse sentido. Isso é libertador, porque dentro da área de tecnologia, você tem milhões de possibilidades de trabalhar com milhões de coisas diferentes, não precisa ser o cara que vai só codar.
P/1 - Isso você foi descobrindo na Rhodia, no finalzinho, ou não, foi mais para frente só?
R - Eu fui descobrir, assim, com todas as letras… lá não. Mas eu trabalhei na… Eu mudei bastante de emprego, eu trocava. Eu falava: “Eu não quero mais”, trocava. Eu sou assim. Daí eu fui para cervejarias Kaiser, na época, que existia. E foi bem legal. E lá eu tive muita noção disso, muita noção, porque eu trabalhava com muito suporte e eu via que eu gostava disso. Na Rhodia também, eu dava treinamento e eu gostava disso. Mas na Kaiser, o pessoal desenvolvia e eu trabalhava muito dando suporte, vendo o que estava funcionando, o que não estava, voltando para o pessoal do desenvolvimento. Eu falava: “Gente, eu prefiro estar com as pessoas ali, do que desenvolver”. Aquilo me deu muita clareza de que era por aí que eu queria.
P/1 - Tem, então, uma diferença grande entre os ambientes de desenvolvimento e de suporte, é isso? Vocês ficam mais isolados em um e no outro não?
R - Acho que tinha, agora é muito diferente, agora é muito diferente. Mas ainda assim tem muitas possibilidades de você trabalhar com coisas diferentes. Então, por exemplo, naquela época você não ouvia falar de design, dos designers. Hoje você tem as pessoas que estão direto em contato com as pessoas que vão usar o sistema, para entender como é que isso funciona, para desenhar as soluções de tecnologia e para depois acompanhar, que não é exatamente o que era um analista de suporte antigamente, mas que é quem entende melhor o ser humano ali e trabalha em parceria total com o desenvolvimento, para trazer interface melhores, habilidades melhores, sensibilidade. O famoso _______, que todo mundo entende hoje. Então, acho que tem várias áreas, mas eu traduzo aquilo que eu sentia, naquela época, para essa parte de design de interface, de Interação Humano-Computador, que é a minha área de especialidade, que eu consegui transferir para isso.
P/1 - Então, na época, era talvez um pouco mais, como é que eu vou dizer, havia uma posição maior então, entre estar em contato com o usuário, com as pessoas, ou não estar, é isso?
R - Tinha. Parece que era uma coisa muito clara sim. Tem um glamourzinho a mais de você ser o cara que programa e não a pessoa do suporte, sabe? Essas bobagens que ainda existem, de vez em quando.
P/1 - E nesse ambiente aí, essa questão de gênero entrava ou não?
R - Não, não! Não entrava, acho que isso era tranquilo. Eu tenho uma história de questão de gênero muito forte. Mas não é relacionado a isso, que eu não sei se eu devo falar agora ou depois. Mas quando eu engravidei, numa época em que eu trabalhava… Tava casada, decidi ter filho e tal. Engravidei na época que eu trabalhava só com homens e me deram o recado, que eu não tinha o direito de engravidar, entendeu? E que eu perderia a possibilidade de crescer na carreira por isso. Eu acho que a questão de gênero apareceu aí. Foi um sofrimento absurdo pra mim, porque eu me dedicava, eu trabalhei a gravidez inteira. E foi muito difícil! Eu perdi o meu emprego, assim, literalmente. Porque quando eu voltei da licença, teve outro recado, do tipo, pode esquecer promoção e tudo mais, pelo simples fato de eu ter engravidado. Então, imagina o teu chefe passando todo dia na tua frente e não olhando para você. E você trabalhando normalmente, grávida. Simplesmente porque você engravidou. Então, eu acho que a minha questão em relação a isso foi muito forte, mas eu faço questão de frisar que foi um ser humano, não foi o ambiente de trabalho que eu estava convivendo, não foram os meus amigos, não foi meu chefe direto, foi um superior que tomou essa decisão. Então, foi um ser humano, não foi… no meio ambiente de trabalho estava tudo bem.
P/1 - Não foi a empresa nem a política dela?
R - Não. Mas me fez tomar decisões de vida. Eu fui embora, porque não tinha clima para ficar. Então, depois eu fui embora e eu parei de trabalhar por um tempo e optei ficar com a minha filha, por um tempo, depois disso. Às vezes eu olho para isso, e falo: “Poxa, que bom!” Eu tive uma boa desculpa para ficar com a Marina. Teve um lado bom. Mas na época foi difícil.
P/1 - E conta pra gente, pra quem for ler depois. Como é que funcionou na época isso? Você ficou… com quantos meses de gestação você saiu? Quanto tempo você teve até você se demitir? Você pediu demissão?
R - Eu pedi demissão. Eu trabalhei normalmente até o sétimo mês, porque a Marina tentava nascer. Então, eu tive uma licença do sétimo ao oitavo, mas eu trabalhei normalmente até o sétimo. Daí eu tive uma gravidez super feliz, contente, gostosa e curti para caramba e foi tranquilo nesse sentido. Mas eu trabalhei normalmente, no sétimo eu fui afastada, porque realmente estava com o risco dela nascer prematura. E ela nasceu prematura aos oito meses. Nasceu com oito. Daí eu passei a minha licença toda maternidade, cuidando dela, que na época eram quatro meses. Quando eu fui voltar, daí eu vi que tinha tido uma reestruturação na área, tudo e entendi, me deixaram muito claro a impossibilidade de crescer. E a Marina prematura, com algumas coisas bastante delicadas de cuidado com ela, por conta disso. O pai dela, na época, a gente conversou bastante, decidiu que eu ficaria um tempo com ela. E eu saí da empresa.
P/1 - Você tinha quantos anos, Raquel?
R - 27.
P/1 - Você ficou quanto tempo em casa?
