P/1 – Boa tarde, Carlos.
R – Boa tarde.
P/1 – Eu gostaria que você falasse seu nome completo, onde você nasceu, a data e o que você faz.
R – Meu nome é Antônio Carlos Gomes dos Santos. Nasci em São Paulo, no bairro da Lapa, em 1964, e sou pintor de automóveis.
P/1 – Você lembra...Continuar leitura
P/1 – Boa tarde, Carlos.
R – Boa tarde.
P/1 – Eu gostaria que você falasse seu nome completo, onde você nasceu, a data e o que você faz.
R – Meu nome é Antônio Carlos Gomes dos Santos. Nasci em São Paulo, no bairro da Lapa, em 1964, e sou pintor de automóveis.
P/1 – Você lembra o nome dos seus pais, dos seus avós e o que eles faziam?
R – O nome do meu pai é Manoel Siqueira dos Santos, da minha mãe é Donatila Gomes dos Santos e do meu avô não lembro muito bem, porque não convivi com meus avós, só lembro quando olho o nome deles no documento.
P/1 – Você lembra qual era a profissão do seu pai, sua mãe, avós? Alguém te contou?
R – A minha mãe em 74, quando me dei por gente, (risos) cuidava da casa. O meu pai era encarregado de uma firma, se não me engano, da Cosipa. Foi uma época que nós tínhamos uma empregada, que nos levava e buscava na escola. Minha mãe foi trabalhar como doméstica, depois da separação do meu pai, por causa de bebida e de outra mulher. Eu tinha 11 anos na época e foi quando vi, pela primeira vez, o chão abrir sob os meus pés. Nós fomos morar em Carapicuíba, acho que em 77, e a cidade não era o que é hoje. Em 77, nós morávamos na Avenida Jorge Ribeiro de Lima, no Alto da Lapa, um bairro nobre, e foi quando mudamos para Carapicuíba.
Foi uma situação meio difícil porque meu pai arcava com todas as contas e, de repente, minha mãe se viu sozinha com cinco filhos para dar de comer e dar de beber. Meu pai, por sua vez, não se importava com a história. Voltando um pouco, antes de mudarmos desse apartamento, eu tinha 11 anos, e lembro que o dono do apartamento perguntou ao meu pai: “O senhor não quer comprar este apartamento? Estou vendendo.” O dono da firma que meu pai trabalhava foi até à minha casa e falou: “Seu Manoel, o senhor trabalha há tanto tempo comigo. Eu vou comprar este apartamento e desconto no seu tempo de casa.” Meu pai – não sei que cultura é essa – falou que a casa dele era um chapéu na cabeça, como pode? Uma pessoa falar que a casa dele é um chapéu na cabeça, mal sabia que isso ia conseguir desencadear um monte de problemas, não só para a esposa como para os filhos. Até hoje, tento me recuperar e é difícil.
P/1 – E os seus irmãos? Você é mais velho, mais novo, têm homens, têm mulheres, como é?
R – Somos quatro homens e uma mulher, eu sou o mais novo.
P/1 – Você lembra da sua infância no Alto da Lapa? Como era a rua para brincar? Vocês brincavam em casa? Em Carapicuíba, você lembra do que vocês brincavam? Como era a rua?
