P/1 – Beleza, dona Izanil, boa tarde.
R – Boa trade.
P/1 – Primeiro, eu gostaria de agradecer de a senhora ter aceitado o convite para essa entrevista. E pra gente começar, eu queria que a senhora falasse pra gente o seu nome completo, a data e o local do seu nascimento.
R – Meu nome é Maria da Silva Pinto de Albuquerque, nascida aqui em Ilhabela, dia oito de janeiro de… agora…
P/1 – A gente tinha feito as contas, 1928?
R – Vinte e oito.
P/1 – E fala pra gente o nome dos seus pais.
R – Paulino Manuel da Silva e Eva Esperança da Silva.
P/1 – E dos seus avós?
R – Olha, só minha avó, Benedita Esperança da Silva. Agora, o pai (marido) dela, eu não sei porque, minha vó veio escrava, né? Quer dizer que já veio gorda de lá, minha mãe nasceu aqui, mas não sei, o pai…
P/1 – E conta pra gente então, dos seus pais, dona Izanil, um pouco da história deles, né, como que eles se conheceram, a senhora sabe? Eles contavam?
R – Olha, essa parte não, porque eles casaram, o meu pai, o pai dele era português e veio pra cá e ficou morando lá no Ilhote, onde meu pai, acho que nasceu lá, porque eu era pequenininha, eu escutava essas histórias mais antigas, né, que sabe que a pessoa gosta de estar escutando. Depois, o meu pai já conheceu a mamãe já mocinha, né, aqui no Perequê. Ele vinha de lá aqui pra Perequê. E aí, namoraram, casaram, ela casou nova. Ela teve 26 filhos. Eu sou a última, por isso que eu não sei contar muitas coisas, né, porque eu fui a última filha. Naquela época, pra conversar, criança não entrava na sala, a conversa era dele e quando a gente ia escutar o que eles estavam conversando, minha mãe fazia assim [sinal] pra gente sair dali. Meu pai era carpinteiro, ele trabalhava muito, às vezes, levava mais de uma semana fora de casa. Aqui mesmo na ilha, mas em outros bairros, né? E nós ficamos aos cuidados da minha mãe.
P/1 – E conta pra gente o quê que a sua mãe fazia.
R – Minha mãe, ela trabalhava na roça, né? Tudo trabalhava na roça. A profissão dela era parteira. Todo mundo vinha chamar ela e ela fez muito parto. Vinham chamar ela à noite, ela ia, já levava uma trouxinha com roupa, sabe o que é trouxinha, que eles falam? Amarravam assim e vinham chamar… Ela ia, ela saía de lá e já ia pra essa casa. Aí, tinha uma irmã: “Mamãe não levou roupa suficiente para estar todo esse tempo. Eu vou procurar onde ela tá”. Se chamavam na Barra, ela ia nessa casa primeiro: “A sinhá Eva…”, chamavam de Sinhá Eva: “A sinhá Eva?” “Fulano de tal veio buscar ela”, porque chegava em casa dizia: “Tá na casa de fulano”, aí de lá da Barra, ela ia pra vila, fazer parto na vila e toda percorrendo, como dizia ela. Minha irmã também, só andava procurar na casa que ela estava, aí chegava: “Mãe, mas a senhora…” “Ah filha, como é que eu vou embora? Vieram me chamar que tinha um parto aqui no Saco da capela”, sabe onde é, né? Dali no Saco da Capela, tinha que voltar para Itaquanduba que tinha um parto e assim foi indo.
P/1 – E essa profissão de parteira ela aprendeu com a mãe dela, também, com a sua…
R – A mãe dela sabia, a mãe era parteira. A mãe era escrava e ela fazia parto, fazia tudo, parto mesmo das próprias mulheres, filhas dos colonos, lá… Ela fazia parto e ela aprendeu com mamãe… a mamãe aprendeu com ela.
P/1 – E a senhora estava contando, né, onde que elas faziam esses partos? Quer dizer que tinham histórias da sua avó indo fazer partos em lugares mais distantes, como é que era?
R – Como assim você fala? Mais distantes, como assim?
P/1 – É, que ela pegava a canoa e aí fazer os partos…
R – Isso é para Castelhanos. Em Castelhanos, ela ficou quando veio lá da África, né, ficaram em Castelhanos e de Castelhanos, iam pra Santos. E depois, aí muitos escravos fugiam, né, para ficar libertos… Já estavam libertos, mas tinha que ter um patrão, né, e minha avó ficou com família aí… conhece a Marquinha? O avó dela ficou com a minha avó, mamãe não tinha nascido ainda. E ficou com ela e ela ficou tomando conta dos filhos desse casal. Mas ela sempre contava que a escravidão era muito sofrida. Mas ela teve sorte porque todos os senhores que ela ia, ela não ia pra trabalhar, ou era para tomar conta, ficar responsável pelos filhos se estava grávida, ela fazia esse parto, aí que tinha que fazer, né, porque em qualquer lugar nascia, não tinha lugar certo. E aí, ela fez muito e aprendeu.
P/1 – E como que chegava em Ilhabela nessa época? Que histórias que você ouvia? Como que se fazia para chegar aqui?
R – Pra chegar aqui só vindo de canoa e depois, vinha na estrada, aquela caminhozinho… Vinha de Santos pra cá, mas, quer dizer, vinha, passava uma semana, duas semanas, naquele tempo vinha a pé porque não tinha estrada, né, tudo…
P/1 – Então tinha que andar a pé de Santos até aqui, chegando aqui, tinha que atravessar de canoa?
R – De canoa.
P/1 – E como é que foi pra sua avó, que você contou, né, que ela ainda era viva quando começou a ter a balsa, né? Qual que foi o impacto, assim pra cidade ter a balsa, para ela?
