P/1 – Bom dia, Victor, mais uma vez, eu quero agradecer a sua disponibilidade e o interesse em participar, contribuir aqui com a gente e pra começar, eu queria que você falasse o seu nome completo, a data de nascimento e o local onde você nasceu.
R – Meu nome é Victor César Shing, eu nasci no dia 30 de agosto de 1987, na cidade de São Paulo, no bairro da Bela Vista.
P/1 – Queria também que você contasse pra gente um pouco sobre os seus pais. Quais os nomes dos seus pais, o quê que eles fazem e um pouco sobre a história deles.
R – Tá. Minha mãe chama Marlene Batista dos Santos, também é natural de São Paulo, também do bairro da Bela Vista e o meu pai chama Carlos César de Mello Shing, também de São Paulo, só que eu acho que ele não é da Bela Vista (risos). Meus pais se conheceram ainda na adolescência, na época de escola e tiveram atração um pelo outro, começaram a namorar. Os meus avós paternos, a minha avó é de Pernambuco, o meu avô era chinês, imigrante, se eu não me engano, ele veio de Hong Kong, refugiado de briga politica, eu não sei, na verdade, são as histórias que chegaram até a mim. E ele era muito habilidoso com comida, ele era cozinheiro e chegou a ter restaurante aqui em São Paulo e no desenrolar da vida acabou tendo sócios que não foram legais com ele, acabou perdendo tudo e se aventurou depois, trabalhando como cozinheiro itinerante, né, trabalhando em vários lugares, viajando. A minha vó é de Pernambuco, ela sempre cresceu aqui na Vila Maria. Na verdade, ela veio pra cá muito jovem, cresceu no bairro da Vila Maria e ela conheceu meu avô também muito jovem e sempre viveu com ele. Meus avós maternos, o meu avô, se eu não me engano era funcionário público e a minha avó sempre foi dona de casa, trabalhava como domestica e também cresceu no bairro nosso lá da Bela Vista, também. Acho que é isso que eu me recordo mais deles, assim.
P/1 – Você chegou a conviver com esses avós?
R – Com as minhas duas avós, sim, a materna e paterna. Minha vó paterna ainda vive comigo, minha vó materna faleceu há pouco tempo, agora, faz uns dois anos, mas eu tive contato, praticamente, fui criado dividido, assim, com atenção das duas, assim.
P/1 – Conta um pouco o que seus pais faziam ou fazem no campo profissional, também.
R – O meu pai, hoje, ele trabalha com bolos de casamento (risos), ele faz bolos artesanais de casamento com pasta americana, ele molda, esculpe, ele é muito bom, eu falo que ele é o Buddy brasileiro, ele é bom, modéstia à parte, ele é muito bom. Minha mãe se aposentou, mas ela trabalhava com Administração durante muito tempo, trabalhou em um monte de lugar, o último trabalho dela foi na Petrobrás e ela trabalhava no setor administrativo. Mas meu pai, antes de trabalhar com bolo, ele sempre trabalhou também… fala que até é parecido com o pai dele, porque ele sempre trabalhou em casas, restaurantes e bares, assim, também.
P/1 – E você tem irmãos?
R – Tenho uma irmã, hoje ela tem 20 anos, recém completados, chama Isabela. Ela é minha irmã do segundo casamento do meu pai, meus pais não são casados, meu pai tem uma outra família e ela é fruto desse novo casamento dele.
P/1 – E você tem contato com ela?
R – Sim, temos. Não tanto quanto eu gostaria, porque ela mora em Campinas com o meu pai, eu moro aqui em São Paulo, então fica muito difícil de ser próximo um do outro, mas sempre que possível, tenho contato sim.
P/1 – É Isabela?
R – Isabela.
P/1 – O quê que a Isabela faz?
R – Isabela, hoje, eu acho que por alguma influência minha, ela tá estudando Pedagogia (risos), ela faz Pedagogia na UNICAMP, ela tá acho que no segundo ano, agora.
P/1 – Você falou que você viveu, né, nasceu na Bela Vista, que seus pais também, que a família parece que tem uma relação com o bairro. Conta um pouco pra gente como que é a Bela Vista, o bairro onde você cresceu, a casa onde você viveu e vive, não sei se é a mesma.
R – Sim, eu vivo na mesma casa desde sempre. Eu, como eu falei, eu moro com a minha avó, ela mora comigo ainda, só que hoje os papeis se inverteram, quando eu era criança, ela cuidava de mim, hoje eu que cuido dela. Mas a Bela Vista é um bairro muito grande, posso dividir em duas partes, a parte considerado Bexiga, que é a parte onde tem a imigração italiana, das cantinas… melhor, divido em três partes: a parte do Bexiga, que tem essa parte da imigração italiana que é raiz ainda até hoje; a parte mais pra baixo que tem a maior concentração da imigração nordestina; e a parte alta que é onde encontra a maior parte do comércio, do maior comércio que são bancos e ali, concentram umas pessoas que não se enquadram nem do lado do Bexiga e nem do lado da imigração nordestina. É um bairro agitado, porém também muito tranquilo em algumas regiões do bairro. É um bairro muito tradicional por conta da riqueza de culturas que contém, por conta das imigrações que ali receberam. É um bairro completo, eu posso dizer, tem de tudo, desde casa noturna, grandes teatros, cinema, mercados, é um bairro completo para se viver assim, não falta nada pra gente, é um bairro na região central de São Paulo e é bem localizado porque tá no centro, então, não falta água, não falta luz, não tem enchente, considerando em comparação com os outros bairros mais afastados, né, então isso é um privilegio que a gente tem. Acho que essa e a principal característica que tem assim, do bairro.
P/2 – Tem alguma memória de infância no bairro, assim?
R – Ah tem! Quando eu era criança, por mais que viver na cidade de São Paulo, região central, eu brinquei muito na rua, então desde criancinha mesmo, meus seis anos, eu já brincava na rua com claro, supervisão da minha família, mas eu tinha amigos do prédio que a gente descia para a rua e fazíamos todos os tipos de brincadeiras tradicionais de rua, desde esconde-esconde, pega-pega, policia e ladrão, jogar bola, andava de skate, tudo o que se pode dizer que nas culturas mais antigas, nas vivências de rua eu consegui viver, vivendo no centro de São Paulo.
P/2 – Costumava frequentar algum lugar assim, especificamente?
R – Quando eu era criança?
P/2 – Isso.
R – Somente escola, mesmo. Na época de criança, é um fator legal, falo que é um divisor de aguas da vida, assim, porque querendo ou não, ainda vivendo na região central e por ter contatos de familiares muito próximos, a gente também tava sujeito a muita coisa que não devia. Então, eu tive muito contato com marginais também, com más influencias, tive muito contato. E eu lembro que eu era o caçula da turma, né, então o pessoal até me protegia um pouco quando… tinha briga na rua, o pessoal não deixava eu me envolver, aí quando chegava o pessoal um pouco mais barra pesada, eles queriam sair pra roubar pra poder… roubar bolsa, toca-fitas de carro na época e eu queria participar, porque eu tava ali, eu queria ser envolvido com aquele grupo de pessoas que era o que eu convivia, só que os meninos que moravam no mesmo prédio que eu, que eram mais próximos a mim nunca deixaram, assim, mas eu sempre tive contato com isso. E uma coisa que foi muito importante nessa época que eu nunca precisei fazer isso, eu sempre tive os meus pais muito presentes nessa hora, assim, minha mãe nunca me deixou faltar nada, tudo o que eu pedi, ela sempre me deu, mesmo com dificuldades. Então, eu queria, de repente, ter um videogame, a minha mãe trabalhava, fazia umas horas extras ali e me dava o videogame, então eu não precisava compartilhar daquela cultura que os meninos tinham. E eu comecei a despertar um senso crítico muito cedo e isso me fez analisar muito a situação e eu percebi que eu não precisava sair pra roubar com os meninos, porque eu queria estar ali por conta da molecagem, mas não que era uma coisa que eu precisava fazer, porque eu tinha acesso a essas coisas. E aí, foi quando eu comecei a me afastar desses grupos de pessoas e focar mais nas outras pessoas que foram os amigos da escola, principalmente, então a escola foi muito importante nessa época, porque era além da rua, era onde eu tinha mais contato com pessoas. E os meus amigos da escola são os meus amigos até hoje, assim, de anos. A gente tem uma relação de família, mesmo. E naquela época, principalmente, na escola, a gente começou a ter contato com esporte e aí, eu falei para a minha mãe que eu queria praticar esporte e ela me colocou num clube pra fazer esporte, então aquele tempo que eu passava na rua me relacionando com más influencias, eu acabei canalizando para o esporte. Eu era muito jovem, tinha acho que uns seis anos e ali foi o meu primeiro contato com o esporte. Com isso, os meus amigos do prédio também acabaram indo para o mesmo lugar e a gente acabou formando uma outra comunidade, ali, que foi a comunidade que praticava esporte à tarde, a galera que ficava na rua e a galera que ficava no esporte. Então, acho que respondendo a sua pergunta, se eu frequentava algum lugar, sim, era o esporte no clube e a escola.
P/1 – O clube e a escola ficavam também, no mesmo bairro, no Bexiga?
R – A escola, sim.
P/1 – Você lembra o nome?
R – Lembro, se chamava Paulo Machado de Carvalho, era uma escola de ensino fundamental I que seguia até a quarta série. E por ser uma escola muito pequena, acho que isso facilitou bastante para eu me aproximar desses amigos que eu fui fazendo e me afeiçoando mais, né? Só que teve uma época em que eu fui morar com a minha mãe. Minha mãe… ela, por mais que eu não fui criado pela minha mãe, minha mãe sempre foi muito presente, sempre morou perto de mim, então eu passava os finais de semana na casa da minha mãe, tudo. Mas teve uma época que eu fui morar com ela, passei a morar com ela dois anos e aí, eu inverti a situação, passava a semana com ela, no final de semana, eu ia pra casa da minha avó pra poder estar em contato com os meus amigos. E na época em que eu morei com a minha mãe eu estudei no Maria José, Escola Estadual Maria José que foi, inclusive, onde meus pais se conheceram.
P/1 – E o clube?
R – O clube fica… era ACM na época, Associação Cristã de Moços que ficava ali próximo a Praça Roosevelt, não vou me recordar o nome da rua, agora. Mas ficava ali próximo da Consolação, próximo do SESC da Praça Roosevelt, foi ali o meu primeiro contato. Pratiquei esporte lá durante uns dois anos, eu fazia natação lá e fazia futebol, também.
