P - Sayonara, para gente começar eu queria que você falasse seu nome completo, a cidade e a data de nascimento. R - Eu sou Sayonara Maria Silva do Nascimento. Nasci no Rio de Janeiro, na cidade de Registro, sou carioca e nasci no dia 17 de junho de 1963. P - Qual o nome de seus pais? R - José ...Continuar leitura
P - Sayonara, para gente começar eu queria que você falasse seu nome completo, a cidade e a data de nascimento.
R - Eu sou Sayonara Maria Silva do Nascimento. Nasci no Rio de Janeiro, na cidade de Registro, sou carioca e nasci no dia 17 de junho de 1963.
P - Qual o nome de seus pais?
R - José Antonio da Silva, meu pai, e minha mãe Sidelma Veloso da Silva.
P - E você tem irmãos?
R - Tenho um irmão, Marcelo.
P - Ele mora lá em Registro?
R - Não, todos nós moramos aqui no Rio, eu só trabalho lá em Duque de Caxias, eu moro no Rio.
P - O que seus pais fazem?
R - Meu pai sempre foi revisor gráfico, sempre trabalhou em gráfica, sempre fez a correção de livros, livros que são editados. Minha mãe pouco, quando nova trabalhava, mas depois não, depois que veio os filhos ela se dedicou mais a casa.
P - E qual o bairro que você mora?
R - Eu moro em Tomás Coelho.
P - Você mora lá desde pequena?
R - Não, mas já fui para lá com dez anos, sempre morei no Rio, um bairro próximo, antes disso eu mudava muito, mas depois não, já tem 35 anos que eu estou no bairro, que aí eu fui para lá com dez anos, passou um tempo, logo depois eu me casei, fui morar, continuei morando no mesmo bairro. E também mudei de um lugar pro outro, mas lá mesmo, de um
apartamento para uma casa, mas eu continuo morando no bairro.
P - Queria que você contasse um pouco sobre sua infância, onde você morou, até ou antes dos dez anos ou depois, seus pais, como que era?
R - Sempre morei com meus pais,
e quando eu já tinha oito anos aí nasceu meu irmão, temporão, aí ajudei minha mãe, desde nova eu sempre fui muito responsável, muito quietinha e já ajudei a minha mãe a tomar conta dele, sempre fui muito estudiosa. Acho que nunca dei muito trabalho à minha mãe não, e aí foi passando o tempo, minha mãe costurava um pouquinho em casa, para ajudar com as contas de casa e aí eu sempre fiquei com a responsabilidade do meu irmão. E me formei, sempre quis ser professora, isso já foi uma determinação minha desde criancinha, tinha as brincadeiras, sempre fui de escola, de bonecas, e com as bonecas sempre dando aula, isso já foi meu foco principal.
P - Me conta uma coisa, como que era sua casa quando você era pequena?
R - Olha, até ou mais de oito anos nós tínhamos uma vida mais difícil, aí quando meu irmão nasceu ainda passou um pouquinho, mas depois aos dez anos a gente já foi para uma casa própria, um apartamento próprio, aí meu pai já teve condição, já foi melhor, daí a própria vida foi melhorando, ele já foi ficando melhor, ele já teve como ter um carro. Quer dizer, o meu irmão já teve uma vida muito mais fácil, do que a minha, por conta da situação que foi melhorando mesmo, mas eu não tive, tantas dificuldades não, só que sempre estudei em escolas públicas. Aí só mesmo quando eu fui à faculdade que aí eu já fui estudar na faculdade particular porque eu não consegui fazer um pré-vestibular e não consegui passar para uma faculdade pública.
P - Como era sua casa própria? Quando vocês mudaram, quando seu irmão nasceu, sua mãe ficava em casa? Seu pai ia trabalhar? Como que era o dia-a-dia?
R - A minha mãe costurava um pouco para ajudar, e eu tomava conta dele, do meu irmão pequeno. Eu ia para escola e ela ficava com ele, logo depois eu voltava e ajudava em tudo, e já ajudava nas tarefas de cozinha, da própria casa, de cuidar da casa, isso tudo eu já assumia bem para minha mãe poder costurar e também nos ajudar, e também poder dar um conforto melhor para gente. E já nesse apartamento, era um apartamento novinho, foi um prédio construído recente, foi construído, foi a primeira locação, então já era uma coisa que a gente ficou muito melhor do que antes, era um apartamento sempre alugado, uns melhores, outros não tanto, uns bairros melhores outros não. Esse era um bairro razoável, um bairro na zona norte do Rio de Janeiro, mas não é, vamos dizer assim, tão distante, um bairro que fica mais ou menos 40 minutos do centro da cidade, em frente onde tem
o metrô, então um local razoável. O apartamento em si é muito bom, onde meu pai e minha mãe vivem até hoje, até hoje eles moram nesse apartamento, então foi bom esse período, que a gente foi com esse apartamento.
P - E como é que foi você mudando para lá? Você já começou a fazer amiguinhos por perto, lembra de algumas brincadeiras?
R - Eu nunca fui muito de brincar em rua, mas o que eu me lembro que eu brincava era pique-bandeira, que era muito queimado, como é um condomínio, então as ruas passam carros, o condomínio fechado, os carros no estacionamento, então dá para brincar na rua, hoje até que não porque tem muitos carros, mas na minha época já era, há 35 anos atrás, então dava bem para brincar. Eu fui logo para escola pública próxima, então com isso eu fiz as amizades, e as amizades eram também do mesmo condomínio, a maioria, então tinha como brincar. Sempre me entrosei bem, nunca tive muito problema de relacionamento, não.
P - E você brincava com eles de dar aula?
R - É, eu brincava muito com as bonecas porque por eu ter sido muito tempo filha única eu brincava sozinha bem, eu quase não ia para rua, esse período que eu já fui para rua já foi mais na adolescência, eu já mesmo, quando eu atingi meus 12, 13 anos, eu já estava no segundo segmento,
ensino fundamental, o antigo ginásio, aí sim que eu passei a brincar na rua. Então essas brincadeiras de bonecas era eu sozinha com as bonecas, agora já com as meninas não, aí já estava mesmo ensaiando os namoros, já não era a mesma brincadeira de boneca.
P - E lá na sua casa, com a sua mãe, a sua mãe costurava dentro de casa?
R - Costurava, costurava e ainda ajudava ela, tinha algumas coisas que eu fazia, que eu não gostava, por exemplo, era as costuras, os panos, as linhas que ficavam no chão sempre sobravam para eu catar, e claro, a gente nunca gosta dessas tarefas, mas eu fazia. E eu tive que ajudar também na parte de arrumação de cozinha, de casa, então eu tinha que ajudar para ela poder costurar, apesar que eu chorava muito. Mas tinha o lado bom, quando tinha alguma roupa da moda, do momento, ela às vezes fazia para mim aquela roupa em um dia, eu me lembro uma época uma roupa cigana que estava muito em evidência, tinha uma festinha de 15 anos, eu queria e ela na sexta-feira, entrou, pegou a roupa, pegou o tecido, aquele tecido florido e fazia. E muitas vezes também as pessoas que faziam as costuras, que levava os tecidos, sobravam tecidos, e elas diziam:
“Ah, pode ficar, faz uma roupinha para sua filha ou pro seu filho.” E aí eu gostava porque sobrava para mim, menina é até mais fácil para fazer roupas,
sempre magrinha, fazia com qualquer pedaço de tecido.
P - A sua mãe, ela também fazia comida em casa?
R - Fazia, ela sempre costurou, costurava e fazia comida,
isso o principal era
com ela mesma, e eu fazia as tarefas que dentro da minha idade eram
possíveis de fazer, que eu estudava também, mas eu levava o meu irmão na escola, isso o que eu podia eu ajudava, mas ela que fazia mesmo o pesado.
P - E você lembra quando você começou a estudar, ir para escola?
R - Olha, eu lembro pouco, como eu mudei muito de bairro até a idade de dez anos talvez eu não tenha me firmado tanto, porque daí sim nesse outro bairro eu fiquei tanto tempo, então eu me lembro de tudo. Eu estudava em escolinhas, passava, ficava um pouco em casas alugadas, às vezes seis meses só naquela casa, e aí mudávamos, íamos para outro bairro. Então não criava muito vínculo não, mas estudei, estudei sempre o quanto pude em escolinhas particulares, pequenas. Logo depois que eu atingi a idade, escola pública mesmo, aí foi só escola pública, aí foram várias, passava de uma para outra, às vezes mudava no meio do ano, aquela época que fazia prova, e uma das escolas que eu lembro bem até foi uma escola Paraná. Na época tinha patrulha escolar de segurança, a gente levava um rótulo aqui do lado, um tecidozinho, e isso marcou, até porque a gente prestava muito, aquilo foi uma eleição, aquilo era importante, estar com aquele tecido aqui do lado,
com as letras, uma coisa que todos queriam,
e aquilo foi uma eleição. Eu gostava e sempre por ser a melhor aluna sempre acabava recebendo essas homenagens dos próprios alunos, dos próprios colegas,
P - O que era essa patrulha?
