Paula Prado Kfouri nasceu na capital paulista em 1984. Filha de Juarez Negreiro Kfouri e Valéria da Silva Prado. O pai foi um químico de profissão e de origem libanesa. Quando o avô de Paula desembarcou no Brasil, Juarez, tinha onze anos. Munida de poucas informações sobre a família paterna, Paula destaca apenas que foi nesse período que o avô faleceu. A partir daí os Kfouri deitaram raízes no Brasil e se tornaram uma família grande, salienta Paula. Com pouca referência paterna ela conta da separação dos pais, o considera um amigo, um “cara legal” e de bom coração. No entanto suas maiores referencias de vida são femininas. Paula narra a mãe vinda de uma familia tradicional, fala com afeto e admiração da avó e bisavó maternas. Eram os “Silva Prado” que deixaram suas marcas históricas em Higienópolis, bairro da capital paulista e na vida de Paula. A tônica de sobrevivência e luta foi a marca da vida de Valéria sua mãe, que ficou grávida aos vinte e dois anos, ainda muito imatura, e sofreu para criar duas filhas sozinhas, acrescenta Paula. Valéria da Silva Prado foi pedagoga. A bisavó Nair viveu cento e um anos e na sugestão de Paula é que sua vida deveria render um livro. Nascida no Maranhão, numa cidade chamada Buriti, filha de uma fazendeira rica e de gênio forte, Nair sofreu muito. Foi prometida em casamento aos treze anos de idade a um primo que a fez sofrer muito. O ápice da humilhação nesse casamento arranjado, que servia apenas para manter a herança dentro da família, foi quando o marido, a quem Paula descreve como um “playboyzinho da cidade”, pediu um copo de água a Nair. Mesmo vendo que na garupa do cavalo de sue marido bêbado havia outra mulher Nair, deixou o bordado e atendeu a requisição, mas foi surpreendida com o resto da água no seu rosto. Foi a última vez, após esse humilhante episódio ela partiu definitivamente para São Paulo com as duas filhas. Colocou as filhas num colégio interno e...
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Paula Prado Kfouri nasceu na capital paulista em 1984. Filha de Juarez Negreiro Kfouri e Valéria da Silva Prado. O pai foi um químico de profissão e de origem libanesa. Quando o avô de Paula desembarcou no Brasil, Juarez, tinha onze anos. Munida de poucas informações sobre a família paterna, Paula destaca apenas que foi nesse período que o avô faleceu. A partir daí os Kfouri deitaram raízes no Brasil e se tornaram uma família grande, salienta Paula. Com pouca referência paterna ela conta da separação dos pais, o considera um amigo, um “cara legal” e de bom coração. No entanto suas maiores referencias de vida são femininas. Paula narra a mãe vinda de uma familia tradicional, fala com afeto e admiração da avó e bisavó maternas. Eram os “Silva Prado” que deixaram suas marcas históricas em Higienópolis, bairro da capital paulista e na vida de Paula. A tônica de sobrevivência e luta foi a marca da vida de Valéria sua mãe, que ficou grávida aos vinte e dois anos, ainda muito imatura, e sofreu para criar duas filhas sozinhas, acrescenta Paula. Valéria da Silva Prado foi pedagoga. A bisavó Nair viveu cento e um anos e na sugestão de Paula é que sua vida deveria render um livro. Nascida no Maranhão, numa cidade chamada Buriti, filha de uma fazendeira rica e de gênio forte, Nair sofreu muito. Foi prometida em casamento aos treze anos de idade a um primo que a fez sofrer muito. O ápice da humilhação nesse casamento arranjado, que servia apenas para manter a herança dentro da família, foi quando o marido, a quem Paula descreve como um “playboyzinho da cidade”, pediu um copo de água a Nair. Mesmo vendo que na garupa do cavalo de sue marido bêbado havia outra mulher Nair, deixou o bordado e atendeu a requisição, mas foi surpreendida com o resto da água no seu rosto. Foi a última vez, após esse humilhante episódio ela partiu definitivamente para São Paulo com as duas filhas. Colocou as filhas num colégio interno e serviu como dama de companhia da esposa de um governador do Estado de São Paulo. Ao mesmo tempo em