Projeto Memórias do Comércio 2020-2021 – Módulo Bauru
Entrevista de José Mauro da Conceição
Entrevistado por Cláudia Leonor e Wiliam Carneiro
Bauru, 07 de fevereiro de 2021
Entrevista MCHV_021
P2: Olá!
R1: Olá!
P2: Tudo bom com o senhor?
R1: Tudo bem.
P2: Então tá bom. Vamos gravar entrevista, então?
R1: Bora, menina!
P2: ((Risos)). Ó, obrigada por ter topado dar entrevista. Oi, Caio.
P3: Oi. Tudo bem?
P2: Tudo, e você?
P3: Tudo ótimo.
P2: Então tá. Já conversou com o José Mauro, já deu certo aí o...
P3: Já, já. Já está tudo certinho.
P2: O William vai fazer de P1, viu, Caio?
P3: Tá bom.
P2: Combinei com ele, é por causa da claquete. Que número que é essa daqui? É 21?
P3: Deixa eu dar uma olhada aqui.
P2: Eu abro aqui. Nossa, tem tanta coisa aberta.
P3: Deixa eu copiar o link.
P2: É a entrevista 21.
P3: 21?
P2: 21. Vamos esperar só o William...
P1: Já estou aqui, Cláudia.
P2: Opa! O William teve com a gente, seu José.
R1: Ah!
P2: Como que o senhor prefere ser chamado? José Mauro ou José?
R1: Ah, pode chamar de Mauro.
P2: Mauro? Está certo.
R1: É. Me chamavam de Zé Mauro, entendeu?
P2: Ãhn. Então, a gente chama de Zé Mauro.
R1: Não, me marcou muito esse Zé Mauro, você entende? Eu sofri...
P2: É?
R1: ... muito por causa desse Zé Mauro. Vamos só pôr o Mauro, está bom.
P2: Então está bom. Então está bom. O Willian teve com a gente aquele dia que a gente conversou com o senhor, né?
R1: Ok.
P2: O William também é morador aí do Mary Dota, conhece bem o bairro.
R1: Ok.
P2: A dinâmica toda aí da avenida, tá? Então, ele vai conduzir a entrevista e eu vou acompanhá-lo, tá bom?
R1: Tudo bem.
P2: Então, William, é HV_021, pra fazer a claquete. Você lembra da sequência?
P1: Você poderia passar, Cláudia?
P2: Olha, Projeto... eu faço a claquete. Eu faço a claquete.
P1: Tá bom.
P2: É José Mauro... deixa eu ver aqui. José Mauro...
R1: Da Conceição.
P2: Da Conceição. Tá. Então, Caio, podemos ir?
P3: Podemos ir, estou deixando já gravando aqui.
P2: Tá.
P3: Tudo certo.
P2: Então vamos lá. É uma entrevista informal, o senhor conversa com a gente como se o senhor estivesse tomando um café com a gente. Tá bom?
R1: Tranquilo. Sossegadinho.
P2: Então tá bom. Então vamos lá!
Projeto Memórias do Comércio de Bauru
Entrevista de José Mauro
Entrevistado por William Carneiro e Cláudia Leonor
Bauru, 07 de fevereiro de 2021
Entrevista: História de Vida 021
Transcrito por Selma Paiva
P1: Então, boa tarde, ‘seu’ Mauro. Eu gostaria que o senhor falasse, agora, né, um pouco, pra começar, o seu nome completo, a data e o local de nascimento.
R1: Ok. Eu me chamo José Mauro da Conceição, nasci no dia 18 de fevereiro de 1966. Eu sou de Marília, estado de São Paulo e eu estou aqui, hoje aqui, ao vivo e a cores, para todos vocês. Ok?
P1: Aê! ((Risos)) E qual é o nome do seu pai, da sua mãe?
R1: Ah, o meu pai é o José Aparecido Benedito da Conceição, né? E a minha mãe, Maria Rodrigues Cunha da Conceição, né? São ambos descendentes de... do pessoal lá do norte do país, né? Os pais deles eram um da Bahia, né? A minha vó, de Alagoas. É, minha família é um pouco de mistura, né? E a minha vó também... eu tenho uma vó que era portuguesa. Né? Então, essa mistura brasileira aí. Aí está aqui o futuro dessa nação aqui, que somos nós e nossos filhos.
P1: ((Risos)). E o senhor também tem irmãos?
R1: Tenho. Tenho. Eu tenho um irmão, né, e duas irmãs.
P1: E qual que é o nome deles?
R1: Um é o Jorge, né, o meu irmão, a minha irmã a Cristina e a outra é a Célia.
P1: Uhum. Sim. E o senhor falou que tem a origem, né, do norte, a família, né, vem do norte, tem a vó portuguesa, né? O senhor sabe como é que eles vieram pro Brasil?
R1: Repete de novo, fazendo favor.
P1: A sua família, o senhor disse que a avó é portuguesa, né? O senhor sabe quando que ela veio? Por que, a motivação?
R1: Não, assim, a história eu não sei, porque a minha mãe fala que a mãe dela faleceu quando ela... assim, ela tinha uns três anos de idade, né? E, naquela época, tinha muita falta, assim, de assistência médica, essas coisas, era muito carente, né? Então, ela teve um problema que ela acabou falecendo e a minha mãe era pequena. E a situação dos meus pais, da minha mãe, entendeu, foi uma situação, assim, de sofrência, contando com a geração de hoje, né? Entendeu? Então, deu ela pra criar, pra uma família, né? A família Coelho, que era de Marília, que era um pessoal de empresário, sabe como é? Então foi assim, foi uma vida meio difícil, dificultada, assim, entendeu? E eu não cheguei a conhecer essa minha avó, que era portuguesa. Mas o meu vô, eu conheci, que era baiano, né? Grandão, falava forte, arretado, firme, né? Sangue na veia, sei lá o que é. ((Risos)) Então, é mais ou menos assim, meio brabão, meio... né? Então, era assim, meio truculento. Entendeu? Foi assim, entendeu? O que eu sei da descendência dos meus avós, né?
P1: E aí, então, o senhor disse que a sua mãe morou em Marília, né?
R1: É, minha mãe morou em Marília.
P1: Com a sua família?
R1: Ah, minha família também. Entendeu? A história da minha mãe é uma história legal, assim, porque, naquela época, entendeu, como era muita dificuldade, essas coisas, registrava os filhos não quando nascia, que eles não tinham condições de registrar, os pais, assim, alguma coisa. A maioria das pessoas daquela época, entendeu, registrava quando ia, assim, tinha um problema de saúde, ia falecer, ia morrer, então registrava. Entendeu? Então, mais ou menos a história é assim. Agora, hoje, não, né? Hoje tem as leis, tem as formas, tem tudo mais fácil, tudo mais facilitado. Coisa que a juventude hoje talvez não conheça, entendeu? Eu vejo assim, hoje as coisas são bem mais fáceis.
P1: Uhum. E como que era... o senhor sabe como que era a vida lá em Marília, deles, dos seus pais?
R1: Ah, sei. Isso aí eu sei. Entendeu? O meu pai, quando era jovem, meu pai, né, era, assim, da parte da minha vó, da outra parte, entendeu, era filho... ele, praticamente, assim, não teve um pai do lado dele. Né? Foi criado, assim... a mãe dele foi a mãe e o pai dele. Então, era uma vida bem simples, né? Então, o meu pai era uma pessoa bem simples, mas uma pessoa bem correta, você entende? Uma pessoa esforçada, uma pessoa que lutou bastante pela vida. Entendeu? Então, o exemplo vivo do meu pai, o legado dele, entendeu, é nunca deixar a gente desistir das coisas, dos nossos sonhos, entendeu? Que, por mais que seja dificultoso, por mais que seja difícil, sonho é sonho, entendeu? É que nem eu falo, eu comento com meus filhos, né: a gente tem que sonhar, tentar construir um castelo. Entendeu? Porque, pelo menos, se a gente não conseguir construir esse castelo, pelo menos dois cômodos, um banheiro e um quarto, a gente fez. Entendeu como é? Então, os sonhos são feitos assim. Então, não importa o que essas pessoas falam, se você é ambicioso, se você não é ambicioso. Isso aí não importa. Entendeu? A gente não deve __ (19:03), não, a gente tem que partir pra cima e ir pra luta, né? Então... e sonhar é bom, né? Que o homem que deixou de sonhar, deixa de conquistar, né? Então, eu falo pros filhos, meus filhos têm a idade de vocês hoje, entendeu? Nenhum trabalha comigo, entendeu? Porque eu sou o adubo do sonho deles, você entende? Então, eu trabalho, entendeu, pra poder ajudá-los, que eu também sonhei, também. Um dia eu fui o jovem também e sonhei. Entendeu? Então, eu fiz o que eu consegui fazer, dentro dos meus limites, né? Eu fiz três anos de cursinho, pra você analisar. Agora, por que três anos de cursinho? Os professores até zoavam o meu plantão: "Ô Mauro, vai se formar pro cursinho?". Entendeu? Só que, naquela época minha, entendeu, não tinha esse apoio do governo, né? E se tinha, não era comentado. Entendeu? Só comentavam pro pessoal que tinha cultura na época, tudo. Meu pai não tinha cultura, entendeu, pra conversar. Meu pai só foi meu pai, não foi meu amigo, né? E hoje, eu vejo essa geração hoje, os pais são mais amigos, né? Senta, conversa, troca ideia, discute, troca exemplo, fala, comenta, entendeu? Aí, se o filho achar que deve pegar, pega. Agora, se ele não achar que deve pegar, ele não pega, mas ele paga o preço. Entendeu? ((Risos)) Então, não pode cobrar, né? Que nem eu falo pros meus filhos: “Vocês não cobram, não, que eu falei que não ia dar certo. Agora, você fez, né? Então você...”. Todo... eu falo assim, com meus meninos, que tudo tem um preço, né? Entendeu? O preço de quem faz certo e o preço de quem faz errado. Se fez errado, paga o preço; se fez certo, pega a bênção, né? Mais ou menos assim. ((Risos)).
P1: E o seu pai trabalhava com o que, na época?
R1: Meu pai trabalhava numa fábrica de vassoura, né? E depois dali meu pai foi ser gari da prefeitura. Né? Trabalhou muito de gari. E por meu pai não ter essa cultura, de conversar, tudo, naquela época, as coisas eram bem difíceis, né? Tinha o aluguel pra pagar, tinha de manter a casa, entendeu? A gente morava em casa simples, casa de madeira, que tinha muito na época, entendeu? Eu falo até pros meus filhos hoje, né? Na minha época, eu sabia quando era dia, quando era sol, quando era chuva, né? Porque casa de madeira, sempre tem um buraquinho, né? E sempre tem um telhado furado. ((Risos)) Então, é mais ou menos assim, pra quem morou em casa de madeira, o pessoal sabe. E... que eu falo assim pros meus meninos, né, que nem meu pai, né? Então, era muito difícil pra ele, porque ele era sozinho, então eram complicadas as coisas. Entendeu? E eu sofri por causa disso. Entendeu? Eu sofri bastante, né? Porque ele era sim ou era não, então não tinha conversa, meio termo, né? Que nem hoje, pelo menos eu sou assim, eu converso bem com meus filhos, né? Meu pai não tinha muito conversa não, entendeu? Era mais courinho do que carinho, entendeu? ((Risos)). Só o olhar... a educação era outra, entendeu? Só o olhar já falava tudo, você entende? Tem muita coisa. E não é só eu, não, viu? É aquela época, entendeu? Às vezes chegava uma visita em casa, entendeu? Tinha uma... que nem, eu estava no quarto, entendeu? Se a visita tivesse sentada lá na sala, na cadeira, sentada e meu pai na outra e eu tivesse que passar no meio deles, eu não podia passar. Entendeu? Se eu quisesse licença, eu tinha que pedir licença, entendeu? Se eu passasse de uma vez, sem pedir licença, na hora que a visita fosse embora, apanhava. Não era castigo não, era couro. Entendeu? Então, qualquer coisinha, couro. Então, a educação era outra, mesmo. Então, mais ou menos assim. Então, a gente foi criado dessa forma. Pelo menos eu, fui criado dessa maneira. Entendeu? Mas valeu a pena, entendeu? Nem por isso eu não deixei de odiar meu pai, entendeu? Cada vez mais eu gosto mais dele. Entendeu? E depois, a profissão do meu pai de gari, que meu pai trabalhou na prefeitura, aí passou um tempo, você vê, ele foi, assim, promovido, entendeu? Aí ele foi pro... tinha um matadouro municipal na minha cidade, ele foi trabalhar no matadouro. Né? Depois do matadouro, o passaram pra ser chefe das mulheres que varrem rua, essas coisas, aquelas margaridas que fala, eu acho, que na época tinha. Entendeu? E ali, depois que ele foi chefe delas, assim, tipo um coordenador hoje, que a gente pode falar assim, ele se aposentou, entendeu, na prefeitura, entendeu? Então, eu tenho orgulho, muito, do meu pai. Entendeu?
P1: Uhum. E a sua mãe trabalhava, ou não?
R1: A minha mãe chegou a trabalhar, assim, mais em casa, lavar uma roupa, passar uma roupa, entendeu? Mas era isso daí. Costurava um pouquinho pra fora, né? Mas sempre foi mais em casa, mais doméstica mesmo, a minha mãe. Só que a minha mãe, por ela ter a quarta série, entendeu, a minha mãe foi meu travesseiro, entendeu? Então, ela era uma pessoa que eu podia conversar com ela amplamente, entendeu? E ela sempre me organizava, você entendeu? "Ó, você deve fazer isso, você não deve fazer isso”. Entendeu? E depois que a gente foi crescendo, a gente acha que é dono do próprio nariz e, muitas vezes, a gente não escuta a mãe, entendeu? Foi onde, às vezes, que eu já levei umas pancadas da vida, por não ouvir a minha mãe. Então, mas... a maioria das vezes, a minha mãe estava correta e certa daquilo que ela falava pra gente. E a mãe sempre está certa, né? Mãe é mãe, né? E mãe é uma coisa do outro ser, né? Entendeu? ((Risos)) É, mãe é uma benção.
P2: Mas que que ela falava, assim? O que ela falava de conselho?