R - Era a patrulha escolar da segurança, então a gente tinha determinado horário, a gente ia pro sinal em frente à escola, ajudava os outros colegas, ficava Como se fosse um policial,
municipal, e eu ficava naquele momento na escola, ajudava as pessoas a atravessar, ajudava as pessoas idosas, tinha um momento para cada um, um momento cívico mesmo, fazia parte na hora que fazia o hasteamento da bandeira, cantava o hino. Então sempre tinha aquele destaque para esse grupo, era um grupo grande na escola, foram escolhidos alguns de algumas salas e tinha esse revezamento para fazer esse trabalho importante, né?
P - Qual que era essa escola?
R - Era Escola Municipal Paraná, isso foi antes mesmo de eu me mudar de bairro, foi em Cascadura ainda, quando eu morava em bairro próximo. Uma coisa que tenha me frustrado um pouco, no meio desse ano que eu estava fazendo esse trabalho eu tive, foi quando eu mudei para esse bairro,
Tomás Coelho, tive que ir para outra escola, mas não, vamos dizer assim, tenha me atingido, fiquei, claro, chateada porque perdi, isso era uma outra escola, isso era uma coisa toda da prefeitura do Rio, todas escolas trabalhavam assim, só que lá eu tinha o grupo escolhido.
E aí eu perdi o meu cargo.
P - Tomás Coelho foi uma escola que você ficou um pouco mais de tempo?
R - Tomás Coelho é o bairro,
a escola era Escola Municipal Maestro Pixinguinha, escola bem próxima, essa escola eu estudei aí desde essa idade até a oitava-série, até terminar, na época, o ginásio.
P - E como que era a escola, como que foi mudar para ela?
R - Me adaptei bem, como eu falei, por causa das crianças, dos alunos que eram todos do mesmo condomínio, então, como era um condomínio novo, muitos alunos também estavam entrando novos na escola, então também foi adaptação para todos. E aí eu sempre fui tímida, mas eu fazia amizade fácil, então eu acabava chegando próxima a uma coleguinha, sempre fazendo amizade, até o final do ano eu já tinha feito amizade com todos, e aí foi a mesma turma até a oitava-série, aí seguiu esse ritmo porque eram os mesmos alunos e foi seguindo as turmas no mesmo turno.
P - E como que era a escola Pixinguinha, você lembra?
R - Bem o modelo padrão daqui da Prefeitura do Rio, de prédios, tinha um auditório lá em cima e lá nós tínhamos merenda, não tinha nada marcante, tinha as atividades, tinham festas, festas de folclore, uma escola boa, tranqüila para se estudar, a minha turma eu gostava bem, me entrosava bem, os alunos faziam trabalhos de grupos.
P - Você lembra de alguma coisa que você gostava mais na escola ou no intervalo, na aula?
R - Acho que eu gostava muito era das festas,
principalmente que marcava muito, era as festas do folclore, isso me marcava muito, só que embora eu tivesse facilidade de amizade eu não tinha facilidade de danças, eu gostava, eu admirava, mas eu tinha sempre muita vergonha de me expor. Então eu admirava as meninas que faziam aquelas danças e que se destacavam, sempre fazia parte do grupo que fazia tudo igual, ficava lá atrás e não se destacava, e tinha aquelas pessoas, aquelas meninas ou rapazes que já destacavam,
porque eles desenvolviam uma outra dança num determinado momento, e aí eu até invejava aquele momento, aquelas alunas, mas eu não tinha, eu gostava e admirava, mas não queria estar dentre elas.
P - Você tinha algum professor que tinha uma referência, que você mais gostava?
R - Isso eu não me lembro, uma professora que marcou muito a minha vida foi ainda lá naquela escola Paraná, que eu comentei lá em Cascadura, uma professora chamada Íria, e sinceramente eu já procurei, já tentei ver se eu a encontro, não sei se estaria viva, mas ela era novinha na época. E uma coisa que quando o meu irmão nasceu, como eu falei, eu tinha oito anos, então ainda não morava lá em Tomás Coelho porque eu fui para lá com dez. Ela, a minha mãe não podia me levar, eu tinha oito anos ela tinha que me levar à escola, e essa professora passava todos os dias de carro na porta do meu apartamento, na época e me levava para escola, então me afeiçoei muito à ela, porque é muito, vamos dizer assim, bom chegar no carro da professora na escola,
então aquilo não era para
todos. E eu gostava dessa situação então durante aquele ano todo, o meu irmão nasceu em Setembro, então até o final do ano eu ia com a professora, ia e voltava, ela me levava e me trazia, então essa professora eu me afeiçoei mais, eu me lembro dela até hoje, de tudo. Aí os outros professores, tive carinho sim, a professora chamada Denise já nessa escola Pixinguinha, porque ela acompanhou a gente, em Ciências que era uma disciplina que eu gostava muito, era uma professora muito dinâmica mas não me afeiçoei tanto quanto essa daí.
P - E como que era na hora do intervalo lá na escola do Pixinguinha, era muita bagunça?
R - Uma escola de adolescente, e já o horário que eu estudava tinha vários turnos, o horário que eu estudava já era o horário dos adolescentes, então já tinha aquelas paquerinhas, aquelas coisas, mas nada de mais até porque era muito rígida, a escola alguns anos atrás era muito mais rígida do que ela é hoje. Nós tínhamos a merenda, íamos lá, não era almoço, era só lanche e não tinha nada que chamasse a atenção, que fosse diferente não.
P - O que era essa merenda, o que vocês tinham o costume de comer?
R - O que tinha muito, eles davam um todinho, feito um nescauzinho com chocolate, um biscoitinho com queijo, pão com salsicha eram coisas que davam muito, era mais essas coisas, não tinha assim comida não, pelo menos no nosso horário, talvez porque o nosso horário era o finalzinho, era o último horário.
P - Você gostava de ir para escola?
R - Sempre gostei, a escola sempre foi, acho que normalmente quando eu pensei em ser professora, eu nunca trabalhei em outra coisa sem ser escola, então adorava.
P - Como que era o uniforme lá do Pixinguinha?
R - É, está aí uma história engraçada, a gente quando estudava naquela época, da primeira à quarta-série o uniforme era uma saia toda de preguinhas e uma blusinha de tergal com o escrito EP, Escola Pública, e quando ia de quinta a oitava que já era o ginásio, mudava o uniforme, a saia passava a ter dois machos, duas pregas macho, duas na frente e duas atrás, e a blusa ela já tinha um outro símbolo, não era mais o EP, era outro símbolo que era o símbolo do Brasão da cidade do Rio. E aí diferenciava, as pessoas na rua já sabiam, aquela ali não é do primário, aquela é do ginásio. Exatamente no ano que eu passei para a quinta-série, foi quando houve a junção, juntou tudo, modificou e passou a ser então o antigo primeiro grau, que junta tudo de primeira a oitava-série, não tem mais divisão. E aí e o resultado, o uniforme passou a ser tudo igual, eu me lembro que eu fiquei muito frustrada com isso porque andava já na rua, eu era sempre muito franzina, eu era magrinha. O meu uniforme até a oitava-série era já com a sainha de duas pregas e a blusinha de tergal, depois passou a ser de malha, foi modificando.
P - E depois da oitava você foi para onde?
R - Depois da oitava eu estudei numa escola particular. Era uma escola que ela conseguia, dava muitas bolsas de estudo, e o meu pai através do trabalho dele conseguiu uma bolsa de estudos, já fui fazer o Curso Normal. Aí já o uniforme era do Normal, era um uniforme que eu tinha muito orgulho,
porque todas as segundas-feiras, a gente tinha que ir com a blusa de manga comprida, que tinha uma gravatinha e a blusinha de prega e aquela blusinha com cinto,
uma coisa bem tradicional, ainda que no Rio, no Instituto de Educação ainda tem o seu uniforme, e era o uniforme mesmo tradicional.
P - E como que era essa escola?
R - Foi uma escola que eu me identifiquei muito, tanto é que logo depois eu arrumei emprego nela e fiquei trabalhando lá por oito anos, lá mesmo nessa escola. É uma escola muito grande,
existe até hoje, ela tinha uma tradição no Ensino Normal com professores excelentes, pessoas que tanto trabalhavam no Instituto de Educação, que era uma escola tradicional do Normal aqui no Rio e trabalhavam lá também. Então era o mesmo ensino, era muito boa, ela funcionava também, os alunos de primário e de ginásio, então a gente fazia já o estágio também, e com as crianças ao mesmo tempo que está fazendo o Normal, então uma escola excelente, muito boa sim.
P - E como era a casa mesmo, a escola, a sala?
R - É muito antiga, essa escola foi fundada em 1930, então ela tem muito tempo mesmo, e aí até quando a comemoração, em 1980, dos 50 anos da escola, eu estava lá, não como aluna como funcionária. Então era uma escola bem tradicional, tinha um auditório bem velho, e tinha uma tradição de escolas antigas, muito grandes. Tinha uma quadra muito grande, era uma escola de vários andares, vários pavimentos, muito boa.
