P - Bom dia Bem vinda. R - Bom dia. P - Qual é o seu nome completo, o local e data de nascimento? R - Shirley Paixão Ipólito. Nasci em Itaperuna, no dia 9 de novembro de 1960. P - Qual é o nome dos seus pais e o que eles faziam? Você se lembra? R - O meu pai, José Ipólito, operador de máquinas, trabalha no DR. Minha mãe, Maria da Paixão Ipólito, trabalha em casa. P - E qual é a origem da sua família, Shirley? Dos avós, você sabe? R - Meus avós paternos - eu não sei muito bem - eram filhos de escravos, vieram aqui de Petrópolis, eu não sei muito bem de onde. O meu avô materno, eu conheci bem, José Emílio da Paixão. Ele vendia algodão. Ele tinha uma fazenda, vendia algodão, mas também não sei de onde ele veio, ele também não sabia. Era também descendente de escravos. Depois da fazenda, uma prima queimou todas as coisas que ele tinha escrito: cartas, essas coisas. Então, nós perdemos quase tudo que sabemos dele. P - Não tem muitos documentos? R - Documentos, não têm. P - E irmãos, quantos você tem? R - Tenho oito. P - São homens, mulheres? R - Cinco homens. Nós somos cinco homens e quatro mulheres. O meu irmão mais velho já está falecido. P - E como era essa convivência de quando vocês eram meninos, mais novos, com tantos irmãos, na sua casa, quando vocês eram pequenos? R - Bom, minha casa sempre foi muito pequena. Então, vivia muita gente. Não tenho muita lembrança, porque eu me lembro que a gente morava em uma roça chamada Pirapitinga e era perto de uma escola, onde tinha uma professora, que eu só me lembro de flash. Mesmo mais velha, depois de adolescente, me lembro de brincar na rua. Essas coisas que eu me lembro. P - E como era na casa, o cotidiano, com tantos irmãos? R - Minha irmã mais velha sempre trabalhou e cuidou das crianças. Minha mãe lavava roupa. Eu brincava, só brincava na rua. O dia inteiro brincando na rua, lá. E a minha mãe gritando para eu ir para a escola....
Continuar leituraP - Bom dia Bem vinda. R - Bom dia. P - Qual é o seu nome completo, o local e data de nascimento? R - Shirley Paixão Ipólito. Nasci em Itaperuna, no dia 9 de novembro de 1960. P - Qual é o nome dos seus pais e o que eles faziam? Você se lembra? R - O meu pai, José Ipólito, operador de máquinas, trabalha no DR. Minha mãe, Maria da Paixão Ipólito, trabalha em casa. P - E qual é a origem da sua família, Shirley? Dos avós, você sabe? R - Meus avós paternos - eu não sei muito bem - eram filhos de escravos, vieram aqui de Petrópolis, eu não sei muito bem de onde. O meu avô materno, eu conheci bem, José Emílio da Paixão. Ele vendia algodão. Ele tinha uma fazenda, vendia algodão, mas também não sei de onde ele veio, ele também não sabia. Era também descendente de escravos. Depois da fazenda, uma prima queimou todas as coisas que ele tinha escrito: cartas, essas coisas. Então, nós perdemos quase tudo que sabemos dele. P - Não tem muitos documentos? R - Documentos, não têm. P - E irmãos, quantos você tem? R - Tenho oito. P - São homens, mulheres? R - Cinco homens. Nós somos cinco homens e quatro mulheres. O meu irmão mais velho já está falecido. P - E como era essa convivência de quando vocês eram meninos, mais novos, com tantos irmãos, na sua casa, quando vocês eram pequenos? R - Bom, minha casa sempre foi muito pequena. Então, vivia muita gente. Não tenho muita lembrança, porque eu me lembro que a gente morava em uma roça chamada Pirapitinga e era perto de uma escola, onde tinha uma professora, que eu só me lembro de flash. Mesmo mais velha, depois de adolescente, me lembro de brincar na rua. Essas coisas que eu me lembro. P - E como era na casa, o cotidiano, com tantos irmãos? R - Minha irmã mais velha sempre trabalhou e cuidou das crianças. Minha mãe lavava roupa. Eu brincava, só brincava na rua. O dia inteiro brincando na rua, lá. E a minha mãe gritando para eu ir para a escola. Tudo muito difícil: ir para a escola, todo mundo só brincar. P - Você se lembra de como eram as brincadeiras, quais eram as suas preferidas? R - Eu sempre brincava de Mocinho e Bandido e Pique Bandeira. Eram as brincadeiras que a gente fazia. Não tinha brinquedo. Não tinham essas coisas que a gente compra no R$1,99. Essas coisas não tinham, não. P - Não tinha brinquedo, então vocês inventavam brincadeira também? R - É. Essas brincadeiras eram o que tinha ali na região. Eram brincadeiras de meninos. Na verdade, essas brincadeiras de menino eram aquelas que eu brincava: as brincadeiras com os meninos. As meninas ficavam para lá, eu brincava com eles, de Mocinho e Bandido, de Zorro. P - E as brincadeiras de meninas - que as meninas brincavam - o que eram? Você se lembra? R - Eu não brincava de menina. Eu não sei do que elas brincavam, porque eu nunca brinquei com menina. P - Você preferia as brincadeiras dos meninos? R - Eu brincava só com menino. P - E você se lembra da rua? Como era? Era de terra? R - De terra. Nós morávamos na roça, nessa época. Depois, fomos morar na cidade, que é Itaperuna, Pirapitinga é pertinho de Itaperuna. A minha casa era a única casa da rua. O resto era brejo. Tinha sapo, essas coisas. E depois, muitos anos depois, é que foram passar calçamento lá. P - E tinha bichos também? Tinha galinha, criação de bichos? O que é que tinha? R - Nessa minha casa tinha galinha, cabrito - que você gosta - galinha, cabrito e tinha uma vaca que meu avô trouxe para poder dar leite ao meu irmão mais novo, que é o Alexandre. Ela ficava lá, para tirar leite todos os dias. P - E vocês plantavam alguma coisa também? R - Não, só horta. Porque, nessa época, a gente já