Programa Concórdia Digital Formando Cidadãos
Depoimento de Márcia Regina Rover Castanho
Entrevistada por Gustavo Ribeiro Sanchez
Concórdia, 26/04/2013
Realização Museu da Pessoa
CD_HV008_Márcia Regina Rover Castanho
Transcrito por Karina Medici Barrella
Revisado por Leonardo Dias de Paula
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Programa Concórdia Digital Formando Cidadãos
Depoimento de Márcia Regina Rover Castanho
Entrevistada por Gustavo Ribeiro Sanchez
Concórdia, 26/04/2013
Realização Museu da Pessoa
CD_HV008_Márcia Regina Rover Castanho
Transcrito por Karina Medici Barrella
Revisado por Leonardo Dias de Paula
P/1 – Professora Márcia, pra começar eu queria pedir pra você falar o seu nome completo, a data e o local do seu nascimento.
R – Tá. Márcia Regina Rover Castanho, natural daqui de Concórdia mesmo. 30 de outubro de 68.
P/1 – Professora, me conta um pouco da sua casa de infância. Como é que era a casa na qual você nasceu, você cresceu? O que você lembra dessa casa?
R – Ah, uma coisa bem simples e a casa está lá até hoje, meus pais moram lá até hoje. Era no interior de Concórdia, em um lugar em homenagem ao Tiradentes, ela se chama Linha Tiradentes. Estudava na escola lá, escola do interior, multisseriada. Tinha aquilo bem de interior, a gente morava na vila, próximo de igreja, próximo do barracão, da escola. Uma vida bem tranquila, bem do interior, pouca gente, estradas de chão, claro, sempre, até hoje.
P/1 – E as brincadeiras de infância, do que vocês brincavam, como é que era?
R – Ah, bem diferente de agora porque a gente tinha um pátio imenso na escola, uma grama imensa, e, como a gente morava perto, todo esse lugar era da gente. Então, as brincadeiras eram muito de fora, de correr, de árvores, sempre muito movimento, nada parecido com agora. A gente usava muito o espaço. E a minha mãe era “prof.” lá do lugar, ela trabalhou o tempo todo pelo Estado, era uma escola estadual, e eram duas professoras sempre. Então, na série em que eu estudava ela nunca trabalhou, ela sempre mudava para que eu não fosse aluna dela, por ética. Mas assim, as duas “profs.” que a gente teve na época eram muito de incentivar a brincadeira, o movimento, nada daquilo de muito paradinho. Bem divertido (risos).
P/1 – E você falou que sua mãe era professora. O que seus pais faziam, o que você pode contar um pouco do que os seus pais faziam?
R – Bom, então minha mãe era “prof.”, ela se aposentou há bastante tempo já. O meu pai é agricultor, daí tinha muito essa coisa de roça, de plantação. Batalharam bastante pra ter alguns maquinários porque eram só eles dois, nós somos em duas meninas, uma mais nova do que eu. Quer dizer, não tinha mão de obra em casa, praticamente. Bem cedo a gente saía pra estudar porque não tinha lá. Então eles tiveram que lutar bastante pra ter alguma coisa mais de máquinas pra conseguir fazer o que eles queriam. E essa minha irmã também saiu logo cedo porque ela também é professora hoje. Eles estão lá, os dois agora, com mais de 70 anos, mas bem dispostos, bem ativos. Esse ano minha mãe completa 73, e ela fez carteira de motorista quando ela completou 70 anos. Quer dizer, nada parecido com alguém de 70 quietinho em casa.
P/1 – Legal. E como era o cotidiano da casa? Vocês tinham o costume de almoçar juntos, quais eram os hábitos?
R – Sempre, né? Interior você tem isso muito de todo mundo estar junto na mesma hora, não tem horários diferenciados. Então manhã era todo mundo, ao meio-dia tinha todo mundo, no fim da tarde também. Esporadicamente tinha épocas de plantação ou safra que o pai saía no início da semana e às vezes ficava dois, três dias, porque ele trabalhava pra outras pessoas também. As máquinas que ele tinha ia pra outros lugares, então, às vezes, esses dias fora. Mas bem normal, vida de interior, todo mundo em casa o tempo todo (risos).
P/1 – E Márcia, quais são suas lembranças da sua mãe professora? Você lembra de ver ela preparar aula em casa, como é que era isso?
R – Não. Primeiro que a gente não podia pisar muito pesado porque era chão de madeira, então se tu pisa pesado lá, a mesa dá o balanço. E meu Deus, acho que praticamente todas as noites ela tinha o material em cima da mesa, então a gente sabia que fazia a lavação da louça, ajeitava, e depois a mãe ia abrir as coisas dela na mesa. E encantava, né? Pense, lá no interior, tendo a mãe “prof.” quanta coisa mais que eu podia ver, podia ter, do que as outras crianças, né? Então aquilo de pôr o material, imagina, ela tinha canetas diferentes, ela tinha papéis diferentes, então, a gente fazia rapidinho o que tinha que fazer. O pai sempre foi uma pessoa muito colaboradora, muito família, de ajudar secar a louça, ajudar a limpar coisas e tal, então todo mundo fazia, depois a mãe sentava. O pai normalmente ia ver TV e eu ficava na mesa, claro, ali ao redor vendo, olhando e eu acho que um pouco desse encanto pela coisa ficou na gente, né? Porque nunca foi muita questão da minha mãe que a gente fosse professora, não. Ela até falava que a gente poderia ter seguido outras coisas, e na verdade eu e minha irmã acabamos ficando nisso. Acho que a vivência que a gente teve também ajudou pra se decidir por esse lado e estamos aí até hoje, né?
P/1 – E Márcia, qual foi o primeiro contato que você teve com a escola? O seu primeiro dia de aula, como era a escola, o que você lembra? As primeiras lembranças de escola.