R – Ah, no Alto da Lapa era muito gostoso e agradável, até porque eu nasci e me criei ali. A gente brincava para caramba, aquelas brincadeiras de criança: pega-pega, esconde-esconde, brincadeiras do meu tempo. Foi uma infância muito bacana enquanto meu pai estava junto com a gente. Quando ele foi embora, complicou, porque nós tínhamos uma vida de “playboizinho”, os meus irmãos tinham carro, nós íamos de carro para escola e quando não ia de carro, a empregada ia levar e buscar. Quando fomos morar em Carapicuíba, mudou totalmente, como se fosse da água para o vinho, não tinha mais mesada. Uma criança que tem tudo, criada com mimo e, de repente, se vê sem nada, tem que aprender a se virar em terras desconhecidas, a conviver em lugar que nunca esteve. Lá, comecei a fazer carretos em feira, que nem sabia como fazia, mas tinha que sobreviver e ajudar a minha família e a minha mãe. Apanhei muito na feira porque eu era tido, perdão pela expressão, um garoto bunda mole. Você foi criado em um sistema, de repente te abre as portas e fala: “voa.” Como? Eu não tinha asas para voar naquela situação que estava, e nem estava preparado. Não culpo minha mãe, dou os parabéns a ela, é guerreira e não abandonou em nenhum ponto os filhos, adoro ela de coração. E não que eu tenha raiva do meu pai, espero que Deus me dê condições para ajudá-lo um dia, se ele precisar. Mas uma “magoinha” eu tenho porque a gente poderia estar melhor. Estamos vivos, graças a Deus e à minha mãe, que ensinou todos nós a trabalhar e nunca deixou que pegássemos nada de ninguém. Se tem alguém que minha mãe criou e que faz alguma coisa errada, não foi ensinamento dela, porque ela sempre foi responsável e teve muita categoria naquilo que ensinou, naquilo que fez na vida.
P/1 – Quando vocês foram para Carapicuíba, com todas essas dificuldades, você começou a trabalhar. Você conseguiu fazer amigos? Conseguia ainda brincar um pouco? Voltou para a escola? Como foi isso?
R – Sim. Eu fiquei meio traumatizado por um tempo, devido àquela situação. Não queria acreditar que aquilo estava acontecendo comigo. Meu irmão também... porque minha mãe teve dois casamentos e foi infeliz nos dois. No primeiro casamento, o marido dela era branco. O segundo casamento foi com meu pai que era negro. Sempre me dei muito bem com meus irmãos, gosto muito deles. Mesmo os meus irmãos só por parte de mãe são formidáveis, nota dez. Em Carapicuíba, tive uma infância normal, embora com problemas, estava vivendo e conhecendo uma outra história da minha vida. Moramos sete anos em Carapicuíba, depois voltamos. Entrei em oficina em 79, na época em que fazia um frio tremendo em São Paulo, que criava gelinho até no capim. Eu entrava às sete e meia da manhã, e tinha, nessa época, uns 16 anos. Quando comecei a aprender a pintura de automóveis nada era fácil. Quando eu chegava de manhã na oficina, o pessoal falava: “Pega esse taco para lixar.” Tinha gelinho na água. Eu falava: “Mas vou enfiar a mão aqui?” “Não, não é para derramar água, quero que você coloque a mão e pegue o taco que eu vou lixar.” Quando ele tirava o taco da minha mão, meus dedos estavam travados. (risos) Não condeno, não critico, não tenho raiva disso porque ninguém passa uma coisa se não tiver que passar. Então, eu passei por isso. Hoje, ajudo as pessoas que me rodeiam, eu luto se puder, para que elas não passem o que passei, porque é muito ruim e o que você não quer de ruim para você, não pode desejar para o seu próximo.
P/1 – Você lembra como era com 15 anos? Era cabeludo ou não era? Como você, seus amigos e conhecidos se vestiam na época?
R – Com 15 anos, nós usávamos aquela calça apertada, tipo boca de sino. Apertada ridícula, por sinal. (risos)
P/1 – Década de 70 para 80?
R – Isso. Aquela calça apertada boca de sino e camisa para dentro da calça. Meu cabelo não era aquele black enorme, depois, com o tempo foi ficando.
P/1 – Era moda?