morava na cidade. Aí só plantava couve, alface, essas coisas de horta mesmo, de fundo de quintal e que a gente tomava conta. P - E vocês iam para a escola, não é? Você estava nos contando. R - Tinha um embornal. P - Tinha um embornal. Como era um embornal? O que é que punha no embornal? R - Um embornal é aquela bolsa que se faz em casa, de pedaço de pano, de brim. E colocava só um caderno, borracha não tinha, era só o lápis. E só. Livro não tinha, porque o governo não dava. Tinha aquelas cartilhas, não é? Só as cartilhas mesmo. P - Vocês levavam lanche de casa? Ou era a escola que dava? R - Não. A escola dava tapioca e leite de chocolate, naquela caneca de alumínio, quente que ninguém tomava. Era o que a gente comia na escola. P - E como era? Vocês iam à tarde para a escola ou de manhã? Como você ia para a escola? R - Não. Era de manhã. P - Era de manhã e você ia como? A pé? R - A pé. P - Era longe? R - Não sei o que é longe. Eram uns quarenta minutos andando. Mais ou menos. P - Vocês iam todos a pé? R - Todos a pé. P - E você ia com os irmãos e alguns amigos? Tinham, na região, uns amigos, de outros lugares? R - Não, era pouca gente. Era só mesmo eu e os meus irmãos. P - E vocês iam a pé, depois voltavam a pé, mais tarde, da escola. Como era quando chovia? R - Não. Nessa época a gente já morava na cidade, então, se chovia, tinha que ir na chuva, porque não tinha sombrinha. Naquela época, sombrinha era caro, então não tinha sombrinha. Ou não ia. Quando chovia, não ia. P - E você se lembra das comidas daquela época, da sua infância, que a sua mãe fazia? Tinha alguma coisa típica? Ou que ela gostava de fazer? R - Não, na minha casa comia-se angu todos os dias. Meu pai não comia sem angu. A gente tinha que comer angu, todos os dias se fazia angu. Na casa da minha avó, eu me lembro que ela fazia uma comida que era galinha com macarrão. Isso era junto - era uma comida engraçada - era uma galinha com macarrão que ela fazia, eu me lembro. Porque eu era criança também, não comia as partes gostosas do frango, só pé e pescoço. E só comia isso. P - E os doces, sobremesas? Tinha alguma que sua mãe fazia ou sua avó fazia e que te marcou? R - Minha mãe faz cocada até hoje e faz muito bem A cocada da minha mãe é muito boa. P - Vocês também iam muito para a casa da sua avó ou ela morava com vocês? R - Não, ela morava em outra rua. Era pertinho. A gente ia todo domingo. P - E voltando para escola, o que você se lembra da escola? Como era aquele prédio? R - A escola está no mesmo lugar, até hoje é a mesma escola. As minhas irmãs trabalham nela: Escola Estadual Rotary. Minhas três irmãs, a mais nova e as duas mais velhas estão lá. Agora, está sendo reformada, até uns dois meses atrás ela estava igualzinha. Agora está tendo reforma, ela está toda cheia de ar-condicionado, essas coisas. Mas, engraçado que eu só me lembro de duas coisas da minha escola: uma professora que eu tive - que era linda - a Sônia, eu me lembro dela com a "sainha" curtinha de futebol, aquele meião de futebol; e uma que ainda está na escola, se aposentou agora, a gente consegue encontros com ela, que é a Dona Dodôra, que era muito ruim para a gente. Ela era muito ruim para a gente. Eu só me lembro dessas duas coisas da escola. E de brigar com a minha irmã. Atrás, tinha uma rampa que a gente subia em cima de papelão e escorregava. Já escorregou em papelão? P - Já, muito bom. R - Atrás da escola tinha. Mas, os donos da escola não podiam escutar. Então, eu não deixava a minha irmã ir lá, porque tinha aquela separação: as mais novas não podiam chegar. P - Aí não se misturavam? As mais velhas com as novas? R - Não. P - Isso, mais ou menos em que idade que não podia se misturar? R - Nessa época, eu acho que eu tinha uns dez a doze anos, ela devia ter uns nove, mais ou menos. P - E aí não misturava com adolescente, não podia misturar? R - Não, não podia. Porque nessa época a gente já estava saindo, então a gente já estava mandando na escola. P - Ah, já eram as mais velhas da escola. E essas professoras, das quais você se lembrou: a Dona Dodôra e essa outra professora - que você disse que era bonita - o que te marcou nelas? Era o quê? O jeito com que elas trabalhavam com vocês, que elas lidavam com vocês? O que era? R - É porque uma era o oposto da outra. A Dodôra era muito brava, muito rígida. E a Dona Sônia era mais porque era meiga. Da escola eu me lembro bem delas. P - E você se lembra quem ensinou você a ler, a escrever?Foi em casa ou foi nessa escola? R - Foi nessa escola, mas eu não me lembro da professora que me ensinou a ler. P - E foi na escola? R - Eu me lembro que ela cortou o meu cabelo, porque eu não penteava. Cortou curtinho. P - Qual delas que cortou? R - A que me ensinou ler, mas eu não me lembro de quem ela era. Eu me lembro desse fato dela ter me mandado de volta, porque eu tinha o cabelo comprido e eu não deixava minha mãe pentear. Então, ela me mandou de volta e cortou meu cabelo curtinho. P - E quem cortou foi ela, não? Ela mandou para casa para cortar o cabelo? R - Mandou para casa para cortar. Aí cortou curtinho. P - Aí você voltou? R - Voltei. Cortou curtinho. P - E você ficou chateada? R - Não, acho que não. Acho que eu quis cortar mesmo, porque eu não deixava pentear. Fiquei chateada não. P - E você se lembra se elas liam para você? Algum professor lia para você estórias ou contava estórias? R - Eu não me lembro de nenhuma delas. Eu me lembro de meu pai contando estórias, mas não me lembro de nenhuma delas. P - E seu pai contava estórias para você como? Tinha