R – O primeiro dia de aula eu não lembro dele, não. Agora, a lembrança que eu tenho é que, como minha mãe trabalhava na escolinha e era perto, muitas vezes eu ia com ela pra escola, não como aluna, é claro, com quatro, cinco anos, alguma coisa assim. Porque eu gostava muito, mas daí eu sabia que eu só podia sair do lugar que ela me colocasse, colocava coisas lá para que eu pintasse, desenhasse, coisa assim, eu só podia sair de lá quando ela dissesse que eu podia, porque não podia atrapalhar a aula. Então assim, da escola, a lembrança mais antiga é assim, esses dias que eu ia, que eu ficava lá, aí eu participava na hora que brincava, participava na hora do lanche, participava dessas coisas. Mas eu não podia atrapalhar a aula, então eu tinha que ficar lá quietinha. Acho que essa é a mais antiga. Agora, o primeiro dia de aula, não sei.
P/1 – E como aluna, você lembra quais foram as primeiras coisas que você aprendeu? Alguma professora que marcou mais do começo?
R – Acho que o que marcou assim, você vê, o pessoal do interior entra na escola naquela época na primeira série sem “pré”, sem coisa nenhuma, né? Chegam na época até com mais de seis anos, claro, com sete, oito anos pra entrar na primeira série. E essas crianças que vinham dificilmente conheciam alguma coisa de letras, de escrita, tudo era muito novidade. E eu já sabia muitas coisas disso, né? Já lia também quando eu entrei, então, eu acho que uma das coisas que parece que foi uma marca é que, como eu conhecia muito de letras e escrita e leitura, eu ajudava muito o pessoal que estava perto. Quem entrasse aí no primeiro ano, segundo ano, eu ajudava muito porque aquilo tudo eu conhecia, então eu podia ajudar eles, eu não precisava deixar que eles sofressem. Às vezes acho que eu ajudava demais, “prof.” acho que nem devia gostar muito. Mas assim, isso de eu estar colaborando com os colegas, e ajudar, e fazer, e tentar daí. Eles tinham também pouquíssimo material, eu tinha mais material, material mais diversificado, então eu tinha muito isso de ir, de dar, de fazer. Então, essa coisa de estar o tempo todo em função dos colegas (risos). Não sei se isso foi bom. Enfim que, lá na escola de primário, lá do interior, nós estudamos quatro anos, lá o meu marido estudou também, que ele é desta mesma Linha Tiradentes. Lá a gente estudou junto, depois ele ficou um tempo ainda por lá, eu vim pra cidade pra estudar e coisa assim, e no final das contas voltamos a nos encontrar e estamos até hoje, né? É de lá que ele vem também, lá da escolinha.
P/1 – Legal. Você vem pra cidade no Ginásio, quando é que se dá?
R – Isso, quando começou a quinta série, que então era série, não tinha como ir e vir todo dia, então eu vim morar para cá, aqui pra Concórdia. Casa da minha avó materna, fiquei sete anos até concluir Ginásio e Segundo Grau. Depois que eu me mudei pra uma cidade aqui perto, Capinzal, onde eu fiz a faculdade em Joaçaba. Voltei pra cá, fiz a pós aqui e acabei ficando aqui. Trabalho nesta escola desde que eu voltei pra Concórdia, quando eu cheguei, naquele ano ia ter concurso municipal no final do ano, alguma coisa assim, e daí eu fiz o concurso do município e comecei a trabalhar nesta escola aqui, e acho que vou ficar por aqui até completar o tempo disso daí. Porque já estou fazendo aí 23 anos nessa mesma escola.
P/1 – Qual foi o primeiro impacto, a primeira impressão, quando você vem pro centro, pra cidade? O que você lembra? Como é que foi vir pra casa da avó?
R – Muita insegurança, né? Primeiro porque a gente já se sentia um pouco inferior vindo do interior e tal, frente a quem estava aqui. Lá na sala de aula, lá na rua da vó. Porque eles tinham acesso a muitíssimo mais coisas do que a gente teve até a quarta série. Então, muita insegurança, as primeiras três semanas alguém tinha que ir comigo até a escola, primeiro porque era meio longe mesmo do centro, mas muita insegurança, não é uma coisa que a gente se sentisse à vontade. Acho que depois passou (risos).
P/1 – E aí o Ginásio mesmo, como é que foi essa experiência de diferente escola?
R – É de quinta à oitava série, né? Ali é uma época que a gente não consegue criar vínculos com muitas pessoas, não se criam laços, me parece, nessa época era muita gente, escola grande, imagina, vindo lá do interior, escola grande com mais de 500 alunos. Esses quatro anos eu não sei se eu posso te dizer que eu tenha feito amizades. Não sei porque dá a impressão que passou muito superficialmente. De repente, até por isso da gente não se aproximar muito, não ficar muito à vontade com o pessoal. E a gente já não era muito de falar, era mais quietinha.
P/1 – E o Segundo Grau você faz na mesma escola, você muda?
R – Não, muda de escola só, mas na mesma cidade, estágio, aqui tudo isso. E então quando eu termino o Segundo Grau aqui que eu me mudo, né?
P/1 – O Segundo Grau você fez Magistério?
R – Magistério.
P/1 – E como é que era isso de optar pelo Magistério, tinha outra alternativa?
R – Ah, sempre teve. Aqui sempre teve várias coisas. Não grandiosas, mas sempre teve várias alternativas. Mas isso de que a gente ficou muito nessa dúvida da mãe de que a gente fosse “prof.” também. É uma profissão não muito fácil, ela já conhecia e tal. Então tinha lá Administração, Secretariado e tudo isso e que a gente não se atraía, então a gente acabou ficando no Segundo Grau, e desde o estágio a gente se deu muito bem. Tiramos de letra e ficamos aí mesmo (risos).
P/1 – E quando começa, pesa a decisão, Márcia, de falar assim: “Ah, eu acho que eu quero ser professora”.
R – Ah, acho que lá no Ginásio, hein? Porque esse tempo de quatro anos que a gente estava aqui, a gente passou a conhecer outros cursos e outras pessoas que faziam esses cursos, mas não atraía. Então acho que lá no Ginásio mesmo a gente já estava indo pra esse lado de que o Segundo Grau seria Magistério.
P/1 – E aí, a primeira experiência profissional, como é que foi a primeira vez numa sala de aula como professora? Não necessariamente o primeiro dia, mas esse começo?