P/1 – Agora você contou que morou uma parte com a sua avó e uma parte com a sua mãe. Quando você morava com a sua avó, que idade foi isso? Você morava só você e ela? Como era essa casa?
R – Nossa, com a minha avó foi desde pequenininho, porque pelo o que os meus familiares me contam, meus pais eram muito jovens quando eu nasci, era uma média de 18 a 20 anos, então foi praticamente saindo da adolescência. Eles tinham que trabalhar, então, acabava ficando com a minha avó pra que eles trabalhassem. E eu fui acostumando, fui acostumando, fui acostumado e acabei ficando com a minha vó. E aí, ia pra escola, minha vó me levava pra escola, pegava na escola, à noite eu ia pra cada da minha mãe, só que era mais fácil eu ficar com a minha vó, tanto pra mim, quanto pra eles. E foi ficando até os meus seis, sete anos, eu fiquei com a minha vó. Aí depois, eu fui passar esse período de tempo morando com a minha mãe, depois eu voltei com a minha vó.
P/1 – Essa vó era a vó pernambucana?
R – Isso. Minha vó paterna.
P/1 – Qual é o nome, mesmo, dela?
R – Da minha vó?
P/1 – É.
R – Inês.
P/1 – E você tem memórias pra contar pra gente dessa vó, de onde que ela veio de Pernambuco? Como era no dia a dia, ali?
R – A história da minha vó…não sei muita coisa, não, mas eu me recordo que eu conheci a minha bisavó que eu me lembro, o que eu mais me recordo assim era do carinho que a minha vó tinha com a mãe dela. E eu tive o privilegio de conhecer, tive pouco tempo de convívio com ela, tudo, mas eu recordo plenamente que ela fazia cocada, ela morava na zona leste, morava no… era Artur Alvim o bairro. E a gente ia visita-la às vezes, mas a minha avó assim, de história da minha vó, não sou saber te dizer muita coisa, não. Só sei que ela veio de Pernambuco, ela foi criada em colégio interno, naquela época era muito difícil, acho que por conta da imigração, ela passou um tempo em colégio interno, mas não vou saber dizer muita coisa dela, não.
P/1 – E você sabe contar pra gente um pouco porquê que a família escolheu, acabou chegando e ficando ali na Bela Vista quando veio de fora?
R – Da minha vó, eu acho que por conta do acesso, porque ali, região central é muito fácil e como o meu avô, ele acabou trabalhando viajando muito, então, eu acredito que ali era um melhor acesso para eles. Já minha família materna sempre foi da Bela Vista, então, desde que eu sei deles, é dali que saiu, a história começou.
P/2 – Conta um pouquinho como foi essa transição da criança para a adolescência, como foi a sua adolescência, as suas vivências?
R – Minha adolescência… minha transição foi como eu falei, regrada ao esporte. A partir do momento que eu tive o contato com o esporte, eu passei a viver o esporte, não simplesmente praticar, mas a viver. Quando eu falo isso é disciplinado, respeitando regras, todos os valores que o esporte traz, eu comecei a codificar isso melhor. A minha transição mesmo foi quando… o mais marcante foi quando eu comecei a frequentar o SESC, que eu pratiquei esporte na ACM nessa época e lá, eu conheci algumas pessoas, só que era particular, era caro, então não dava pra ser mantido por conta que minha mãe que me sustentava. Então, não deu pra gente continuar. E aí, eu fiquei só na escola. E eu encontrei na escola um amigo que era da época da ACM e a gente começou a se aproximar de novo. Então, deixa eu explicar melhor. Na época em que eu estudava nessa escola em que tudo se iniciou que eu falei do Paulo Machado, era uma escola pequena que ia até a quarta série. Depois, a gente teve que ser transferido de escola, aí eu passei para uma escola municipal e lá, eu encontrei esse amigo que era da ACM. Eu levei alguns amigos que eram dessa escola para essa escola municipal e encontrei outros amigos que eram da ACM e eles estavam na mesma situação também, eles tinham parado de praticar esportes lá, tudo mais, e a gente convivia. E aí, a gente começou a desenvolver interesse por jogar futebol mais a fundo, porque a gente ficou um período sem praticar e aí, a gente conseguiu a informação que tinha o esporte acessível pra gente lá no SESC e era próximo da ACM onde a gente frequentava, tudo, o acesso pra gente era legal e aí, a gente começou a frequentar lá. Só que o ano já tinha começado, então a programação já tava fechada, das aulas, então a gente não podia praticar de forma dirigida, a gente ia nos horários vagos e até que virou o ano em 2002, um amigo conseguiu uma vaga pra entrar na aula de futebol, no projeto Tribo Urbana e eu não consegui. E aí, pra não ficar sem fazer nada, e esperando o horário da aula acabar pra poder liberar a quadra pra gente poder jogar, eu me inscrevi no basquete e aí, mais uma vez que tudo mudou (risos) na minha vida e eu comecei a praticar o basquete por uma ocupação, apenas, e depois virou paixão. E aí, por influência também, acabei convidando os outros meninos pra praticar e a gente prática até hoje. Dali, eu posso dizer que a adolescência começou, então, minha transição, respondendo a sua pergunta, foi de uma situação ociosa encontrando uma ocupação novamente.
P/1 – O quê que é o Tribo Urbana?
R – Tribo Urbana era um programa do SESC de esporte, iniciação esportiva pra crianças e jovens. Anteriormente ao Tribo Urbana, tinha para os mais novos o Curumim, que existe até hoje. Então, quando você tinha uma idade que você não podia mais ser Curumim, você já estava virando adolescente, você começava a participar do Tribo Urbana. E o Tribo Urbana possuía várias atividades, principalmente esportivas, tinha natação, natação não, tinha basquete, futebol, voleibol, teatro, se eu não me engano, tinha dança e se eu não me recordo a memória, chegou a ter judô também. Então, era uma gama de possibilidades, a gente não tinha limitação, a gente podia fazer até quatro atividades que era o que o tempo permitia, né? Então, você podia fazer voleibol, futebol, teatro, judô. E eu optei somente por fazer basquete naquele momento.
P/1 – Você foi à procura de futebol, mas optou por fazer basquete?
R – Isso.
P/1 – E daí? Como foi isso?
R – E daí que primeiro, eu fui muito bem recebido. Era um grupo de pessoas mais velhas, eu era um dos mais jovens, na época, então, isso deu uma resistência pra mim, porque eu não sabia jogar basquete, eu sabia que tinha uma bola maior que a de futebol e jogava na cesta, o pouco que eu tinha contato era na escola e foi muito superficial. Então, ver aqueles meninos mais velhos competindo, treinando, isso me encheu muito os olhos porque é uma coisa que eu aprendi a gostar há pouco tempo atrás e o desafio me motivava mais ainda. Então, quando o professor virava e falava pra gente correr, eu queria correr mais que os maiores. Era para saltar? Eu queria saltar mais que os maiores e teve uma figura importante ali que foi um amigo chamado Valter, que ele tava na mesma situação que eu, só que o meu caso foi com o futebol, o dele era o vôlei, ele não conseguiu vaga no vôlei, então, ele foi fazer futebol, a mesma situação e a gente tinha a mesma idade e também vinha de escola pública e a gente se alinhou ali: “Vamos se juntar aqui pra poder se garantir contra esses caras mais velhos”, então ele foi um cara bem importante, assim, pra se dedicar na nova prática, né? E aí foi indo, assim, o desafio foi o que foi me conquistando, depois a superação e o envolvimento com o grupo, principalmente, o grupo foi bem agregador também. No começo, teve essa resistência por ser uma coisa nova, o que eu acho normal, mas depois que eu fui inserindo naquele meio, eu fiz parte e eu faço parte até hoje, eu não consigo me ver longe disso. Isso foi muito importante assim, pro inicio dessa história.
P/2 – E alguma partida, competição que vocês participaram?
R – Muitas. Eu lembro da primeira participação que a g ente teve, foi um amistoso contra o Palmeiras e foi Rosa Branca que montou a equipe, porque naquela época tinha a Tribo Urbana e o Clube do Basquete, que o Clube do Basquete era comandado pelo Rosa Branca. E nós, que éramos, vamos dizer, da iniciação, a gente foi convidado, alguns foram convidados para participar dessa partida e eu e mais outro amigo apenas fomos convidados e a gente era os mais jovens, que menos tinham contato, a gente foi convidado para participar. Então, só de colocar o uniforme pela primeira vez e ir para uma partida oficial, nossa, foi inesquecível (choro/emoção), a gente nem entrou na partida, praticamente, a gente entrou faltando dois minutos, mas foram os momentos mais mágicos, assim. Eu vendo os meninos jogar, aí tinha o meu professor que tava junto, também, que era o Alexandre e quem comandava era o Rosa, mas de ver ali, de fazer parte daquilo tudo foi inexplicável no momento, porque a gente olhava: “Meu, a gente tá fazendo parte disso, a gente nunca imaginava estar aqui”, fazia o quê? Seis meses que a gente estava com o pessoal e só a gente estava ali. E aí, era um jogo pra valer, assim, contra uma equipe de federação que jogava bastante e aí, de repente, faltando dois minutos pra acabar o jogo, a gente nem tava ligando pro placar, se tava ganhando, se tava perdendo, a gente tava curtindo muito aquele momento. E aí, o Rosa chamou a gente, falou: “Vai, vai correr, vocês sabem o que tem que fazer, vai correr”, a gente entrou no jogo e aí, quando a gente pegou na bola, a galera gritava, eu tinha 14 anos, o pessoal já tinha seus 18, a gente nunca tinha entrado numa partida e aí depois, quando acabou, todo mundo aplaudiu a gente e aí, até teve o convite do treinador da equipe do Palmeiras pra gente ir lá treinar com eles lá, participar da equipe, jogar na federação, tudo mais, fazer uns testes. Então, nossa, fazia muito tempo que eu não lembrava disso.
P/1 – Como que era o Rosa Branca? Ter aula com ele, com o Alexandre que você falou?