R1: Ah, eu tive uma situação muito crítica na minha vida, com 22 anos de idade. Eu sempre trabalhei nessa profissão, entendeu? Eu levei um tombo muito grande, entendeu? Psicologicamente, o homem está centralizado em três coisas: na família, no emprego, entendeu como que é? E na parte financeira. E eu praticamente, perdi essas três coisas de uma vez. Entendeu? Eu tinha 22 anos e eu não tinha experiência, né? Então, foi muito forte. Foi muito forte. Tanto forte, que eu queria fazer uma coisa até que... entendeu? Que nem ia ser aconselhável, entendeu como era? Mas era difícil. E eu falei pra minha mãe que eu ia fazer e a minha mãe sabe que eu sou um cara determinado, entendeu como que é? Falei assim: "Ó, mãe, ele vai me pagar e eu vou pegar o dinheiro e vou fazer isso e isso e isso”. Entendeu? Aí a minha mãe falou uma coisa que eu não esqueço até hoje. Aí a minha mãe falou assim: "Ó, depois dali, eu vou embora”. Porque na época não tinha internet, né? Não tinha nada. Aí minha mãe falou assim: "Você comentou isso com alguém?". Eu falei assim: "Não, não comentei com ninguém. Estou comentando com a senhora”. Ela falou assim... e foi coisa de família, né? Aí ela falou assim: "Ah, por que que você vai fazer?". Eu falei: "Ah, mãe, ó, o cara mexeu com a pessoa que eu mais gostava, entendeu? Já estava difícil essas coisas, o cara pegou, fechou a loja que eu trabalhava”. Entendeu? Que era um tio que eu tinha, eu trabalhava pra ele e ele fechou a loja. Entendeu como que é? E eu falei assim: "Então, e está complicado. Não por ter que fechar a loja, porque eu sou um cara novo, eu sei como arrumar outro emprego, eu vou trabalhar, daqui uma semana eu estou trabalhando”. Entendeu? E mexer, né, mexer nessa parte minha sentimental, sabe? Aí eu fiquei assim, né? Aí minha mãe falou assim: "Ó, você não vai fazer nada disso, meu filho, porque se você fizer isso, né, como seu tio vai ver a sua vitória?". Entendeu? A minha mãe falou desse jeito, entendeu? A vida é uma escada, uma hora você pode estar subindo e pode estar descendo. Não que eu desejo isso. Ela falou assim: "Se isso for verdade, que você está comentando, se isso for verdade, que você está falando, entendeu, quem vai pagar o preço seria ele, ou senão, você vai pagar o preço”. Eu falei assim: "Ô louco, mãe, a senhora está vendo a minha situação, como que eu estou. Eu estou arrebentado”. Entendeu? E, na época, ele estava bem financeiramente, porque quando eu fui trabalhar pra ele, ele não tinha quase nada, né? Assim, na parte material, entendeu? E eu não tinha experiência, eu tinha só o coração.
P2: Uhum.
R1: Né? Sou honesto, que nem eu sou até hoje. Entendeu? Assim, é duro a gente falar da gente, entendeu? Mas o exemplo maior são os filhos, a família, os amigos, que estão em torno da gente, que pode falar mais da gente, né? Porque a gente, às vezes, pode falar da gente e pode se tornar... a pessoa falou assim... se envaidecendo daquilo, né? Mas não, eu sou uma pessoa simples e humilde, né? Como eu aprendi na minha vida, né? Mas aquilo lá mexeu muito comigo. Eu tinha 22 anos, não tinha experiência, não tinha nada. Mas eu acho que Deus é... assim, Deus trabalha na vida da gente, que a gente não entende, né? Mas tudo isso que eu precisei passar, porque hoje eu sou pai também, né? Eu tenho meus filhos. Então, hoje eu posso direcionar bem os meus filhos. Então, eu tenho filhos meus, entendeu, que são os meus orgulhos, sabe? Não estão trabalhando junto comigo, nem nada, mas eles são batalhadores, né? Então, tudo aquilo que eu não consegui na minha vida, entendeu, eu tentei passar pra eles, né? E eles comem, né? Eles comem o alimento que eu falo pra eles, meus filhos, né? Quando eles... eu tenho o meu filho que tem 25 anos, o Cassiel, hoje ele é psicólogo formado, entendeu? Eu também sou psicólogo, eu sou o psicólogo dele, né? Eu falo dessa forma, né? Ele... a gente que senta, a gente conversa, entendeu? E, pra ele se formar em psicólogo, a gente ralou muito, né? Por quê? Porque chegou uma época que nem... o Brasil muda muito politicamente, né? De quatro em quatro anos, em cinco, em seis, em sete e sete anos, mais ou menos, o Brasil muda muito, na parte financeira, na parte política, entendeu? Que não é um país estável, né? E a juventude não tem essa experiência, né? Aí o meu filho falou assim: "Ó, pai, o meu patrão falou assim pra mim: ‘Ou é o emprego ou é faculdade’”. Né? Eu falei assim: "Não, nós não temos como escolher". Eu falei com ele: "É a faculdade, filho”. Entendeu? "Nós vamos acabar essa faculdade aí junto, aí. Nós vamos ralar, mas nós vamos acabar, nós vamos buscar esse canudo”. Entendeu? E o dia mais bonito, assim, da minha vida, é quando meu filho foi pegar o canudo lá na faculdade, entendeu? Que aí eu... tinha um espaço lá, tinha mais de oitocentas pessoas sentada lá, entendeu? E eu sou meio doidão, meio louco, sabe, quando fala de filho, sabe? Aí eu peguei e invadi lá, catei o canudo junto, entendeu? Junto com ele, entendeu? Aí eu estava nem aí, entendeu? Saí pulando, gritando, berrando, entendeu? Tem até umas fotos lá, sabe? Aí o pessoal foi ao delírio, aí todo mundo batendo palma. Foi legal. Aquele dia, eu me formei de psicólogo também, entendeu? Agora, eu tenho mais dois filhos homens, eu tenho uma filha que é professora, né? Ela também, eu consegui formá-la. Entendeu? Eu falei pra ela: "Ó, filha, não importa, o importante é ter um canudo”. Entendeu? Não desfazendo o papel de ninguém, você entende? Que nem o meu pai foi gari, não desfazendo o papel de ninguém. Mas eu falei pra minha filha: "Ó, filha, melhor do que limpar o chão pros outros”. Entendeu? "Pega um canudo, entendeu, melhor do que ser escravo dos outros”. Né? Que o pai tem a sofrência aí, a gente trabalha sábado e domingo, entendeu? No sacrifício, não tem tempo nem pra família, até é complicado. Pelo menos você é dona do seu nariz”. Entendeu? Porque o homem - como fala na palavra - o homem que não tem profissão é escravo do outro, entendeu? Então, pelo menos meus filhos estão no caminho certo. E eu tenho o meu filho do meio, também, que é o José Augusto, né, é um negrão folgado, entendeu? Raposa ‘véia’, entendeu? Tem 23 anos, ligeiro, entendeu? Mas, ó, é inteligente. Acorda seis horas da manhã, seis e meia, para meia-noite, meia-noite e meia, só estudando, ralando mesmo. Né? Aí ele chegou em mim e falou assim: "Ô pai...". Até fiquei bravo, quando ele entrou na faculdade, né? Quando ele entrou na faculdade, eu fiquei bravo com ele. Por quê? Porque eu paguei um ano de cursinho pra ele e eu falei pra ele quais faculdades que ele ia entrar, pra ir lá fazer a inscrição. Aí eu falei: "Vai na Londrina, na UEL, tem Rio Grande do Sul, tem as coisas tudo aí, Campinas”. Aí ele chegou em mim e falou assim que tinha passado na Unimar. Entendeu? Não... lá é faculdade particular, né? Aí eu falei: "Pô, meu velho, tu é folgado, hein, cara? Você faz um ano de cursinho, vai passar na faculdade, fala da Unimar pra mim?". Eu conheço a Unimar, entendeu? Eu conheço... eu conheci o Márcio, conheci tudo o pessoal ali, né, entendeu, que é da minha cidade, então foi cliente meu também, freguês meu. E aí eu falei: "Pô, mas tu é folgado, hein, cara? Você está achando que eu sou otário? Paguei um ano de cursinho pra você passar numa faculdade particular?". Mas Deus sabe de todas as coisas, né? Às vezes a gente critica, mas eu queria mostrar pra ele, você entendeu, que a gente sacrifica pra poder ver bem os filhos. Falei: "Pô, meu...". Aí eu pensei, na minha cabeça, que eu ia pagar a faculdade pra ele, já que ele prestou faculdade de Enfermagem e, na época, ficou mais de mil reais por mês, né? Aí eu falei: "Pô, meu. Você vai ter de ralar”. E aí ele falou assim pra mim... como ele é ligeiro, ele falou assim: "Não, pai, tem 20% ou 30, não sei o que é, que é da cor, né, porque eu sou pardo”. Aí ele falou uma palavrinha mágica também, né? Ele falou: "Pai, você não vai me ajudar?". Né? Aí quando ele falou isso daí, né, meu, já derreteu o coração, né? Queimou já, né? Falei: "Ah, nós estamos aí pra isso. Eu vou te ajudar”. Né? Aí foi uns tempinhos. Aí ele foi prestando os cursinhos lá, uma coisa pra ganhar desconto, até ele ganhou uma bolsa de 100%.
P2: Ó, que beleza!
R1: É, então. Ele ganhou a bolsa de 100%, aí eu fiquei contente, né? Aí um dia, ele chegou em mim, né e falou assim: "Ô pai, eu não quero fazer faculdade de Enfermagem”. Né? Eu falei assim: "Por quê?". Ele falou assim: "Olha, eu quero fazer Medicina”. Né? Aí eu falei assim - como a gente não pode matar o sonho dos filhos: "Ô filho, vou falar um negócio pra você. A faculdade de Medicina é cinco, sete, oito mil, dez mil reais por mês e o pai não tem condições de pagar isso aí. Esse aí é o primeiro ponto que eu estou falando pra você. Segundo ponto que eu vou falar pra você: e se eu tivesse condições, também, eu não ia pagar, entendeu? Por quê? Porque eu saí de baixo, entendeu? Ralei, eu acho que é muito dinheiro pra pagar uma faculdade, né? Agora, vou falar uma coisa pra você: eu não posso matar o seu sonho. Eu nunca vi médico com duas cabeça, entendeu? Nem braço com cinco braços e nem perna com cinco pernas, entendeu? Os caras são seres humanos, os cara ralaram, estudaram, tem amigo meu que é médico, tem amigo meu que é dono de hospital, tem amigo meu que é engenheiro, entendeu? Eu tenho amigo meu que foi preso, entendeu? Eu tenho amigo meu que é empresário, entendeu? Então, a sociedade oferece tudo isso daí. Agora, se a gente se esforçar, eu garanto que você vai ser médico”. Eu falei pra ele. Porque hoje tem amplas situações, tem vários lugares pra você ir, pra você ser médico hoje, entendeu, dentro de uma faculdade, né? E ele está estudando, ele estuda, entendeu? Presta o Enem, entendeu? No ano passado, ele ficou em nono lugar aqui em Bauru, em Medicina, né? Só tinha uma vaga, entendeu? Ele falou assim: "Ô pai, só tinha uma vaga, eu fiquei em nono lugar”. E esse ano, ele garantiu pra mim que vai entrar. ((Risos)) Porque a namorada dele entrou, você entende?
P2: Ó!
R1: Ano passado, entendeu? Então... e aí eu peguei no colo a menina, viu? Ela ia comprar lá no supermercado carne com a vó dela lá e hoje ela namora meu filho, né? Então, eu até brinco com ela, né? Eu acho que é minha filha também, entendeu? ((Risos)) Eu acho que eles estão no caminho certo, você entende? Agora, tem um terceiro filho meu, que é o mais novo, né? O meu filho foi na parte de esporte, onde que eu gosto muito também, pra tentar na... ser um jogador, né? Eu o apoiei, em todos os sentidos, entendeu? Pagava viagem pra ele e tudo, entendeu? E foi treinar num time grande, entendeu? O time queria ficar com ele, só que ele não queria saber, ele não gostava de treinar, você entende? Aí eu o xingava, falava se era medalhinha, se tinha ganhado quantos campeonatos. Entendeu? Mas é coisa de garoto, ele tinha 16 anos na época. Aí outro dia eu falei: "Você vai se arrepender”. Né? Porque os times o chamaram pra se alojar, né? Na época, todo sonho de menino era alojar, né, num time grande, entendeu? E ele nunca quis, entendeu? Taça São Paulo o chamaram pra jogar, ele não quis. Aí outro dia, ele falou assim: "É, pai, bem que eu podia jogar”. Eu falei: "Agora, filho, acabou, porque tem mais de 18 anos. Porque da minha parte eu não faço mais nada. O que o meu pai não fez pra mim, eu fiz pra você, então...". Agora está estudando. Falou que vai entrar na faculdade e está aí no caminho. ((Risos)).
P2: Está tudo encaminhado, né?
R1: Ah, eu creio que sim, você entende? Inclusive, ele trabalhava aqui, ele morava aqui comigo em Bauru, o meu mais novo, né? O Otávio, né? Ele, com menos de 18 anos, gerenciava mais de 30 homens na fábrica, entendeu? Que ele trabalhou na fábrica, desde pequeno, ele trabalhava na fábrica, né? Desde os 13 anos, quando ele veio morar comigo. E ele sempre trabalhador e é um menino, assim: com 14, 15 anos ele foi embora de casa, foi morar sozinho, meu filho. Entendeu? Ele tomou atitude e foi embora. Né? Ele foi embora, porque eu não queria pôr internet em casa, entendeu? Eu falei pra ele: "Eu não vou pôr essa merda, entendeu? Porque você entra numa página aí, você vai me complicar. Você é de menor e criança de menor é complicado. Entendeu? Eu não fico em casa, trabalho muito. Entendeu? E eu não confio. Vai chegar os seus amigos aqui...". Ele falou: "Ah, então vou embora, vou morar lá com o meu patrão”. Com o Daniel lá, que lá na fábrica tem um negócio. Eu falei: "Ah, então mora lá”. Entendeu? “Porque o homem... eu acho, na minha opinião, o homem que é grudado na calça do pai e na saia da mãe, não vai crescer. E eu não estou criando você, cara, pra ficar na minha barra, não, entendeu? Você quer morar sozinho, então você mora”. Entendeu? Foi meio assim, meio truculado, assim, tal, mas ele foi, você entendeu? Foi, eu acho que ele cresceu muito, sabe? Que ele é o mais novo, mas eu acho que ele tem mais experiência que os outros. Ele é um menino decidido também, sabe?
P1: Uhum. Então, o senhor fala, né, que a educação é uma coisa muito importante. E, na sua primeira escola, as suas escolas que o senhor estudou, o senhor se lembra? O senhor pode descrever...