um horário ou sempre era um momento? R - Não, só quando chovia e à tarde, na cama. P - E você se lembra que tipo de estória ele contava? Era de medo? R - Não, era estória de medo. Estória dele mesmo. Não me lembro. P - E, voltado para a sua escola, o que ficou mais marcado de divertido, além dos papelões, de descer na ladeira? Tinha uma amiga especial? Uma amiga com quem você brincava? R - Tinha. Tinham duas meninas, depois a gente até se separou. Luíde, que cresceu junto com a gente. Ela morava na casa atrás da minha. E uma menina, Rosinha, ela chamava. A gente a chamava de Rosinha da Bidoca. A mãe dela tinha o apelido de Bidoca, então, ela chamava Rosinha da Bidoca. Essas duas. E minha irmã mais nova, que estudava comigo, na mesma escola. P - Vocês ficavam mais juntas? R - É. P - E tinha uniforme, Shirley? Como era? R - Não. Nós só tínhamos uniforme no mês que a gente ia desfilar - que era no mês de maio, 10 de Maio - a festa da cidade. Então, a gente só comprava uniforme nessa data. Aí eu me lembro sim. Era Vulcabrás, eu me lembro que era sapato Vulcabrás, meias compridas e aquela saia plissadinha. A blusa era de voil, acho que era voil aquele negócio, de manguinha, com aquele bolso. Eles davam o bolso para pregar. P - E a saia era de que cor? R - Azul. P - Azul marinho? R - E blusa branca. P - E os meninos também? R - Os meninos eram também. P - Punham calça comprida ou short? R - Short, aquelas bermudas. P - E me diz uma coisa: como era o cotidiano na escola, vocês brincavam no pátio também, tinha brincadeira, era permitido? R - Brincava no pátio. Tinha um pátio bom, a gente brincava no pátio. Na hora do recreio, tinha aquela merenda muito ruim. Eu me lembro que a merenda vinha em caixas do exército. Era da época da ditadura, eu me lembro bem que era em caixa de exército. A gente comia aquelas comidas que eles davam no exército. P - E era sempre a mesma, todo dia igual? R - Era leite de chocolate, chocolate com leite, tapioca, horrível Sopa de macarrão. Era isso, pelo o que eu me lembre. P - E tem alguma coisa que você gostava muito na escola? O que te marcou, que você adorava fazer? R - Sabe que não? Não tinha nada que eu gostava muito na escola. P - Sei, tinha que fazer. R - É. P - E depois que você saiu dessa escola, você foi para onde? R - Na época, tinha admissão. Teve admissão aqui. Aí tinha aquele livrinho da admissão para a gente ler, estudar para poder fazer aquela provinha - igual ao vestibular - e passar para a quinta série. Eu me lembro que eu fiz a prova, tinha que tirar cinqüenta, eu tirei 53. E quem foi ver foi a minha cunhada. Foi lá ver. P - A nota? R - A nota. Para ver se eu tinha passado. E, depois, no outro ano, quando eu já estava na quinta-série, eu me lembro do Romário, que é um professor que eu tenho - que está ali na foto, depois você vai ver – e eu fiquei em recuperação em Geografia e ele me passou, me deu a nota. P - Ele te deu a nota. Por que será que ele te deu? R - Não, foi porque eu pedi. Eu tinha perdido ano, nessa época. Não sei nem porque que eu perdi o ano. Eu era relapsa mesmo, deve ser. Aí a minha cunhada, essa mesma minha cunhada, foi lá para ver a nota. E ele me deu a mesma nota que eu tirei na admissão, que foi 53. P - E você ficou feliz que você passou na admissão? R - É. Aí eu já estava lá na escola, não é? No Colégio Estadual 10 de Maio, que era uma escola famosa da época, ela ainda está lá. Não sei, acho que se eu não passasse, eu teria que voltar - acho que era alguma coisa assim - eu fui lá e me lembro dela ter ido à casa dele, subiu uma escada, eu fui lá pra ver. Ele falou: "Não, pode deixar. Eu vou dar a nota." P - Aí você passou? R - É. Mais tarde, na faculdade, eu já terminando a faculdade, ele foi meu paraninfo. P - Olha, que maravilha E como vocês se reencontraram? R - Ele era professor da faculdade que eu fiz. P - Por coincidência? Porque ele era professor dessa escola. R - Ele era professor da Colégio 10 de Maio. Eu acho que foi por coincidência. Muitos anos depois que passou a ter a faculdade. A faculdade foi no lugar de onde era um hospital. Aí ele foi ser professor da faculdade, foi meu professor de geografia, ele ficou comigo os quatro anos, eu acho. Quando eu terminei, ele foi meu paraninfo. P - Então, você entrou, passou na admissão, que era um exame difícil naquela época, não é? R - Nossa, era muito difícil. Eu acho que era igual ao vestibular hoje. P - Tinha uma sensação de vestibular, não é? Acho que era uma grande preocupação naquela época: passar na admissão? R - É. Porque, se você não passasse, você teria que ir para um colégio particular, que na cidade não tinha. Naquela época, não tinha nenhum colégio particular. Você teria que esperar até você passar e fazendo aquelas provas. P - Depois da admissão você faria o Ensino Fundamental II? R - É, é a quinta-série. P - E aí, como foi no Fundamental II? Você ganhou novos amigos? R - No Fundamental II, eu fiquei os quatro anos com a mesma turma. Era uma turma grande. E aí foi normal, nessa época não perdi mais, fui direto. Mas eu era muito relapsa. Eu não era boa aluna não. P - Você não gostava de estudar ou você era mais ou menos? R - Não, eu era mesmo relapsa. Eu não fazia era questão de nem estudar. Brincava muito. P - E depois, foi crescendo, o que você fazia com esses amigos mais adolescentes, pré-adolescentes? Qual era a diversão? R - Nessa escola tinha uma banda, uma fanfarra, que o maestro se chamava José Carlos. Nossa, ele era muito rígido Está lá vivo, até hoje, o Zé Carlos. De vez em quando, eu encontro