R – O Ale é um dos caras mais importantes pra mim, assim (choro/emoção), acho que na minha vida, porque quando eu cheguei para participar da turma do basquete, ele que me recebeu. Ele era muito atencioso, diferente de muitos professores que eu conheci assim. E ele tinha uma atenção maior com a gente porque acho que pela gente ser mais jovem, então, ele tinha um cuidado diferente. E ele era muito… ele sempre foi uma grande referência, um grande exemplo assim, porque quando a gente tinha uma noção de esporte e via treinador, técnico, tanto em filme quanto em documentário, reportagem, a gente sempre tinha uma referência de um cara bravo e o Rosa era esse cara bravo, porque ele foi atleta competitivo, ele foi bicampeão mundial com a seleção brasileira em 59 e 63, então, ele tinha essa raiz de ser rigoroso. E o Alê não, o Alê ele conversava com a gente, ele tinha esse dom de agregar o grupo. Então, tanto que a história começou a mudar depois que os meus amigos que eram do futebol começaram a praticar o basquete, então, me senti mais em casa ainda, porque eram os meus amigos mais particulares participando de um momento meu, ali, e o Alê, ele abraçou todo mundo e fazia a gente se sentir as pessoas mais especiais o tempo todo. E ele sempre incentivava a gente, sempre tinha uma palavra pra corrigir alguma coisa, isso não só no basquete, mas seria pra tudo, porque o que a gente aprendia no basquete, a gente tirava depois para o nosso dia a dia e continua sendo assim, até hoje, eu falo que particularmente falando, eu fui educado pelo esporte, né, e acho que a pessoa chave para essa educação que eu tenho hoje foi o Alexandre. Então, era o contraponto, assim, com o Rosa. O Rosa, a gente tinha admiração por ele, por ele ser quem ele era, a figura que ele era, que ele representava para o país, quando a gente passava perto dele, todo mundo queria falar com ele, tirar foto, ele era uma celebridade do esporte, a gente teve essa aproximação com ele. Mas a minha admiração principal sempre foi pelo Alê, pela pessoa que ele é, assim, sempre foi com a gente e até hoje ele é, a gente tem contato até hoje. Então, ele foi muito agregador, assim. As primeiras competições que a gente participou assim, foi ao comando do Alexandre, já não foi mais com o Rosa. O Rosa foi uma transição, se eu não me engano, ele foi um idealizadores do programa do Clube do Basquete. Então, quando ele ficou doente, ele teve que se ausentar, aí quem assumiu foi o Alexandre e aí, com isso, a gente acabou tendo mais participação também do Clube do Basquete, porque foi uma transição, né, o Rosa já conhecia os meninos mais velhos, tudo, ele confiava naquela galera, não que ele não confiasse na gente, mas gente não teve tempo de talvez aprender tudo que ele tinha ensinado para aqueles outros mais velhos e quem teve essa missão pra ensinar a gente foi o Alexandre, aí com essa ausência do Rosa, ele sumiu, subiu a gente de categoria, vamos dizer assim e nos aperfeiçoou. Depois o Rosa fez uma visita pra gente em clinicas e palestras e tudo assim, ele afinava as nossas habilidades, né? Mas o grosso mesmo foi o Alexandre. Aí eu lembro que o basquete tava muito forte naquela época lá no SESC que a gente frequentava, tanto que montou uma turma de basquete à noite, que eram pessoas mais velhas ainda, que eram os veteranos, porque a galera mais velha da época do Rosa Branca começou a se ausentar também porque tinha que trabalhar, começava a estudar, chegava a idade em que você tinha que escolher e não dava mais para jogar, a gente não era profissional, a gente não tinha auxilio financeiro, a gente jogava por amor, mesmo. Então, acabou que a gente assumiu essa condição de mais velho na equipe principal e a gente no tinha ainda tempo hábil de experiência pra poder entrar em competição, mas a gente fazia muito jogo com esse pessoal dessa turma da noite, que eles, sim, eram muito… nossa, anos mais experientes que a gente, era uma equipe, praticamente, de máster. E eles eram os nossos principais adversários, assim, eram amistosos quinzenais e a gente sempre perdia (risos), perdia, perdia, perdia, até que teve um dia que o Alê chegou, chamou a gente e falou: “Vamos ganhar dessa vez?”, a gente falou: “Pô, a gente tá tentando” “Então vamos ganhar dessa vez, vamos se concentrar e vamos ganhar”, daquele jeito que ele sempre fala, brincando e calmo. E eu lembro que nessa partida, a gente se fechou, a gente se juntou e falou: “A gente vai ganhar dessa vez”, e a gente tava bem entrosado, já se conhecia, aí já não era mais uma turma de iniciação esportiva, já era uma turma de amigos. Isso pesou muito e a gente vendeu aquela partida, a gente jogou de forma linda, assim, foi fantástico e a gente ganhou aquela partida, foi a primeira vez que a gente ganhou uma partida. Eu lembro que eu chorava, eu fiquei muito feliz, os meninos também choravam, aí a gente abraçou o Alê e parecia final de campeonato, mas era só um amistoso. E foi a primeira partida que a gente ganhou, foi lá no ginásio amarelo.
P/1 – E nessas partidas, você levava pessoas da família pra assistir?
R – Não. Meus pais nunca me viram jogar basquete, até porque meu pai mora em Campinas e minha mãe sempre trabalhou. O nosso grupo, acho que só tinha uma mãe que participava, assim, de ver os jogos que era a mãe do Felipe, a Ana, que a gente chama ela de mãe também, a gente tem essa coisa de chamar a mãe do outro de mãe, o pessoal chama minha vó de vó, mas ela era a única mãe assim do nosso grupo que participava, assim, um pouco. Mas os meus familiares não, nunca foram me ver assim, não, até porque os horários dos jogos eram bem difíceis, né, então não dava, não, mas eles não iam ver, não.
P/1 – Vocês iam quantas vezes por semana e durante quanto tempo foi esse processo de frequentar o clube?
R – (risos) De segunda à sábado no SESC Consolação e de domingo, no SESC Vila Mariana (risos), a gente chegava lá… a aula começa às duas horas, acabava às quatro, aí tinha um horário livre que a gente ficava jogando até às seis e meia, das quatro às seis e meia, aí fazia mais um treino à noite com esse pessoal do máster, depois, que era das seis e meia às oito. Aí, voltava pra casa, aí a gente pensava em comer, tomar banho, fazer as coisas e aí, no outro dia, ia pra escola de manhã, acabava a escola, ia pra casa correndo, almoçava e já ia para o SESC, porque nessa época foi legal que foi uma overdose de basquete, eu posso dizer porque a gente começou na Tribo Urbana que era esse estágio anterior e as aulas eram de terças e quintas. O Clube do Basquete eram de segunda e quarta e de sexta-feira, era recreação livre. A gente jogava à tarde inteira e à noite, São Paulo inteira ia para o SESC Consolação ver basquete. Era… nossa, era magico de ver sexta-feira também à noite chegar, a gente contava a hora pra chegar sexta-feira à noite, porque era gente da cidade inteira, era gente de todos os pontos, de todas as etnias, todas as tribos se juntava na quadra do basquete, tinha gente que ficava pra fora do ginásio porque não tinha espaço de tanta gente que tinha, era comunidade… a gente falava que a negrada toda se juntava no mesmo lugar naquela hora. E eram tantas partidas, tantas partidas, começava às seis e ia até às nove e meia, a gente conseguia jogar uma partida, perdeu, não vai dar tempo de jogar de novo, mas a gente ano ia embora, a gente ficava lá vendo, a gente se deliciava de ver o pessoal jogar e as confusões que… era só os caras grandão, a gente olhava assim, meu, imagina esse cara jogando com a gente. Era uma época que a gente gostava muito só de estar fazendo parte lá, de ver aquilo. Então, a gente frequentava de segunda a sábado e quando não tinha lá, a gente ia para a outra unidade que tava tendo. Eu lembro que foi o nosso challenge, a gente falava que aos finais de semana, a gente ia desafiar os meninos dos outros SESCs.
P/1 – E você consegue assim, fazer alguma relação do porquê que todo mundo ia lá na sexta-feira no SESC Consolação jogar o basquete?
R – Lá era o maior polo de basquete que tinha, a estrutura era muito boa, a gente tinha uma quadra muito boa, era uma quadra gostosa, um ambiente bacana. Ficava gente do lado de fora da quadra, não tinha espaço, os patrulheiros ficavam desesperados lá, pedindo pro pessoal ir para dentro, para não consumir coisa lá, era muita gente, muita gente, parecia um estádio de futebol, assim, só que era um ginásio que tinha um espaço do tamanho dessa sala, assim, pro pessoal ficar e era gente que subia no ombro do outro, era genial. Mas isso também teve muita influência do Rosa, porque o Rosa, ele divulgava, ele chamava o pessoal pra ir pra lá, ele era um cara que promovia o basquete também, então, como ele tinha muita influência, o pessoal acabava indo para lá. Depois com a ausência dele, começou a se perder um pouco isso mesmo, a gente continuou fazendo a manutenção, convidava algumas pessoas… eu lembro que a gente começou até a fazer umas saídas para os parques Ibirapuera, convidar as pessoas pra ir lá jogar com a gente: “vai lá, porque a negrada lá joga e o racha lá é bom, dá pra você ir lá e curtir também” ’Tem que ter carteirinha”, era o único SESC que podia jogar com o RG, então não tinha necessidade de ter a carteirinha para poder participar desse momento, porque era um evento que tinha na região, na cidade assim, pra quem gostava de basquete, era o point. Então, mas o que promovia aquilo, realmente, era o Rosa e as outras tribos que começaram a frequentar lá. Aí depois, teve uma restrição, o lance do RG, aí começou a… só permitir a participar quem tinha carteirinha e aí depois, começou a ter umas regras na recreação dirigida, que antes era lei da quadra, né, que a gente fala, era ganhava, você jogava e você montava o time que você queria, então você chegava com o seu time de amigos lá, meu, gritava “Próximo” e esperava. Isso era legal, só que… aí depois, começou a mudar a direção da recreação, aí era a partida dupla, então você jogava duas, tinha que sentar, então você não tinha mais aquele desejo de vencer o mais forte, de continuar na quadra, a gente era o rei da quadra: “Não vamos sair à noite inteira”, aí a galera começou a dispersar um pouco e foram buscar outros polos para jogar. Mas o lado bom disso que eu vejo, é que deixou de concentrar num lugar só, mas se propagou. Hoje você encontra, não na mesma proporção que era naquele tempo, mas você encontra o basquete em outros lugares, agora, mas nasceu dali, com certeza tudo aconteceu dali.
P/1 – Sobre o Rosa Branca, quando você chegou lá, você e seus amigos, meninos, vocês tinham assim… sabiam quem ele era?
