Projeto Memória dos Brasileiros: o Brasil que precisa mudar.
Depoimento de Ivonete da Silva Souza.
Entrevistado por Winny Choe e Julia Basso.
Açailândia, 30/10/2007.
Realização: Museu da Pessoa.
MB_HV072_Ivonete da Silva Souza
Transcrito por Vivian Wolf Krauss.
Revisado por Paulo Ricardo Gomides Abe
P/1 – Ivonete, pra gente começar, eu queria que você falasse seu nome completo, sua data e cidade de nascimento.
R – Meu nome é Ivonete da Silva Souza, e eu completo ano dia 28 do dez de 1974, tenho 33 anos, nasci aqui em Açailândia do Maranhão.
P/1 - Você podia falar o nome dos seus pais?
R – Meu pai se chama Sebastião Pereira de Souza, minha mãe, Luiza da Silva Souza.
P/1 – Eles nasceram aqui em Açailândia?
R – Não, eles vieram do Ceará, são cearenses e os pais deles são indígenas.
P/1 – Da região do Ceará?
R – É, da região do Ceará.
P/1 – Eles trabalhavam com o quê?
R – Os dois trabalham com a questão da lavoura, na roça, são agricultores.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Tenho, nós somos nove. São sete mulheres e dois homens.
P/1 – Você é a...
R – Eu sou a terceira na família.
P/1 – Sete irmãos?
R – Sete irmãos, mais sete mulheres, comigo, e dois homens.
P/1 – E eles moram aqui?
R – Todos moram aqui, meus irmãos, nenhum mora fora.
P/1 – Como é que foi que sua família chegou aqui em Açailândia?
R – Na verdade na época em que meu o pai veio, ele veio pra construir aquela BR 010. O Juscelino Kubistchek quando veio pra cá estava precisando de trabalhadores pra tirar pedra do meio da estrada e meu pai veio em busca de emprego. Então desde essa época ele está aqui. Ele tem 75 anos.
P/1 – E eles estão morando aqui agora?
R – Sim. Moram aqui em Açailândia. Sempre, desde o início, tiveram os filhos deles tudo aqui, do primeiro até o último.
P/1 – E como é que era quando você era pequenininha, na sua infância com seus sete irmãos? Como que era a casa que você morava?
R – Ah, a gente morava numa casa ainda de barro, na época, também era de palha, depois fio de barro. Agora, hoje, é uma casa construída, com toda a estrutura que uma casa tem que ter. Mas no início era de palha e pronto. Palha e coberta de barro. Então aqui não era, não tinha. Ele é um dos primeiros habitantes aqui de Açailândia. É. Açailândia ainda não era, Açailândia tem 26 anos só de emancipação, de cidade. Então ele tem 35 anos de cidade.
P/1 – Então ele foi um dos primeiros?
R – Um dos primeiros. Porque ele veio pra cá pra construir a BR 010 e depois ficou.
P/1 – É...
P/2 – Ivonete, você falou que seus pais são descendentes de índio.
R – Sim.
P/2 – E seus avós?
R – Meus avós, sim, também eles são indígenas. Meu avô era puro indígena, já morreu, a minha avó não. Ela é cearense pura, mas meu vô não, era indígena mesmo, casado com uma branca. Teve que sair do convívio social dos indígenas.
P/2 – De que comunidade que ele é?
R – Eu não sei, não. Eu não sei de qual comunidade ele era, pois ele era do Ceará também. Eu nem perguntei.
P/1 – E o quê que você acha do seu pai e da sua mãe, que têm uma característica indígena no jeito?
R – A minha mãe tem uma pura característica. Meu pai nada. A minha mãe é as comidas, os jeitos, os remédios naturais. Essas coisas ela tem as características indígenas. O meu pai não tem nada de indígena.
P/1 – Que comida que sua mãe fazia que era...
R – A que, por exemplo, beju, que é indígena, a macaxeira, que é indígena, tirar a puba, que nós chamamos, que é uma tradição indígena, então são essas as comidas. E a medicina quando a gente era criança ela não deixava tomar remédio de farmácia, só natural. Ainda hoje ela costuma preservar isso.
P/1 – Como é que é...
P/2 – O que é a puba?
R – Puba é uma tradição, uma tradição indígena da própria macaxeira. Você bota ela de molho, deixa ela por três dias de molho, depois coloca ela num saco e espreme. Aquele pó, aquela vitamina ali, tu bota no sol pra secar, e é a puba.
P/2 – Tipo uma farinha?
R – É, tipo uma farinha.
P/2 – O que faz depois com essa farinha?
R – A gente faz mingau pra criança, faz, é, bolo. Essas coisas.
P/1 – E o beju?
R – Pois é, o beju também a gente tira a massa e faz o beju e come, e come de qualquer jeito: com manteiga, sem manteiga, com ovo, com carne.