R – Não, a balsa já começou e já tava mais civilizado, mesmo aqui, né? Aqui já tinha médico, assim, mas não fazia parto, né? E os médicos… O posto que tinha era em São Sebastião (SP). Então, o pessoal já ia pra lá, direto pra lá. Mas muitos não iam porque não conheciam, conheciam a mamãe e tinham mais confiança e porque São Sebastião também não tinha hospital, não tinha nada, só atendimento. Quando começou o hospital em São Sebastião, veio uma equipe para o posto de saúde e foi ver aquele prédio, né, hospital, mas como é ter hospital e não ter médicos? Estar fechado? Procuraram saber. Aí, foram com o prefeito, aí o prefeito faliu assim: “Olha, não é que eu não queira que funcione, mas é falta de médicos e de dinheiro”. Aí tem a irmandade do Coração de Jesus, fieis em Santos, aí ele procurou saber dela se podiam, né, funcionar a ajuda delas e tudo, então, eles vieram, os médicos. Aí, os médicos falaram assim: “Mas não tem parte de enfermagem aqui”, eles falaram assim: “Olha, nós queremos que esse hospital funcione com quem não sabe, para eles aprenderem, porque não tem outro meio”, então ficou uma lista de São Sebastião, no posto e na prefeitura. E o prefeito de São Sebastião era muito bom. Se dava muito com nós em casa, tudo. Daí, ele sempre chegava em casa: “Olha, sinhá Eva, o hospital funcionando, mas a sua filha ainda vai para lá”, que eu tinha muita vontade de enfermagem, mas como fazer? Aí, ele fez, ele falou assim: “Olha, procura o médico, o nome é Doutor Crispim, ele é o chefe, procura como é que é isso”, aí tinha uma prima que trabalhava lá, aí foi conversar com ele: “Dá o nome dela aqui, fala pra ela que esteja no dia certo aqui e na hora certa, porque a hora que abrir a porta, quem está, entrou", quem faltou, perdeu”. Aí, minha prima veio em casa falar pra mamãe: “Tia, deixa ela, se ela quer ir, deixa”, porque aqui na Ilhabela não resolvia nada, nada… Nunca ajudaram a gente, né? Mamãe… aí eu fui. Todo dia, às sete e meia, eu tinha de estar no hospital, um mês. Quando chegou no último dia do mês, eu não quis ir. Mamãe: “Izanil, você não vai?” “Ah, mamãe, todo dia, lá, amanhã, amanhã, tô cansada de ser amanhã, eu não vou, não” “Você vai, esse amanhã é hoje”, ela dizia: “É hoje esse amanhã” “Não vou”, aí não fui. Fui no outro dia. Ela falou assim: “Eu só peço, vou rezar para que esse amanhã não seja hoje”. Aí, fui. Enfermagem era só eu daqui, que ia para limpeza, para cozinha, tudo ia muita gente, eu que chego, que olho, eu vi ele sentado assim, quando deu comigo, ele fez assim. Ele era assim, era um médico mas ele era bom demais. Eu cheguei, cumprimentei, ele: “O que veio fazer aqui?”, aquilo pra mim foi uma bofetada: “O que você veio fazer aqui? Terminou o prazo ontem”, eu disse assim: “Pelo amor de Deus”, aí sai chorando, né? Depois ela chamou: “Vem, volta aqui. Vai lá, tem um corredor grande, entra naquele corredor, tem uma moça sentada lá no final do corredor, você fala pra ela, ela que vai dizer sim ou não pra você”, olha menina, mas eu rezava, aí eu fui. A moça quando eu fui me aproximando, ela baixou a cabeça e fez isso. Eu: “Misericórdia”, aí fui, mas nunca perdi a esperança, com tudo, mas nunca perdi a esperança. Aí eu cheguei lá, ela tava assim: ‘Já sei o que você veio fazer, mas o prazo terminou ontem. Hoje já é outro amanhã”, eu também não respondi nada, não tinha o que responder. Agradeci a ela, dei a volta. Aí, quando eu tava quase no final, ela falou: “Volta aqui”, aí eu voltei, ela falou assim: “Entra nesse outro corredor, se você achar alguma coisa no corredor, é seu”, e era balde, tudo de limpeza. Aí, eu voltei, olhei no cantinho, tava um balde, tava me esperando, né, tava lá no cantinho o balde com tudo, aí eu peguei, nossa, aí vim agradecer ela: “Sorte de você, que sobrou e colocaram naquele cantinho”, aí as meninas que já estavam trabalhando e limpando: “Izanil, agora, hoje que chegaste! Tivesse sorte” (risos). Mas a sorte anda comigo, Deus é bom, Deus nunca falha.
P/1 – Conta pra gente como do nome Maria, o seu apelido, a senhora ficou conhecida como Izanil.
R – Olha, naquela época, quando tá batizando, não procuravam registrar. Levavam criança pra batizar, batizavam com o meu nome. Meu padrinho… Não, foi o nome certo, aí minha madrinha e tia que batizou o nome que ela deu, Izamir. Então, eu me batizei por Izamir e tudo: “Izamir…”, e chamado Izamir. Izamir é um nome muito ruim pra chamar. Aí, cresci com Izanil. Para a escola, também não procuravam registro, né? Então, ia Izanil na certidão de batismo. Quando chegou na primeira eleição que teve pra governador, eu não lembro bem o nome, eu falei assim: “Eu vou dar um voto, nunca dei voto, também vou lá saber como é essa eleição”, brincava assim: “Será que é pesada essa eleição?”, aí eu fui. Aí, fui… Fiz lá… Vinha o rapaz tirar fotografia, tudo, mas toda fotografia tinha a cara feia, a cara pra traz, o olho pra traz… Aí, eu tirei. Quando chegou um dia, veio um chamado pra mim, pra eu comparecer no juiz. Mamãe falou: “No juiz? O que você fez?”, aí ficou: “Fez alguma coisa?”, digo: “Não, mamãe” “Você vai lá saber o que é”, aí foi um senhor lá, nos encontramos nós três, outra daqui também chamada Alzira e uma do Porto Novo e uma de Caraguá [Caraguatatuba] (SP), nós quatro fomos intimadas. Então, perguntava para ela: “O que você veio fazer aqui?” “Não sei”. E tinha um que trabalhava no Fórum, ele se dava muito com a gente, ele dizia assim: “Izanil, o que você veio fazer aqui?” “Não sei” “Vou procurar saber, fica aí”, e todas levaram o papelzinho, né, e eu não levei. Quando chegou a hora da chamada, aí eu fui chamada. O juiz era pequenininho. Aí, ele pediu o papel, eu falei: “Não, doutor…” “Você não trouxe o papel? Pra que você quer esse papel? Tá guardado, né?”, ele era bravo. Eu falei assim: “Eu nunca fui chamada, nunca vim na sua presença, do juiz, eu não conhecia, primeira vez, não explicaram, a pessoa que entregou pra mim esse papelzinho para chamar para o juiz não explicou porque era, porque não era, né?”, aí fiquei quieta, todas nós levamos chamada, todas nós erramos. Aí ele falou, explicou, falou assim: “Olha, isso aqui é para o juiz eleitoral”, aí nós perguntamos: “O que é Juiz eleitoral?” “Vocês não sabem?”, aí meu Deus do céu. Aí, eu falei assim: “Não sei doutor, eu não sei porque nunca passei por isso, pela primeira vez eu tô na sua presença e eu não sei explicar”, aí ele falou assim: “Como é o seu nome?”, aí eu dei o meu nome, o nome de todas elas deu. Aí, chegou pra última chamada Alzira: “Seu nome”, sabe daquelas pessoas, não sei se são brutos por vontade ou é gene de nascimento, eu não sei, é pessoa que fala e nem pergunta o que é. Era desse tipo. Ai, ela dizia de lá: “Será que vai ser a minha vez?”, nós, a moça de Porto Novo, tudo levou chamada, mas quieta, né, vai responder o quê? Aí, ela falou: “Doutor, por que você tá chamando assim? Você não tem um papelzinho aí com o meu nome também? Com o nome dela também tá ai” “Eu sei que está, eu já deixei você por último porque eu quero saber direito, porque eu não tô entendendo o seu nome” “Mas não tá escrito aí?” “Eu quero pela sua boca, pra você falar o seu nome”, aí ela falou: “Admiro um doutor não saber ler o meu nome”, aí esse rapaz estava até nervoso, né, mas o quê que essa menina… ele falou assim: “Então repita seu nome, como é que é?”, aí ela falou assim: “Presta atenção, hein”, desculpa que é uma palavra feia. O nome dela é Alzira Sampaio Carvalho e ela dizia Alzira Sampaio “Caralho”. Aí, ele falava: “Mas não é isso que tá escrito” “Como não tá escrito? Olhe bem ai”, e falava alto: “Meu nome é Alzira Sampaio ‘Caralho’”, esse moço, mas ele ficava lá atrás, com vontade de dar um puxão nela, porque esse juiz era bravo. Aí, depois de tanto ela repetir, ela repetiu, aí ele falou: “Sabe o que tá escrito aqui? Alzira Sampaio…” “Tá escrito isso, doutor? Tem certeza?”, o juiz pediu licença: “Vou perdoar esse menina, mas par mim não adianta mais falar mais nada, deixa ela”, e ela falava mal dele, falava mal do juiz. Aí, fomos lá, ele nos levou nesse outro cartório, né, aí foi feto isso: “Izanil, você quer que te tire…?”, tinha que tirar um nome: ou Izanil ou Pinto. Silva era o nome de mamãe e Pinto era pelo sobrenome do meu pai, né? Aí, eu falei assim: “Escuta aqui uma coisa, mas não pode ficar tudo junto?”, agora não, que tem uma porção de nome, né, antes não, tinha que ter a quantidade só daquelas palavras. Aí, eu falei assim: “Sabe da última? Deixa o Pinto, deixa tudo e tira o Izanil”, mas tudo me chamam de Izanil. Todo mundo.
