Projeto: Vidas em Costura - Moda, Legado e Empreendedorismo
Entrevista de Geraldo Lima
Entrevistado por Grazielle Pellicel
São Paulo, 18 de julho de 2023
Código da entrevista: VDC_HV003
Transcrita por Selma Paiva
Revisada por Grazielle Pellicel
(00:36) P1 - Para começar, Geraldo, primeiramente muito obrigada por aceitar o convite. E nós começamos pelo básico, que é perguntando o seu nome completo, data e local de nascimento, por favor.
R1 - Tá. Eu queria primeiro agradecer também, pelo convite, fiquei muito feliz. Eu sou Geraldo Coelho Lima Júnior, de Belo Horizonte, nascido no dia 5 de janeiro de 1958.
(01:02) P1 - Seus familiares te contaram como foi o dia do seu nascimento?
R1 - Para dizer a verdade, eu tenho pouca informação a respeito disso, mas eu sou um filho, como a gente chama lá, temporão (filho que nasce muitos anos depois do irmão que o antecede). A minha irmã mais nova é dez anos mais velha que eu. Minha mãe, inclusive, quando ficou grávida, não imaginava que ela fosse ainda ter um filho, porque ela já estava com 44 anos de idade, isso há 66 anos atrás é muita coisa, faz muita diferença e uma coisa que eu sei é que eu sou o único filho, dentre todos os meus irmãos, que nasceu em hospital. O resto, todos os anteriores nasceram em casa. E o hospital era, na realidade, do outro lado da rua, então ela simplesmente atravessou, na hora do parto e foi para o hospital, para que eu nascesse.
(02:00) P1 - O hospital era uma novidade, então, quando você nasceu?
R1 - Não. O hospital não era a novidade, a novidade era ela ter um filho em hospital, porque naquele momento ela já estava com 45 anos, então era até por uma questão mesmo de... como dizer?... segurança para ela. Foi mais indicado que eu nascesse em hospital, diferente de todas as minhas irmãs e do meu irmão.
(02:31) P1 - Você sabe como foi o seu parto? O seu parto não, a gestação, se foi tranquila ou não.
R1: Eu não tenho muita...
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Entrevista de Geraldo Lima
Entrevistado por Grazielle Pellicel
São Paulo, 18 de julho de 2023
Código da entrevista: VDC_HV003
Transcrita por Selma Paiva
Revisada por Grazielle Pellicel
(00:36) P1 - Para começar, Geraldo, primeiramente muito obrigada por aceitar o convite. E nós começamos pelo básico, que é perguntando o seu nome completo, data e local de nascimento, por favor.
R1 - Tá. Eu queria primeiro agradecer também, pelo convite, fiquei muito feliz. Eu sou Geraldo Coelho Lima Júnior, de Belo Horizonte, nascido no dia 5 de janeiro de 1958.
(01:02) P1 - Seus familiares te contaram como foi o dia do seu nascimento?
R1 - Para dizer a verdade, eu tenho pouca informação a respeito disso, mas eu sou um filho, como a gente chama lá, temporão (filho que nasce muitos anos depois do irmão que o antecede). A minha irmã mais nova é dez anos mais velha que eu. Minha mãe, inclusive, quando ficou grávida, não imaginava que ela fosse ainda ter um filho, porque ela já estava com 44 anos de idade, isso há 66 anos atrás é muita coisa, faz muita diferença e uma coisa que eu sei é que eu sou o único filho, dentre todos os meus irmãos, que nasceu em hospital. O resto, todos os anteriores nasceram em casa. E o hospital era, na realidade, do outro lado da rua, então ela simplesmente atravessou, na hora do parto e foi para o hospital, para que eu nascesse.
(02:00) P1 - O hospital era uma novidade, então, quando você nasceu?
R1 - Não. O hospital não era a novidade, a novidade era ela ter um filho em hospital, porque naquele momento ela já estava com 45 anos, então era até por uma questão mesmo de... como dizer?... segurança para ela. Foi mais indicado que eu nascesse em hospital, diferente de todas as minhas irmãs e do meu irmão.
(02:31) P1 - Você sabe como foi o seu parto? O seu parto não, a gestação, se foi tranquila ou não.
R1: Eu não tenho muita notícia disso, mas eu acredito que sim.
(02:43) P1 - E você sabe por que colocaram o nome de Geraldo?
R1 - Geraldo é o nome do meu pai também, então por isso o Junior, no final. Então eu peguei o nome do meu pai e aí acrescentou-se o Junior. Então era o último filho, com certeza, imagino eu. Quer dizer, imaginavam que seria o último filho e suponho também que era meio que uma homenagem, talvez.
(03:14) P1 - E você sabe qual é a origem da sua família, tanto do seu pai, quanto da sua mãe?
R1 - Tanto o meu pai, quanto a minha mãe são mineiros. Ele nascido em uma cidade chamada Mar de Espanha - que fica em Minas Gerais, apesar de chamar Mar de Espanha - e ela nascida em Belo Horizonte mesmo.
(03:34) P1 - Você sabe como eles se conheceram?
R1 - Não sei te dizer. Não tenho essa informação.
(03:42) P1 - E o que eles faziam?
R1 - Mamãe era dona de casa. Naquela época, a mulher normalmente ficava em casa cuidando dos filhos. Afinal de contas, quando eu nasci, nós éramos sete. Só a minha irmã mais velha que já tinha se casado. Na realidade, ela já tinha um filho, então eu já nasci tio. E meu pai tem... como formação, era dentista, mas como opção profissional ele era um gráfico. Então, na família, a gente tinha uma gráfica, lá em Belo Horizonte, que foi fundada por ele. Ele trabalhou em gráficas, antes de abrir a própria gráfica e isso seguiu como uma tradição durante muito tempo na minha família, mesmo depois que ele faleceu.
(04:36) P1 - E a gráfica era muito diferente do que é hoje em dia uma gráfica?
R1 - Ah, era, a gente tinha uma tipografia. Então, era um esquema completamente diferente: então você tinha os tipógrafos, que montavam frase por frase, palavra por palavra, ia montando aquilo, para poder fazer a impressão dos documentos que eles imprimiam lá.
(05:01) P1 - Você chegou a trabalhar lá também?
R1 - Na gráfica, propriamente, não. Quando eu era jovem, além da gráfica, a gente teve também uma papelaria, então eu cheguei a trabalhar na parte de papelaria, mas não na gráfica, mas eu vi, era tudo no mesmo espaço, porque o meu pai construiu um prédio que tinha, no térreo, inicialmente só a gráfica e depois foi dividido entre a gráfica e a papelaria e a gente morava nos andares de cima. Então, eu convivi a minha infância, minha juventude diretamente com a gráfica e com a papelaria.
(05:41) P1 - Você sabe o que o levou a construir um prédio?
R1 - Não, mas eu imagino que fosse um desejo de ter a família toda reunida, porque ele construiu um prédio com sete apartamentos, então imagino eu que a ideia era essa. Então tinha um apartamento que era dele, da mamãe e dos filhos que ainda estavam solteiros e outros apartamentos, tanto que praticamente todos os meus irmãos e eu também, claro, mas todos os meus irmãos moraram com as suas famílias nesse prédio.
(06:17) P1 - E eles costumavam te contar histórias?
R1 - Da minha família?
(06:24) P1 - É, pode ser da sua família ou gostavam de ser contadores de história.
R1 - Bom, a minha família sempre foi muito de conversa. Afinal de contas, um lado da minha família tem uma descendência italiana, então o povo gosta de falar bastante. Festas, lá em casa, eram sempre muito agitadas, muita gente, família muito grande e sempre tinha muito história sobre várias coisas, tanto a família do meu pai, quanto a família da minha mãe eram grandes também, tipo, oito, nove irmãos em cada lado, então eram, vamos dizer, reuniões muito agradáveis, muito gostosas e com muita coisa, muita cantoria, muita piada, o povo adorava contar piada.
(07:21) P1 - Tem alguma lembrança de algum momento desse [que é] especial para você?