P/1 – E você gostava de comer essas coisas? Seus irmãos?
R – Eu gosto de beju, de cuzcuz, tapioca. De puba (risos). Essa tradição aí eu gosto.
P/1 – Crescer com sete irmãos deve ter tido muita brincadeira.
R – É, brincadeiras e brigas (risos).
P/1 – Como é que era? Conta um pouquinho pra gente.
R – A gente, na verdade, brincadeira, como só era mais mulheres, a gente brincava muito de casinha. Como na roça a gente tem privilégio, não tinha carro nem nada, de correr, de brincar de bambolê, de elástico, de cancan, que a gente chama, que é amarelinha, então dessas brincadeira a gente brincava muito. Como tinha muita mulher, então não tinha dificuldade pra brincar.
P/1 – E como é que chamam seus irmãos?
R – O meu irmão mais novo se chama Gilmar. Depois tem minha irmã mais nova que é Daiane; tem a outra, a Vanusa; tem a Núbia, Arlete, Maria e eu Ivonete. E o Gilvan.
P/1 – E a sua mãe ficava cuidando de todos?
R – É, minha mãe nunca trabalhava fora, só às vezes na roça, cozinhando pro meu pai pra questão da roça. Minha mãe sempre cuidou de nós. Da casa, nunca trabalhou fora.
P/1 – O seu pai plantava o quê na roça?
R – O meu pai planta macaxeira, arroz, feijão, batata, fava. Então ele planta essas coisas da roça.
P/1 – A fava é aquela fava...
R – Uma branca, grandona.
P/1 – Boa, hein?
P/2 – E frutas?
R – Não, a gente não tem, não tem sítio, porque aqui o sítio a gente costuma plantar as frutas e a roça é só mesmo a questão da plantação, da lavoura.
P/1 – E conta como é que era então, quando vocês todos, toda essa criançada, brincava com outras pessoas, outras crianças do bairro, vizinhos. Ou era só entre vocês?
R – Não, a gente brincava com outras, outros vizinhos que vinham, outros vizinhos do lado, então a gente não teve nunca dificuldade de encontrar, naquela época, crianças com quem a gente pudesse brincar.
P/1 – E como é que foi que você começou a estudar?
R – Não, a minha mãe ela é analfabeta. Minha mãe e meu pai, mas eles sempre tiveram o cuidado de colocar a gente na escola. Então a minha mãe ela botava eu na escola, tanto particular, ela pagava a minha tia pra dar aula de reforço pra gente, e na escola do município. Como a gente já foi estudar um pouco tarde, porque na época não tinha escola, quando abriu as vagas na escola, ela matriculou todo mundo. E ela sempre teve esse cuidado de incentivar a questão da educação.
P/1 – E a escola era longe da sua casa?
R – Não, não. Sempre foi perto, a escola da minha casa, sempre, sempre.
P/1 – E a hora do recreio, como é que era na escola? Você lembra de alguns colegas, professores?
R – Na hora do recreio não lembro muito bem essa questão das brincadeiras, dos professores. Só lembro do lanche (risos) porque eu adorava comer sardinha com arroz. Eu gostava muito de sardinha com arroz, ainda hoje. Então na hora do lanche já estava esperando só o lanche (risos). Mas eu não lembro muito dos professores. Não lembro, não.
P/1 – Você lembra de alguma matéria que você gostava mais?
R – Ah, eu gostava sempre de História, eu gostava muito de História. Ah, o que eu detesto é matemática, uma das piores.
P/1 – E como é que era? Vocês acordavam. Seu pai conseguiu colocar todos os irmãos na escola? Foi pondo aos pouquinhos?
R – Sim, a mãe sempre dividia, uns de manhã, outros à tarde. Eu sempre estudava à tarde. Como eu era a terceira, então a gente tinha que cuidar dos mais novos, e depois os mais novos iam pra escola de manhã e os mais velhos, que ela ficava em casa, ficava à tarde.
P/2 – Como você ia pra escola?
R – A minha mãe sempre ia deixar a gente na escola. Ela era bem no terreiro da casa. Ela ia e vinha, ia e vinha. Era assim, nem dois minutos da casa, quase ao lado. Era. Ainda hoje a escola é quase ao lado da minha casa. As escolas, as grandes escolas de Açailândia são ao lado da minha casa, então não tem dificuldade pra ir à escola.
P/1 – Conta um pouco como que era. Você começou a ir à escola. O que você fazia? O que você gostava de fazer quando você foi crescendo, ficando mais jovem?