R – Sim, o início. Isso foi em Capinzal, essa cidade onde eu me mudei depois do Segundo Grau. Porque até então, o Segundo Grau, a gente não trabalhava como “prof.”, não tinha idade, e até a faculdade, os dois primeiros anos de faculdade ainda não podia trabalhar porque eu só atingi a maioridade no final do segundo ano, né? Então lá em Capinzal eu trabalhei em escola estadual. Escola de bairro, muitos problemas, não era muito aluno na sala, devia ter em torno de 20, mas acho que lá foi onde a gente viu, conseguiu vislumbrar o que teria de dificuldades e o que seria atrativo na profissão. Porque os alunos com muitos problemas, de todos os tipos, então a gente acaba se envolvendo porque você fica uma manhã toda, uma tarde toda, então ali eu acho que esses quatro meses iniciais que eu peguei na escola, uma substituição, foi aí que deu pra ver, vislumbrar bem, o que seria estar trabalhando como professora em uma escola. No caso, de bairro. E também nunca me atraiu muito escola particular, eu até trabalhei um tempinho em Capinzal, e aqui também, em escola particular, alguns meses, mas era uma coisa que não era aquilo que eu tava querendo, não. Aí, quando apareceu aqui na escola pública não saí mais.
P/1 – Eu tenho uma curiosidade. Quando você fala a gente, você e sua irmã caminhavam muito juntas de conversar?
R – Ah, muito! (risos).
P/1 – Como é que foi, conta um pouco essa trajetória.
R – A minha irmã tem seis anos a menos do que eu, mas então veja, quando eu estava no Magistério ela já estava cursando o Ginásio, então, nós somos muito ligadas. Tudo aquilo que eu fazia, que tinha de livro, que fazia de trabalhos no fim de semana, todos os fins de semana enquanto eu estava aqui em Concórdia, no sábado, eu voltava pra casa lá no interior e ela estava lá. Porque até então ela fazia isso de ônibus, ia e voltava todo dia, ela ficou na casa da mãe e do pai. E na época que eu fiz não tinha como, então eu tive que vir morar aqui, né? Então, no fim de semana eu sempre ia pra lá, ela estava lá e então as duas, o assunto do fim de semana era escola. Que coisa, programa de índio esse! Mas aquilo que eu estava fazendo, veja que na época não tinha telefone, nada disso, então o jeito da gente se comunicar, ou a gente se encontrava, ou a gente se escrevia. Então, no fim de semana eu acabava levando cadernos e livros diferentes. Porque ela queria ver tudo o que eu estava fazendo, e agora no estágio, quando começou o estágio, tudo o que eu estava fazendo de aula, ela queria ver tudo. Então no fim de semana a gente acabava passando lá, falando de escola, de estágio, de tudo isso. E acho que aí eu também contribuí para ela ir pra esse caminho de professora. E quando eu digo a gente, é sempre a gente mesmo, eu e ela, bem juntas, sempre que na medida do possível a gente estava juntas nisso.
P/1 – E aí teve o período superior. Você comentou um pouco da Universidade, queria que você me contasse a diferença. É diferente do Magistério, é outra perspectiva?
R – Então, em Joaçaba eu fiz o curso superior de Pedagogia, quatro anos. Aí, eu vejo que foi o período mais puxado que a gente teve, era aula toda noite, regular. E eu morava numa cidade perto, que é Capinzal, então anda mais ou menos uma hora de ônibus. Então toda noite a gente ia e voltava, e trabalhava, daí eu já estava trabalhando, nos dois anos últimos. Acho que foi o período mais puxado, manhã, tarde e noite, era longe. Mas foi aí que a gente, nossa, muita coisa veio da Pedagogia, do curso superior. Eu acho que até mais do que a pós-graduação. Porque daí a pós já eram menos encontros, era de fins de semana, sexta e sábado, então, é claro, você não tem isso de todos os dias estar junto como foi o curso superior de Pedagogia. Aí a gente cresceu muito, foi aí na Pedagogia, com certeza. Então, depois desses quatro anos de Pedagogia eu voltei a morar pra cá e um tempinho depois conseguimos Pedagogia aqui também, na pós, e daí a gente fez aqui a pós-graduação, já trabalhando aqui.
P/1 – Eu queria que você me contasse um pouco como é a professora Márcia. Preparação de aula, o ambiente dentro da sala de aula.
R – Bom. Dizem, minhas colegas, que eu sou meio perfeccionista, que eu gosto de tudo muito certinho, muito bonito, muito organizado. Gosto bastante de ter disciplina pra trabalhar. Na sala, quando dá pra ter aqueles momentos de conversa, do trabalho em trio, em dupla, em juntar pra conversar e tal, mas na hora do trabalho normal do dia a dia eu não gosto muito de barulho o tempo todo, não. Gosto de uma coisa mais tranquila. Planejamento, por enquanto sempre, praticamente, dá pra desenvolver na escola. Mas quando é final de bimestre, trimestre agora no caso, que a gente tem muita nota, muita correção e tal, que eu costumo usar em casa também esse tempo. Mas normalmente as aulas que a gente tem de folga entre umas aulas e outras que os alunos estão com as outras “profs.”, nesse tempo de folga, uma aula, duas aulas que tenha no dia a gente utiliza pra planejamento. E a gente pede muita ajuda, sempre, onde a gente não consegue, principalmente nessa questão de Informática. Porque veja que nossa, a gente conheceu o computador muitíssimo mais tarde do que os alunos que a gente tem agora, que estão no meio do computador desde que começam a falar e caminhar, né? Então, nessa área assim a gente pede muita ajuda à prof. Adriana, à prof. Bete, que estão aí. A gente vai lá e diz: “Socorro! Como que eu faço isso aqui?” E na escola a gente se ajuda muito aqui. De vez em quando a gente ouve alguns comentários de um lugar ou outro que não é assim, que o pessoal não se junta, e aqui a equipe de trabalho do Nações é fora de série, a gente se ajuda muito. Então, hoje eu “tô” planejando, “tô” escrevendo, eu procuro, não acho, é alguém que diz que sabe onde está, ou que diz que tem em algum lugar, ou que tem esse livro que fala disso. É uma equipe excelente que a gente tem aqui. Então, rende muito, né? Às vezes a gente para, toma chimarrão todo mundo junto, e ah, daqui a pouco a gente sabe que não dá mais, tem que parar com o chimarrão, tem que ir de volta, vamos de volta. É assim um trabalho bem agradável, não tem clima pesado, coisa assim, não. É muito tranquilo aqui, daí rende, né?