R - Eu fiquei seis anos. Eu fiquei seis anos. É muita coisa. Eu mudei de cidade, porque Augusto mudou de emprego, ele saiu, ele foi para outro emprego, a gente mudou de cidade. Eu tentei fazer outras coisas, eu tentei me reinventar, pensei na possibilidade de ir para outras áreas. Quase fui trabalhar com uma amigona minha, com engenharia, com arquitetura que eu não tinha feito. Então, eu acho que eu pensei nesses seis anos, nesse vai e vem todo, aconteceram muitas coisas de vida pessoal. E daí teve uma característica muito séria que aconteceu e muita coisa mudou na tecnologia completamente. Então, quando eu fui voltar, eu estava completamente desatualizada, completamente. Foi dificílimo. Eu cheguei a fazer teste numa empresa, que eu olhava para o computador, deu tela branca, eu não conseguia fazer, porque eu falei: “Meu Deus, eu estou muito, muito atrasada”. É como se o mundo tivesse completamente mudado durante aquele tempo. E foi mesmo, porque com a internet, a mudança das coisas acontecendo, muitos sistemas tinham sido alterados, as formas de fazer as coisas. Então, o único jeito que eu enxerguei de voltar para o mercado, foi voltar a estudar, não tinha outra forma. Eu entendi que eu estava desatualizada. E daí eu fui fazer mestrado. Fui literalmente voltar a estudar.
P/1 - Isso aí e no começo dos anos 2000?
R - É, por aí.
P/1 - E você foi fazer mestrado onde, qual a matéria? Como é que foi esse movimento?
R - Contando assim parece fácil, mas foi difícil para caramba. Sabe o que eu fiz? Tinha um professor da Unicamp, de sociologia, que era amigo da família, e eu conversando com ele, eu falava assim: “Cara, eu preciso voltar a estudar, eu não sei o que eu faço. O que tem na Unicamp com tecnologia e tal?” Ele falou: “Raquel, dá uma olhada”. E me ensinou como procurar alguma área que fosse legal para mim ali dentro. E eu olhei, existia… Nossa, tinha um catálogo físico, parecia uma lista de telefone, sensacional, com tudo quanto é área de pesquisa e tudo. Eu estudava aquilo, eu olhei muito, procurei. E resolvi procurar um professor, olha isso que legal que foi. Eu resolvi procurar o professor que tinha sido o meu professor de estágio, na época que eu fui estagiária na Unicamp. E eu entrei no IMEC do nada, eu catei o carro, fui lá no IMEC, a recepcionista me atendeu. Eu falei: “Olha, eu queria falar com o professor fulano de tal, ele foi meu orientador aqui de estágio, X anos atrás”. Ela falou: “Não existe mais aqui, porque ele saiu, ele não é mais professor da Unicamp, ele montou uma empresa e não está aqui. Mas por que você queria falar com ele?” “Porque eu quero voltar a estudar, eu queria fazer mestrado e eu não sei com quem falar, não sei por onde começar”. Ela falou: “Mas você quer fazer mestrado em que?” Eu falei: “Eu queria fazer mestrado para tecnologia em educação”. Porque nesse meio de campo eu já tinha entendido que eu gostava muito de gente e eu falei: “Eu vou tentar entender o que é isso”. E ela falou: “Bom, tem uma área que…” Não, não foi ela que falou. Ela falou: “Bom, eu não sei como conseguir te ajudar”. Eu baixei a cabeça, fui embora um pouco frustrada. E uma moça me parou no meio do caminho e falou, assim: “Eu ouvi a tua conversa. Tem uma área que se chama Núcleo de Educação Aplicada aqui na Unicamp, que talvez seja uma coisa legal para você. Por que você não vai lá?” Eu falei: “Onde fica isso?” Ela me ensinou o caminho, eu fui. E eu bati na porta e fui atendida por uma pessoa muito legal, que falou… Eu contei a minha história para ela, e falei: “Como é que eu faço para entrar aqui?” Ela falou: “Tem uma professora que talvez se interesse por você, que é a [Maria] Cecília [Calani] Baranauskas”. Ela pegou, ligou para a Cecília e marcou uma reunião minha com a Cecília, na mesma semana. Então, eu entrei no NIED, e tive essa facilidade de ter uma pessoa que me acolheu e marcou uma entrevista com a Cecília e eu fui conversar com ela. E ela falou: “Bom, tem um projeto aqui que é com empresas, se você tem…” Eu tinha, numa dessas eu tinha dez anos de história de analista de sistemas de empresa. Ela falou: “Talvez você possa ajudar a gente com a sua experiência”. Eu frequentei a Unicamp nesse Núcleo de Educação e Informática e comecei a trabalhar no projeto deles com empresas, sem ser coisa nenhuma lá dentro. Então, eu ia estudar, me atualizar, estava em contato com os alunos de lá o tempo todo. E estudava e entregava um pouco da experiência que eu tinha, mas eu não era aluna, não era funcionária, não era nada. Eles simplesmente me ajudaram a estar lá, para estudar. E foi isso que me abriu a possibilidade, de meses depois, quando abriu o edital para a gente concorrer para vagas de mestrado e tal. Daí eu estava preparada para concorrer a uma vaga para entrar. E daí eu entrei no Instituto de Computação na Unicamp para fazer mestrado, foi isso que me fez descobrir um outro mundo, que eu me apaixonei, que é o da ciência. Então, o Instituto de Computação que eu não entrei na graduação, eu fui fazer mestrado lá. Daí eu descobri essa paixão por pesquisa, eu sou extremamente curiosa e eu entendi que isso podia ser utilizado como ciência. Eu gosto de estudar, então eu fiz mestrado, virei professora de universidade, depois fui trabalhar numa universidade e eu não parei mais. Mas foi muito legal, porque eu descobri uma profissão que eu não sabia que eu teria.
P/1 - E o seu mestrado, você desenvolveu qual dissertação? Era nessa área, mas o que você pesquisou?
R - Exatamente por querer trabalhar com gente, eu fui fazer uma área da Ciência da Computação, que se chama Interação Humano Computador. Então, o que você aprende é a criar interfaces. Então, tem o ________ que vem daí e a sensibilidade, a usabilidade e como você entrevistar as pessoas, etnografia, uma série de coisas, que você entende como estar no meio das pessoas para entender como a tecnologia realmente pode ajudar a vida delas. Então, isso tem tudo a ver com o que eu quero, mistura esse sentimento de, sabe? Da psicologia de você entender as pessoas e traduzir isso para que a tecnologia faça sentido na vida delas e não seja imposta para a vida delas. Então, assim, eu me encontrei 100% nisso.