R1 - Eu tenho lembrança de vários momentos, na realidade. Inclusive, por exemplo, final de ano normalmente fazia-se comemorações que reunia grande parte da família na gráfica, porque a gente morava em cima, então toda a produção da festa era feita nos andares superiores e a festa acontecia normalmente lá dentro da gráfica, que se juntavam várias daqueles mesas, tinham umas mesas muito compridas, em que todo material que ia ser impresso e encadernado era separado, então precisava de umas mesas compridas, pra poder fazer isso. Tem um nome que agora eu não estou lembrando exatamente como é o nome que a gente dava para aquilo e aí limpava-se isso tudo e fazia um grande mesão, porque era um espaço muito grande, uma área muito grande, no térreo, e fazia um grande mesão, com uma comedoria louca. Isso quando... porque teve uma época que, no fundo do terreno, existia também o que a gente chamava de cantina, então era um refeitório, vamos dizer assim, mas que depois, por questões diversas, ele acabou sendo desativado. Aí, todas as festas eram trazidas também para dentro da gráfica, então misturava um pouco a família com os funcionários. Então, era uma coisa grande, com muita música, dança, sempre muito agradável.
(09:02) P1 - E as comidas, quando você era pequeno, tem alguma comida que te remete àquele tempo?
R1 - Me remete a vida inteira. Por exemplo, toda quinta-feira era dia de macarrão com bife à milanesa e, se eu posso, ainda hoje eu gosto do macarrão com bife à milanesa, na quinta-feira. Eu não sei por que a quinta-feira, não me pergunta, isso era uma tradição familiar. Isso, se eu vou na casa de alguma irmã, então, pode ser que, se eu vou almoçar na casa de alguma delas em uma quinta-feira, elas venham a fazer macarrão com bife à milanesa.
(09:39) P1 - E, além disso, você falou que era os funcionários e a sua família. Sua família, que você diz, é você e seus irmãos?
R1 - Eu, meus irmãos e sobrinhos, porque a minha família é muito grande, sempre foi muito grande, tanto por parte de papai, quanto de mamãe, eles tinham muitos irmãos e casados e com filhos, então uma reunião só desse pequeno núcleo familiar era uma coisa de sessenta, setenta pessoas. Então, era muita gente. Se reunia todo mundo e misturava ainda com o pessoal da gráfica.
(10:22) P1 - E tinha algum parente que você gostasse muito?
R1 - Vários parentes que eu gostava muito, tanto do lado da mamãe, quanto do lado do papai, vários. Outro dia mesmo eu estava lembrando, com uma das minhas irmãs, de uma tia minha chamada Glorinha, que era tia do meu pai, então era uma tia-avó minha e eu adorava conversar com a tia Glorinha. Eu não lembro das conversas que a gente tinha, mas eu adorava conversar com ela. Como também eu tinha uma tia por parte de mãe, que a família inteira chama de Dindinha, na realidade ela se chamava Teresina, mas a família inteira chamava essa minha tia de Dindinha, que era uma bordadeira, inclusive, e era uma pessoa muito próxima. A gente sempre tinha muita ligação. As famílias, principalmente do lado da mamãe, eram sempre muito próximas, muito chegadas, mais até do que do lado do meu pai.
(11:41) P1 - E como é que era o apartamento que você cresceu, no prédio?
R1 - Era muito gostoso, porque assim: esse prédio foi construído, ele tinha, vamos dizer, uma área comum aberta muito grande, então tinham quatro apartamentos em um andar e três apartamentos no andar superior. Esses quatro apartamentos todos eles davam para essa área. O apartamento que eu morei quando criança, quando jovem e já adulto era o apartamento que ficava no fundo do prédio, era o maior apartamento, exatamente porque foi o apartamento que recebeu mais filhos simultaneamente, os outros apartamentos eram apartamentos de dois quartos, esse já era um apartamento de três quartos, com um quarto lá fora, que era o quarto de costura da minha mãe, com uma área no fundo, que também era muito grande e ali era meio que uma copa misturado com lavanderia, era uma coisa meio misturada, assim, as coisas se misturavam, porque uma coisa ficava meio do lado da outra, mas emendadas e sempre dando para essa área externa, que era uma área que a gente convivia muito, era uma área que a gente tinha muita convivência. Então, por exemplo, das minhas irmãs e meu irmão, os filhos deles, eu sou da geração dos filhos mais velhos deles, para você entender um pouquinho melhor. Então, eu tenho, como eu falei: o meu sobrinho mais velho é dez meses mais velho que eu. Logo depois, a sobrinha que vem logo depois é dois anos mais nova que eu, então a gente convivia todo mundo. Então, eu tive uma infância de muita brincadeira e muita briga também com os meus sobrinhos, principalmente esses da geração mais velha, das minhas irmãs e do meu irmão mais velho.
(13:57) P1 - E o que vocês costumavam fazer, naquela área aberta? Vocês brincavam do quê?
R1 - Nossa! Uma das coisas que a gente mais gostava (risos) era, no verão, porque era tudo azulejado, então era azulejo de fora a fora e a gente jogava a água e não tinha piscina no prédio, então no calor, em Belo Horizonte, a gente tinha uma brincadeira, que era sair correndo e deslizando naquela área, aquilo era uma delícia, pra lá e pra cá, uma farra. Isso era uma brincadeira. Fazíamos muita festa junina, enfeitava toda essa área externa com bandeirinhas e fazia festa junina. Fazíamos comemoração de aniversários ali fora e até mesmo no Natal, eu lembro do Natal ainda pequeno, mas eu tenho um pouco essa lembrança: minha mãe sempre foi muito ativa na igreja, ela era católica e no final do ano sempre tinham algumas comunidades perto lá de casa e sempre havia uma distribuição de presentes, essas coisas e eu vestido de Papai Noel, dando os presentes, mas eu uma criança, cinco anos, seis anos, uma coisa assim; e tinha uma escadaria muito grande até chegar nesse andar onde a gente morava, acima da gráfica, de 34 degraus, eu lembro de eu contar degrau por degrau, enquanto eu subia, e aí o povo ia fazendo fila, subindo isso, ia até lá em cima, que é onde acontecia essa distribuição de presentes e depois descia, para ir embora. Então tinha muita festa, muita coisa. Quando a gente mudou para lá, quando o meu pai construiu esse prédio era um bairro completamente deserto e não tinha… a gente tinha uma casa vizinha e mais nada, o resto era mato, porque inicialmente esse bairro que a gente morou em Belo Horizonte, chamado Gutierrez, pertencia a uma família, que depois foi vendendo, loteou e foi vendendo; e meu pai foi um dos primeiros que comprou um lote, onde ele veio a fazer essa construção. Então, eu tive uma infância também de brincar na beirada de rio, eu tinha um rio a cem metros da porta lá de casa, então brincava no rio, brincava de mamona, jogar mamona, sabe, nos outros, porque aos poucos outros prédios foram sendo construídos ali do lado, mas durante muito tempo a gente ainda teve uma rua de terra, depois que veio um calçamento de pedra e mais na frente o asfalto, até o rio ser canalizado e coberto e virar uma avenida.
(17:15) P1 - E aí no rio vocês mergulhavam, brincavam na borda?
R1 - Não, não dava para mergulhar, porque era um rio mais rasinho, mas chegava na beirada do rio, brincava ali, na beirada, aquela coisa de jogar água um no outro, isso sim, e muita lama.
(17:32) P1 - E sua família, vocês tinham costume de se reunir pra ouvir rádio, assistir TV?
R1 - Ouvir rádio, eu não tenho muito essa lembrança, não, de reunir para ouvir rádio. E TV [era] mais à noite, na hora de novela ou algum programa à noite, uma coisa nesse sentido, mas nem tanto de se reunir, ficava... na realidade, enquanto as minhas irmãs estavam solteiras, a gente ficava ali, na sala, assistindo televisão, uma televisão imensa, gigantesca, de tubo, mas não tinha tanto esse hábito de reunião pra assistir TV, não. Era uma coisa corriqueira.
(18:28) P1 - Quando você era criança, você tinha aquele sonho, pode ser até mesmo lúdico, de: “Quando eu crescer eu vou ser isso”, mesmo que seja de super-herói? (risos)
R1 - Eu não tenho lembrança do que eu pensava que eu queria ser quando eu era criança. Sinceramente, eu não pensava. Eu sabia que eu tinha uma ‘pegada’ mais para o lado artístico, vamos dizer assim, até porque, quando eu era criança eu fui cantor de televisão. Existia um programa, em Belo Horizonte, chamado Roda Gigante, que passava em uma emissora que era afiliada da Rede Tupi, chamada TV Itacolomi, então todo domingo tinha o programa Roda Gigante. Então, às quintas-feiras à noite minha mãe levava para um lugar que, naquela época, se chamava Palácio do Rádio, para poder ensaiar a música que eu ia cantar no domingo, então toda quinta-feira tinha isso e eu fazia parte, vamos dizer assim, do casting principal do programa, então era raro o domingo que eu não estava cantando. Então, eu sempre tive um pouco essa questão da arte que, depois, da música evoluiu para o teatro e depois do teatro, simultaneamente à dança e o design. Então, foi uma coisa meio que acontecendo simultaneamente. Então, se você me pergunta o que seria, eu não sei especificar, eu imagino que eu pensava que eu queria ser alguma coisa dentro do ambiente de artes, alguém dentro do ambiente de artes, profissional nessa área.