P/1 – Deixa eu te perguntar uma coisa em relação aos alunos. Qual a faixa etária que você decidiu: “Ah, eu quero trabalhar com pequeno, eu quero trabalhar com os grandes”. Como é que foi um pouco essa trajetória?
R – Quando a gente fez estágios no curso superior, a gente faz estágios em séries menores e como a formação é Filosofia, Psicologia, Sociologia, a gente faz estágio também em Segundo Grau, né? Nem pensar, nem pensar. Me identifiquei de cara foi com esse pessoal menor. Hoje, mais ou menos as séries que a gente trabalha tem em torno de oito a dez, 11 anos no máximo aí. Ah, é aí que eu fiquei, sem dúvida nenhuma. Nunca passou de dizer: “Ah, por que eu não peguei outra coisa, gente maior, que é mais independente”. Essa idade dos alunos eles são nossos, é uma idade que você senta e conversa com eles. Eles escutam você. Você propõe coisas, ‘vamos fazer isso’, todo mundo tá disposto. Eles são nossos nessa idade. Então é aquilo de ‘é a minha turma’, é isso, ‘é a minha turma’. Eles são meus de verdade. Quando tem alguma coisa com outra “prof.” que não deu certo, que alguém bagunçou, que alguma coisa assim, a gente não consegue olhar eles como alunos daquela “prof.”, se eles incomodaram, alguma coisa deu errado na aula dela, eu tenho que tratar disso porque eles são os meus alunos. A gente tem a turma como minha, ela é minha. E eles se identificam muito com a gente. Se tem uma figura que eles identificam como a “prof.” deles, e no caso desse ano eles têm cinco, seis “profs.”, sei lá, diferentes. Não, a “prof.” deles é a “prof,” da sala. Então, a gente adota eles, e eles têm um vínculo com a gente de que onde tá a “prof.” Eles sabem que a “prof.” é aquela “prof.” da sala, não é de nenhuma matéria que estão falando, né? Por isso tudo o que acontece de bom e não tão bom, nas outras aulas, são minhas também. A gente na sala, é a gente com a turma.
P/1 – Legal. E você comentou essa coisa toda da Informática. Quando foi o primeiro contato assim, que você falou: “Agora eu vou ter que usar um computador”.
R – Sabe que eu e uma outra “prof.” que trabalha aqui também, a “prof.” do Pré, olha, o que isso deve ter sido, em 97 por aí. Em um dos encontros que a gente teve com a nossa equipe pedagógica da Prefeitura, disseram que as escolas estariam recebendo daqui um tempo computadores. E aí, ninguém havia mexido com computador ainda, até então. E eu e essa prof. Nádia, a gente conversava muito e nós combinamos que eu acho que nós teríamos que fazer alguma coisa. Então, olha que lá se vão 15 ou 16 anos, nem sei, não sei exatamente também. E nós fomos fazer um curso à noite, eu e ela. Pense, na época trintonas, no meio de um monte de “piazadinha”, de 18 no máximo, talvez. Tudo “piazadinha”, e nós estávamos lá fazendo o curso pra tentar conhecer, e esse eu lembro do primeiro dia. A gente estava subindo a escada e eu disse: “Nádia, onde é que nós fomos nos meter? Eu não sei nem ligar aquilo”. Não tinha isso na época, nem em escola, nem em lugar nenhum. Eu lembro que ela disse: “Mas e daí? Ninguém precisa saber que nós não sabemos!”. Fomos nós duas lá, e fizemos um intensivo de mais ou menos aprender a conhecer o computador. Porque no ano seguinte teria na escola e ninguém sabia mexer. E, no ano seguinte, só a secretária sabia mexer alguma coisa no computador, e eu e a prof. Nádia. Porque nós éramos a elite, já tínhamos feito curso de Informática, pensa, né? Então no ano seguinte tinha a secretária e nós duas que conhecíamos computador. E veja, não faz 50 anos, faz até bem pouco tempo. E você pensar em hoje, tudo se faz pelo computador, tanto em escola quanto em outros lugares. Mas os alunos têm hoje esse encontro praticamente, quem não tem em casa, semanalmente a gente está na Informática fazendo um pouco de cada coisa pra que, nós temos uma realidade que muita gente não tem computador em casa. A nossa faixa econômica aqui não é muito elevada, então muitos dos nossos alunos não têm computador em casa, claro. Então eles só têm esse contato semanalmente aqui na nossa Informática. Claro, que por exemplo, um Alex da vida, nossa, ele tira de letra, né? Porque esse pessoal que tem, nossa (estala do dedos), são “super” pra frente. Hoje a gente pede pro filho da gente: “Artur, faz isso pra mim!”. Porque eu sei que ele sabe muito mais coisas do que eu, né? Mas assim, a gente entrou pra conhecer, né? E quando a gente entrou no Professores em Rede, também o que nos levou a participar quando a prof. Neidi comentou eu disse pra ela: “’Prof.’, como a gente é defasada nessa área!”. Daí viramos, mexemos o horário, substituições e tal pra que a gente pudesse participar.
P/1 – Então me conta um pouco assim. Como chegou o Professores em Rede a vocês? O que era o Professores em Rede, como foi isso?