P/1 – E conta pra gente, dona Izanil, como é que era a sua casa de infância, como é que você lembra que era essa casa com todos esses irmãos que a senhora teve.
R – Minha casa eu lembro que ela ainda é viva (risos). Aquela esquina ali, que tem aquele restaurante Max, não tem aquela casa ali é um restaurante ali também, ali eu nasci, naquela casa. Era uma beleza, ali. Tinha quatro quartos, casa grande e minha mãe, ela hospedava pessoal tudo atrás da Ilha que chegava: “Madrinha Eva…”, a maioria era madrinha Eva, os pais chamavam de sinhá Eva. Vinha um senhor que era gago, eu tinha uma irmã chamada Ana: “Ana, vem aqui, vê pra mim, conta isso aqui pra mim”, era só moeda: “Eu quero que você separe pra mim…”, ela tinha o trabalho de separar moedinha por moedinha, então separava, sabe? Para o senhor fazer compra. Então ali, o pessoal à noite, ia dormir ali, ela mandava fazer esteiras, forrava a sala, tinha um quarto grande, tudo de esteiras. Ela nunca falou não, nunca.
P/1 – E como é que era a hora das refeições, né, como é que a senhora lembra das tarefas divididas, porque eram muitos irmãos.
R – Ela punha uma esteira no chão, então fazia aquela roda, todo mundo sentava e naquele tempo, era cuia, você sabe o que é cuia? Cada um já tinha a sua, não tinha prato, sabe? Era aquela cuia e tinha uma colherzinha, uma colherzinha de pau, também, tudo já tava ali. Então, ela já punha a comida pra todos, quando chegava no último: “Mãe, eu quero mais”, lá ela voltava por de volta… Tudo ali naquela cuiazinha pra gente comer. E tem assim, mas sem reclamar, mas eu tinha um irmão que ele era muito esperto, sabe? Então, ele ficava olhando o prato de todos, principalmente se tinha galinha, matava três, quatro galinhas, né, os pedaços da galinha maiores, aí mame falava: “Manuel, você não vai comer?” “Ah mamãe, eu tô esperando, porque a senhora deu um pedaço de galinha maior…”, dizia o nome… “E pra mim, a senhora me deu tão pequeno” “Dei pequeno pra você? Que pena. Dá aqui que eu dou pra você”, ela ia, chegava na frente dele, punha na boca e comia: “E eu?” “Você não quer porque é pequeno, então eu como. E você vai comer então feijão, arroz…”. Nunca faltou [comida], porque eles plantavam, né? “Se quiser tem arroz e feijão e verdura”, que tinha bastante. Aí, ele chorava, chorava, chorava, depois: “Não mamãe, deixa eu como esse mesmo” (risos), mas era assim, sabe? Tudo certinho ali na hora das refeições, do café, também. Café tinha uma padaria pequenininha, mas ela plantava muita batata, era café com batata, batata cozida, banana da terra cozida. Então, tinha muita fartura, nunca passamos necessidade, de dizer: “Estou passando fome”, de jeito nenhum.
P/1 – E você tinha que fazer alguma atividade pra ajudar em casa?
R – Cada um tinha [sua tarefa], tinha uma irmã que levantar e fazer café era ela, tinha duas que era para lavar roupa, lavava roupa na cachoeira e os outros, de tarefa tinha café pra colher, tinha essa parte aqui de café: “Vocês vão colher e quando eu chegar, eu quero ver”. E quem ia pra roça, principalmente, quando plantava feijão e arroz, feijão, milho… Todos trabalhavam.
P/1 – E qual que era uma tarefa que a senhora gostava de fazer pra ajudar?
R – Olha, eu fui a caçula, então os outros faziam por mim, sabe? Porque eu ia fazer a tarefa, mas eu tinha raiva, num instante, eu acabava a minha parte. Aí depois, à tarde, ela dizia assim: “Izanil, você fez aquela parte?” “Fiz, sim senhora”, tá tudo… porque eu batia na raiz, sabe, então você vem da escola, ainda tem a tarefa, almoça e ainda tinha a tarefa, colher café. Tinha um cesto aí, tinha que colher café. Tudo tinha… tudo trabalhava.
P/1 – E como que era a escola? O que a senhora se lembra da escola?
R – A escola, a primeira escola minha foi num bairro, que agora é o bairro da Água Branca, na própria casa da professora, tinha muita criançada, sabe, tudo casinhas pequenininhas. Então, ela foi falar com o papai: “Ah seu Paulino, puxa vida, tanta criança sobrando, o pouco que eu sei, eu gostaria de ensinar”, ela falou assim: “Mas como é? Tem que falar com o inspetor”, aí o meu pai: “Deixa que eu vou conversar com o inspetor”, aí veio aqui na vila procurar saber o dia que o inspetor e o papai vinha conversar, aí meu pai disse assim: “O lugar que ela mora é só café, café, cana e plantação, fruta tinha bastante”, então, ele foi lá, gostou do lugar, achou que ela queria ensinar, ela era pequenininha, então ela começava a dar aula e ela também, assim, (risos), falava pro meu pai: “Olha, Paulino, também tenho a minha tarefa de casa, na época de café”, meu pai falou assim: “Então faz assim, no recreio das crianças, é colher café”, duas horas é o recreio, então todo mundo com a cestinha de café, pra ajudar a colher o café e depois, era café, tem outra coisa que a gente colhia também pra ela. Nós adorávamos a festa que ela fazia, ela fazia festa, ainda me lembro outro dia, ainda tava lembrando da música que ela ensinou pra nós cantar quando o diretor chegasse, inspetor, de três em três meses ia lá. Então, nós cantava pra ele. A música era assim: [cantando] “Escolinha modesta da roça, rodeada de pé de café, o Brasil se levanta e renova numa grande alvorada de fé”, aí a turma batia o pé no chão, né? “Tinha lençol ao dente… bendita escola rural”, aí o inspetor: “Mas como é que você ensina essas coisas pras crianças?” “Doutor, tenho que ensinar uma música, eu não sei essas músicas, então eu invento essa música, invento outros brinquedos, assim”.
P/1 – E qual que era um brinquedo que a senhora lembra de ter feito ou inventado junto com…?