P - E os coleguinhas? Porque mudar de escola, aumenta.
R - É, eu já estava aí passando para o Normal nessa escola, já estava aí, quando eu entrei pro Normal eu tinha 14 anos, 14 para 15 anos, fazendo 15 quase, então era uma escola que todos que estavam lá tinham o mesmo ideal que eu: ser Normalista. Então a gente já tinha, entrava já com aquela vontade, estava aprendendo coisas tais como didática, didática de várias situações. E sempre me empenhei muito, eu adorava fazer as coisas para as crianças, e já começava logo no estágio, já com as crianças, então aquilo já era uma euforia muito grande,
foi uma escola que eu me adaptei muito.
P - Para quem não conhece o que é ser Normalista?
R - Ser Normalista é exatamente fazer o Ensino Normal, que naquela época era fazer formação de professores que é hoje. Hoje até para você dar aula, ser professor de primeira à quarta-série, você hoje tem que fazer faculdade,
eles chamam de docência superior. Mas naquela época não, bastava o nível do segundo grau, então alguns alunos faziam o Científico, fazia um Técnico e os outros faziam o Normal que era o curso de formação de professores, então por isso Normalista, pelo Ensino Normal.
P - E aí saindo da oitava série, ainda querendo fazer o curso de normalista, o que seus pais, eles te incentivaram ou eles acharam estranho, como é que foi isso?
R - Não, sempre minha mãe incentivou muito, sempre soube que eu queria ser professora, a vida toda, então ela sempre me incentivou, meus pais sempre me deram todo apoio. Nenhum dos dois tiveram condição de estudar, o meu pai pela função dele, sempre soube muito a escrita, falar, mas ele teve pouco estudo, então sempre eles me incentivaram muito. E eu fiz o Normal todo, sempre nunca fiquei reprovada, eu já tinha o ideal da faculdade, de Normalista. Eu já sabia que eu iria fazer Pedagogia, que era vamos dizer assim, diretamente a profissão ligada às Normalistas, professores, a pessoa mais que estaria à frente da escola. E eu tinha um ideal de montar uma escola, nessa época do Normal gostei disso, pensei mesmo em fazer Pedagogia para montar uma escola.
P1 – Quais são as disciplinas que alguém que vai ser normalista faz diferente?
R - Naquela época a gente aprendia muito a didática, que é como ensinar aquela matéria, então tinha didática da matemática, didática da ciência, didática da linguagem, então como ensinar, quais as estratégias que utiliza? Hoje eles já utilizam de outra forma, não é mais essa palavra que é utilizada, didática, mas na época era isso, então era bem diferenciada, normalmente quem fazia Normal, não tinha preparo para fazer um pré-vestibular, fazer um vestibular, porque ela não ensinava Física, Química, Biologia. Tinha sim o Português, a Matemática, matérias essenciais, mas era o básico mesmo. Aprendia muita psicologia, para poder lidar com os pais, tanto com os alunos, então toda era essa o currículo da escola.
P2 – E você gostou das disciplinas?
R - Eu me identificava muito, porque era uma coisa que eu já imaginava, isso tudo, eu sempre tive isso, muito segura, muito determinada, então eu já sabia o que eu ia estudar, então eu sempre me aplicava, é claro que tem alguma disciplina que às vezes você não se identifica muito, mas aí ela faz parte,
mas eu de uma certa maneira, eu gostava de todas.
P - Essa escola era próxima da sua casa?
R - Não, não era muito próximo, coisa assim de 20 a 30 minutos no máximo de ônibus, eu ia de ônibus, e voltava.
P - E aí você fez muitos amigos, eu queria que você contasse um pouco de como é a convivência lá, como é que foi?
R - Era uma sala, sala de normal só tem meninas, naquela época principalmente, no entanto só tinha moças, eram legais, era muito legal, tinha alguma afinidade com alguns professores, outros sim outros não, nós fazíamos passeios, nós saíamos para Quinta da Boa Vista. Na época
podia-se ir tranqüilamente durante a semana mesmo. Então, às vezes, combinávamos, saíamos, nós estudávamos de manhã, saíamos, íamos à Quinta da Boa Vista passear, Jardim Zoológico mesmo, a própria Quinta em si que fica próximo, então íamos ao Museu, fazíamos passeio, era um grupo de 40 alunas mais ou menos. Claro umas ou outras não ficam tão próximas, mas umas 20 ali eram bem próximas, fazíamos todos os passeios. À noite quando podíamos íamos a alguns lugares, não era muito de sair à noite não, era muito difícil sair à noite, mas uma festinha ou outra, porque era a idade dos 15 anos. Então era a idade que faziam aquelas festas onde as moças tinham 14 damas e aí a menina dos 15 anos. Então a gente acaba sendo chamada para essas festas, mas eu não tinha um poder aquisitivo muito bom, vivia tranqüila, mas razoável. Muitas vezes participava das festas, outras vezes não, porque tinha que comprar o vestido, mas era um momento assim mesmo, eu acho, eu tive uma adolescência muito feliz. Não lembro assim de nada traumático, eu nunca fui muito assim eu nunca quis muito mais do que eu podia, eu nunca quis muito: “Ah, eu queria ir à festa, queria muito comparar aquela roupa e não tenho o dinheiro para aquela roupa” Eu aceitava bem as coisas, achava que o que eu tinha era o suficiente e quando não podia eu me conformava.
P - E o que mais você fazia nesses tempos de seus 12, 15 anos? Fora ir à escola, sair com seus colegas, tinha um pessoal do bairro também, a sua casa.
R - Olha, desde que eu entrei no Normal estudava de manhã, à tarde fazia estágio já, então eu já trabalhava com turma, porque a gente trabalhava com a professora desde o segundo ano Normal. Então já com 15 para 16 brincava pouco na rua, cheguei a ensaiar andar de bicicleta, andava muito pouco, andava mesmo no condomínio, mas muito pouquinho tanto é que acho que esqueci, dizem que não se desaprende andar de bicicleta,
mas eu acho que eu desaprendi, eu tenho que pegar de novo para reaprender. E fazia muito, e a noite a gente ficava assim no bairro mesmo, dentro desse condomínio, às vezes tinha uma festa, tinha um campo de futebol, tinha umas festas á noite, eu dançava e participava muito de festas juninas, eu sempre gostei muito, eram festas do barro mesmo e eu participava, mas era essa a minha atividade.
P - E quais as músicas que você gostava de ouvir, de grupos, era fã de algum grupo?
R - Sempre adorei o Bee Gees, muito mais lento então tinha algumas músicas de discoteca
também,
época de John Travolta, essa época aí, então era as músicas que eu mais gostava, mas naquela época se escutava muita música americana. Hoje não, a gente escutava mais nacional, mas naquela época era muito as americanas, então a que eu me lembro mais é a do Bee Gees.
P - Sayonara vamos passar um pouco para parte de juventude, mas antes eu queria saber você tinha um sonho de criança? Aquela coisa que...
R - Ah eu não me lembro, uma coisa diferente, na minha profissão?
P - Ir a algum lugar ou fazer alguma coisa?
R - Não, não me lembro de nada assim que tenha a ver não.
P - Esses estágios que você falou que começou cedo a fazer, foi uma motivação sua ou como é que foi isso?
R - Era uma exigência do curso, mas eu me dedicava mais do que realmente a
exigência,
que a gente tinha um número de horas, eu gostava daquilo, adorava estar com os alunos, adorava estar ali, já ser chamada de tia Quando você começa no Normal as crianças já te chamavam de tia, então eu gostava, então eu me identificava bem com as crianças, já começava a resolver as tarefas, tanto nas de casa que eles traziam, já ajudava muito a professora, sempre me destacava bem, e a professora quando via que eu gostava, que eu estava ali me dedicando mesmo às crianças, ela me deixava mais à vontade, deixava eu ir além mais do que uma estagiária podia. Então era exatamente isso que eu fazia, quer dizer independente da exigência do estágio eu fazia sempre mais um pouco.
P - E aí você formou como Normalista?
R - Me formei Normalista, já comecei logo a trabalhar nessa escola mesmo que eu estudava e ali fiquei por oito anos, aí já dando aula, a primeira turma que eu peguei era uma turma de quarta-série, e eu estava com 17 anos. Como essa escola era uma escola que, embora fosse particular, dava muitas bolsas de estudo, então as crianças eram grandes às vezes, e eu quando eu peguei essa turma de quarta-série, porque era a única turma que tinha sobrado na escola. E eu queria que queria dar aula, então o diretor falou: “Olha, eu vou fazer uma experiência.” E eu fui, eu tinha que, vamos dizer assim, passar por aquele teste, senão talvez eu perdesse aquela oportunidade. Então eu encarei mesmo, e fui muito bem porque eu era, eu não era a professora deles, eu era a colega deles porque eu tinha 17 e tinha alunos com 15, mas eu conseguia me impor, conseguia mostrar à eles que eu não era, embora eu tivesse, eles me vissem tão nova quanto eles. Mas eu era a professora, então eu fiquei como uma colega que sabia um pouquinho mais e que ensinava para eles, que orientava eles, então eu tive foi uma turma que marcou muito porque foi a minha primeira turma, foi o meu desafio, e foi assim, foi o final do ano, foi uma choradeira, nós fizemos uma festa de encerramento e foi chorar, da parte deles e da minha parte também, foi um entrosamento muito bom.