R1: Rapaz...
P1: ... como é que era na época?
R1: Nossa, eu vou te falar tudinho como era a escola de antigamente e a escola de hoje, tanto que eu falei pra você que a minha filha é professora, entendeu? A sorte dos alunos que eu não sou professor, entendeu? Que, se eu fosse professor, a primeira lei hoje, que eu punha dentro do aluno, é o seguinte: proibido esse tal de smartphone, celular, é proibido entrar na sala. É proibido. Não pode levar celular na sala de aula. "Ah, mas tem tecnologia”. O governo que tenha a tecnologia dele lá dentro da sala de aula, entendeu? Não o aluno levar o telefone pra não sei o que lá. É proibido. Na minha... a primeira coisa, era proibido. Porque, na minha época, se existia uma coisa, entendeu? Educação. Né? E se existia uma coisa também, você entendeu? Que era o respeito, né, com os professores, né? Então, a gente respeitava. Agora, o jovem, entendeu, ele gosta de liberdade, ele gosta de fazer aquilo que é proibido. Na minha época também, a gente gostava, só que tinha um preço. Entendeu? Não é que nem hoje, entendeu, você faz, fala que vai ser punido, mas não tem punição. Na minha época, tinha punição. Eu estudava no Tomás Antônio Gonzaga, primeira escola de Marília e tinha uns oitocentos a quase mil alunos, na parte da manhã, né, no colégio. Então, era muito aluno. E na escola tinha a diretora, que era a dona Edneia. Dona Edneia. E tinha uma árvore bem frondosa, que a gente fazia aquela fila indiana: mulher de um lado, homem do outro, você entendeu, né? Tipo o do exército. Aí você punha a mão, tomava a distância... no ombro da pessoa, tomava aquela distância, né? E ficava na fila e batia o sinal e subia. Todo mundo em silêncio, nada de bagunçar, nem nada de nada, não. Mas aí passava o inspetor na frente e passava uma inspetora no fundo, entendeu? E cantava o Hino Nacional todo dia, entendeu? Antes de entrar na escola, de manhã e na hora do recreio cantava o hino, que era o Hino da Bandeira, entendeu? Então, cantava o hino, né? E a gente cantava. E se desse um pio e fizesse gracinha, ninguém pegava e puxava orelha, não, entendeu? Pegava pelo braço, entendeu, você ficava lá de prontidão, lá em frente da árvore, entendeu? E mil pessoas quase, oitocentos alunos te olhando você lá embaixo da árvore. Entendeu como que é o negócio? Então, isso daí, cara, mexe com o psicológico da gente, né, quando a gente é jovem, né? Ninguém quer ficar debaixo da árvore pagando mico, né, pros amigos, né? Hoje não tem nem fila, hoje não tem nada, você não sabe quem que é o aluno que vai pra escola ou não, tem nem uniforme hoje. Entendeu? Na minha época, era tudo uniformizado. Se eu não tivesse com uniforme, eu voltava pra casa, entendeu o negócio? Então, eu acho isso aí é questão de... não é que a gente é ignorante, nem nada, entendeu? É, mas mudou. Mudou, mas mudou pra pior, entendeu? Você vê os alunos hoje... a minha filha é professora. Ela chegou em mim e falou: "Ô pai, eu estou formando bandido. Eu não estou formando cidadão, entendeu? Porque o pessoal não quer assistir aula. E eu não grito com ninguém, desde que começou a falar dentro da sala de aula, eu cruzo meus braços, eu vou de ré até na lousa, fico olhando pra eles, entendeu? E quando eles param, eu falo: ‘Se quiser ir embora, você pode ir’”. Entendeu? Mas fica quieta.
P1: Ela é professora de quê?
R1: “Eu não vou gastar minha voz, nem nada”, ela fala. Entendeu? "Se for o caso de presença, a gente põe presença lá e vai embora”. Ela fala desse jeito. Entendeu? Então, hoje, não tem mais aquele respeito com as pessoas, entendeu? Com os professores, né? Por quê? Porque a atitude, a educação, vem de casa. Nossa. E tem muitos pais que não conhecem os filhos e acham que os filhos são donos da razão. O meu filho, quando tinha 16 anos, meu filho mais velho, eu pensei que era um menino muito inteligente, né? E eu pensei também que ele era um menino, assim, respeitoso. Aí, outro dia, eu cheguei lá na escola dele, entendeu, pra conversar lá com o diretor, pra ele sair mais cedo, a professora me cruzou e falou: "Você é o pai do Cassiel?". Eu falei: "Sou”. Aí ela falou assim: “Ó...”. Começou a argumentar do meu filho, né? Ela falou assim: "Ó, o Cassiel está assim, assim, assim, dentro da sala de aula”. Eu falei: "Chama ele lá pra mim". Ela o chamou, tal. Aí sentou eu, ele, a professora e o diretor, né? Aí eu ia falar com a professora, ele começou a argumentar, entendeu? E eu falei: "Cala a boca”. Eu fui na segunda, ele argumentando, eu falei: "Fecha a boca”. E na terceira, eu falei: "Ó, você sabe que não vai ter a terceira, viu, meu amigo?". A hora que ele foi abrir de novo, aí eu parti mesmo, entendeu como que é? Então, o seguinte: não é que a gente é ignorante, a gente não é esse negócio. Então é o seguinte: os filhos, muito... eu não vou falar dos jovens não, vou falar da criança hoje, de três anos, de quatro anos, de cinco anos. Elas testam o pai, entendeu? Então, o que acontece? Você fala assim pra criança: "Não sobe aí no sofá”. E ela pega e sobe. Aí você fala assim: "Se você subir no sofá, eu vou te quebrar a perna”. Pô, já falou errado, entendeu? Parece que você vai quebrar a perna de um filho? O pai não vai quebrar a perna do filho. Mas se o pai fala assim: "Ó, se você subir no sofá, eu vou te pôr de castigo, eu vou dar uma chinelada”. E o pai e a mãe cumprir com aquilo que faz, entendeu, na segunda, na terceira vez, a criança não vai fazer aquilo. Agora, ela sobe lá, você não quebrou a perna dela, o que vai acontecer? “Não vai quebrar, então vou continuar subindo”. Então, acontece, até hoje, assim, na sociedade eu vejo assim. É muita promessa e pouca atitude, você entende?
P2: Mas antigamente não era assim, né, ‘seu’ Mauro?
R1: Não. Antigamente, não. Era só o olhar, que nem eu falei pra você. Era só olhar. Meu pai olhava...
P2: Mas na escola também era só olhar?
R1: A escola?
P2: É.
R1: Ah, a escola era só o olhar. A minha escola foi isso daí.
P2: Onde o senhor estudou?
R1: No Tomás Antônio Gonzaga, lá em Marília. E eu tinha professor... assim, as notas nossa era de um a dez, eu tinha um professor, o professor Edgar, de português, que a nota dele era de um a cinco. Não tinha dez. Aí depois foi pras letras, A, B, C, D e E. A nota dele era só até C, não tinha nem B nem A, você podia ser o melhor aluno, entendeu?
P2: Ele não dava?
R1: Não dava. Ele não dava nota nem B e nem A. Entendeu? Mas foi um dos melhores professores que eu tive. Eu tive bons professores, viu? Tenho saudades dos meus professores, assim. Eu tive bons professores. Entendeu?
P1: Quais foram eles?
R1: Oi?
P1: Quais foram eles? Quais as matérias que o senhor gostava?
R1: Ah, a matéria que eu gostava era Educação Física, você entendeu? Fala assim: “Mas, por quê?” Eu gostava de esporte, então era o professor Furlanetto. E o professor Furlanetto era preparador físico do Marília Atlético Clube. E, na época, ele queria me levar pra jogar bola, pra ser um profissional. Eu tive amigo meu que jogou no Palmeiras, jogou no Santos. Entendeu? Jogou no Marília, meu primo também jogou. Eles não tinham nem metade da minha bola. Né? Eu jogava bem, entendeu? Eu jogava bem. E era assim: na nossa classe, tinha um aluno, o... agora não vem o nome dele, mas o menino era crânio. Entendeu? O menino era dez, né? E na Educação Física, ele era uma negação, você entende? Então, ele... ((Risos)) eu o ralava na Educação Física e na escola, ele me ralava, você entende? Entendeu? Era assim. Então, era gostoso, assim. Tive um... era gostoso, foi bom. Professora... tinha a Rosalina, professora de Geografia, né? O professor Edgar, que era de Português; o professor Abel, de Inglês, né? Ah, tinha uns pares de professora. Tinha a professora... eu tive uma professora também, no segundo ano, que eu me dei mal com ela, sabe? Porque eu comecei conversar... sentava no fundo... segundo ano, eu não esqueço, ela deu uma reguada na minha cabeça de quina, ‘vei’, entendeu? Fez um galo na minha cabeça, entendeu? A Dona Zoila, parece, Dona Zoila. Eu cheguei em casa, eu falei com meu pai. Falei: "Pai, olha aqui, ó”. Mostrei até a cabeça, né? Eu falei: "Pai, olha, ela deu uma reguada aqui, tal”. Ele falou assim: "Ah, eu vou lá amanhã conversar com ela”. Ah, eu fiquei até alegrinho, né? Falei: "Agora eu não vou levar mais reguada". Cheguei lá, rapaz, me dei mal. Você acredita, rapaz, que era amiga do meu pai? Entendeu? E falou assim pra mim... ((Risos)) ele falou assim... me chamou e falou assim: "Ó, o dia que ele ficar assim, do mesmo jeito, a senhora pode dar outra nele”. Mas nunca mais falei, você entendeu? Fiquei quietinho, entendeu? Então, era assim. Entendeu? Na nossa época, era assim, entendeu? É olho por olho, filho. Entendeu? Você fez, vai pagar o preço. Hoje não, hoje é tudo light. Hoje eu vejo aí rapaz, dá dó das crianças, dá dó do jovem, entendeu? O jovem hoje com 15, 16 anos, entrando na bebida, nas drogas, né? Então, é difícil, né? Entendeu? É difícil, viu. Eu tenho meus amigos que têm os filhos na droga. Então, é complicado, arrebenta com a família isso daí. Né?
P1: O senhor falou, então, que gostava muito de jogar bola, então. Quase jogou no MAC?
R1: Ah, eu gostava. É, então, o meu primo jogou, foi jogador, você entende? Eu não fui jogador, mas eu fui amigo dos jogadores, entendeu? Tinha a camisa... o meu filho jogou. Esse meu filho mais novo aí, ele tem foto lá, ele jogou, ele treinou até com o Carlão. Quando ele falou assim pra mim, eu falei... ele falou assim: "Ô pai, estou treinando com o Carlão”. Né? Na minha época, o Carlão já era velhinho, entendeu? Eu falei: "Bom, o Carlão está andando?". Ele falou assim: "Não, ele põe uma cadeira lá no meio de campo lá e fica sentado, só mandando fazer”. Eu falei assim: "Não...". Né? Porque, na época do campeonato de 1978 e 1979, o campeonato era outro, que nem o Noroeste, XV de Jaú, eles revelaram bastante jogador pra time grande, né? Entendeu? Então, foi assim... então, eu conheci bastante gente... assim, os jogadores, os caras tudo, eu conheci. E eu trabalhei uns três anos lá no clube, né? Nós tínhamos... eu vendia sorvete, na época lá. Eu ganhava dinheiro, entendeu? Eu sempre fui vendedor, entendeu? Meu negócio é vender. É vender, né? Conversar, trocar ideia, entendeu? Fazer daquela coisa, uma simples coisa, um grande negócio, né? Eu sei vender, entendeu? Eu gosto, eu gosto de vender. ((Risos))
P1: O senhor vendia nos dias de jogo?
R1: Ah, vendia, hein, cara? Nossa! Vendia e ganhava dinheiro, né? Assim, não é que eu ganhava, eu não administrava o dinheiro, quem administrava o dinheiro era o meu pai, né? Só que o meu pai não tinha, assim, uma experiência pra administrar, porque, naquela época, ele queria... né? É a vida sofrida, não tinha uma cabeça legal, né? É que nem hoje eu falo com meus filhos: o dinheiro não foi feito pra gastar, entendeu? Porque dinheiro todo mundo ganha, mas poucos que guardam o dinheiro, entendeu? Então, a vida foi me ensinando, entendeu? “Dinheiro, filho, não é pra gastar, dinheiro não foi feito pra gastar, entendeu? Então, você separa um pouquinho”. Entendeu? Porque na própria palavra de Deus fala: “Há tempo de guardar pedras” - não é uma coisa assim, mais ou menos? – “separar pedras e de gastar pedras”. Ganhar dinheiro, entendeu como que é? Com dinheiro é assim, entendeu? Há tempo pra tudo. Agora, a gente... a vida passa muito rápido, que eu falo com meus filhos. Você tem sessenta anos... hoje eu estou com 56 anos, eu tenho 14 anos de vida, de força, porque depois dos setenta, você não tem mais força. Entendeu? Que nem hoje, eu estou com 56 anos, eu tenho inveja de mim mesmo com 22 anos. Se eu tivesse com 22 anos, com a cabeça que eu tenho hoje, ‘vei’, entendeu? Nem minha sombra me segurava, você entende? Eu dava rasteira nela. ((Risos)) Então, é assim. Só que com 22 anos você não tem cabeça, você entende? Você quer sair, passear. Entendeu? Ir num barzinho, né? Então, é mais ou menos assim. É necessário viver? É necessário viver, entendeu? É legal? É, entendeu? É bom, é gostoso, entendeu? Mas tem que saber, né? Você não vai pegar cem e gastar cento e dez, você entendeu? Pega cem e gasta vinte, né? Apesar que: "Ah, está duro, está duro, está duro”. Mas sempre foi duro, sempre foi difícil. Eu acho que hoje é mais fácil que antigamente. Por que é mais fácil hoje? É simples de ver as coisas, a visão das coisas. Por quê? Antigamente, todo mundo tinha dinheiro pra encher o carro de combustível. Hoje, todo mundo tem carro e não tem dinheiro pra encher o carro de combustível. Entendeu como que é? O cara vai no posto e põe dez reais, quinze reais, vinte reais, entendeu? Na minha época foi assim, entendeu? Então, assim, na minha época, pra você tomar um refrigerante, era só no fim do ano, a maioria das pessoas. Eu, quando eu tomava refrigerante, eu furava com prego a tampinha, pra não acabar logo, entendeu? ((Risos)). É, então mais ou menos assim, entendeu? Hoje não. Hoje, se você quiser Coca-Cola você vai lá, atravessa aqui, você pega, entendeu? Se você quiser... o que você quiser comer, quer comer uma pizza, você come, entendeu? Antigamente, era pão com mortadela no boteco. Entendeu? Quando o pai levava. Isso era o lanche da gente.