R – Não, nós brincava muito de pular corda e de jogar… Esqueci o nome agora, mas juntava tudo, cada um com quatro frutinhas, assim, então pra nós jogar. Eu tinha até campeonato disso daí, sabe? E bola, jogava bola. Daí, o diretor arrumou bola e mandou pra gente. Então, mandava assim: “pode mandar costurar”, sabe? Então, ela ensinava. A gente fazia algodão, algodãozinho, agora é outro nome de fazenda, isso pra fazer a combinação e calcinha. Ela cortava, ensinava e a gente bordava a calcinha e bordava a combinação. Então, quando acabava, ela separava e punha o nome e depois, pros meninos, os meninos já tinham outros brinquedos, né? E assim, tinha também outro brinquedo que ela gostava muito de fazer. Eu sei que a gente aprendia muita coisa com ela e no fim do ano, a gente fazia aquela festa, né? Cantava, né, fazia… os doces naquela época eram doces… Como é que diz? É cocada que tinha, doce de laranja, doce de cana também, isso a gente fazia bastante, isso a gente aprendia a fazer e pra atravessar a cachoeira quando chovia… Às vezes, caía aquela chuva, a cachoeira atravessava a nado (risos) e pra vim pra escola, os pais levavam pra atravessar a cachoeira, mas não faltava ninguém. Era tão bom. O dia que me lembro daquele tempo de infância, né? Era muito gostoso.
PAUSA
R – E aqui não tinha estrada, tudo era caminho.
P/1 – Era tudo a pé, então?
R – Tudo a pé, não tinha negócio de estrada, nada. E tinha bastante fruta. Fruta era demais. Laranja, era abacate, era goiaba, todo lugar que você ia tinha goiaba, sabe? Depois começou a dar na vila, tinha manga, nós roubava manga, né? E tinha uma velhinha, coitadinha, dava até dó, tinha daquelas mangas grandes, nós roubava manga e depois, chamava ela, gritava, punha apelido nela, mas era muito bom.
P/1 – E como é que era a cidade? O que tinha na vila? Como é que estava espalhado, assim? O quê que era de diferente? Tinham uns caminhos?
R – Não, na vila eram as ruas certinhas, sabe? Ali tinha a pracinha, o grupo nosso era bem em frente, tinha a praça e o grupo, né? Era muito bom.
P/1 – E aí, em volta que era diferente? Que a cidade não era assim, grande?
R – Não, não era grande, era pequeno, mas o formato tudo, é igual. Não tem mudança, só o grupo… Agora, não é mais o grupo, ali, ali era um casarão grande e do outro lado ainda tem as mangueiras, ainda tem as mangas lá, que o dono dali brigava por causa de uma manga, brigava porque uma manga que caía no chão, ele brigava (risos). A gente roubava. Então, nós roubávamos a manga da casa da velhinha, né? Tadinha. E ela: “Vou falar para ao diretor que a turma do Perequê…”, tinha gente da Praia Grande, “…é ladrão, não sei o quê…”, A gente chegava no outro dia, tinha a queixa lá. Diretor chamava a gente: “Quem é de tal lugar, assim, assim, se apresenta aqui”, aí a turma: “Ah, vamos ficar de castigo”, tinha 15 minutos, tinha um quartinho que tinha uma caveira, né, então aqueles que sabiam, que o diretor sabia que era bravo, punha ele lá e ligava: “Socorro…”, a caveira vinha dançar… Muito bom!
P/1 – Conta pra gente, como foi quando a senhora foi ficando mais velha e começou a trabalhar, que tipo de trabalho a senhora foi fazer? A senhora contou do hospital, né?
R – Olha, o primeiro trabalho meu foi o hospital. Ninguém sabia nada, o pior era isso, quando chegava um doente, tinha uma enfermeira da Petrobrás, já tinha Petrobrás, e uma enfermeira que veio de São Paulo, as duas para lidar com a gente. Ela ensinava desde arrumar cama, tudo que hoje em dia não arrumam, principalmente aqui, não arrumam a cama como a gente aprendeu. Arrumar a cama, tudo direitinho, tudo em ordem e ela deixava a turma fazendo isso. Quando ela voltava, ela passava: “Quem arrumou essa cama?” “Fui eu” “Desmancha”, elas ficavam com uma raiva: “Desmancha” “Mas por quê?” “Não”, e tudo… Não podia chamar, uma delas chamava Ester, era Dona Ester. Hoje em dia, não respeitam nada, Dona Ester. Quem escolhia pra maternidade… Eu logo queria trabalhar… Esqueci o nome da repartição, onde nascia nenê, esqueci agora o nome: “Quero pegar esse serviço”, mas eu fazia andar no pronto socorro que toda hora tava chegando desastre da Petrobrás, né? Aí, o médico falava assim: “Maria Izanil, tem aquele curativo assim, assim, você faz” “Tudo bem”, ia lá e fazia. Ele vinha depois: “Já fez? Deixa eu ver. Desmancha e faz tudo de novo”, ai que vontade de chorar, “Mas como que eu vou fazer? O senhor não explica como que é para fazer”, aí ele explicava o jeito que eu já tinha feito, que ele já tinha ensinado. Aí, um dia eu cheguei: “Por que o senhor manda desmanchar o serviço que eu faço?”, ele falou assim: “Izanil, olha, você faz certo, mas se eu disser que você faz certo, outros que você fizer, já vai achar que faz certo. Tem que trabalhar melhor” “Mas dá raiva” “Eu sei que dá raiva, mas é isso aí, tem que fazer mais caprichado. Eu acho bom o seu serviço, mas tem que mandar desmanchar”.
P/1 – E a senhora chegou a fazer algum parto?
R – Nossa! Não sei nem falar. Olha, eu fiz parto até perto lá das pancadas do mar, tinha um casebrezinho lá embaixo, era dia seis de setembro, aí o pai veio buscar, pediu o médico uma ajuda, porque não podia levar a mulher de onde estava para a estrada. Aí, ele dizia assim: “Izanil, você vai” “Sim, doutor”, mas eu já tinha feito muito parto. “Qualquer coisa você traz a paciente. A ambulância vai levar você, vai ficar lá de plantão e qualquer coisa, vem me avisar”, aí eu fui. Aí eu fiz o parto, porque não dava para subir com a mulher, porque era morro e era tudo apertadinho assim, ela podia até ganhar neném naquela subida. Aí, eu fiz o parto direitinho, apliquei injeção que eu já tinha levado, aí o motorista da mulher: “Izanil, é melhor vai chamar o médico…”, porque ele ficou esperando, “Vai lá buscar o médico, já nasceu, mas é bom que ele venha”, aí ele foi. Até pra ele descer ficou com medo: “Eu descer nesse barranco?”, porque o mar quando batia na pedra, ia para… batia na casa. Eu fiz muito parto. Muitas vezes, eu ia daqui pra casa, parava uma pessoa no caminho: “Aqui não tem ninguém que faça um parto, que tá nascendo uma criança”, aí eu dali já ia. Eu saia daqui, pegava o ônibus as sete horas, chegava em casa dez, onze horas da noite porque nesses caminhos, fazia um monte de parto.
P/1 – E qual que é a sensação de ver nascer uma nova vida?