R – Na moda. Nós frequentávamos salões, naquela época. Nos anos 80 continuou. Eu curtia funk, mas o funk de antigamente não era isso que toca hoje, que é uma vergonha. Era KC and The Sunshine Band, era aquele (James Parker?). Eram uns cantores bem conceituados, realmente o funk dava para ouvir. Desde minha adolescência, fui ligado à música e depois passei a curtir outros gêneros, como MPB. E passo isso para o meu filho, ele também curte muito MPB. Acho muito gostoso o que veio da minha adolescência. Me liguei em música e a MPB foi me dando força. Uma letra de uma música é uma coisa banal, como é que pode? Naquele tempo, vinha escrito no compacto: “Disco é cultura” e realmente fazia valer aquilo que estava escrito, porque era cultura.
Hoje não pode escrever isso em um disco, tem que processar a pessoa que escrever esta frase num disco de funk de hoje, porque não se vê cultura nenhuma. Não estou contestando, mas para quem ouve as músicas de hoje, principalmente funk ou rap, eles falam que dizem a realidade, eu não sei que realidade um drogado tem para dizer. No meu modo de pensar, o cara usa drogas para cantar um tipo de música que faz apologia às drogas, ao governo, à polícia, a tudo. Hoje, eu e meu filho de 17 anos vemos, com clareza, que esse tipo de música e esse tipo de sociedade que está se formando hoje é antissocial e imoral. Para mim, não leva a lugar nenhum, pois se levasse, eles poderiam frequentar qualquer sociedade. É o meu jeito de ver e de pensar cultura musical. Para mim, funk e rap não são cultura musical, estou fora disso.
P/1 – Nessa época que vocês frequentavam os salões, com o bom funk original, vocês dançavam ou iam só para paquerar? Como era?
R – Nós íamos para paquerar e dançávamos para caramba. Eu curtia rock também, os Titãs nos anos 80. Eu ia a um salão de baile chamado (Raquete?), que tinha na avenida Mofarrej, no Alto da Lapa, perto do Ceagesp. Era muito bom, foi na época que voltamos a morar em uma casa alugada no Alto da Lapa, em 83 ou 84. Eu já era pintor de automóveis, depois de ter sido ajudante. Vi que estava me dando muito mal como ajudante e pensei: “Ou aprendo, ou vou comer capim aqui.” Tinha também um motivo muito grande para aprender, que era minha mãe, não queria vê-la sofrendo. Aprendi e me tornei pintor de automóveis, um profissional respeitado. Comprei meu carro e era dono de meu nariz. Voltei a viver o sonho de morar no lugar que mais adoro. (fala emocionada) Ia para bailes e disputava namoradinhas. Era coisa da época: “Está vendo aquela menina lá?” “Ah, deixa que eu chego nela.” Tinha um colega que o apelido dele era terrível, Morangão, e ele parecia muito com o Elvis Presley. Toda vez que nós íamos para o (Raquete?), curtíamos, foi na época que o grupo Camisa de Vênus estava fazendo sucesso. Eu falava para ele: “Você é louco, toda vez que você vem para cá, precisa comprar uma outra camisa ou sua mãe está cansada de pregar botões”, porque ele ajoelhava e rasgava os botões e fazia que estava tocando uma guitarra imaginária. (risos) Eu cansei de falar com meu outro amigo: “Esse cara tem problema” “Ah, mas ele é um retardado!” “Um retardado não pode ser, porque é uma coisa lenta que chega. Estou quase crendo que é um débil mental mesmo.” Ele chega todo final de semana com uma camisa e ráu, rasga quando toca o rock, ajoelha e faz que está tocando uma guitarra. (risos) É uma coisa que passou, mas marcou muito. Na época, nós olhávamos como uma coisa idiota, mas que fez parte daquilo que vivemos e curtimos. Também tinha uma colega que gostava muito do Bee Gees, e gosta até hoje. Um dia, eu cheguei à casa dela, a Maria de Fátima, e ela estava muito assim... sei lá, ela tinha terminado o namoro com um colega meu. Acho que um dos meus maiores erros é ficar indicando pessoas para alguém. Às vezes, indicamos e não dá certo. Eu tinha indicado meu amigo Marcos para ela. Eu falei: “Ele gosta de você, é um cara trabalhador, bacana, honesto.” Depois, quando cheguei à casa dela, tive o desprazer de ouvir que aquela honestidade dele tinha acabado, quando ela o encontrou com outra no barzinho e que eu sabia. Falei: “Como eu sabia? Pelo amor de Deus, eu