Depoente: Agnelo Di Lorenzo
Entrevistado por: Cláudia e Itamar
São Paulo, 23 de novembro de 1993
Entrevista nº 001
P - Bom, eu queria que o senhor falasse pra gente o nome completo do senhor, onde o senhor nasceu e em qual ano.
R - Esse é o mais triste! (Risos) Eu nasci na Argentina, na cidade de Rosário, dia dezesseis de abril de 1926.
P - E como é que era a casa do senhor em Rosário, o dia a dia?
R - Era uma casa de gente humilde, de um empregado ferroviário, éramos quatro irmãos. E, apesar das dificuldades financeiras de meus pais, nós tivemos uma infância até feliz, porque se nós não tínhamos, digamos, aquela comodidade, aquele bem-estar que o dinheiro dá, nós tínhamos o amor de nossos pais. O respeito, nós tínhamos que... Eles nos ensinaram... E jogamos muita bola, isso era o principal.
P - Como é que era o dia a dia da sua casa?
R - Bem...
P - A família argentina assim, o que difere?
R - Bem, o dia a dia de toda família, praticamente. Lá na Argentina, naquele tempo, nós não tínhamos empregada doméstica, nós estudamos. Éramos quatro irmãos, os quatro estudaram, eu cheguei até a segunda. Terminar, completar a segunda série também. Minha irmã se formou professora e meu irmão era menor, o último era menor, então foi no tempo que eu vim... Eu tinha uma diferença de idade muito grande, o último, caçula, veio temporão né, e tinha uma diferença comigo de uns dez, doze anos. Então quando eu vim para o Brasil com 20 anos, ele teria nove, dez anos no mínimo. Em casa, afinal minha mãe trabalhava muito pra nos dar sempre em dia, exigia de nós. Inclusive nós tínhamos a obrigação de ajudá-la nos afazeres, porque minha mãe, inclusive até o pão que nós comíamos ela fazia em casa, então nós tínhamos que preparar o forno, encerar os sábados, encerar religiosamente, enquanto preparava o forno buscar... Procur...Continuar leitura
Projeto: História em Multimídia do São Paulo Futebol Clube
Depoente: Agnelo Di Lorenzo
Entrevistado por: Cláudia e Itamar
São Paulo, 23 de novembro de 1993
Entrevista nº 001
P - Bom, eu queria que o senhor falasse pra gente o nome completo do senhor, onde o senhor nasceu e em qual ano.
R - Esse é o mais triste! (Risos) Eu nasci na Argentina, na cidade de Rosário, dia dezesseis de abril de 1926.
P - E como é que era a casa do senhor em Rosário, o dia a dia?
R - Era uma casa de gente humilde, de um empregado ferroviário, éramos quatro irmãos.
E, apesar das dificuldades financeiras de meus pais, nós tivemos uma infância até feliz, porque se nós não tínhamos, digamos, aquela comodidade, aquele bem-estar que o dinheiro dá, nós tínhamos o amor de nossos pais.
O respeito, nós tínhamos que.
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Eles nos ensinaram.
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E jogamos muita bola, isso era o principal.
P - Como é que era o dia a dia da sua casa?
R - Bem.
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P - A família argentina assim, o que difere?
R - Bem, o dia a dia de toda família, praticamente.
Lá na Argentina, naquele tempo, nós não tínhamos empregada doméstica, nós estudamos.
Éramos quatro irmãos, os quatro estudaram, eu cheguei até a segunda.
Terminar, completar a segunda série também.
Minha irmã se formou professora e meu irmão era menor, o último era menor, então foi no tempo que eu vim.
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Eu tinha uma diferença de idade muito grande, o último, caçula, veio temporão né, e tinha uma diferença comigo de uns dez, doze anos.
Então quando eu vim para o Brasil com 20 anos, ele teria nove, dez anos no mínimo.
Em casa, afinal minha mãe trabalhava muito pra nos dar sempre em dia, exigia de nós.
Inclusive nós tínhamos a obrigação de ajudá-la nos afazeres, porque minha mãe, inclusive até o pão que nós comíamos ela fazia em casa, então nós tínhamos que preparar o forno, encerar os sábados, encerar religiosamente, enquanto preparava o forno buscar.
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Procurar a lenha pra aquecer o forno, e pra nós era uma festa porque era o dia que saía os pãezinhos especiais que nossa mãe fazia pra nós.
P - Além dos pães, o que mais que ela fazia que vocês ajudavam?
R - Nós ajudávamos em todos os afazeres, fazer as compras, ia fazer o que me mandava e tudo mais, isso sempre depois, após o horário da escola, que nós estudamos sempre de manhã, então no período da tarde era que nós tínhamos que fazer as nossas obrigações de casa para depois sermos liberados pra brincar.
P - E o quê que você se lembra das atividades do seu pai como ferroviário?
R - Meu pai trabalhava nas oficinas do Ferro Carril, que ficava a 25 quilômetros da cidade de Rosário, então de manhã cedinho, às seis horas da manhã, tinha que estar já para pegar o trem que levava até as oficinas da estrada de ferro e só voltava às seis horas da tarde.
Inclusive almoçava lá tudo em um restaurante da estrada de ferro, né.