R – Bom, então a prof. Neidi trabalhava aqui na época. E muitas vezes ela comentava: "Ah, hoje à noite eu tenho PER”. Ou então: “Não, não sei o quê, eu tô fazendo lá no Professores em Rede”. Então, esporadicamente ela tinha um comentário disso, que tinha alguma coisa aqui, tinha uma coisa aí. E quando abriu pra que se outras pessoas quisessem, e eram vagas limitadas, claro, porque não tinha como ser turmas enormes. O que nos levou a fazer é isso. Eu sei, tenho consciência, que eu nunca vou chegar, acho, no conhecimento que esses alunos têm hoje de computação, quem está no dia a dia mexendo aí. Porque eles estão no meio disto desde que nasceram, praticamente. Agora, eu sei que eu não posso ficar pra trás também. Então, se eu vou trabalhar com aluno lá na Informática, quanto cada coisinha a mais que eu vier a saber vai contar, né? Quando o Professores em Rede veio, que começou a abrir vagas, que aí a Prof. Neidi dizia: “Não, vai ser legal”. E aí a gente foi se informando. A gente tinha um pouquinho de receio quanto a ter muita coisa extra pra ser feita e não conseguir dar conta, sabe isso do não conseguir dar conta? Porque eu ainda não tenho conhecimento dessa tal de Informática, e ter talvez muita coisa pra fazer em relação a isso. E a Neidi dizia: “Não, é bem tranquilo, pode vir”. Ela foi falando e nós entramos. De novo, eu e a Prof. Nádia, né, da escola (risos). Fizemos isso pra conhecer mais, e assim, tanto a Prof. Neidi, quanto a prof Adriana que trabalharam diretamente com a gente, Flávia, elas eram extremamente delicadas com a ignorância da gente, sabe? Eram muito delicadas, muito companheiras. Então, a gente se sentia bem à vontade de dizer: “Ih, não sei fazer isso aqui, meu Deus, e agora?” Lá vinham elas. Não era aquilo de você estar medindo conhecimentos com quem estava lá. E tinha “profs.” de várias escolas do município, era uma turma de, acho que em torno de 20, e não tinha mais do que duas pessoas por escola. Então aquilo de você se expor. Eu estou me expondo, estou mostrando que eu não sei, eu não conheço. E as meninas foram excelentes, nossa.
P/1 – Então, Márcia, se você fosse sintetizar qual era a proposta do Professores em Rede no começo?
R – Eu acho que, em palavras bem simples, é conseguir inserir estes professores nesta modernidade que agora faz-se absolutamente necessária. Sempre que a gente conversava, entre nós ali do grupo, o assunto, eu acho que a fala principal era de: “Nossa, olha, dá pra fazer isso, temos aquilo”. Eu acho que o Professores em Rede, e toda essa limitação de tempo que a gente teve, até que foi organizado o grupo, foi disponibilizado o local, as pessoas, então a nossa primeira turma foi a que teve o menor tempo. Mesmo assim, tendo esse tempo, acho que nem 50% do tempo das outras turmas que agora têm, a gente conseguiu conhecer uma realidade diferente. É inserir essas pessoas um pouquinho mais vividas que não tinham conhecimento de computação desde os dez anos, como o pessoal tem agora. Acho que esse foi o principal objetivo. E você se sentir mais à vontade dentro de uma Sala de Informática porque daí eu posso levar a minha turma lá, eu sei que vai ter coisas que, claro, eles vão saber em detalhes, principalmente de jogos e coisas assim, a gente trabalha também com eles. Claro que eles vão ter uma habilidade maior do que a gente, mas quando é você levar para desenvolver trabalhos específicos de cultura, do que é trabalhado em escola, nossa, eu sei fazer isso, que bom que eu consigo ajudar eles, né? Eu acho que o PER teve isso, de colocar a gente nesse meio, inserir estas pessoas pra se sentir mais à vontade lá na Informática mesmo, e nossa, eu gostei muito! Eu gostei muito! (risos).
P/1 – Márcia, qual a importância da formação continuada pros professores?
R – Ah, isso sim. Como a gente vai estar parando uma coisa dessas, né? Sempre que tem o termo formação continuada me parece que está ampliando um pouquinho mais daquilo que eu conheço. Eu fiquei um ano praticamente fora da escola nesse tempo que eu vim pra cá, quando eu tive o bebê então tinha as licenças que estavam acumuladas e tal, então eu fiquei o ano inteiro fora. Voltei em dezembro, só para ver como as últimas duas semanas, e aquele ano eu passei fora o ano 2000, esse ano eu fiquei fora. Pense que no ano seguinte quando a gente voltou pra trabalhar, e daí as pessoas falavam: “Ah, isso, é esse texto daquele curso tal” “Vixe”. Aí eu já ficava assim, eu não tive esse. Um ano que eu fiquei sem participar de nenhuma dessas coisas, tanto através da Prefeitura, quanto através de, a gente tem, por exemplo, congresso de educação todos os anos, que a gente faz encontro intermunicipal, tudo isso, todos esses encontros, eu não participei de nada naquele ano. Pense que um ano só que eu fiquei fora, no ano seguinte, as pessoas comentavam e eu ficava: “Vixe, vou ter que ver o que é isso”. Porque eu já me sentia um pouco mais por fora do que elas estavam. Então, se você pensar nisso, vamos ficar três anos sem nada disso. Não, de jeito nenhum! A formação continuada precisa continuar mesmo porque é aí que a gente se encontra, é aí que a gente cresce. Eu acho que é nesse convívio com as pessoas do grupo, com as pessoas lá, se fala muitos assuntos e é aí que você cresce. E as formações que a gente tem aqui é sempre com pessoas muito boas. Agora, até no mês que vem a gente tem Congresso de Educação, dois dias onde juntam pessoas de outros municípios também. Então, é aquilo de que todo ano a gente marca no calendário que tal mês vai ter um congresso que nós precisamos organizar nossa escola de uma maneira que se fecha as portas nesses dois dias e que não faça falta em dias de final de ano, tal, porque todos nós vamos pro Congresso de Educação. Eu acho que é bem importante, a gente não se separa desse contato com essas pessoas. Nesse ano de 2000 que eu fiquei fora, eu vinha pra escola de vez em quando, dava uma passadinha, vinha com o Artur, trazia pro pessoal e tal. E eu ligava pra minha tia em Capinzal, onde eu morei, que ela também era “prof.”, né? E eu ligava pra ela às vezes no fim de tarde pra pedir o que eles estavam fazendo lá no Belizário agora, o que estavam estudando e tal, porque eu sentia falta dessa conversa diferente, desde casa, de filhos, de pessoas bem queridas por perto da gente, cunhadas, que são muito queridas e tudo isso. Mas o que era nossa conversa? Era de filhos, era de casa, era o dia a dia delas, o meu dia a dia. Não tinha ninguém nesse ambiente pra se conversar coisa diferente. Aí, de vez em quando ligava pra minha tia, não tinha telefone ainda na casa da gente na época, e eu ligava pra ela e conversava: “O que você está fazendo na tua escola?”. Porque parecia que essa conversa diferente estava fazendo falta. E aí no ano seguinte quando eu voltei, que eu vi tudo o que elas falavam e que eu não sabia, aí mesmo é que eu vi que fiz falta (risos) esse ano que eu fiquei fora, né? A gente já fica um pouquinho mais por fora.