com ele. A gente se encontra de vez em quando. Cidade pequena, não é? Todo mundo encontra o Zé Carlos. E ele era o marido da diretora daquela escola primeira, onde eu estudei, da Dona Irani. Eu fui para essa escola, fui para a Escola 10 de Maio e fui para a fanfarra. Eu toquei, na época, prato, depois eu fui tocar tarol. Aí era divertimento só A gente viajava, ia para outras cidades tocar. E tinha uma amiga minha, que ainda é minha amiga até hoje, Nair - Nair Mariano - que ela cresceu comigo, era amiga da minha irmã, ela também era terrível, não passava de ano de jeito nenhum. Era eu, ela e Liliana, uma amiga da gente. Então, nós passamos esse tempo todo, esses quatro anos, juntas. Eu fui fazer o segundo grau e a Nair se perdeu, ela não passou, ficou por lá, não conseguiu terminar. Ela estudou com a minha irmã mais velha, estou com a minha outra irmã, depois encontrei com ela e fiquei quatro anos com ela e ela não saiu. Eu acho que ela gostava de ficar na escola, gostava. P - Pode ser. R - É. P - E no segundo grau, daí você já estava adolescente, como era a diversão adolescente? R - No segundo grau, já não era muito não, porque com 13 anos eu já fui trabalhar. Eu estudava de manhã e trabalhava com Doutor Israel à tarde, em um prédio. Eu tinha que ir para casa, voltar rapidinho, trazer almoço para o meu irmão - que é mecânico - deixar o almoço para ele lá e ir trabalhar. Eu trabalhava até as seis horas. P - E o que você fazia nesse seu primeiro trabalho? R - Eu fui secretária de um dentista, Doutor Israel. Ele tinha saído do exército e a esposa dele, Dona Sílvia, tem um asilo lá, ela é presidente do asilo, até hoje ela está lá. A minha irmã trabalhava nesse prédio, daí arranjou para eu trabalhar com ele lá, na tarde. Eu trabalhei com ele uns três anos. Depois saí, fui trabalhar no Sindicato dos Bancários, também com uma dentista, chamada Ivete. Era uma turca loira, bonita. Aí trabalhei uns quatro anos com a Ivete, uns quatro anos, eu acho. Eu estava quase sendo dentista, e saí, fui trabalhar no Brasão. Uma foto que tem ali. Eu fui ser telefonista no Brasão, uma concessionária de carro que tem lá, ainda está lá. Eu fiquei sendo telefonista lá um tempo, depois fui ser secretária do dono da concessionária, que é o Célio. Fui rodando nesse grupo, é um grupo grande que tem lá, grupo líder. Aí rodei nesse grupo, trabalhei nas três firmas deles. E já passei para o magistério. Passei na prefeitura de Itaperuna. P - Você escolheu fazer o Magistério ou era o que tinha para fazer na época? Como foi essa escolha? R - Não, é porque eu não fiz Magistério. Eu fiz Contabilidade, por isso que eu trabalhei nessas firmas. Como não tinha nada para fazer, eu já estava trabalhando e tinha uma faculdade lá - tem ainda - que a gente chamava FAFITA, na época, agora já é Fundação São José - e a FAFITA tinha Letras, Matemática e História, então eu tinha que escolher uma dessas. Como Matemática, eu não sei fazer conta nem de dois mais dois, português tem aquele monte de regra, eu falei: "Ah, vou escolher História mesmo, que eu acho que é o mais fácil que tenho para escolher." Eu escolhi História e fui fazer. Eu trabalhava de manhã, só fui fazer porque eu trabalhava de manhã. As minhas irmãs já tinham feito também, as duas mais velhas já tinham feito: uma, tinha feito Matemática, a outra, feito Letras. Eu fiz Estudos Sociais primeiro, depois fiz complementação para História. P - Você gostava da faculdade? Como foi essa vida de Universidade? R - A minha vida de faculdade foi muito boa, para brincar, não é? P - Qual era a diversão? R - Brincava muito. Todo final de semana, tinha churrasco. Apesar de eu não beber, eu ia todo final de semana. Minha faculdade foi só de brincadeira. A gente brincou muito. Muita coisa mesmo. P - Então vocês faziam churrasco. Vocês saiam, fazia alguma coisa de cinema, alguma coisa assim? R - Não, tinha um cinema. Lá em Itaperuna, teve um cinema, mas nessa época já estava só passando filme pornô. Teve uma época que passou só pornô direto, não tinha outro. Depois, era só Kung Fu. E vídeo, essas coisas era difícil. Então, nós tínhamos uma professora que é a Dulce Diniz - que agora largou o Magistério e fez advocacia - ela levava alguns filmes para a gente. Levou, na época, “Platoon”, ela fazia esses trabalhos desses filmes. Era ela que levava a gente para ver esses filmes. No resto, a cidade não tinha ainda cinema. Tem uns dois anos que tem cinema na cidade agora. Uns três anos. P - E as paqueras? Quando vocês já eram jovens, como eram as paqueras, onde se namorava? Como foi isso para você? R - Eu tinha uma turma. A turma era eu, Lena, Luciana, hoje, todas são professoras, coitadas. E Ademildes, que não era muito não. Nessa época de faculdade, você está perguntando? P - Sim. R - A gente namorava muito. Nossa Todo dia a gente namorava, eu acho. Tinham bailes. No final de semana, tinha que ir ao baile. Tem um clube lá. P - Era no clube? R - No clube Itapuã, que a gente ia. P - E o que vocês dançavam e como é que se vestiam para o baile? R - Teve uma época - eu me lembro que era na época das discotecas, naquela época daquele "Nos Tempos da Brilhantina" - era igualzinho ao filme. Igualzinho àquela mulher do filme. P - Do John Travolta? R - O John Travolta e a mulher do filme. P - Igualzinho o modelo e o tipo de música também? R - A mesma. P - De discoteca. R - Discoteca. P - E depois da faculdade, você saiu da faculdade, você já trabalhava, não é? R - Já. Aí fiquei um tempo trabalhando no Brasão, depois eu arranjei um contrato na Prefeitura