E essa era uma rotina todo dia, que não podia perder nem um dia sequer de trabalho, nem horas, porque depois no final ia ser necessário para o cumprimento das obrigações financeiras, enfim, era uma rotina pra nós.
E meu pai inclusive foi um homem muito dedicado, muito bom, muito trabalhador, e eu guardo uma grande lembrança dele, dos dois, pai e mãe, né.
P - O quê que você pode falar pra gente das tradições argentinas, assim, que são mais marcantes?
R - As tradições, as tradições.
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É o seguinte, não sei se agora ainda continua com isso, mas era sempre, especialmente, no tempo de verão que os dias são mais prolongados, era sempre.
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Às quintas-feiras e aos sábados era churrasco, então às quintas-feiras à noite meu pai com meus tios, primos, nos juntávamos e fazíamos um churrasco, impreterivelmente às quintas-feiras, isto era certo.
E aos sábados - com carne bovina, né - era com peixe, que nós morávamos a dois quarteirões do rio Paraná, na cidade de Rosário.
O rio Paraná vai envolvendo a cidade durante todo o seu trajeto né, e lá o peixe é abundante, e nós comíamos um pintado, um pacu,enfim, um dourado.
Sempre aos sábados fazíamos isso, porque aos domingos, como nós somos descendentes de italianos, era macarronada sempre.
P - Dessa descendência italiana o que você considera mais marcante na sua formação?
R - Olha eu sou.
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Minha mãe, a senhora minha mãe é espanhola e meu pai italiano, então eu sou fruto de uma mistura brava, né ? (Risos) Mas sempre prevaleceu mais, pela influência de meu pai, pela influência de minha avó, minha nona, sempre influenciou muito mais, pra mim especificamente, a parte italiana.
Então eu gostei sempre muito mais da parte italiana que da parte espanhola de mim.
P - E tem alguma coisa marcante da tradição italiana?
R - Olha, sabe que.
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É muito marcante porque nós no começo, quando meu pai recém-casou, nós moramos juntos com meu avô, com meu nono, então eu fiz muita amizade com ele, porque ele já, logo após que nós moramos lá, nós perdemos a nona, a avó, e ele ficou viúvo, então se apegou muito a nós que morávamos juntos com ele.
E eu como era o primogênito, o mais velho né, é claro que ele tinha certo carinho por mim, brincava muito comigo, me levava a passeio, falava muito comigo, e isso fez que eu me apegasse muito, porque ele viajou muitas vezes pra Itália, ele podia ter sido um homem que ganhou muito dinheiro na Argentina, mas ele gastou muito também, indo e voltando pra Itália, pra rever a Itália e tal.
Ele era um apaixonado pela terra dele, e é claro isso é muito natural, né.
Isso foi se apegando dentro de mim e por isso pode ser que tenha sido o fator principal pra eu gostar muito mais do lado italiano que do lado espanhol.
P - Você falou dos jogos.
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Além dos jogos que outras brincadeiras você se lembra?
R - Bom, tínhamos essas brincadeiras de pião, brincar de pião, brincar de.
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Todas essas brincadeiras de criança que temos aqui tinham lá e se praticava sempre na escola, no bairro, no clube.
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Nós éramos sócios de um clube de basquete, então aprendi a jogar basquete, futebol, enfim.
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Na escola nós tínhamos um campo de futebol, estudávamos num colégio de padres e era obrigatório para jogar futebol, assistir missa, porque nós tínhamos o nosso campeonato né, da escola de futebol, era um campeonato muito concorrido e saíram muitos jogadores de futebol de lá, então, tínhamos isso aos domingos.
Tinha o jogo de futebol, aos sábados à tarde tínhamos o jogo de futebol do bairro, time do bairro, e durante alguns dias de noite, não me lembro bem os dias, até sexta, nós praticávamos basquetebol, e tinha campo de bocha lá no clube, também lá na Argentina é muito apaixonado pelo jogo de bocha, então nós crescemos nisso né? Pescando, indo pescar com meus tios, com meus pais, todas essas coisas boas que a gente relembra muito.
P - Os jogos de futebol vocês que organizavam? Os do bairro, como é que era? Você jogava com seus primos?
R - É, nós tínhamos nosso time de futebol lá no bairro e meus primos faziam parte do time também, e eles eram muito melhor jogador que eu, e o único que foi profissional fui eu.
É questão de sorte muitas vezes.
Eu me lembro muito desses times, esses jogos de várzea, que a gente sente.
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Agora depois de muitos anos sinto uma saudade muito grande disso.
P - Como que eram esses jogos de várzea?
R - Nossa, quando eram bairros rivais.
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Nós tínhamos um time bom e muitas vezes saía pancadaria, sabe? E tinha que levar a turma boa pra defender, porque a gente era garoto, 14, 15 anos.
Tinha que levar esses rapazes já maiores, e às vezes iam nossos pais e tal pra ajudar.
Era muito bom.
P - E como que você começou a se profissionalizar?
R - Olha, eu comecei a jogar na escola e aos 13 anos eu passei a treinar, fazer treinamento nas divisões inferiores do Rosário central.
P - Quem que te levou pra lá?