P/1 – E, professora Márcia, do que você aprendeu no Professores em Rede, quais as ferramentas, o que você lembra que você conseguiu fazer em sala de aula com os alunos, o que você conseguiu trazer? O que você lembra?
R – Olha, uma coisa que me marcou porque cada vez, cada pouco eles queriam estar fazendo era essa conversa entre eles, os computadores, claro tudo por escrito, um bate-papo, um chat bem no nível deles, nos assuntos deles. Então, a gente só podia conversar através do computador. E cada poucos dias, semanalmente a gente vem pra cá, faz algum tipo de atividade semanalmente, e sempre tinha aquilo de que eles queriam conversar. Então: “Prof., hoje nós vamos conversar?”. Nós fizemos, inclusive, uma prova que eu colocava as questões na lousa e eles podiam se ajudar a responder só batendo papo pelo computador, por tudo isso, aí eles podiam anotar, podiam qualquer coisa, mas ninguém podia conversar. Porque eles gostaram tanto dessa conversa entre eles, a conversa muda eles diziam, né? “Prof., hoje nós vamos conversar mudo?” “Não, hoje não vai dar, hoje nós vamos fazer outra coisa”. No dia da prova, daí nós combinamos tudo isso, que ninguém mesmo podia falar. Foi um sucesso. Daí eles queriam sempre fazer prova muda, eles não queriam mais fazer outro tipo de coisa. Acho que o que marcou disso tudo foi isso, e o que a gente conseguiu fazer de montagem com eles em histórias de quadrinhos, em livrinhos que a gente conseguia estar colocando ali. Montagens com fotos com eles na página, a escrita deles. Eu vejo que se a gente tivesse um ano todo como as turmas estão tendo agora, pense o que mais ainda a gente iria conseguir ter feito, né? Mas o que a gente trabalhou ali com eles, excelente, a gente se realizou!
P/1 – E professora, como é a recepção dos alunos a essas novas tecnologias na sala de aula? Como eles recebem?
R – Eles são muito ansiosos por isso. Quem tem computador, quem tem internet em casa, já diz: “Ah, isso eu sei fazer”. Na verdade a gente usa muito também a ajuda lá. Porque eu trabalho com o quarto ano e tenho vários alunos que têm bastante dificuldade de escrita e leitura ainda, então, como praticamente boa parte do que a gente faz depende de escrita e leitura, e no computador, mais uma novidade, aí que eles acabam se enrolando mesmo. Então tem muito isso da ajuda. Só que eles esperam pro dia que a gente tem marcado computação, que eles sabem que nesse dia sempre vai ser o que eles vão gostar de fazer. A gente também está usando agora digitação, que não é o objetivo que eles aprendam a digitar rápido, nada disso, mas a questão dos erros ortográficos, então nós estamos usando muito isso. Praticamente toda semana duas ou três linhas. Cada um tem o seu documento com o seu nome, e toda semana a gente escreve duas ou três linhas. Eu vou falando e eles vão escrevendo. Quando termina a escrita, cada um tem que procurar dar um jeito naquilo que de alguma maneira está sublinhada, está alguma coisa, cada um tem que procurar resolver. De que jeito, de forma que o que tem aqui, o que tem lá, então, toda semana essa digitação da maneira deles, com o dedo que cada um consegue, tudo isso, está ajudando a perceber erros que lá escrevendo eles não notam. Nem a minha escrita no quadro ele copia diferente, ele não percebe. Se ele copia do livro, ele está copiando diferente e ele não percebe. E lá, ele tá percebendo. Então, a ortografia está ajudando muito essa questão da digitação. E junto com isso daí, claro, todo dia a gente procura por uma coisa diferente, os dez minutos finais deixa livre, eles podem estar fazendo o que quiserem. A gente estuda no quarto ano, o assunto básico em Estudos Sociais é o estudo do estado, então a gente estuda Santa Catarina o ano todo, em todos os seus aspectos. Então toda vez que a gente vai na Informática, normalmente tem alguma coisinha de Santa Catarina pra estar procurando, pra estar vendo, pra que fique bem fresco na memória que é um estudo até o final do ano. Então, todo ano tem alguma coisinha de Santa Catarina. Ou alguma pergunta pra ser respondida, ou alguma imagem pra ser olhada, pra depois conversar, alguma data de alguma coisa. Então, sempre junto com isso tem o meu assunto, tem a ortografia, e tem os dez minutos deles. Então, quem tem mais prática faz isso já, quem está aprendendo, eles estão sendo o que nós fomos lá no nosso primeiro curso. Aprendendo a ligar, a desligar.
P/1 – Me conta um pouco mais isso. Os alunos que pela primeira vez sentaram no computador, você percebe como é que é isso?
R – Eu acho que muita timidez, eu vejo, mesmo aquele que é mais elétrico, ele chega lá, ele fica muito tímido porque é uma coisa que ele não conhece nada. Então, primeiro que ele tem receio de mexer, você tem que dizer: “Olha, liga aqui, agora, você liga aqui”. Ele não vai mexer sem você falar porque é tudo muito diferente, muito diferente. Nós temos uma clientela que dá pra dizer que é mais carente, uma boa clientela mais carente, então, ele senta e espera. Já na segunda, na terceira vez que você vai, ele já está ligando, então, você vê esse progresso. E como a gente tem aqui o mesmo gabinete pra dois monitores, normalmente um liga antes do que o outro. Aquele que não está ligando, ele fica assim, na frente esperando. E daí às vezes ele diz: “Prof., estragou”, com aquele medo que: “Ah, estraguei”. E depois você vê com que habilidade ele vai, senta e se acha dono daquele lugar, aquele que já está conhecendo. Aquele que ainda está chegando assim, é naquele que a gente tem que sentar perto pra ajudar. E a gente vê bem essa diferença. Quando ele tem um pouquinho mais de conhecimento, que ele já consegue abrir uma internet, digitar um assunto e encontrar aquilo, nossa, você vê que ele senta e ele se acha que está poderoso. Aquele que senta um pouquinho mais assim, mais devagar e tal, você tem que sentar do lado porque esse colega tá em dúvida.