R – Nossa! Uma grande alegria, sabe, porque a gente tá vendo nascer uma criança, meu Deus, como é que pode passar num lugarzinho tão estreitinho? Mas eu fiz muito parto. Outro dia, fui na missa, na volta, tinha dado um lanche lá para as crianças, eu tava sentada, veio uma moça, aí chegou e falou pra ela: “Essa aqui” “Mas quem é essa aqui?”, depois, ela veio, me abraçou: “Você me conhece?” “Tô conhecendo agora” “Muito tempo tô conhecendo a senhora, mas não sabia quem era” “O quê que acontece? Eu não mereço esse abraço” “A senhora merece, eu vou dizer. Eu sou filha de…”, e deu o nome da mãe, “A senhora que fez o parto dela lá na vila e fui eu que nasci e a senhora… eu queria saber quem era a senhora”. Aí de vez em quando, aparece, sabe? Outro dia foi no ônibus, todo mundo saltou e eu sempre salto por último, eu fui saltar e um rapaz me parou: “Escuta, você desce ou sobe ou fica parado”, ele falou assim: “Não, estou esperando a senhora mesmo. Quero segurar na sua mão” “Por enquanto não tô pedindo socorro”, comecei a brincar com ele “Não, mas eu quero pegar na sua mão”, daí, desci, sentei lá na vila, aí ela falou assim: “Sabe por que eu fiz isso?” “Não” “Porque eu não conhecia a senhora, minha mãe falou quem era a senhora, me explicou e para mim ajudar onde a senhora tivesse, no ônibus, a senhora descer”, eu nem lembrava, moço já, né? Depois eu falei assim: “Mas será?” “Minha mãe falou, então minha mãe falou, tô segurando na sua mão. Sabe por quê?” “Por quê?” “A senhora não lembra de mim, mas eu vou dizer. Quando a senhora chegou, o médico não tava, ele não tinha chegado ainda e a senhora… Quando o médico chegou, eu já tinha nascido, a senhora que pegou. E outra coisa, tenho isso aqui doído”, eu: “Por quê? Caiu?” “Não, dos tapas que a senhora me deu quando eu nasci”, eu ri com ele.
P/1 – E como que é para a senhora ser a terceira geração de mulher que fez isso? Que ajudou em parto…?
R – Eu fico contente. Nem sei, nós estávamos lá no Bonete, o rapaz, ele e a mulher. Então, eles casaram, pegaram um barco e foram viajar, passar a lua de mel e nessa lua de mel, arrumaram um bebê, né? Então, em todo lugar que eles paravam, ele levava ela no médico, o médico falava: “Melhor vocês pararem de viajar, porque ninguém sabe o que tá por trás disso” “Não, doutor, eu tenho que ficar no barco”, quando completou nove meses, eles estavam aqui na vila. Aí, foi lá falar com o médico: “Doutor…”, o médico não tinha muita prática com o negócio de parto, né? “Doutor eu quero que o meu neném nasça no mar, porque eu vivo no mar, eu não tenho casa, minha casa é o mar, é o meu barquinho, é o mar” “Mas não pode” Aí o médico me chamou pra conversar com ela: “Tira essa ideia dela”, aí eu: “Sabe porque o médico não quer, porque a praia aqui é muito suja e a criança sai pura mesmo, né? Como é que vai por nessa água suja?” “Ah, mas tem que nascer no mar para ser caiçara” ”Vou pensar”, aí o médico falou: “Aí Izanil, por sua conta”, eu pensei: vou enganar essa moça e não vou levar para praia. Justamente naquela semana, tava o mar sujo mesmo. Aí, tinha preparado uma bacia, arrumei, tampei, deixei guardado, aí quando ela tava com dor, dor, tava em trabalho de parto e aí: “Como é para levar pra praia?” “Não sei, quem sabe é Izanil que tá cuidando dela” “Izanil, dá para ir pra praia?” “Não dá, ela vai sair da praia, vai ganhar neném na rua” “Mas eu quero que meu filho tome banho salgado quando nascer” “Tudo bem”, aí ela tomou um banho, tal, aí eu peguei um pouco da sal, pus na bacia, fui no chuveiro, peguei um pouco de água, pus naquela banheirinha, né? Tinha uma cama, que antes, eu já tinha preparado tudo, uma cama pra encaixar aquela banheira com uma cadeira embaixo pra apoiar, disse: “Prontinho”, mas ela não tava sabendo que era pra ela, né? Aí, eu falei assim: “Olha, eu vou dizer, quando tiver a primeira dor, a segunda, na terceira, vai nascer” “E como é que você vai pra praia?” “Não vai dar tempo” “Eu vou correndo e jogo na água” “Aí, você vai matar o seu filho, dessa ladeira até chegar na praia! Não faz isso. Fica calma que vai ser resolvido isso”. Aí, ela ficou calma, né? Ai puseram na posição e: “Quando vier a dor, você faz uma forcinha”, aí: “Mas já tá nascendo?” E nasceu e caiu na água, aí: “Meu filho caiu na água?” “Na água salgada”, aí caiu, eu tirei, aí passei uma toalha, né, e ela chorou tanto, o marido chorando e ela chorava, falei assim: “É água salgada, pode experimentar, é água do mar” “Aí que bom, meu filho, você tomou primeiro banho com água do mar”. Depois nunca mais eu vi, foram pro mar. Depois um dia, eu cheguei de trabalhar, a minha irmã falou: “Veio um casal aqui, que o moço quer muito conhecer você que tá morando em Bonete, mas eu falei pra ele vim mais cedo amanha”, aí outro dia quando eu cheguei do serviço, chegou aquele casal. Minha irmã disse: “É esse casal aí. Não conhece?” “Não”. Ele forte, aí depois, ele com a criança no braço, né, aliás, era ele com um presentinho pra mim, não sei o que, eu até pensei que era uma criança que ele vinha trazendo no braço, aí ele falou: “Você não tá lembrado de mim, Iza?”, falei assim: “Não” “Mamãe, conta pra ela a história”, aí que a mãe contou, meu Deus do céu, mas a mãe chorou, até eu chorei. Aquele homão grandão, porque de lá do hospital, ligou pra família dele lá de São Paulo, trouxeram roupa, roupa no hospital, tudo ele vestiu, trouxeram roupa pra ele.
P/1 – E dona Izanil, quando foi a primeira vez que a senhora saiu da ilha? Daqui de Ilhabela? A senhora se lembra como é que foi?
R – Que eu sai como? Pra passear?
P/1 – É, pra conhecer outros lugares ou ir até o continente.
R – Ah, eu ia sempre. Eu tinha um compadre lá em São José [dos Campos] (SP), então, ele tinha quatro, cinco filhos, quatro meninas e criou um menino, pra dizer que agora eu sou homem (risos), mas eu me senti bem, eles também, muitas vezes, ligava pro hospital, eu chegava no hospital: “Izanil, tua comadre lá de São José ligou pra você que é pra você ligar pra ela urgente”, aí eu ligava, né, pra saber: “O que é comadre ou comadre?” “Sabe o quê? Minha filha não sei o que, ela caiu e machucou o braço, eu quero, comadre, que a senhora venha aqui, porque eu não levei para o hospital ainda” “Eu tô trabalhando, eu não posso” “Mas a senhora vem aqui?”, aí vem a menina chorando do telefone: “Tia, a senhora não…” “Eu vou, você vai no hospital com a sua mãe, espera lá, o que o médico fizer, você aceita e depois, eu vou conversar com o médico pra saber como é que foi” “Então, tá bem”, então, eu dali mesmo, eu já ligava pra casal, pegava o ônibus e já descia no ponto do ônibus em São José à noite e eu deixando filho em casa, já estavam me esperando. Aí, ia no médico.