P2: E era bom, não era?
R1: Ãhn?
P2: E era bom, não era?
R1: Nossa! Meu pai me levou duas vezes, eu não esqueci até hoje. ((Risos)) Meu pai me levou uma vez lá na quermesse pra comer frango assado, né? Eu não esqueci até hoje, entendeu? Então, assim, a vida é gostosa de viver, né? A vida é muito boa, pra quem sabe viver. Ah, por quê? Ah, hoje não, hoje a geração, o que acontece? A gente não teve nada disso, então a gente quer fazer o melhor pros filhos, né? Que nem hoje, o meu filho... eu dei, na época... faz uns quatro anos atrás, quando ele fez aniversário, eu dei um Prisma pra ele. Entendeu? E fui: "Vai lá ver o carro”. Né? Ele queria comprar outro tipo de carro mais inferior, mas ele falou: "Ó, pai, eu gostei desse carro aqui, pai. Mas a moça falou que tem mais três pra... que está interessado”. Eu falei: "Ah, isso aí é jogada dela, não tem mais nada, não” "Ah, mas como o senhor sabe?". Eu falei assim: "Não, passa o telefone que eu vou ligar pra ela, porque o carro é seu” "Mas por quê? Como você vai fazer?". Eu falei: "Fica tranquilo, filho, eu nasci no comércio, eu sei como faz essas coisas". Eu cheguei pra ela e falei o seguinte: "Ó, você guarda o carro pra mim, que o dinheiro vai sair daqui 15 dias e, quando sair, eu vou dar um cafezinho pra você, tá bom? Eu vou te dar X em dinheiro, pra você tomar um café”. Dá pra ir até num restaurante pagar o churrasco, você entende? Ela falou assim: "Não, então está bom, o carro pode deixar, que eu vou guardar”. Aí eu peguei e dei o carro, entendeu, pra ele. Mas meu carro é velho, você entende? Então, o que é? Aquilo que a gente não teve, a gente acabando fazendo com os filhos.
P2: A gente dá.
R1: Entendeu como que é? Então, eu não sei se eu ajudei meu filho, entendeu, ou se eu detonei com a vida dele. Meu filho, depois que ele pegou esse carro, que me deu um prejuízo depois, você entende como que é? É minha irmã me ligando pra mim, ele... virou milionário, sabe? Mas hoje não, hoje... aí depois ele levou umas cacetadas na cabeça, aprendeu, eu tomei o carro dele e deixei guardado, entendeu? Falei: “Ó, não é assim a vida, não, cara, entendeu? O seu vai ficar guardado aqui, entendeu?". Aí eu falei... ah, hoje não, hoje a gente conversa, tal. Ele passou... eu falando pra você, ele passou no... ele terminou a faculdade de psicólogo, né? Hoje ele é policial militar, né, meu filho. Então, eu tenho orgulho disso aí, né? Eu tenho orgulho, muito, disso aí, né? E vai aprendendo com a gente. Então, é gostoso, né? É gostoso.
P1: E o senhor disse, então, que, né, assim, desde sempre, o senhor gostou muito do comércio, gostou de vender.
R1: Ah... comércio.
P1: ... quantos anos o senhor tinha, quando o senhor começou no comércio?
R1: Ó, eu comecei...
P1: (55:34) com seu tio.
R1: Nessa parte aí, eu vou falar pra você: nessa parte aí, o meu pai, por ser uma pessoa, assim, meio ignorante, muito orgulhosa, orgulhoso, eu paguei um preço alto. Por quê? Naquela época, tinha um negócio de batizar as crianças, essas coisas, tudo. Então, eu tinha batizado uma das minhas irmãs e hoje ela não está entre nós mais, né? Mas, assim, era compadre do meu pai e ele trabalhava no Banco Real, entendeu? E nesse Banco, ele era, assim, eu não estou lembrando agora o setor que ele fazia, mas ele era mais que o gerente, né, no setor. E, naquela época, não tinha o office-boy, né? Falava outro nome, né? Aí a minha mãe falou assim: "Ô, Zé, arruma... vai lá, conversa com o seu compadre lá, fala pra ele arrumar um espaço no Banco lá pro nosso filho lá, pro Mauro, né, pro menino, né, pra ele ir lá trabalhar no Banco, de contínuo”. De contínuo, falava de contínuo, né?
P2: É.
R1: Não era office-boy, era contínuo. Aí meu pai: "Não, não vou amolar ninguém, não, vou fazer isso aí, não”. Aí eu fui trabalhar com meu tio __ (56:56) eu fui levar marmita pro meu tio, levando almoço. Entendeu? Aí o meu tio tinha um açouguinho, aí eu fui levando almoço. Fui levando almoço ali e ele me segurava, né? Segurava, pra ele sair um pouquinho, pra ir no Banco, tudo, entendeu? E ali fui aprendendo. Né? Fui aprendendo uma nova profissão, aí até quando eu fui trabalhar integral com ele. E o meu salário era um botijão de gás no fim do mês, quinhentas gramas de carne moída e um frango por semana, entendeu? E, em dinheiro, eu recebia, se fosse hoje, cinquenta reais, que eu recebia. Por mês. E eu ficava contente. Entendeu? Por quê? Porque eu estava aprendendo uma profissão. E eu tenho orgulho da minha profissão. Porque, na minha profissão, demora uns três, quatro anos pra você aprender, tipo de uma faculdade, pra você aprender certo, entendeu? Se você aprender errado, entendeu, você vai falar assim: "Ah, eu sou um balconista, sou um açougueiro”, mas não é, você é um cortador de carne. Você não é um balconista, você não é açougueiro. Entendeu? Então, eu tenho orgulho disso daí, da minha profissão. Porque nem faculdade tem, entendeu? Então, é uma coisa difícil de aprender, né? E eu trabalhei com o meu tio muito tempo, entendeu? Depois fui trabalhar, passei em outras casas de carne na minha cidade, né? Trabalhei num supermercado de grande porte. Fui coordenador, entendeu? Fui preparado pra ser gerente de loja, entendeu? Aí tive problema familiar, então eu não pude. Então, eu sei muita coisa, só que... "Ah, mas qual que é a sua situação hoje?". A minha situação, não me falta nada, graças a Deus. Podia ser melhor, mas por quê? Só que hoje, que nem, eu passei por vários tipos de... como funcionário, também, que a gente pega pra gente, quando a gente é responsável, situações econômicas do meu país, que eu falo pros meus filhos. Quando eu disse pro meu filho, que eu falei pra você, que eu perdi dinheiro com ele, ele foi abrir uma empresa, eu falei que não era hora de abrir empresa, que estava com problema, na época, com a Dilma e o Eduardo Cunha, né? Eu falei: "Filho, o Brasil está numa situação difícil, agora não é hora de abrir nada, né, por causa isso, isso e isso”. E meu filho teimou comigo e perdeu dinheiro. Não foi o dinheiro dele, não, foi o dinheiro meu. Né? Depois que deu errado, ele veio falar comigo. Então...
P1: Ele tentou abrir loja do quê?
R1: Oi? Ele abriu uma casa noturna, com três ambientes. Entendeu como que é? E eu falei que não era pra abrir aquilo, entendeu? Porque uma das coisas principais, quando você está começando, é não ter despesa, entendeu? Porque você não tem o fluxo de caixa, a empresa, né? Quando... geralmente um erro... um dos maiores erros que tem, né? Que o cara não tem fluxo de caixa e tem despesa. Então, você tem que conter a despesa, entendeu? É que nem agora, o que aconteceu agora com essa epidemia aí: muita loja fechada. Entendeu? Tem cara que tem dinheiro, antes de quebrar, o cara fechou, entendeu? Não é que ele quebrou, entendeu? Ele não quis gastar dinheiro, __ (1:00:10) dinheiro bom, porque coisa boa, você não joga fora, que é dinheiro. Coisa boa, a gente guarda, entendeu? Agora, quem ficou, quem está na luta aí, claro que não tem o dinheiro, entendeu? Porque muitos quebraram porque não tinham dinheiro, entendeu? Porque eu passei vários tipos de problemas financeiros, assim, que nem eu falo, assim, crise econômica no país, como foi na época do real, época de inflação, entendeu? Teve uma época que eu... na época do Sarney, você punha três vezes o preço da carne ou quatro vezes por dia, o preço da carne, entendeu? E a carne era tabelada, entendeu, você trabalhava, daqui a pouco a polícia vinha na porta, vinha a Rede Globo na porta, né? Então, às vezes você nem era trabalhador, parecia que você era bandido, entendeu? Por causa da política econômica do país, né? Então, era complicado. E hoje, o jovem...
P1: Teve uma época que faltou carne, né, no Brasil?
R1: Então, foi na época do... acho que foi do cruzado, né? Não sei, foi na época do real, foi alguma coisa assim, que faltou. Né? É que nem agora, hoje, também. Hoje, não é que... hoje também, está passando pelo mesmo caso que nós passamos em 2014. O povo esquece das coisas. Né? Hoje também não tem carne, entendeu? ((Riso)) Hoje não tem. Tem, tem, mas tem que pagar, né? O preço está lá em cima, subiu, porque se tivesse bastante carne, o preço não estava lá em cima, por causa da exportação, né? E se o governo tabelar, a carne some. Então, o governo não tabela, porque o governo sabe como que é a carne. E é um comércio, assim, que eu gosto, sabe? É um comércio que foi feito pra quem entende, né? Não é pro cara aventureiro. Às vezes o cara tem bastante movimento, né, que hoje têm vários tipos de trabalho, o pessoal trabalha, entendeu? Mas é complicado trabalhar no comércio, mas é gostoso, porque de manhã é uma coisa, à tarde é outra e à noite é outra, entendeu? A primeira semana do mês uma coisa, a segunda é outra, na terceira é outra e na quarta é outra. Entendeu? Então, tem o dia do vale, tem o dia de pagamento, entendeu? Então, é uma coisa, assim, geniosa, cara, gostosa. Entendeu? A coisa é gostosa, entendeu?
P1: Complexa, né?
R1: Ah, cara, ó, é muito bom, assim, sabe? Eu tenho a visão, sabe? Outro dia uns amigos meu falaram assim: "Ó, e fulano, e fulano?". Eu falei: "Cara, esse cara não vai longe”. Entendeu? Eu falei com meus amigos. "Ah, por quê?" "Porque não vai, cara, eu não estou desejando mal pra ninguém”. Você entende? Porque eu tive os amigos lá na minha cidade, fizeram a mesma coisa, você entende como que é? É tão complicado, que o produto é caro, entendeu? Você não pode ficar... comprar um produto caro e pôr o preço lá embaixo. Né? É complicado, né? O comércio é complicado. Ainda mais no gênero alimentício, né? O gênero alimentício é complicado, entendeu? O cara tem que ser muito ligeiro, né? Tem que ser ligeiro. Mas, apesar que, hoje, também, entendeu, existe muito acompanhamento, né? Entendeu? Se a pessoa for, assim, uma pessoa humilde, a pessoa aprende. A pessoa aprende. Mas que nem outro dia eu estava falando com o meu gerente do Banco, né? Hoje, essa época de hoje, foi feita pra separar, no comércio, vamos falar assim, os meninos dos homens. Entendeu? Quem pensa como menino, vai quebrar mesmo. Entendeu? Agora, o homem que, assim, que é mais, assim, vai com a... devagarzinho, tocando o barquinho bem lento, na boa, esse aí consegue sobreviver um pouquinho mais.
P1: Uhum. E...
R1: E a molecada é muito afoita, no comércio, né? Você pega um jovem no comércio, ele é afoito, ele tem força, né? Ele acha que pode, entendeu? Não quer ouvir, né? É onde vai quebrar a cara, entendeu? Mas tem jovens que gostam de ouvir. Eu tive um patrão meu que era jovem. Você entendeu? Ele gostava muito de conversar comigo, né? E, quando ele foi reformar a loja dele, por ele ser jovem, ele me chamou lá no escritório. Ele falou assim: "Ô ’seu’ Mauro, o que você acha que deve... como que vai ser o meu balcão?". Aí eu expliquei pra ele como que seria o balcão. Né? "Rapaz, é assim?". Eu falei: "É assim”. Aí veio o cara fazer o balcão, eu falei assim: "Ó, faz um contrato aí”. Entendeu? "Aqui, ó, você vai fazer o balcão de madeira, entendeu? Você vai fazer um balcão de... que faça um produto... tipo de um isopor, fica bem durinho, sabe? Por dentro do balcão, sabe? Então põe aí, esse produto aí também, pra ficar leve, no balcão, pra gelar bem, pra não perder temperatura”. Entendeu? Então, você vê que tem gente que tem cabeça boa.
P1: Uhum.
R1: Então... e o menino ligeiro, rapaz, esperto, cara. Entendeu? Esse meu amigo aí.
P1: E aí, o senhor trabalhou, então, com seu tio, né, nesse açougue e aí, depois já veio pro Mary Dota? Como é que foi isso?
R1: Não, não, não. Não, depois eu trabalhei muito tempo em Marília, entendeu? O Mary Dota foi o seguinte, cara, ó, vou falar pra você: quando Deus está na nossa vida, entendeu? Eu creio nesse Deus aí que eu sirvo também. O Mary Dota... você está me ouvindo?
P2: Pode falar, pode falando. Saiu a imagem.
R1: É. O Mary Dota, essa foi uma coisa que estava no meu sangue. Entendeu? Que foi um sonho, sabe, que eu realizei. Porque o Mary Dota, antes de abrir o Mary Dota, como eu trabalhava lá em Marília e eu tinha uma experiência lá, eu vim aqui no Mary Dota. Não morava ninguém. Só tinha beija-flor, as casas estavam fazendo, a rua era de terra, né? Aí eu fui lá na Nações, no escritório, pra pegar uma casa aqui, porque eles vão montar um comércio lá, três mil casas, não sei, mais ou menos.
P2: Foi lá na Cohab?