P/1 – E, professora, quais potenciais que você acha que a tecnologia traz para a Educação, que ela trouxe aqui pra Concórdia?
R – O mundo de hoje é tecnológico, não há como nenhum tipo de profissão mais existir sem a tecnologia. Então, tudo o que a gente puder colocar, ajudar e fazer com que conheçam, o progresso das pessoas, os alunos vão crescer mais se eles conhecerem mais tecnologias. Não podemos de maneira nenhuma deixar de lado a questão humana que é muito nossa, que isso com crianças pequenas, mas nós sabemos que nós já temos que preparar pra que eles se encaminhem pra conhecimento tecnológico. É impossível você olhar alguma coisa hoje e pensar: “Não, aqui não precisa, aqui eu posso trabalhar porque eu não conheço nada em tecnologia”. Acho que cidade nenhuma vai conseguir avançar sem isso, escola nenhuma vai avançar. E como a gente esteve aqui nesse processo de adquirir o primeiro computador da escola, colocar no ano seguinte pra que fosse trabalhado, olha o conhecimento que a gente tem a mais com isso! Eu, às vezes, digo pra Solange que quanto nós mexemos com isso, com a Barsa, meu Deus! A Barsa estava sempre, um dos volumes, estava sempre com a gente porque onde você ia pesquisar alguma coisa? Tudo o que tu imaginasse teria na Barsa. Então, era muito difícil a gente não ter um desses volumes com a gente porque agora precisava desse assunto, daqui a pouco precisava do outro. Às vezes eu digo, a Barsa está ainda lá e a gente não usa mais hoje, nem eu, nem ninguém mais. Aonde você vai procurar o que você está precisando? Lá no computador, lá na internet, lá naquele assunto. Então, se tornou obsoleto e, infelizmente foi, é uma coisa que passou, só que o conhecimento aumentou, eu acho. Mesmo largando um pouquinho a pesquisa de livros e essas coisas de mesa, o conhecimento pra todo mundo aumentou. Nossa, a cidade progride muito com isso porque é dali que sai, o rendimento econômico, indústrias, porque o nosso município é bem dessa coisa, é de industrialização mesmo, produtos agrícolas, e essas coisas. Sem tecnologia a cidade não cresce, isso é básico.
P/1 – E, professora, pra fechar esse bloco eu iria te perguntar quais são os desafios pra continuação do Professores em Rede, do que falta ainda acontecer?
R – Olha, da outra turma que participou depois de mim, a gente conversou um pouquinho com as pessoas, mas não profundamente. Ainda me parece que o obstáculo, por exemplo, agora há pouco foi formada uma nova turma que ainda o obstáculo maior não é do Professores em Rede, é da organização do tempo de cada um, sabe? Acho que esse ainda é o maior empecilho, que muita gente gostaria de estar fazendo, mas daí diz: “Como que eu vou fazer isso? É na sexta à tarde, é na segunda de manhã. Como eu vou fazer isso? Não tem como”. Então vamos esperar uma próxima turma. Então a nossa turma, nós fizemos lá numa quarta-feira à tarde, mexemos uma porção de coisa pra poder organizar pra isso. Quando tem a possibilidade se muda, mas muitas pessoas, acho que o empecilho ainda é conseguir organizar o seu tempo e o seu trabalho, que às vezes não tem como mudar, e coisas assim. Pra você estar participando toda semana de um encontro desses você precisa ter aquele período que você sabe que não, segunda à tarde, toda segunda à tarde eu vou estar me encontrando com esse pessoal pra isso. Acho que o maior empecilho é ainda você conseguir colocar isso pra cortar quadradinho e ter esse tempo pra toda semana ou a cada 15 dias, não sei, estar lá. Eu acho que o maior empecilho ainda é esse.
P/1 – Já caminhando pro final, eu queria te perguntar um pouco como é a Márcia mãe, né?
R – A Márcia mãe. Márcia, mãe. É a que tinha que ter o Artur pra falar, né? [risos]. Eu acho que eu sou bem mãezona. O Artur tem 13 anos, tá na oitava série, ele estuda nessa escola aqui, à tarde. Ele é um guri fácil de negociar, então, me parece que a gente fez bem esse papel do conversar, de fazer com que entendesse que isso é possível, agora isso não é. Eu sou assim, não controladora, mas gosto de cobrar bastante as coisas, assim. Teu material amanhã pra computação tá pronto? O teu material da catequese pra amanhã está aí? Eu gosto das coisas assim, colocadas dentro do cronograma. E acho que também sou bem mãezona porque os filhos são das mães, né? Sem dúvida os filhos são das mães, então as mães fazem as coisas, negociam. Sempre que possível a gente leva, a gente traz. Quando não é possível ele dá um jeito. Ele também é muito companheiro da gente, nossa, o Artur é dez, colabora em tudo. Então, eu acho que em casa até agora a gente conseguiu desenvolver bem o papel de mãe porque o pessoal é bem legal, bem sem nada de, nem agressivo, nem bicho, nem nada disso, então eu acho que esse papel do conversar, enquanto ele era um pouco menor, ajudou bastante, né? Ele é muito dez.
P/1 – E quais as coisas mais importantes pra você, seja na vida pessoal, na profissional, pra você hoje, Márcia?