P/1 - Então você se atualizou completamente, talvez. Porque isso é o que quase se fala mais hoje.
R - É, eu tive a oportunidade de estar no futuro. Eu mais que me atualizei, acho que isso que você está falando é exatamente isso, esse é o pensamento. Eu entrei para o futuro assim, porque ali a gente já enxergava coisas que iam acontecer. É uma área que antecipa muito o que está para acontecer, sem dúvida.
P/1 - E como foi ser professora? Como é que você é professora? Como é que você começou?
R - Foi super legal. Eu dei aula numa faculdade que não existe hoje, que era em Paulina, que eles abriram, depois infelizmente fecharam. Mas eu gostava. Mas quando eu era criança, eu dava aula particular para as filhas das amigas da minha mãe, que tinham aula com ela. Então, tipo, eu dava aula de matemática para as crianças também, quando eu era criança. Então, eu acho que eu tenho essa coisa de didática e de gostar de dar aula. E dei aula de dança, como eu falei para você. Então, entrar na faculdade e dar aula, foi uma delícia. Eu não dou aula hoje, mas eu morro de vontade de dar, mas não dá tempo. Mas eu acho o máximo, porque é uma troca de conhecimentos, de experiências muito grande. Então, você encontra pessoas das mais diversas formas de pensamentos no mesmo lugar. A sala de aula é o lugar mais legal do mundo, no meu modo de ver, assim. Porque você tem um monte de gente pensando de formas diferentes, estudando juntas e aprendendo. Acho que tanto na posição de sentar na cadeira e assistir, participar, como na posição de professor. Eu amo estar lá, eu acho isso muito legal.
P/1 - Nessas épocas de professora, tanto, desde criança, até adulta, algum aluno te marcou, pelo bom, pelo ruim, tem aluno que enche o saco, às vezes. Como é isso para você?
R - Acho que vários. Aqueles que mais se dedicavam e que estudavam bastante, tem alunos que hoje eu olho no Linkedin e falo: “Cara, eu sabia que essa pessoa ia dar muito certo”. Porque eu vi que estava se esforçando e que estava se dedicando. E tem os que me desafiavam bastante, eu acho que isso também era uma provocação forte, que às vezes aqueles alunos mais rebeldes, que te desafiam, que fazem perguntas difíceis, para ver se te quebram ali. Que eu também tentava entender um pouco o porquê daquilo, da onde vinham aquelas sensações. Então, acho que ambos os lados, opostos. Essa minha vontade de entender um pouco das pessoas também me ajudava a entender o que estava acontecendo na sala de aula.
P/1 - Você ficou quanto tempo nessa faculdade mais ou menos?
R - Eu fiquei quase três anos. Daí eles fecharam e eu parei de dar aula. Mas se eu tivesse tempo hoje eu voltaria (risos).
P/1 - Entendi! Depois dessa faculdade, o que aconteceu?
R - Eu quis fazer doutorado, então a área de doutorado que eu queria ainda é uma faculdade, a faculdade de Midialogia da Unicamp, que não tinha ainda o doutorado, eles estavam para abrir. Durante o meu período de mestrado, eu conheci uma pessoa, que é o meu mentor de vida, assim. Então tem a Cecília Baranauskas, que é minha professora de mestrado. E tem o José Armando Valente, que é o meu orientador de doutorado, de pós doc. Esse cara… ela também, são duas pessoas fora de série. E eu tinha conhecido ele, ele é um ser humano super importante e ao mesmo tempo super… se você conversar com ele, é super humilde, tranquilo, é um gênio. Eu queria trabalhar com ele de qualquer jeito, eu achava que eu ia aprender muito, ele tinha uma experiência de ter trazido a educação a distância para o país, para você ter uma noção. E ele tinha feito a pós dele no MIT, e eu realmente queria trabalhar com o Valente. Então, eu fui tentar fazer doutorado sobre orientação dele. E como ia abrir o doutorado na área que ele estava, que não era o Instituto de Computação, eu fiz um ano de Antropologia no meio do caminho que eu conseguiria convalidar. Então, eu fiz um ano de Antropologia, que me ajudou a entender mais ainda das pessoas e mudou bastante a minha cabeça. E daí eu fui, ingressei para o doutorado, passei por todo o processo de novo, mas para tentar ser aluna do Valente e deu certo. Eu sou Doutora em Artes. Isso é muito louco, porque eu fui trabalhar com tecnologia, numa área que chama Cultura Audiovisual e Mídia, dentro do Instituto de Artes. Mas eu fui fazer doutorado no meio de fotógrafos, cineastas, artistas plásticos e tudo mais, que me deu uma visão de mundo bem diferente. Foi muito interessante, muito legal.
P/1 - Nesse novo ambiente você continua estudando tecnologia também, certo? Mas de outra forma?
R - É! No mestrado eu trabalhei muito dentro de uma empresa, que chama Delphi, que faz produtos automotivos. Então, o meu mestrado foi inteirinho lá dentro, muito voltado para empresa. No doutorado eu trabalhei com tecnologia, muito voltado para educação. Eu desenvolvi meu projeto inteiro numa cidade chamada Sud Mennucci, que é no estado de São Paulo, quase saindo, que é a primeira cidade que disponibilizou a internet gratuita para a população. Então, eu queria pesquisar fortemente, o que aquilo tinha mudado na vida dessas pessoas. Então, eu fui para lá. E o prefeito da cidade, falou: “Raquel, carta branca, trabalha com a gente”. Eu fiquei quatro anos de doutorado super envolvida com eles, desenvolvendo projeto de desenvolvimento de cidade, entendendo a cidade inteligente, vendo o que estava acontecendo na população. Então, foi uma coisa muito cidade, comunidade, as pessoas, sabe? Foi uma outra abordagem, projetos de educação ali dentro. Foi muito legal, aprendi muita coisa. Amo a cidade de Sud Mennucci, as pessoas. Achavam até que eu ia arrumar uma casinha lá, para viver um pouco lá, de tanto que eu vivi uma coisa intensa ali com eles. Foi muito legal.
P/1 - E quais conclusões você chegou com relação a essa novidade na cidade, de ter internet distribuída, assim, em todos os lugares, é isso?