P - Você lembra do primeiro dia de aula?
R - Lembro bem, foi exatamente por isso, que quando eu entrei na turma,
nem vi que eram alunas grandes, meu Deus tinha meninos maiores que eu, e muito engraçado que eu encontro alguns ainda no Orkut hoje,
porque eu entrei no Orkut exatamente para isso, e alguns já me localizaram lá: “Você
é a Sayonara que deu aula para mim naquela época.” Pelo nome ser diferente, eles me localizam mais fácil, e tem a comunidade da escola, do Colégio Cardeal Leme, então me adicionei com a comunidade, então fica mais fácil de eles me acharem. Então esse primeiro dia de aula foi uma coisa, eu tinha que encarar aquilo, eu não podia me deixar abater, porque senão eu perderia talvez, o emprego e aquela oportunidade. Então eu fui em frente, é claro que no princípio me intimidei, os alunos adolescentes sempre te testam, eles querem ver a tua resistência, então alguns faziam gracinhas e tal, porque me viram muito jovem. Mas tirei de letra, claro que por dentro eu estava com medo danado, eu estava tremendo, por dentro eu tinha vontade de sair porta a fora, quando eu vi aquela turma grande daquela maneira, mas aparentemente para eles não, eu estava ali, eu sabia, eu estava ali para ajudar eles, eu estava ali para ensinar eles, para contribuir, e eu conseguia manter. E tiveram gincanas na escola e nós tínhamos, fazíamos parte de uma torcida, e eu torcia junto com eles, eu vibrava junto com eles, naquele momento me pegavam junto com eles como se fosse colega mesmo, mas eles sabiam a diferença de me respeitar, inclusive foi muito bom.
P - E fora as aulas que você já começou a dar com 17 anos, o que mais você fazia no seu dia-a-dia, você freqüentava alguns lugares?
R - Trabalhava o dia inteiro nessa escola e fazia faculdade à noite, então não tinha muito, finais de semana, eu passava os finais de semana todos preparando aula, eu já trabalhava sábado pela manhã, então eu só tinha a tarde e a noite. Minha mãe ainda costurava, ajudava nas tarefas de casa, já com 17 anos eu conheci meu marido,
foi meu primeiro namorado, tinha namoradinhos, mas namorar em casa mesmo, ele foi o primeiro. Então eu estava no último ano do Curso Normal, quando conheci ele, então ele já fazia parte da minha vida e me ajudava quando eu comecei a dar aula. Já no ano seguinte, quando eu estava fazendo 18 anos, ele me ajudava. Finais de semana era fácil, saia com ele, ia cinema, naquela época quase não tinha shopping, porque hoje a gente vai, passeia no shopping, vai ao cinema, mas eu ia lanchonetes,
não era o Mcdonald’s, era o Bob’s que era o point no momento. Mas eu ia no Bob’s, fazia os lanches, voltávamos para casa, ele não morava muito perto, ele morava próximo a escola que eu trabalhava, pertinho, então quer dizer, a gente só se via sábado e domingo, porque semana toda eu estava trabalhando. Ele também trabalhava, estudava, então fazia só isso, as vezes ele passava o dia na minha casa, aí já alugávamos, deixa eu ver, vídeos? Não tenho certeza assim de que vídeo cassete já era nesse época, a gente via filmes, ele passava o dia inteiro lá já na minha casa para gente compensar, às vezes, me ajudava o dia inteiro a cortar as “orelhinhas” para dar aula,
para colocar em páscoa, é, coisinhas de festa do dia das crianças, ele me ajudava e fazia parte junto comigo.
P - E como vocês se conheceram?
R - A gente se conheceu numa festa junina da rua onde meu primo morava, ele era colega do meu primo, meu primo me chamou, na primeira festa, a gente teve só uma conversa, aquela coisa e nada de mais. Logo depois tinha uma outra festa, então, coisa de um mês depois, teria uma outra festa, de uma outra prima e ele foi chamado também, e foi quando a gente começou a namorar, que aí outros colegas vieram para comentar o que ele queria namorar e tal, e ficamos, daí a gente já começou o namoro.
P - E seus pais aceitaram?
R - É, lá não,
lá ainda foi escondido, ainda ficamos uns finais de semana, coisa máxima de um mês ainda só namorando na rua. Mas minha mãe já sabia, eu contava logo para ela, ela já sabia e logo depois ele foi em casa, ele marca muito o que meu pai, logo depois que meu pai chegou, meu pai perguntou para minha mãe: “Quem é o moleque?” E ele marcou bem isso,
ele comenta eu até hoje, ele tem uma amizade muito grande com meu pai, ele tem um estima muito grande por ele, aí sempre comenta isso: “Da primeira vez que você me viu me chamou de Moleque” Mas foi, assim, eles aceitaram bem.
P - Mas e aí, depois desses oito anos na escola, você falou...
R - É, nesse período que eu trabalhei no Cardeal Leme eu dei aula, logo fiz a faculdade, de lá mesmo terminei a faculdade e aí com uns quatro anos que eu terminei, eu assumi a supervisão da escola. Isso porque eu sempre tive a postura mas responsável do que a minha idade, então com 21 anos que eu tinha terminado a faculdade, a dona da escola já me colocou na supervisão, era supervisionar os professores, acompanhar o que o professor estava dando, ver se as professoras estavam de acordo com os alunos, se aquele currículo era de acordo,
acompanhar o trabalho que a professora
estava dando, também acompanhar as estagiárias, as Normalistas, as turmas. Isso porque, às vezes, a Normalista não está bem, não está de acordo, não tem aquele empenho, então tinha que acompanhar isso também, emitir esse relatório, aí eu já comecei. Só que eu trabalhei lá até 1988, quer dizer em 1986 eu casei, em 1988 então veio a minha filha, quando eu fiquei grávida eu sai da escola, já sai exatamente no mês que eu ia ter, já pedi que eu queria me desligar, porque eu já estava trabalhando em outra escola também, então já estava meio difícil de conciliar tudo, aí eu tive que sair dessa escola, da Cardeal Leme.
P - Aí você se casou. Mas aí antes de você chegar, na hora que você teve a sua filha
e saiu da escola, eu queria saber como é que foi você dando aula, e aí namorando com o seu atual marido, como é que foi que vocês se decidiram se casar, como é que isso foi pensado entre vocês dois?
R - É, já estava aí fazendo faculdade, então eu tinha que trabalhar e pagar a faculdade, então praticamente o meu salário todo era para pagar a faculdade, então tínhamos dificuldade. Começamos a fazer o enxoval, porque a gente já se entrosou logo, dois anos depois que a gente começou a namorar, ficamos noivos, decidimos que a gente queria mesmo casar, e aí ele também era muito responsável, então ele sabia que a gente tinha que ter uma casa própria, a idéia dele era essa, eu até que dizia assim: “Ah não, vamos casar com aluguel.” Mas ele sabia da dificuldade, ele sabia que a gente para casar, para viver melhor, a gente tinha que ter pelo menos um cantinho, um apartamentinho, uma coisa bem simples, mas tinha que ser nossa. Então a gente começou a juntar dinheiro, muito aperto, mas já aí ele não pôde estudar, ou um ou outro, então ele abriu mão do estudo dele, ele só trabalhava, juntava o dinheiro, não fez a faculdade e aí juntava, e aí a gente conseguiu comprar umas coisas e tal. Eu terminei a minha faculdade em 1984, e dois anos depois, juntamos dinheiro e fizemos um empréstimo. Aí a gente conseguiu comprar um apartamento, foi quando a gente casou mesmo, foi depois de ter esse apartamento.
P - E como é que foi o casamento?
R - Ah, foi muito bacana, bem simples, simples demais, mas conforme mesmo eu queria,
um vestido de noiva que eu escolhi, a ida para igreja, dentro da igreja católica que era o que eu queria, numa igreja que eu tinha feito a primeira comunhão nessa igreja, minha mãe casou nessa igreja, e eu era devota,
gostava da santa, que era Nossa Senhora Conceição, então eu queria casar lá. E ele concordou plenamente, então nós fizemos o casamento, uma igreja muito bonita, fizemos uma recepção simples, fiz uma coisa simples, mas bonita, dentro da igreja mesmo, e casamos, fomos à lua de mel e fomos logo pro nosso apartamento, e eu continuando a trabalhar.
P2 – E onde é que foi a lua de mel?
R - Foi próxima, Macaé, bairro próximo, cidadezinha próxima ao Rio das Ostras, em praia, o carioca gosta de tudo que é praia, então tinha umas praias boas, legais, inclusive hoje a gente tem uma casa próxima lá, porque a gente gosta muito do local.