P/1 – E dona Izanil, conta como que a senhora conheceu o seu marido.
R – Eu trabalhava e a minha mãe sempre falava: “Izanil, todo mundo casou, só falta você”…
P/1 – Seus 25 irmãos mais velhos? Todo mundo casou?
R – Tudo. Depois de 26 filhos, eu fui a última. Todos casaram. Daí tinha uma que não casou, ela vivia com nós, mas a mamãe falava isso e na mesma hora, dizia assim: “Você casando, eu penso em ficar com ela, porque ela é muito boa, ela faz de tudo”, mas se a mamãe tava doente, ela precisava de um chá, ela fazia o chá, chegava na porta do quarto: “Izanil, pega o chá pra mamãe”, ela não cuidava. “Mas por que?” “Ah não”, tinha que chamar minha irmã casada para vir dar aquele chá ou comida, se precisasse para dar na boca, ela não dava. Então, eu pensava tudo isso, quer dizer, se eu casasse, sei lá onde eu vou morar e minha mãe, como é que fica?” Não. Deixa a vida passar. Aí, nunca quis casar. Tinha um rapaz que era até baiano, ele queria, dizia assim: “Izanil, mas não vai atrás da sua irmã”, minha irmã não gostava dele, sabe? E minha mãe adorava ele. Mas eu: “Não, mamãe, enquanto Deus não lembrar da senhora” “E se eu levar muito tempo?” “Não tem problema, mas que eu vou trabalhar, eu venho correndo…”, eu vinha correndo, chegava em casa meia-noite, ainda ia lavar roupa, tudo, levantar cedo, mas eu preferia ficar fazendo assim do que me casar. Aí depois, eu não sei porque eu resolvi casar, né? E ela adorava e meu marido adorava ela. Naquele tempo, ele tinha caminhão e ele dizia assim: “Vó, vem cá, tem um negócio aqui pra mostrar no caminhão pra senhora, mas só que eu tenho que levantar a senhora…”, então ele punha ela na frente da cabine, fechava a porta e ela começava a gritar: “Socorro, socorro, seu marido quer me matar” (risos), aí ele entrava dentro do caminhão e trazia ela aqui pra vila, para os lugares, sabe? E ela gritava: “Socorro!” (risos). Então, já casei com mais de 30 anos, mas só depois que ela morreu. Morreu, não, no finalzinho, né?
P/1 – E como foi para a senhora ter filhos sendo uma mulher que também fazia os partos? Como foi quando chegou a sua vez de ter filhos?
R – Eu controlava tudo, eu já ia sempre na última hora, sabe? Não adiantava… Meu segundo filho que demorou bastante pra nascer, mamãe ainda era viva, mas eu não queria ir para o hospital, né? Aí no final, não tive no hospital, mas me seguraram, me seguraram, chegou lá… O médico disse: “Olha, o que acontecer com a sua mãe, você é responsável” “Mas acontecer o quê? Doutor?” “Você não quer vir para cá, tudo bem, fica lá com a sua mãe, mas o que acontecer…”, então quando esse meu segundo, eu não quis ir, né? Mas depois me arrependi, sabe, nossa! Eu já não pensava na dor que eu sentia, eu pensava o sofrimento que ela tava passando, porque ela perdeu a noção. Aí, minha cunhada veio e ficou ali sentada e chamou ela, quando ia nascendo, aí minha cunhada: “Dona Eva, olha, tá nascendo o seu neto”, ela: “É? Já vai nascer mesmo”, ela não ligou, né? Aí, eu fiquei com medo, aí comecei até a chorar, né? Aí, minha cunhada: “Não faz isso não, não vai chorar não”, mas se acontecesse alguma coisa com ela, eu era responsável. Aí, eu sei que depois nasceu muito bem, minha cunhada pôs nos braços dela, ela chorou, chorou, chorou e cansada, ela parou. Então, ela dizia pra todo mundo: “Dona Eva, a assenhora que pegou? Ainda teve a coragem de fazer parto da sua filha?” “Ah, se eu tive? Tá aqui”, ela dizia que era ela e os médicos vinham sempre em casa, né, aí ele: “Que tal, dona Eva, aguentou?” “Aí doutor, sabe Deus o que eu passei, mas tá aqui”, mas o médico era bom, todo mês ela tinha que fazer almoço para ele, todos eles, almoçar, comer jabá. Uma vez, um médico, um mineiro. Ele ainda era vivo, não sei agora. Ele falou assim: “Maria Izanil, amanhã nós vamos comer lá, sim” “Aí, doutor, então eu vou sair cedo, porque eu faço compra em São Sebastião, eu tenho que fazer compra pra poder ir para lá”, ele começou a dar risada: “Compra pra quê?” “E vocês, o que vão comer?” “Quer dizer que amanhã não tem comida na sua casa? Não tem nada?” “Tem, mas não para essa turma, que quando sentam pra comer, não querem levantar mais da mesa, né?”, aí ele ria: “Não vai não, compra aqui mesmo, quando você for sair mais cedo”, aí eu saía e eu fazia compra. Quando chegava lá, já tava a compra, eles compravam, mandavam e eu não comprava nada, Doutora Elisa. Muito boa. Mas foi bom.
P/1 – E dona Izanil, como é que foi para a senhora ver a sua família crescendo, né, então teve os filhos, teve os netos…
R – Tudo bem. Eu aceitei tudo, né, ajudei bastante, isso eu ajudei bastante a todos eles. Tem uma que agora morava em Santos (SP), era muito sofrimento, enquanto não trouxe pra cá, agora estão tudo aí. Mas a vida é assim mesmo.
P/1 – Dona Izanil, conta pra gente o que mudou na cidade de quando a senhora era pequena?
R – Mudou tudo. Aqui , mudou tudo. Não tinha luz, não tinha água, não tinha. Só tinha um caminhãozinho velho de um rapaz que veio pra cá, trouxe, colocou o caminhãozinho velho e para todo lugar ele fazia viagem. Mas foi mudando, cada vez tá mudando uma diferença, né? Tinha festinha, muita festinha, muita festinha. Todo mundo… “Tá tudo claro lá, estão fazendo festa”, tudo era lamparina, sabe o que é lamparina? Tudo lamparina. E essa época de junho, julho, tudo festa caipira… Qualquer lugar tinha festa caipira, fogueira. Uma festa mesmo. E não tinha luz, com todo sacrifício. Não tinha briga, não tinha nada, só a diferença é que agora tem essas, às vezes, fazem aquela festa tão bonita, acaba…
P/1 – E conta das festas tradicionais, aproveitando que agora que a senhora falou disso, né? Quais eram as festas marcantes que toda a vila ou a comunidade se reunia?