R - Foi. Porque o Celso Junqueira, que era o prefeito de lá, colocou uma antena de rádio para conseguir internet mais barata, para o sistema público, para a prefeitura e para o comércio. Só que aí eles perceberam que se eles ampliassem esse sinal, com o custo mais baixo, a população teria. Eles tinham, na época, acesso a internet discada. Lembra daquilo? Que fazia o barulhinho e custava caro para caramba. Então isso mudou, tinha gente que estava vendendo produtos de outras cidades ali dentro, conversando com gente de fora, sabe? Tudo que a internet proporciona, mas aquilo deu um boom na vida deles, assim, de uma hora para outra. Em uma cidade de oito mil habitantes, na época. A educação deles era fantástica, de escola pública. E aquilo também ajudou com que eles tivessem acesso a outros materiais, de outros lugares. Então, assim, foi muito legal. E daí, eu tive a oportunidade de… Bom, no meio do caminho, eu fiz uma parte do meu doutorado no MIT em Genebra. E foi esse projeto da cidade que me proporcionou e o Valente que me ajudou a aplicar para ir para lá. E daí eu fui conhecer outras pessoas que trabalhavam com tecnologias para comunidades também, dentro do MIT. Então, assim, foi muito interessante entender o que a tecnologia podia fazer para a comunidades em risco, para a comunidade de outros países. Então, no doutorado, teve esse projeto nessa cidade. E daí, indo para o MIT, eu vi o projeto de outras pessoas, em outras comunidades. Então, comunidades em situação de guerra, de pobreza extrema. E pesquisadores que estavam vendo como a tecnologia podia fazer com que essas pessoas se comunicassem melhor, para ter mais segurança, ou como a tecnologia trazia, proporcionava que algumas pessoas se comunicassem, para simplesmente expor sua dor. Então, eu vi situações, assim, de pesquisa de tecnologia para coisas diferentes do que eu estava vendo aqui. Me abriu bastante a mente também, de entender o poder da tecnologia para as pessoas nesses contextos, sabe? Eu aprendi bastante.
P/1 - Logo depois de desenvolver a sua tese, você já pensou em fazer um pós-doc, ou você… Foi isso?
R - Não, não foi. Na época da minha tese, eu entrei em contato com muitas organizações, assim, eu tava em contato… Nossa, eu tinha reunião, desde a reunião com ONU, até reunião com uma startups, sabe? Pequenininha, que estava tentando fazer algum projeto social. Então, eu tinha muitos projetos de pesquisa, assim, possíveis, em andamento, com algumas organizações, que eu falava: “Vou voltar dos Estados Unidos, vou defender a minha tese, já tenho algumas…” Tinha, acho que uma seis organizações que eu pensava em trabalhar junto e tal. Daí teve um momento delicado no país de falta de investimento em ciências, um momento político que parou muito investimento e que muitos desses projetos que eu tinha em vista, foram travados ali. Essas organizações pararam algumas coisas e eu vi que não ia dar certo. Eu tinha deixado muita coisa legal rodando em Sud Mennucci, e lá no MIT, tal, que eu poderia usar nessas situações e trazer e continuar esses trabalhos. Mas seis meses de batalha, olhando para isso, daí eu defendi minha tese e tal. Eu falei: “Não vai acontecer de verdade, eu vou mandar currículo”. Foi bem isso. “Vou tentar entrar em empresa”. Daí eu me lembrei de uma empresa que eu tinha achado muito interessante nesse percurso que eu tinha ido conhecer por conta do doutorado, que era um Instituto de Pesquisa Eldorado em Campinas. Foi a primeira empresa que eu mandei currículo, mas foi a primeira e única, porque deu certo. Eles me chamaram no dia seguinte. E eu fui trabalhar na área de educação do Eldorado e foi bem legal, foi bem interessante também. Então, eu fui para a empresa, mas eu pude usar aquilo que eu estava aprendendo, desenvolvendo, em termos de pesquisa. Não fui trabalhar com pesquisa em si, mas foi bem interessante poder trabalhar com a educação lá.
P/1 - Você foi trabalhar com o que? Com aplicação de tecnologia?
R - Existe um projeto lá, chamado Apple Developer Academy, em parceria com a Apple. E são vários laboratórios que existem no Brasil e pelo mundo, para o desenvolvimento de aplicativos em iOS. Eu fiz parte da construção desse projeto ali, do começo desse projeto, coordenava o projeto em três cidades, onde tinha esse projeto começando acontecer e principalmente aqui em Campinas. Então, eu fiz parte dessa história, o desenvolvimento do projeto. Sou apaixonada por isso. E é com alunos da faculdade que vão para lá como se fosse um estágio. É muito legal. Desenvolve muitas pessoas. Dá para acompanhar hoje também o que esses alunos desenvolveram profissionalmente. E foi uma experiência assim, incrível, que depois também a gente ia para fora do país, para ver o que estava acontecendo lá e trazer as novidades. Então, eu fiquei no Eldorado, cinco anos e meio. Sou muito feliz por ter participado disso. Morro de saudade. Tenho muitos amigos lá. E foi uma experiência incrível. Aprendi muito também.
P/1 - Isso em Campinas?
R - Isso em Campinas
P/1 - Realmente você vai e volta.
R - Eu volto para Campinas. Eu saio e volto, saio e volto. Minha família está lá, acho que minhas raízes estão lá, fortes. Mas eu tô no mundo e volto, tô no mundo e tô lá.
P/1 - Depois do Eldorado você foi trabalhar em outro lugar, então, é isso?
R - Depois do Eldorado eu vim para IBM, que é onde eu estou hoje. Há sete anos.
P/1 - E como é que você foi para a IBM, foi convidado, o que aconteceu? Como foi?