(20:23) P1 - E como você foi parar na TV, cantando?
R1 - Esse programa tinha um concurso, que também era feito na televisão, transmitido, essa coisa toda e eu cismei que eu queria participar e daí, então, a minha família, eu não sei se foi minha mãe, minha irmã, não lembro quem foi, fez a minha inscrição para participar desse concurso e os candidatos, as crianças que eram classificadas, faziam automaticamente a transição desse programa de calouro mirim, vamos dizer assim, para o, entre aspas, cantor do programa principal, que era o Roda Gigante. Então, foi um desejo meu, de entrar nessa área, quando era criança.
(21:23) P1 - E como é que você se sentiu ao aparecer na TV? Se sentiu famoso?
R1 - Não sei te responder. É engraçado isso! Era uma coisa comum, era quase como uma brincadeira, porque inclusive eu lembro que era até, na hora que a gente entrava no palco, tudo muito sério, então: “Fulano vai cantar, beltrano vai cantar”, mas lá atrás, nos camarins, a gente brincava muito. A "gente" que eu falo: eu, as meninas e os meninos que cantavam. A gente brincava muito ali, tinha uns corredores imensos, porque era muito grande esse edifício onde ficava o Palácio do Rádio e o teatro, em si, ficava, logo que você entrava, mas lá para trás tinham vários estúdios de TV, de rádio e vários camarins, então a gente brincava muito por ali, fazia um pouco de farra e na hora que entrava era meio que aquilo, era meio que “tô brincando” também, não tinha muito essa coisa que a gente tem hoje, de repente... como é que eu vou te explicar? Essa coisa que está muito ligada à rede social, aparecer. A gente não tinha isso. Então, não tinha muito essa preocupação em se destacar ali, era um prazer, era uma coisa que a gente ia para se divertir, mesmo.
(23:14) P1 - E como é que foi pisar pela primeira vez na escola? Você lembra?
R1 - Nervoso. Eu lembro que isso foi ainda no Jardim, em um grupo escolar; eu lembro do meu uniforme listradinho de azul e branco, com a camisa branca e um bordado vermelho no peito, era tipo uma jardineira que a gente tinha. Eu tenho lembrança de, no começo, ser uma coisa meio nervosa, meio incômodo, mas eu não vou saber te trazer detalhes. Mas eu lembro também que tinha algumas coisas que eu adorava. Adorava quando a gente tinha alguma experiências, tipo: “Vamos toda a classe para aprender a fazer salada de fruta” e aí entrava para a cozinha da escola, do grupo, e todo mundo ia fazer tudo junto, para depois comer. Então, tinha umas coisas que eu achava gostosas. E desenhar também era uma coisa que me dava muita satisfação, mas eu lembro que o começo foi uma coisa meio traumática, vamos dizer assim.
(24:34) P1 - Por causa do nervosismo?
R1 - É.
(24:39) P1 - Você falou que eram só duas casas e o resto era mato. A escola era perto?
R1 - A escola não era longe, mas também a escola ficava no meio de um terreno baldio. Tudo era... esse lado de Belo Horizonte... como é que eu vou te explicar? Essa região de Belo Horizonte não era ainda uma região tão habitada, então para poder ir para o colégio eu lembro que eu ia de ônibus, eu não lembro quem me levava, mas eu lembro que era um certa caminhada. Hoje em dia, eu não acho tão longe, mas naquela época que se é criança, você tem a sensação de que é mais longe do que realmente é, mas eu lembro que perto da escola tinha vários lotes vazios. Hoje é uma região completamente povoada, cheia de prédios e tudo mais, em Belo Horizonte. A escola ainda existe, o grupo ainda existe, é Grupo Escolar Pandiá Calógeras, existe até hoje, mas lá eu só fiz o Jardim. Depois, quando eu entrei mesmo para o que a gente chamava de primário, que é a primeira parte do ensino fundamental, aí eu já fui para um outro colégio, já era um outro colégio.
(26:18) P1 - E como é que foi esse período?
R1 - Pro outro colégio?
(26:23) P1 - É. Como é que foi a escola? Você gostou?
R1: Gostei. Era uma escola bem curiosa, porque assim: lá tinha tanto o ensino, na época a gente chamava de ensino primário, ginasial e científico e à parte do que era... esse colégio ocupava uma quadra inteira, praticamente, em Belo Horizonte, em uma avenida muito importante, chamada Avenida do Contorno. Então, o colégio ocupava praticamente a quadra inteira, quase até a metade... não, um pouco mais de um terço do terreno do colégio era o primário, aí eu lembro direitinho que tinha uma rampa, que era o acesso para o ginásio e o científico. Então, uma coisa que a gente sempre conversava, que estava no primário, em chegar do outro lado da rampa, que era onde você já estava em um grau superior de educação, de ensino e tal e era gostoso, acredito eu que era gostoso. Eu era um bom aluno, tirando boas notas, as lembranças estão meio vagas, mas pelo que eu me recordo era legal.
(28:10) P1 - E mudou muita coisa, depois que você atravessou a rampa?
R1 - Nossa, mudou demais. Primeiro que o primário era aquilo: a cada ano eu tinha aula com uma professora, quando a gente já passava para o ginásio, a gente passava a ter cada disciplina com um professor, então só isso aí já foi uma diferença muito grande e num período, vamos dizer, de transição de uma fase da vida para outra, muito rápido, então você está… eu entrei para o primário sete, oito, nove, dez, com onze anos eu estava no ginásio. Então o ginásio você saía daquela coisa infantil de a professora - a ‘tia’, que o povo fala hoje – única, que cuidava da turma inteira, para uma série de professores que ia cuidar cada um da sua disciplina, voltado para a turma inteira e o ginásio era muito maior. Como é que eu vou te explicar? Assim: no primário eram poucas turmas de cada ano, já quando a gente ia para o ginásio eram muitas turmas de cada ano, então tinha turma A, B, C, D, por exemplo. Para cada ano era, sei lá, eu não sei aí proporção, mas um contingente muito maior de alunos e uma passagem. Então, assim, é pré-adolescência, mudando completamente o esquema de vida, mas ainda criança. E aí a gente já convivia, no ginásio, com o pessoal que, naquela época, estava fazendo o científico, que seria o ensino médio de hoje. Então, a gente chegava com onze anos, mas já convivia com os meninos e as meninas que estavam com quinze, dezesseis, dezessete anos. Então, eram as crianças ainda, que iam amadurecendo. Então é uma experiência, eu nunca pensei a respeito disso, mas interessante: como é que você vai fazendo essa transição de vida, como é que você vai se encaminhando para aquilo que você mais quer. Agora, era uma escola muito rígida com os alunos, em especial quando a gente entrava no científico, porque daqui a pouco ia ter que fazer um vestibular e era uma escola que, para mim, para o que eu queria, voltando um pouco na pergunta que você fez agora há pouco, para aquilo que eu de fato estava querendo, que era ir para um lado mais artístico, ela não me dava muito retorno, vamos dizer assim, porque era uma escola tradicional em abrir espaço para os alunos nas faculdades de Engenharia, de Medicina, de Direito e não de Arte, que eram os cursos mais tradicionais, até porque naquela época não existia tanta divisão entre cada uma das áreas. Por exemplo, eu falei com você: eu sou formado em Design. Era o que Design? Não tinha Design de Moda, Design Gráfico, Design Digital, era Design; era o Desenho Industrial, na realidade. Então, pra isso também. Então você tinha Engenharia, Direito, Medicina e depois, lá pelas tantas que o povo ia determinando o que ia querer fazer.
(32:33) P1 - E você chegou a fazer o científico também?
R1: Fiz. Fiz o científico, não completei o científico nessa escola, nesse colégio, que era o Colégio Loyola, fui completar o científico em uma outra escola. Eu fiz o terceiro ano científico em uma outra escola, que tinha uma ‘pegada’, vamos dizer, mais suave, não era tão rígida, e eu saí [da anterior] porque eu fui reprovado. (risos)
(33:07) P1 - Por quê? Você lembra?
