Supermercado familiar

P/1 – Dona Angelina, nós gostaríamos que a senhora nos dissesse seu nome completo, local e data de nascimento.

R – Angelina Aparecida ____ Galassi. Vinte e sete, fevereiro, 1937.

P/1 – Quais eram os nomes dos senhores seus pais?

R – Era José ____ e Iara ______ ________.

P/1 – Qual a origem da sua família?

R – Era italiano, mamãe espanhola.

P/1 – A senhora se lembra dos seus avós?

R – Não, não lembro. Porque quando cresci já não os tinha.

P/1 – A sua família é de um lado espanhola de outro lado italiana. A senhora sabe, pelo que eles contavam, como é que eles vieram pra cá, quando mais ou menos, em que período eles vieram?

R – O pai do meu sogro veio com doze anos.

P/1 – O pai do seu sogro. E o seu pai?

R – O meu pai esse eu não cheguei a saber.

P/1 – como ele veio. Ele era também descendente de italianos.

R – É, porque também, eu perdi meus pais muito nova, né? E lá na lavoura era tudo diferente, a gente não. Quando fui entender bem. Com doze anos perdi minha mãe, com 16 perdi meu pai. Então era meio.

P/1 – A senhora não sabe. A senhora sabe a origem, mas não sabe quando eles vieram nem porque vieram. Qual era a atividade de seus pais?

R – Eram da lavoura.

P/1– Tanto a mãe como o pai trabalhavam na lavoura.

R – Minha mãe era comerciante, né?

P/1 – Ah, é?

R – É, minha mãe tinha uma loja em Amparo, e quando foi na revolução de 1937 ela foi, destruíram a loja dela. Mas aí o consulado espanhol conseguiu reconstruir tudo de novo pra ela. Então ela tocou a vida dela, ela tinha três filhas, e depois ela ficou viúva. Foi então que meu pai, e eles começaram a namorar. Só que aí, quando eles casaram, o meu pai era sitiante, ela veio morar no sítio. E meu pai também já tinha uma família de outra mulher, com nove filhos.

P/1 – Nossa!

R – Só que a primeira família dele já tinha ido tudo pra São Paulo. E as filhas também da minha mãe já estavam todas encaminhadas já, na cidade, em Amparo. E daí ela foi morar com meu pai, lá na lavoura, no sítio nosso. E daí foi que aconteceu nós, os quatro irmãos.

P/1 – Então a senhora tem três irmãos.

R –Nós somos em dois homens e duas mulheres.

P/1 –E esses irmãos da senhora trabalham no comércio também?

R – Eu tenho uma irmã que não trabalha, mas outro irmão trabalha. E tenho um irmão que está conosco lá, que trabalha com a gente no mercado. O caçula.

P/1 –A senhora então nasceu em Amparo. Como a senhora veio pra Campinas? Por que a senhora veio e quando a senhora veio?

R – Então foi assim: como lá ___ ____, meu pai ficou muito doente também. A minha mãe tinha morrido primeiro, meu pai ficou muito doente. Então meu pai tava desenganado sabe? Do médico. Então a gente tinha começado um namorinho, ia com ele lá, né? Daí meu pai falou assim: “olha, vocês não tem mãe, vocês não tem pai, que já vou morrer, estou doente, estou desenganado” – ele tava muito ruim – e ele falou assim: “quero chamar esses moços porque se eles quiserem casar acho bom vocês casarem”. Aí eu falei: “Meu Deus, mas casar!”. A gente nem sabia, né? Daí eu com a minha irmã nós casamos. Aí, com 18 anos casei e ela casou. Aí, quando eu casei fui morar com a minha família, minha família era – a família de meu marido – eram colonos numa fazenda. E de lá foi a vida, né? Trabalhando, trabalhando. Só que meu marido gostava muito de negociar. Então a gente ia pra roça as oito horas da manhã, voltava quatro horas; daí eu ia cuidar da casa, ia cuidar das criação, que ele comprava muito; daí ele ia fazer horta e ia plantar tudo que precisava plantar de verdura, depois ele ia na colônia vender. Ele trocava por frango, por galinha. Tudo aquela coisa que; ele negociava. E eu junto, sempre trabalhando junto. Depois nasceu meu primeiro filho, com 18 anos, quase 20 anos, nasceu meu primeiro filho. E depois começou, né? Eu sei que daquela fazenda nós fomos pra outra fazenda e tal. Daí já tava com três filhos, só que nessa fazenda o menino tava engatinhando. E a gente tinha uma plantação de arroz e meu marido comprou um barzinho na beira da estrada, sabe? Então nós fizemos a plantação de arroz, tava muito linda maravilhosa. E daí – ele tinha um compadre que já tinha ido pra São Paulo, pra Campinas, montou um barzinho – daí não tva bom lá, na fazenda tava muito puxado. Mas daí deu uma tempestade acabou com todo o arroz, plantação. No dia que ___, malhava todo dia. “Eu não vou mais trabalhar na roça, eu vou pra Campinas”. Nossa! Eu chorava muito porque como que eu ia pra Campinas, que eu não conhecia nada. Daí ele veio pra Campinas, ficou uma semana na casa do compadre, padrinho do meu filho; e lá ele começou. E tinha um senhor que ia levar bebida lá no barzinho, aqui de Campinas. Aí ele falou que tinha um botequinho, não era boteco, era uma portinha que vendia banana, pinga, essas coisas – e o cara queria vender. Aí meu marido veio – naquele tempo ele tinha quatro mil réis de criação; ele vendeu tudo, acabou com tudo. E daí ele veio; veio pra Campinas, negociou; daí foi buscar a mudança e a gente mudou. Mas era muito precário, muito precário. Eu sfri muito porque vim com três crianças, o pequeno tava engatinhando. E lá na roça a gente sofreu muito, dentro dessas lavouras, eu e meu filho mais velho. Aí quando ele veio para Campinas ____ já era mais grandinho, né? Aí a gente começou lá. Só que a casinha, ele tava aumentando. Daí na frente meu marido precisava dormir debaixo do encerado. E bom foi. Só que lá não tinha água. Era muito ruim o negócio de água; tinha que buscar numa mina que chamava mina do sapo. E era um sufoco. E levar as crianças na escolinha ali embaixo. Nossa foi muito difícil. Muito difícil! E meu marido saia cedo e voltava tarde porque ele ia – naquele tempo tinha muita mercadoria nas fazendas – então ele ia buscar a criação, trazia planta, essas coisas, o homem ponhava lá tudo: banana. Então a gente vendia muito, vendia bastante. Aí a gente começou a freguesia, depois fomos aumentando um pouquinho, aumentando. Isso aí foi de 1965 até 1990.