R – Mais importantes. Acho que filho entra aqui, porque agora como a gente tem uma carreira mais ou menos já resolvida, e indo já pros finalmentes, os objetivos da gente estavam aí colocados e foram alcançados. Me parece que o que norteia agora assim, mais de agora pra frente, é mesmo essa questão de trabalhar bem pra encaminhar o filho. Porque a gente já tem uma vida encaminhada, tem uma situação financeira estável, ninguém vai ficar rico mesmo até morrer, então, acho que é isso. Conseguir encaminhar bem essa pessoa que está em casa e, com certeza, continuar indo muito bem no trabalho da gente. Me sinto muito à vontade aqui na escola, é um lugar que eu gosto de estar, que eu não tenho pesar toda manhã, quando é seis e meia da manhã que eu tenho que levantar. Eu não tenho esse pesar que: “Ai, levantar de novo pra ir trabalhar”. Não é isso. Eu levanto como qualquer outro dia, como no sábado, como no domingo, eu não tenho isso: “Ai, hoje eu tenho que ir pra escola”. A não ser ontem porque ontem eu não tava bem de saúde. Assim, ontem não tava nada legal, então foi difícil o dia. Mas normalmente o ambiente aqui é bom, os colegas, a gente faz muita brincadeira, ri muito na sala das “profs”. É uma coisa bem integrada, então não tem nenhum tipo de pesar: “Ah, hoje tenho que passar o dia na escola”. Não.
P/1 – Márcia, você falou daquele encanto que você tinha quando você via sua mãe mexendo no material. Ainda existe esse encanto pela Educação?
R – Quando alguém me diz. “Meu Deus, eu não teria paciência”. Assim, em roda de amigas. E daí, eu digo que eu não vejo dificuldades em trabalhar com crianças, que nossa, é tão fácil, é só sentar e conversar com eles. Ou, se não está dando certo para tudo, para a aula, vamos conversar, tá resolvido. É tão fácil. Que daí alguém diz: “Meu, eu não teria paciência”. Eu olho e penso: “Mas isso é tão fácil, por que ela não iria conseguir?”. Então eu acho que é em função de que a gente ainda tem a coisa do gostar daquilo que está fazendo. Porque trabalhar com crianças é, ou você gosta pra desenvolver um bom trabalho, ou você fica sem gostar, e você sofre muito. Aí, você vai pensar numa manhã todo dia: “Ai meu Deus, tenho que levantar e ir pra escola”. Nada disso. O trabalho com crianças realiza as pessoas, eu acho, me realiza. Nossa, como eu gosto de chegar naquela sala, está aquela bagunça de arrumar banco e não sei o quê, e conversando. E daí eu chego, vou conversando: “Oi, bom dia, gente! Vamos lá, se organizar”. E daqui a pouco tá todo mundo, tá bem, vamos conversar. Eu acho que é porque o encantamento continua, senão a gente já viria: “Ah não!”. Não, não é isso. Ah não, acho que eu me sinto muito realizada lá na sala. Então, você fala sério, às vezes ergue a voz e fecha a cara e conversa. Ah, terminou, pegamos no pé, deu o problema, tivemos essa conversa séria, daí eu digo pra eles: “Agora começamos a aula”. O começamos a aula quer dizer: “Não tenho mais o que reclamar e não tenho mais que xingar, nem nada”. Agora vai começar a aula, então é a nossa aula. E um dia a orientadora daqui da escola me disse. Ela tinha chego na minha sala e eu estava conversando bem sério com um aluno, bem cara fechada e dizendo sei lá o quê, não me lembro. E, assim, bem brava. E daí eu disse que era pra ele sentar agora e tinha um outro esperando pra conversar, com atividade na mão, alguma coisa assim. Daí, eu fiz pra ela um pouquinho, chamei ele pra atender, antes de conversar com ela. Ela me chamou lá fora e disse: “Como você pode isso? Estava brava com um, “tava” falando sério, “tava” xingando. Veio o outro, ela com toda voz doce, conversando com ele da atividade como se fosse outra pessoa agora a conversar”. E daí eu disse: “Mas Lu, é assim. Quando você consegue separar as coisas, você gostar do que faz, eu não vou ficar brava com todo mundo, eu não vou estar o tempo todo de cara amarrada. Eu não vou fazer com que minha aula seja aquela coisa estressante pra quem está lá sentado e tal. É você gostar da coisa”.
P/1 – E pra fechar eu queria te perguntar quais são os seus sonhos hoje?
R – Assim meio pensando em cima da hora? Uma coisa que eu falo seguido é conseguir terminar bem o meu trabalho aqui, que quando eu estiver em final de carreira provavelmente eu vou estar aqui porque como a gente está há tanto tempo, mora nesse lugar há tanto tempo, imagino que eu termino a carreira aqui. E o que eu falo meio seguido é que, quando eu terminar o meu trabalho aqui, jamais eu quero ficar em casa curtindo estar em casa aposentada, nada disso. Eu quero ter tempo pra fazer tudo aquilo que eu gostaria de fazer hoje e não posso, bem em função do tempo. Que essas coisas extras que às vezes a gente olha as pessoas fazendo, você não pode fazer, não dá tempo, não tem como. Que eu consiga terminar o meu trabalho com saúde, pra então fazer essas outras coisas que agora eu tô tendo de deixar. Eu não consigo ter um tempo adequado nem pra ginástica, nem pra academia, faço as caminhadas assim daqui no fim de tarde. Essa coisa de natação que eu gosto muito e a gente acaba tendo de largar. Trabalhos manuais, pinturas, crochê, isso tudo. e então, nada disso na verdade a gente tá conseguindo. Então, assim pensando em cima da hora eu acho que agora é conseguir terminar bem aqui, começar muito bem a minha fase de estar em casa, e até pra ajudar quem está aí, quem vai estar numa faculdade possivelmente, estas coisas assim. Não é nenhum plano grandioso, não (risos).
P/1 – Tá certo. Só queria te perguntar como foi contar um pouco da sua história, essa entrevista, como é que você se sentiu?
R – Teve que pensar bastante, são coisas assim... Porque, quando eu cheguei aqui, eu não fazia ideia do que ia ter que conversar. E estava bem nervosa. De manhã eu ainda disse pras colegas lá da sala: “Ai, que chegue nove horas logo”. Porque é inseguro, eu não sabia o que ia ter que conversar. Então, quando você começou a perguntar isso, perguntar aquilo. Ah, tem que pensar no tempo atrás. Mas é o que você disse, começamos meio empacando, no nervosismo, e depois vai. O seu trabalho é bem bom, a gente ficou à vontade (risos).
P/1 – Tá certo então, obrigado Márcia, queria te agradecer.
R – Tá certo então, foi um prazer conhecer os dois (risos).Recolher