P - E aí, você foi morar nesse apartamento que você e seu marido compraram, ele é no mesmo bairro?
R - No mesmo bairro, no mesmo condomínio que a minha mãe morava, só que eram duas ruas, eu só fui morar na segunda rua, mas era o mesmo condomínio, aí por isso eu continuei morando no mesmo bairro. Aí fiquei nesse apartamento ainda por dez anos, nosso objetivo era uma casa porque ele sempre morou em cães, se sentia um passarinho preso na gaiola. E eu respeitava isso, o sonho dele, ele queria porque queria uma casa, a gente lutava muito e tal. Depois de dez anos a gente conseguiu comprar a nossa casa, também numa vila de casas do lado desse condomínio, então permaneceu no bairro.
P - Me fala o que você gosta desse bairro.
R - Olha, não tem nada demais, um bairro que é até pequeno, mercados, tem um shopping próximo, mas não é no bairro, é no bairro ao lado, dá até para ir à pé durante o dia nesse shopping, não é um bairro que tem assim um comércio. Mas, por ele ter um metrô é um bairro de fácil acesso, claro que a gente aqui no Rio de Janeiro fica procurando lugares para morar melhor, é um bairro que dá para gente trabalhar, voltar, hoje em dia para gente sair a noite é muito mais difícil, então a gente procura nem sair. Mas nesse bairro está morando tanto a minha mãe do lado, que mora até hoje, a minha sogra que depois de um tempo, conseguiu comprar um apartamento também nesse mesmo condomínio, então também está próxima. O meu irmão tem uma casa em cima da nossa casa, que ele ajudou a fazer, e ele também mora com a minha cunhada, casou e tem a minha cunhada com a minha afilhadinha, minha sobrinha, então a gente gosta porque está todo mundo junto, fica todo mundo próximo.
P - Tem os amigos próximos também?
R - Tem os amigos.
P - E aí voltando um pouco para escola, você ficou grávida da sua filha?
R - Fiquei grávida e saí dessa escola. Como eu já tinha formação, eu comecei a dirigir uma escola particular, uma escola grande, essa escola era uma escola de informática, na época era uma escola assim, bem diferencial porque a Informática estava nascendo, estava crescendo, entrando no mercado de trabalho. Então eu assumi a direção dessa escola por conta do curso que eu tinha na faculdade, e aí eu fiquei nessa escola por 12 anos, então quando a minha filha nasceu não dava mais para conciliar as duas, então eu saí daquela escola anterior, onde eu dei aula e passei a assumir essa outra escola.
P - E aí os desafios de assumir uma escola? Ainda mais informática chegando.
R - Os desafios eram muitos porque na área de informática sempre tinha mais professores homens,
a mulher ainda não estava muito na área da Informática, então as professoras que tinha era mais professoras de Português, Matemática, Ciências,
as disciplinas básicas, mas os professores mesmo de Processamento de Dados, como era o nome do curso, eram professores homens, e aí existia assim, vamos dizer uma barreira muito grande por ser dirigido por uma mulher. Claro que acima de mim tinha o dono da escola que também me dava todo respaldo, então tive sim, alguns enfrentamentos, alguma coisa assim, mas eu tentei sempre levar a conseguir, fiz amizades com esses professores, tinha sempre apoio do diretor, do dono da escola, foi uma experiência sim, difícil inicialmente, mas depois deu para superar bem.
P - Como chama a escola?
R - Escola Técnica Virginia Patrick.
P - E aí nessa escola, você estava muito junto à pedagogia e às disciplinas didáticas de educação, e aí de repente entrar na informática?
R - Exato, exato. Eu tive que aprender um pouco, embora que não tenha aí procurado uma escola, alguma coisa para me aperfeiçoar, nesse momento não, mas eu acabei tendo de entender mais. Os próprios professores me ajudaram, eu procurava saber, eu nunca tive dificuldades de dizer: “Eu não sei, me ensina isso, o que é isso, o que aprende nessa linguagem?” Porque na época era uma linguagem separada, hoje a gente aprende Informática como um todo, mas na época não, eram linguagens diferentes. Então eu não tinha vergonha de perguntar que era para eu poder falar também pro aluno aquilo que era melhor para ele, o que não era. Unindo a parte profissional com a parte pessoal, talvez tenha sido por isso que eu tive só uma filha, foi quando eu mergulhei nessa escola. Eu digo que mergulhei porque eu entrava na escola às sete horas da manhã e não tinha horas para sair. E essa escola depois cresceu muito, ela se tornou uma escola com uma rede, com outras escolas, em outros bairros, e eu acabei assumindo isso tudo. Eu entrei na escola em 86, e em 88 a minha filha nasceu, então ela tinha dois anos de idade, e eu acabei, vamos dizer assim, me ausentando muito com ela. Eu tinha uma pessoa dentro de casa, que tomava conta dela, que levava ela para escola, que trazia, então eu acabei me ausentando bem, talvez por isso eu tive uma filha só, ela sempre me pergunta, mas é que eu não tive tempo para ver a infância dela.
P - E como que era o perfil do aluno, sabe, desse aluno de Informática, que deveria ser bem diferente?
R - Eram alunos já adolescentes, alunos já também procurando a profissão da Informática, para se preparar melhor, para estar melhor no mercado de trabalho, para fazer o diferencial, que era a época de fazer a diferença, então era alunos empenhados. Era um curso caro, era uma escola cara, então tinha um valor caro nas mensalidades e os alunos se empenhavam muito, eles tinham bons professores, tinha, vamos dizer assim, um retorno do ensino que eles aprendiam.
P - Teve alguma situação, assim engraçada, diferente que você tenha passado, que você lembre?
R - Olha, situação engraçada, assim que eu lembre não, o meu marido trabalhou uma época na escola, vamos dizer que ele trabalhava durante o dia e como a escola funcionava até a noite, precisou de uma pessoa para auxiliar a noite e ele foi trabalhar também. E à noite já eram mulheres e homens, à noite que eu estudava, e às vezes eu tinha muito ciúme dele por conta da moças, porque eram moças muito atiradas,
já bem decididas na vida. E eu sabia de histórias com professores, como dominava os professores, na maioria, homem não tinha essas situações, eu sabia desde o que rolava. Quando ele foi, criei uma barreira mas nada que a gente não deu para contornar não, eu omitia também, muito mais esse ciúme.
P - E os computadores, os recursos pedagógicos existiam na escola, como é que eram, eram muito diferente dos de hoje?
R - Ah, muito, muito, naquela época os computadores chamavam de “PC 500”, eram computador que hoje, se um aluno for ver ele vai dizer que é um museu,
mas na época eles eram computadores atuais,
computadores que tinham todas as linguagens que os alunos precisavam, eram muito bons, eram uma coisa nova da informática. Era um curso difícil, preparava também para Marinha, então tinha um currículo muito extenso para os alunos.
P - E você tinha computador na sua casa?
R - Nessa época não, eu só tinha mesmo na escola, e pior, eu não dominava nada de Informática, eu sabia um pouquinho com o que os professores diziam, mas eu não dominava nada, como eu era diretora, eu pedia para fazerem para mim: “Ah, por favor, imprime essa declaração, imprime esse histórico.” Mas eu não fazia nada, sabia nada e ai passou os 12 anos, daí eu fui para outra escola e já fui pra Escola Municipal Roberto Weguelin, tive que aprender mesmo.
P - E como é que foi que você foi se desprendendo dessa escola porque você tem um vínculo muito forte assim, com o lugar que você vai.
R - É, criei, um vínculo por causa do tempo, do horário que me dedicava, eu trabalhava só lá na sala. E devido a algumas situações na escola,
ela passou por fase, ela passou por crises, aí já começou a era da Informática, 12 anos, aí já começou outra escolas a terem Informática. Já criou-se situações de professores que saíram dali e foram trabalhar em outras escolas, então o que aconteceu, fui me desligando, eu fui me decepcionando um pouco com a escola particular, com salário, com tempo que eu me dedicava a escola. Comecei a fazer uma reflexão da minha vida, de ver tudo que minha filha, o que eu tinha perdido dela, minha filha já estava com dez anos, eu não tinha acompanhado a infância dela. Então comecei a repensar nisso tudo, e decidi fazer uns concursos públicos, falei: “Eu vou sair da escola particular.” Isso porque eu acho que já estava um pouco cansada, tinha responsabilidades demais, estava um pouco cansada. E eu decidi: “Eu vou entrar em uma escola que eu tenha horário de entrar, horário de sair, e não levar aquela escola para casa.” Porque lá eu assumi muito, eu levava para casa e eu trabalhava sábado e domingo direto, vivia para a escola.
P - E aí você passou?