P/1 –Que bairro era este?

R – São Vicente. Mas nisso tudo, aconteceu tanta coisa, sabe, problema de doença. E quando chegou meu filho de onze anos já tava, começou a ficar no barzinho trabalhando. Então ele me ajudava, meio dia ia na escola. Mas assim, né, eu sempre não deixei de dar estudo pra eles, educação, tempo pra eles. Iam na escola, tudo aquilo. Daí foi, daí já tava começando a melhorar, a gente começou a comprar os terrenos em volta, sabe, já tava ficando grande. Só que daí, passado um tempo, em 1990, meu marido tava muito doente, sabe, a gente tava tentando reformar a casa pra cima pra derrubar tudo ali; pra gente mudar pra cima pra abrir toda a frente. E ele tava muito doente. Eu tava trabalhando também na casa, lá. Sempre trabalhando. Só que daí ele, nisso tudo meu filho mais velho casou – e nessa confusão de vai e vem; de aumenta, de corre, ele doente – nisso veio uma firma no São Vicente, uma rede de supermercados grande, aliás, veio um depois veio outro mercado, né, na rede. Daí meu marido faleceu. Daí a gente ficou desnorteada, né, não sabia o que fazer, se ia embora, se não ia, se ia dar pra tocar. Aí começamos. No começo foi muito choro, muito desespero, muito sem saber como fazia, né? Daí eu falei assim: agora precisa pegar e juntar com esses meninos e começar a trabalhar. E nisso tudo o meu filho tava na política, era vereador, é o Natal, né, meu caçula também ajudava ele. Então a gente fez uma reunião e resolvemos. Você vai ficar com o pai, no trabalho vai ficar com o comércio do seu pai, nós vamos assumir, vamos trabalhar. Ele falou, não mãe, vou preferir tocar o comércio que o pai deixou. Tá bom, aí começamos. A trabalhar menina, mas trabalhar, trabalhar. E eu tinha uma freguesia muito boa, muito boa mesmo. Não tinha nada ali, às vezes as pessoas chegavam: ai Angelina, eu não tenho nem alho lá em casa, como __ tinha, né? Ás vezes eu tinha, ia lá repartia com eles, fazia maior amizade. E quando veio o Carrefour, todo mundo – além da gente estar desesperado – todo mundo falava que a gente ia fechar. Aí acabei falando Carrefour, também não tem problema, né? É uma rede, né? Daí a gente ficou muito desesperado. Daí os clientes desciam lá embaixo e voltavam com a sacolinha. Mas chegava ali na porta eles não queriam entrar. Então eu ia de encontro com eles, pegava a sacola e guardava pra eles. ____. Não, ó, fazer o seguinte. Aquele tempo eles me chamavam de Angelina – faz o seguinte: “nada disso, se você veio aqui acho que veio atrás de alguma coisinha. Então você ver o que quer, você compra, e o que você achar que compensa vai comprar lá. Não tem problema nenhum. Eu também estou fazendo assim, eu estou vendo onde está mais barato pra por aqui, pra comprar”. E isso foi, Marisa, dia a dia, mês a mês, e eu ali no batente, cedo à noite. Podia ser a hora que quisesse eu tava lá. Fazia as coisas à noite, madrugada. Meu filho levantava, meu marido ficava à noite então eu ia cuidar, né. E daí eles ficavam – era aquela correria pra ir pra escolinha, corria, corria. Mas só que também não tinha água. E daí, lá de cima, porque era uma rua só. Era de terra, não tinha nada, não tinha casa. Então a prefeitura colocava água numa caixa pro lado de cima da rua. Mas não deixavam a gente pegar. Daí uma vez eu peguei água lá, eu saí tão preocupada – a gente era nova, né, com medo, essas coisas, né. E o carro veio, eu olhei assim pro lado, eu olhei quando vi o carro tava em cima. Aí eu joguei os baldes todos, né, aí voltei chorando, tinha água, né? Aí as crianças ficaram sem almoço. Meu marido chegou e eu falei: “olha, não dá pra ficar aqui, não tem água. Hoje aconteceu isso”. Aí a gente não tinha dinheiro, mas tinha um poço no fundo do quintal. Daí tinha um vizinho nosso lá, ele era poceiro. Aí ele pegou e veio fundar o poço com a gente. Naquele tempo a gente pagava dia dez. aí nós pagamos, meu marido era muito certinho, fazia controle, procurava comprar mais a dinheiro, aquela coisa. Então foi muito gostoso o nosso trabalho ali. Eu vivia, aqui também porque a gente perguntava, não sabia se a era feliz ou infeliz, porque nem dava tempo de ver o que era aquilo. Era só trabalhar, trabalhar, trabalhar.

P/1 –A senhora contou que o seu marido faleceu. Em que ano ele faleceu?

R – Em 1990.

P/1 – Até 1990 vocês ficaram nessas condições no mesmo endereço.

R – No mesmo endereço.

P/1 – A senhora falou dos seus filhos que resolveram contribuir com os negócios do pai depois da morte do pai. Quantos filhos a senhora teve? Fala os nomes deles.