R - Naquela época não tinha treinadores, tinham delegados, então cada divisão inferior tinha um delegado que procurava o jogador e formava, era essa gente abnegada dos clubes, que gostavam do clube e iam formando time né, e nós.
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Ele foi procurar na escola né, e eu na escola era o goleiro.
Quando comecei a jogar no Rosário Central, eu não quis ser goleiro, eu quis.
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Minha paixão era ser atacante, e eu comecei a jogar na linha direita e durante o primeiro ano eu joguei na quinta divisão, sexta, aliás, na sexta divisão eu joguei o ano todo de direita, de meia-direita, após isso no ano seguinte, na quinta divisão, na metade do campeonato, houve um, o nosso goleiro se machucou e eu precisei ir, como naquele tempo não tinha troca de goleiro, tinha que ir um atacante, que é um jogador de defesa tinha que ir no gol, e eu fui no gol, e eles sabiam que eu jogava no gol porque me conheciam, e daí pra frente não saí nunca mais, tive que jogar porque acharam que eu tinha que ficar nessa posição.
P - Mas por que você não queria ser goleiro? O quê que acontecia?
R - Olha, a paixão de todo goleiro é marcar gol, não sei se você sabe, é isso mesmo.
A paixão de todo goleiro.
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Pois pode perguntar todos os goleiros antigos ou de hoje, todos eles têm a paixão de jogar na linha e marcar um gol.
(Risos)
P - Uma espécie de vingança?
R - Eu sei lá, espírito de vingança, eu diria ser.
É muito mais gostoso realizar que defender.
Então eu acho que deve ser uma emoção muito grande um indivíduo, um jogador marcar um gol num momento decisivo, numa partida importantíssima, na partida final marcar o gol.
É muito mais importante que você defender.
Porque geralmente você pode ver que o goleiro defende um gol feito num último minuto, mas se o atacante marcou no primeiro minuto um gol, quem vai lembrar todo o público, a crônica esportiva só vai lembrar daquele sujeito que marcou o gol no primeiro minuto.
Isso é.
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Que dá o resultado.
Tem que ser o resultado.
Então, eu teria gostado muito de ter sido um jogador atacante, mas Deus quis que eu fosse goleiro e eu fico agradecido por ter me ajudado bastante.
Eu agradeço a Deus que sou um homem que fui realizado aqui no Brasil, me realizei, fiquei muito feliz com aquilo que eu fiz aqui, estou orgulhoso daquilo que eu fiz, orgulhoso de ter pertencido a um clube que realmente hoje, hoje, não no tempo que eu jogava, hoje eu acho que é um clube que.
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Dos melhores do Brasil, se não é o melhor, um dos melhores do mundo também pela organização, pela forma de ser, por tudo aquilo que possui, pelos dirigentes que tem, e pelo time de futebol que tem no momento.
Eu defendi dois clubes na minha vida: o Rosário Central e o São Paulo Futebol Clube, como jogador.
Os únicos dois clubes que eu joguei na minha vida, foram esses dois clubes.
P - Como é que foi a tua primeira partida em Buenos Aires? Quem que eram os adversários, jogadores?
R - Olha, você não vai acreditar.
Naquele tempo eu acho que fui um dos poucos jogadores que eu fiz.
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Que fizeram que eu fizesse, não é que eu fiz fazer, mas houve uma temporada que o goleiro titular se machucou e eu jogava na terceira divisão, que fazia os preliminares, eu não sei se ainda hoje eles fazem.
A terceira divisão eram jogadores menores de 20 anos e nós tínhamos um time muito bom, que competia com River, com Boca, com os grandes times que tinham grandes divisões inferiores.
E nosso time sempre tava em segundo, terceiro tá.
Então, houve uma oportunidade em que se o goleiro se machucou e eu não fiquei concentrado nada, não sabia de nada né, mas o treinador, pra eu não ficar nervoso, não me comunicou nada, só na hora que terminou o nosso jogo, o jogo da preliminar, ele me falou: olha filho toma um banho rápido, vai entrar outra vez.
Não me deu nem tempo de ficar nervoso, nem pensar, não é? E eu joguei três partidas consecutivas, na terceira e na primeira, três partidas consecutivas.
Encontrei grandes clubes: São Lourenço Del Meno, River Plate e Boca Junior.
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Três clássicos que era um time pequeno, como era naquele tempo, como era Rosário Central, era pra perder os três, e nós não perdemos nenhum.
Ganhamos um e empatamos dois.
Então, foi uma coisa realmente sensacional pra mim especialmente, e para o clube também né, mas houve uma partida que nós empatamos zero a zero com o River Plate.
O River Plate naquela época tinha o Moreno, o Pederneira, o Labruna, enfim, tinha um timaço.
Era apelidado de “máquina” naquela época, e não conseguiu marcar gol na gente.
Então quando nós chegamos em Rosário, fomos recebidos até com banda.
Na estação de trem até banda tinha pra nos receber.
Esses são momentos, realmente, muito bons que ficam gravados na gente.
Uma satisfação muito grande de ter vivido esses momentos.
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Muito bom mesmo.
A única coisa que eu.
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Outro momento de grande satisfação foi esse ano, eu integrei o time juvenil, naquele tempo era o juvenil da seleção argentina que disputou no Equador um campeonato sul-americano e nós fomos campeões.