R1: É, eu fui lá na Cohab. Aí chegou lá e falou assim: "Não, é só pra quem mora em Bauru”. Né? Eu falei: "Pô, então está beleza”. Aí se passou uns tempos. Passou uns vinte anos, mais ou menos, quinze anos, vinte anos, passou. Aí eu voltei aqui uma vez. Aí eu olhei bem um açougue e falei: "Nossa, que açougue bonitinho, ajeitadinho”. Aí demorou um tempinho. Aí, faz uns quinze anos que eu estou aqui, aí um amigo meu falou assim: "Você quer trabalhar em Bauru, Mauro?". Eu falei: "Pra quem?". Ele falou: "Ah, pro português”. Eu falei: "Rapaz, eu preciso, hein, cara? Eu preciso, porque eu não posso ficar aqui na cidade, mais”. Né? Que eu estava com a separação da minha mulher lá, da minha ex-mulher, né? Falei: "E eu não quero ficar aqui, sabe?". Eu falei pra ele. Aí ele falou assim: "Ah, vai lá, rapaz, que vai ser bom pra você. O cara é meio chatão, né? Ele é meio assim”. Eu falei: "Ah, mas eu fui criado nesse sistema já, cara, pra mim, é um beijinho na flor, cara, entendeu?". Aí beleza. Aí eu vim aqui e deu certo, sabe? Chegou aqui estava tudo preparado pra mim. Trabalhei quinze anos pra ele, a gente sempre se respeitou, né? Ele foi meu patrão, ele foi meu amigo, né? Hoje ele vem aqui e me auxilia ainda, né, na parte da contabilidade, passo o balanço, a gente vê certinho quanto que deu, quanto que não deu, né? Ele tem a experiência, né? Porque ele falou assim: "Ô, Mauro, eu posso vir aqui?". Eu falei assim: "Ô louco, ‘seu’ Elias, com certeza. Vem aqui me auxiliar, que vai ser de grande valia”. Porque a experiência das pessoas, né? Quando a gente está cercado de pessoas com experiência na vida da gente e a gente dá ouvido, não tem como não dar certo as coisas. O sucesso é mais rápido, o sucesso vem mais rápido, né? Eu falei assim: "Não, é legal”. E ele é meu amigo, sabe? Ele vem aqui uma vez por semana, né? Eu falei: “Ó...”. Né? Meu xodozinho, assim, sabe? Eu gosto dele, a gente conversa.
P2: Como ele chama?
R1: “Seu’ Elias.
P2: E ele é português, você falou, né? O ‘seu’ Elias é português?
R1: Ele é português. Ó, o português...
P1: Ele tem sotaque e tudo?
R1: Ãhn?
P1: Ele tem sotaque e tudo?
R1: Tem, tem um pouquinho, mas faz tempo que ele veio pro Brasil, né? Mas o português, ele é brabo, né? Português é brabo. É, só que tem um negócio, o português: ele tem um coração bom, você entende? O arrependimento dele é no ato. Entendeu? Ele fala um monte de merda pra você, mas daqui a pouco está arrependido, você entende? Aí, depois, conversa, é assim mesmo. Agora, o espanhol, meu amigo, espanhol é complicado, hein? Espanhol não tem dó, não. Entendeu? Espanhol, ele fala, é complicado o espanhol. É assim, entendeu?
P2: Ô Mauro, mas assim, esse seu amigo que te apresentou pro ‘seu’ Elias?
R1: Foi. Ele me apresentou, assim, né? Porque eu estava na casa do meu... eu estava lá no Rio Grande do Sul, né? Aí eu vim pra Marília, aí um amigo meu falou assim pra mim: "Ô Mauro, você não quer trabalhar em Bauru?". Eu tinha passado no açougue dele, né? Ele falou assim: “Ó...”. Eu falei: “Ah, eu vou, cara”. Falou: “Eu já trabalhei lá”. Né? Eu falei: “Ah, beleza”. Aí eu vim pra cá mesmo, sabe? Aí eu vim aqui e estou aqui. Aí, demorou... vai fazer, o quê? Aí ficou, mais ou menos... é complicado falar pra você, sabe? Tudo a gente tem que ter paciência nas coisas, né? Aí, eu trabalhei pra ele a primeira vez, trabalhei uns dez meses, né? Aí, esses dez meses, ele me dispensou. Né? Aí eu acho que foi um ato de Deus, assim, também, né? Por quê? Porque a minha ex-companheira estava morando na Espanha, né e quando eu saí daqui ela voltou pra Marília também e, na época, os meus filhos eram pequenos, né? Aí eu fiquei mais uns dois anos em Marília. Aí ele pegou e um dia eu liguei pra ele, ele falou assim: "Vem cá, que vou te dar um... preciso conversar com você”. Aí eu vim aqui pra Bauru, conversar com o ‘seu’ Elias, aí ele fez uma proposta pra mim, de eu ser o sócio dele, entendeu?
P2: Ó!
R1: Aí eu aceitei. Mas sócio, assim, né? Deixa eu te explicar. A gente tem que ter sabedoria, entendeu? Eu até admirei, porque é... a vida é assim mesmo. Só que eu fui o tipo de sócio assim: eu não sabia quanto que dava, não sabia quanto que entrava. ((Risos)) Entendeu como que é? Então, ele me pagava o que eu merecia e pra mim estava bom, porque na minha cidade, eu não ia ganhar esse valor e eu também... eu não o contrariava, sabe? Eu achava justo, também, né? Que nem, eu falei que eu comprei um Prisma pro meu filho, né? Foi juntando dinheiro, né? Eu achava o justo. Mas o que aconteceu? Só que eu nunca reclamei de nada. Aí, passou, agora, no final, a empresa ficou os dois anos no meu nome, a empresa. Ele foi passando aos poucos, entendeu? Hoje, a empresa é definitiva minha, entendeu?
P2: Ó!
P1: Olha!
R1: Hoje eu a administro 100%, entendeu? Então, eu já... eu administro 100% a empresa, ele só vem pra me auxiliar. Mas o que é o auxílio dele? É o seguinte: como ele é velhinho, eu não posso matar o sonho dele também. Entendeu? Então, se ele ficar lá, 24 horas no ar, dentro da casa dele, eu acho que é pesado, entendeu? Então, ele dá uma escapadinha e vem aqui, a gente conversa um pouquinho, troca uma ideia, ele corta uma carninha. Entendeu como que é? Então, isso é o respeito. Né? Isso é gratidão, né, que a gente tem, né, com as pessoas. Entendeu? Então, foi isso lá atrás, que eu aprendi com meu pai, né? Por mais que meu pai seja... foi ignorante, foi um pouco, assim, bem rústico na nossa criação, eu nunca vi meu pai agindo de errado com as pessoas. Entendeu como que é? Então, é isso aí que eu falo com meus filhos também, né? Então, a gratidão, só tem a gente a merecer, né?
P2: É.
R1: Coisa boa, que a gente planta, né? Planta coisa boa, colhe coisa boa, né?
P2: Ô Mauro, mas assim, com quem você aprendeu, assim, os cortes de carne, essas coisas?
R1: Ah...
P2: Porque, o seu açougue é bem diferente do açougue de um supermercado, que você só compra pacote agora, né?
R1: Então, mas é... então, mas o que acontece? Acontece o seguinte: a carne é assim... o pessoal não comenta muito, só comentou nessa crise que teve, acho que foi uns dois anos atrás, essa crise da JBS, né? Foi que eles maquiavam a carne, né, que todos frigoríficos... não só esse tipo de frigorífico, mas outro frigorífico, entendeu? E o povo esquece muito rápido das coisas, você entende? Só que a carne com osso, é uma carne diferenciada. É uma carne que tem mais sabor, é uma carne que resiste mais e é uma carne maquiada. Só que o pessoal, hoje, não entende muito isso, sabe? O pessoal vai mais pelo preço. Né? Só que a carne com osso, ela não é tão cara que nem a carne maquiada, né, a carne embalada. Eu trabalhei 10 anos com carne embalada, também, né? A carne embalada não aguenta muito, ela só faz, porque o mercado... o que acontece com o mercado? O supermercado tem mais de cinco mil itens lá dentro, entendeu? E a carne é um chamariz, que a maioria dos mercados usam, a carne é como um chamariz, que é pra chamar o cliente, entendeu? O açougue, não. O açougue não é muito necessário isso. Entendeu? Porque o cliente que compra em açougue, é um cliente diferenciado, entendeu? Ele sabe o que ele quer, entendeu? Então, ele sabe o que ele está procurando, né? Então, a gente procura... agora, eu, que nem... do meu patrão, eu tenho uma visão totalmente diferenciada sobre isso, sabe? Que nem hoje, o comércio que eu trabalho, eu estou tentando mudar, entendeu? Então, tem muita coisa, hoje, que nem atacado. Que nem hoje, as minhas bandejas são de 28 centímetros, por 56. Pra você encher uma bandeja dessa de bife, vamos colocar aí quatro quilos de bife. Entendeu como que é? Então, você vai ter dez bandejas, vamos colocar quatro quilos em cada bandeja, são quarenta quilos. Se tiver trinta bandejas, são cento e vinte quilos. Agora, suponhamos que essa bandeja, eu venha a diminui-la. Eu vou ter mais variedade e pouca quantidade. Entendeu? Então, por isso que você tem que agir rápido no comércio. Então, hoje, eu tenho esse tipo de visão, né? Então, é complicado. O que acontece também? Tem muita coisa que você não pode enfeitar o doce, porque você paga por isso. Então, o comércio que eu trabalho é arroz e feijão. Arroz, feijão e açúcar. O que é arroz, feijão e açúcar? É aquilo que você consegue todo dia, entendeu como que é? Eu não vou pôr um doce de leite aqui, entendeu e demorar quatro, cinco dias pra vender.
P2: Uhum.
R1: Entendeu como que é? Então, eu tenho que pôr a coisa pra rodar, entendeu? Então, é isso que gera o comércio, você tem que tentar... você tem que rodar o seu produto, ele tem que sair rápido. Né? E você tem que ser ligeiro, né? Se demorar um pouquinho, abaixa, né, não insiste com ele. Entendeu como que é? Então, é mais ou menos assim, entendeu? Assim que a gente trabalha. É dessa forma, entendeu? Mas o cliente...
P1: E, Mauro...
R1: ... tem que chegar e tem que sair satisfeito, né? Tem que sair satisfeito. Você não pode enganá-lo, né?
P2: É.
R1: Só o enganei uma vez só e foi um pequeno engano.
P1: ((Risos)). E, Mauro, e a carne é um produto muito diferente, porque ela precisa ser fresca, então tem que vender rápido, também, né?
R1: Não, mas a carne é complicado, sabe? Porque 70% que a gente trabalha, é com o sexo feminino. Cara e elas são enjoadas, exigentes e fala, é a propaganda sua. Entendeu? O homem, não, cara, entendeu? O homem gosta daquele bifinho com gordura, entendeu? Você chega pra ele: "Está bom?" “Está bom”. Entendeu (risos) como que é? Chega lá, a mulher pega e fala: "Pô, mas é isso aqui?". Entendeu? Aí ele fala: "Não, foi o açougueiro”. Porque o homem é malandro, entendeu? A mulher, não, cara. Negociar com mulher é difícil. Entendeu? Por isso que a Dilma não ficou no poder. Entendeu? O Lula ficou. Por quê? Malandro. Entendeu? O que eu falo? Eu falo assim, mas é isso é real, o que eu estou falando. É assim, ó: você tem cem bois, eu vou lá comprar cem bois seu, eu falo assim pra você: "Ó, eu vou pagar 98, você deixa essas duas aqui? Quando eu vir pegar aquelas cinquenta do lado lá, você põe junto?". Você fala: "Tudo bem, cara. Você é freguezão meu, você pode levar”. A mulher, não. Você fala assim: "Não, é 98 que você vai pagar. Esses dois, quando você vir, entendeu, você leva depois”. Entendeu? A mulher é assim: é sim, sim e não, não. Não tem meio termo.
P2: Mas como que ela compra, assim? Como que ela compra?
R1: A mulher?
P2: É.
R1: Ela gosta... ela compra... todo mundo, geralmente, sempre... aí compra pelos olhos, né? A pessoa compra pelos olhos. Mas o homem, assim, o homem você leva mais no bico, você entende ou não? O homem, você leva mais no bico, né? "Ô, está bom assim? Pá, pá”. Você vai tocando o barco, você vai levando mais ele, você entende ou não? A mulher é difícil levar. Em todas as áreas, viu?
P2: Mas aí, ela pede tal corte, tantos quilos? Assim, ela é muito específica, muito exigente?
R1: É, a mulher, eu acho que ela é mais exigente que o homem, mas é em tudo, viu? Entendeu? Hoje, a minha patroa trabalha comigo, sabe? Ela me ajuda, ela trabalha no caixa, né? Ela exige de mim mesmo e ela não conhece nada, entendeu? E ela exige, ela fala: "Ah, isso aqui está errado, isso aqui está errado, isso aqui está errado e isso aqui está errado”. Aí eu falo assim com ela: "Pô, meu, trabalhei 15 anos com português, agora vou trabalhar o resto da vida pra você?". ((Risos)) Entendeu como que é? Sou funcionário ainda, você entende ou não? ((Risos)).
P2: Mas, ô Mauro, me fala uma coisa: a mulher é que costuma fazer a compra do dia a dia, né, da comida.
R1: Ah, então, mas hoje, ela compra até dentro de casa, sabe? Porque o marido, antes de comprar, às vezes pede pra ela, sabe? "Ô benzinho...". Por telefone, né, liga pra ela: “O que você precisa? O que você necessita?". Você entende? Então, é mais ou menos assim, né? Aí ela fala assim: "Ah, preciso de tantos, tanto aquilo”. Só que tem uma mudança também, na sociedade, né? Porque o consumidor de hoje, é diferente do consumidor de antigamente.
P2: É.
R1: Entendeu? Então, o consumidor é totalmente diferente.
P2: Mas olha, eu tenho...
R1: Pode falar.
P2: Eu tenho a impressão que, assim, antigamente... eu vejo pela minha mãe. Ela sabia, assim, pedir uma carne, pra que servia. Então, assim, quer fazer carne moída? Carne moída você faz com essa carne e com essa carne. Corrige se eu tiver errada. Às vezes, assim, essa turma mais jovem, sabe, assim, fazer carne moída, qual é a carne? Ou ela...
R1: Não...
P2: ... ela chega lá e pede: "Carne moída”. Não importa se é patinho, ou se é...
R1: Não, essa turma mais jovem é complicada, sabe? O pessoal pede, está com o celular aqui, ó, entendeu? Ele pede pra você e está aqui no celular. Você pode mandar o que for lá pra ele, entendeu? Ele não está nem aí. Entendeu o negócio? Ele vai embora, entendeu? O cara... eles não são mais espertos. Não. Chega as velhinhas aqui, você está cortando, aí ela está dando volta lá atrás do balcão, pra olhar do lado seu, o que você está fazendo, o que você deixou de fazer.