R1 - Lembro, claro. Porque todas essas disciplinas mais exatas, vamos dizer assim, não eram a ‘minha praia’, então eu ia muito bem naquilo que hoje a gente ainda chama de Humanas, então, Português, História, língua estrangeira, Geografia, tudo isso eu ia muito bem, mas entrava na Química, na Física, na Matemática já era uma coisa meio estranha e eu tinha uma certa… eu não sei se era dificuldade ou se era desinteresse, que não é que eu não sabia, mas eu não me dava muito bem e aí acabei sendo convidado a me retirar do colégio, porque um aluno que tinha sido reprovado (risos) não podia continuar ali, entendeu?
(34:07) P1 - E você não teve outra opção, por exemplo, de fazer o clássico?
R1: Não. Era aquilo, era o científico. Eu nem sei se tinha clássico, acho que clássico é uma coisa que deve ter vindo talvez um pouco depois. Não tenho certeza. Olha, agora você me deixou em dúvida.
(34:34) P1 - E nesse período que você não gostava do científico, não era ‘sua praia’, você encontrou alguma alternativa para conseguir fazer arte, de alguma forma?
R1 - Com certeza, porque aí tinha algumas ‘válvulas de escape’, porque o próprio colégio, apesar de tudo, oferecia a tal chamada Semana da Cultura e na Semana da Cultura eu fazia teatro, ia cantar, fazia exposição. Então, eu tinha uma ‘válvula de escape’ no meio dessa história, para continuar seguindo, mas aquilo não me mantinha. Eu era até reconhecido pelo que eu fazia, mas aquilo não me mantinha na escola, no colégio, porque não era o interesse principal do colégio esse tipo de coisa, esse encaminhamento para uma área mais artística, mesmo.
(35:41) P1 - E fora da escola, você conseguiu fazer alguma coisa?
R1 - Quando eu ainda estava no colégio?
(35:49) P1 - É.
R1 - Não.
(35:54) P1 - Só depois?
R1 - Só quando eu entrei na faculdade.
(35:59) P1 - E esse período assim, do final da escola, quando você terminou a escola e a faculdade, você já foi direto?
R1 - Saí do colégio e fui para a faculdade. Eu fiz dois vestibulares, eu fiz um vestibular para Comunicação Social, que era uma coisa que eu achava que ia me dar bem também, ia entrar no meio, pra área de jornalismo, um pouco para esse lado. Eu já tinha feito estágio em agência de publicidade. Tinha, [na] época de colégio. Eu fiz estágio em agência de publicidade, por quê? Porque a gente tinha, naquele período, cursos profissionalizantes e eu fiz o curso profissionalizante de Publicidade e eu acabei indo estagiar em uma agência, ainda quando eu estava no científico. Então, quando eu fui fazer o vestibular, eu meio que estava nessa ‘pegada’: ou eu ia para Comunicação e aí talvez eu enveredasse para a área de Publicidade, ou eu ia para um outro curso, que ainda era muito novo, que era o curso de Desenho Industrial. Eu fiz os dois vestibulares, passei nos dois vestibulares e optei pelo Desenho Industrial. Foi direto, uma sequência: eu saí do científico e entrei na faculdade.
(37:22) P1 - E por que você escolheu Desenho Industrial?
R1 - Eu achei que fosse ser mais interessante, agora não me pergunta porquê. Eu lembro que, na época, eu fiquei um pouco na dúvida, um ou outro, um ou outro, um ou outro e acabei optando pelo Desenho Industrial. Eu tenho impressão que até por conta dos valores da mensalidade. Eu acho que isso aí deve ter influenciado, porque o Desenho Industrial era uma faculdade, hoje é uma universidade, mas na época era uma faculdade estadual, então as mensalidades eram mais baixas e Comunicação Social era na PUC de Minas, que eram mensalidades mais altas. Tenho impressão, vaga lembrança que isso aí influenciou um pouco na minha opção.
(38:18) P1 - E o que você esperava de Desenho Industrial?
R1 - Eu não tinha a menor ideia, porque, como era uma coisa muito nova, eu sabia que tinha alguma coisa ligada com a área de desenho, com a área de criatividade e que não era Belas Artes, porque também tinha faculdade de Belas Artes na UFMG, mas eu sabia que a minha ‘pegada’ não era fazer Belas Artes, eu sabia que era uma coisa que a criatividade ia estar envolvida, mas para um outro lado. A gente não tinha tanta noção assim, eu fui entendendo dentro da própria faculdade o que era Design, que, na época, a gente nem falava essa palavra. Era: “Você faz o quê? Que curso você faz?”, “Eu faço Desenho Industrial”, não “Faço Design”. A palavra design veio muito tempo depois. Então, dentro da própria faculdade é que eu fui entendendo o que era aquilo. E era uma faculdade que era interessante, porque, na realidade, a gente tinha... lá era um centro universitário tanto [de] Comunicação Visual, quanto [de] Desenho Industrial. A Comunicação Visual poderia estar ainda mais próxima da ideia do que a gente conhece hoje como Design Gráfico e com um ‘pé’ na Publicidade, mas para esse lado do Design Gráfico e o Desenho Industrial, que era mais para o desenvolvimento de produtos mesmo, então eu acabei optando mesmo pela área de desenvolvimento de produtos, que eu não imaginava que depois eu viria a trabalhar com moda.
(40:20) P1 - Sim. E quando você entrou na faculdade, esse período saciou a sua vontade de estar com a arte?
R1 - Ah, então! Eu entrei para a faculdade... deixa eu tentar lembrar uma coisa aqui... eu acho… eu vou fazer uma correção em uma coisa que eu comentei com você: eu comecei a estudar dança no terceiro científico, por brincadeira total, porque eu tinha umas primas que faziam dança e a gente, elas faziam os espetáculos anuais de uma escola de balé, do Studio Anna Pavlova, lá de Belo Horizonte, e em um desses tantos estúdios eu meio que já trabalhava com teatro amador e tal, tinha isso também, agora estou ‘amarrando’ aqui umas coisas que eu não contei. Então tinha coisa do teatro amador, fazia teatro amador inclusive na igreja e aí elas me chamaram, porque estava precisando de um ator em um espetáculo de fim de ano do Studio Anna Pavlova, lá fui eu, para poder interpretar um papel e, com isso, eu acabei entrando no ano seguinte. Então, olha, isso foi no segundo científico e no terceiro científico eu já estava começando a fazer aula de dança e pouquíssimo tempo depois eu já estava fazendo Desenho Industrial, dois anos e meio, três anos depois eu começo a trabalhar profissionalmente como bailarino, então eu era bailarino profissional, estudando Desenho Industrial.
(42:08) P1 - E como é que foi isso, de se tornar um bailarino?
R1 - Foi um questionamento muito grande, porque aquilo nunca tinha passado pela minha cabeça. Eu fazia dança, porque eu gostava, era uma diversão, mas, ao mesmo tempo, era legal por um outro lado, eu já começava a perceber ali um interesse por entender o corpo, tanto assim que o meu interesse por figurino começa comigo fazendo dança, ali dentro do próprio estúdio desperta em mim esse interesse de começar a desenhar roupa, só que não na indústria de confecção, como figurino de espetáculo. Então, ali começa essa história, só que eu venho a concretizar isso em um momento em que eu já estava trabalhando profissionalmente como bailarino. A partir daí as coisas vão meio que... como eu vou falar?... uma entra na outra, passa não haver tanta separação, vamos dizer assim, entre as atividades. Então, a faculdade de Desenho Industrial me dá subsídio, porque eu estudo a figura humana para desenhar a figura humana; o balé, eu trabalho com essa figura humana no meu corpo e no corpo do outro e uma coisa vai juntando na outra e vai me dando essa vontade de criar roupa para espetáculos. Inicialmente era isso, era roupa para espetáculo. Então eu entrei para esse primeiro grupo de dança, que foi motivo de muita conversa quando eles me convidaram, para poder integrar. Era um grupo de dança que pertencia a este estúdio, então eles tinham um grupo profissional pequeno, que pertencia ao estúdio e eles me chamaram para integrar esse grupo profissional chamado Ballet Teatro Minas, então eu fiquei assim, eu falei: “Gente, mas eu estou fazendo faculdade e aí, como vai ser uma coisa misturada?”. Mas eu acabei aceitando e foi maravilhoso. E eu fui convivendo com todas essas coisas, então elas começaram a se sobrepor. Então, entendendo, hoje eu tenho uma clareza maior, que a coisa principal estava ali na questão do corpo: "O que é isso? Como que eu lido com isso?".