Então esse ano pra mim foi um ano fantástico, né? Essas são as boas lembranças que nós temos, de garoto, depois vieram as lembranças maiores, campeão pelo São Paulo em várias oportunidades, como jogador ajudei o São Paulo.
Tive sorte de ajudar o São Paulo em torneios fora do país importantes, excursões muito boas também.
Fui campeão nas divisões inferiores do São Paulo: dente de leite, dentinho, infantil, juvenil, aspirante e profissional.
Então eu me sinto um homem realizado dentro daquilo que eu fiz.
P - Sem dúvida.
Conta um pouco pra gente como que foi a sua vinda pro Brasil? Por que você queria tanto vir pro Brasil?
R - Em 1946, o Rosário Central fez uma excursão pelo Brasil, eu fiz parte dessa delegação e joguei todas as partidas.
E nessa época o finado Vicente Feola me convidou para vir para o São Paulo.
E realmente isso foi pra mim.
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Eu era.
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Não sabia nada do que era o Brasil, não sabia o que era São Paulo, nunca tinha saído, eu apenas conhecia Montevidéu né, e pra mim foi agradável.
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Foi muito agradável ter conhecido o Brasil, uma surpresa, uma surpresa muito agradável.
P - O quê que mais te marcou?
R - A cidade de São Paulo pra mim foi uma coisa fantástica, e o Rio também.
Naquela época era as belezas naturais do Rio, nós estivemos em Pernambuco, estivemos na Bahia, em Belo Horizonte, então às vezes, em Porto Alegre também.
Agora, Porto Alegre já é mais parecido com a Argentina, né, e São Paulo já é diferente, o Rio já é exuberante, é coisa completamente diferente do que nós estamos acostumados a ver na Argentina.
Eu fiquei empolgado, empolgado pelo Brasil.
E depois que eu voltei para Argentina, houve uma temporada que eu estava jogando, então eu queria vir para aqui, mas não houve oportunidade.
Naquele tempo, quando fizeram a proposta pra vir para aqui, eu era titular do time lá, com 17, 18 anos, tinha 18, 19 anos, não me lembro bem, então não havia possibilidade de.
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Mas após 1947/ 1948, houve uma troca do treinador, e esse treinador achou que tinha necessidade de ter um goleiro mais experiente do que eu.
E ele trouxe um outro rapaz pra jogar, aliás um rapaz muito bom, que era melhor que eu, a gente tem que reconhecer, era muito bom.
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Mas nessa idade você não se conforma em ficar na reserva, ninguém se conforma.
Eu comecei a trabalhar.
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Matutar.
E teve essa partida que, nós íamos para Buenos Aires, eu encontrei o Antonio Sartre.
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Antonio Sartre foi um grande jogador que jogou no São Paulo, foi uma das glórias do São Paulo.
Conversando com ele, ele teve uma ligacão telefônica com Vicente Feola, tal, e fez, e pediu pra eu ir pra lá, não, pra cá.
P - Pro Brasil.
R - E eu vim pro Brasil, dizendo que estava indo pra Colômbia, que naquela época a Colômbia estava levando.
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Era um futebol pirata, não precisava de passe não precisava nada, então eu falei que ia.
Naquela época houve uma debandada muito grande de jogadores argentinos, que foram pra Colômbia.
Então, eu falei que estava indo pra Colômbia, inclusive dei o nome do clube e tal, naquela época não tinha televisão, não tinha esse contato que tem hoje.
Hoje uma mentira dessa era checada na hora que era mentira, né.
E eu vim para o Brasil, vim pra São Paulo e vim para o São Paulo e fiz uns testes no São Paulo, fui confirmado.
Então, aí que foi um diretor achegado ao São Paulo para comprar meu passe.
Então, um clube pensando que tinha perdido um jogador, receber dinheiro, é uma coisa maravilhosa.
Então, compraram meu passe com a maior facilidade, para minha sorte, grande sorte minha.
P - Teve alguma repercussão você ter saído falando que ia pra Colômbia e ter vindo parar em São Paulo?
R - (Risos).
Não, eu falei que.
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Sei lá, um monte de mentira não, porque o que eu queria era vir para o Brasil, não pra Colômbia, e felizmente deu tudo certo.
Foram momentos realmente de grande apreensão, porque você fica nessa, vai sair, não vai sair.
Eles vão me castigar por não ter falado, né.
Mas naquele tempo o futebol argentino.
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Os dirigentes pensavam muito mais no dinheiro que em outra coisa, e se eu fosse pra a Colômbia, eles não iam receber um tostão.
Esse foi um grande argumento, não iam receber nada porque eu ia jogar lá na Colômbia, e de fato, tinha um clube para eu ir pra lá se eu quisesse.
Mas vindo para cá o clube pagou.
O São Paulo pagou o passe, e depois para eles foi uma salvação, porque naquele tempo o dinheiro lá era muito curto, como ainda é hoje.
Os clubes, naquela época, passavam dois meses, era 60 dias, 70 dias, o dinheiro curto, então quando viram o dinheiro ficaram satisfeitos, e eu muito mais.
P - Por quê?
R - Troquei a noite pelo dia.