R – Eu vim pra Campinas com três filhos; depois nasceu o caçula, que é o João Carlos, que acho que você falou com ele. Daí começaram a trabalhar tudo, tinha o pequenininho pra cuidar. E eu tinha um filho, Antonio Pedro, Pedro; ele não se ajeitava de ficar ali preso. Ai eu falei, o que vou fazer com esse menino? Não posso deixar na rua. Aí eu coloquei ele de guardinha, ele trabalhava, era uma graça. Depois ficou mais assim, tinha um senhor, porque eu tinha uma amizade com o povo. Então ele veio: “Dona Angelina, deixa o Pedro – ele não gosta de ficar aí – deixa o Pedro trabalhar comigo de servente de pedreiro”. Falei: “nossa, não seu Zé, não é muito peso?” “Não, dona Angelina, é mais pra me ajudar e tal”. Eu deixei, nossa, era até pra ser um profissional. Aí depois, a roupa vinha muito suja, sabe, e eu não agüentava lavar a roupa, e a roupa dele de barro; e eu achei melhor ele não trabalhar. Depois ele cresceu mais e acabou ficando junto com a gente trabalhando. Evoluiu. E depois, quando ele casou, ele casou novo, nós tínhamos uma chácara e ele já cuidava dessa chácara pro pai. Daí quando ele casou, o pai era vivo tudo, ele falou que queria ter um comercinho dele. O pai dele falou: “Vai montar seu comercinho!. Ajudou, e até hoje ele tem comércio, tem comércio de bebida – no atacado ele tem. Então ele deve muito bem. E os três tão comigo lá, e eu com eles.

P/1 – Então a senhora com a senhora no supermercado a senhora tem o João Carlos, com quem eu falei.

R – O Sebastião, que é o terceiro; e o Natal, que é o mais velho, esse que foi vereador.

P/1 – Então com a senhora estão esses filhos.

R – Esses filhos.

P/1 – Vamos falar um pouquinho da sua infância.

R – Da minha infância eu não tenho muito o que falar. Porque na infância, lá no sítio, a gente brincava, era aquela vida.

P/1 – Do que a senhora gostava de brincar?

R – Ah, aquelas brincadeirinhas que a gente ia, de pular corda, de brincar, né? Agora sair meu pai não deixava. Passear, ir numa missa, nada. Agente pulava corda, brincava de boneca. Fazia pouca coisa, que eu tive nessas oportunidades; porque meu pai quis que a gente fosse trabalhar muito cedo na lavoura.

P/1 – E a senhora tinha amiguinhos?

R – Tinha, poucos, mas tinha. Porque era sítio, sabe? Porque sítio é um aqui, outro lá pra frente, tinha na escolinha. Só que a escola lá era só terceiro ano, lá na roça. Só que depois, como a minha mãe era a dona da loja em amparo, e a dona que ficou, ficou minha madrinha. Aí eu fui fazer o quarto ano lá. Fui a única que consegui fazer o quarto ano.

P/1 – E com foi esse tempo que a senhora passou com a sua madrinha?

R – Ah, foi gostoso, foi bom. Mas eu achava falta da mãe, mas eu ia final de semana, não era longe.

P/1 – A senhora se lembra, quando a senhora veio pra Campinas, o que a senhora percebeu em Campinas. A senhora em Amparo, na cidade de Amparo?

R – Não, na fazenda.

P/1 – Depois o seu esposo e a senhora estabeleceram um pequeno comércio, esse comércio era na fazenda também?

R – É, era na fazenda. Na rua assim, sabe esses leites, que vinham naquele tambor grande? Os donos da fazenda, os funcionários traziam todos ali. E ali os caminhões, os funcionários vinham buscar, pra levar.

P/1 – Era perto de uma estrada.

R – Era numa estrada.

P/1 – Ah, sei. A senhora se lembra se quando a senhora veio pra Campinas, como a senhora se sentiu? Como a senhora viu a cidade? A senhora já conhecia a cidade de Campinas?

R – A cidade, a gente passou só, e veio, foi lá no bairro. Era praticamente uma fazenda, porque não tinha nada aquele tempo, eram algumas casas, tinha uma igrejinha lá, que lá que a pessoa ia estudar. Era praticamente uma fazenda, né? Eu estranhei muito, sofri muito porque não tinha água. Porque no sítio tinha muita água, aquelas minas de água, que era maravilhosa. Aí eu estranhei muito.

P/1 – A senhora ficou muito tempo sem água.

R – Fiquei sim, fiquei acho que uns seis meses sem água.

P/1 – Depois então que conseguiram fazer o poço. A senhora se lembra de quando a senhora veio pra cá, se as pessoas tinham o costume de comprar coisas em São Paulo?

R – Que eu saiba não.

P/1 – Tudo o que precisava as pessoas do seu bairro ali, que era quase uma fazenda, as pessoas compravam tudo por ali mesmo?

R – É, na esquina onde eu moro tinha um armazém grande, que depois fechou, foram todos embora. Depois também eu montei o mercado, mas esse armazém grande ficou muito tempo lá. Eles vendiam de tudo, era uma coisa grande.

P/1 – E as pessoas compravam lá.

R – Compravam lá e também comprava no meu, quando foi formando. Quanto mais tinha, eu vendia na caderneta, né? Aquele tempo era coisas de saco: arroz, feijão, sal, lembra? Então a gente vendia na caderneta, quando a gente começou a melhorar, né?

P/1 – Então a gente estava falando sobre as compras. Então as pessoas tudo o que precisavam compravam naquele armazém.

R – Ali e onde tivesse, depois que veio o mercado grande. Depois foi melhorando tudo; depois veio a Swift, né?

P/1 – A senhora sentiu desde cedo, a senhora sentiu uma inclinação pra trabalhar em comércio?

R – ah, sim eu tenho paixão por comércio. Se eu pudesse voltar no tempo, ficar lá com meus clientes, meus funcionários; os fornecedores, que também eu comprava, ajudava a pagar. Nossa, muita gente. Eu gosto.

P/1 – A senhora sempre gostou?

R – Ah, eu gostava. Nossa, eu gostava muito mesmo. Eu não cansava, eu não tinha horário, sabe, pra mim.