R – Não fazia ideia de quem era o Rosa Branca quando eu fui pra lá. Eu só ouvia falar: “Vai ter aula do Rosa na segunda-feira, na quarta”, eu vinha de terça e quinta, porque eu era dos menores, Rosa, quem é Rosa? não fazia ideia quem era Rosa. Ele entrava na quadra, cumprimentava todo mundo, eu dava oi, mas não sabia quem era. Aí, o Alê que me explicou quem ele era. Aí, o Ale falou: “Como assim vocês não sabem quem é o Rosa Branca?”, ele deu uma aula pra gente sobre o Rosa Branca e ele tem muito orgulho de ter conhecido o Rosa, porque acho que ele foi estagiário do Rosa, então, ele era o cara mais gabaritado para falar do Rosa Branca pra gente. E aí, ele nos falou dos feitos que ele foi medalhista olímpico, foi bicampeão mundial e aí, a gente foi conhecendo a história e vivendo essa história com a presença dele, também, lá, né? Porque depois que a gente soube quem era, o peso daquela pessoa, a gente olhava assim: “Ele é o Rosa”, porque a principal referência que a gente tinha naquela época era o Oscar, que é um pouco mais contemporâneo. O Rosa foi seleção brasileira na década de 50, 60, mas os feitos deles daquela época ainda são até… maiores do que dessa época contemporânea que a gente vive agora. Então, depois, a gente começou a ter uma noção do quanto isso representava e o quanto que isso promovia para o basquete que a gente vivia, começamos a usar ele também, né? Eu me lembro de um fato importante assim, que foi bem legal, que teve uma celebração no SESC Consolação, que é onde a gente frequentava, frequenta até hoje, que foi a celebração do campeonato mundial de 1963. Então, a unidade inteira ficou vestida de verde e amarelo, exposição, clinicas de basquete e tudo mais. E teve um jogo festivo que reuniu ainda os atletas daquela época que estavam vivos, né, que uns já se foram. Aí, estava o Rosa, o Amauri Passos, Vlamir Marques, uns outros lá. E a gente teve, antes dessa apresentação, teve uma vivência de basquete cadeirantes que é o basquete paraolímpico e a gente foi lá participar da atividade com as cadeiras e o pessoal que era cadeirante sacaneava a gente de uma forma absurda, a gente estava tentando andar com a cadeira, vinha um, tirava o ferro, a roda caía da nossa cadeira, a gente virava, ficava no chão, eles pegavam a bola, roubavam, levava. E aí, depois, a gente foi fazer a mesma vivência, só que eles na cadeira e a gente em pé, andando. Aí, o meu amigo, o Felipe… “Esses caras sacanearam a gente com a cadeira, agora a gente vai sacanear eles sem cadeira”, eu tava com a bola, ele parou embaixo da cesta, aí o rapaz de cadeira estava sentado, ele estava em frente a cesta, esse meu amigo segurou na cadeira dele pra ele não se movimentar, eu vim correndo, eu pisei na cadeira dele, passei por cima dele e enterrei a bola. Aí todo mundo ficou: “Nossa, que moleque ousado”. E foi bem legal porque a gente ficava brincando de se sacanear. E logo depois dessa vivência ia ter o jogo das estrelas que eram os caras da seleção brasileira daquele tempo antigo. Só que antes de começar o jogo, a gente começou a brincar e um dos meninos que é um grande amigo também, o Ibis, ele se pendurou atrás da cesta e a cesta soltou e ela veio abaixo. E aí, a gente olhou, o Ibis acabou com o evento (risos), porque como é que os caras iam fazer o evento agora? E aí ficou todo preocupado: “Foi sem querer, eu não queria fazer isso”, aí o Alê olhou assim, a gente: “Nossa, vai tomar a maior bronca”, né, mas ele começou a rir: “Você tem noção do que aconteceu?”, aí ele subiu correndo lá, conversou com acho que os superiores dele, explicou o que aconteceu, aí transferiu o jogo para o outro ginásio. E aí, teve a partida com os senhores da seleção brasileira de 63 lá, também foi muito legal de ver, como eles estavam muito velhos e fazia muita cesta, os caras eram muito bons, assim. Aí depois dessa partida, a unidade fechou e todo mundo saiu do prédio, menos eu e mais dois, o Felipe e o Leandro, porque a gente se escondeu, que a gente queria conversar com os atletas, com os senhores. Aí, a gemente se escondeu no vestiário e sabia que o prédio já tinha fechado, sabia que eles estavam lá dentro e queria ter mais… a gente só conhecia o Rosa, queria conhecer o Amauri Passos que o Alê falava tanto dele, também. E aí, quando a gente tava lá, a gente se ligou que o prédio já tinha fechado, todo mundo já tinha ido embora, só tava nós três lá e o pessoal que tava participando do evento. Aí, o Alê viu a gente, assim, o Alê e o Eric, que na época era estagiário, hoje ele trabalha no SESC Ipiranga. Ele olhou assim pra gente: “Vem cá vocês três, vem com a gente”, a gente entrou no elevador, aí tava todo mundo no elevador, a gente subiu pro último andar da unidade e lá tem um terraço, e lá tava tendo um coquetel pra essas pessoas, celebrando e aí, eles convidaram a gente para participar do coquetel (risos), aí eu olhei assim, eu falei: “A gente tá aqui mesmo?”, aí o Ale virou pra gente e falou: “Fica à vontade aí, vai conversar com quem vocês querem conversar agora, não precisa ficar tímido”, e o Felipe ficou muito tímido, eu sempre fui cara de pau, eu perguntava, falava e o Felipe tímido, assim. Só que o legal dessa história foi que a gente estava lá para tietar e a gente foi tietado, porque eles queriam saber quanto tempo a gente jogava, qual que era a nossa influência, o quê que a gente conhecia deles, eles estavam curiosos preá saber se a gente conhecia eles, de verdade, né? Como que a gente conhecia eles. A gente passou à noite lá no coquetel com eles, participando, os professores da unidade, os diretores, os atletas lá e a gente lá. Aí depois, o Alê olhou o relógio, falou: “Já tá tarde, vamos pra casa, senão os pais de vocês vão ficar preocupados”, aí agradecemos, demos tchau pra toso mundo, aí todo mundo deu tchau coletivo pra gente e aí, a gente foi embora e aí, eu acho que essa é uma grande lembrança que eu tenho, principalmente do Rosa dessa época, porque a gente nunca esperava que ele ia ser tão receptivo, porque a gente tinha a visão dele ser bravo e ele foi super receptivo, integrou a gente também, foi bem legal. E a gente ficou lá escondido (risos), entrando no coquetel dos caras.
P/1 – Você lembra de alguma coisa do bate-papo que vocês falaram com o Rosa ou com o Amauri?
R – Lembro. O Amauri perguntava pra gente onde a gente estudava, se a gente gostava de ir para a escola, ele falava: “Você tem que ir para a escola, se não for para a escola, não pode jogar basquete, tem que ir para a escola” “Mas a gente vai pra escola, vai pra escola sempre”, aí o Rosa até me olhou e falou: “É, eles vão pra escola, só que eles não estão indo pra escola pra estudar, não, eles ficam matando aula pra vim pra cá de manhã” (risos), porque teve uma época que a gente começou a matar aula pra ir para o SESC jogar basquete de manhã porque a quadra ficava livre. E aí, ele deu uma cutucada, a gente: “Não, não, foi só uma vez” (risos), mas era isso, eles queriam mais era saber da nossa particularidade, mesmo, como que a gente estava inserido no basquete e eles ficaram muito gratos, assim, pela nossa interação, principalmente com o projeto do SESC, né, de basquete.
P/1 – Você tinha comentado que essa questão da escola é muito importante, né, pro Rosa, né?
R – Sim.
P/1 – Quer falar um pouco disso, não?
R – O Rosa era muito rigoroso, como eu falei. Então, ele pedia pra gente sempre ser disciplinado, parecia até quartel, assim, às vezes, ele era muito severo e ele exigia disciplina. E na época da escola, teve uma vez que quando eu já mudei de escola, eu mudei de escola quatro vezes e uma das mudanças da escola, eu já sabia jogar basquete e jogava basquete no intervalo. E a molecada da escola não sabia tanto, então, eu me sobressaía, só que era uma escola meio barra pesada e os moleques não gostavam muito de perder pra mim e aí, a gente acabou que teve uma briga. E aí, me encurralaram lá, me bateram e eu fiquei com uma marca no rosto e aí, eu voltei para o SESC pra jogar. Aí o Rosa olhou pra minha cara assim, ficou me olhando, eu: “Que foi professor?” “Você brigou na escola?” “Não, briguei não, foi no jogo” “Isso não é marca de jogo, você brigou na escola”, aí eu expliquei pra ele, eu falei: “Não, e que eu tava jogando e aí, os meninos não gostaram que eu ganhei”, aí ele… foi a única lição assim, realmente, que eu tive do Rosa que ele falou: “Se você é melhor do que os outros, você não tem que se sobressair e expor isso, você tem que ser humilde igual todo mundo” “Mas eu não fui desumilde”, mas ele achava que eu tava me exibindo e realmente, não foi isso. Mas ele quis deixar bem claro isso que mesmo que eu fosse melhor que os demais, eu não deveria expor isso, eu tinha que me enquadrar a todos. E aí, eu explicando para ele que não foi isso, que não foi isso, aí ele ficou bravo e falou: “Se você brigar de novo na escola, você nunca mais aparece aqui” “Tá bom, tá bom”, aí ele falou: “Eu conheço os moleques da sua escola, eu vou saber", sabia nada, aí ele jogou um verde: “Eu vou saber se você brigar de novo na escola, e você nunca mais aparecer aqui”, aí o Alê depois veio conversar comigo: “Tomou uma carcada do Rosa, né?”, eu falei: “É, tomei”, mas depois eu também nunca mais tive motivos para brigar na escola e nada assim, mas foi a única vez que o Rosa chegou a dar uma lição, mesmo assim em mim, mas era sempre mais coisa de jogo e jogo, jogo, jogo…
P/1 – E aí, você foi crescendo, né, isso foi um período grande e aí, quando foi quando chegou a hora de escolher a profissão, que já estava no ensino médio, no colegial, como foi esse processo aí?