Era uma coisa assim, uma diferença tremenda de um clube pra outro.
Apesar de eu ter jogado nas divisões inferiores, eu morava a dois quarteirões do clube, minha residência ficava a dois quarteirões do clube.
Mas realmente eu queria mesmo, sonhei muitas vezes, muitas noites, dias, sonhava que vinha para o Brasil, até concretizar aquilo que eu desejava.
P - E o que mudou na sua vida, a partir de então no Brasil?
R - Mudou tudo, tudo, porque eu vim pra um time organizado, um time muito sério.
Eu quando jogava no Rosário Central, trabalhava, trabalhava no Ministério de Guerra, na Escola da Fábrica Militar de Armas.
E aquilo lá era disciplina rígida, claro.
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P - E o que você fazia lá?
R - Eu trabalhava lá, dentro dessa oficina.
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Eu tinha um curso de eletricista e trabalhava.
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Acondicionava motores elétricos e tal, repunha, concertava.
Era duro levantar às cinco horas da manhã para entrar às seis.
Não era mole não.
Então troquei a noite pelo dia, muito feliz por isso.
P - E quando você chegou em São Paulo, você foi morar onde?
R - Primeiro, quando eu vim, fui morar num hotel, não me lembro o nome da rua, mas hotel aí no centro da.
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P - Na Xavier de Toledo?
R - Na Xavier de Toledo, né? Aí que vai sair no.
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P - No Mappin.
R - Em frente ao teatro.
Aí fui! Eu fiquei até depois arrumar um apartamento.
Depois de dois meses, dois meses e meio fui morar em Santana.
P - O senhor já era casado?
R - Era casado sim.
E morei em Santana durante uns 25 anos, até eu me mudar agora pra Santo Amaro lá, onde eu.
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P - E o São Paulo, treinava onde? Onde que era.
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R - No Canindé.
P - Como que era o bairro lá, o local?
R - Era chamada a ilha, porque onde estava o Canindé, a concentração do São Paulo, do time, o treinamento, estava rodeado de água, era tudo cheio de água.
Agora foi tudo aterrado e tal, naquele tempo o rio avançava e entrava.
A entrada para o Canindé, para a concentração do São Paulo, para onde nós treinávamos, era uma ponte, uma ponte, e tinha um rio aqui, rio de todo lado.
Então era uma ilha perfeita.
Aí tinha a concentração, tinha a equipe de remo, de barcos de remos, que antigamente o São Paulo fazia isso, onde treinavam também os atletas, os atletas de salto na.
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Todos esses grandes atletas.
O São Paulo teve grandes atletas, campeões inclusive, e nós treinávamos lá também.
Sempre o São Paulo foi muito mais futebol que outra coisa né, mas naquela época possuía um grande treinador, preparador de atletas, que era Dietrich Gerner, hoje falecido, e teve grandes atletas, campeões inclusive de paulistas e brasileiros.
E nós convivíamos com eles lá.
Era uma família muito boa naquele tempo.
P - E a cidade de São Paulo, como que era? Que lembrança você tem dessa época?
R - Uma grata lembrança viu.
Naquele tempo não tinha.
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Não era a cidade hostil que é hoje.
Você vivia tranquilamente, podia sair, os assaltos.
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Havia assaltos, é claro, uma cidade grande, mas não eram com essa, essa pressão que há hoje, por uma série de circunstâncias também, naquela época não tínhamos a dificuldade financeira que você tem hoje, se vivia muito melhor com muito menos dinheiro, mas se vivia muito melhor.
Era uma cidade muito agradável pra se morar.
Apesar das dificuldades de condução, porque para vir de Santana para o centro era uma dificuldade, era ônibus sempre lotado, lotações que faziam, táxis que faziam estações, e se demorava.
Pra vir de Santana ao centro da cidade, se demorava 40 minutos, 50 minutos, mas fora isso era uma cidade muito agradável.
Nós tínhamos bonde.
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Eu muitas vezes pegava o bonde aqui em Santana e descia na Ponte Pequena, é.
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R - Naquele tempo, filas intermináveis também pra ir ao cinema.
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Não era fácil não.
O cinema era a paixão, porque era ou futebol ou cinema.
Após a chegada da televisão que houve mais divertimento.
Outro divertimento que a gente tinha, quando tinha uma folga, nós íamos pra santos, pra praia.
Esse era um passeio maravilhoso, nós gostávamos muito, e as crianças sempre queriam ir para Santos.
Mas como sempre a gente tinha compromisso aos domingos, tinha que esperar a época certa.
E nas férias a gente sempre ia pra Santos.
P - Que cinema que vocês iam? Que rua que era? Que tipo de filme que vocês viam?
R - Eu sempre gostei daqueles filmes sempre de ações, naquele tempo tinha filmes de piratas e tal.
Agora já é filmes de detetives, de ação, de assassinato e essas coisas todas, né.
Sempre gostei muito de filme de ação, gostei não, gosto até hoje, e fico horas inteiras na televisão vendo esses filmes, gosto, adoro filmes.
Eu acho que hoje o homem, família, com a televisão tem muito mais.
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Logo após que saiu a televisão, eu já comprei uma pra minha família.