P/1 – Na sua infância o seu pai proibia a senhora de sair, que a senhora falou. A senhora não ia a nenhum passeio.

R – Não.

P/1 – Como a senhora conheceu o eu esposo?

R – É que era lá da fazenda mesmo.

P/1 – Ele era da fazenda onde a senhora trabalhava?

R – Era da outra fazenda, depois que a gente ficou conhecendo, tudo. Não, ele era da fazenda, mas nós éramos do sítio. Então, acabamos conhecendo.

P/1 – Assim, de passagem. Como foi o conhecimento?

R – Ah, foi legal, mas a gente não tinha muito tempo. Porque meu marido deixava, mas depois que ele viu que a gente tava namorando, ele já logo quis que casasse, então foi assim, uma passagem meio rápida, né?

P/1 – Mas como a senhora conheceu, a senhora lembra?

R – Ah, foi assim. Teve missa, né, aí teve aquela quermesse. Aí foi que eu com minha irmã conhecemos eles, aí começamos a namorar, assim, namorar tinha que ir em casa, ficar lá sentado com os pais, né, e depois, assim que teria que ser.

P/1 – Claro. E quando a senhora sua mãe faleceu, a senhora e sua irmã assumiram a casa? Como foi? Vocês eram bem pequenas.

R – É, nós éramos pequenas. Aí eu tinha irmão, né, ele casou com outra. Não, eu tinha irmão, ele casou, e essa madrasta veio morar com nós. E daí ela ficou lá um bom tempinho com a gente, mas a gente sofria a falta da mãe. Ter o carinho da mãe. O pai também.

P/1 – Faleceu logo. Quando a senhora tinha dez anos faleceu a sua mãe?

R – Doze anos.

P/1 – E o seu pai quando a senhora tinha 18?

R – Dezesseis. Dezesseis e três meses; parece.

P/1 – Então esses quatro anos a senhora passou.

R – Dezesseis e três meses, que eu casei com dezoito e pouco.

P/1 – A senhora passou esses quatro anos com a esposa do seu irmão?

R – É. Mas a gente ia trabalhar na lavoura, não tinha problema nenhum. Eu sempre ajudava meu pai.

P/1 – Você sempre ajudava?

R – ah, ajudava. Eu e meus irmãos, minha irmã.

P/1 – Vocês chegavam a fazer viagens pra outras cidades naquele tempo?

R – O que a gente vinha era Amparo, alguma vez, né?

P/1 – A senhora chegou a viajar de trem?

R – Cheguei a viajar de trem, um pedacinho assim.

P/1 – Como era a viagem?

R – Ah, era gostoso, muito gostoso.

P/1 – Por que? O que tinha de especial?

R – Ah, não sei. Sei lá se é porque a gente era jovem, misturava, aí gostava.

P/1 – Então a senhora começou a atuar no comércio logo depois que a senhora se casou? Logo depois vocês montaram a. A senhora lembra o ano?

R – Ai, foi logo que eu casei, né?

P/1 – A senhora casou quando tinha 18 anos.

R – Em 1965 eu vim pra Campinas.

P/1 – Deve ser por volta do início dos anos 60, que a senhora começou a atuar no comércio. A senhora fazia de tudo. Como era pra senhora, quando veio pra Campinas, a senhora começou a conhecer outras lojas, outros estabelecimentos comerciais. A senhora ia nessas lojas?

R – Ai, não, era muito longe. A gente não fazia muito isso aí. Era só trabalhar, ninguém tinha tempo de ver nada. Era só trabalhar.

P/1 – A senhora lembra de alguma loja daquele tempo? Quando a senhora chegou. Do nome de alguma loja?

R– Eu sei que tinha Eldorado, Eldorado é o que mais eu lembro.

– Eldorado. Lojas de calçados, de roupas, a senhora não lembra?

R – Ah, tinha na cidade, mas eu não lembro muito assim.

P/1 – A senhora não lembra. Quantos funcionários a senhora tinha depois que o seu marido faleceu? Quantos funcionários? Porque aí a senhora é que começou verdadeiramente.

R – É, quando meu marido faleceu, então já logo, a gente continuou ali, então eram poucos funcionários.

P/1 – Quantos a senhora tinha?

R – Ah, tinha poucos. Acho que uns dez funcionários. Ia aumentando, né? Conforme ia aumentando. Mas depois a gente comprou, ali na Saudade, uma loja que tinha tido um negócio de falência, ela fechou, né? Então a gente comprou ali, meu filho caçula: “vamos comprar, vamos comprar”. E eu era muito medrosa no tempo, eu chorava muito quando era pra fazer as coisas. E tinha muito medo de conta, de não poder pagar. Eu era muito assim, porque meu marido não gostava muito de contas, sabe? E eles não, eles queriam por a cara. Eu falei: não, “bora” com isso porque a gente tem que crescer, né? E quando a gente abriu em Saudade, já foi aumentando os funcionários, outra loja. Daí ali a gente começou a ir melhor, tava com a estrutura melhor. O caçula já tinha evoluído muito, né?

P/1 – Quando a senhora abriu a loja? A senhora lembra mais ou menos quando vocês inauguraram a loja da Saudade.

R – Então, foi 1990. Ah, foi logo que meu marido, ah, foi 1992, 1993.

P/1 – Depois a senhora inaugurou outra loja. Quando foi, a senhora lembra?

R – Não, não demorou muito, não. Passados uns anos a gente inaugurou lá.

P/1 – Onde é?

R – Na ____. E, quer ver? Acho que uns seis, sete anos, começou a pensar no Souzas, né? Porque em Souzas não tinha ninguém. E daí começaram a falar pra ele; João Carlos ia muito pra Souzas, né? Começaram a falar pra ele, porque ele faz muito amizade, né? Por que não ia montar um comércio em Souzas, aquela coisa toda. Essa conversa ficou quase um ano, daí, certo assim, ele ficou amigo de um médico lá, e o médico falou que queria construir uma loja pra nós. Nossa, eu ficava assim: ai meu Deus, mais uma loja! E construiu uma loja maravilhosa pra gente, lá em Souzas. Nós abrimos, estamos muito bem. E agora o dono do prédio comprou outro ____, outra parte grande, construiu, a gente inaugura acho que até o final do ano. A outra parte, que abre toda a loja, lá, ela fica bem maior, bem mais bonita.