de Itaperuna. E fui trabalhar em uma escola chamada Colégio Nossa Senhora das Graças. Lá eu já tive grandes amigas, Rogéria. P - Você quer parar um pouquinho? Quer dar uma paradinha, tomar uma água? R - Bom, no Colégio Nossa Senhora das Graças, eu encontrei grandes amigas. A Rogéria, que foi uma grande amiga minha, que uns anos depois ela ficou grávida e ela se casou com um médico e morreu um mês depois que a neném nasceu. Ficou grávida mais ou menos junto comigo. Mariá deve estar com dez anos hoje. Eu me lembro dela falando que foi no dia em que ela pegou a filha dela, que agora ela não podia morrer. Realmente, não é? O tempo todo que a gente trabalhou juntas - trabalhei com ela uns cinco anos - o tempo todo que eu trabalhei com ela, ela fez coleção de revistas de casamento. Engraçado que nada na vida dela deu certo. Ela queria ter aquele casamento, de véu, grinalda: não deu certo. Ela se casou, o cara já era casado, foi só morar. O sonho dela era ter filhos, porque ela teve uma irmã, Roberta, que morreu jovem, com quem ela não teve muito contato. Então, quando ela foi morar com o Maurício, ela falou que ia aguardar tudo certinho que ia dar tudo certo. Ela ficou grávida, logo depois, ele não queria ter filhos, ele já tinha do primeiro casamento. Meninos. E disse que só aceitaria bem se fosse uma menina. E realmente veio uma menina, a Mariá. E ela não teve nem, chance de conviver com a criança, um mês depois, ela ficou doente e morreu. E aí eu saí da escola e aí voltei pro Brasão, trabalhar. Saí do magistério e voltei pro Brasão. Eu trabalhava à noite, para uma escola. Nessa escola, era à noite, o meu irmão mais velho que me levava. Todos os dias ele passava no Brasão e me pegava, me levava na escola. Ficava me esperando lá, porque era na roça. Era ele e a esposa dele. E me traziam de volta. P - Você dava aula para que idade, na roça? R - Lá, eu dava aula para adulto. Não era EJA não, tinha outro nome. Não sei se era Artigo 99. P - Desses projetos que eles fizeram? R - Desses projetos que vêm por um bom tempo, nem fica. P - Então você trabalhava o dia inteiro? De noite também. R - Trabalhava o dia inteiro. Entrava às sete horas e saia às seis horas. P - E quando você encontrou o seu marido? Porque você falou para nós que você é casada. Como foi esse namoro? Onde foi? R - O meu marido, eu o conheci no mesmo ano que eu entrei no Maria da Penha, aqui. Aí foi engraçado: eu conheci o meu marido em uma meia-noite do dia primeiro de abril. Conversamos e tal. Eu estava saindo até de um bar, lá. Ele mora para o lado de Bom Jesus e eu em Itaperuna. Ele estava na minha cidade. Aí conversamos. Ele marcou no outro dia, para ir à minha casa. Ele chegou à minha casa, eu não estava, estava em outro aniversário. O meu sobrinho - que era pequenininho, o Pedro - ensinou a ele onde eu estava. Ele foi lá e não nos largamos mais. Então, faz dez anos. P - Até hoje vocês estão juntos. E vocês começaram a namorar e você já estava trabalhando o dia inteiro, como era o cotidiano? R - Já. Eu tinha saído do Brasão, trabalhava no hospital, no laboratório chamado de Medicina Nuclear, que faz exame de Cintilografia. Eu estava trabalhando lá, dali a uns meses, eu fui chamada pela prefeitura de Itaperuna, porque tinha feito um concurso há muito tempo, eles não tinham chamado. Então, me chamaram e a única vaga que tinha era à noite, era a que eu queria. Eu fui trabalhar no Bambuí, que é de onde minha mãe veio. Minha mãe morou no Bambuí por muitos anos. Eu fui trabalhar lá, nessa escola e encontrei pessoas que já tinham me conhecido desde pequenininha: Dona Cocota, Marlene. Lá eu fiquei quatro anos. P - E era para adulto também que você dava aula? R - Era. Adultos. Lá, é engraçado: eram adultos e crianças. Porque tinham os de quinze e tinha os de quarenta anos. P - Juntos? R - Juntos, todos juntos. E os alunos de lá - a maioria deles - não conheciam s praia. Eu fui levá-los à praia. Durante três anos seguidos, eu levei os meus alunos à praia. Eles vinham de cavalo, chegavam cedo de cavalo, e lá ficavam. P - Passavam o dia na praia, depois voltavam? R - Tinham meninas muito bonitas lá. P - E como você chegou à Escola Maria da Penha? R - Eu cheguei em 1995. Nessa escola que eu estou agora, não é? P - Isso. R - Eu fiz concurso também. A diretora era Rosana. Eu fui segundo lugar no concurso, então foi uma escolha fácil, não tinha como não entrar naquela escola mesmo, que era a mais perto de chegar, vindo da minha cidade. Eu trabalho a 53 quilômetros de onde eu moro. E 53 quilômetros da onde a minha mãe mora. Então, eu saio da minha casa de manhã, vou até um ponto, nesse ponto eu pego uma carona, que eu não sei de quem é, de alguém que passa, qualquer um que passa ali, vou para Cardoso. Depois eu volto, na volta eu não paro naquele ponto que eu fui primeiro, vou para casa da minha mãe. Da casa da minha mãe, eu volto para a minha casa. P - E você acorda que horas, para fazer tudo isso? R - Eu acordo quatro e meia, mais ou menos. Vinte para as cinco. P - E você volta para casa, que horas? R - Eu chego à minha casa por volta de cinco horas, porque, às vezes, por exemplo, no dia que tem planejamento, a gente fica até mais tarde, aí eu chego mais tarde, umas sete, oito horas. Porque eu vou para a casa da minha mãe, almoço e volto para casa. P - E você tem um filho, que você contou para nós antes da entrevista, você tem um filho de oito anos. E com quem ele fica? Como você faz no seu cotidiano de trabalho e mãe? R - Quando eu tive neném, eu fiquei dois anos na casa da