Então, já não precisava tanto sair, porque o jogador de futebol leva uma vida muito presa, muito difícil, você fica muito longe de sua família, e às vezes você vê crescer seus filhos sem ter vivido com eles.
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Sem ter tido a satisfação de viver a infância com eles, você vivendo no mesmo lar e tudo, você não gozou o prazer de estar com eles quando pequenos.
Quando eu acordei, meus filhos já estavam na faculdade, minha filha já tinha estudado pra se formar professora e tal.
E daqui a pouco minha filha casou e meu filho se formou engenheiro e se casou também, e a gente ficou sem os filhos.
É duro.
A vida de futebolista, que muitas pessoas pensam que é muito fácil, é muito difícil, e hoje é muito mais difícil que na minha época, porque hoje eu vejo clubes, como o São Paulo, jogar 97, 98 partidas por ano, quando nós, naquela época, jogávamos no máximo 50.
No máximo entre campeonato e amistoso jogávamos 50 partidas.
P - Como que era o dia o dia do jogador?
R - Naquela época nós treinávamos terça, quarta, quinta e sexta.
Concentrávamos sexta á noite para jogar, sempre concentrávamos.
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Quando era um jogo importante, às vezes, concentrávamos quinta-feira também.
Mas nós treinávamos só de manhã, e a tarde era tudo, de segunda-feira era livre, completamente livre.
Eu aproveitava isso pra ganhar mais um dinheirinho para o bem-estar da gente.
E foi nessa época que eu comecei a vender cadeiras cativas, títulos patrimoniais, vender depois publicidade para o São Paulo e tal, ajudei um pouco o São Paulo a construir o estádio também.
Foi um momento bom.
P- O quê que o senhor lembra da construção do estádio?
R - Que na primeira época ninguém acreditava, muito pouca gente acreditava na construção do estádio, porque começaram a vender-se cadeiras cativas quando estavam nos alicerces.
Quando começou a sair e tal, começaram sair um pouco, mas muito pouca gente acreditava que saísse o estádio, mas a gente usava muito o nome, que jogava no São Paulo, né, pra vender as cadeiras cativas.
E muitos falavam: ah, eu vou comprar porque é você e tal, mas não vai sair.
E eu: vai sair, sim, vai sair.
Muitas dessas pessoas hoje devem se lembrar, são pessoas idosas, devem lembrar disso, e se uma vez escutam esta entrevista, eles falam: mas puxa vida, o gringo tinha razão (risos).
Hoje é uma satisfação muito grande, um orgulho pra todos nós, são paulinos, esse estádio que temos.
Enfim, é um prazer grande mesmo de pertencer a uma instituição séria como é o São Paulo.
Eu sou sócio, já fui conselheiro do clube, e por circunstâncias de eu gostar de futebol, às vezes eu me afastei pra exercer funções em outros clubes.
Mas esta última vez que eu fui para um grande clube que é a Portuguesa, eu fiquei decepcionado completamente, porque o fato de eu ser são paulino, eu tive que sair da Portuguesa.
Não porque os dirigentes quisessem, porque um grupo pequeno de torcedores fanáticos acharam que eu sendo são paulino, eu podia entregar o jogo para o São Paulo, uma ignorância total.
Então, eu desisti disso, digo não, não posso depois de certa idade, com o passado limpo que a gente tem, se sujeitar a escutar uma bobagem dessas, porque vocês.
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Todo mundo sabe que eu sou muito achegado.
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Sou são paulino mesmo, e eu tenho orgulho de falar disso, não ligo pra ninguém, sou um profissional correto, honesto, que quando eu trabalho pra outra instituição, dou, faço o possível e o impossível pra que esses títulos são ganhos, porque a minha obrigação, é minha moral que está em jogo.
Então, mesmo me desagradando, se pudesse ganhar do São Paulo ganharia, mas eu estou vendo que isso não compensa.
Eu prefiro dirigir meus conhecimentos em outro lugar, uma instituição menor que não te dê chance de ganhar dinheiro, tal, mas você fazer as coisas onde você gosta, trabalhar onde reconhecem o seu trabalho.
É por isso que eu trabalhei quatro temporadas, cinco, não me lembro bem, em Jaú, no XV de Novembro de Jaú, que é um clube pequeno, humilde, mas eu fui recebido de braços abertos, e depois do São Paulo, um clube que eu, que me agrada é o XV de Novembro de Jaú.
P - E entre as partidas, suas partidas, qual que foi a maior emoção?
R - Bom, eu tive, graças a Deus, muitas emoções boas, muito boas.
Fui várias vezes campeão pelo São Paulo, como jogador.
Como treinador fui campeão em 1975, dirigindo o São Paulo, que foi até hoje, até hoje, mesmo com essa extraordinária campanha do São Paulo, foi a maior campanha da história do São Paulo, foi campeão em tudo, ficou 43 partidas invicto de campeonato, foi o artilheiro, foi o time que mais gol marcou, o artilheiro no campeonato, a defesa menos vazada, e campeão de renda.
Então ganhou tudo naquela época, e eu, graças a Deus, eu era treinador do time, que grande satisfação.
P - Quem que era o time, Poy?