não sabia!” “Mas ele é seu amigo!” “Mas não é porque é meu amigo que vai contar tudo para mim e não é tudo que conto pra ele.” “Você é cúmplice.” “Não”. É uma pessoa superbacana, maravilhosa e hoje é casada. Um dia, nós estávamos relembrando nossa época, pois ela viveu uma boa parte da minha adolescência, que foi a minha melhor época, nos anos 80. Eu vivi os anos 80, não passei batido. Tinha qualidade de vida, que é parecer viver em um mundo de sonhos. Tudo ali dá certo, nada dá errado, tudo que você faz é bacana e legal. Não é como hoje, que luto para caramba e dá errado aqui e ali. Não culpo ninguém, se tenho que passar por isso, tenho que passar, fazer o quê? Estou com 43 anos, dia 8 de janeiro, faço 44. Mas estamos vivendo a vida, estamos levando do jeito que Deus vai concedendo para gente ir vivendo.
P/1 – Você disse que gosta muito de música. Você consegue ouvir música ainda hoje? No rádio, em algum lugar?
R – Muito.
P/1 – Como é que você ouve e onde? Em casa ou no trabalho?
R – Eu gosto de ouvir mais em casa. Tenho uma tonelada de CDs. Curto Zizi Possi, Jane Duboc, Gonzaguinha, Zé Ramalho, Marina, Ângela Rô Rô, que são feras da MPB. Curto também músicas internacionais, como Bee Gees. Música é uma coisa que não abro mão. Tudo tiraram da minha infância, mas a música ninguém conseguiu. Não sou cantor, gosto de ouvir uma boa música. Viajo nas letras, porque tem música que faz você transportar, como aquela música do Guilherme Arantes, me identifico muito: “Meu Mundo e Nada Mais”, quem conhece, sabe o que estou falando.
P/1 – Você disse que tem um filho. É só um filho ou tem mais? Quantos anos ele tem?
R – Tenho dois. Tem um que tem 22 anos, que aboli como filho, porque ele não aprendeu. Foi criado pela mãe, mas morou um bom tempo comigo, depois dos 14 anos. Eu tenho um jeito de pensar, um conceito de vida e, não que eu queira criticar, mas o que é errado, é errado e acabou. Ele casou com uma menina e batia e espancava a garota. Eu sempre falei para ele: “Filho, o problema é o seguinte: se não dá certo, separa, porque não se bate em ninguém. Mulher não é objeto e você está traindo sua esposa. Você é um canalha. Se eu fosse a sua mulher, você estava num mato sem cachorro comigo, porque o que você fizesse, eu iria fazer o dobro.” Ele disse “Ah, mas ela tem que apanhar.” Ser homem é ser honesto e ter categoria, não é achar que mulher é capacho, até porque, hoje, mulher faz mais que homem, sei muito bem disso. Mulher é independente, e o homem que fala: “Eu amo uma mulher”, como demonstra isso? Lugar de mulher é pilotando fogão? Lugar de mulher é pilotando máquina de lavar? Não. Eu falei para meu filho: se os dois trabalham, os dois têm que chegar: um lava roupa e outro lava louça. Se ama, tem que dividir os problemas e o lazer. Se há amor, não tem sacrifício. Como é que eu amo uma mulher e vou sacrificá-la? Tenho um neto de dois anos e três meses. Um dia, a minha nora ligou, quando o garoto tinha seis meses. Fui à casa dela, ela abriu o armário e não tinha nada. Eu falei: “Tudo bem! Vou ao mercado fazer uma compra. O que são esses hematomas?” “Ah, foi uma briguinha que nós tivemos.” “Vou fazer esta compra para você. A próxima compra eu não vou fazer, a menos que você dê parte dele” “Ah, mas ele é...” “Você tem que dar parte dele. Se ele levantar a mão para você, eu quebro a cara dele, dou a minha palavra de homem. Se ele não pagar, eu pago a pensão, se ele estiver preso. Se estiver solto, não pago, é injusto pagar uma coisa que ninguém me chamou lá na hora. Mas tudo bem, não estamos levando isto em consideração e não é esta a questão. A questão é que você e o garoto não podem passar por essa situação. Acho ridículo uma mulher gostar de apanhar. Se um me desse um tapa, eu mostrava para ele qual é o caminho da roça rapidinho”. “Vou ver se tomo uma providência.” Apanhou de novo. Fui falar com ele e ele disse: “A mulher é minha, o problema é meu.” “Então, a partir de hoje, você não é mais meu filho. Você é maior de idade, não me procura, e não me liga porque não vou atender. Que pena que você casou com uma trouxa! Porque o dia que ela te colocar na cadeia, nem lá eu vou te visitar.”