que isso marcou negativamente o histórico dos homens da família pôs em evidência o lado feminino aguerrido que Paula toma como referência. A grande lição herdada dessas mulheres é que “tudo passa”, nada vai durar para sempre. Essas mulheres ensinaram Paula tomar as rédeas da própria vida. Paula não tem muitas lembranças da primeira infância, quando viveu num apartamento localizado na Rua Nhambiquaras, bairro de Moema, zona sul da cidade de São Paulo. Lembra de uma TV pequena, um móvel pequeno e só, as memórias são mais abundantes no outro apartamento em que passou a viver até os dezesseis anos. Lembra de uma infância em contato com a natureza nas freqüentes idas a fazenda e sítio dos avós localizados no interior de São Paulo. Andar de cavalo, colher fruta no “pé” e mexer com a terra faziam parte de sua agenda campestre. As lembranças emocionais da infância são regadas com a relação conturbada dos pais antes da separação. A adolescência de Paula foi tensa devido às discussões com a mãe, pensou muitas vezes em sair de casa quando tinha dezesseis anos, experimentou isso algumas vezes, tentou morar com o pai, mas acabou não dando certo. Sua adolescência foi diluída no papel de menina trabalhadora e isso afetou não só sua adolescência como também seus estudos. Desde muito cedo, quando saiu da casa materna empreendeu com o namorado em uma rede de restaurantes na capital paulista. Estudou Marketing, Gestão, Planejamento de Marketing e Vendas, mas não chegou a concluir nenhum deles. Contudo, escolheu vendas porque se avaliava positivamente nessa área. Outra área afetada por essa precocidade na vida profissional e empreendedora foi a relação com amigos, ela avalia a si mesma e não se considerava uma boa comunicadora, e por isso não tinha muitos amigos próximos. No período final de sua adolescência Paula tem uma confluência de fatores que configuram uma nova fase em sua vida. Casamento, vida profissional, gravidez, maternidade e o diagnóstico da Esclerose Múltipla orbitam no mesmo período. Paula se casou da primeira vez com dezenove anos. Em sua retrospectiva de memória ela avalia que o casamento foi uma linha de fuga, que facilitou sua saída da casa materna. Nesse momento o casamento se misturou a vida empreendedora de Paula. O casal abriu um restaurante e como sócios levaram o negócio adiante por oito anos. De um simples restaurante o projeto virou uma rede, e ao longo do tempo montaram nove restaurantes chamados “Desfrutti”. Depois de oito anos de parceria venderam a rede que segundo ela ainda existe sob nova direção. Paula avalia que apesar da “loucura” que foi gerenciar tudo isso, foi um algo muito bom. Depois dos restaurantes Paula trabalhou como vendedora de uma loja de móveis especiais, e ganhou um bom dinheiro na época. Foi um momento feliz para ela. Ela se narra uma mulher guerreira como as mulheres da família, e usa os exemplos de sua mãe para falar sobre a sua maternidade em uma descrição paradoxal. Por um lado, a mãe foi fonte de muitos atritos em sua adolescência, por vezes rude, não a compreendia, não demonstrava tantos gestos de afetos, porém a filha reconhece o êxito materno, “estamos vivos” ressaltou Paula. Ou seja, a mãe foi responsável. A mãe foi boa e ruim ao mesmo tempo, revelações confusas de uma adolescência intensa e precoce. Paula não soube projetar um futuro sobre que tipo de mãe será para o João, seu filho, mas vivendo o presente possível, aposta na sobrevivência responsável, no afeto, no espírito de luta, no lema de que “tudo passa”. Ao narrar sobre o encontro com a Esclerose Múltipla Paula continuou com seu jeito aguerrido para lidar com tudo. Os primeiros sintomas vieram quando os restaurantes tomavam boa parte de seu tempo. Ela lembra que em julho de 2005 sentiu uma queimação na parte superior do peito quando se dirigia para o restaurante. No começou achou que fosse alergia, o marido também achou que não era nada. Ligou para uma cardiologista, conhecida da mãe, falou sobre os sintomas, recebeu prescrição de medicamentos, mas sem