R - Era o Waldir Peres, o Waldir Peres, Forlan, depois Nelsinho, Paranhos de zagueiro central, Arlindo de quarto zagueiro, Gilberto de lateral-esquerdo, no meio de campo era Chicão, Chicão, Pedro Rocha, na linha era Terto, Murici, Serginho, primeiro o Mirandinha, depois se machucou, Waldemir quebrou a perna, entrou Serginho e na ponta-esquerda Zé Carlos.
P - O quê que você colocava pra essa equipe que era importante?
R - Seriedade, seriedade, eu tratava impor disciplina, seriedade e amizade, que você pode exigir dos jogadores, sendo amigo deles, porque quem jogou sabe que o jogador não é sempre que pode jogar bem, tem seu dia infeliz.
Apesar de que ele diz muitas vezes: “puxa, o cara não quis jogar”.
É tudo mentira, não tem um jogador, por pior caráter que ele seja, que não quer jogar bem, ou pelo dinheiro, ou por vaidade, ou por amor à camisa, ele sempre quer jogar bem.
Então, o dia que o jogador não joga bem é porque ele não está num dia feliz, porque adversário foi mais feliz que ele, uma série de circunstâncias, ou porque ele não está se sentindo bem fisicamente, ou espiritualmente, uma série de circunstâncias.
Não existe jogador que queira jogar mal porque ele quer, não existe.
Isso só sabe quem jogou.
Aquele que disputou, aquele que entrou dentro do gramado, aquele que suou a camisa, aquele que jogou na equipe, ele sabe que isso não existe.
Sempre jogador quer ganhar, por mais mal caráter que ele seja, é difícil.
P - E com relação à torcida quê que.
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R - Bom, a torcida do São Paulo pra mim foi muito boa assim.
Como jogador então eles me trataram muito bem sempre.
Eu tive a sorte de ser feliz, jogar bem contra os grandes times, especialmente no Pacaembu, que o Pacaembu, naquela época, era o lugar, era o teatro onde se consagrava o jogador, e eu fui muito feliz nesse tempo.
Depois eu tive a felicidade de inaugurar o Morumbi.
Na partida inicial, eu fui.
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Inaugurei o time, fui capitão do time.
Esse foi um prazer muito grande e uma honra que me deu a diretoria, pelo esforço que fiz vendendo cadeiras cativas também, e por merecimento.
E essas duas partidas inaugurais eu joguei, porque eu tinha ficado fora do time com fratura, né? Então quase todo ano fiquei fora do time, mas eu me preparei, me preparei pra inaugurar o estádio, e consegui, e fui feliz com isso, fiquei muito feliz com isso.
P - O quê que você se lembra desta partida? Os momentos mais emocionantes?
R - O primeiro jogo nós.
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Nós tínhamos.
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Olha que o primeiro eu não me lembro em, eu estou meio.
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Mas acho que o primeiro jogo, e nós jogamos contra o time português.
P - Sporting.
R - É, o Sporting de Lisboa.
Nós ganhamos de um a zero.
E jogamos acho que com quase todos os nossos jogadores.
Agora, o segundo jogo contra o Nacional de Montevidéu, a equipe foi reforçada com Djalma Santos, com Almir.
P - Julinho.
R - Julinho né, realmente com três, quatro grandes jogadores, e nós também ganhamos de dois a zero essa partida.
Então, o São Paulo conseguiu na inauguração do estádio, que não foi inauguração toda, foi uma parte do estádio inaugurado.
A inauguração completa, se não me falha a memória, foi em 1970, dez anos depois, o São Paulo inaugurou por completo o estádio, demorou bastante.
O estádio começou, as obras foram iniciadas em 1963 ou 64, perdão, perdão, 53, 54.
Foi inaugurado parcialmente em 1960 e completo em 1970, então passou um bocado de tempo pra terminar, que foi uma obra gigantesca com dinheiro que o povo deu, que não somente são paulinos, claro, grande parte foi de são paulinos que compraram cadeiras cativas, mas tinham muitos corintianos, muitos palmeirenses que também compraram cadeiras cativas, por isso que saiu essa obra.
R - Por que corintianos e palmeirenses também compraram?
R - Porque acreditaram.
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Acreditaram que o São Paulo poderia realizar.
O São Paulo foi um dos poucos clubes que realmente tem bagagem e condições de fazer aquilo que se propõe, é por isso que eles acreditaram.
P - E hoje como que você vê o São Paulo?
R - Eu já falei, pra mim hoje o São Paulo, com tudo.
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O estádio, a parte social, as dependências dentro do estádio, aquelas partes de física, aquele material que tem pro departamento médico, aquela retaguarda toda pro São Paulo dar pros atletas, eu acho que no Brasil é o primeiro, e um dos primeiros no mundo todo, o São Paulo Futebol Clube.
P - A gente está fazendo uma pergunta pra todo mundo.
Qual seria o time do São Paulo que você escalaria?
R - Ah, já não é problema meu, isso é problema do Telê.
P - Não, de todos os tempos.
R - Também não é problema meu.
Esse é problema da crônica esportiva.
Eu já fui incluído duas vezes em enquete entre jornalistas na equipe ideal do São Paulo, esse é um orgulho muito grande, guardo um quadro grande disso, que isso é realmente um.
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Viver e ser colocado no meio de tantos monstros sagrados do São Paulo.