P/1 – E o outro filho, quantos anos tem?
R – Dezessete.
P/1 – E ele estuda? Trabalha? O que ele faz?
R – Estuda no SESI (Serviço Social da Indústria) da Imperatriz Leopoldina e trabalha comigo. É um exemplo, um garoto trabalhador, educado, totalmente o oposto do outro. Graças a Deus, estou conseguindo que ele tenha uma cultura boa e uma educação bacana. Ele se esforça bastante para isso, não é difícil fazer alguma coisa por ele.
P/1 – Você começou a trabalhar bem pequeno. Você disse com 10 anos?
R – Com 12, quando meu pai largou da minha mãe.
P/1 – Hoje você trabalha com pinturas de carros. Onde? Em uma empresa ou oficina? Como você chegou lá?
R – Eu sou um prestador de serviços. Hoje, quem me vê, fala: “Puxa! Você parece tão calmo!”. Mas eu não sei porquê, se passei por traumas na infância, sou meio nervoso. Às vezes, estou fazendo um trabalho e o cara começa a me acelerar, eu paro e falo: “Não vou fazer. Pega, faz você.” É errado isso, mas não consigo controlar, é espontâneo. Depois o cara fala: “Carlos, faz favor, eu te conheço, você é boa pessoa. Vamos conversar.” Tem colega que fala: “Esses dois brigam como cachorro e daqui a pouco estão ali se amando.” “Você é louco? Vou amar homem?” (risos).
P/1 – Mas resolve, né?
R – Resolve o problema.
P/1 – Você presta serviço temporário em vários lugares?
R – Isso, presto serviços temporários.
P/1 – E o seu filho te ajuda? Vocês vão juntos aos clientes?
R – Ajuda e eu pago o salário dele.
P/1 – E ele estuda que horas? Como é que ele faz?
R – Ele estuda à noite.
P/1 – Perto da casa de vocês?
R – Não. Deixa eu retroceder um pouco. Faz um ano e meio que estou trabalhando temporário, mas eu trabalhava de empregado também. Eu trabalhava de empregado na Rua Potsdam, no Alto da Lapa. A oficina tinha uma casa lá dentro que eu morava e tomava conta. No bairro que eu mais gosto, imagina se eu não ia aceitar um convite desse? Não vai pagar nada, vai trabalhar e ganhar. Foi uma época que ele começou a ficar comigo. No começo, o pessoal não aceitava muito porque ele tinha 12 para 13 anos. “Não, ele é criança.” “Sou responsável por ele, pode deixar, sem problema nenhum.” Eu fiquei muito alegre quando ele veio morar comigo, parecia que eu tinha ganhado na mega-sena. A gente se divertia muito e saía. Tinha barzinhos de ambiente familiar, ali é lugar nobre. Deus me livre levar um filho a um bar de periferia. Faz onze anos que moro na Cidade Tiradentes, infelizmente. Friso muito bem: infelizmente. Não consegui gostar, após de onze anos não gosta mais, não adianta.