minha mãe, até meu filho ficar maiorzinho. Depois, eu fui para casa, aí meu filho ficou com meu marido, em casa, porque ele trabalha em casa, aí ele que dá almoço, tudo, toma conta dele direitinho. Eu só estou em casa à noite. P - Você só volta para casa à noite. R - Sim. P - E como foi começar a dar aula? Foi por que você escolheu ou por que tinha a oportunidade desse trabalho que você contou para nós, que era à noite? R - O meu pai sempre falava que, naquela época, alguns anos atrás, o melhor que tinha, era ser professora. A mulher tinha que ser professora, porque era melhor profissão do mundo. Como Itaperuna não tinha muito campo de trabalho, quando eu estava fazendo História, fiz o concurso, passei, acho que foi meio por acaso mesmo. P - E você foi gostando de dar aula? R - Hoje eu gosto também. P - Como você foi começar dar aula para adolescentes ou crianças, como você trabalha hoje? Porque você trabalhava com adulto, mas hoje você dá aula pra crianças. R - Agora eu dou para adolescentes. P - Para adolescente. E quando você começou a dar aula para adolescente? R - Quando eu cheguei, na Escola Maria da Penha foi mais difícil. Sou brava, brigo à toa, qualquer coisa eu estou brigando. Choro à toa e brigo à toa. Então, os alunos até hoje, eles ainda têm um pouco de receio. Eles me obedecem mais do que obedecem à maioria. Agora, eu sou mais light com eles lá. Quando a gente fica mais velha, a gente fica mais light. Então, agora eu estou mais calma com eles. P - E você leciona História mesmo? R - História. P - E o que é que você mais gosta da sala de aula, Shirley? De dar aula, o que você mais gosta? R - O que eu mais gosto é de contar. De contar a história. Eu gosto muito de contar sem ter que seguir livro. P - E o que você acha que é o maior desafio para você, ao dar aula? R - Fazer o aluno entender o que eu estou falando. Acho que é muito difícil. Às vezes, eu estou falando uma coisa, eu sinto que ele não está entendendo, não está sabendo para o quê serve aquilo. Na verdade, tem coisas que não servem, não vão servir para ele depois. P - E você, diante disso, de algumas coisas você percebe que não vão servir para eles, como você planeja as suas aulas? Como você pensa nesse desafio? Em fazê-los entender. Você muda o seu planejamento quando você percebe isso? R - Eu penso assim: primeiro, que eu gosto de dar o que eu gosto. Eu sempre pego na matéria aquilo que eu mais gosto, acho que todo professor faz isso, não é? Aquilo que gosto. Então, eu falo mais daquilo que gosto. Eu gosto mais de atualidade, então, eu falo muito de atualidade com eles. Eu tento levar para eles o que está acontecendo. P - E você tem liberdade, então, para fazer esse planejamento - partindo do que você mais gosta - lá na escola? R - Tenho. P - Você pode escolher? E você faz o planejamento com algum colega de história também ou da mesma faixa etária ou não, você faz sozinha? R - Não, faço sozinha. Apesar de ter uma hora de planejamento na escola. P - Mas vocês têm reuniões em conjunto? A reunião pedagógica? R - Tenho. P - E você contou que levou seus alunos da outra escola para ver o mar, não é? E, hoje em dia, você utiliza outros espaços da escola, sai da escola para levar os alunos a outro lugar, você consegue fazer isso ainda hoje? R - Ah, faço, ainda faço isso hoje. Acho que eu sou a única pessoa na escola que faz isso lá. Tem dez anos que eu faço. Todo ano levo e trago meus alunos ao Rio, porque há dez anos, eu descobri que a ALERJ (Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro) manda ônibus para buscar os alunos e a escola não paga nada. E descobri também que nas segundas-feiras não se deve marcar nada aqui no Rio, porque não abre nada. Então, tem dez anos que eu marco na ALERJ, todo ano eu marco, agendo e marco de manhã, já tem a hora certinha, marco meio-dia. E é sempre o mesmo passeio: eu os levo à ALERJ, depois eu trago eles no Museu da Marinha, que passa em frente - porque o ônibus da ALERJ não pode sair da rota, tem que vir certinho - então, passo na Marinha, a gente faz aquele tour pelo Museu da Marinha, depois eu os levo no shopping e trago eles de volta para casa. P - Então, vocês passam o dia no Rio? E eles gostam? Do que eles mais gostam? R - É, porque é assim: lá não tem outra professora que faz. Então, eu dou aula sempre para duas turmas. Sempre dou para o nono ano ou dou para o sétimo ou dou para o oitavo. Então, são sempre essas turmas que vão, são as turmas que eu dou aula. Eles sempre esperam um ano para chegar o dia. P - Nesse grande dia. R - É. P - E como é para você a escola? O que significa a escola para você? R - Bom, lá eu passo metade da minha vida, porque eu chego cedo, chego sete e saio meio-dia. Então, eu acho que faz parte. É quase a minha família. E tem algumas pessoas que realmente fazem parte da minha família. P - E você disse que gosta de contar história, do jeito que você gosta, mais de atualidade. E tem alguns autores ou alguém da Historia, algum professor ou educador, que é sua referência, de profissional? Alguém que você sempre admirou como autor ou um educador? R - Sabe que não. P - Você pega várias referências, sempre atualizando o que você gosta mais. E o que significa para você educação? R - Eu sempre falo com meu aluno que o conhecimento é aquilo que ninguém tira da gente. E é a forma de você tecer alguma coisa, é só pela educação. Não tem outro caminho para você seguir se você não chegar pela educação, se você não tiver conhecimento, você não chega a lugar nenhum. P - E os alunos que você tem hoje em