R – Depois do meu primeiro contato com o Alê, eu já comecei a admirar ele demais. Então, eu sempre falei: “Eu quero ser igual a ele, quero ser igual ao Alê”, e aí, eu escolhi fazer Educação Física, eu sou formado em Educação Física por influência do Alê, mas antes de eu tomar essa decisão, eu tinha uma outra escolha bem significativa, porque quando a gente estava para completar 18 anos, a gente conheceu… a gente teve um amigo novo no basquete que ele era imigrante japonês, a mãe dele estava aqui no Brasil estudando, fazendo especialização em medicina estética e o menino chamava Hiroki e ele gostava de basquete, começou a frequentar basquete com a gente, aí o Alê como sempre agregou o moleque, o moleque não falava nem português, a gente começou a ensinar ele a falar português, que ele andava com o dicionário embaixo da mão, a gente adotou ele assim. E eu e o Felipe que é um amigo… de todas as histórias que eu tô contando, o Felipe participou de todas, a gente se aproximou mais desse menino, do japonês, o Hiroki, a gente cuidava dele, a gente ia buscar ele em casa, a gente levava ele pra comer porque ele não sabia falar e mãe dele se afeiçoou muito a gente e a mãe dele conversou com a gente falando que se a gente quisesse, ela conseguiria uma oportunidade pra gente ir morar no Japão, na cidade de Nagano com eles, para poder jogar basquete. A gente olhou assim, pensou: “Como assim?” “Vocês não jogam basquete aqui? Vocês vão poder jogar basquete lá no Japão” “Mas não é simples assim, ir para o Japão para jogar basquete” “Mas é porque…”, ela explicou que o basquete lá é um esporte em desenvolvimento, que o japonês… não é cultura do japonês e eles estavam querendo difundir essa cultura do esporte e eles gostam muito dos brasileiros, porque os brasileiros são raçudos, treinam mais e ela falou que isso poderia ser legal tanto pra gente, quanto pra eles, só que seria um contrato de seis anos. E aí, eu pensei bem, eu sentei com o Felipe, a gente conversou, eu nem expus isso para a minha família, e aí ele falou: “Eu vou só se você for”, eu falei: ‘Eu também, eu só vou se você for”. Só que na época, eu sempre quis fazer faculdade e eu já tinha esse espelho do Alexandre e tudo e tava muito difícil de eu fazer faculdade, eu tentava bolsa como atleta em universidade e eu não conseguia, porque era uma bolsa parcial. Aí, tentava… não conseguia entrar na faculdade, de jeito nenhum. Aí conversando com a minha mãe, minha mãe mais uma vez se sacrificando por mim, se esforçando, ela falou: “Realmente você quer fazer isso?” “Eu quero, ame” “Então, tá. Então, escolhe uma universidade que não seja tão cara porque eu não vou ter como pagar uma universidade cara, mas você vai confiar no seu potencial e eu vou pagar a universidade pra você”, aí eu lembro que eu fiquei super feliz, mas eu tinha que tomar uma decisão, eu ia pro Japão ou eu ia ficar para estudar? E aí, algumas noites sem dormir porque eu tinha que dar a resposta logo, aí eu levei em consideração o esforço da minha mãe. Aí eu falei: “Minha mãe vai deixar de fazer as coisas dela pra poder pagar a faculdade pra mim”, e o combinado seria que ela ia pagar somente o primeiro ano, eu ia ter que me virar a partir do segundo ano com as despesas, mas eu levei em consideração o esforço da minha mãe, aí eu falei para o Felipe: “Felipe, não vai rolar, velho, eu vou ficar porque tá acontecendo isso, eu vou conseguir ingressar na universidade”, e aí, na hora ele ficou meio assim, porque ele nunca teve ambição talvez quanto eu tinha de carreira, assim, então para ele era um momento que ele queria degustar. Mas aí depois, ele entendeu e a gente na hora de falar o sim, falou não e aí, veio pra cá. Aí, eu comecei a fazer faculdade. Eu contei essa história para o Alexandre e aí, ele ficou super feliz e eu contei pra ele que ele era uma das influencias de eu estar fazendo isso, também, e aí, ele me deu o maior apoio, me incentivou, falou que se eu precisasse contar com ele, eu poderia conversar com ele e daí foi quando começou a direcionar a minha carreira assim, acadêmica, quando eu ingressei na faculdade, mas eu tive que escolher entre jogar basquete e estudar.
P/2 – Como foi esse período da faculdade? Você fez estágios? Como foi?
R – A faculdade foi uma fase muito boia que eu guardo com muito carinho, porque eu era muito novo, eu entrei exatamente com 18 anos e na minha turma eu era o mais novo, pra variar, eu sempre fui o mais novo em todos os núcleos sociais que eu me envolvi. Então, era molecão e cheguei na universidade: “Por quê que você tá aqui?”, era o questionamento que os professores faziam, aí eu falava: “Porque eu sei jogar basquete, eu tenho um professor de basquete e eu quero ser igual a ele, então por isso que eu vou fazer Educação Física” “Legal”, só que ao me aprofundar na universidade, eu comecei a ver que o basquete não era a coisa mais importante pra mim, eu fui conhecendo outras coisas e eu comecei a me aproximar muito d parte do lazer e da Educação Física escolar. E na faculdade, eu fui obrigado a fazer estágios, né, e esses estágios foram escolas e eu precisava de um professor de confiança para que viesse a me conduzir no estágio. E aí, eu fui falar com o Alê, falei: “Alê, eu preciso fazer estagio”, só que o Alê não trabalha na escola. Só que tinham os outros professores do SESC que também eram amigos meus, assim, de longa data, todas as histórias que eu falei, eles tiveram participação também e aí, eu falei com o Marcinho que ele era professor também acho que já era do Curumim, ele ficava com os menores, mas ele sempre estava interagindo com a gente. Eu conversei com ele e falei que precisava fazer estágio, aí ele falou: “Então, vai fazer comigo”, ele dava aula numa escola estadual lá perto da casa dele, na zona leste, num lugar chamado Santa Terezinha. E eu falei: “Sério?” “Sério, vai lá comigo” “Tá bom, então eu vou”, aí eu acordava cedinho, acordava cinco horas da manhã, sair do centro de São Paulo para ir para o extremo leste, quando todo mundo do extremo leste estava vindo para o centro. E aí, eu encontrava ele lá às sete horas da manhã, escola longe pra caramba, mas eu passava a manhã inteira com ele lá, acompanhando as aulas, tudo e aprendi muito com o Marcinho, nossa, muito mesmo em relação a escola, assim, porque o que o Alê me representa como profissional e incentivador, o Marcinho tenho também muito como espelho, porque você olha pra ele, você fala: ‘Esse cara não mexe com criança” e ele é um mago, assim, as crianças amam ele. E eu consegui ver como ele faz, aprofundar, porque eu tinha uma noção muito superficial de ver ele no SESC, porque eu não fui aluno dele no SESC, eu só vi ele trabalhando e lá, no estágio não, eu pude vivenciar a vida dele como professor e aprendi demais com ele lá. Eu tinha que fazer acho que dois, três meses de estágio com ele, acabei fazendo um ano inteiro, praticamente, porque eu queria continuar assim, e ele sempre foi um querido também, sempre me incentivou também, sempre me deu muita força, assim, bem bacana. Aí, no ano seguinte, eu tinha que fazer estágio de novo, só que com o ensino fundamental II, que são os maiores. Aí, eu fui fazer com o Marquinhos, que também foi professor do SESC. Só que lá foi mais rápido, porque eu também naquele tempo já trabalhava, então não podia me aprofundar tanto, mas quando eu tava no SESC, conversava muito com ele ainda, ele me passava vários feedbacks do que acontecia. Além do período de estágio que eu fiz com ele, também. E foram períodos assim, de muito conhecimento, principalmente, eles foram pessoas importantes para a minha base hoje como profissional de escola que sou, né, principalmente.
P/1 – Você tem algum destaque pra contar pra gente, alguma coisa legal ou ruim que você viveu com eles nesse…
R – No estágio?
P/1 – É.
R – Tenho. Com o Marcinho. Ele tinha um aluno que chamava Romário, era uma criança, tinha de oito para nove anos e o moleque era muito levado, muito levado. E o Marcinho falava com ele, ele obedecia, na hora que ele dava as costas, ele já subia, queria pular o muro para fugir da escola, era bem endiabrado o menino e o Marcinho, ele sempre foi cauteloso, coimo abordar criança pra não reprimir e eu, naquela época, ainda não tinha conhecimento também, falava: “Cara, você é muito paciente, velho, porque eu já tinha gritado, se fosse eu já tinha gritado, já tinha mandado o moleque descer”, aí ele pegou e falou pra mim: “Eu tenho essa vontade, você acha que não? Eu tenho muito essa vontade, é que eu não posso conduzir as coisas dessa forma”, aí eu falei: “Meu, mas todo mundo é assim?”, aí ele falou: “Alguns, mas ele acho que é por causa do nome, é muito marrento chamado Romário, né?” (risos), o moleque chamava Romário e era marrento, ainda.
P/1 – E aí, foi concluindo o processo da faculdade…
R – Fui. Eu falei, eu queria ser professor de basquete igual o Alê, mas eu fui conhecendo outras coisas que foi a parte do lazer e a Educação Física escolar que são as duas áreas que eu amo trabalhar. Mas quando eu sai da universidade, eu concretizei esse sonho de ser igual o Alê, porque eu entrei numa instituição grande que era um colégio em São Caetano do Sul e a minha função era professor de basquete. Então, foi ali de novo um inicio de uma nova fase, porque ali, eu me via na pele do Alê e do Rosa, ali e para os meus alunos, naquela época, eu fui a grande referência também como o Alê foi pra mim. A gente tem contato até hoje, ainda, os meus alunos também e eles têm um carinho enorme, assim, por mim assim como eu tenho pelo Alê, então é muito legal de ver essa comparação. E naquela época, eu contava da minha experiência, contava do Rosa Branca também, eles conhecem todas as escolas que eu passei, eles sabem quem é o Rosa Branca porque eu vivi com o Rosa Branca, eu conto as mesmas histórias que o Alê me contava e foi um processo muito parecido com o meu, porque eu peguei uma turma também que não conhecia basquete, comecei a ensina-los, eles também não ganhavam, depois eles tiveram o processo de começar a vencer e aí, a gente foi campeão pela primeira vez, nós fomos campeões duas vezes e foi a maior alegria da vida dele ser campeão nos jogos escolares municipais e pra mim também, porque o primeiro contato como professor, eu consigo fazer um resultado desse, alcançar um resultado desse. Então, o processo começou a andar, daquilo que eu planejava, comecei a dar aula de basquete, aí depois, eu comecei a dar aula de futsal igual o Marquinhos no SESC, que eu fiz estágio com ele também, ele dava aula de futsal, aí eu: “Marquinhos, preciso de ajuda no futsal”, aí eu conversava com ele, eu ia lá, dava aula de futsal também na escola. E aí, as coisas foram aumentando e eu fui cada vez me inserindo mais assim, aí entrei no âmbito escolar, mesmo, pedagógico e daí em diante, eu até ousei em me especializar nessa área, eu fiz pós-graduação em Educação Física Escolar e tô até hoje também nessa área.