R - Isso é bem legal. Quando eu tava no MIT, um dia juntaram os brasileiros lá, “venham brasileiros, que vem uma pessoa do Brasil fazer uma apresentação, sobre uma oportunidade de trabalho lá”. E daí era o Cláudio, que é meu colega até hoje, que foi para o MIT, ele também tinha estudado lá, ele foi contar que a IBM Insurance, estava abrindo no Brasil, no Rio de Janeiro. Ele tava tentando verificar se tinha pesquisador, pessoas brasileiras, que iam voltar para o Brasil e que se interessariam em trabalhar na IBM Insurance. E eu fiquei encantada com tudo que ele contou. Mas era Rio, então na época, eu ia voltar para o Brasil, mas eu falava: “Eu não vou morar no Rio”. Eu não tinha essa intenção. Mas eu fiquei com aquela sensação gostosa, de falar: “Nossa, que legal, tem uma área de pesquisa dentro de uma empresa, uma coisa que roda com projetos muito legais, que ele tinha explicado”. Então, de tempos em tempos, eu meio que olhava para IBM Insurance, procurava, tentava saber o que eles estavam fazendo, como curiosidade. E um dia uma amiga minha, que trabalha na IBM desde sempre, que é uma das meninas que estudou comigo no Imaculada e que eu ainda mantenho contato. Ela me disse: “Nossa, você acha tão legal a IBM Insurance, você vive me perguntando e tal. E tem uma vaga lá”. E daí? Eu apliquei, eu apliquei para uma vaga, mas fui chamada para outra, não foi exatamente, mas eu acho que eles acertaram muito na leitura que fizeram. E eu estou na mesma área há sete anos, e é muito legal o trabalho que eu faço lá, porque é também o contato com as pessoas e com a tecnologia e com a pesquisa. E foi nessa transição de Eldorado para IBM que eu fiz o meu pós doc. Então, nesse meio de caminho, eu acho que eu ingressei no pós-doc no NIED. Eu fiz no NIED, que é o Núcleo de Informática, onde eu comecei, me abriram as portas antes de entrar para o mestrado. E daí eu fiz com um projeto que estava rodando no Eldorado. Então eu comecei a trabalhar no pós doc com um projeto que tinha lá e que ainda tem, que é parceiro da IBM, que é o Hackatruck. Então, fui estudar o Hackatruck, que é um caminhão que passa pela cidades levando projetos de educação. Eu comecei o pós doc lá e terminei acho que quando eu tava transicionando para a IBM já.
P/1 - E a IBM você trabalha em São Paulo, onde?
R - Eu trabalho em São Paulo. Eu trabalho em São Paulo, a minha casa é em Campinas. Eu tinha apartamento aqui em São Paulo também, mas depois da pandemia eu comecei… Eu fui só para Campinas e fiquei trabalhando home lá. E hoje eu vivo nas duas cidades, eu fico nesse vai e vem, eu vou para lá, vou para cá.
P/1 - Antes de perguntar mais sobre isso, me fala um pouco mais do seu trabalho na IBM hoje, da área, da sua função?
R - Falo. Eu trabalho na área de Ciência, onde estão os pesquisadores, que é a IBM Insurance. A gente tem vários laboratórios pelo mundo, a IBM Research. Aqui no Brasil, tem esse no Rio, que é onde tudo começou, e aqui em São Paulo. E os pesquisadores estão todos aí nessa área. Eu não trabalho, hoje, exatamente como pesquisadora, às vezes sim, mas atualmente eu trabalho mais no Think Lab, que é uma área que atua como conexão entre a área de pesquisa, então todos os pesquisadores e as outras áreas da IBM, para ir aos clientes. Então, a nossa área recebe os clientes, para entender o que eles precisam e para procurar dentro da IBM Insurance, o que a gente pode trazer de tecnologia para eles, dependendo do que eles estão precisando. Então, a minha área que também faz, a área onde eu trabalho, que também faz essa conexão, entre as outras áreas da IBM que tem tecnologias que estão sendo aplicadas para os problemas e soluções para os clientes. Eu falo assim, aqui no Insurance, a gente tá trabalhando com isso, a gente tenta juntar essas contas. É meio que traduzir, às vezes, o que o Insurance está fazendo para essas outras áreas que são bem aplicação. A área de Insurance trabalha sempre com coisas também de futuro, assim como toda a área de pesquisa. Então, que tecnologias a gente vai precisar para os próximos anos, para a gente antecipar esse desenvolvimento e trazer para a realidade atual? Então é muito interessante.
P/1 - Então às vezes os clientes vem falar com vocês também, é isso?
R - Sempre. Às vezes, sempre. Sim, a gente está sempre em contato com o cliente, está fazendo muitos eventos para mostrar para os clientes também, o que a gente faz. Muitas vezes trazendo outras áreas, então fazendo reuniões, que você junta especialistas de várias áreas para conversar com os clientes. Fazendo workshops, sessões de design thinking. São muitas dinâmicas diferentes para traduzir essas tecnologias, que às vezes são tão específicas, difíceis de entender, para eles. Tem pessoas da nossa área que são desenvolvedores, tem designer, que desenvolvem protótipos, para ajudar com que essas tecnologias fiquem mais compreensíveis, para testar. Então o Think Lab, hoje, têm vários skills diferentes, tem pessoas que são de gerenciamento de projetos, tem os desenvolvedores designers, têm fotógrafo, produtor de conteúdo, Então, skills muitos diferentes para a gente compor todo esse contato com o cliente.
P/1 - E pelo que você está me falando, parece que… Vou voltar essa questão do cenário, do ambiente de tecnologia, até porque é um pouco do tema. Mas parece que teve alguma mudança, então? Ou não? Você vê uma mudança necessária de se ter para, enfim, trabalhar com tecnologia hoje em dia?
