(...) Minha casa é própria... Vou pra onde? Tem tanto lugar mais violento..Aqui é nossa família... Os vizinhos são nossa família... em outros lugares a gente não sabe... Aqui... todos filhos foram nascidos e criados aqui... Todo mundo se conhece, já sabe o comportamento... (...) O trabalho.. Sempre trabalhando e lutando pra criar... pra fazer isso aqui, pra entulhar isso aqui.. Porque só com coragem mesmo, viu? Amanhecer o dia com a casa cheia de micróbios, de bichinhos do lixo... Amanhecia o dia e a casa estava cheia de morotozinho branco, dentro do barraco, com as crianças... Tinha que limpar, botar criolina pra não atingir as crianças... Muito sofrido mesmo... (...) Tem uns quarenta anos que começou a entulhar assim... No dia treze de outubro vai fazer cinquenta e dois anos que eu moro aqui... (...) Porque eu morava em casa de aluguel, na Geraldo Farias... Aí minha filha morava aqui – a que mora aqui. O marido dela disse: “Tem um pedaço...Vou enfiar umas varas lá pra você fazer um barraco pra vocês” Aqui era maré... Eu sei que meu marido vinha todo sábado e botava uns pedacinhos de tábua... E a maré embaixo... A gente só vinha de barco... E a casa que a gente morava era de aluguel... Todo mês pagava quinze reais, naquele tempo... E o dono da casa tinha vendido, mas não tinha ido morar... Aí ele viu já os pedacinhos de madeira e disse assim: “Eu vou ficar aqui”... Mas se ele ficasse, não ia sair mais... Eu estava com dois meses de parida, morava lá no São Cristóvão... Meu cunhado foi me chamar correndo porque um rapaz ia ficar no barraco, ia fechar o barraco pra ficar... Meu marido: “Se ele ficar, a gente vai perder...” Ele pegou os meninos, naquele tempo a gente já tinha filhos, botou os meninos dentro da canoa, chegou aqui botou um colchão no chão, botou um bocado de tabuinha, tudo pequenininha assim, um lençol... Foi dia treze de outubro.. Deu uma trovoada...(...) Eu chorava......
Continuar leitura
(...) Minha casa é própria... Vou pra onde? Tem tanto lugar mais violento..Aqui é nossa família... Os vizinhos são nossa família... em outros lugares a gente não sabe... Aqui... todos filhos foram nascidos e criados aqui... Todo mundo se conhece, já sabe o comportamento... (...) O trabalho.. Sempre trabalhando e lutando pra criar... pra fazer isso aqui, pra entulhar isso aqui.. Porque só com coragem mesmo, viu? Amanhecer o dia com a casa cheia de micróbios, de bichinhos do lixo... Amanhecia o dia e a casa estava cheia de morotozinho branco, dentro do barraco, com as crianças... Tinha que limpar, botar criolina pra não atingir as crianças... Muito sofrido mesmo... (...) Tem uns quarenta anos que começou a entulhar assim... No dia treze de outubro vai fazer cinquenta e dois anos que eu moro aqui... (...) Porque eu morava em casa de aluguel, na Geraldo Farias... Aí minha filha morava aqui – a que mora aqui. O marido dela disse: “Tem um pedaço...Vou enfiar umas varas lá pra você fazer um barraco pra vocês” Aqui era maré... Eu sei que meu marido vinha todo sábado e botava uns pedacinhos de tábua... E a maré embaixo... A gente só vinha de barco... E a casa que a gente morava era de aluguel... Todo mês pagava quinze reais, naquele tempo... E o dono da casa tinha vendido, mas não tinha ido morar... Aí ele viu já os pedacinhos de madeira e disse assim: “Eu vou ficar aqui”... Mas se ele ficasse, não ia sair mais... Eu estava com dois meses de parida, morava lá no São Cristóvão... Meu cunhado foi me chamar correndo porque um rapaz ia ficar no barraco, ia fechar o barraco pra ficar... Meu marido: “Se ele ficar, a gente vai perder...” Ele pegou os meninos, naquele tempo a gente já tinha filhos, botou os meninos dentro da canoa, chegou aqui botou um colchão no chão, botou um bocado de tabuinha, tudo pequenininha assim, um lençol... Foi dia treze de outubro.. Deu uma trovoada...(...) Eu chorava... Deu uma trovoada.. Aì, minha filha, o único lugar que não molhava é onde botei a cama... Botei os três meninos que tinha na cama... Eu e meu marido mexíamos assim (mostra)... Toda molhada.. Parida ainda... Mas eu não tive nada.. Eu chorei... Passava maré, passava aqueles pedaços de pau pra gente pegar, ia pregando nas paredes, as prandes pra poder fechar o barraco... (...) As latas... Aí abria pra ir pregando nas paredes assim... E quando chovia, molhava tudo... Nós tínhamos fogareiro de carvão, fogãozinho o assim... A gente sofreu... Botava lençol, tudo, pano, pra fazer a parede assim... E levava assim, pegava uns pauzinhos, quando podia comprava tábua, um caixote pra ir pegando, fazia.. Fechou um vão.. Dali a pouco, foi pegando as tabuinhas quando a maré passava... Porque caía o lixo, a gente pegava as tábuas e ia pregando assim nas paredes... Sofremos muito...Quase todo mundo aqui era assim...(...) Um lugar que Deus deu... A gente vai roubar o quê? A gente foi entulhando, devagarzinho... Dois anos, depois mais dois... E aí graças a Deus..
Recolher