P/1 – Ampliação da loja.

R – Vai ampliar todo, vai modernizar melhor, sabe? Os móveis já estão comprados, os balcões. Vai ficar muito bonita.

P/1 – Então, de 1990 pra cá – só pra eu entender – de 1990 pra cá a senhora com seus filhos abriram três unidades de supermercados.

R – Mas, além disso, nós crescemos muito; nós fizemos um prédio atrás, na mesma loja lá de São Vicente – elas são alugadas essas lojas – o prédio mesmo é salão de São Vicente.

P/1 – Onde a senhora começou.

R – Onde eu comecei. Ali nós fizemos um prédio de três andares e compramos todo o redor ali, as casinhas, depois você vai ver na foto. Tem uma ali; as casinhas como eram. Só que a gente; fizemos cada negócio pros moradores de lá que você não acredita.

P/1 – Conta.

R – Nós demos uma casa maravilhosa em Valinhos, pra uma – agora ela é até minha amiga, nós saímos juntas às vezes – casa muito maravilhosa em Valinhos. Demos um sobradinho no ____ pra outro cliente. Tinha outra, que essa mulher era que nem uma irmã minha, ela era muito, ela me ajudou em tudo ali, sabe?

P/1 – Ela era sua antiga vizinha?

R – Quando meu filho foi pra ser vereador não tinha noção, ela me ajudou, me preparou. Porque era uma coisa. Como que poderia ver um filho meu vereador? Então, nossa, eu ficava preocupada com aquilo. Então, ela me ajudou muito. Só que ela morava numa casa que – ela pagou aluguel muito tempo – fala uso capião. Nem sei se posso estar falando essas coisas, mas a entrevista, era uso capião. Então ela, aí meu marido foi, não meu marido não, meu filho mais velho. Eles, né? Todos eles trabalhavam. Foi até o dono, negociou, resolveu, pagou uma parte, não sei lá como foi. Mas ela tem uma big de uma casona lá no bairro. Dela agora. Faz tempo isso aí. Então todos, e mais alguns inquilinos que tiveram a oportunidade de ter o que é deles, muito bom, muito caprichado. E a gente sempre quis fazer o melhor.

P/1 – Claro. Quando o seu marido faleceu a senhora tinha dez funcionários. Hoje, quantos funcionários a senhora tem?

R – Acho que tá quase, entre funcionários, nós temos muita gente que trabalha pra fora, parte de segurança, parte de limpeza. Tem mestre de obras; tem eletricista; tem pedreiro. Ai nem sei quanta gente. Então dá quase 400 funcionários.

P/1 – A senhora vê que em 17 anos.

R – Quase 400 funcionários.

P/1 – Quais foram pra senhora os maiores desafios no comércio?

R – O maior desafio pra mim foi quando veio o Carrefour aqui na minha porta. Aquilo, eu chorava a noite. Eu olhava a minha loja parece que não tinha ninguém, eu ficava doente. Aí no outro dia eu ia trabalhar. Porque eu fui uma pessoa que mais quis ficar lá. A família queria se mudar, eu assim muito, assim, preocupada, né? E eu naquela paixão, pros clientes, pro bairro, pra aquela lojinha. Aquela coisa de fazer, acontecer. Eu quis ficar lá. Então, eu sofri muito. Ali foi pesado.

P/1 – E como a senhora venceu isso?

R – Ah, eu acho que foi muito atendimento. Carisma. Procurar sempre procurar pro cliente: “o que você tem? O que você não tem?”, e buscar, levava na casa, sabe? “Amanhã vou te entregar”. Fazer assim, o que se podia e o que não se podia pro cliente. E eu era muito enérgica com limpeza, sabe? Ai, eu lavava aquilo, eu limpava, eu encerava. Você não acredita o que eu fazia. Eu gostava muito. E depois meus filhos, né? Que eu não faço nada sozinha; eu ia junto com eles. Eles são muito trabalhadores, muito honestos. Então, pra nós não tinha hora. Mesmo quando meu marido, antes dele falecer, ele ficava. No final de semana tinha um barracão lá que tinha bar. Então como não tinha nada no bairro o pessoal ficava todo lá, vinha todo ali. Então ele amanhecia lá. Daí de manhã ele vinha dormir e eu entrava. Dali ajudou a gente bastante também.

P/1 – Ele vendia artigos pras festas?

R – É, bebida, salgadinho. Essas coisas assim o pessoal ia dançar, vinha beber, aquelas coisas assim.

P/1 – A senhora, dona Angelina, o que a senhor percebe que a senhora poderia falar, de transformação, nos artigos que a senhora comercializava. A senhora falou uma coisa, vendia em sacos. Fala um pouquinho dessas transformações que a senhora atravessou. A senhora antes a senhora comentou que o arroz, o feijão. Fala um pouco.

R – Então, a gente vendia assim, né? Mas eu naquele tempo eu gostava só de trabalhar com as meninas, eu não gostava, eu não queria trabalhar. Sentia bem, aquela moçada comigo, senhoras. Então aquele tempo ainda tinha uma menina. Ela mora no bairro, tem uma família maravilhosa, ela que juntava os sacos de arroz nas [vascas?]. Eu tinha uma que era açougueira e a outra que batia a carne. Mas era _______ boi, mesmo. Ela está numa rede no Rio de Janeiro, uma rede muito famosa. Cada vez que ela vem ela tenta falar que vai ver a mãe dela, que sou eu, e faz uma festa. E não deixa de vir me ver. E meus funcionários, hoje têm mercado. Mas eu ensinava. Eu era enérgica, mas nós éramos todos amigos. Então, eu assim, eu gostava de trabalhar com elas, não tinha assim, dificuldade. Mas depois começou a evoluir muito. Aí eu vi que já não dava mais, né? Elas tiveram que, daí ela foi fiscal de caixa. Foi mudando. Até que depois ela casou, foi cuidar da vida dela, foi pro Rio de Janeiro. Cada um foi, né? Se coisando e vindo outros. Mas aí começou tudo mais prático, mais fácil. Daí começou, aquele tempo servia no balcão, assim pesado, servia. Depois começou vir modernizar. Foi da onde que eu também coloquei; minha lojinha, minha mercearia era assim tudo nas prateleiras direitinho. O cliente entrava lá, pegava. Então já começou a melhorar muito. Já tinham os açougueiros, depois, bem pra frente já começou a vir carne embalada, né? Mas eu tenho ainda até hoje o balcão, que fatia bife, tudo.