R – Pois é, uma das coisas que eu não gostava era de ler. Quando eu comecei a estudar minha oitava série, eu comecei a ler livro de literatura. Eu comecei a ter o gosto pela leitura, então eu lia muito, muito, muito livro. Eu engolia, comia livro de literatura. É... esses livros de Machado de Assis, eu lia quase todas as coleções dele. Então eu gostava muito disso, de explicar, de ir na frente falar, de explicar as matérias, de conversar com os professores depois que eu fui entendendo mais das coisas. Foi a partir daí que eu comecei a colocar na minha cabeça que eu tinha fazer uma faculdade. Então eu não parei de estudar.
P/1 – E o colegial? Você fez aqui também em Açailândia?
R – Sim, tudo, até o segundo grau, tudo. Depois o Segundo Grau eu fiz em Imperatriz, e a Pós-graduação fiz aqui mesmo em Açailândia.
P/1 – E antes no período do colegial, como é que era essas coisas da paquera, das festinhas?
R – (risos) Ah, não...
P/1 - Das festinhas?
R – Eu nunca gostei dessas coisas de festas. Eu sempre gostava muito de sair com meus amigos, mas não da escola. Eu não tinha amigos da escola, não. Eu tinha fora. Fora eu tinha, que eram os meus amigos da igreja, da Pastoral da Juventude, de movimento social. Esses eu tinha, aí eu saía. Mas na escola eu não tinha.
P/1 – Você começou a ir, a participar de movimentos da igreja desde pequena?
R – É porque a Igreja Católica é a uns três minutos da minha casa, então eu tinha uns treze anos quando comecei participar. Ela começou a construir. Eu comecei a ajudar na construção. Então desde a construção até o final eu comecei a participar da igreja. Eu era muito envolvida na questão da igreja, do movimento social da igreja.
P/1 – Você foi por conta própria?
R – Fui por conta própria. Lá em casa todo mundo é assim, negócio da igreja, minha mãe nunca, nunca incentivou. Mas também nunca proibiu.
P/1 – E conta pra mim, como é que foi a igreja foi construída? Você começou a participar?
R – A gente começou a pedir dinheiro pra construção e começamos a participar do grupo de jovens da Pastoral da Juventude. Íamos ia pros encontros, então comecei a me envolver. Na escola nem tanto, mas na igreja eu era mais envolvida com as amizade, na escola quase não tinha amizade.
P/1 – Como é que eram os encontros da Igreja?
R – Da Igreja? É todo final de semana, todo sábado e domingo tinham os encontros da juventude.
P/1 – E o pessoal todo que começou a participar foi por...
R – Foi por conta própria.
P/1 – Que legal.
P/2 – Quais movimentos que a Igreja trazia? Você falou dos movimentos sociais.
R – Pois é.
P/2 – Na época que você entrou...
R – Na época, não sei se você já ouviu falar, vocês, nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBEs). Pois é, era nas CEBEs, CEBEs e Pastoral da Juventude, a gente participava dos dois. A CEBE é o encontro de comunidade, mesmo, do povo mesmo: uma coisa que o povo vem da roça, se encontra, todo mundo. É aquela animação, aquela alegria. Não é coisa de Renovação Carismática, é uma coisa do povo mesmo. Tanto a CEBE quanto a Pastoral da Juventude. Eu comecei a me engajar nesses dois.
P/1 – Como é que é a Pastoral da Juventude?
R – A Pastoral da Juventude agora teve o Encontro de Dia Nacional da Juventude (DNJ), faz tempo. Depois que eu comecei, vim estudar, essas coisas, eu me afastei, porque, quando você estuda, a faculdade não tem muito tempo, tem que estudar e tudo. Faz tempo que eu estou afastada, mas a Pastoral da Juventude, ela encontra todos os jovens que trabalham nessa questão da área social. A Pastoral da Juventude é mais com a área social. Então ela é um órgão da Igreja que trabalha, movimenta a área social da Igreja: tem a questão das famílias carentes, tem a questão de trabalhar com drogado. É esse o objetivo da Pastoral.
P/1 – Quando você começou a participar do movimento, você resolveu prestar vestibular? Pra que você foi pra Imperatriz?
R – Eu, Filosofia, porque na época eu não tinha opção, na época eu queria Assistente Social, só que não tinha, então eu fiz Filosofia e passei e estudei Filosofia.
P/1 – Como é que foi sair de casa? Já saiu antes ir pra um lugar? Você já tinha ido pra Imperatriz? Como é que foi?
R – É. Desde os treze anos que eu saio pelo mundo. Eu viajo pra São Luís. Eu viajo sempre desde os meus treze anos, porque eu nunca fico em casa. Eu, quando eu comecei viajar, comecei a trabalho, a trabalho voluntário, na época no Conselho Tutelar. E eu ia com outras pessoas mais velhas. Então eu nunca tive dificuldade pra sair.
P/1 – Pra onde que você foi nesses viagens?
R – São Luís, eu ia pra Goiânia, pra Belém. Com treze anos eu já viajava.