R - Sim. Eu acho que tem coisas que são naturais da área, que uma é, você gostar de novidade, ser curioso, curiosa, gostar de estudar, porque aquilo que eu estou falando hoje, agora, daqui cinco minutos não é mais. Então, a gente tem que estudar 100% do tempo, se atualizar, eu acho que isso é muito interessante. Em tecnologia para pesquisa, em especial, assim, tem uma cabeça aberta, de você entender que você não sabe a verdade. Acho que uma das lições mais interessantes da pesquisa, assim, é você não se acomodar na situação de que isso que você está aprendendo hoje, ele é realmente verdade. Você buscar outras coisas e ter essa humildade de fazer outras hipóteses, de testar de novo. Então, acho que na tecnologia têm essas características, que são intrínsecas ao profissional, que é a curiosidade, a dedicação, e gostar de estudar, de aperfeiçoar, de gostar de mudança. Mas com o skill técnico, algumas coisas mudam, outras continuam. Uma pessoa que gosta de trabalhar com desenvolvimento, que gosta de programar, é sempre muito forte na área, a gente sempre precisa desse profissional, a gente sempre precisa dos designers que estão entendendo, traduzindo o humano para tecnologia. É difícil falar, eu não gostaria de falar de tipos de profissionais e especialidades, mas pessoas que são especialistas em outras áreas e que podem trabalhar com tecnologia, isso é fantástico, eu acho que isso mudou muito. Se você falar, assim: “Ah, eu tenho um médico que resolve trabalhar com tecnologia”. Poxa, a gente precisa dele, porque ele que traduz como essa especialidade associada a questões de tecnologia, realmente a gente consegue trazer uma solução melhor. Então, hoje a gente vê no laboratório pessoas de várias áreas diferentes, que curtem trabalhar com tecnologia também e mistura esses dois skills para a gente desenvolver soluções mais específicas para alguma coisa. Acho que isso mudou, era muito aquele paradigma de: “Ah, eu sou a pessoa de tecnologia”. “Não! Vem, traz outras coisas, traz outros conhecimentos”. As pessoas com conhecimentos diferentes compõem soluções melhores. Isso é muito interessante. E a gente não precisa ser aquilo a vida inteira. Eu redesenhei a minha carreira assim, várias vezes. E vi alguns, às vezes, alguns preconceitos em relação. Eu lembro de uma pessoa que falou assim: “Vai fazer doutorado na área que eu fiz”. E aquela pessoa me disse assim, “poxa, mas você vai ficar com diploma de doutora em artes, você é da computação”. Eu falei: “Tá aí. Qual é o problema disso?” Então, aqueles paradigmas, de eu vou por aqui, só posso fazer isso. Não! Eu acho que a coisa mais legal hoje, é a gente entender que pessoas que fizeram coisas diferentes, estudam coisas diferentes, ou pessoas diferentes no mesmo ambiente, aquilo compõem soluções melhores, sabe? Acho que isso é o mais interessante que o ser humano aprendeu ultimamente, com mais força.
P/1 - Você acha que isso tem acontecido nas empresas que você tem contato, ou na própria IBM, essa necessidade de um ambiente mais diverso, isso tem acontecido, tem sido colocado no palco?
R - Tem. A IBM é antiquíssima nisso, ela começou isso lá atrás. Então eu acho que é um ambiente extremamente diverso e a gente trabalha para que isso seja uma realidade no todo, então é muito interessante, é maravilhoso como isso acontece lá dentro. Mas eu acho que é geral, acho que é uma busca geral. Então, a gente vê muito essas questões, porque a mulher na tecnologia… “Vamos tentar trazer a mulher para a tecnologia”. A gente não precisa forçar situação nenhuma, a gente só precisa entender que todo mundo tem que ser feliz onde gosta de estar. E tem muita possibilidade de qualquer pessoa trabalhar em qualquer área, a gente não precisa estabelecer regras nenhuma. Então, eu sempre trabalhei no meio de muitos homens, hoje eu vejo isso mais diverso, mais misturado. E é muito legal, porque você vê pessoas com cabeças diferentes, com pensamentos diferentes, se ajudando, acho que é se completando. É bem isso.
P/1 - E especificamente com relação à questão de gênero, você percebeu uma mudança desde o começo da sua trajetória profissional até hoje? Eu digo não só na IBM, mas enfim, no geral?
R - Acho que tem uma aceitação muito grande para que tenha todos os tipos de perfis. Mas existe um número que ainda é real. Se a gente olhar para a matemática da coisa, você ainda vê mais homens trabalhando com tecnologia do que mulheres. Quando eu olho para as estatísticas que me mostram, não em determinado lugar ou outro, mas ainda tem muito movimento. Eu sou chamada constantemente para falar. “Ah, tem um evento de mulheres e tecnologia, porque a gente não consegue alcançar o meio a meio, alguma coisa assim?” Eu não sei! Eu não me preocupo com número, eu não me preocupo com isso não, eu não acho que número representa alguma coisa que possa ser um problema. Eu me preocupo que as pessoas se sintam confortáveis de fazer aquilo que elas gostam, eu não sei se tem menos mulher que goste disso, e seja natural e pronto. Entendeu? Sabe, quando você olha para uma profissão e fala: “Tem mais mulher ou tem mais homem?” Porque eles gostam mais disso. Se for assim, tá tudo bem. O que não pode é as pessoas se sentirem impedidas de fazer aquilo que elas gostam. Mas para mim é simples assim, não é uma questão de número, mas que a gente se sinta confortável. E eu acho que a gente sente. Para ser bem sincera nessa história toda que eu te contei, eu te contei de um problema aí, alguma coisa importante na minha vida, mas eu não me senti desconfortável nos ambientes em que eu trabalhei. Nunca tive problemas para estar lá. Então, eu acho que isso é muito legal, que todo mundo se sinta confortável. E que tecnologia não seja uma coisa assim de bicho de sete cabeças, do tipo: Será que não é para mim? É para mim? Não, é para todo mundo. Tem muitas possibilidades de você trabalhar com isso.
P/1 - Queria voltar um pouco para as questões mais pessoais da sua vida que aconteceram durante toda essa trajetória. A sua filha nasceu no final dos anos noventa, é isso?
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P/1 - Como é que foi esses seis anos que você ficou com ela mais proximamente?