P/1 – Então, dona Angelina, a senhora estava falando das modernizações, que a senhora começou a vender os produtos já ensacados, nas prateleiras; que os seus clientes podiam pegar. Mas que até hoje a senhora tem o açougue. Por que a senhora tem o açougue?

R – Por que o cliente é muito fiel à carne fatiada na hora. Ele pega, nós temos peças. Balcão muito grande, tudo na bandeja, fatiadinho na hora, também, mas ainda ele gosta da carne fatiada na hora. Então nós temos fregueses de vários tipos. Que quer de um jeito, quer de outro. Então a gente deixa a vontade do cliente. Ele escolhe o que ele quer.

P/1 – A senhora falou dessa permanência que a senhora coloca no seu comércio pra atender o cliente. Qual outra modernização a senhora imprimiu no seu estabelecimento?

R – Ah, teve muitas. A gente colocou código de barras. Fomos pioneiros ali no bairro. Inclusive a rede grande não tinha; nós implantamos. E depois a gente foi modificando muito. Balcões, reforma de loja. Carrinho, estacionamento, treinamento para os funcionários.

P/1 – Como é, fala um pouquinho desse treinamento dos funcionários.

R – É, treinamento. Nós temos o pessoal do RH. Tem a pessoa especializada em treinamento. Ou é ela mesmo ou vem de fora. Então nós temos a sala, acabou de entrar a gente já vê vale-transporte, vê uniforme. Já faz a entrevista. Primeiro ela entra, ela conhece toda a loja, né? Depois ela faz a triagem, tudo direitinho, depois ela vai para o treinamento, depois ela vai pra loja. Se é as outras lojas, chegando lá, vai a moça do RH; ela vai, apresenta pro gerente e ela e o gerente acompanham a loja toda, vê todo os setores, conhece toda a loja, os funcionários da loja. Então ela entra mais a vontade; não entra muito constrangida.

P/1 – Quais são as recomendações que são feitas durante o treinamento para os funcionários do Galassi?

R – Cada setor tem um. O açougue é fazer como o cliente quer. Se ele quer a carne mais fina, ele tem o direito de escolher; se ele quer que tire uma gordura da carne, então tira. Ele é o cliente, ele precisa ser atendido do jeito que ele quer. Então o açougue é isso. Não gostamos de fila. Os frios, tanto temos os frios pra fatiar na hora, como o frio fatiado. Como o açougue, também tem. Daí: “ai, essa mortadela é boa?” “Ah, se a senhora quiser experimentar”. Aí dá uma fatia, ela experimenta, né? A padaria é um detalhe assim, que eles tem que estar sempre atentos: a gente vai assando o pão; coloca ali direitinho, mas sempre vai acabando. Então, já vai chegando os clientes sem perceber, “Ai, dona, já tá saindo o pão quentinho, a senhora quer o pão?”. Aquele atendimento mais vip para as pessoas. A mercearia é diferente, a mercearia ele não tem muito contato com o povo. Mas, a mercearia é assim, você sabe que você entra na loja e às vezes acha dificuldade pra achar uma mercadoria, né? Então vai até o repositor e o repositor não pode falar, apontar o dedo, está lá. Ele tem que acompanhar o cliente, ir no setor e mostrar a mercadoria. E o hortifruti é outro treinamento: ele estar atento se a mercadoria está boa, se a mercadoria tá fresquinha. Ele perceber ali o cliente. Às vezes o cliente tem dificuldade pra escolher bem uma fruta, ele não sabe o nome, não vê direito o preço. Então, ele que está atento ali pra falar com o cliente. E o caixa você sabe, é onde o cliente acaba ficando mais, às vezes nervoso, agitado, ali. “Ah, vai ter que por no carrinho, vai ter que pagar, levar”. Fazer compra é complicado pra mulher de hoje em dia, que é muito corrido, né? Então ali sempre tem as meninas, tem os pacoteiros. Estão sempre ali, têm fiscais, tem a moça da boca de caixa que é a responsável. Todos estão sempre por ali, né? Auxiliando, atendendo. Então a gente tenta fazer assim. Não é tanto que às vezes eu falo que é tão perfeito. Que a gente lida com o ser humano; mas a gente tenta, a gente percebe. Nós temos um papel, um papelzinho assim que fica dentro de uma urna, pra eles falarem da família Galassi. Então eles escrevem que eles querem melhorias, que ele gostou, não gostou, queria outra mercadoria. Se foi bem atendido, ele diz. Uma vez por semana meu filho lê tudo e passa pro gerente, encarregado, comprador. Depende do que acontece.

P/1 – Como é que vocês organizam as mercadorias no mercado. Tem alguma intenção? Conta pra gente por favor. Como é que vocês pensam a organização das mercadorias?

R – Então, isso daí já é um trabalho. As compras já tudo certinho, cada mercadoria no seu lugar. Já vem certo. A mercadoria chega é só colocar certinho. Ás vezes se quiser uma mudança, assim: “Ah, vou fazer uma pia”, uma coisa diferente. Então tem a pessoa certa, que ela vai lá com o gerente; ela monta direitinho. Tem o comprador, o gerente de compras. “Ah, negociou uma mercadoria com preço melhor”. Então vai fazer a conta disso, daquilo, daquilo. Então as pessoas, a ação, que é o cara do marketing também, que ajuda a ver as faixas, os cartazes.