P/1 – E o que você fazia? Conta pra gente essas viagens.
R – A gente ia pra encontro de formação, por exemplo. Na época era um encontro que a gente ainda tem, o chamado Meninos e meninas de rua, onde os adolescentes e as crianças são todas de ruas. E elas foram resgatadas e estão colocando o exemplo. Então as pessoas que iam ser formadoras depois, com maior de idade, eles já levavam pra saber como era a realidade, então eles sempre me levavam quando tinha o encontro, porque era feriado às vezes, pra eu ir, que não prejudicava a escola. Eu ia com eles, porque nas minhas cãs a minha sorte é que eu moro perto. Minha mãe mora perto de onde funcionava tudo, onde funcionava o Foro da cidade, onde funcionava as escolas, essas coisas. Então eu, através do juiz é que ele me chamava. Ele: “Ah, vai ter um encontro”. Como na época não tinha nada, nenhuma estrutura, mesmo, muito forte aqui, então eles me convidavam. Eeu ia com ele, às vezes a assistente social do município me levava. Eu ia. Minha mãe não fazia caso mesmo. Eu ia (risos).
P/1 – O que você gostava dessas viagens?
R – Eu gosto. Gosto.
P/1 – O que você mais gostava?
R – Das experiências de ouvir as experiências, e que tem mudança. Às vezes a gente pensa que não tem, mas tem mudança. Então as experiências são mais fundamentais no dia a dia da gente. Faz com que a gente enxergue o mundo de outra maneira.
P/1 – Quando você foi pra Imperatriz, você foi morar sozinha?
R – Não, a gente morava aqui e ia. Todo mundo que estuda lá vai todo dia e volta.
P/1 – E a faculdade era legal, como que era?
R – Era, a faculdade... Na verdade quando eu estudei Filosofia, eu fiz porque eu não tinha opção, mas depois que eu comecei, eu vi que a filosofia está imbuída em toda a vida da gente. É o início de qualquer carreira, de qualquer ser humano, a filosofia. Depois eu fui fazendo outras faculdades, outras pós-graduações.
P/1 – Depois o que você fez?
R – Eu fiz Filosofia, depois eu fiz Psicologia, Meio Ambiente, Pós-graduação Ambiental. Esse ano que vem eu estou querendo fazer outra Pós-graduação pra não ficar parada _______
P/1 – Pegou o gosto de estudar.
R – Sim. Porque quando eu fico assim parada, eu fico inquieta.
P/1 – E aqui, depois, mesmo morando em Imperatriz, você começou a trabalhar? Além dessas viagens que você fazia, o que você foi fazendo? O que você foi...
R – Meu primeiro trabalho eu tinha dezesseis anos, eu comecei trabalhar no Foro da cidade. Na verdade não foi um trabalho, o Juiz pediu pra eu secretariar ele, porque ele me dava uma ajuda de custo só. Então como na época ele não podia ter uma secretária nem nada pra atender o telefone, às vezes atender as pessoas só, era trabalho mesmo, assim, simples. E eu fui. Desde esse tempo que eu comecei a trabalhar nos movimentos sociais e até agora eu nunca parei, porque ele me convidou. Era um Juiz muito bom na cidade, trabalhava nessa questão da erradicação do abuso sexual, exploração sexual infantil. A gente trabalhava junto e ele me convidava, e eu ia. E ele todo mês me dava uma ajuda de custo. Do bolso dele eu não sei, sei que ele dava.
P/1 – E como é que que você começou a trabalhar com os movimentos sociais? Que movimentos sociais que eram? Além do...
R – Os movimentos sociais que a gente trabalhava, principal, era a Pastoral da Juventude, que é da Igreja Católica, que foi o início de toda a trajetória minha nos movimentos sociais; depois eu trabalhei exclusivamente com a questão do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e o Conselho Tutelar; e hoje no Centro de Defesa (Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia). Só, os movimentos sociais em que eu trabalhei e que eu me envolvi até hoje são esses.
P/1 – E como é que foi o seu primeiro contato com o Centro de Defesa?