Moro lá pela minha mãe, porque ela nunca teve casa e oportunidade. Compramos um apartamento porque eu caí lá sem conhecer, caí de besta. Depois fui ver o que que era o lugar. Meu filho veio morar comigo, comecei a ensinar, e hoje é quase um profissional, mas não é exatamente isso que quero para ele. Coloquei um colega no trabalho, o Alex, um amigo que nós ajudamos por um tempo. Na época, ele precisou e nós demos uma mão para ele. “Eu tenho que dar graças a você.” Eu falei: “Não, dê graças a Deus. A gente é assim, não é pela gente, é porque Deus que toca.” Se é Deus que escolhe a gente para ser assim, fazer o quê? Não tem como a gente ser diferente. Hoje, o Alex é técnico de tintas automotivas e trabalha na JD, e eu quero ver se coloco o meu filho para ser técnico de tintas da JD também.
P/1 – Hoje em dia, você gosta muito de ouvir música. Quando dá tempo, não está trabalhando, o que você gosta de fazer, além da música? Você vai para barzinho? Continua indo com os amigos? Como é hoje o cotidiano do lazer?
R – Meu tempo está muito escasso, por causa da distância de onde moro para o trabalho. Para mim, barzinho é difícil, mas eu gosto muito de ir para barzinho de karaokê, não canto nada. Já viu? Aquilo ali é para quem não canta mesmo! (risos)
P/1 – É para brincar. (risos)
R – Ali é para brincar, para quem não canta nada. (risos)
P/1 – É faz de conta.
R – A gente pega 80 pontos e fica comemorando. Nossa! Uma maravilha! (risos)
P/1 – Uma noite de sucesso. (risos)
R – Quando a gente vai ao barzinho, o pessoal fala: “Você canta bem!” Mas é treinamento, porque montei um karaokê em casa, no som, então você se ouve e esse é o problema: você vê onde está a falha. De tanto você treinar, não é que você canta bem, você engana. (risos) Você não vai cantar nunca! E os vizinhos sofrem. Imagina você cantando, depois você fala: “Não vou cantar, vou deixar a fita tocando.” Ah, meu Deus do céu! Eu não queria ser vizinho meu. Então, na minha hora de lazer, ligo meu aparelho de karaokê e não coloco os CDs de karaokê, coloco um CD normal do Gonzaguinha, faço um sistema que a voz dele quase desaparece, entra a sua, fica a banda certinho e grava na mesma qualidade de CD. Você se ouve, está limpinho e quem ouve, fala: “Parece que convence”, mas quem sabe, fala: “Não grava CD não, que você não ganha nem para o sal.” (risos)
P/1 – Bom, nós estamos finalizando. Queria saber se você quer contar mais alguma coisa que você lembra ou gostaria de comentar algo que não perguntamos.
R – Não, acho que está bom.
P/1 – Como é que você se sentiu ao contar sua história para nós? Como é que foi essa entrevista para você?
R – Muito bom, eu não sabia que ia ficar tão descontraído assim. Vocês estão de parabéns, puxa vida! Muito obrigado, para mim realmente valeu a pena ter vindo aqui. Não foi uma perda de tempo. Ganhei muito em estar aqui, conhecer pessoas maravilhosas como vocês. Muito obrigado.
P/1 – Nós que agradecemos sua presença, você ter vindo até aqui e compartilhar sua história de vida conosco. Muito obrigada.
R – Eu também agradeço a vocês, à minha mãe, ao meu filho, ao meu amigo que está lá fora, o Wender, sou padrinho dele e quero ajudar esse garoto. Ele pode ter certeza que tem um amigo, um padrinho fiel, para sempre.
P/1 – Que bom.Recolher