melhoras. Depois de organizar um chá de bebê de uma amiga, voltou para casa, dormiu e no dia seguinte acordou com um formigamento em todo o pescoço e descia para o colo torácico. Ela ligou para a cardiologista com quem falara antes e foi-lhe indicado procurar um neurologista. Ao fazer a consulta Paula já estava com perda de força muscular e teve de receber ajuda da mãe para caminhar. Fez exames, foi internada e diagnosticada com Esclerose Múltipla. Ouviu do neurologista que a doença era sem cura. A falta de informação sobre irritou Paula que descreveu os sentimentos após o diagnóstico como se um “vácuo tivesse entrado” dentro dela. Como era superativa e amava os esportes, uma das principais preocupações de Paula era a perda de mobilidade. Ela narra atitudes desesperadas de busca pelo movimento, como circular várias vezes a mesa de jantar da casa, escorando nas cadeiras, apenas para se manter ativa. Mas antes de pensar em retomar a vida Paula passou uma temporada em um sítio em Atibaia. Foram momentos muito importante para ela uma vez que a relação dela com a zona rural era muito positiva desde a infância. Ao retomar a vida viu algo na internet sobre uma menina na mesma condição e isso a estimulou bastante. Os dois anos que se seguiram ao diagnóstico foram considerados por Paula como anos de pesquisa intensa sobre a doença. Diz ela que ficou “psicopata” em estudar sobre a Esclerose Múltipla. Nas pesquisas sobre a doença, o tema alimentação ganhou destaque na vida de Paula. Quanto ao prognóstico ela decidiu, por quatro anos, não tomar nenhum medicamento. A recusa em ser tratada com remédios vinha das experiências hipocondríacas por parte da avó materna e da mãe. Paula relatou que, por parte da família da mãe, tudo era motivo para tomar remédio e ela tinha aversão a um ambiente que ela considerava “um tanto neurótico”. Mas foi na segunda experiencia com um surto, em março de 2009, que mudou de opinião. Tomou Avonex e passou muito mal. Como era o único disponível sofreu por anos, quando o médico receitou o Fingolimode, na mesma época em que decidiu engravidar. Sua narrativa revela que sua intensidade na adolescência e na vida profissional, agora estava canalizada para a gestão de si, do corpo, da mente. Criou um blog chamado “Sobre viver”, atualmente desatualizado, mas foi um ambiente virtual onde testemunhava experiencias possíveis com a Esclerose Múltipla, escrevia sobre alimentação saudável e esportes. Praticou ioga, foi vegetariana por doze anos até a gravidez, voltou a pedalar sua bike, se apaixonou, casou-se novamente, foi mãe do João. A alimentação funcional e saudável e prática de exercícios mais do que nunca encontraram um sentido para a vida com a Esclerose Múltipla. No processo para se reabilitar do impacto que a doença trouxe, assim como os efeitos da medicação, Paula entendeu que o esporte, ioga e a alimentação salvaram sua vida. Como não é de sentir fadigas recorrentes, os exercícios, quaisquer que fossem, vinham como aliados. Nessa altura de sua vida, com o filho João e a doença em sua vida, Paula se integrou a equipe da AME (Amigos Múltiplos pela Esclerose). Ela é responsável pelo setor de comunicação da associação. Em parceria com a AME criou o canal no Youtube chamado “Qualidade Vivida”. Espaço de mídia social onde trata dos mais variados temas da vida e relaciona-os com a EM, ou seja, uma vida em condição crônica de doença, mas com qualidade. Relata que, recém diagnosticada julgou as informações que circulavam na internet muito “deprê”, o que a incentivou fazer um movimento em sentido contrário. Se transformou em uma ciberativista pela circulação de uma “qualidade de vida” com a doença. A vida com Esclerose Múltipla não se tratava apenas da doença, havia muito mais que era preciso dizer. Era isso que Paula se propôs evidenciar. A história de vida de Paula revela que a força de um valor de família infere em ações aguerridas na construção positiva de uma vida com Esclerose Múltipla.
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