dia, como eles são? É escola pública, mas são alunos interessados, você sente se são interessados, se eles são animados ou não, envolvidos, como você vê esses alunos? R - Muito poucos são envolvidos, muito poucos mesmo. P - Você acha que tem a ver com a idade ou você acha que não, foi mudando? Você, que é professora há tanto tempo, você acha que mudou por causa da geração? R - Eu acho que a geração de hoje tem muita facilidade, porque eu penso que, por menos que eu tenha aprendido, de todas as minhas brincadeiras - que foram muitas na escola - de tudo isso, eu ainda consegui assimilar mais do que eles conseguem hoje, de conhecimento, de conhecimento histórico, dessas coisas. Eu vejo que eles têm facilidade em tudo. Fico olhando lá, meu sobrinho de dois aninhos, se ele pegar o celular, ele sabe mais do que eu. Mas em ter conhecimento, eu não vejo esse envolvimento neles não. São muito poucos, eu acho. P - E na escola você tem alguns recursos como um vídeo em sala de aula ou uma sala de vídeo, você tem uma biblioteca que te ajuda nessa prática? R - Não, biblioteca não tem não, tem uma sala de leitura que tem alguns livros, mas muito poucos. E tem a sala de vídeo. P - E tem a sala de informática também, na sua escola? R - Tem, a sala de informática tem. P - E você usa a sala de informática ou não, ela te ajuda na sua prática ou não? R - Bom, a sala de informática, desde que eu estou na escola, ela está lá. Este ano que nós descobrimos que nós podíamos usar a sala de informática, porque até esse ano a gente não sabia. Pensávamos que a sala de informática era só para ter o curso que estava tendo lá, que é um curso que está fora da escola, é dentro da escola, mas não pertence à escola. Então foi só nesse ano que descobrimos que nós podíamos utilizar, sem a autorização de outros. P - E você já conseguiu pensar nas tuas aulas, como é que você vai usar essa sala de informática ou você tem um professor lá que você tenha contato? Você pensou algumas coisas que você possa fazer na sala, que ela vá te ajudar? R - Esse ano eu vi na internet que tem um projeto “O Telescópio na Escola”. Eu até tinha inscrito a escola nesse projeto, mas como é à noite e a escola funciona à noite, tem curso de informática à noite, não deu. Mas eu consegui fazer a inscrição, consegui entrar em contato com os coordenadores, até falei com o Jean, essa semana, que a gente podia reviver isso para poder remarcar. Porque os alunos até foram lá, no dia, para ver as estrelas e tal, mas chegou lá e o programa Carta no Céu - que é o programa que tinha no computador - tinha sido apagado. Então, não pôde. Aí parou um tempo com essa primeira e agora a gente vai voltar para fazer isso. P - E você já conhecia, já mexia em computador? Ou alguém te ensinou, te ajudou a mexer, teve algum treinamento? Ou o professor Jean, ele tem algum contato com você de te ajudar, tem alguém assim lá? R - Não, lá na escola não. P - Você aprendeu, então, de outra forma. R - Arranjei em casa, eu tenho computador em casa. P - E você acha que o computador vai te ajudar bastante na sua aula, outros recursos que cheguem, tem o DVD na escola, você acha que isso te ajuda, te anima? R - Eu acho que anima o professor e o aluno, porque a possibilidade dele ver, torna as coisas mais concretas do que ele só imaginar. P - E o Programa TONOMUNDO, do Oi Futuro, você teve contato, está na sua escola? O que você sabe dele? R - Bom, do TONOMUNDO, eu não sei nada, porque eu sei que tem, o computador chegou à escola em 2000, mas nós não sabíamos para o quê. Aliás, alguns professores achavam até que não era da escola, que era da outra instituição, onde eles fazem o outro projeto lá, que é o Projeto Meu Amigo Computador. Na verdade, eu não sabia nem que esse projeto existia. P - E como você soube? Qual foi a primeira vez que você ouviu falar do TONOMUNDO? Só vai trocar a fita. P - Voltando um pouquinho, a gente estava conversando do TONOMUNDO, aí nós perguntamos para você como você ouviu falar do TONOMUNDO? Do projeto? R - Eu não ouvi falar do TONOMUNDO. A Alessandra falou comigo que ela teria que vir ao Rio para o projeto da Oi. E falou que tinha que vir quatro pessoas. Aí falou: "Ah, então vamos, Shirley, já que você quer ir" Quando cheguei aqui, naquela reunião onde teve aquela oficina, foi quando nós descobrimos o projeto. P - Aí vocês foram descobrindo o que era? Com as pessoas de outras escolas? R - Ainda não sabemos direitinho não, porque nós estamos sem os contatos e parece que os contatos estão com o Rafael, ele não passou nada para a gente ainda. Eu passei um e-mail para o Pedro Malafaia, ele me deu alguns telefones. Acho que foi sexta-feira, quarta-feira, que ele passou alguns números de telefone para a gente ligar. Na semana que vem, a gente vai começar a ligar pra ver o que é. P - E o Rafael também é professor de informática na escola? R - Não, o Rafael é da prefeitura. Ele não é professor da escola. Ele só é professor de informática do curso Meu Amigo Computador. P - E os outros professores também não ouviram falar do TONOMUNDO? R - Não, eles sabem menos do que eu. P - A sua turma atualmente, o corpo docente é mais ou menos da sua época, tem vários que estão lá há muitos anos ou não? R - Tem alguns que estão desde antes, são todos mais ou menos da mesma época, entraram todo mundo na mesma época, poucos são novos. P - E como é a relação entre os professores? As reuniões? Você acha que elas contribuem para a sua aula, quando vocês se juntam na equipe inteira, na equipe pedagógica? R - As professoras da