R - Fiz os concursos, e aí passei para escola lá em Duque de Caxias, Roberto Weguelin lá em Duque de Caxias, foi onde eu escolhi mesmo trabalhar, na época tinha os vários bairros,
porque Imbariê é o terceiro instituto de Duque de Caxias, então é bem distante, não é no centro de Duque de Caxias, pro centro Duque de Caxias é próximo, quer dizer eu tenho condução perto da minha casa, que fica pro centro de Duque de Caxias coisa de 20 minutos. Imbariê não, em Imbariê condução demora uma hora e meia, dependendo do trânsito, às vezes fica duas horas. E me apaixonei Eu falo isso sempre para as pessoas, quando vão à escola se contagiam pela escola, talvez seja pelos alunos, talvez seja pela carência afetiva que eles tem, e você então se torna muito próxima, você quer ajudá-los, você vê a maneira como eles agem, então você acaba se cativando por eles. Com o tempo que a gente tem, três anos mais ou menos, eu poderia sair, não penso em sair, com todas as dificuldades, tem amigos meus que dizem: “Você trabalha em Duque de Caxias, não é possível, não acredito” E eu poderia pedir transferência, mas eu gosto muito da escola.
P - Você está lá há três anos?
R - Não, eu estou lá desde 2000, oito anos,
oito anos.
P - Oito anos. E você entrou lá como professora?
R - Já entrei como professora, também com uma turma de quarta-série ainda, aquela mesma coisa que eu fiz lá no início, porque aí minha faculdade nesse momento não importava, porque o que importava era o Normal. Eu entrei como professora de primeira à quarta, mas logo no ano seguinte, eu entrei em 2000, em 2001 eu fui chamada já para fazer a capacitação desse programa TONOMUNDO, que na época, era Projeto Telemar de Educação. Aí eu fui chamada, fiz a capacitação em
São Paulo, aí tinha que mergulhar na Informática, na verdade eu fui escolhida, como digo à minha diretora, que dizem: “em terra de cego quem tem um olho é rei”, eu tinha um olho, porque ninguém sabia nada de computador na minha escola. E eu como tinha trabalhado naquela escola aqueles anos todos, eu tinha uma “noçãozinha”. Aí eu fui, e quando eu cheguei lá, fiz a capacitação, eu vi que precisava de mais, que só aquilo que eu estava fazendo, o que eu sabia era muito pouco para eu poder chegar na escola. Porque essa capacitação que eu recebi era para passar para os outros professores, todo o programa, todo o projeto como que seria, o que desenvolvia, tomar conta do laboratório de informática, que na época a Telemar estaria doando para escola, então eu precisava saber mais. Aí eu fui fazer um curso, uma prós-graduação em informática educativa, para poder me especializar, poder trabalhar melhor.
P - E me conta uma coisa, antes da sua, para gente falar mais sobre informática, você já tinha ido à São Paulo?
R - Não, não, não conhecia São Paulo, tinha ido só à Aparecida do Norte, mas São Paulo mesmo a capital não, não tinha ido, passei 15 dias lá, conheci, foram 33 pessoas fazer essa capacitação. Aí conheci vários lugares, nós tínhamos as atividades todas durante o dia e a noite tinha sempre alguma atividade de lazer.
P - E a capacitação, o que te chamou a atenção, como foi assim, eles te ensinaram o que?
R - Eles ensinaram como trabalhar o projeto na escola, como desenvolver projetos que auxiliavam a comunidade, o que realmente a gente aprendeu lá, qual era aquele objetivo, porquê de colocar laboratório de informática dentro da escola, não era só um intuito de montar um laboratório para os alunos entrarem, mexerem no computador, tinha um intuito maior, aquilo era apenas um ponto de partida, um passo para escola mudar, era uma atitude que só dependia da gente transformar aquela comunidade. A aí fui me identificando bem, com o programa.
P - E aí você decidiu também estar fazendo a especialização?
R - Precisava de recursos maiores para poder fazer essa pós-graduação porque precisava de recursos para poder estar trabalhando na Internet, porque era uma coisa nova que estava vindo e eu quase não conhecia, eu conhecia o computador, Internet eu quase não vivenciava, daí eu já comprei o computador, já tinha um computador em casa, então eu podia fazer as duas coisas, aí eu já precisava mesmo de mais recursos.
P - E lá na escola eles tinham, quando entrou o programa da Telemar,
de educação, eles tinham alguma expectativa de trabalhar com esses novos recursos, já se trabalhava com recurso já?
R - Era uma idéia da diretora, que a escola tivesse um laboratório de informática, e foram pouquíssimas as escolas que tinham, eu acho que se tinha alguma em Caxias era uma ou duas, então era o objetivo dela, então ela já se prontificou com a Secretaria de Educação a receber o laboratório, caso eles quisessem implementar aluno. Então quando surgiu o projeto, na época a Telemar - hoje é a Oi Futuro -, procurou a Secretaria Municipal e pediu que queria uma escola que eles pudessem fazer isso, tinha que ser uma escola que ficasse numa comunidade carente, que tivessem um IDH baixo, então foi quando escolheram o Roberto Weguelin. E aí se concretizou um sonho dela e aí me chamou, eu fiz a participação e começamos então a trabalhar.
P - E aí quando você voltou, foi difícil multiplicar isso para os professores?
R - Primeiro fez um grupo pequeno, quatro professores, eu e mais três,
a Thirlei, a Zuleide e a Talita, então esses três professores e nós fizemos então as reuniões, eu passei para eles tudo que eu tinha aprendido. E então nós quatro é que passamos a traçar os próximos passos, juntas nós fomos construindo o que a gente ia fazer, mas é claro que a gente teve muita rejeição do professor, até foi o tema da minha monografia quando eu fiz a informática educativa, resistência que o professor tem em relação à Informática. Isso porque a gente tinha que levar os alunos, as turmas e os professores juntos, para gente estar fazendo alguma coisa, construindo, pesquisando e os professores tinham medo, medo porque o aluno adolescente mesmo ele não conhecendo ele não tem medo, então ele ia, ele mexia no mouse, ele interagia rapidamente com aquilo lá, com o computador mesmo sendo uma novidade para ele. Mas os professores não, e os professores não estão acostumados, hoje já está bem diferente isso, mas naquela época, há uns sete anos atrás, foi em 2001, os professores achavam que eles eram soberanos, então estar num laboratório aprender junto com eles, ou então o aluno vai me ensinar, isso era um baque para eles, a gente percebia. Aos poucos foi uma conquista lenta, muito lenta, te digo até de anos, hoje eu te digo que a gente consegue mais envolver os professores, mas a gente faz um convite a eles, tem todo um jogo de cintura para que ele se envolva e também se envolva em nosso trabalho.
P - Me conta um caso de algum problema que você teve, com essa adaptação com os professores, sabe, para sala de informática.
R - Os casos em si era que eles não queriam ir, eles mandavam metade da turma e queriam ficar com a outra metade na sala. E eu: “Vamos lá levar todos, a gente inicia uma pesquisa com a metade, coloca mais alunos nos computadores, essa turma é pequena” Sempre eles tentavam de alguma maneira sair pela tangente, embora eu conseguia levá-los, em determinado que algum aluno perguntavam: “Professora, como é que faz isso, professora?” “Ih, sumiu a tela” E ele também entrava em pânico,
então às vezes eles diziam: “Não, vou ali fora tomar um café.” E sumia, saía porque como eu estava junto, ele sentia: “Bom, ela toma conta aí.” Ele sentia aquela insegurança, sempre foi dessa maneira mas não teve assim, foi vários casos, mas não assim um que tenha sido expressivo.
P - O Weguelin ele tem outros tipos de recursos pedagógicos também?
R - Tem sala de recursos que são os professores que trabalham com a parte de Multimídia, tem biblioteca, e daí o laboratório de informática, ele abriu muitas portas, ele assim portas por quê? Porque através da Internet a gente conseguiu muitas coisas voltadas pros alunos, para comunidade em si, e uma das coisas principais, foi o nosso consultório dentário. Desde nova eu tive alguns contatos com alguns dentistas, umas pessoas que foram os meus dentistas e foram amigos e que eu acabei convivendo com eles, conhecendo filhos, família, e o que aconteceu? Nós tínhamos lá a escola, lá tem uma característica muito difícil porque eles não tem água encanada, a comunidade não tem, água de poço é de péssima qualidade, e a escola é abastecida de carro pipa, a prefeitura manda um carro pipa a cada dois dias para poder abastecer a escola. Então as crianças escovam os dentes com água sem flúor, tem problemas sérios de dentição, de cárie, isso a gente observava muito, eu via muito. Eu me lembro que quando eu dava aula muitas vezes eu dava escovinhas de dente pros meus alunos, nuns kitezinhos, coisa do dia das crianças, também comparava escovinhas de dente e dava, eu sempre tive muito essa formação com eles. E quando eu comecei a vivenciar, a ver alunos já adolescentes com dentes cariados na frente, sem dentes, eu comecei a me preocupar. Eu me lembro bem que eu contei, um dia eu cheguei para Vera minha diretora e falei assim: “Vera, eu posso montar um consultório dentário aqui dentro da escola?” Aí ela falou assim: “Você está doida? Claro tudo bem, você que sabe. Um consultório dentário dentro da escola é uma coisa inédita.” “Eu vou tentar.” E a princípio, ela falou: “Onde?” Porque a escola não tinha muitos espaços, aí eu vi um espaço pequeninho lá e falei: “Ah, acho que aqui dá” Medi uma cadeira, uma mesa dentária: “Acho que aqui dá.” Consegui um espaço melhor que ficou muito bom, e aí eu levei a frente isso, conversei com os alunos, começamos com as pesquisas e comecei a mandar e-mails para centenas de pessoas, centenas de firmas. Procurei esses amigos dentistas, um deles foi quem doou um aparelho dentário velho, mas era o que tinha. Aí meu marido que sempre também sempre apoiou muito em tudo, tudo ele me ajudava, e levava tudo que eu precisava, e a gente conseguiu e os voluntários foram aparecendo. A inauguração desse consultório dentário foi em 2005, a gente já está aí com três anos com o consultório dentário funcionando dentro da escola, atendendo os mil alunos, dentro dos mais necessitados, a gente tenta procurar com os dentistas voluntários, que não são muitos, já tivemos uns outros saíram, outros persistem, esses dois estão desde o início e continuam. Tem acadêmicos de faculdades, universidades que estão nos ajudando, que vão lá. A gente também está sempre promovendo encontros, digamos o Dia da Saúde Bucal, e aí sim eu procuro prefeitura, prefeitura dá um apoio e a gente mantém esse consultório dentário com muita dificuldade, mas é com muitas rifas, promovendo festas, eventos para conseguir angariar dinheiro para acolher esses alunos, para poder movimentar a escola.