P/1 – Atualmente, você tá fazendo o quê?
R – Eu sou professor de uma universidade e sou professor de um colégio. O colégio, eu trabalho com ensino fundamental I e II, de segundo a nono ano e na universidade, eu dou aula no curso de pós-graduação e lazer da FMU, a escola chama Vital Brasil, colégio Vital Brasil e na Universidade FMU, onde eu atuo no curso de pós-graduação e lazer.
P/1 – E como que é o seu trabalho cotidiano? O quê que você poderia dizer que é um desafio do cotidiano, que é um dia bacana de trabalho? Um dia ruim?
R – O dia ruim pra mim é quando eu tô ocioso, eu detesto me sentir ocioso, é uma coisa que me magoa, eu não ter função, não ter alguma coisa pra produzir, assim. E um dia bom são os dias que eu tenho conflitos na escola, porque os conflitos acrescentam muita… é muito rico pra você trabalhar, principalmente, valores e eu fui educado através de conflitos também, né, de amigos e tudo mais, então eu gosto muito quando eles têm as discussões deles e eu consigo entrar na discussão e fazer eles refletirem sobre aquilo tudo e aquilo me traz um resultado positivo que é a reflexão, principalmente. Então, eu saio muito satisfeito quando eu consigo entrar nessa sintonia com os alunos. Mas eu acho que principalmente o que é mais difícil é eu me manter sendo eu mesmo, porque a gente veste muitas mascaras, às vezes, quando a gente tá trabalhando, né? Quando eu tô trabalhando com publico, eu tenho que ter uma postura diferente de quando eu tô trabalhando com outro, totalmente oposta, talvez, essa postura, né? Quando eu tô na universidade, eu posso ter uma desenvoltura mais aflorada, quando eu tô com as crianças, eu tenho que ser mais atencioso, eu tenho que ter uma observação mais delicada e é muito difícil por conta disso, que a gente acaba fugindo um pouco daquilo que a gente quer ser. O que eu quero ser? Eu quero ser o tempo todo esse cara competitivo que brinca, que fala, que… e nem sempre pode, né? isso é o que mais me segura, assim.
P/1 – Mas você gosta?
R – Gosto. Gosto, sim. Hoje, eu gosto muito, eu não me vejo fazendo outras coisas. Modéstia à parte, eu sou muito bom no que eu faço, assim, eu tenho resultados surpreendentes, o que tá me produzindo, me proporcionando uma carreira acadêmica bem efetiva, produzindo coisas que eu nunca imaginei que poderia produzir, tais como livros, estudos mais aprofundados de algumas áreas, a possibilidade de fazer uma outra graduação. Então, são resultados positivos, assim, daquilo que eu venho fazendo, de muitas coisas que eu errei e que eu pude corrigir depois, então, acho que… principalmente, o sucesso que eu venho tendo hoje é por conta de eu ter errado e ter tido pessoas que me corrigiram, principalmente, e me deram a possiblidade de consertar isso tudo depois, né?
P/1 – Por exemplo?
R – Por exemplo como professor mesmo, às vezes que eu não consegui atingir algum objetivo no começo da carreira e eu pude ter conversas abertas com os outros colegas, com os amigos hoje, né, os professores, principalmente do SESC, isso foi um canal muito importante porque quando você sai da universidade, é um mundo totalmente oposto, você ouve umas coisas na universidade, mas na realidade, é muito diferente. E aí, você vai buscar essa referência onde? Então, você erra muito e eu tive amparo de muitos professores e outros colegas e amigos. Então, se eu talvez não tivesse tido esse amparo, principalmente, eu não teria atingido alvos tão altos, assim como eu venho atingindo.
P/1 – Você tinha comentado anteriormente que uma parte assim, que te trouxe muita atração na faculdade foi a área de lazer e recreação. Conta um pouco dessa relação com esse tema, como que você desenvolveu…
R – Recreação e lazer, bom, recreação é uma disciplina que eu tive na universidade no primeiro ano da graduação de Educação Física. E é uma disciplina onde a gente aprende a lidar com jogos, brincadeiras, a gente aprende a dirigir e a conduzir situações recreativas. E eu, por ser muito jovem, naquela época, na transição da adolescência, molecão, eu tava sempre fazendo brincadeira, sempre tava fazendo piadas e eu tive um aprendizado com um professor… o nome desse professor de recreação chama Ronald Guimarães, ele me ensinou uma coisa chamada ARTE, que é uma abreviação que significa Atividades Recreativas Temáticas de Encenação. E o objetivo disso era fazer com que a gente aprendesse a lidar com interpretações de personagens, mas de uma forma descontraída, não tão quadrada como no teatro. É você ser um príncipe encantado numa brincadeira, num conto de fadas, um pirata num caca ao tesouro, enfim… e você tem muita liberdade para ser aquele personagem, mas também de conduzir ele da forma que você melhor encontra. E ao vivenciar essas situações com a recreação, eu vi que eu levava jeito e aí, eu comecei a primeira… o primeiro trabalho que eu tive foi com recreação, porque eu trabalhava numa escola de ensino infantil e a principal ferramenta que a gente usa para trabalhar com as crianças é a recreação e isso tava ainda no primeiro ano de faculdade, era um dos primeiros estágios, assim. E depois, eu fui progredindo, fui conhecendo outros lugares e acabei caindo na área da recreação hoteleira. Recreação hoteleira é um campo que trabalha com lazer atuante nas partes de hospedagem, desde resorts, hotéis fazenda, pousadas, enfim, hotéis. E quando você trabalha na área hoteleira, você tá sujeito a muita coisa, desde uma convenção de esporte ao conto de fadas e isso me despertou muita desenvoltura para umas outras coisas que eu fui fazendo, por quê? Ao iniciar o trabalho, eu fui me especializar um pouco mais e eu fui fazendo cursos e um dos cursos que eu fiz, eu conheci um rapaz que ele era um dos monitores desse curso e ele era muito bom, ele era engraçado, era um cara que todo mundo gostava de observar, de ver e eu olhei, falei: “Acho que esse é o padrão de profissional que eu quero seguir, esse cara é legal, eu quero ser um cara legal, assim”. E aí, conversando com ele, ele me falou que uma das ferramentas que ele utilizava pra poder fazer esse trabalho e alcançar aquele nível foi que ele estudava… ele fez cursos de palhaço, ele estudava palhaço. Aí, eu me questionei, né, estudar palhaço? Como assim se estuda palhaço? Palhaço do circo. Aí, ele me orientou que tinha um curso em Jundiaí que era um curso de palhaço que a gente poderia aprender um pouco mais sobre o nossos eu interior, sobre as nossas sensações e que isso é uma grande ferramenta. Quando eu entrei na faculdade, eu aprendi a aprender a gostar de aprender, porque até então, eu não era tão chegado. Mas eu me interessei, fui atrás desse curso, eu fui para Jundiaí, fiz o curso, durava uma semana. E lá, a gente apreendeu muitas coisas, assim, muito pessoal, assim, muito particular, a gente expunha isso e naquele momento, eu não entendia nada, tanto achei que aquele curso não me serviu de nada, não teve valia de nada, mas depois, quando eu comecei a trabalhar com os hotéis, eu tive o convite do rapaz de fazer uma sketch e essa sketch era de palhaços e aí, eu: “Opa, eu acho que isso tem a ver com alguma coisa que eu já vi por ai”, e eu fiz e quando eu estava atuando naquela situação, onde os palhaços se encontravam, conversavam, começou a fazer sentido para mim aquilo que eu tinha visto no curso que eu tinha feito em Jundiaí de palhaços. E eu me encantei, eu falei: “Opa, isso é legal, eu me sinto à vontade, eu gostei”, e aí, eu comecei a estudar mais, me aprofundar mais sobre isso e desde então, eu venho estudando palhaços até hoje, já faz dez anos que eu estudo palhaço. Então, eu sou um professor palhaço (risos).
P/2 – E você tem alguma vivência assim pra contar pra gente dessa…
R – Como palhaço?
P/1 – Como palhaço.