P2: Pra ver se está fazendo direito.
R1: É, mais ou menos isso, entendeu? Agora, chega um moleque novo aqui, entendeu, ele não está nem aí, entendeu? Ele não está nem aí.
P1: O adolescente não sabe comprar carne.
R1: É. Não está nem aí, entendeu? A mãe dele falou pra ele, falou: "Ó você vai lá, compra um quilo de coxão mole”. Entendeu? "Você vai lá, compra um quilo de patinho”. Ele só vai pedir pra você. "Ah, dá um quilo de contrafilé, dá um quilo de patinho”. Não está nem vendo você cortar. Ele está lá no celular aqui, ó, mexendo aqui ó. Só no celular, entendeu? Ah, a juventude hoje, rapaz, vou falar pra você, rapaz, dá até dó, entendeu? Dá até dó. Mas a gente... eu procuro, entendeu, servir os meus clientes da maneira que eles gostam, da maneira que eles querem. Por quê? Porque hoje está muito caro, dá dó, eu mesmo... corta meu coração, sabe? Dois pacotinhos de carne, sessenta reais.
P2: É muito, né?
R1: Sabe? Você vai cortar um bifinho pro cara, rapaz, você tem que falar bem baixinho, devagarzinho quanto que deu, senão o cara é perigoso dar um ataque do coração, você entende? ((Risos)) Às vezes eu ponho o papelzinho lá, deu tanto. Entendeu o negócio? E eu divido, né? Eu divido aqui, eu divido no cartão, divido, faço em dois, três pagamentos. Entendeu o negócio? Então, é complicado, rapaz, entendeu? Mas da dó. Dá dó do pessoal. Entendeu? Por causa da política, né?
P2: O que mais tem saída no açougue? O que mais tem saída, que tipo de carne?
R1: Ó, tem mais saída a carne de segunda, entendeu? Hoje, assim. Mas depende da região, você entendeu? Se eu for trabalhar no Centro, sai mais de primeira, sai menos de segunda. Se eu for trabalhar nos bairros, sai mais de segunda e menos de primeira, entendeu? Depende da região.
P2: Mas eu digo aí, aí no Mary Dota.
R1: Ah, aqui eu trabalho mais com carne de segunda, entendeu? Eu trabalho mais com carne de segunda.
P1: E, Mauro, como que é ter um supermercado, né, o Confiança, bem em frente ali? Como é que é isso? ((Risos)).
R1: Ó, é o seguinte, eu sou assim, sabe? Eu penso assim: às vezes, a gente é um pouco chupim deles, porque se não fosse eles, a gente não estava aberto. Entendeu? Então, a gente necessita do cliente dele, porque às vezes o cara fala: "Ah, não vou no mercado, não, vou no açougue ali, não tem ninguém ali”. Entendeu como que é? Então, o cara está com... o cara que é mais rápido, quer ser atendido mais rápido, é ali onde você vai começar a ganhar. Né? É ali que você tem de já, né, colocar uma estratégia ali, em cima daquela pessoa, porque você sabe quem são seus clientes e você sabe quem não são seus clientes. É que nem o que eu acabei de falar pra você: eu tenho uma nova visão de fazer as coisas, entendeu? Tem muita mercadoria que eu não tenho, entendeu? Então, quer dizer, mas eu quero abrir meu espaço pra esse tipo de mercadoria, né? Eu quero abrir espaço pra ter esse tipo de mercadoria, né? Porque eu tenho um ponto bom.
P2: Muito bom.
R1: Né? Você, quando você está perto de um cara bom, entendeu, tem tudo pra você ir bem também, né? Aí, a vida é assim também. Quando você está cercado de pessoas boas, você vai bem, entendeu? Que nem, eu estou cercado de comércio bom aqui, onde passa gente toda hora. Onde tem gente, tem dinheiro, entendeu? Então, onde tem dinheiro, né, você tem condições de se alavancar melhor. Então, eu penso dessa maneira, dessa forma de pensar, né?
P2: Descreve um pouco o ponto que você está.
R1: Oi?
P2: O ponto que você está, descreve um pouco...
R1: Ah...
P2: ... pra gente...
R1: ... o ponto?
P2: ... como que ele é, como é que ele era antes.
R1: Ah, eu tenho até umas fotos aqui, dele antes, estou reformando, entendeu? Já era pra estar reformado, por causa de negócio de epidemia, por causa dessas coisas tudo aí, né, eles falam que não têm tempo de fazer. Eu quero mudar as coisas aqui, eu fui atrás de pessoal pra fazer as bandejas minha, pra diminuir, né? Eu mando os caras virem, já estão até: "Ah, Mauro, mudou as coisas, não estou tendo condição de fazer”. Então, está meio assim, difícil de eu organizar as coisas do jeito que eu quero. Entendeu? Mas eu quero fazer uma mudança aqui um pouquinho radical, só que vai dinheiro, sabe? Como meu fluxo de caixa está um pouco baixo, eu estou indo bem devagarzinho, né? Mas eu estou indo, estou mudando. E o mais gostoso, é quando o cliente passa e fala que está mudando, né? Então, isso é gostoso. E aí, passa o cliente e fala: "Nossa, está mudando aqui, tal. Opa, está melhor”. Entendeu como que é? Então, assim, a parte minha de refrigeração... que nem, eu trabalhava com o ‘seu’ Elias, ele, por ser uma pessoa de idade, né, português, né, um pouco ignorante em certas coisas, eu falava com ele: "Não, está certo”. Ele fala: "Não, está tudo certo”. Então, não funcionava muito com ele, entendeu? A partir do momento que passou a ser 100% meu, eu já mandei arrumar as partes de refrigeração, troquei os motores. Entendeu? Então, isso vai custo, vai dinheiro, só que é uma coisa que o cliente não vê, entendeu? Isso aí apresenta na mercadoria, né? A carne mais bonitinha, mais vermelhinha, entendeu como que é? Então, devagarzinho, entendeu, eu estou voltando, né? Só que agora, durante essa crise que deu aí, as carnes subiram tudo, entendeu, eu tentei usar de outra estratégia, de outras maneiras, entendeu? Mas, graças a Deus, está dando tudo certo pra mim, sabe?
P2: Que estratégias foram essas?
R1: A minha estratégia? É o seguinte: hoje tem mais fornecedor pra fornecer, entendeu? Então, você compra menos, entendeu e divide as suas compras e você tem compra todo dia chegando na sua loja. Todo dia fresquinho. Entendeu?
P2: Entendi.
R1: Mais ou menos isso.
P1: E aqui, no Mary Dota, também tem o frigorífico, era o antigo Mondelli, vem carne dali aqui, ou não?
R1: Não, do Mondelli, o meu patrão não pegava deles lá, entendeu? Então... mas se a gente pedir, os caras mandam, entendeu? É claro, pagando, fazendo certinho, paga. Só que, o que acontece? É o valor da mercadoria também, entendeu? Você não vai pagar mais caro, se tem outra pessoa vendendo a mesma mercadoria mais barato.
P1: Uhum.
R1: Entendeu? Como eles são exportação, eles mexem com exportação, dão mais prioridade pra exportação, as mercadorias são mais caras. Porque eu já trabalhei com a mercadoria deles, entendeu? E hoje, o pessoal não quer muito ver esse lado, o pessoal quer ver o lado do preço. Entendeu? Então, o pessoal vem aqui, vai no concorrente fazer a comparação, entendeu? Então, a maioria das pessoas faz comparação.
P2: Tem muito açougue aí, no Mary Dota?
R1: Não, não tem, não, viu? Aqui não tem, não. Tem eu aqui, tem o Messias e tem mais uns mercados, tem muito mercadinho, entendeu? Abriu muita coisa aqui, né? Abriu o Tenda lá embaixo, supermercado, abriu faz tempo, mas abriu. Quando eu vim pra cá, não tinha. Entendeu? Abriu os mercadinhos na vila em cima, entendeu? Nas outras vilas de baixo abriu mercadinho, todos eles têm carne, entendeu? Então, parece que não, mas afeta. Quando eu vim aqui, a gente era praticamente sozinho, nem na Vila São Paulo não tinha açougue, quando eu vim pra cá. Hoje tem açougue lá, tem mercadinho, tem bastante coisa, você entende? Então, é assim, né? E hoje, a renda per capita das pessoas diminuiu bastante, né? Da família, né? Caiu bastante a renda das pessoas.
P2: Agora, se caiu a renda, tem algum tipo de carne que aumentou a procura, assim, nesse período de isolamento? Tem algum?
R1: Tem. ((Risos))
P2: Picanha?
R1: Desculpa de eu falar, sabe, mas dá dó povo, eu falei pra você, entendeu? Hoje, é carne moída e salsicha, entendeu? O mercado... é hambúrguer, mercado, entendeu? Então, são os... linguiça, entendeu, frango. Então, são os campeões de venda. A carne é mais fim de semana, entendeu?
P2: Teve uma queda, então, no poder aquisitivo, que aí...
R1: Ah, teve. Entendeu?
P2: Pessoal procura os produtos mais em conta.
R1: Mais em conta. Linguiça, por exemplo, que é mais baratinha, entendeu? Então, você tenta procurar onde o povo está e vender aquilo que o povo quer, né?
P2: É, tem que ser, né?
R1: É, e o comércio que vai mudando também, você entende? O comércio vai mudando.
P2: Ô Mauro, mas assim, você recebe aquelas peças grandes pra fatiar, pra fazer os cortes? Como é que é isso?
R1: Eu só compro carne com osso.
P2: Com osso?
R1: Entendeu? É. Aí você vai desossar a carne, aí separa as carnes, entendeu? Aí separa os cortes.
P2: É o osso que dá esse gosto melhor?
R1: Ah, na verdade, é o seguinte: ela não é maquiada, né? Ela não vem embalada. A partir do momento que ela vem maquiada, que ela vem embalada, entendeu? Vamos falar assim, ó: você compra uma caixa de patinho. Numa caixa de patinho vai vir seis peças de patinho, numa caixa. Então, aí, mata o boi, põe lá, joga lá na câmara, entendeu? Vai ficar 15 dias, aquela caixa lá de patinho, vamos colocar assim. Talvez não fique, entendeu? Mas vai começar a zanzar pra cá, fica lá 15 dias. E o boi não. O boi, ele matou, já vem direto pro açougue. Você entendeu?
P2: É fresquinha.
R1: É fresquinha. Então, que nem contrafilé. Quem vai comer contrafilé, a 42, 52 reais, não é todo mundo que come. Onde está essa carne? Ela está guardada em algum lugar ou ela foi pra exportação. Se ela não foi, ela está guardada, entendeu? Uma hora ou outra o dono do frigorífico vai fazer uma promoção dela. Onde tem as promoções no mercado. Entendeu?
P2: Mas aí já tem dias que a carne está lá?
R1: É, então, não tem nada a ver, porque tem os processos, tem a higienização, tem tudo, mas o gosto muda.
P2: Entendi.
R1: Entendeu?
P2: Está boa pra consumo, mas não é o mesmo gosto.
R1: Não é o mesmo sabor.
P1: Uhum.
R1: Entendeu? Não é o mesmo sabor. Por que, o que acontece com a carne? A carne tem uma maturação própria, entendeu? A carne. O que que é a maturação de uma carne? A maturação, a própria palavra está falando: maturação. O que é madurar? Madurar é que nem uma fruta, não é? Se a fruta madurar demais, o que acontece?
P2: Ela apodrece.
R1: Ela apodrece, né? A carne é a mesma coisa, entendeu? A maturação da carne é o apodrecimento da carne. Entendeu como que é? Os caras: “A carne é mais macia, a carne é mais mole, a carne é mais cara”. Fala a maturação da carne. Então, a carne é um produto perecível, ela não pode ficar muito tempo parada, ela tem que girar. Entendeu? Então, se o povo não consumir, ela abaixa, entendeu?
AJUSTES NO VÍDEO
P2: Vai lá, William.
P2: ‘Seu’ Mauro e o senhor, então, passou uma grande parte da vida, aí, né, com a carne, mexendo, né? O senhor chega a fazer churrasco também no final de semana? Como é que é essa relação do senhor com a carne?
R1: Ah, meu amigo, eu vou falar um negócio pra você, eu vou falar um negócio pra você: eu tenho um primo que ele trabalha no Banco, ele mexia com dinheiro, né? E ele faz um churrasco da hora, sabe? Entendeu? E um dia, me convidou, eu fui lá na casa dele. E eu comendo carne, entendeu? Eu, pá, comendo carne, porque eu adoro comer carne. E aí ele falou assim pra mim, falou: "Pô, Mauro, eu pensei que você não gostava de carne, que você ia enjoar de carne". Eu falei assim: "Você rasga dinheiro?”. Falei pra ele. “Você trabalha no Banco. Você vê dinheiro, você rasga?”. Falou: "Claro que não". Eu falei: "Eu também, cara". Entendeu? Coisa boa todo mundo gosta, entendeu? Né? Carne, dinheiro, carro bom, todo mundo gosta. Você entendeu como que é? ((Risos)) Então, coisa boa é gostosa. Carne é bom, entendeu? Ontem mesmo eu estava num churrasco, ontem à noite. Você entende? E eu como carne, cara, entendeu? Eu não gosto de fazer muito churrasco, você entende? Eu não sou fã de fazer churrasco e quando eu quero comer carne eu vou na churrascaria, que eu lá, eu me lambuzo, eu peço, eu como. Só que não são todas as carnes que eu como não, viu? Eu gosto de uma costela, do cupim e da picanha, entendeu? O cara vem com linguiça, vem com pernil não sei do que, vem com as coisinhas, cheddar, essas coisas, eu estou fora, entendeu? É carne mesmo, entendeu?
P1: O senhor conhece.
R1: Ah, é carne, velho. Você paga caro pra comer bom. E é pra comer o mais caro, entendeu? ((risos))
P1: E não enjoa.
R1: É.
P2: Com quem que o senhor aprendeu a fazer esses cortes, quando vem o boi com osso?