P - E aí todas as suas novas ferramentas dentro da escola, o laboratório de informática, o laboratório dentário, o que você acha que isso é importante para escola?
R - Eu acho que transformou a escola, eles primeiro entram num laboratório de informática desde o menorzinho até o maior e dominam perfeitamente, sabe? Então esses alunos vivenciaram a Internet muito antes da lan house, hoje tem a lan house em cada esquina, mas eles já dominam bem isso. A gente também conseguiu no ano passado um projeto onde eles aprendem violão, violino, então nós conseguimos aí as doações de violão, violino, professor que sabe ensinar, que é formado em Música e Geografia, ele da aula de Geografia, mas ele conseguiu liberar esse tempo para ele dar essa aula, então ele dá aula pros alunos, a gente faz esse movimento, outros querem, até outras aulas, cavaquinho, a gente vai caminhando aos poucos. Cada situação dessa vai transformando eles, e aí acho que foi o laboratório de informática. Porque dali acabou abrindo nossas cabeças e vendo que um infinito leque de oportunidades que a gente podia oferecer para eles,
então a escola hoje ela não se limita só a uma sala de aula e dar aula. São vários projetos que eles tem tais como guarda florestal, guarda mirim que eles visitam uma floresta da Taquara próxima. E aí eles já aprenderam a catar os lixos, a orientar, como andar nessa floresta, então é um projeto muito bonito, eles adoram e o
meio ambiente, projetos de horta, a gente conseguiu isso tudo através do laboratório de informática, porque mandando e-mails, contatando, conseguindo ver firmas e chamar firmas para fazer palestras, então a gente conseguiu montar a horta na escola, então foi um leque mesmo de oportunidades que foi se abrindo para eles.
P - E você no Programa TONOMUNDO, qual é o seu papel?
R - A gente tem o nome dado lá no início da capacitação, Mediadora, Formadora Local - MFL, que é a pessoa que foi capacitada e passa pros outros professores essa capacitação. Mas hoje na minha equipe nós somos uns quatro formadores, cada um trabalha dentro de uma área, dentro do Programa TONOMUNDO, ninguém faz só isso ou só aquilo, sempre a gente se entrosa, a gente desenvolve os projetos juntos, então eu acho que houve um entrosamento muito bom porque a equipe não mudou, é a mesma desde o início.
P - Você participou agora do encontro em Natal?
R - Participei, eu participei dos cinco encontros, tive essa oportunidade até porque a Prefeitura cedeu no início as passagens, então eu consegui participar dos cinco.
P - E como é que é a formação, porque são muitos laboratórios, são muitas pessoas que também entraram na informática pela primeira vez, como é que você vê esses encontros?
R - Lá a troca de experiências é muito grande e tem muitas pessoas, uns tem muitas dificuldade e aí superam outros não, outros deixaram mesmo, vamos dizer assim se abateram, não levaram o projeto à frente. Os computadores, às vezes, não estão funcionando e aí é muito importante essa troca para poder estimular, porque alguns acham que aquela dificuldade é muito grande. Então eles tem que saber das outras dificuldades para ver que tem quanto, ou às vezes bem pior e que está superando, então se torna também como um estímulo,
para você: “Não, puxa vida eu tenho isso e isso e isso, e não estou conseguindo mas o fulano nem tem isso e ele está conseguindo.” Então são momentos de repensar, de refletir. Agora a gente também recebe muitas palestras boas, palestras para que a gente possa estar atualizada, poder ver outras maneiras, outras formas, outras estratégias de estar ensinando, de estar ajudando os alunos.
P - Conversando com alguns professores, esses últimos dias a gente percebeu muito que eles têm um intuito muito forte de escrever projetos, como você também mostrou é consultório dentário, é a horta. Você acha que esses intercâmbios, essas palestras trazem uma bagagem assim, ou é uma coisa do próprio corpo de professores da sua escola?
R - É, exato, claro que a gente sempre busca nesses projetos estar identificando a necessidade da escola, da comunidade, mas eles também nos orientam, eles nos direcionam a isso,
tanto é todos nós saímos de lá com um projeto em mente, que é o projeto rumo à adolescência saudável. Então é uma idéia que eles já estão lançando, daí você vai desenvolver, nossa escola tem já vários projetos, os professores abraçam bem, normalmente esses projetos saem do laboratório de informática e daí a diretora Vera abraça mesmo. O que a gente passar para ela, ela aceita: “Vamos, vamos” E ela encabeça e nos ajuda, isso é muito importante, o apoio da direção, porque senão, às vezes também não manda, não basta só ter boa vontade, precisa ter toda uma equipe te auxiliando. E os professores da escola também, hoje eles já estão entrosados e tudo que é lançado, eles aceitam bem, também contribuem, também dão a parcela de ajuda da maneira deles e contribuem mesmo da melhor forma.
P - Sayonara, o que é a educação para você?
R - Eu sempre digo que a educação é um sacerdócio, porque se você pensar em desvantagens, você de repente se desmotiva, eu penso no lado bom, no lado positivo, penso em tantas vidas que eu transformei, eu penso em tantas pessoas, hoje mesmo quando eu tenho contato com alunos que eu ensinei a ler e hoje estão formados, eles entram e dizem: “Olha eu me formei em Biologia, me formei em Medicina, sabe?” Então eu iniciei aquilo,
eu fiz parte da vida dele, eu fiz aquela diferença na vida dele. Eu vejo também, a educação lá na escola, transformando essas vidas mesmo, nós tivemos vários alunos que tiveram envolvidos em situações violentas,
por conta do bairro e, no entanto através de um projeto, a gente conseguiu trazer ele para a escola. Hoje eles nos ajudam no laboratório de informática. Então, às vezes, tem alunos que vão para lá de manhã e ficam até as 19 horas, é a hora que eles saem do turno,
então esses alunos eles estão envolvidos de tal forma que a gente está modificando a vida dele. Porque por um bairro ser distante, o que eles têm é a expectativa de trabalhar no mercado próximo ali, ser entregador, caixa de mercado. Às vezes a expectativa da vida dele é baixa e com esses projetos, com essa dedicação, vai modificando, então eu vejo transformar as vidas.
P - E fora da escola, o que você costuma fazer?
R - Não, eu adoro viajar, eu estou aí com o meu marido, comecei a contar do casamento, eu vou fazer 23 anos de casada e tenho a minha filha com 20 anos, fazendo a faculdade dela, estou orientando ela, a gente sai muito nos finais de semana, viaja muito, tenta na medida do possível conhecer vários lugares, construímos aí uma casinha lá próximo do lugar onde passei a minha lua de mel porque a gente gostou muito do lugar, do litoral, então a gente tem a nossa casinha lá, então sempre que pode estar fugindo para lá. Tenho as minhas idéias de sair, daqui do Rio de Janeiro mas claro que vou deixar muita saudade lá no Weguelin, mas também ter também faz parte da vida, também vão precisar de outra pessoa, isso ainda vai demorar mais um bocadinho, ainda mais uns dez anos ainda para eu poder sair, me desligar totalmente. Mas trabalho em outra escola também, eu passei a trabalhar na prefeitura do Rio, mais ou menos a mesma época eu também ingressei, só que a minha diferença, eu faço a diferença nessa escola, na Roberto Weguelin. Na outra escola pelos recursos serem menores ou talvez pela valorização ser diferente, vamos dizer assim o apoio ser diferente, eu sou uma professora igual a todas as outras professoras, cumpro com a minha obrigação, com meu horário, com meu trabalho, mas não faço a diferença não, como eu faço no Roberto Weguelin.