R – Primeiro contato com o Centro de Defesa, eu estava trabalhando no Conselho Municipal. Estava trabalhando, como falei já, e o juiz me dava uma ajuda de custo, não era bem um trabalho. E a gente ia mantendo, porque eu estudava um turno, e no outro eu me dedicava lá. E o Padre Danilo estava recém chegado na cidade, na cidade de Açailândia.E a gente estava, era da Igreja e tudo, ele me conhecia um pouco da Igreja, da Pastoral da Juventude e ele começou a participar do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente juntamente com a gente. E a gente trabalhou um ano eu e ele, logo a Carmem chegou também e começou também nessa luta do Conselho Municipal. A gente tudo junto. Aí foi, a gente teve umas complicações lá dentro do Conselho, porque é muito difícil trabalhar no Conselho porque ele é paritário, ele é um pouco do governo, um pouco da sociedade, então ele não tem muito espaço pra gente mostrar trabalho. Então a gente ficou. Nós ficamos um pouco decepcionados porque na época o Prefeito botou um Presidente e nós não queríamos o presidente. A gente resolveu estudar uma maneira de trabalhar com as causas sociais aqui em Açailândia, e como aqui na época tinha muita prostituição – ainda tem, mas é menos –, a gente começou a trabalhar com a questão da prostituição infantil e a gente começou a estudar uma maneira mais prática de trabalhar com essa questão dos movimentos sociais, a questão da causa social em Açailândia. Convidaram eu, a Carmem e o Danilo. Então fomos pensar. Depois juntamos um grupo pra pensar, passamos um ano estudando a Declaração Universal dos Direitos Humanos, experiência fora, como era que era o trabalho com essa questão da luta a questão dos Direitos Humanos. E foi daí que a gente começou a ter essa visão. Desde o início em 1996, 1995, que a gente começou a estudar os primeiros passos pra como se fundar um movimento social, o que a gente queria, como a gente queria. E daí deu a história.
P/1 – No começo era uma proposta maior na questão da defesa dos Direitos Humanos. Agora, ele tem um direcionamento muito forte na luta contra o trabalho escravo também.
R – Assim, sempre foi, aqui em Açailândia, e ainda é aberta a questão dos direitos humanos. A gente luta e defende tudo que aparecer ao nosso alcance. Só que quando a gente abriu a porta, quando a gente abriu a porta do Centro de Defesa, apareceu uns trabalhadores, uns trabalhadores de trabalho escravo, na época, em 1996. Em 1996 ainda. Logo que a gente abriu, eles apareceram contando a história deles, e a gente não acreditava. E fomos eu, a Carmem e o Filho. Fomos pras carvoarias, pras matas dormir lá. A gente foi ver se era verdade ou não era. E a partir daí a gente começou nessa questão da erradicação do trabalho escravo, porque na época a gente ouvia falar, mas não sabia que aqui existia essa prática. E por incrível que pareça foi dentro de carvoaria a primeira denúncia que a gente foi verificar, nas carvoarias.
P/1 – Foi de trabalhador.
R – É, de trabalhadores nas carvoarias. Um grupo de dez vieram aqui.
P/1 – E você assim, nessa vivência em Açailândia, que você cresceu aqui e tudo, você tinha ouvido falar antes, assim, desse tipo de...
R – Não.
P/1 – De regime de trabalho?
R – Não, o que eu estou falando pra vocês é que, como eu trabalhava com a questão da criança e adolescente, única coisa que eu trabalhava mesmo era com a questão da prostituição infantil. Na época em que eu comecei a trabalhar, tinha leilão de virgem, de crianças, de adolescente, então era muito, muito, muito forte essa questão. A gente trabalhava mais nessa questão. Trabalho escravo nunca tinha visto falar.
P/1 – Conta um pouco mais sobre essa luta aí da questão da prostituição infantil, que você passou.
R – Quando a gente começou a ter notícia dessa questão de prostituição infantil foi quando uns fazendeiros levavam as adolescentes pra Imperatriz, pra um cabaré lá, chamado Dalva, e lá nesse cabaré as meninas tinham que ser virgens pra poder ser leiloada. Então eles pegavam das redondezas de Açailândia, Buriticupu, Elizeu, pegava aqui da região do interior pra poder leiloar lá. Elas iam a troco de emprego, elas não, porque assim, as mães aqui, na época, ofereciam a filha fácil porque, “Ah, um emprego melhor, um estudo melhor”. Então elas deixavam ir como se tivesse, mais liberdade. “Não, vá, você vai pra onde você quiser”. E elas iam. Chegavam lá, na verdade eles leiloavam as meninas por preço de nada. Às vezes, na época era preço de banana, e ainda hoje é. E o fazendeiro ficava uma noite, tirava a virgindade e depois jogava na beira da amargura. As meninas com 13, 14 e até 16 anos. Era... e a Justiça montou uma fiscalização pra ver se pegava. Tem um livro, tem até um livro, do Gilberto (Dimenstein?), que é chamado Meninas da Noite, que conta a história. Foi ainda em 1995, 1994, que foi descoberto. Quando se deu fim, mais ou menos, na questão do leilão. Mas são coisas absurdas.
P/1 – Até hoje essa luta continua?
R – Até hoje.
P/2 – Essas meninas, depois que elas passavam por essa coisa do leilão...
R – Elas ficavam. Elas ficavam com vergonha de voltar pra casa e ficava no mundo da prostituição. Às vezes tinha algumas que ainda eram resgatadas, ainda iam trabalhar nas casa dos outros, mas a vida delas...