R – Tenho. Tenho três relatos bem fortes, assim, pra mim, que foi quando eu comecei a gerenciar a parte de lazer de um hotel e eu contratei uma trupe de circo pra fazer a temporada de férias. E lá, com certeza, tinham alguns palhaços e esses palhaços dividiam o nosso alojamento. Então, as noites eram noites intermináveis porque eu ficava conversando com esses artistas o tempo todo e eles me davam feedbacks, me ensinavam truques, técnicas e foi muito legal esse tempo. Então, tanto que na temporada seguinte, nas férias seguintes, eu contratei esse pessoal de novo que foi muito gostoso e deu tudo errado, o circo, literalmente, pegou fogo, os artistas não eram os mesmos, aí foi um pessoal que se achava superior aos demais, porque a minha equipe era equipe de lazer, a equipe deles era equipe de artistas, então, eles dividiam, foi totalmente diferente a primeira experiência. E aí, em uma das apresentações, eles foram fazer um número mais ousado, onde usavam pirofagia, que e a manipulação de fogo e um dos meninos lá dos palhaços, ele foi cuspir fogo e tinha que acabar o número naquela hora e ele se empolgou e cuspiu mais, cuspiu contra o vento, voltou no rosto dele e aí, foi um bafafá todo e o hotel tava lotado, todo mundo assistindo, aí eu tive que apagar o incêndio todo, né? Consequentemente, eles foram embora e a gente tava na metade do mês, eu tinha pelo mais 15 dias de atração de circo e o meu hospede, ele não tinha culpa, só que eu não tinha como trazer um novo circo amanhã, por exemplo, assim, eu tinha pouco tempo, era coisa de três, quatro dias. E eu não tinha orçamento, eu não tinha tempo, falei: “Meu Deus, o quê que eu vou fazer?”, eu cheguei para a minha equipe, conversei com eles e falei: “Gente, os caras foram embora, a gente fica, é a nossa popularidade que tá em jogo. Nosso hotel é conhecido como um dos principais hotéis para o habito de lazer, a gente não pode manchar a nossa imagem, o quê que a gente vai fazer? Tem que ter circo”, foi quando eu peguei todo o conhecimento que eu tinha adquirido com os cursos que eu fui fazendo, com as rodas de conversa que eu tive, com a vivência que eu tive com os palhaços da outra temporada e convenci os dois meninos a aprenderem um pouco mais sobre palhaços. Então foram três noites que ao terminar o trabalho, juntava eles e começava a ensinar tudo aquilo que eu tinha. Eu achei que foi muito arriscado, mas eu montei um número de um show de palhaços e eram três palhaços em cena: eu e aqueles dois recreadores que naquele momento, estavam estreando como palhaços. Eu já tinha tido umas experiências anteriores, mas também não achava que era o suficiente para me apresentar como artista num grau de responsabilidade como esse. Os meninos estavam nervosos, tudo, eu acalmei todo mundo e falei: “Vamos lá, a gente vai conseguir e vai ser legal”, eu lembro que a última orientação que eu dei para eles foi: “Divirtam-se, se vocês se divertirem, o publico vai se divertir também”. E foi uma delicia fazer o show, foi um show maravilhoso, assim, deu tudo certo o que a gente combinou e a galera gostou, que tava assistindo, a avaliação foi extremamente positiva e dali em diante, eu tive coragem, confiança e falei: “Acho que isso dá pra levar mais a fundo e profissionalizar um pouco mais”. Então, dali, eu tive confiança para poder, realmente, levar a ideia à frente, e surgiram mais dois palhaços que também estão fazendo palhaço até hoje comigo. Então, dali foi se formando uma situação. A outra história que envolve os palhaços foi que eu fui… por conta em trabalho em hotéis, eu viajo muito, aprendi a viajar muito e isso foi uma outra paixão. Então, eu comecei a mochilar, fazer passeios… viagem de mochila nas costas e cai no mundo. E em uma das minhas aventuras de mochila foi pera Europa em 2012 e eu conheci muita gente, muito artista de rua, principalmente, e fui fazendo intercâmbio de informações artísticas fantástico. Eu aprendi muita coisa e uma das minhas paradas foi em Londres bem na época dos Jogos Olímpicos. Eu dei Educação Física, tive um professor medalhista olímpico, sou apaixonado por Jogos Olímpicos também, então, juntou uma coisa com a outra, falei: “Vou pra Londres”, só que quando eu vi aquele cenário olímpico montado, eu tava com o meu equipamento de palhaço: maquiagem, figurino, eu falei: ‘Eu tenho que fazer umas fotos aqui, isso pro meu acervo, vai ser fantástico”. E aí, eu comecei a fazer umas fotos, eu fiz uns amigos lá que me ajudaram e um pessoal me viu. Eu não falo inglês, então minha comunicação era só através de expressão de olhar, gestos e as minhas rodas de pessoas me vendo era cada vez maiores, assim, e eu parei na frente do Palácio de Buckingham e lá estava um monte de gente, muitas pessoas na frente do palácio, porque tinha a troca da guarda real e aquilo é um evento que acontece todo dia. E na frente do palácio tem um monumento, aí eu tô lá de palhaço, eu entro no monumento e começo a brincar com as crianças que ali estavam. E eu só tinha um apito, eu colocava as crianças em cima do monumento e começava a brincar, eu subia no monumento, parecia que eu ia cair. De repente, os pais começaram a olhar, todo mundo começou a olhar, deu que eu comecei a brincar tanto naquele monumento com as crianças, que todo mundo começou a olhar pra mim, aconteceu a troca da guarda real, e ninguém viu a troca da guarda real porque ficaram olhando pra mim, aí quando todo mundo olhou: “Ué, cadê a troca da guarda? Não teve” “Teve, aconteceu”, e aí, minha amiga até falou: “Meu, você tem noção do que você fez?”, eu falei: “Não” “Você acabou de quebrar mais um evento” “Como assim?” ‘Você quebrou a troca da guarda real, todo mundo tava querendo ver a troca… só amanhã pra ver esse negócio de novo”, eu falei: “Ah, paciência, né?”, aí um rapaz que era do comitê olímpico tava passando e me viu fazendo isso. E ele conversando comigo em inglês, eu não sabia, minha amiga traduziu pra mim, ele falou: “Eu não posso te dar dinheiro, mas eu gostei do que você tá fazendo, vamos combinar uma coisa? Eu tenho alguns pontos de concentração de turistas que não podem ficar ociosos, que é pessoal em fila, ponto de espera. Seria legal se você fizesse alguma coisa nesses pontos. Em contrapartida, eu te consigo alguns ingressos”. Eu tava de mochileiro, mochileiro não tem dinheiro, eu tava ali só pra ver, achei perfeito a contrapartida e fiz. Aí, eu fiz alguns momentos numas praças, onde eu integrei alguns chineses com alemães e aí, consegui alguns ingressos pra ver algumas partidas, aí eu vi Brasil e Bielorrússia no futebol, eu assisti natação, vi judô, que inclusive, foi a primeira medalha olímpica do judô feminino, eu consegui ver, então foi bem legal, assim. E o terceiro ponto da história como palhaço foi quando eu formei minha dupla com o Paçoca. O Paçoca foi professor da universidade que eu estudei, ele é um cara extremamente conceituado na área do lazer, ele é autor acho que de 12 livros hoje, ele é um cara extremamente conhecido. E ele tem formação de palhaço. E esse cara, ele me levou para lecionar na universidade na cadeira de Recreação e Lazer também. Então, eu era substituto dele. Acabou que a gente saiu da universidade e aí, o Paçoca olhou pra mim, falou: “Vamos começar fazer a vida? Vamos ganhar dinheiro?”, eu falei: “Vamos, né?” “Com o seu repertorio e o meu, a gente consegue fazer uma coisa legal”, aí a gente formou uma dupla de palhaços e o nosso principal ponto de atuação era escolas porque nós somos professores, então, a gente conhecia escolas, fazia uma proposta de um show pedagógico bem trabalhado, ele também tem formação, ele trabalhou muito tempo em hotel, em hospital como palhaço também e aí, a gente começou a estruturar um show e foi um show bem arrumadinho, bem bacana, gostoso de assistir. Só que eu fui pegando a experiência que eu fui adquirindo nas viagens, nos cursos e eu comecei a ver que aquilo tava ficando pequeno demais. Aí, eu falei: “Paçoca, eu quero aumentar isso, cara, só nos dois, a gente não vai chegar tão longe”. Aí, conheci um menino chamado Heitor que ele foi trabalhar comigo num hotel e me viu fazendo palhaço, ele falou: “Cara, eu quero fazer isso, me ensina. Eu quero fazer palhaço” “Você quer mesmo?” ‘Quero” “Eu te ensino”, ensinei ele e aí formou um trio, aí ficou: Shing, Paçoca e o Bolinha. E foi pegando forma, aí eu resgatei o palhaço que eu ensinei pela primeira vez que foi o Fill, naquela vez que o circo pegou fogo. Aí, eu trouxe ele, aí já ficamos com quatro. Aí, na escola que eu trabalhava tinha um professor de dança muito bom, que ele tinha uma expressão corporal fantástica e ele também se interessou, virou o palhaço Gigante também, aí começou que vira uma palhaçada, tem muito palhaço hoje e aí, hoje, nós somos uma companhia atuante que trabalha com arte clownesca e nós somos em nove palhaços, todos formados… exceto um, tirando o Paçoca e um que é o Rafa, praticamente, todos formados por mim (risos) e a gente hoje tá firme e forte, a gente atendeu… se apresentou em alguns teatros grandes do interior de São Paulo, na própria São Paulo, gravamos DVD, participamos de grandes festivais como Risadaria, Satirianas, Festival da Comédia, enfim, a gente hoje vem trilhando uma… hoje eu tenho uma carreira paralela de professor com artista por conta do palhaço do circo.
P/2 – Qual é o nome da companhia?
R – Entretenimento SP, Entretenimento Shing Paçoca (risos). Hoje a gente tem mais um sócio que é o Alípio, que também é palhaço, mas como o nome já tá estipulado, pessoal já conhece, então, a gente manteve só Shing Paçoca, mas o Alípio também é sócio e a companhia não é só de nós, não é só nossa, ela é composta por todos, toso mundo lá tem vez ativa, toso mundo palpita. Eu que dirijo a maioria dos espetáculos, eu que escrevo, eu que ensaio, mas toso mundo tem voz ativa no nosso trabalho, lá. É bem legal.
P/2 – Você chegou a estudar teatro antes de tudo isso?
R – Na época do SESC, do basquete, do Tribo Urbana, eu acabei fazendo um pouco de teatro lá, também, por influência de alguns amigos que eu conheci por lá e era um pessoal legal, aí me convidaram pra fazer. Mas só nessa época mesmo, foi coisa de seis meses, ano mais, tanto que na apresentação de encerramento, eu nem participei. Mas somente o meu contato com teatro foi só aí.
P/1 – E lá teve alguma ligação já com o palhaço, com o circo, ou não?
R – Naquela época?
P/1 – É.
R – Sim. Eu conheci uma menina chamada Catarina… Catarina? Não me recordo o nome dela, agora. Mas ela já estudava teatro fora do SESC também e ela comentou que o professor de teatro dela pediu pra assistir uns filmes que se remetia ao teatro, mas que tinha uma característica muito forte com a comédia e com o palhaço. E eu gosto muito de filme e ela me indicou e eu fui assistir e se tratava do filme “Tempos Modernos”, do Charlie Chaplin. E eu olhei aquele filme e eu fiquei encantado, eu dou risada até hoje, se eu assistir. Hoje, eu tenho a coleção inteira de todos os filmes do Charlie Chaplin e naquela época, me fez muito sentido e aí, eu fui buscar depois outros filmes e me indicaram um filme chamado “O Circo”, também do Charlie Chaplin. E no circo, ele é muito mais caricato e então, dali foi… eu posso dizer que foi o meu primeiro contato com a palhaçaria, foi ali, porque um ano depois foi quando eu comecei a fazer faculdade e chegou nesse episódio do curso que eu conheci o rapaz que me indicou o estudo do palhaço. Mas daí que tudo, praticamente, começou. Eu só não fazia ideia, tinha noção que tudo isso estaria interligado, mas hoje, fazendo um recalculo de tempo, foi dali que tudo começou a minha história com palhaço, com Charlie Chaplin, mas eu ainda perguntei: “Mas ele não tem um nariz vermelho, nada a ver, ele não usa roupa de palhaço”, aí ela me explicou que segundo os estudos que ela tinha, ali ele não era uma figura palhaço, mas a expressão dele se tratava da mesmo impressão que os palhaços tinham e aí, foi um norte para começar os meus estudos também, depois.