P - É um sentimento muito forte, né?
R - É um sentimento muito forte, uma dedicação muito grande, eu tenho alunos que, os alunos também fazem isso, eles fazem essa diferença, a gente aqui na cidade do Rio você tem que ter mais receios, são alunos que você tem que estar mais resguardado para poder agir com eles, tem mais maldade na cabeça, estão mais próximos a civilização. E isso também contribui um pouco para modificar as posturas deles, do aluno, e lá não, lá ele ainda tem aquele intuito de interior, é uma situação que inclusive eu gosto de contar, conto pros professores do Rio para fazer uma comparação, mostrar à eles como é diferente a minha escola em Imbariê, a minha escola aqui do Rio. Em um certo momento trabalhando num laboratório de informática com os alunos, aí uma aluno abriu a porta meio fascinado, entrou já sentou numa máquina e eu observando ele, e falei assim: “Filho, olha só, como é que você faz, como é que você fala?” Aí ele virou para mim e: “Ah, desculpa professora, benção.” Aí eu falei assim: “Filho, Deus te abençoe. Mas não é isso não, é que agora está um grupo, você tem que aguardar para o próximo grupo.” ”Ah é? Então está bom.” “Pode ficar, fica com esse grupo, depois você vai lá para fora e faz parte do próximo grupo também, pode ficar.” Até pela maneira como ele se colocou, quer dizer eu queria que ele entrasse e falasse: “Boa tarde, professora. Posso entrar,
posso fazer parte desse grupo, tem que ser no próximo?” Alguma coisa que eles já estão acostumados, mas a maneira como ele reagiu quando viu: “Benção” Uma criança aqui no Rio não tem mais esse hábito, não tem mais essa cultura, é uma coisa bem, então sabe-se com certeza, esse daí pede benção ao pai e a mãe,
ele continuou com aquela cultura e isso influi muito na personalidade do aluno, da criança,
isso é bom para ele, esses tipos de coisas são boas de ser cultivadas.
P - Sayonara você tem uma vida de muito estudo, e de um amor pela educação e agora pelo Weguelin também muito forte, o que você vê de todo esse panorama, assim você tira de aprendizado, vamos dizer assim, que você leva cotidianamente?
R - Eu acho que eu cresci muito, modifiquei muito, muitas coisas, talvez lá naquele início que eu pensei em ser professora, que eu pensei em ser pedagoga, eu não pensei que eu fosse conquistar tanto, não pensei que fosse chegar a tanto quanto cheguei e fazer tanta diferença, sabe? Vamos dizer assim, me envolver tanto com uma escola como eu me envolvo com eles lá. Eu sei que para minha filha isso é bom, eu sou um exemplo, me sinto assim como exemplo para ela, ela também é tão empenhada no estudo talvez pelo que eu falo, eu sempre incentivei ela para ler, leitura, sempre comprei livros, sempre tentei fazer com que ela seguisse, não a profissão mas que seguisse o mesmo estilo, de se dedicar a profissão dela,
então eu acho que eu cresci muito, mais do que eu imaginava.
P - Então antes da gente chegar no finalzinho, eu queria lembrar você, você contou uma história muito bacana para gente, sobre o seu nome, eu queria que você contasse um pouco mais.
R - Minha mãe foi ao cinema com o namorado e aí ela, foi justamente ver o filme Sayonara, e eles adoraram, uma história muito bonita e aí os dois decidiram que o dia que eles tivessem uma filha, eles dariam o nome de Sayonara. E aí passaram alguns anos, ela não casou com esse rapaz, ele foi pro outro lado e ela também e aí ela casou com meu pai, e a primeira filha então ela deu o nome de Sayonara. E o que eu conto sempre que é engraçado é que esse rapaz, ele é mais ou menos parente, tinha um parentesco, e há cerca de uns cinco anos, dez anos, a gente encontrou eles numa festa, no caso o ex-namorado de minha mãe e a esposa dele, e já tinham uma filha também, novinha na época. E para nossa surpresa, quer dizer eu mesma não me lembro bem, eu tinha uns dez anos e a menina se chamava Sayonara também. Quer dizer, ele também deu o mesmo nome, eles mantiveram o pacto deles, né. E claro a minha vida toda a minha mãe sempre comentou isso, ano passado a minha filha pesquisando na Internet, achou a venda do filme, e aí ele procurou e pediu e encomendou e veio. E eu tenho agora o filme Sayonara, eu já vi várias vezes, adorei e tem até comunidades no Orkut com as mesmas situações, não igual a da minha mãe, mas pelo menos a situação de que a mãe viu o filme e deu o nome da filha, e até me perguntaram como eu consegui o filme, foi muito bacana.
P - O que sua mãe te contou, que ela gostou do filme, assim?
R - A história é a seguinte: ela era japonesa e ele era americano, não podiam viver um relacionamento, ele era militar por isso ele estava no Japão, então era proibido, ela como japonesa só podia se relacionar com japoneses, aí teve aquela situação, tiveram que se separar, então ela já contava isso, e tinha a música,
Sayonara
era o tema do filme. Minha mãe se apaixonou pelo nome, achou lindo, mas aí eu também gosto, é diferente,
aonde eu vou as pessoas até me identificam muito e todas as situações: “Sayonara? Já vi esse nome” Eles falam alguma coisa assim que sempre faz um diferencial pelo fato de um nome diferente.
P - Tem alguma coisa que a gente não tenha perguntado, alguma história, caso que você tenha passado aí na sua vida?
R - Não, assim talvez vamos dizer assim, a minha ansiedade em relação a essa entrevista hoje,
o que acontece é o seguinte devido a esses projetos todos que a gente desenvolve lá, a gente tem tido muitas reportagens na escola. E é tudo muito formal, a gente tem que ficar em pé,
não pode olhar a câmera, tem que olhar para as entrevistadoras, para os repórteres, então é realmente uma coisa que sempre me deixou muito tensa. Às vezes gaguejava e não podia, tinha que ter um direcionamento do que ia responder, tinha que ser muito rápido, não podia demorar tanto, então isso limita muito você, aí perguntava antes, você dizia e dizia assim: “Então você fala isso, isso e isso.” Você tinha que diminuir, e você não podia, tinha que ser rápida, e isso acabou criando uma tensão muito grande, um bloqueio, foram várias reportagens, mas não adiantou, várias tipo assim, cinco, seis reportagens que tiveram lá na escola por conta desses projetos que a gente desenvolve lá. Então eu estava muito tensa de ter que vir para cá e me sentir a mesma coisa, eu falei: “Meu Deus vai me criar um bloqueio, eu vou gravar uma fita só, não vou conseguir gravar nada, porque eu não vou conseguir responder.” Mas não, tive assim a simpatia de vocês, o acolhimento, a maneira como vocês me receberam, todo assim esse envolvimento,
e assim sentada á vontade, aí a gente acaba
se descontraindo e falando demais.
P - E você gostou de dar uma passagem, uma breve passagem nessa linha do trem do tempo?
R - É muito bacana, a gente lembra de coisas que eu acho que eu não lembrava a muito tempo e hoje assim veio, fluiu,
é engraçado mesmo porque eu achava que eu não ia lembrar de uns fatos, eu falei: “Ah, meu Deus, acho que se for buscar lá no início, não vou lembrar.” E não, a gente vai buscando, vai falando e aí vai relembrando e as situações, vão fluindo e vão, a gente vai lembrando sim, muito legal.
P - Sayonara, você já conheceu o Museu da Pessoa?
R - Conheci lá no encontro de Itacuruçá, quando a gente lá teve que fazer uns depoimentos, teve não, foi uma coisa descontraída para quem queria, lá a gente já fez alguns depoimentos, houve umas entrevistas, já falou da escola, claro que naquela época era mais voltada à escola, eu achei até que eu falei alguma coisa do meu nome mas foi mais por curiosidade, alguém perguntou e eu acabei falando. Mas era mais voltada ao projeto TONOMUNDO, mais voltada à escola, mas conhecia desde àquela época, mas esse projeto agora é uma coisa bem inovadora, eu acho que é uma maneira de valorizar mesmo a história do professor, resgatar, essa como iniciou, como foi a vida dele, isso é muito bacana.
P - E você quer contar mais alguma coisa para gente, alguma coisa que a gente esqueceu de perguntar?
R - Não, acho que não, acho que não, deixa eu ver, acho que hoje me resumindo eu sou uma pessoa feliz,
eu sou formada no que eu quero, eu tenho uma filha que eu adoro, marido, bem vivo bem, tenho uma família,
toda, graças a Deus estão todos bem de saúde, então acho que estou bem, não tem mais nada à acrescentar.
P - Então eu queria agradecer em nome do Museu da Pessoa.
R - Obrigada vocês por terem nos recebido, por estar abrindo esse espaço,
para que a gente possa estar contando as nossas histórias.
P - A gente está sempre de ouvidos bem abertos. Muito obrigada.Recolher