É um orgulho muito grande.
P - Quais foram os grandes monstros sagrados que você viu jogar ou que o São Paulo já teve? Fala um pouco sobre esses grandes jogadores.
R - Olha, eu tive a felicidade de jogar num time que jogava Savério, Mauro, Bauer, Rui, Noronha, Friaça, Albella, Leônidas, Remo e Teixeirinha.
Eu joguei nesse time.
Depois joguei em outro grande time também, que jogou eu, De Sordi, Mauro, jogamos mais de dez anos juntos, consecutivos.
Depois Bauer, Pé de Valsa e Alfredo, ou Pé de Valsa, Bauer e Alfredo, Maurílio, Maurinho, Albella, Gino, Negri e Teixeirinha, fomos campeões com esse time em 1953.
Depois fomos campeões outra vez comigo, De Sordi, Mauro.
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P - Em 1957?
R - Em 57, era Dino, Vitor e Riberto, Maurinho, Amauri, Gino, Zizinho e Canhoteiro.
Eu tive a felicidade de jogar com esses Zizinho e Canhoteiro, dois monstros, grandes jogadores de bola.
P - Quando o Canhoteiro veio para o São Paulo?
R - Canhoteiro veio no São Paulo em 1954, no começo de 1954.
Ele veio fazer teste, trazido por um empresário do Norte.
Quando eu vi esse jogador, puxa vida eu tenho que contratar na hora, não esperei mais porque se não alguém ia levar.
P - Foi você que ajudou que a escolha.
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Como é que foi essa história da excursão que vocês fizeram?
R - Por que em 1953 o São Paulo, nós fomos campeões e o chamado Raymundo, era nosso diretor de futebol naquela época, me deu uma folga para ir para Argentina, que já fazia tempo que eu não ia visitar meus pais.
Quando eu voltei das férias, o time já tinha conseguido uma excursão para o Nordeste, eu fiquei fora, fiquei em São Paulo, fiquei treinando com os jogadores reservas e aspirantes que ficaram em São Paulo, e foi aí que apareceu o Canhoteiro, quando eu vi o Canhoteiro simplesmente, fez e trouxe no chão, coisa que eu nunca tinha visto, uma facilidade pra tratar a bola, uma habilidade realmente muito grande.
Nesse domingo, nós fomos fazer uma partida amistosa em Poços de Caldas e ele foi, e eu fui jogar, reforçando o time e tal, e jogamos em Poços de Caldas, e ele jogou no time, nossa senhora, o que esse rapaz fez.
Quando voltou, já estava contratado, que realmente era muito bom.
P - Como que era a relação do Canhoteiro, particularmente, e de vocês todos com o Bela Gutman, o técnico húngaro?
R - Ele era muito bom, o Canhoteiro era um rapaz que se estava com uma turma boa, ótimo, mas se estava com uma turma da pesada, ele ia também no embalo da pesada.
Ele era assim, mas era uma pessoa realmente sensacional, muito boa.
P - Por que ele não vingou, não foi um grande jogador de seleção, por exemplo?
R - Quem sabe por ter sido um pouco boêmio, quiçá por isso, quiçá por isso.
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Porque condições ele tinha pra ser titular de qualquer seleção.
Foi um jogador muito habilidoso, muito bom jogador.
Mais alguma pergunta?
P - O senhor gostaria de falar mais alguma coisa, alguma coisa que ficou faltando?
R - Olha, falando de futebol e falando do São Paulo, eu posso ficar aqui dez horas consecutivas falando.
Eu sou apaixonado pelo meu clube e sou apaixonado pelo futebol, então pra mim é muito fácil.
P - Você se sente hoje mais argentino ou mais brasileiro?
R - Eu sou argentino de nascimento e brasileiro de coração.
Eu acho que não há necessidade de você dizer, ir e se naturalizar, e fazer essas.
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Você é brasileiro porque você gosta sinceramente, é brasileiro porque você paga todos os impostos em dia, e você vive corretamente com honestidade dentro do país, para você ser respeitado e respeitar os outros.
P - Poy, pra gente terminar, qual o sonho que você gostaria de realizar ainda?
R - Realmente, eu tive muita sorte, fui feliz em muita coisa, em tudo que fiz.
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então futebol é minha paixão.
Eu gostaria de finalizar minha vida desportiva dentro do São Paulo, fazendo aquilo, onde eu me iniciei, não jogando bola, naturalmente, mas fazendo alguma coisa, colaborando com o São Paulo na medida do possível.
Eu me sentiria realizado e ficaria muito feliz.
Já não se trata de financeiro, não se trata de nada disso, que a gente tem condições de viajar pro exterior.
Eu já estive na Arábia, ganhei um bom dinheiro, posso viajar para o Japão, mas eu já não estou mais em idade de pensar nisso, estou na idade de pensar em finalizar onde eu comecei, fazendo aquilo quando comecei a trabalhar, fora de jogador, naturalmente, nas divisões inferiores, tal.
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Não como treinador, porque já tem gente muito boa lá, mas colaborando, fazendo alguma coisa assim de útil.
P - A gente agradece muito a entrevista.
R - Foi um prazer muito grande tratar com vocês, que vocês são uma simpatia.