R - Ah, foi bom demais. Eu acho, assim, às vezes, algumas mulheres perguntam. Às vezes, sempre. E aí, você acha que eu paro, não paro e tal. Eu acho que a experiência é de cada um. E foi bom demais, poder ficar com ela de verdade, poder acompanhar o crescimento dela, poder assistir cada pedacinho do desenvolvimento dela, entender aquilo. Eu não perdi nada, eu não perdi as palavrinhas, eu não perdi o que ela comeu de diferente. Então, foi muito, muito intenso. E foi muito gostoso ter vivido isso. Então, em nenhum momento eu me arrependi disso. Só que teve essa dificuldade toda, que eu contei, de depois recuperar. Então, eu vou te contar uma história, eu posso, sobre um evento que aconteceu exatamente sobre isso. Eu fui chamada uma vez, logo que eu tinha entrado na IBM, para fazer uma uma palestra, assim, de supetão. Sobre carreira. Um evento de carreira que ia ter, mas assim: “Raquel, faltou uma pessoa no evento de carreira”. Tipo, ficou doente. “Será que você entra amanhã e fala?” E foi assim, de uma hora para outra. E daí eu fiz uma palestra sobre carreira em tecnologia, exatamente isso. E lá no meio do caminho, que eu falei que eu parei um tempo, mas eu tava contando sobre um aspecto totalmente profissional. Eu falei que parei um tempo e depois fui voltar. E na hora… Bom, eu terminei a palestra, na hora das perguntas, algumas mulheres começaram a falar: “Vem cá, volta aqui um pouquinho, aquele pedaço que você falou que foi difícil voltar, conta para mim? Porque eu estou nessa fase. Eu parei porque eu tive filhos e não sei como é que eu volto, eu não sei se eu tenho coragem de voltar e como é que você se sentiu dividida entre uma coisa e outra? E o quanto isso foi difícil?” E daí eu falei com naturalidade, porque que eu tinha parado e o quanto aquilo foi importante na minha vida, de ter estado com ela. E sim, foi difícil voltar, mas foi legal também. E eu falei: “A propósito, coincidentemente, minha filha…” A Marina estava lá, naqueles dias. Eu tinha falado: “Vai assistir filha, o evento”. E eu falei: “Ela tá aqui”. Nossa, foi forte, foi meio que plateia chorando, eu segurando para não chorar. E foi muito bonito aquilo, foi muito gostoso. Eu escrevi no Linkedin um textinho sobre isso e muitas mulheres depois entrarem em contato comigo, para conversar melhor sobre isso, que eram mulheres que estavam ou na dúvida se separavam, ou como elas iam conseguir equilibrar as coisas, ou mulheres que não sabem como fazer para voltar. Então, eu acho isso ainda muito forte para gente.
P/1 - Talvez seja uma das principais barreiras, talvez. Profissionais, no caso, coisa que o homem não passa. Não passa.
R - Aqui né?
P/1 - É, exato!
R - Porque quando eu estava nos Estados Unidos, eu vi homens cuidando dos filhos para mães irem trabalhar. E daí eles me explicaram que lá, na época, tinha, às vezes, um acordo quando um dos dois ia parar, parava quem estava ganhando menos, era uma decisão mais financeira do que de gênero. Eu achei bem interessante, eu achei bem interessante isso. É, mas aqui sim, ainda é bastante assim.
P/1 - Você teve experiências que eram diferentes, o homem também tirava licença.
R - Parava, às vezes parava por um tempo, no caso da mulher ter um salário mais alto. Eles faziam conta, era isso. Não que fosse uma coisa muito comum, mas eu vi alguns casos e fiquei curiosa e fui tentar entender o que acontecia. Legal, era uma alternativa, uma alternativa bem resolvida ali entre o casal, decisão de casal. Sempre é uma decisão de família.
P/1 - E como é que está a sua filha hoje?
R - Ela é um show. A Marina tá jóia. Ela tem um temperamento super forte, é super inteligente. Super diferente de mim, eu aprendo todo dia com ela. E a gente tem uma relação muito, muito próxima. Ela pediu para vir para cá, porque ela tá acostumada. Eu falei: “Não filha, hoje não”. Ela está acostumada a me acompanhar, ir comigo em algumas coisas de trabalho. E ela foi viver a experiência dela também depois, de viver fora e aprender outras coisas. E tá transicionando na carreira. Marina está nessa mesma fase, de eu vou para cá, eu vou para lá, que eu já estive antes também.
P/1 - E como é que você conheceu o seu marido, o Augusto?
R - Então, não é mais. O pai da Marina, o Augusto, eu conheci na 3M, eu trabalhei com ele. Mas a gente se separou, depois. E a gente tem uma relação legal e bem resolvida, mas eu me separei dele quando a Marina estava com dezesseis anos. E hoje eu sou casada com o Carlos, eu estou com ele há oito anos.
P/1 - Sua vida teve várias mudanças mesmo.
R - Teve. Eu não sou muito apegada a zona de conforto, então. Eu acho que eu tenho certa agitação, é a mesma curiosidade que me faz ser cientista e de buscar conhecimentos novos e de gostar de coisas diferentes, me faz buscar empregos diferentes. E no casamento, infelizmente, que isso não é legal, você viver um divórcio, mas acho que a gente casou muito jovem e ao longo do tempo a gente foi se tornando pessoas diferentes, então chegou a acontecer de eu me separar.
P/1 - E com relação ao seu trabalho, a tecnologia, a gente não precisa falar nada específico. Mas como é que você vê o futuro dessa área, para onde a gente está indo, essa questão, talvez, de inteligência artificial seja meio incontornável de se falar. Mas o que vocês veem para o futuro da tecnologia?
R - Pergunta difícil, acho, de responder, especial pelo momento, porque a gente tá vivendo mais uma onda, é mais uma onda de mudança. E as pessoas enxergam isso como uma grande mudança, como uma quebra da forma como as pessoas fazem as coisas. Mas tecnologia, ela é metodologia, ou ela é produto que te faz melhorar alguma coisa que você já fazia. Então, eu falo assim: “Lápis, caneta, livro, é tecnologia, cinema é tecnologia. Não é só Inteligência Artificial a tecnologia”. Eu lembro que a gente estudava, assim, como é que a gente vai ter extensão de cérebro, extensão de membros. Se você parar para pensar, o celular, ele é uma extensão da mão hoje, a gente nem tira mais da mão, ele é uma extensão de cérebro, a gente não decora. Ninguém mais decora número de telefone, de contato das pessoas, tem um monte de informação lá. Então, a gente está passando por esse processo, desde que o ser humano é ser humano. Está sem volta, sempre foi sem volta, não é que agora é sem volta. E sem volta para a inteligência artificial, é, mas já tava. Assim como é sem volta os aplicativos que a gente usa hoje. Sim. Eles podem se transformar em outras soluções diferentes, mas a gente não vai voltar para o que era, de não usar essas soluções. Então, acho que falta ter uma paz, nesse momento que as pessoas estão um pouco assustadas do que está acontecendo com a inteligência artificial, de ter um paz de que: olha aí! Isso sempre aconteceu. Olha para a medicina, hoje a gente tem facilidade de tratamentos que estão possibilitando com que o ser humano viva cem anos, a gente não tinha isso anos atrás. Se você parar para pensar na pandemia, quantas pessoas puderam conversar com outras pessoas a distância e poucos anos atrás a gente não teria essa facilidade. A minha filha foi para Austrália e ficou ela presa lá e eu presa aqui, uma coisa que a gente não imaginava ficar nessa distância durante a pandemia. Eu conseguia conversar com a Marina todo dia, apesar do sofrimento de saber que ela estava presa lá e eu tava presa aqui, mas isso aliviava muito essa dor. Então, não tem volta? Não. O que a gente sempre precisa, é pensar que a gente precisa usar essas ferramentas todas para coisas boas. “Ah, pode ser usada… Tem alguma coisa que pode ser usada com uma finalidade ruim? Sempre teve, sempre tem. Mas isso é ser humano sendo ser humano, gente sendo gente. Vamos pensar que a gente pode melhorar a vida das pessoas com essas tecnologias, com coisas novas, trazendo saúde, trazer mais educação, trazer qualidade de vida. Eu acho que… Eu sempre penso por aí.