R1: Ó, eu aprendi, assim, porque o corte é o seguinte: não é só cortar a carne. O lucro da carne está no corte, entendeu? Não é simplesmente cortar. Que nem eu falei pra vocês, né? Tem o cara que aprende errado, faz a vida inteira errado e pensa que está certo. E não vai ganhar dinheiro, entendeu? Então, o corte tem que ser bem feito. O que acontece hoje? Na época... tem coisa que a gente não sabe, eu vou falar uma coisa pra vocês: tem dono de supermercado também que não sabe. Na época o açougueiro ganhava mais que o gerente, na época. Hoje, o gerente ganha mais que o açougueiro, entendeu? E a carne está quarenta reais o quilo, cem gramas de carne é quatro reais, entendeu? Eu não sei quanto está o dólar, não sei se está seis e pouco, eu não sei quanto está o dólar, mas é mais de meio dólar cem gramas de carne, entendeu? E se você perder isso daí, o cara vai pro pau. Entendeu?
P2: Entendi.
R1: Então, a carne tem que ser valorizada, né? Os cortes têm que ser valorizados. Então, você pode ganhar cem gramas, como você pode perder. Se você perder, você está ferrado; se você ganhar, não tem problema.
P2: É o teu lucro.
R1: É, não é bem um lucro, porque ganha pouco, entendeu? A gente que é pequeno, a gente ganha pouco, entendeu? Então, a gente tem que ganhar em outras coisas, né? Que nem eu falei assim: economizar, não gastar muito, entendeu? Ficar cuidando da parte da vida da empresa, essas coisinhas tudo aí, você entendeu? Porque o concorrente, o concorrente não tem dó não, sabe? O concorrente não tem dó. Então, você tem que ganhar na compra, tem que comprar bem, entendeu? Você tem que comprar bem, entendeu? Tem frigorífico aqui que vende o boi mais barato, vende os miúdos mais caro, mas não compensa, entendeu? Então, é complicado o negócio, sabe? Pra você pedir miúdo, você tem que comprar o boi, entendeu? Então, um amarra o outro, entendeu? Então, é complicado o negocinho, é complicado, porque você tem que jogar com eles. Então, é assim, sabe? E tem que ser amigo de todo mundo. Você pede a mercadoria, às vezes ele manda outra, você não pode ficar bravo. Entendeu? Época de crise você tem que fingir que não viu. Você tem que dar um de João Bobo, sabe? "Ah, valeu, beleza" "Algum problema?" "Não, não tenho problema nenhum, meu amigo, o que é isso?". Só que você dá uma canseira nele de duas semanas, você não compra dele, entendeu? Mas você é amigo dele e, quando você precisar, ele vai estar lá, entendeu? É assim que eu ajo, você entendeu? Foi assim que eu aprendi. Agora, quando a coisa está boa, você pode brigar, né? Mas o bom mesmo é não brigar, né? O bom mesmo é ser amigo de todo mundo, o bom mesmo é você ser forte, aguentar o rojão, sabe?
P2: Uhum.
R1: Assim, forte, assim, né? Eu falo, assim, no dia a dia, né? Entendeu? Você tem que aguentar o rojão. É não fazer questão de muita coisa, sabe, no ramo, sabe? Porque amanhã o cara te ajuda, você entende? Às vezes os outros não têm e o cara tem, então é assim que a gente tem que pensar, né? Tem que ser assim, né? ‘Veiaco’. ((risos))
P1: E pro senhor, na sua opinião, qual que é o segredo do sucesso nessa área aí pra alguém, pra algum açougueiro?
R1: Ah, eu acho que, assim, sabe? Onde que a pessoa não quer hoje muitas coisas. Eu acho que é uma profissão também que a tendência é ela ir se eliminando, sabe? Essa profissão, assim, é uma profissão mundial. Onde você vai, você vai arrumar trabalho, entendeu? Que os cortes quase são as mesmas coisas. Se for na Inglaterra, você vai desossar a mesma coisa, que o boi não vai mudar, entendeu? O corte vai mudar um pouquinho, às vezes vai mudar o nome, a língua, você vai ter um pouquinho mais de trabalho e tudo, mas ali, na mecânica da coisa ali, você vai desempenhar o seu trabalho, né? Agora, o sucesso, rapaz, eu acho que vem, assim, de você procurar saber cada vez mais, aprender cada vez mais, entendeu? Porque hoje só não está, assim, no corte, está num contexto geral, sabe? Na compra, no pagamento, né? Então, você tem que ser assim, saber o que você está comprando, né? Saber o que você está fazendo, né? Então, você tem que vigiar muito, né? Tem que vigiar muito. Tem que vigiar lá na frente, né? Ó, que nem, esse negócio... essa crise que a gente... já passei muita crise. Essa crise atual, eu nunca passei uma crise dessa, entendeu? Eu nunca passei. Está muito difícil, entendeu? Pode ver, muitas lojas fecharam. Você vai no Centro da cidade, tem muita loja fechada, né? Então, está complicado. Mercadoria dobrou os preços, subiu muito, entendeu? Então, você tem que ser assim, perseverante, sabe? Tem que torcer que vai dar certo. Ó, no Brasil, cara, entendeu, o comerciante é um herói, cara, no Brasil, entendeu? Paga muita taxa, muito imposto, entendeu? É muito, assim... você vê aí, a gente vê aí essa política, uma política desonesta, né, na minha opinião, entendeu? O pequeno comerciante hoje paga mais tributo que o grande comerciante, entendeu? Agora tributaram a carne, voltaram, então, o pequeno comerciante hoje, ele paga muito mais, entendeu, que o grande. O grande não paga muito, né? Então, é uma coisa, assim, meio... Brasil não é fácil, não. Só que, assim, é um país... não é um país, né? O meu Brasil eu não chamo de um país, né? Eu só falo que é continental, né? País continental, né? É um continente, o Brasil. É difícil de administrar uma nação dessa, entendeu? O Brasil, acho que devia ser dividido, né, em quatro regiões, né? Um presidente localizado, né? E ter mais quatro presidentes no país, em cada região, né? A minha opinião, né? E ser distrital, né? Os deputados, né? Essas coisinhas. É muita situação, assim, sabe, é muito dinheiro jogado fora, é muito mal administrado, né, o país, né? E o Brasil usa a esquerda e usa a direita, né? A política, né? E uma precisa da outra, uma pra arrumar e outra pra desarrumar, você entende? Então, hoje a direita está arrumando e amanhã vem a esquerda e desarruma, entendeu? Isso é o Brasil, né? Quer dizer, por que desarrumam? Porque está tudo certo, entendeu, financeiramente, entendeu? Eu gosto de política, sabe? Entendeu? Eu gosto, né? E eu falo que a mente do brasileiro voa rápido, né? Entendeu? Problema que o cara, quem ele votou, ele nem sabe mais em quem ele votou, você entendeu? Ele fala só que não vai votar mais ultimamente. Eu acho que quem não vota, não adianta discutir política, você entende? Porque eu acho que quem não vota, é um tipo de covardia, né? Então, acho que o voto, entendeu, é uma coisa muito importante, né, pro brasileiro, né? A gente tem o direito de votar, né? Tem nação que não tem, né? Então, a gente tem que fazer o direito de votar. Se o país está assim, então, a culpa é nossa, né? Então, a gente tem que fazer direito, porque eu acho, eu creio, que tem gente boa, né? Ninguém é 100% honesto, vamos falar assim, correto, do jeito que a gente gostaria de ser. Pode ser até honesto, desculpa, mas correto, né? Cada um pensa diferente, né? Então, mas a minha opinião, entendeu, é a minha opinião essa daí.
P1: E, ‘seu’ Mauro, como é que os açougues, né, sobreviveram, quando a carne sumiu, na crise dos anos 1980? Né? Que os fazendeiros deixaram de mandar pro abate. O senhor sabe disso?
R1: Ah, eu sei. O pessoal não sobreviveu, né? Os donos de açougue ficaram... os que tiveram coragem, os que tiveram coragem, entendeu, dobraram o faturamento deles, entendeu? Dobraram, enriqueceram, ganharam muito dinheiro, entendeu? Por quê? Eles fechavam o açougue e vendiam por fora. Vamos colocar assim: eles abriam o açougue e vendia só as coisinhas que... e caro, né? Que a carne, não é que ela desapareceu, a carne foi tabelada e não podia vender naquele preço, né? Porque aquele preço não ia dar lucro, não ia pagar nada. O governo tabelou a carne. Como a inflação subia demais, o governo tabelou. Quem comia carne é quem pagava mais, né? Então, o cara ligava pra você, passava um papelzinho pra você e à noite você entregava na casa das pessoas, né? Entregava de carro, né? Você vendia só de peça. Né? Só tinha assim. Se eu cortasse... se cortava... o açougueiro cortava carne de segunda e vendia a preço de primeira, não tinha carne de segunda mais, né? E o cara que vendia uma carninha, ele abria um pouquinho, o fiscal chegava. Então, era complicado, entendeu? Então, é onde que o pessoal ganhou dinheiro. Que nem é hoje, entendeu? Bar que abriu na epidemia ganhou dinheiro, os outros estavam fechados. Entendeu? Os que tiveram coragem ganharam dinheiro. Então, a crise foi feita pra isso: muitos pra perder e poucos pra ganhar. O que tem coragem, ganha.
P1: Na década de 1980 tinham umas pessoas que faziam meio escondido, ali, a entrega de carne?
R1: Ah, questão de sobrevivência, entendeu? Questão de esperteza também, né? E até hoje é assim, viu? Até hoje. Na epidemia todo mundo ganhou dinheiro, entendeu? Mas não foi nós que ganhamos dinheiro, né? Foi na área de saúde, né? Entendeu como que é? Você vê aí, na área da saúde, o pessoal ganhou dinheiro. Entendeu? O governo só mandava, até hoje está aí, ó. O pessoal tem medo de falar as coisas, tem coisa que a gente não pode falar, entendeu, mas a gente sabe como que é. A epidemia existe? Existe, entendeu? Mas foi provado que muita gente ganhou dinheiro, né? Tem matéria sobre isso aí. É assim. Toda crise, cara, entendeu, um vai sair vivo e outro vai... dez vão sair mortos.
P1: E quais foram as maiores dificuldades agora na pandemia, pro senhor? Os desafios.
R1: Ah, o desafio? O desafio maior foi que o frigorífico fechou, entendeu? O pessoal não sabe, entendeu? Era pra ser maior a coisa, entendeu, mas o presidente interveio, entendeu? Mudaram a coisas. Teve frigorífico que não aguentou e ele, ao invés de estar matando, abatendo, ele... o que ele fez? Ele terceirizou a matança, entendeu? Então, o prazo que você tinha, você não tinha mais o prazo. Hoje, você compra mais à vista ou compra no cheque, né? O prazo acabou, né? Pra nós, que somos pequenos comerciantes, entendeu, o prazo está curto, porque o produto está caro. Entendeu? E eles têm medo de perder dinheiro, né? Porque, se o cara quebrar, não vai pagar. É isso aí. Então, é um prazo curto, um tiro curto, entendeu? E pagar rápido. Você vende hoje e paga amanhã. Isso, pra quem não tem fluxo de caixa, pesa muito. Então, você tem que ter fluxo de caixa na sua empresa.
P1: Uhum. E o senhor disse que está reformando lá, né?
R1: É.
P1: Como é que vai ser essa reforma? No final, como é que vai ser? Como é que vai ficar?
R1: A reforma é o seguinte, que nem hoje, açougue, quando se fala de açougue, entendeu? O açougue contém muito material, entendeu? Uma geladeira, freezer, é mesa grande, é serra, entendeu? Balcão grande. É tudo... entendeu? E hoje as coisas mudaram, entendeu? Hoje as coisas mudaram. Eu tenho um balcão de seis metros. Eu tenho que por 15 mil reais, pra eu vender dois mil reais de mercadoria, entendeu? Então, é complicado o negócio, entendeu? Então, é complicado. Então, o que acontece? Hoje, que eu tenho experiência também em tipo de supermercado, que eu trabalhei dez anos em supermercado, hoje, a sua área de venda é feita por metro quadrado, que é o que o supermercado faz, entendeu? Os mercados... "Eu tenho uma loja de duzentos metros quadrados". Entendeu? "Eu tenho uma loja de dois mil metros quadrados" "Quanto você vende por metro quadrado?". Entendeu? Então, você mede sua loja e você tem que ver quanto está vendendo por metro quadrado. Por que você tem que ver? É o produto que cabe ali naquele metro quadrado. Entendeu? Então, hoje, é o seguinte, eu vejo assim: aqui na reforma do meu comércio, eu tento colocar mais mercadoria. Entendeu? Eu sou obrigado a pôr mais mercadoria. O meu pensamento, hoje, é isso daí, entendeu? É pôr mais mercadoria, entendeu? Por quê? Se o meu concorrente hoje tiver lotado, entendeu, é mais meia dúzia que vem pro meu lado. Entendeu como que é ou não? Então, a minha visão é essa, né? Mas, assim, não pra matar o meu concorrente, que é claro que eu nem tenho condições e, se eu tivesse condições, também não ia fazer isso, entendeu? Porque pra um comerciante, um precisa do outro, entendeu? Pra ter o... o cliente é __ (01:49:14) o cliente gosta de entrar numa loja, sair. Que nem na Batista, o cliente vai numa loja, vai na outra, vai na outra, que é onde vai criar fluxo de gente, né? Entendeu? Mais isso daí, mais pra criar fluxo de pessoas na quadra, no quarteirão. Por isso que aqui a quadra, aqui, as duas, três quadras aqui, é importante, né? Tem bastante loja, né? Então, cria aquele fluxo de pessoas, né, na avenida, né? Fica um ponto estratégico pra venda.
P2: Já que a gente está registrando a história, né, fala pra gente qual o nome da avenida, né, no Mary Dota e, assim, como que você descreve a avenida.
R1: Ah, aquela Avenida Marcos de Paula Raphael, né, aqui no Mary Dota, né? É uma avenida bem ampla, com um canteiro no meio, né? Arborizada, entendeu? Só que, a minha opinião, eu sou meio crítico. É pouco iluminada, entendeu? Podia ter uma iluminação melhor. Isso eu já cobrei, né? Eu já cobrei com a prefeita de Bauru, quando ela estava na campanha política dela, eu falei pra ela não esquecer da iluminação da Avenida Marcos de Paula Raphael e pra gente que mora aqui é importante, né? Hoje, quando tem um sinaleiro, hoje, de pedestre, né, pra ir pro mercado hoje. Foi necessário, tem bastante pessoas idosas no bairro, né? É um bairro, hoje... pelo antigo prefeito foi bem atendido também, eu vejo que foi bem atendido, né? Tem hoje as rampas dos cadeirantes, né? Os cadeirantes andam na avenida, têm o livre acesso pelas calçadas, né? E tem vários tipos de loja aqui, né? Tem um Banco do Brasil aqui, onde poderia ter mais outros dois, três Bancos aqui também. Tem uma casa lotérica do lado, aqui, do meu comércio, né, que viabiliza as pessoas a pagar as contas, né? Então, é uma avenida importante pro bairro, uma avenida de bastante acesso também pelas rodovias, né? Ela tem os acessos aqui pelas rodovias, que corta os bairros, né? E, além de tudo isso daí, né, que estou falando com você, tem a escola também que fica aqui na avenida, né? E eu acho que é uma avenida ainda de futuro, entendeu? Que, no meio dela, lá indo pra Vila São Paulo, ali, também tem um terreno vago, né? Tudo ali, entendeu? Eu acho que é uma avenida de futuro ainda, tem muita coisa ainda tem pra acontecer aqui nessa avenida que tem. E aí, é muito importante, vou falar novamente, muito importante pro bairro.