P/1 – As promoções funcionam efetivamente.

R – Ah, funcionam. Hoje em dia a promoção funciona muito bem.

P/1 – E vocês fazem liquidações também?

R – Liquidações, nós não temos muito; não somos magazine, forte, pra falar: “Ah, eu vou liquidar uma geladeira, uma roupa, isso aqui”. Nós somos um mercado muito de alimento. Então a gente faz os preços e vende. Ás vezes a gente põe, né? Tem um leite aqui: “Ah, tem pouco já vou queimar”, ou um arroz, assim. Nós trabalhamos muito assim, também.

P/1 – Essas promoções que a senhora diz que os senhores fazem, elas são promoções que tem um período. Nos dias da semana tem promoções de dias. Conta como é que vocês fazem.

R – Nós temos o jornalzinho direto na loja, nós soltamos um jornal na segunda, não no domingo à noite. Devo ter alguma falha nessa parte, mas ___. No domingo à noite que vai até terça-feira à noite, que é o cestão. Aí vai, sempre tem uma carne junto, ovos eu tenho, um leite, um pão; produtos de mercearia junto com hortifruti. Que o nosso hortifruti é muito bom; inclusive é um dos meus filhos que compram. É o meu terceiro filho; faz muitos anos que ele faz. Agora tem os caminhões, tem os funcionários, mas ele não deixa de ir junto. Ele vai porque ele escolhe a mercadoria à vontade. E então a gente tem essa promoção. Quando é quinta-feira sai outra promoção. Não, daí, quarta-feira termina, até quinta ou sexta tem a promoção da loja, os cartazes. E depois na quinta-feira, conforme, ou na quinta ou na sexta, a gente já faz a promoção. Que é carne, bebida, todas essas coisas; que é pra final de semana. Então daí o folheto é mais forte. E tem o folheto de fim de mês também, com as ____. Então a gente trabalha também bastante com promoção.

P/1 – Os seus clientes, da loja do Jardim São Vicente, ficou claro que a senhora tem uma fidelidade bastante alta; um nível de fidelidade bastante alto. E nas outras lojas? Como é que tem sido?

R – As outras lojas, como a gente ensinou e deu muito treinamento, eles fizeram toda a freguesia. Então já tem a freguesia lá, que a fiscal já conhece, a pacoteira. Ah, tem tudo um trabalho bonito, que você chega lá e fica admirada. Você sabe, a freguesa às vezes tem algum probleminha, mas nada de assim, né? Então, eles atendem muito bem, graças a Deus. Pelo menos eu não tenho reclamação.

P/1 – Nas formas de pagamento. A senhora disse que quando o seu estabelecimento começou a ficar um pouquinho melhor a senhora começou a trabalhar com caderneta. Como que foi isso? Conta pra gente.

R – Ah, foi que o bairro lá, a gente ficou conhecido. então era sacos, então a gente vendia na caderneta pra aqueles clientes. Vendia, recebia direitinho, muito gostoso, não tinha problema, não tinha nada, sabe? Só que depois foi evoluindo.

P/1 – Como que foi? Como a senhora saiu da caderneta?

R – Depois veio o convenio, veio o ticket, veio o cartão, vieram as firmas que faziam boletos. Daí, nossa, até hoje, tanto jeito de pagamento! À vista também, hoje eu vendo bem à vista. Então, hoje tem muitos cartões, convênios.

P/1 – E a senhora usa cheque predatado?

R – Eu pego também. Para 40 dias, já tá tudo certinho. O ano inteiro, os clientes já sabem.

P/1 – E como é a questão da inadimplência?

R – Ah, falar pra você que não tem, sempre tem. Nós trabalhamos diferente com o cliente. Porque, você pode pegar o cheque, mandar pro banco, porque é calçado o cheque, nós não ficamos com nada, tudo vai direto pro banco. Então fica lá. Então, primeiro a gente trabalhava assim, o banco colocava o cheque e reapresentava o cheque. Então, quando a gente ligava pro cliente, o cliente falava: “Poxa, já reapresentou, atrapalhou minha conta”, e tal. Então começou a ficar uma coisa meio. Aí conversamos pra lá, conversamos com o pessoal do banco, e tal. Então agora faz assim: nós temos uma menina, que cuida disso. O cheque vai pro banco, fica lá. No dia ele é apresentado, no fim do mês, depende das datas. Só que se voltar um cheque o banco não reapresenta mais, a gente não autoriza. E nessa volta do cheque vem direto pro nosso comércio. E lá tem uma menina que lida com os clientes. Muito educadamente, fala que deu problema com o cheque, que ele voltou. Qual o dia que a gente poderia colocar o cheque? Alguns falam assim, tal dia você pode depositar; alguns falam: “Ah, não dá pra eu te pagar aí?”. Muito pouco, a gente aceitamos lá, sem problemas.

P/1 – A senhora falou que faz promoções através de um jornalzinho. A senhora faz publicidade do supermercado de outra forma. A senhora fez, no início?

R - Já fiz muito, fiz televisão, fiz jornal, fiz rádios. Então geralmente, deverá estar mais com o jornalzinho. Televisão parece que não tem visto.

P/1 – E a senhora acreditou na época que foi positiva a publicidade?

R – A publicidade sempre é boa. Depende da sua estrutura, pra pagar uma televisão, pra pagar outra coisa.

P/1 – Em relação aos outros mercados, por exemplo. A senhora disse que teve que enfrentar um grande supermercado, uma grande rede de supermercado. A senhora naquela época usou alguma estratégia de publicidade?

R – É, sempre a gente fez alguma coisa, diferente e tal. E às vezes a gente para. Naquele tempo não se estruturava muito em televisão. Depois pra frente a gente colocou várias vezes. Conforme ia dando certo, né?

P/1 - Até hoje a senhora fica a frente das suas lojas?