P/1 - E o que você vê para o seu futuro, você acha que você tem algum plano, ou algum sonho para realizar ainda. Como é que está isso?
R - Ah, eu tenho todo dia. Eu tenho todo dia. Eu sempre quero aprender coisas novas, eu sempre quero estudar, eu queria sentar na cadeira da faculdade de novo, mas tá difícil. Dentro da empresa eu tô sempre estudando, acho que eu posso melhorar em tudo que eu estou trabalhando. Então, eu ainda tenho bastante sonho de trabalho pela frente, de coisas que eu quero crescer, que eu quero fazer. Eu, hoje, com a experiência que eu tenho, eu também gosto muito de ser mentora de outras pessoas e trazer um pouco do conhecimento que eu tenho para ajudar outras pessoas a se desenvolverem na área. Eu gosto de liderança. E pretendo ainda estender isso por um tempo. Mas lá na frente assim, eu sempre achei que eu nunca ia parar de trabalhar, mas agora, lá na frente assim, eu penso que talvez alguma hora eu queira parar e fazer uma cerâmica, sabe? E voltar lá para minha origem de fazer alguma coisa que não seja só isso, não sei, não sei. Talvez viajar pelo mundo. Eu amo fazer trilha, eu sou jipeira com o Carlos. Eu gosto de natureza e nos fins de semana a gente vai para o meio do mato e fica vendo verde, para exatamente descomprimir dessa correria que é o dia a dia. E a hora que to só eu e o verdinho assim, do mato, isso me faz muito bem, então… Sempre nos meus planos tem a natureza, sabe? Tirar o sapato e botar o pé na grama, tem muito disso.
P/1 - E tem alguma coisa que você acha que gostaria de deixar como legado, para quem te conhece, para quem te conheceu, para o mundo?
R - Tem. Eu não acho que legado é assim, uma coisa grandiosa. Eu não tenho nenhuma pretensão assim, de falar: “Nossa, aquela coisa grandiosa que ela deixou”. Eu acho que legado é todo dia, sabe? Sabe, você encontrar alguém passeando na rua e que a pessoa fala alguma coisa que você falou que fez diferença na vida dela, de alguma forma boa, e que você nem lembrava. Eu acho que legado é isso. Então, eu procuro não deixar passar no dia a dia, eu procuro atender as coisas que eu acho importante no dia a dia, ou no trabalho, fora do trabalho, como pessoa. Às vezes uma palavra, um ouvido, antes de vir para cá, uma pessoa me chamou que precisava muito falar comigo, eu olhei para o relógio e atendi, talvez eu tenha acalmado ela. Então, acho que o legado é isso, talvez para algumas pessoas eu deixar aquilo que pessoas deixaram para mim, essas pessoinhas que eu comentei que fizeram diferença na minha vida, que me ensinaram alguma coisa, que me deram direcionamentos que foram importantes. É isso. Acho que o dia a dia.
P/1 - E tem alguma história, ou alguma coisa, uma pergunta que eu não fiz que você gostaria de falar, uma mensagem, qualquer coisa que for, antes da gente finalizar?
R - Eu acho que o mais importante mesmo, quando a gente fala de carreira, e eu vim aqui para falar disso, é a gente tentar encontrar o que faz a gente feliz. Eu ouço muitas vezes que isso não é possível, que você tem que arrumar um trabalho que está à disposição, ou que lógico, tem questões financeiras, tem questões de se manter na vida, tem todas dificuldade do mercado. Mas é que dentro, assim, tem uma vozinha, dentro do coração, da mente, que intui, que fala com a gente, que mostra mais ou menos o caminho, de onde você vai entregar aquilo que vai te fazer ser feliz e vai fazer as outras pessoas serem felizes. Então, escutar menos o mundo assim, as outras pessoas, os preconceitos, ou os conceitos, ou as modas, principalmente as modas. E falar assim: “O que será que eu curto?” E buscar realmente assim, o que está dentro da gente. E ter curiosidade de entender, de buscar, porque quando você vai e se arrisca em alguma coisa que você acha que é legal e você descobre que não é legal, isso também foi importante, que te faz voltar para o caminho que é o melhor. Então, assim, ouvir o coração, mais do que o mundo aí fora, acho que é fundamental.
P/1 - E conta para mim, então… Eu gostaria de ficar mais tempo com você, mas acho que é melhor a gente…. pelo cronograma. Mas eu queria saber como é que foi contar um pouquinho da sua história hoje? A gente nunca consegue contar tudo, mas como é que foi para você?
R - Foi muito especial. Foi muito especial, a gente dificilmente fala da gente. Eu estou sempre falando de outras coisas. No meu trabalho eu faço apresentações, faço palestras, sempre sobre outras coisas, até quando a carreira é menos que isso, então. Eu estou honrada de ter sido chamada, muito obrigada. E emocionada, acho que por muitas vezes aqui eu me emocionei com memórias importantes, memórias gostosas, gratidão pelas pessoas que eu lembrei, gratidão pela minha vida. Tenho certeza que eu vou sair daqui, vai vir mais um monte de coisa boa na cabeça, então foi uma experiência muito bacana, muito bonita. Obrigada!
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