(45:09) P1 - Você falou que tinha vontade de trabalhar com figurino. Isso foi ainda durante a faculdade?
R1: Foi, eu ainda estava na faculdade, mas eu já trabalhava profissionalmente como bailarino e aí surgiu a primeira oportunidade para eu criar um figurino para um balé que eu dançava. Aí começou literalmente uma coisa a entrar na outra e isso se acentuou mais ainda quando eu saí desse primeiro grupo profissional, saí do Ballet Teatro Minas e fui para o Grupo Corpo. No Grupo Corpo, eu acabei desenvolvendo, não só dentro da Escola Corpo de Dança a questão do figurino e aí eu já tinha me formado em Desenho Industrial, eu me formei em Desenho Industrial em 1980, e em 1981 eu já estava dentro do Grupo Corpo. Eu me formei em dezembro e em janeiro eu já estava dentro do Grupo Corpo. E lá dentro do Grupo Corpo eu tive a oportunidade de criar figurinos para os espetáculos, para algumas coreografias que estavam acontecendo. Então, veio meio que uma passagem, as coisas vão meio que se encaminhando para até o momento em que eu me desligo, entre aspas, da dança e assumo o outro lado da moda, mas isso não é uma coisa imediata, não, tem um período aí em que isso vai caminhando. Então, no Grupo Corpo, eu dançava profissionalmente e criava para a Corpo Escola de Dança. A partir do trabalho que eu fazia na Corpo Escola de Dança, eu comecei a criar figurinos para outras escolas lá de Belo Horizonte também e simultaneamente eu comecei a criar coreografias. Então, às vezes eu era chamado para um figurino e acabava envolvido completamente na coreografia daquilo que estava sendo criado. Muitas vezes a ideia saía de mim e ia para a pessoa que estava coreografando, por saber que eu era bailarino, acabava me chamando e eu fazia uma coisa junto com a outra.
(47:59) P1 - E como é que era a rotina de trabalho?
R1 - Era uma rotina rígida, como uma rotina de qualquer bailarino. Então, começava a trabalhar de manhã, não lembro, talvez [às] nove horas da manhã a gente devia começar a aula. Eu lembro que eram seis horas de trabalho diário, profissionalmente falando, com um pequeno intervalo, para uma breve refeição no meio do caminho, mas eram seis horas de atividades diárias lá no Grupo Corpo. O Ballet Teatro era um pouco menos intenso, o Grupo Corpo tinha um outro esquema de trabalho, então a gente tinha a aula e seguido da aula tinham os ensaios. Aí, tudo mais que eu quisesse fazer, fosse aulas para aprender outro tipo de dança ou trabalhar em algum figurino fora da escola, isso eu tinha que me ‘virar’ nos horários livres.
(49:08) P1 - Quando você começou a fazer os figurinos, isso começou a ‘abrir portas’ para você, também?
R1 - Belo Horizonte, nessa época, a turma de dança era toda muito pequena, vamos dizer assim, eram poucas escolas de dança. Então, no final das contas, até pela pouca quantidade de profissionais que desenhavam eu acabei sendo convidado por várias outras escolas e grupos semiprofissionais e profissionais de dança, para poder criar figurinos também. E o figurino, na realidade, vai fazer a minha passagem para a moda, é dele que eu dou o ‘salto’. No momento em que eu paro de dançar, não necessariamente paro de dançar, no momento que eu paro de dançar com o Grupo Corpo, eu começo a trabalhar com moda, mas ainda continuando a dançar.
(50:20) P2 - Quando você começou no Corpo, o Corpo já tinha a dimensão que ele adquiriu? Ele já era essa instituição famosa fora do Brasil?
R1 - Já. Quando eu entrei para o Grupo Corpo, o Corpo ‘explode’ com o espetáculo Maria Maria. Maria Maria é o grande sucesso do Grupo Corpo e é com ele que ele ‘explode’. O Grupo Corpo passa a fazer uma carreira internacional com Maria Maria. Tanto que, quando eu entro, eu entro especificamente como bailarino de Maria Maria, foi a primeira coreografia que eu aprendi no Grupo Corpo, e aí eu entro e poucas semanas depois. A gente já estava fazendo espetáculos, acho que, em Salvador e menos de um mês depois desse espetáculo em Salvador eu estava fazendo temporada na Argentina e temporada longa, porque era uma época que os espetáculos aconteciam de terça-feira a domingo. Não era sexta-feira, sábado e domingo: era terça-feira, quarta-feira, quinta-feira até domingo. E cheguei a viajar com o Corpo para vários outros países. Então ele já era, sim, uma companhia, eles já tinham ido fazer espetáculos na França e vários outros, na Argentina, em outros países e eu peguei um pouco desse começo, vamos dizer assim, mas eles já tinham esse nome. Afinal de contas o Grupo Corpo... Maria Maria estreia em 1976.
(52:24) P2 - Poxa, a sua cabeça nesse momento... porque eu imagino que era uma coisa ‘fora de série’, uma instituição brasileira ali, pós-ditadura, fazendo arte em alto nível.
R1 - Era, e era muito bacana. Porque primeiro o Corpo, em Belo Horizonte, como um grupo particular e tinha sede própria, com teatro. Então, a gente tinha a oportunidade de ensaiar dentro do teatro, apesar de não caber todos os espetáculos. Maria Maria, por exemplo, não cabia, para poder fazer ali dentro, porque ficava um pouco apertado, precisava de um palco um pouco maior, mas a gente trabalhava muito e foi um período muito rico, de muito aprendizado e durante o período que eu estava no Corpo, então, primeiro foi Maria Maria, depois entrei pra dançar uma outra coreografia, que foi o Último Trem, então Maria Maria e o Último Trem dessa parceria Milton Nascimento na música e Oscar Araiz na parte coreográfica. E a partir disso também participei de outras coreografias, estreando coreografias inclusive aqui em São Paulo, no Teatro Cultura Artística, e [em] outras cidades também que a gente acabou viajando. E era um grupo muito respeitado, desde sempre. Quando eu entro para o Corpo, que é em 1981, Maria Maria já tinha cinco anos de vida, o Último Trem já tinha sido estreado. Só que a partir de um determinado momento, o Rodrigo Pederneiras, que era bailarino do Corpo, começa a cada vez mais desenvolver o trabalho coreográfico dele e a criar a linguagem dele enquanto coreógrafo e isso sempre ligado ao Corpo. Depois ele começa a fazer coreografias fora do Grupo Corpo, mas nesse primeiro momento sempre ligado ao Grupo Corpo e eu participei de algumas dessas montagens, inclusive, com ele.
(54:54) P1 - Você ficou quanto tempo no grupo?
R1 - No Grupo Corpo, eu fiquei três anos e um pouquinho.
(55:03) P1 - Por que você decidiu sair?
R1 - Na realidade, eu quis fazer uma outra coisa, eu quis mudar de companhia. Eu queria vir para São Paulo e eu queria ir para o Balé da Cidade e fiz audição no Balé da Cidade. Esse é o meu momento de transição, aí, mas naquele dia da audição a gente não teve a resposta, os bailarinos homens não tiveram a resposta de quem seria o novo integrante da companhia e eu fiquei nessa situação durante algum tempo, basicamente três meses. Eu lembro que a audição foi em outubro e eu fiquei nessa até o começo de janeiro, só que eu falei com o diretor do Grupo Corpo: “Eu fiz audição no Balé da Cidade e estou aguardando uma resposta”. E a resposta não vinha, a resposta não vinha, a resposta não vinha e eu falei: “Se a resposta vier, eu estou saindo daqui”. A resposta não veio até janeiro. Em dezembro, eu fui desligado do Corpo oficialmente. Já, já eu explico. E aí o Balé da Cidade não me dava resposta. Quando o Balé da Cidade veio a me dar a resposta, no mesmo dia eu tinha feito uma entrevista dentro de uma confecção, para começar a trabalhar com moda. Nunca tinha trabalhado com moda, não tinha ideia do que era isso, e aí, naquele momento, quando eu recebi a ligação, eu deveria estar em São Paulo em duas semanas, para começar a trabalhar e eu falei: “Não, eu não vou, porque eu estou fazendo uma mudança de carreira”, tipo transição de carreira ali, na marra. Mas eu não parei a dança, eu continuei. Então, quando eu falei oficialmente no Corpo, primeiro porque quando entrou um novo bailarino no Corpo, para me substituir, até que ele aprendesse tudo o Corpo já tinha alguns compromissos profissionais e eu ainda fiz alguma coisa, por pouco tempo, mas ainda fiz alguma coisa e logo na sequência a gente montou um outro espetáculo. A “gente” que eu falo é um outro grupo que se uniu, artistas, atores e bailarinos que se uniram e montaram um outro espetáculo, em Belo Horizonte, em cima de textos da Adélia Prado. Então, a gente ficou em cartaz durante um tempo e eu já, aí, ensaiando e já trabalhando com moda. Ensaiando, fazendo espetáculos e trabalhando com moda. Então, eu tenho um ano aí, no meio dessa história, vai fazer quarenta anos o ano que vem, que é o meu ano de transição, que eu saio de uma coisa, para poder pegar o caminho da outra.