R – Então, eu vou falar aqui no Perequê, [tinha a] festa de São João. Vinha gente de Caraguá, de bairros, vinham a pé, porque também lá não tinha ônibus. Assim, vinham na véspera de São João, vinham na festa aqui, porque aqui tinha a parte da igreja, fechava a igreja, tinha já um… fazia um… aí, como é que chama? Com toldo, tudo. Era feito um barraco grande, ali já começava o toque, era o baile, amanhecia o dia, sabe? Então aqui começava festa de Santo Antônio, dia primeiro de junho, depois acabava Santo Antônio, vinha São João, passava dois, três, começava São João… aliás, acabava São João, começava São Pedro e ia até o final da festa. E a pessoa que brigava ia preso, se brigava na festa de Santo Antônio, só saía em julho da cadeia (risos), só saía em julho, a mãe mesmo ia pedir para o delegado, né? Ele falava: “Ele não quer brincar, vai brigar, então fica aqui, acabou a festa…”, depois tinha na vila sempre da Padroeira, teve, né?
P/1 – Qual que é a padroeira?
R – Padroeira Nossa Senhora D’Ajuda, cada bairro tinha uma festa, né? Mas era bom, que a gente saía daqui, ia brincar, ia dançar quadrilha, era gostoso. Não tem mais essas festas.
P/1 – E como é para a senhora andar na cidade, assim, já toda mudada, mas ainda assim, reconhecendo as pessoas, ou encontrando com…?
R – Encontro. Eu encontro… Olha, eu vou na missa na Barra, porque pra mim é durante o dia a missa … Deixei de ir mais à noite, daí eu vou na missa, depois da missa, eu vou lá na Barra. Então, vou lá, faço um lanche, aí começam a chegar as pessoas… Outro dia, ficamos até duas horas da tarde, aí a moça falou assim: “Meu Deus, eu vim comprar carne pra fazer almoço”, ela esqueceu, nós ficamos na conversa e quando lá lembrou, eu acho que já tinha até almoçado na casa dela, qualquer coisa. Então, ontem mesmo, eu fui na missa, aí de lá, passei lá e fiquei conversando, ontem cheguei até mais cedo, peguei o ônibus… Mas você encontra, sabe? E é gostoso! Esses encontros assim.
P/1 – E a senhora costuma contar histórias para os seus netos de como era antigamente ou contar…?
R – É, mas agora eu não tenho neto. Eu só tenho a neta, aí eu conto… Eu converso com ela bastante, né? Mas antes, já tinha bastante, fazia aquela roda, contava. Os vizinhos tinham filhos, à noite, principalmente à noite de verão, eles iam pra casa conversar, os velhos, né, nós íamos brincar de pique, sem pique, roda e tinham umas coisas, nós inventava, passa anel, né? Se uma tinha namorado e o pai não sabia, o namoro se desfazia na brincadeira do anel, e ficava até tarde assim. Então, dá saudade porque acabou, não tem nada disso.
P/1 – E tinha alguma cantiga de roda que vocês cantavam?
R – Tinha bastante. Mas agora não tem mais, as crianças já querem se meter também… Você vai, já querem também entrar no meio da dança (risos).
P/1 – Tem alguma cantiga que a senhora se lembra?
R – Tem. Tem bastante. Sabe quando eu lembro? Se eu não tenho sono, aí me vem tanto aquela recordação, aí lembro de tudo, eu dou risada, eu converso, eu sento na cama, eu converso, né? É tão gostoso relembrar. No sábado mesmo, eu encontrei com a Deise, tinha um sobrinho dela que até me segurou por aqui, eu ainda comecei a brincar: “Ladrão não é porque eu não tenho dinheiro”, aí ele: “Adivinha quem tá aqui?”, aí eu sei que depois, eu falei: “Meu Deus, quanto tempo que eu não via ela” “Pois é, não tem mais roda”, e mamãe fazia chá na noite de frio pra dar pra nós. Mas agora, não brincam não, não tem nada de brincadeira.
P/1 – E a senhora sente saudades de alguma coisa?
R – Me dá saudades.
P/1 – E dá saudades do quê?
R – Dá saudades do pessoal no tempo da minha mocidade, né? Aqui mesmo não tinha luz, não tinha água, quando chegava sábado, “nós reunia” e ia pra vila, lá sempre tinha alguma coisinha no clube, principalmente à noite de Natal, fim do ano, ia aquela turma. Aí mamãe dizia assim: “Meia-noite, eu quero todo mundo aqui”, tinha outra que dizia: “Meia-noite, eu quero…”, cada um já dizia pros filhos. Então, nós ficávamos: “Vamos embora, deu 11 horas”, a gente já contava pelo sino da matriz, né? Muitas vezes, nós saiamos daqui onze e meia, correndo, correndo. A primeira casa que chegava, chegava a turma toda, né? “Olha, vai ser meia-noite”, aí se abraçava, tal, “Vá lá comer alguma coisa”, aí a gente entrava na casa, já tirava da mesa um pedacinho… já saía correndo, já tinha outra, sabe? Assim até chegar em casa, chegava em casa, tinha já duas que: “Aí, meu Deus do céu, meu pai vai brigar com nós”, mamãe: “Por quê?” “Porque nós não vamos chegar meia-noite” “Fala pra ele que depois vocês tiveram aqui e vocês demoraram, mas leva alguma coisinha para eles comerem aqui, diferente de vocês”, porque todo mundo fazia uma mesinha, né? Era muito bom. Nós se abraçava… Quando dava meia-noite, navio tudo começava a apitar, era aquela farra, abraço… A gente fazia a nossa festa. Agora não se encontra mais. Eu agora encontrei só com uma, a Deise: “Izanil, cadê a nossa festa?” “Pois é”. Vai acabando, né?
P/1 – E dona Izanil, pra gente terminar assim, tem alguma coisa que a senhora gostaria de falar pra deixar registrado, assim, daqui da cidade ou da sua história, alguma passagem, assim, que você queira deixar registrado que eu não tenha perguntado?
R – Essa não lembro. Tem tanta coisa, tanta coisinha, mas, não lembro, não. Tem muita coisa. Mas assim, não da para eu lembrar…
P/1 – Teve alguma história sua no mar? A senhora saiu de canoa ou de barco por aí? Pra algum lugar?
R – Sai várias vezes.
P/1 – Tinha medo?
R – Não. Mas só nunca fomos atrás da Ilha, mas de canoa atravessar para São Sebastião, ia aquela turma. A mamãe pagava duas pessoas de confiança: “Você leva as minhas meninas e vocês meia-noite, vocês vão buscar elas”, em São Sebastião. Então, nós íamos pra lá. Quando chegava lá, uma disse: “Olha meia-noite, hein, que o homem vem buscar a gente”, outra: “Izanil, é mesmo, meia-noite”, olhava no relógio, quem tinha relógio… Muitas vezes, coitados, eles iam embora, desistiam, chegavam, viam nós na brincadeira, sabe? Tinham dó de atravessar. Depois, eles voltavam, mas não para passar o dia em casa. Outro dia, então, mamãe tinha confiança. “Vai ver que Marcelino entrou numa festa coma s crianças, tá na confiança deles”, nós chegava de manhã, ou já tava em casa muito tempo.
P/1 – E a senhora sabe de alguma lenda, assim, que tem na cidade, alguma história assim, de saci ou de alguma história dessas de folclore da cultura tradicional?
R – Que passou por mim?
P/1 – É, ou que a senhora tenha visto ou ouvido alguém contar?