P/2 – Mudava.
R – Mudava.
P/1 – E você começou a trabalhar com essa ideia mais um pouco de direitos humanos.
R – Foi. Eu tinha treze anos quando comecei a trabalhar nessa questão.
P/1 – E quando você foi pra Imperatriz você foi cursando e continuou trabalhando aqui?
R – Sim, eu já quando... Na verdade, quando eu vim fazer faculdade eu já estava no Centro de Defesa. O pessoal do Centro de Defesa foi que me incentivou bastante, porque, quando eu comecei a vir pra cá, a fazer um trabalho voluntário, trabalhei doze anos de trabalho voluntário aqui. Eu ainda não tinha terminado meu Segundo Grau, eu não tinha, eu ainda estava terminando, porque na época que eu fiz meu Segundo Grau, eu fiz uma tal de “Formação Geral”, então não era nada. Eu fiz de novo o Segundo Grau Normal. Quando eu vim pra cá eu ainda estava cursando o Segundo Grau, estava terminando. Aí foi que o pessoal aqui me incentivou a fazer a faculdade. Eu já fiz faculdade, já estava aqui. Durante todo o meu processo histórico de universidade, eu já estava aqui.
P/1 – E quando você formou...
R – Ainda estou aqui, quando eu formei ainda estava aqui trabalhando, porque na verdade quando a gente trabalha nos movimentos sociais, a gente não exerce uma função, exerce várias. Então na verdade a faculdade da gente é boa pela experiência, mas às vezes você não exerce totalmente a sua faculdade, você não é contratada por aquela faculdade, mas sim pelo trabalho que você já exercia antes, pela experiência.
P/1 – E qual que é a importância pra você desses movimentos sociais?
R – A importância dos movimentos sociais na vida das pessoas é fundamental. Dependendo de qual entidade, dependendo da seriedade das entidades, porque elas servem muito pra orientar e prosseguir a vida das pessoas que mais necessitam, já que o rico, as pessoas que têm uma condição financeira, têm como pagar uma advogada; como pagar o seu plano de saúde; como pagar a sua estrutura. E o pobre nem formação tem. Então, além dele ser carente de alimentação, de dinheiro, de casa, de moradia, de tudo, ele ainda é carente de formação e as entidades que são sérias nessa questão da formação, da informação, são fundamentais no processo da conscientização dos moradores da comunidades; tanto faz, daqui de São Paulo, da Europa, mas elas são fundamentais, quando elas são sérias. Quando elas não estão nem aí, só pelo dinheiro, quando elas não estão nem aí pela comunidade, aí... Mas em todos os lugares tem sempre o ruim e o bom.
P/1 – Quando...
P/2 – Ivonete, você estava contando que quando, logo que vocês abriram o Centro de Defesa, apareceram dez trabalhadores e vocês viram que o trabalho escravo existia e...
R – Na verdade eu...
P/2 – Como que...
R – Eu não tinha conhecimento. A Carmem, aqui tem uma senhora, que o nome dela é a Maria, ela trabalhava na casa dos padres onde a Carmem. O irmão dela era de lá, então essa senhora falava muito pra ela sobre essa questão das carvoarias, que o filho dela trabalhava como escravo lá. Então a Carmem, ela já tinha um conhecimento de ouvir falar, mas nunca foi lá pra experiência. Eu não, eu fui a primeira vez. Então, quando eles chegaram e contaram pra mim, era uma história absurda, que não existia. Depois eu e ela e outro rapaz que trabalha aqui com a gente, fomos e verificamos que era realmente isso. Então a gente foi, dormia lá, passava a semana, e ia, a questão da droga também era muito ruim. É muito nas carvoaria. Na época, quando a gente foi, a água era água de lama, comida era estragada e as madeiras na época serravam todas. Então eu fui e constatei a realidade. Eu e Carmem passamos semanas e semanas dormindo lá na mata olhando a realidade.
P/1 – E como...
P/2 – Como esses trabalhadores estavam quando eles chegaram aqui? Quando você viu eles?
R – Pois é, eles estavam todos maltrapilhos, todos rasgados, todos sujos, com barba grande, todos mal cuidados, todos destroçados. A vida deles não... Drogado, sem documento, sem nada. Então eles não eram seres humanos, não, eles eram um trapo de gente, vegetavam só.
P/1 – Eles não dão alimentação e dão drogas, assim? (pausa)
P/1 – Então, você estava contando pra gente sobre o, os trabalhadores e a vivência que você teve lá.