R – Olha, a frente, não. Mas eu visito as lojas diariamente, né? E assim, falar que eu fico muitas horas aqui, não. Porque nós temos uma equipe muito boa, que são os gerentes, minha família. Mas eu visito as lojas sim, até porque se eu não for os funcionários começam a reclamar: “Ah, dona Angelina, a senhora sumiu, a senhora faz falta”. Porque eu sou muito amiga deles mesmo. Até às vezes eu brinco: “Oh, cuida disso daí, heim! Que a mãe aqui não fica muito brava. Cuidado com o pessoal”. “Ah, dona, pode deixar, já vou arrumar, já vou guardar”. Sabe essas coisas de limpeza? Que eu sou muito, pego no pé, assim. Mas nada de eu; eu não posso mais ficar muito no turno. Eu tenho minha vida agora, tenho que cuidar da minha saúde. Tenho neto, tenho bisneto.

P/1 – Fala um pouco dessa tua família. Os seus filhos se casaram?

R – Casaram. Só tem um solteiro. Eu tenho um filho, tenho uma neta. Minha neta acabou tendo quatro nenês, porque teve dois gêmeos, né? Duas meninas gêmeas. Então eu sou avó de quatro netos, e agora, tem um do mais velho, um meninão grandão, também muito bom. E agora tem um pequenininho, do caçula, é um amor de menininho. Esse que eu to curtindo mais agora.

P/1 – E todos eles trabalham, menos aquele que tem um estabelecimento dele mesmo?

R – Ah, todos trabalham. As mulheres também, minhas noras trabalham. Elas trabalham em outras áreas. São professoras, outra trabalha numa multinacional. Outra cuida da casa, dos pagamentos do marido, que ela quer pra fora, né? Então todas trabalham, me dou muito bem, não me dão trabalho. Fico muito feliz com isso tudo, não tenho problemas, né?

P/1 – A senhora poderia dizer quais foram os seus segredos pra se manter no comércio com esse sucesso?

R – Segredo? [risos]. Acho que é o trabalho, né, a dedicação, o amor. Ter essa família muito assim, gostando do comércio. Muito trabalhadeira, não tem vício em nada. Acho que foi. Porque você precisa ter paz pra trabalhar. Se você não tiver paz, amor no coração, ter fé em Deus, acho que nada vai pra frente. É complicado. Tem que pensar nisso, né?

P/1 – Quais são as suas perspectivas pro futuro?

R – Então, agora tá na minha família. Mas cada vez a gente pensa de melhorar, sempre mais pro cliente. Talvez aumentar uma loja. E ir tocando, né? Fazendo o melhor que pode. Ir reformando, arrumando, fazendo o melhor pros funcionários. Já tão com alimentação, já estão com convênio médico. Duas lojas, agora falta a outra de alimentação. Alimentação que eu falo é tipo comida. Que eles tomam café, pão leite manteiga de manhã, a tarde tem tudo. Mas agora a gente já tá vendo mais outra parte.

P/1 – Como é essa alimentação?

R – É, nós fazemos a comida e eles comem, mesmo no lugar. Estamos comçando agora. Mas, assim, pensar um pouco no funcionário também. Porque o funcionário, se não for ele, como que a gente toca, né? Então, isso aí, nós valorizamos muito, damos muita atenção. E hoje, essa semana eu tava falando: graças a Deus, né? Como nossos funcionários antigos estão melhorando de vida. Porque há um tempo, quando eu comecei, se um pintava um quarto vinha falar pra mim. Eu lembro até hoje! Agora não dá mais pra entrar na vida deles mais. Mas sempre a gente sabe: Ah, fulano comprou um carro; o outro tá construindo uma casa; o outro tá com os filhos pra fora estudando. Então a gente fica muito feliz.

P/1 – Dona Angelina, como a senhora vê o comercio de Campinas hoje, comprando com o comércio de Campinas de 40 anos atrás.

R – Nossa, hoje tá muito ótimo, muito bom, Campinas tá ficando maravilhosa. Só que tem muito concorrente. Você vê tá abrindo mercado. A gente tem que continuar, porque se você for correr, sair daqui pra ir lá, você vai ficar a vida toda, né? Porque todo lugar tá abrindo comércio, abrindo mercado, abrindo lojas. Então não tem por onde ficar indo.

P/1 – Mas a senhora sabe que a senhora já competiu com um mercado e a senhora. E o outro mercado que se estabeleceu continuou lá?

R – Aonde?

P/1 – Onde a senhora tinha sua primeira loja.

R – Ali, ah, não. Eles fecharam também. Logo eles saíram de lá. Eles venderam, os sócios venderam e pararam com o comércio.

P/1 – E o da senhora permaneceu.

R – É, tá lá. Agora a gente reformou toda a loja. Tá bonita a loja. Graças a Deus conseguimos dar outra cara na loja, né?

P/1 – Dona Angelina, que lições a senhora acha, de vida, que a senhora tem, do comércio?

R – Olha, a lição pra mim foi muito boa. Eu gosto, sou apaixonada, se pudesse começar de novo começaria. Mas foi uma lição muito boa, porque eu criei uma família maravilhosa, que não dá trabalho, estão todos lá trabalhando. Não querem mais que eu trabalhe. Então foi uma lição muito boa. Foi duro criar eles aonde eu criei, num ___, você sabe, sem estrutura pra nada. Mas meu marido era muito bravo, ficava em cima, não deixava criança saber. Tinha que estudar, tinha que trabalhar. Então foi uma lição muito boa.

P/1 – O que a senhora pensa de ter dado essa entrevista pra memória do comércio de Campinas?

R – ah, eu acho maravilhoso, né? Se vocês me chamaram. Eu sempre fui uma mulher de trabalhar muito, eu não dou entrevista, eu não falo com os funcionários em público, nada. Só falo muito com eles. Eu tava assim, meio ansiosa, então meus filhos. Mãe, imagine, vai sim, gostoso, você vai conversar lá. Eu digo, não eu vou sim.

P/1 – A senhora contou uma história de vida muito bonita.

R – Muito obrigada pela sua participação.