Escola Maria da Penha são pessoas muito difíceis. Mas também são pessoas muito boas. Eu gosto muito delas. E sempre, nas reuniões, sempre alguma coisa de bom a gente tira. De ruim e de bom. Então, sempre você está acrescentando alguma coisa. P - E o seu filho estuda em que escola? R - Estuda na Escola Trenzinho da Alegria, em outra cidade, que é Bom Jesus. P - É pertinho também? Como é o transporte? R - Não, 53 quilômetros. Da minha casa ou da escola dele? P - Da sua casa. De onde ele sai? Ele sai da sua casa para ir para a escola? R - Aí é pertinho. P - Aí é pertinho. E você que o leva, como você faz? R - Não levo, porque eu saio vinte para às cinco, não é? P - Muito cedo. R - Quem leva é a minha cunhada e o meu marido pega, apanha. Eu tenho dois priminhos que vão juntos. P - E fica a 53 quilômetros da onde? R - Não, eu que fico a 53 quilômetros dele. Ele fica há uns dez minutinhos da escola. P - E quando ele volta da escola, ele brinca ou ele faz alguma outra coisa? R - Ele chega da escola às onze e meia, almoça e vai fazer os exercícios no professor particular, porque não tem ninguém para ensinar, eu não estou em casa. Depois ele volta, brinca um pouco e vai para aula de inglês ou então vai para o judô, ou então fica em casa. P - E, então, hoje mora você, seu marido e seu filho? Mas, tem a relação muito forte com sua família ainda, não é? Com a cunhada? R - Todo dia eu vou à casa da minha mãe, todo dia. P - Todo dia. Vocês estão sempre juntas. E essa cunhada, esse cunhado, o irmão, estão sempre ajudando um ao outro, todos moram mais ou menos perto? R - Não, eu moro em cima da casa da minha sogra. Eu estou sempre com a minha cunhada e minha sogra. E meu filho também. Minha mãe mora a uns 40 quilômetros de mim, que é na outra cidade, que é Itaperuna. Mas, à casa da minha mãe, eu vou todos os dias. Eu não fico um dia sem ver a minha mãe. A mãe tem que ver todo dia. P - Todo dia. Aí vocês conversam? R - Todo dia tem que dar a benção. P - E você contou para a gente que a sua família é grande, tem muitos irmãos, oito agora. E no Natal, como é o Natal? R - Bom, o Natal da família é assim: é igual carnaval, em um Natal já se está pensando no outro. No Natal da minha casa são, mais ou menos, umas 150 pessoas que vão. Todos os anos. Aí tem assim: todos os anos, todos têm que ter presentes para todos. Para essas 150 pessoas, tem que ter presente. P - Todos, 150 presentes? R - São. Para todos têm que levar presente. Presente para todo mundo. Cada ano é uma coisa, não pode repetir também não. Meu irmão mais novo é categórico nisso: tem que ter para todo mundo e ser diferente. Aí a partir desse pensamento, nós começamos a mandar fazer, não é? Cada ano manda fazer: faz caneca, faz toalha, faz xícaras, cada ano faz alguma coisa, que já vem impresso com o nome da família. P - E a ceia, quem faz? Cada um faz uma coisa ou sua mãe ainda cozinha? R - Não, tem que ser feito tudo lá em casa, a minha mãe não aceita que faça fora. P - Para 150 pessoas? É uma tradição da família? R - Para 150 e tem que fazer lá em casa, todo ano é lá. Tempera, pernil, frango, aquelas coisas todas. P - Além do seu contato forte com a família, quais as outras coisas que você faz, de lazer, com o seu marido, seu filho, no final de semana? R - Eu gosto muito de ficar em casa. Na casa da minha mãe. Toda vez que eu falo casa, eu penso na casa da minha mãe. Mas eu e meu marido viajamos bem, nós temos uma casa em Iriri, que a gente vai sempre, na praia. Iriri é uma cidadezinha perto de Guarapari. A gente tem uma casa lá, nós estamos sempre lá: eu, meu marido, meu filho e os meus irmãos. Sempre está assim. Sempre alguém da minha família junto, um irmão. P - Da sua vida, o que você acha que você tirou de aprendizados, que te marcou muito? Que, às vezes, você pensa "Puxa vida, olha que coisa que eu aprendi" O que te marcou mais? R - Marcou? Eu aprendo todo dia. Eu sou tão diferente do que eu era. P - É? Por que você acha que você é tão diferente do que você era? R - Hoje, eu sou muito diferente. Eu era muito agitada, muito brigona. Hoje, eu sou muito diferente, eu sou muito calma. P - E você ainda tem um grande sonho? Ou vontade de fazer alguma coisa que você não fez ainda? R - Vou à Machu Picchu com a minha irmã Rosa. P - Você vai? Já está marcado? R - Está marcado. P - O sonho vai se realizar? R - Ah, com certeza. P - Bom, a gente já está terminando a nossa entrevista e eu gostaria de saber o que você achou de fazer essa entrevista e se você quer contar mais alguma coisa? R - Alguma coisa? Não. Fiquei mais nervosa do que eu achava que iria ficar. P - Do que você achou, do que imaginou? Mas foi bom lembrar, contar da sua vida? Compartilhar aqui conosco as suas histórias? R - Foi bom, não é? Foi muito bom. P - Então, a última pergunta. Tem alguma coisa muito marcante que aconteceu nessa escola que você está há tanto tempo, na sua vida de professora que, com aluno, foi engraçado, alguma coisa que te marcou bastante? R - Lá na escola acontecem coisas comigo todos os dias. Todo dia acontece alguma coisa comigo naquela escola. P - Por exemplo? R - Todo dia. Por exemplo, se eu sair, não tem uma pessoa que não pergunte aonde eu vou. Então, todo dia acontece alguma coisa. Ou de bom ou de ruim, todo dia acontece alguma coisa comigo lá na Escola Maria da Penha. Então, eu acho que eu faço falta lá. P - Muito, né? Ficam te vigiando: "Para aonde você vai?" R - Todo dia. P - Então, tá bom. A gente agradece muito a sua presença aqui conosco.
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