R – É, não sei se vocês têm um conhecimento do trabalho nas carvoarias. Trabalho nas carvoarias é muito pesado, então na época não tinha uma fiscalização. Os trabalhadores pra trabalhar pra ganhar alguma coisa eles tinham que estar drogados, senão eles não davam conta do trabalho, então eles usavam droga, droga pesada. Quem fornecia era o próprio gato pra eles poderem ter condição de trabalhar, porque, além de não ter comida suficiente, eles ainda não tinham capacidade. Tinha que usar droga pra ter resistência, porque a droga deixa muito tempo desperto, acordado e tal.
P/1 – Que droga que era?
R – Aqui na região é maconha. Agora não, que já tem muita outras drogas, mas nas carvoarias é muita maconha.
P/1 – São muitas carvoarias aqui?
R – É, muitas carvoarias. Bastante.
P/1 – Por causa das siderúrgicas.
R – É, porque tem seis siderúrgicas, então tem que ter muito abastecimento de carvão. Na época, era só de madeira natural, hoje já tem o eucalipto, mas era só de madeira natural.
P/1 – Só homens?
R – Homens.
P/1 – Mulher não trabalha em carvoaria?
R – Não, na época trabalhava até criança! Criança, mulheres, todo mundo. Agora não, agora já, por causa da fiscalização da lei, já tem mais um controle, mas era homens, mulheres, crianças, todo mundo. De seis anos, de cinco anos. A gente tem “fita” aí, com essas imagem, com criança, com mulheres...
P/1 – Quando vocês...
R – Adolescentes.
P/1 – Vocês filmaram isso.
R – Filmamos.
P/1 – E como é que foi que vocês começaram a pensar, discutir pra denunciar ou não?
R – A gente começou a ver o quê que a gente poderia fazer por eles. Aí foi que, na época, a gente teve sorte porque uma equipe móvel veio aqui. Ela foi bater lá na igreja, aí o Padre Danilo perguntou o quê que eles tinham. Estava fazendo. Ela disse que ela era do Ministério do Trabalho, a Cláudia, a Cláudia, a Cláudia (Márcia?), que hoje em dia ela é aposentada. Foi então que a gente teve a ideia de denunciar. Na época a equipe móvel não tinha tanta autonomia como ela tinha hoje, então às vezes eles fiscalizavam mas não podia cobrar a rescisão do dinheiro, não podia dar nada. Só fiscalizava e botava pro Ministério Público do Trabalho multar e pronto. Mas hoje em dia a lei já mudou, então eles já podem fazer mais coisas.
P/1 – Esses trabalhadores que vocês começaram a encontrar, conhecer, a ajudar, eles que faziam a denúncia?
R – Era, eles que faziam a denúncia. Os primeiros dez que vieram aqui, eles vieram denunciar, aí depois a gente foi e fez essa, essa denúncia, junto ao Ministério Público e à fiscalização. Então daí pra cá eles denunciam direto. É eles que denunciam.
P/1 – E os trabalhadores são de que região?
R – Pará, Maranhão e Piauí.
P/1 – A maioria trabalhando nas carvoarias mesmo?
R – É, carvoaria e fazenda. Mas 80 por cento é carvoaria.
P/1 – O Ivonete, você contou que você entrou pro Centro de Defesa como voluntária.
R – Foi, eu entrei como voluntária.
P/1 – E depois disso, como é que foi?
R – Depois eu comecei a trabalhar, depois de dois anos de trabalhos, porque o primeiro ano foi só essa questão da formação, o que a gente queria, o que a gente não queria. O segundo ano já foi a entidade, já foi fundada. Eu comecei a trabalhar. Vinha um período, abria, trabalhava, atendia e tal. E depois daí eu comecei a trabalhar com meio salário mínimo, até três, quatro anos. Começamos colocar os projetos e começamos um salário e hoje em dia eu ganho bem pelo Centro de Defesa, porque já são dez anos de trabalho, de carteira assinada. A gente já conseguiu ter a remuneração suficiente pra poder manter, porque se a gente sair daqui, a gente não consegue outro emprego por causa da questão da perseguição, que tem muita perseguição política, perseguição dos empresários devido ao nosso trabalho. Então se eu sair daqui, eu tenho que ir embora daqui pra outra cidade, e lá montar minha vida todinha pra poder, ou então montar um próprio negócio pra mim, porque emprego mesmo em alguma fábrica dessa não consigo.
P/1 – E você é educadora hoje, aqui?
R – Sou educadora social, trabalho nos bairros. Já faz quatro anos que eu trabalho com a questão da capoeira, com a questão da conscientização dos jovens e adolescentes. E faz um ano que eu estou trabalhando nos bairros com a questão da conscientização também. Agora vou sair de licença. Só retorno em fevereiro.
P/1 – Me conta como é um dia desse seu cotidiano de ir aos bairros.