P1: Só mais uma pergunta da minha parte, daí eu passo pra Cláudia. E sobre a profissão, né, de ser açougueiro, como que é essa relação do senhor com a questão do sangue, do cheiro da carne? Porque eu acredito que teria muitas pessoas que não gostariam, né, disso. Como é que é?
R1: Ah, isso aí é questão de acostumar, entendeu? O açougueiro é abençoado ainda, você entendeu? Eu falo pra você, você toma um banhozinho, entendeu, passa um perfuminho e já foi. Duro é peixeiro, amigo. Peixeiro é complicado, cara. Nossa, se você for solteiro, peixeiro, entendeu, você tem que tomar banho, passar limão, entendeu, pra ir namorar, entendeu? E você tem que dar uma cheiradinha ainda pra olhar ainda, se está cheirando ou não, entendeu? Agora, açougue não, entendeu? Açougue não, entendeu? Diante do... de acordo com o sangue, entendeu, não é tão, assim, né? O sangue mais da carne, assim, sai mais lá do frigorífico mesmo, você entende ou não?
P2: Uhum.
R1: É, não é tanto assim. Você, qualquer coisinha está limpando toda hora, né? Higienizando o local de trabalho, entendeu? Então, mas está... assim, não tem aquela coisa toda, entendeu? Isso aí é uma questão de higiene, né? Entendeu? Tanto higiene pessoal, quanto higiene também do comércio. Entendeu como que é? Aí você tem o cuidado com essas... esses cuidados que você tem que tomar, né? Tudo limpinho toda hora, assim, fica legal, não fica... entendeu? Não é uma coisa de, assim, terrível acesso, assim, não tenho __ (1:53:57), entendeu? É gostoso, cara, gostoso. É gostoso, é gostoso mesmo. É, assim, é uma profissão bruta, entendeu? Ela é bruta, por causa da carga horária, entendeu? A carga horária pesa. Né? Entendeu? A carga horária pesa, mas questão fora isso daí... agora, no mercado você não trabalha tanto, que nem trabalha em açougue, mas hoje... em São Paulo mesmo, tenho meus amigos lá, tem lugar que faz dois tipos de horários. Só que falaram também que caiu bastante, né? E São Paulo ganhava bem, né? Falava que era açougueiro, você ganhava bem, que nem eu estava contando há pouco tempo: o açougueiro ganhava mais que um gerente, né, do supermercado. Hoje não, hoje o gerente ganha muito mais que o açougueiro, que você perdeu o valor, né? Entendeu? Hoje eu pego um moleque lá, ponho lá pra cortar, passa um ano, passa dois anos, o cara é açougueiro, entendeu? O cara não sabe desossar, o cara não sabe fazer uma linguiça, o cara corta bife grosso e fala que o cara é açougueiro, entendeu? Aí, passa mais seis meses, o cara é coordenador do açougue. Coordenador do açougue. Entendeu? Não respeita ninguém, não tem valor... não falo todos, mas já vi casos assim. Não falo todos. Tem cara, não, tem cara que merece. Entende, trabalha, tudo, trabalhou pra aquilo, desenvolveu seu trabalho pra isso. Mas é aquilo, que nem o começo, né? Começou errado, vai até o fim pensando que está certo e está errado, entendeu? E hoje, você pegar um jovem, é melhor que você pegar um cara, já, falar que sabe trabalhar. Pra você trabalhar do seu jeito, do jeito que você quer, da maneira que você quer, é melhor você pegar um cara que não sabe, também ele aprende da maneira que você quer. Pegar um cara formado, ele vai fazer tudo aquilo que ele aprendeu na vida dele, entendeu? A visão dele é aquela. Mais ou menos isso.
P2: Ao longo desses anos, mudou muito, assim, a forma de embalagens, Mauro? Porque, assim, eu lembro de ir na feira com a minha mãe, embrulhava carne no jornal, né?
R1: É, eu sou também, praticamente, dessa época, entendeu? Dessa época de embrulhar carne no jornal, linguiça, entendeu? Você pegar um jornal hoje e dar pra um moleque embrulhar, ele não sabe embrulhar, só sabe pôr no saquinho e na sacola. Entendeu? Então, é mais ou menos assim.
P2: Tem um jeito de embrulhar, né?
R1: É, o jeito, a maneira, né, de embrulhar. Mas a maneira mais correta é a de hoje, né, que a gente praticou, né? Mais higiene, né? Entendeu? Naquela época, não tinha tanta cobrança, assim, a sociedade não cobrava tanto da gente, né?
P2: É, né?
R1: Dessa forma, né? Até o pão, né? A gente não tinha nem pãozinho francês, era bengala, né? Vinha...
P2: Bengala.
R1: ... no jornal também. É, aquele papel cinzento, né? Entendeu?
P2: ((risos)) Aquele pão assim, né?
R1: É, exatamente, entendeu? Exatamente.
P2: E tinha uma briga pra saber quem ficava com a ponta da bengala, né?
R1: Ah, menina, era mais ou menos assim mesmo. Entendeu? Era mais ou menos assim, entendeu? Era em tudo quase, geral, naquela época, né? Coraçãozinho do frango, né? "Coraçãozinho do frango é meu". Né? Só tinha um, entendeu? ((risos)) Era mais ou menos assim.
P2: Era uma briga mesmo.
R1: É. "Cadê minha moela? Mãe, fulano catou a moela que era minha". Entendeu? ((risos))
P2: ((risos)) Deixa eu perguntar, agora mais da atualidade, né? O senhor falou que a sua companheira ajuda o senhor, vê um monte de coisa, tudo. Como que o senhor a conheceu? Como ela chama?
R1: Ah, eu a conheci, você entendeu, ela foi fazer um trabalho na minha casa, entendeu? E ali, entendeu, ficou conversando, batendo papo, né, trocando ideia, entendeu? E ali acabei... assim, a gente se envolvendo, entendeu? A partir daquele momento, assim, entendeu? Aí, partimos pro namoro, entendeu? Aí fomos morar junto, nos casamos, entendeu? Era... a profissão dela era costureira. Costura bem. O pessoal a chama ela trabalhar. Só que ela está é brava comigo, você entende? Porque as amigas dela a chamam, tudo... mas a gente se dá bem, sabe? Pela experiência que eu tive no primeiro relacionamento, no casamento, ela também teve um também e a gente se respeita bastante, né? E pra mim, ela é muito importante, pro meu trabalho, sabe? Por se tratar de uma mulher, que ela trabalha no caixa, entendeu? Não tem o problema de eu trabalhar com dinheiro e com carne, tem higiene, né? E o pessoal... é uma pessoa bastante observadora, entendeu? Por ser mulher, então, qualquer coisinha, você entendeu, ela está falando, está pegando, está comentando. Mais ou menos assim.
P2: Observadora. E como que ela chama?
R1: Terezinha.
P2: Maravilha.
R1: É.
P2: Tem mais alguma coisa, William?
P1: Eu também ia perguntar qual que é a dica, como é que o senhor pode falar pra um... dica mesmo, né? Pra novos comerciantes nessa área.
R1: Na área de comércio, você fala?
P1: É, na área de comércio, na área de açougue.
R1: Ah, então, sabe? Eu creio, assim, que a gente tem que ser assim, a humildade sempre, sabe? Sempre querendo aprender, entendeu? Hoje, você entra na internet, tem bastante programa, sabe? Tem bastante vídeo, né? Hoje tem um mercado bem amplo, né? A gente está se atualizando, entendeu? O mais antigo não quer se atualizar e tem coisa, entendeu, tem coisa que não dá pra fazer, sabe? Que nem agora, na época de crise, eu tenho muita coisa que eu poderia fazer. Como a mercadoria é cara, entendeu, a mercadoria é perecível, eu não posso fazer, entendeu? Porque o dinheiro está curto, o dinheiro está tiro curto, nosso. Então, o cara vai comer uma carne, uma carne moída e alguma coisa, entendeu, o cara não vai querer comprar. Eu vou comprar uma caixa de coração de frango, entendeu? Eu vou pagar seiscentos, setecentos reais numa caixa de coração de frango, entendeu?
P2: Nossa!
R1: E o cara vai pedir trezentos gramas pra mim, entendeu? ((Risos)) Pra comprar. Então, é complicado isso aí, então é melhor não ter. Entendeu como que é? Então, é assim. Aí os caras vão falar: "Ah, já fui em três, quatro lugar, não tem". Então, não é porque não tem. Tem, é que a mercadoria está cara. Então, hoje o pessoal está trabalhando aquilo que ele vende, entendeu? Com o giro, né? Então, o comércio está assim, né? Mais ou menos assim.
P1: Uhum.
P2: Maravilha. Tem alguma coisa que a gente não perguntou, que o senhor quer deixar registrado, ‘seu’ Mauro?
R1: Não, tranquilo, entendeu? Eu só quero saber desse trabalho, qual é a finalização do trabalho que vocês estão fazendo.
P2: A gente vai fazer... deixa eu fazer a última pergunta, então, a gente encerra e eu explico pro senhor mais coisas do projeto, pode ser?
R1: Ok.
P2: Ó, a gente começou esse trabalho, né, lá na rua, procurando os comerciantes, faz um ano já e o senhor foi convidado pra dar entrevista, fazer parte do projeto,e o senhor está aqui já há quase duas horas falando da sua experiência, da sua trajetória, da sua visão de mundo, né?
R1: Com muito prazer.
P2: Então, mas é uma entrevista que não é jornalística. Então, assim, o que o senhor achou de ter ficado esse tempo aqui e qual a importância pro senhor de ter deixado registrado a sua trajetória, o comércio do senhor, o bairro do Mary Dota? O que o senhor achou de tudo isso, dessa experiência?
R1: Eu achei muito prazeroso, sabe? Particularmente, né, pra mim, é uma grande oportunidade poder falar dos meus filhos, da minha família, do meu passado, da minha experiência, daquilo que eu aprendi, daquilo que eu fui educado, entendeu, pra essa nova geração que tiver oportunidade amanhã de poder ouvir, entendeu? Pra depois, elas poderem cobrar também, que tem coisa que elas querem cobrar muito e fazer pouco e o pouco que faz acha que é muito, entendeu? ((risos)) Então, é isso que eu quero falar. Que, na nossa geração, entendeu, não é que nem essa geração, né? Meus filhos também falam sobre isso assim: "É, pai, só que você passou e você quer que nós passemos". Falei: “Não, não é assim”. É valorizar aquilo que Deus coloca nas nossas mãos, né? Se coloca um pão, então, vamos repartir o pão. Se coloca dez pães, então vamos dividir o pão, entendeu? Então, é mais ou menos assim. Eu acho muito gratificante, sabe? Muito gostoso, sabe? Pra mim, eu sinto orgulhoso, entendeu? Eu me sinto orgulhoso, fazer parte aí, hoje, desse trabalho.
P2: Maravilha!
P1: E, Mauro, você falou dos seus filhos, né? Tem uma filha professora, um filho psicólogo já, né?
R1: Exatamente.
P1: E como é que... o futuro, né, do açougue, como é que o senhor vê isso?
R1: Ó, eu vejo, assim, sabe? Que eu sou um cara muito independente, você entende? Eu vejo assim, de eu não necessitar deles, de eu não precisar dos meus filhos, entendeu? Eu sou... eu sempre... eu trabalho desde pequeno, sou independente, né? Então, amanhã, depois, vai chegar a minha velhice, espero, né, que eu seja assim, independente na minha velhice, né? Que eu vejo meus pais, tudo, você entendeu? Né? Então, tudo aquilo que meu pai acertou, tudo aquilo que errou, entendeu, serve também, entendeu, como história de vida dele e pra minha história, né? E que eu quero que amanhã, depois, a minha história também sirva pros meus filhos, né? Que nem, aí, até hoje eu ajudo os meus filhos. De uma maneira ou de outra, eu os ajudo e sinto muito gratificante ajudando meus filhos, né? Por abençoar os meus filhos, né? Porque eu nunca chamei... assim, eu estou falando de filhos pra você ter um contexto geral, mas eu falo que eles não são meus filhos, são quatro bênçãos que Deus me deu, sabe? Pra eu cuidar, né? Meus frutos, né? E eu tenho muito orgulho dos meus filhos, porque eu tive muito problema, né, com meu irmão, algumas coisas assim, então, onde a minha família, assim, eu tento fazer tudo pros meus filho não errarem, né? Que nem eu falo pros meus filhos: "Ó, vocês são grandes, até hoje não errou, não é agora que vai errar, né?". Entendeu? É mais ou menos assim.
P1: Uhum.
P2: Maravilha! Então, Mauro, eu agradeço muito a sua entrevista. Em nome do Sesc Bauru, Sesc São Paulo e do Museu da Pessoa, eu agradeço muito. Foi ótimo. Eu agradeço você ter persistido e participar, a gente perturbou bastante pra agendar, mas eu acho que valeu a pena, viu? Muito obrigada.
R1: Eu agradeço, eu agradeço.
P1: ‘Seu’ José, eu também gostaria de agradecer. Eu gostaria de agradecer também, ‘seu’ Mauro, desde quando... o momento que a gente pisou lá, a gente conversou, né, a gente te atrapalhou um pouco mesmo, mas foi muito boa a persistência e a gente ter feito a entrevista. Agrega bastante.
R1: Entendi. Eu sou um cara que eu gosto de conversar, você entendeu? Eu gosto de falar. Eu gosto de falar de religião, eu gosto de falar de política, entendeu? Eu gosto de falar das pessoas, entendeu?
P2: É bom, né?
R1: Eu não sei se eu sou o cara certo, entendeu? Mas eu gosto de ter esse tempo, né? Então, pra mim é gratificante.
P2: Não, foi ótimo, foi ótimo. Vou só pedir pro Caio desligar o gravador.
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