(58:29) P1 - Então, você veio para São Paulo, tentou audição do Balé da Cidade, você passou, mas mesmo assim você decidiu confecção? Você sabe por quê?
R1 - Eu resolvi ficar com a moda, não me pergunta porquê, mas eu resolvi ficar com a moda.
(58:44) P1 - E como é que foi esse trabalho, essa mudança?
R1 - (risos) Ela é, no mínimo, engraçada. No começo, porque primeiro que eu não tinha experiência. Eu tinha experiência em fazer figurino, era uma coisa: você está criando roupa para uma necessidade, que é vestir as pessoas para um espetáculo, normalmente era um espetáculo de dança. A outra coisa é você pensar nessa roupa enquanto produto que vai ser comercializado: então eu tive que resgatar o desenho industrial. Então eu tive que voltar no desenho industrial, pegar as minhas coisas de volta relativas ao desenho industrial e começar a entender como que eu ia trabalhar. Foi um começo, não foi traumático, porque eu comecei a trabalhar em uma confecção que era muito pequenininha e tudo funcionava em um espaço também pequeno, apesar dela ter a confecção e a loja num ponto de Belo Horizonte muito importante para aquele período, que era a Savassi, que era onde estavam todas as marcas de moda e tal, mobiliário, decoração, tudo ficava na Savassi, mas a confecção era pequena, então eu fui aprendendo literalmente no que a gente chama de ‘chão de fábrica’. Então a minha mesa ficava onde eu estou aqui e aqui do lado estava a mesa da modelista. Então, muitas vezes eu tinha as ideais, chegava para a modelista, virava para ela e falava: “Eu estou pensando em uma coisa assim, assim, ‘assado’” e a gente ia conversando e eu ia desenhando. Ia conversando, ia desenhando. E aí eu ia recuperando o que era fazer um desenho técnico, porque inclusive nessa confecção os desenhos não eram técnicos, tudo que vinha para lá, até então, eram croquis, então não tinha nada em termos de desenho técnico. Eu introduzi o desenho técnico dentro dessa confecção, exatamente pra poder facilitar, então eu recupero uma coisa lá de trás e introduzo, isso em 1984. E a partir dessa primeira experiência ali dentro, e o mercado de moda também começando uma expansão muito grande em Minas Gerais, o que acabou acontecendo eram uns poucos designers naquela época, em Belo Horizonte. O mercado ficou sabendo da minha existência e eu comecei a fazer, desenvolver coleções freelancer. Então eu começo dentro de uma marca, mas eu não trabalhava o tempo inteiro nela, tinha um horário que eu trabalhava ali, até porque nesse primeiro ano eu falei: “Não, eu continuo mexendo com dança, com isso e com aquilo”. Então eu tinha uma folga de horário, vamos dizer assim. Não é a semana de quatro dias, mas era uma coisa mais ou menos parecida com isso, porque eu tinha e fazia as duas coisas simultaneamente e começaram a aparecer algumas outras confecções e começaram a me chamar, porque ficaram sabendo do trabalho que eu estava fazendo naquela confecção e aí o mercado foi abrindo para mim, o mercado em Belo Horizonte foi crescendo - eram poucos profissionais desenvolvendo para as marcas - e eu comecei, então, a me ver dividido entre esse trabalho com várias marcas, até que eu abro o meu escritório. Então, aí eu saio de trabalhar dentro das marcas e abro um escritório, para poder trabalhar para as marcas. Então, como eu estava falando, aí eu senti a necessidade de ter o meu escritório e esse escritório, inicialmente, eu trabalhava sozinho, mas o campo foi cada vez mais abrindo para mim e aí eu comecei a contratar pessoas para trabalharem comigo. Então, eu tinha profissional que trabalhava fazendo design de estampa, que fazia o desenho técnico, mais a finalização do desenho técnico e tudo mais. E eu comecei a também levar o meu trabalho para fora de Belo Horizonte. Então, o meu trabalho começou a ser reconhecido, inicialmente em algumas cidades, que tem também um trabalho de confecção forte no estado de Minas e depois eu saí para o Rio de Janeiro, inicialmente fazendo algumas poucas marcas do Rio, o que não era meu forte, mas também vim para São Paulo. A minha vinda para São Paulo está diretamente ligada a um período em que eu faço… houve um concurso da Santista Têxtil Jeanswear, que se chamava Passaporte da Moda. Então, eles fizeram esse primeiro concurso e o representante lá de Belo Horizonte falou: “Ah, participa, vai!”. Uma das fábricas que eu trabalhava era uma fábrica de jeans, e eu falei: “Ai, que preguiça, que não sei o que, isso e aquilo, tarará, estou muito cheio de trabalho, parara, parara”. Bom, finalizando, eu lembro que eu fiz uns desenhos exatamente na véspera de um Natal, de 1989, eu fiz os desenhos, finalizei no dia de Natal, entreguei na mão do meu irmão e falei: “Põe no correio para mim, seja o que Deus quiser” e fui selecionado. Primeiro para uma classificação em que eles fizeram uma seleção de cinquenta designers do Brasil todo e depois dessa etapa eles selecionaram dez e eu vim para São Paulo entre esses dez, já montando uma coleção. Eu já tinha uma coleção montada para apresentar. Isso ‘abriu a porta’ minha aqui em São Paulo, porque São Paulo começou a se interessar. E, na época, é muito engraçada essa história, mas eu acabo sendo contratado por uma concorrente da Santista, que era a Alpargatas e eu vou trabalhar em uma das marcas da Alpargatas, mas eu vou trabalhar, bem entendido: o meu escritório desenhava para essa marca da Alpargatas, assim como eu vim a desenhar para outra marca de São Paulo e fui abrindo o meu espaço em São Paulo. E aí, no meio dessa história inteira, o que vai acontecer? Eu já não estava mais no Grupo Corpo, eu já tinha o meu escritório e o Grupo Corpo me chama, para poder fazer figurino para eles e um tempo depois, eu já começando um trabalho que veio ser a minha marca com o João, que é a Uranio, a gente trabalhava muito com pintura à mão, essa coisa toda, e eu ainda continuando fazendo figurino, o Balé da Cidade me chama, pra poder fazer um figurino para ele. Então, eu entrei para o Balé da Cidade, mas não como bailarino, como figurinista do Balé da Cidade. Não figurinista dentro, eles não têm figurinistas contratados, mas eu criei uma série imensa de figurinos para o Balé da Cidade a partir de 1995, até 2015.
(01:07:46) P1 - E antes, você já tinha vontade de vir para São Paulo?