P/1 – O quê que você poderia contar pra gente sobre o palhaço Shing? As características que são mais marcantes dele.
R – (risos) Palhaço Shing… o palhaço Shing é muito sonhador, assim, porque como a gente tá na figura do palhaço, diferente do ator, ali sou eu, não é um personagem. Então, o ator empresta as características dele para um personagem, se eu for fazer uma peça de teatro, e vou ser o Robin Hood e amanhã , por ventura, eu ter que viajar e não comparecer na peça, eles vão ter um outro ator que vai ser o Robin Hood. O palhaço, não. O palhaço sou eu, se eu não estou presente naquela apresentação, vai ter outro palhaço, ninguém vai poder colocar o meu figurino e falar como eu falo, porque eles não têm a mesma sensibilidade que eu tenho, são sensibilidades distintas. Então, o palhaço é um ser e o palhaço Shing sou eu dentro do meu estado mais libertador, porque ali naquela hora é a hora que eu falo o que eu quero, eu expresso o que eu sinto, eu não tenho vergonha de ser quem eu sou. E o que acontece com as pessoas normalmente? A gente esconde as nossas maiores fraquezas, né, a gente tem vergonha e quando a gente tá nesse estado de palhaço, eu não tenho essa vergonha, eu exponho. Se eu tenho uma dificuldade para leitura, vou dar um exemplo melhor, a gente pega uma grande turma numa sala de aula, aí você tem um amigo que tem dificuldade de falar em público, ele vai ter que apresentar o trabalho, ele vai gaguejar, ele vai ficar nervoso e a gente, no fundo, vai dar risada do cara. O palhaço é exatamente isso, eu busco minha fragilidade e exponho ela. Então se eu tenho medo de falar em público, eu vou mostrar que eu estou com medo de falar em público, eu não vou negar esse medo, isso vai ser engraçado ou pode gerar o espanto, também, né? O palhaço não necessariamente tem que ser engraçado. Então, o palhaço Shing é muito verdadeiro. Quando eu estou nesse estado, eu consigo, realmente, ser o que eu sou, o que eu gosto de ser e entra em paralelo com aquilo que eu falei da escola, das mascaras, porque se eu estou em estado de palhaço, eu posso falar o que eu penso, porque eu sou somente um palhaço, né? A diferença de um personagem. Quando você pega duplas emblemáticas de palhaços, algumas duplas são personagens, são mais comerciais, né, que vira até fantasia, vira brinquedo, então é bem diferente. Então, o palhaço Shing é um palhaço que não se nega, ele sempre tá se entregando.
P/1 – Então, hoje você tá trabalhando com palhaçaria, com Educação Física…
R – Eu sou professor de Educação Física atuante, sou palhaço atuante e comecei a estudar há m tempo atrás, agora, graduação em História por conta que eu sempre gostei muito de História por conta da época da escola e esse acervo cultural histórico, principalmente, que o palhaço e o circo trazem, os jogos olímpicos trazem, são coisas que sempre me encantaram e está muito inserido no meu dia a dia. Me atrevi até dar aula de História na ausência de professores colegas na escola onde eu trabalho, que eu trabalhei, na verdade. Então, eu já tenho a facilidade de me comunicar com as pessoas, então a História… hoje, ela faz parte também muito do que eu sou e do que eu faço, então, hoje também eu estou me graduando em História, daqui a seis meses eu serei um historiador, também.
P/1 – E quais são as perspectivas assim, para essa graduação em História…
R – Eu não posso afirmar, assim como eu pensava que eu ia ser professor de Educação Física para trabalhar com o basquete, hoje, o basquete é minha quarta opção, mas eu acredito que será envolvido com a parte da palhaçaria, do circo e dos jogos olímpicos, mas eu já tô pegando uma familiaridade, um gosto muito grande por Segunda Guerra, por História do Brasil, então eu já tô vendo que alguma coisa vai mudar lá na frente, vamos esperar pra ver.
P/1 – Como que você junta tudo isso?
R – Numa grande salada (risos), posso dizer que se juntar tudo isso é uma grande salada, porque eu estudo muita coisa diferente e eu faço muita coisa diferente, mas eu sou muito feliz fazendo tudo isso que é diferente, né? Se for explicar como que eu junto, eu posso dizer que a Educação, o fato de educar é o que une todas essas funções que eu tenho, essas diversidades que eu possuo, porque hoje, a minha relação com a Educação, ela é muito grande em tudo que eu faço: desenvolvimento de caráter, os valores que eu mesmo absorvi com o esporte, com o acervo cultural histórico, com o convívio social, com o convívio cultural, então a Educação para mim, eu falo que é o que me liga a tudo isso, principalmente.
P/1 – E os seus planos para o futuro?
R – Meus planos? Bom, eu tô noivo (risos), vou casar, a minha noiva, por sinal, a conheci lá atrás quando eu tinha sete anos, a gente se reencontrou agora, 20 anos depois, a gente fazia natação junto, ela também é da Bela Vista, por sinal, a gente nunca se cruzou, foi se cruzar depois de 20 anos, mas eu vou me casar. Eu não tenho planos ousados, assim, acho que os principais planos são manter aquilo que eu já tenho de forma sadia, o que é bem difícil, porque exige bastante dedicação e me aprofundar cada vez mais, quem sabe, nas coisas que eu já faço ou aumentar o campo de atuação também. Hoje eu já não tenho mais tanto pique pra viajar o quanto eu viajava nos trabalhos antigos que eu fazia, então, também já esta mudando a história de novo. Mas os planos são principalmente me manter saudável nas coisas que eu faço e coeso, também.
P/1 – Você falou bastante só SESC na sua entrevista, assim…
R – Sim.
P/1 – Você acha… o quê que você poderia dizer da relação da sua vida toda com o SESC aqui? Que relação você faria do SESC com a sua vida, com as suas escolhas de uma maneira resumida?
R – O SESC? Posso dizer que a relação de descoberta, uma relação de gratidão, de amor, uma relação de carinho profundo pelas pessoas, pelos momentos, uma relação de vida, posso dizer que a minha vida tá relacionada ao SESC, tudo que eu faço hoje também… o SESC contribui até hoje, eu até me apresentei já em uma unidade do SESC, eu pratico até hoje as atividades que o SESC proporciona, quem sabe no futuro, eu possa trabalhar no SESC também como professor… mas o SESC tem uma relação muito profunda comigo de vida, de vida assim, tudo começou a se desenvolver no SESC, principalmente, até relação com familiares, com os amigos, relação profissional, descoberta, é muito profunda a minha relação com o SESC.
P/1 – Você se apresentou num SESC? Conta pra gente, como foi?
R – Me apresentei no SESC Bom Retiro, na apresentação do programa Dia do Desafio, eu fui com o Paçoca e a gente fez uma encenação cômica de como seria um palhaço sedentário e eu, como treinador, eu tinha que treinar o palhaço sedentário e foi muito legal, assim, foi bem… muito divertido, porque o Paçoca é gordo e grande, é bem cônico assim, então você olha pra ele e fala: “Nossa, que palhaço estranho, diferente”, então, o contraponto foi bem legal e casou muito bem com a temática do Dia do Desafio. Então foi bem legal. A gente apresentou esse trabalho para os coordenadores, diretores do projeto Dia do Desafio que aconteceu lá no SESC Bom Retiro.
P/1 – E você ainda frequenta as aulas de esporte?
R – Frequento. Hoje não tem mais a mesma intensidade como era antigamente, mas eu frequento por questão, primeiro de gostar muito e de respeito. Até hoje, tem a molecadinha que chega lá, hoje é mais molecadinha,. mas eles olham pra gente assim, tanto eu quanto os meninos que eu menciono aqui praticam também, frequentam. E hoje a gente é uma referência para eles, é um exemplo, assim, é bem legal. Então, é a forma que eu tenho de agradecer a tudo isso também, é estar sempre participando e contribuindo para alguma coisa, nem que for contribuição com a minha participação.
P/1 – Esses amigos, então, parece que vocês formaram uma grande…
R – Família.
P/1 – E eles estão aí até hoje?
R – Estão até hoje. Tem o Leandro que é meu amigo há 20 e tantos anos, a gente se conheceu na escola, tem o Felipe também que é da época do outro clube, lá da ACM que depois, migrou para o SESC comigo, a gente tá junto até hoje. Eles são… acho que posso dizer que são as pessoas mais especiais assim, pra mim, também, que tudo se passou do lado deles, todas as descobertas. Eles tiveram presentes nos meus melhores momentos, nos piores momentos, estão me apoiando até hoje em tudo que eu vou fazer. A gente tem uma relação muito saudável, ainda, de criança mesmo com o outro, a gente compartilha os problemas, a gente compartilha as emoções, a gente compartilha as alegrias. Hoje a gente tá numa fase diferente, que cada um tá construindo a sua vida, mas a gente constrói a nossa vida junto, então, é muito comum, eu vejo assim, até com outros amigos que eu guardo com muito carinho também, mas que você se distância depois que a vida começa a direcionar, né? mas a nossa não, nós somos um trio que a gente permanece junto até hoje. Desde criancinha até hoje, 30 anos já.
P/1 – Vocês continuam se encontrando?
R – Todos os dias a gente se fala, a gente se vê, a gente se cobra… é família mesmo, eu tenho mais contato com eles do que com os meus próprios familiares, mesmo. E é muito legal ter eles por perto, assim, sempre.
P/2 – O quê que você achou de nos contar a sua história?
R – Surpreendente (risos), lembrei de coisas que eu não lembrava mais, achei que eu não ia me emocionar com algumas coisas que eu falo, não é novidade pra mim, contar essas histórias, mas geralmente, eu conto muito para os meus alunos as minhas histórias e eu acho que pelo ambiente, pela circunstância, mexeu mais, foi diferente.
P/2 – Obrigada.
R – De nada. Eu que agradeço.
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