R – Nos bairros a gente tem atendimento jurídico. Eu dou orientação na questão quando as pessoas vão buscar, por exemplo, o registro de nascimento, pensão, a gente dá orientação. Tem esse atendimento, junto com a comunidade tem umas agentes comunitárias que trabalham no bairro lá, que atende no bairro ________. Depois tem as atividades culturais: dança, capoeira, teatro lá no bairro. A gente faz a questão do atendimento familiar, fazemos a questão do acompanhamento escolar também das crianças que participam das atividades culturais. Então nossa trajetória é essa dentro do bairro.
P/1 – Como é que é? O que uma criança precisa ter pra poder participar das atividades culturais do Centro?
R – O critério principal das atividades é ter renda mínima, é ser pobre, carente de tudo e estar estudando. Tem que estar estudando. Esses são os dois critérios principais. A gente não atende à classe que já tenha alguma condição de ter alguma coisa na vida.
P/1 – O que o Centro da Defesa da Vida, dos Direitos, quê que ele mudou na sua vida, assim?
R – Ah, ele mudou minha vida, assim mesmo. E assim, por exemplo, era pra eu ser, não sou, igual às minhas amigas, sem estudo, sem profissão. Era pra eu ser uma pessoa que poderia ser uma prostituta também, porque as minhas colegas de infância todas engravidaram cedo, casaram cedo e depois entraram no mundo da prostituição cedo. E mudou cem por cento, mudou pelo meio do meu conhecimento, a convivência com as outras pessoas. Fez com que eu enxergasse o mundo com outros olhos, fez com que eu valorizasse o que eu tenho, porque apesar de o que eu tenho ser pouco, mas é muito à vista dos que não têm nada, dos que são miseráveis mesmo. Então, por exemplo, se eu como hoje já é uma vitória, então eu tenho que agradecer isso. A partir do trabalho, da luta, na questão da erradicação do trabalho escravo, isso fez com que eu enxergasse e com que eu valorizasse o que eu tenho hoje e o que eu consegui hoje através do Centro de Defesa.
R – E o quê que você espera pra sua vida agora no futuro, com essa filha que está vindo?
P/1 – Ah, eu, o meu futuro é que ela não case cedo (risos). Não tenha filhos cedo também (risos). E o que eu espero é que eu continue pensando dessa forma, que eu continuar valorizando, o que o que eu consegui, o que eu posso conseguir pra mim e pra ela, que ela possa conseguir um estudo igual ao meu, que ela possa ter um conhecimento mais amplo e que possa decidir, porque o melhor na vida é que você decide o que você quer, o que você não quer. Porque quando você não pode decidir, é ruim. Então, que ela possa ter autonomia na vida dela.
P/1 – E em Açailândia o que você acha que mudou com o Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos, da época em que você começou com essa luta contra a prostituição?
R – Com os Direitos Humanos, com o Centro de Defesa... O Centro de Defesa mudou dando oportunidade para os 600 adolescentes que passam aqui. Então esses adolescentes poderiam ser os drogados, poderiam ser um “Zé Ninguém”. Então, é pouco? É, mas através do Centro de Defesa, com o dinheiro de fora, que vem da Espanha, com as doações, que não é da Prefeitura, transformou a realidade de Açailândia nesse sentido. A Prefeitura agora tem mais respeito com o cidadão através das denúncias e o Centro de Defesa fez, então a transformação mudou 50 por cento em Açailândia.
P/1 – O que você espera pro Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos daqui pra frente?
R – O que eu espero é que, se eu sair do Cento de Defesa, as pessoas que a gente educa nesse ramo, nessa questão da luta nos Direitos Humanos, possam substituir com seriedade, com vontade, com amor, com carinho, igual à gente. A gente faz esse trabalho, que não possa deixar esse trabalho morrer. Então que, apesar de que eu não esteja, que a Carmem não esteja, que outros não estejam, mas que outro jovem possa substituir da mesma forma que a gente. De outra maneira, mas com a mesma forma, com a mesma paixão que a gente, que não deixe o trabalho morrer.
P/1 – Pra gente ir finalizando, queria que você contasse o que você achou dessa história de voltar um pouquinho no tempo, contar um pouco da sua infância, do seu dia a dia.
R – É legal, porque a gente relembra o passado. Quando a gente tem um passado ruim também é bom lembrar porque o passado ruim faz com que você não repita tudo o que você fez. E o bom que você reviva a história e reanima tudo o que está dentro de você, então é legal isso.
P/1 – Você quer falar mais alguma coisa?
R – Não, brigada.
P/1 – A gente queria agradecer.
R – Certo, eu...
P/1 – A gente queria agradecer pelo Museu da Pessoa por você ter uma...
R – Também eu queria agradecer vocês por estarem, vieram de São Paulo pegar depoimento da gente, que possa ser de fundamental importância tanto pra vocês como pra nós.
P/1 – Ah, mas com certeza já...
P/2 – Obrigada.
P/1 – Muito obrigada
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