R1 - Tinha. Tanto que na época que eu comecei a trabalhar com a Alpargatas, eu fiz a minha primeira investida em São Paulo, em ter um apartamento aqui, isso aí no comecinho dos anos noventa, bem em 1991, por aí, eu tive o meu primeiro apartamento aqui, por quê? Aí, com o trabalho da Alpargatas, nessa marca que eu desenhava, o que acontecia? Eu senti necessidade de ter um lugar para trabalhar aqui nos dias que eu estivesse trabalhando na fábrica, então eu resolvi: primeiramente, eu aluguei um flat e depois eu vim a ter um apartamento mesmo, que é onde eu trabalhava. Eu tive o meu, vamos dizer, “escritório casa”, meu home office, em São Paulo, para poder atender aqui ao trabalho, tanto da Alpargatas, quanto da outra marca, que era World Class. Só que isso durou pouco tempo. Aí eu voltei para Belo Horizonte e em Belo Horizonte eu e João começamos a dar um ‘gás’ na nossa marca, que aí a gente começou a trabalhar uma marca, o João morava em São Paulo, inicialmente morando em São Paulo, então eu produzia as coisas em Belo Horizonte e trazia para São Paulo e eram vendidas aqui. Aí ele se muda para Belo Horizonte, a marca começa a crescer, crescer, crescer. Bem entendido: a gente era uma marca pequenininha, mas ela cresce e a gente começa a mostrar o trabalho que a gente estava fazendo aqui em São Paulo no Mercado Mundo Mix, isso ainda na década de 1990, acho que 1996, se eu não me engano, a gente começa [a] expor no Mercado Mundo Mix, em São Paulo, e a viajar com o Mercado Mundo Mix, porque houve um período que o Mercado Mundo Mix começou a ser itinerante, então a gente fazia São Paulo, eu não lembro a periodicidade agora, qual era, e fazia Rio de Janeiro, Campinas, Belo Horizonte, Curitiba, Juiz de Fora, a gente ia fazendo e, simultaneamente, um outro evento que era muito parecido com o Mercado Mundo Mix, só que em uma proporção menor, bem menor, chamado Mambo Bazar, que acontecia no casarão, na Avenida Paulista, nesse casarão que tem logo aqui perto, na Avenida Paulista e isso fez com que o mercado de São Paulo fosse se abrindo para nossa marca. A gente começou a ter uma clientela que estava sempre querendo, a gente fazia basicamente moda masculina e, com isso, com essa solicitação dos clientes, a gente usa este apartamento para abrir o showroom da gente, aqui em São Paulo. Então o João ficava aqui em São Paulo e atendia os clientes e eu ficava em Belo Horizonte, cuidando da produção. Até que teve um momento que a gente sentiu que era hora de mais um ‘virada’ e eu me mudo para São Paulo. Aí, sim, eu já não volto mais para Belo Horizonte e estou aqui até hoje.
(01:11:51) P1 - Só para entender um pouquinho, como é que você conheceu o João?
R1 - Em um acaso. (risos) Conheci o João de uma maneira completamente inusitada, em um hall do Cine Astor. Onde hoje é a Livraria Cultura, tinha um cinema e a gente acaba se conhecendo no hall do cinema e começamos a conversar, conversa, conversa e conversa e isso vai fazer 32 anos.
(01:12:26) P1 - (risos) E como é que surgiu a ideia da marca?
R1 - Então, o João não trabalhava na área. Na realidade, ele não tinha nenhum conhecimento a respeito da área de confecção e a coisa começou, a ideia começou a acontecer muito... olha, surgiu a vontade de fazer alguma coisa nesse sentido, mas nessa época eu ainda desenhava para muitas marcas, em Belo Horizonte, então a nossa ideia, no começo, foi fazer alguma coisa que eu não fazia para nenhuma delas. Então a gente começa a trabalhar fazendo camisas masculinas pintadas à mão, estampadas à mão, a gente começa assim e esse trabalho começa a ter uma aceitação não só do público masculino, mas também do feminino, então a gente, em um primeiro momento, dividia a nossa produção entre o masculino e o feminino, mas sempre com essa ‘pegada’ de uma roupa feita muito artesanalmente. Então, para você ter uma ideia, a gente pintava as coisas dentro de casa, na mesa, em cima da mesa de casa e tinha uma facção, uma oficina de costura, que fechava as peças, cortava e fechava as peças para a gente. E a gente foi crescendo, da camisa masculina começamos a fazer outros tipos de produtos, começamos a ampliar o nosso mix de produtos e com essa ampliação é que a gente vai acabar chegando no Mercado Mundo Mix exatamente, mas foi uma coisa que foi amadurecendo aos poucos. Pra você ter uma ideia, o primeiro evento que a gente participa com a nossa marca foi em uma feira de artesanato, lá em Belo Horizonte, a Feira Nacional de Artesanato, a gente vai e expõe camisas pintadas, que era uma coisa muito feita à mão, ali, uma a uma, não existia uma camisa igual a outra, apesar de haver alguns desenhos do que seria feito, porque eu costumava fazer os desenhos técnicos, inclusive com a sugestão do tipo de estampa que seria pintado e tal, mas era aquela camisa. O desenho, durante muito tempo, acho que eu ainda tenho essa pasta, a gente anotava no desenho quem tinha comprado. E aí depois isso foi ficando difícil de continuar acontecendo, porque vai crescendo o tipo de produto e aí a gente foi diversificando e partindo para uma outra história e a marca foi automaticamente crescendo. E quando eu me mudo para São Paulo, aí a gente já vem com o planejamento de, em algum momento, ter a nossa própria loja.
(01:16:07) P1 - Queria perguntar primeiro: por que Uranio?
R1 - Uranio, na realidade, era o nome do meu escritório; só que o meu escritório [se] chamava Uranio 92, que é o nome do elemento químico e a sua numeração, na tabela periódica. Então, a marca do escritório se chamava, era Uranio 92 e quando a gente começa a pensar em nome de marca, a gente queria um outro nome, mas a gente, quando foi fazer pesquisa, esbarrou e eu já tinha o registro do Uranio 92 para a área de confecção, porque eu registrei no INPI, então a gente simplificou e adotou o nome Uranio.
(01:17:00) P1 - E como foi esse processo de abrir loja?
R1 - Foi uma loucura, porque a gente resolveu abrir loja, procurar loja e, de fato, abrir a loja em um período muito curto de tempo. Eu, inclusive nessa, quando eu me mudo para São Paulo, o que acontece? Eu sou convidado a trabalhar em uma fábrica, uma confecção em Guarulhos, onde eu fiquei por dois anos, mais ou menos, e aí, nesse processo é que a gente vai, exatamente entre a chegada minha em São Paulo, o João já tinha vindo, e a abertura da loja, a gente vai amadurecendo o que é esse produto que a gente queria levar para a loja e o Mercado Mundo Mix e o Mambo Bazar são exatamente os termômetros para gente começar a entender o que ia acontecer. Então, a gente abriu a loja ainda assim, sem um ideia definitiva do que era o que viria a ser a Uranio a partir dali, porque a gente tinha uma experiência de um outro tipo de varejo, vamos dizer assim, era um varejo de evento e não um varejo de um ponto comercial, que você vai estar com a porta aberta todo dia. Então, a gente abre a Uranio de uma maneira muito rápida, fazendo uma loja bem charmosa, bem gostosa, mas com pouca grana, naquele começo. E a partir do momento que a gente abre a loja é que a gente começa a sentir exatamente para que lado que a gente vai. O que funcionava no Mercado Mundo Mix e no Mambo Bazar e que a gente continua, [e] o que não funciona enquanto ponto fixo e o que que tinha que entrar, a partir de então. E aí a gente abre essa loja onde? Na Galeria Ouro Fino, que naquele momento estava no auge. Então, a gente consegue um ponto ali na Galeria Ouro Fino e abre a nossa loja.
(01:19:40) P1 - E a partir daí o que muda?
R1 - Muda muita coisa. Primeiro que a maneira de trabalhar o desenvolvimento das coleções passa a ser outra. Então, a gente estava acostumado a desenvolver produtos diversos, para participar de eventos. Então, a partir do momento que a gente abre a loja, há uma preocupação de criação de coleções para atender os clientes da loja. Essa é a primeira grande mudança, vamos dizer assim: tentando entender como é que esse mercado ia reagir a cada tipo de coisa que a gente estava fazendo. Uma outra coisa é: a gente não queria perder o nosso ‘espírito’, vamos dizer, desde o começo, que a gente ia tentando sempre manter a coisa da exclusividade. Então como juntar a ideia de montar uma coleção, ter um ponto comercial aberto de segunda-feira a sábado e, ao mesmo tempo, oferecendo exclusividade e qualidade pro cliente? E daí, dentro dessas coisas todas, acho que é um lance super importante, é que toda a pesquisa para o desenvolvimento dos produtos, do ponto de vista do têxtil, sai, apesar da marca ser masculina, eu não me prendo à escolha de tecidos para o masculino, então eu começo a trabalhar com todo o tipo de matéria-prima, que vai atender a necessidade de criar um produto para aquele cliente, que queria uma coisa que fosse realmente muito diferente e que desse para ele essa diferença que os homens estavam querendo naquele momento. Então, eu estou falando do começo do século XXI. A gente abre a loja em 2001. Então, o que é que esse homem, nesse começo de século, quer? Com pouco tempo depois de abrir a loja, a gente tinha lançado três coleções, aí que vem uma grande ‘virada’ nessa história toda, que eu resolvo então pensar uma coleção de uma maneira completamente diferente em termos de quais vão ser as minhas referências, que até então elas estavam muito ligadas a um ritmo de vida da cidade e eu penso em trabalhar uma coleção a partir de uma coisa que seriam os sentidos sensoriais, como que eu transformo sentidos sensoriais em uma coleção. Só que pensar todos os sentidos era muita coisa, então eu faço a opção por um, um sentido sensorial; e aí vem uma outra mudança. O sentido sensorial que eu escolho é a visão, só que a coleção que eu ia começar a fazer era de inverno, que a coleção de inverno, para mim, trazia a ideia de recolhimento, da gente se proteger do frio, quase como se a gente não permitisse a exposição do nosso corpo, ou não visse o corpo do outro, por conta da quantidade de roupa que eu estou usando e me cobrindo, no inverno. Então, se eu estava trabalhando a ideia do sentido da visão para aquela coleção, eu inverto: em vez da visão, eu vou pra cegueira. Então, eu começo a trabalhar em cima desse corpo que se cobre e que eu não vou vendo. Essa foi a ideia inicial, só que eu entendi que ali tinha muito mais coisa por trás do que essa ideia que eu tinha. Então, eu começo a fazer uma pesquisa para entender como é que a pessoa com deficiência visual se vestia.