R – Não. Não, não lembro nada. Tem muita coisa, mas não lembro, não. Mas aqui era bom, todo mundo era amigo, todo mundo, né? Você não podia dizer: “Tô aqui num lugar”, que a sua mãe não ia saber, porque chegava: “Vocês estão aqui”. Lá no Ilhote, nós ia pra lá, mamãe outro dia disse assim: “Você foi no Ilhote?” “Mamãe, por quê?” “Não sei quem foi – falava o nome – falou que você estava lá no…”, então quer dizer que todo mundo era conhecido, né, não podia sair fugido. Mas era bom.
P/1 – Daí pra gente terminar, conta pra gente como é que foi pra senhora contar um pouco da sua história pra gente aqui, agora, de tarde. lembrar todas essas histórias.
R – Pois é, eu gostaria… É que na hora, minha cabeça não tá dando mais pra lembrar…
P/1 – Imagina, lembrou um monte de coisa.
R – É muita coisa. Como dizia minha vó: “É muita peraltice” (risos), nós tinha Festa de São João era baile, e aqui tinha polícia, né? Então, chamava a polícia e tinha um cabo, ele namorava uma colega nossa e ela morava aqui perto, assim e o pai dela não queria: “Não quero que você namore polícia…”, aí contaram pra ele e ele vinha cantar bem na frente da casa dela, arrumou um violão, sabe, começou a cantar. O velho saía louco, brigava. E tinha festa de São João e ele também gostava de brincar, mas ele não podia. Aí o que nós fizemos? Era ele e um outro soldado: “Você…”, nós arrumamos roupa pros dois: “E vocês ficam brincando também. Qualquer coisa de briga, vocês trocam e…”, ele brincava toda festa, todo mês de julho aqui coma gente e quando tinha briga, estavam presentes, porque a gente já contava: “Teve uma briguinha assim, assim…”, eles iam correndo, já se trocavam roupa de polícia, mas ninguém sabia… “Aquele polícia lá tem tanta feição daquele que tava dançando com a gente” ‘Tem mesmo, já falei pra ele que qualquer hora ele vai ser chamado na delegacia por esse motivo”, mas ele aproveitava a festa, ele não era essa polícia não, porque tem polícia que se orgulha de ficar lá. Nós fazíamnos correio elegante e tinha um prefeito aqui que também gostava de farra, né? As meninas faziam bilhete pra ele, pro prefeito, e queriam encontrar ele em tal lugar, assim. Aí, ele tinha que pagar, né, aquele bilhete, porque é vendido, ele não pagava. Aí, marcava um encontro só para espiar para ver se ele ia, e ele ia, mas não encontrava ninguém. Aí depois, faziam em outro… Depois: “Eu não quero saber disso”, aí fazia um bilhete pra ele, que se ele não fosse, ele ia preso. Ele dava risada: “Olha o que mandaram pra mim? Se eu não fosse no encontro, eu vou preso” “Vai mesmo, vai preso mesmo”. Nós fazíamos cadeia de bambu, então tinham dois soldados lá. Ele chegou um dia que foi preso, a gente tirava um sarro dele: “O prefeito foi preso! Até que enfim prenderam o prefeito de Ilhabela”, aí soltavam. E ele brigava.
P/1 – E dona Izanil, o que a cidade de Ilhabela significa para a senhora?
R – Aí, eu nem sei o que significa. Porque vamos começar pela prefeitura. A prefeitura teve muito prefeito conhecido, desconhecido, mas nunca fez nada! Nada! Nem pra mim, nem pras minhas irmãs, nem pra minha mãe, nunca. Mas não é por isso que a gente… O dia que chegava em casa, a porta estava aberta, sabe? Mas muitas vezes, até hoje em dia, eu fico vendo o movimento, chega uma pessoa, já tenho um lugar, as minhas filhas cresceram, estudaram, mas não teve ajuda da prefeitura.
P/1 – Mas assim, o que eu digo é em relação à cidade assim, o que significa a cidade para a senhora? Como o seu lugar, o lugar onde a sua avó chegou, onde sua família cresceu…
R – Eu acho, sabe, a vila não é mais Ilhabela. Não tem mais morador da cidade. Ali, tem uma ou duas famílias só ali dentro da cidade que seja daqui. No mais, é tudo comércio, tudo comércio. Aí, eu fui lá na vila atrás de Cristina, como é que era, agora é tudo estacionamento, era uma casa também que Cristina tinha a porta aberta, então tinha ali embaixo também, Alice Ribeiro, ali também tem lojas, cheio de lojas. Não tem mais dizer assim: “Eu vou bater a porta de fulano”, não tem. Só tem lá pra cima, na rua de cima, tem uma família só. Tem um filho, tem dois, o casal. Então ali, não tem mais nada que diga cidade de Ilhabela. Tudo era casa, tudo… É, a vida!
P/1 – É, as coisas mudam, né?
R – Mudam muito. Eu acho muito diferente. Os mais velhos vão morrendo, vão ficando os moços, casam, já não cassam com os daqui, já casam com os de fora, né? Antes não, casavam, era a maioria era tudo filhos daqui, aí continuava a família. E agora, não.
P/1 – Bom, dona Izanil, então eu acho que a gente…
R – Olha, eu não tenho nada mais pra contar.
P/1 –A senhora contou um monte de coisa e é por isso que eu…
R – Antes , como dizia a minha avó: “Tinha o peixe com banana verde, agora não tem mais”, a maioria comia tudo peixe com banana verde, né? Agora, não tem mais.
P/1 – Mas a senhora fazia?
R – Fazia, era a comida nossa. Era peixe com banana verde. Mas tinha feijão, mas a maioria era peixe.
P/1 – Conta pra gente como faz esse peixe com banana verde e aí, a gente encerra.
R – Hum?
P/1 – Como que se faz esse peixe com banana verde?
R – Muita gente faz, outro dia, eu vi lá num restaurante: peixe com banana. Mas a qualidade da banana que eles disseram lá nunca foi…
P/1 – Mas como que era o da senhora?
R – O meu tinha banana mesmo, era banana nanica que é uma banana boa pra peixe. Era o peixe, tinha a cebolinha verde que agora ninguém come mais, qualquer lugar, o cantinho assim tinha plantação de coisa tudo pra fazer o peixe, peixada. Olha, se eu for fazer uma peixada, eu não faço, não tem o que por.
P/1 – Mas a senhora estava contando então que você pegava a banana nanica, o peixe e a cebolinha…
R – Peixe, a cebolinha, tudo, cheiro verde, eu fazia o tempero … aí punha o peixe depois de por um pouco de óleo, aí punha o peixe e fazia aquele caldo bem temperado com sal e punha aqueles pedaços de peixe e aí, deixava cozinhar e vamos e vamos.
P/1 – E era gostoso?
R – Era gostoso. Normalmente, o pessoal não comia, então eles deixavam caldear, depois que almoçava, cada um tomava um prato de caldo de peixe, caldear. Era gostoso. Agora salgava muito o peixe, era muito bom, fazia como o bacalhau, sabe? Peixe salgado, uma delicia. Tava vendo na televisão, põem tanta coisa numa comida, que não sente sabor que tem a comida, né? Você olha ali, estão pondo isso, estão pondo aquilo… Pois a vida tá boa.
P/1 – É isso daí. Então, dona Izanil, a gente em nome do Museu, agradece a sua entrevista, muito obrigada.
R – Desculpa não ter mais nada pra contar.
P/1 – Imagina, a senhora contou um monte de coisa. Muito obrigada.
R – É, tá bom.
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