(01:24:31) P1 - E como é que foi?
R1 - Aí foi uma loucura, porque imagina: 2002, internet ainda era uma coisa muito precária. Quando a gente fala 2002 parece que é tão pouco tempo, mas a gente não tinha muita informação, então eu tive que começar a pesquisar de maneira que eu tivesse algum retorno, para poder saber quem é que trabalha com pessoas com deficiência visual. Eu não tinha a menor ideia. E aí eu descubro... eu fico sabendo de uma instituição aqui em São Paulo chamada Fundação Dorina Nowill e que eu vou bater na porta deles e eu chego na fundação e marco primeiro uma entrevista dentro da Fundação Dorina, com a diretora do voluntariado, eu chego para ela e faço a pergunta fatal: “Qual a relação da pessoa cega com a moda?”. A partir dali foram meses de trabalho, eu me tornei um voluntário da fundação, comecei a trabalhar dentro da fundação, até para poder acessar essas pessoas, ter o contato com elas mais proximamente. Começo a entrevistar algumas pessoas. Aí eu vou perdendo um pouco de vergonha, porque eu sou uma pessoa tímida. Só que eu vi que eu precisava descobrir onde estavam essas pessoas cegas e que roupa é essa que eu ia fazer, pensando a partir delas. Então eu faço uma pesquisa e um levantamento muito grande, principalmente junto ao público masculino, mas não só, quais eram os hábitos de vestir, como é que eles se vestiam, como é que eles compravam roupa, como é que eram as escolhas, por que eles faziam aquelas escolhas, se eram eles mesmos que compravam as roupas, se a roupa era comprada por uma outra pessoa, se eles aceitavam se vestir a partir da escolha da outra pessoa, como é que isso tudo acontecia. Então, a partir do momento que eu enveredo nisso e começo a trabalhar junto da fundação, me apoiando em algumas leituras, aí eu também... a nossa produção, a confecção das roupas nesse momento ainda não era feita em São Paulo, continuava sendo feita em Belo Horizonte. Lá em Belo Horizonte eu vou também entrar em contato com o Instituto São Rafael, que também tem esse papel de auxiliar a pessoa cega, começo a fazer entrevistas aqui e lá e começo a levantar material. A gente entende, no meio desse caminho, que um dos grandes problemas pra pessoas com deficiência visual é: “Que cor é essa roupa?”. E aí, conversa vai, conversa vem, eu muito presente nesse momento, naquele período, dentro da fundação, conversa, conversa, conversa: e se a gente identificasse essa roupa? Porque eu fico sabendo como que eles fazem a separação da roupa: a camisa que é branca, da camisa que é azul, da camisa que é vermelha, dentro do guarda-roupa? Como é que eles sabem isso? Se a camisa vai ser o mesmo modelo, vamos dizer assim. E gente lança as etiquetas em braile. Então, para a coleção de inverno de 2003 a gente lança a coleção Olhar, Olhares, que vai ser a primeira de uma série de coleções que passam a contar com etiquetas que informam a cor da roupa em braile. Isso lá em 2003. E aí, para saber se de fato aquilo estava atendendo as pessoas com deficiência visual, para o lançamento dessa coleção a gente faz um lançamento voltado para pessoas com deficiência visual. Então a gente abre a loja para esse público. A gente não fez um lançamento igual a gente fazia nas outras coleções e chamávamos amigos, clientes e isso e aquilo para o lançamento. Não, dessa vez a gente pôs esse povo todo de lado e falamos: “O lançamento é só para pessoas com deficiência visual”, porque ali foi feito o teste: funciona, não funciona. Isso exigiu também da gente fazer toda uma mudança na distribuição do layout da loja, toda a maneira com que as coisas eram expostas. A gente entendeu que tinha que ser modificado, não poderia ser daquela mesma maneira o espaço de circulação, como que ele tinha que acontecer, para que uma pessoa cega fosse de um lado para o outro da loja sem esbarrar em absolutamente nada. A gente chegou a ter uma planta em braile, na fachada da loja. Então, se chegasse uma pessoa cega, a gente indicava: “Aqui está a distribuição da loja, leia a planta para poder entender onde é ‘arara’, onde é balcão, onde é vitrine, onde é provador, onde tem uma escada, onde tem isso, onde tem aquilo” e todas as roupas vinham com essa etiqueta do lado de fora. Ela não era feita para ser uma etiqueta interna, ela era feita para ser uma etiqueta externa, para atender a necessidade da pessoa olhar, contato, o que estava escrito ali.
(01:31:04) P1 - Ela era dura, assim?
R1 - Ela era... a primeira - eu fiz duas séries de etiquetas - era feita em tecido com o relevo emborrachado, mas não funcionou, porque a gente descobriu que, se batesse um ferro de passar ali em cima, ela achatava. Aí eu fui atrás de desenvolver e isso é muito interessante, porque todo o processo de desenvolvimento dessas etiquetas foi acompanhado dentro da Fundação Dorina, então não foi uma coisa feita da minha cabeça, não. Foi uma coisa feita: eu, o designer gráfico que trabalhava comigo, o Leo, e a brailista de dentro da fundação. Então, a gente trabalhava em conjunto. Eu fiz essa primeira série e foram vários testes de estamparia, até ficar pronto a primeira série. Ficar pronto que eu falo: aprovada pela Regina, que era essa brailista. Só que aí eu vi um problema de ordem prática e aí eu comecei o trabalho todo de novo, buscando um outro material, que aí sim ela era de etiqueta um pouco mais rígida, feita em uma borracha e ela tinha relevo. Aí eu tive que, todo o processo de aprovação das etiquetas, fazer tudo de novo, para poder atender a necessidade.
(01:32:47) P1 - Já nessa época… porque hoje em dia a gente escuta, por exemplo, coleções inclusivas e ainda são poucas, mas e nesse período de 2001, 2002?
R1 - Então, é bastante curioso isso, porque do ponto de vista de atender a uma clientela de pessoas com deficiência visual, a gente não tem os dados, para você ter uma ideia de quantas pessoas com deficiência visual vestiram Uranio. Por quê? Porque nós estamos falando de um momento em que ainda as pessoas com deficiência visual, nem todas elas saíam para comprar roupa. Então, a gente tinha casos de, às vezes, chegar uma pessoa dentro da loja e falar: “Nós ficamos sabendo que aqui vocês têm roupa com etiqueta em braile, deixa eu ver a roupa” e aí comprava a roupa e levava, para poder dar para essa pessoa vestir. Mas nem todo mundo era claro e falava com clareza: “Eu vim aqui comprar a roupa, porque tem etiqueta em braile”. Então, eu não tenho dados para poder te falar qual era o número de pessoas. Temos casos de pessoas, de várias pessoas com deficiência visual, que entravam na loja sabendo que a gente estava fazendo aquele produto e que era uma moda super jovem, masculina, muito transada, descolada e tal e que ia lá e queria se vestir de uma maneira bacana e faziam suas escolhas, inclusive de que cor: “Eu quero comprar essa roupa por causa da etiqueta”, mas era um número reduzido, apesar da gente ter contado com muita divulgação da imprensa, na época, porque era uma coisa completamente nova no mercado. Naquele momento, o que existia com braile? Caixa de remédio. Então, eram poucos. Talvez um ou outro produto mais que tinha uma etiqueta em braile, alguma coisa, algum texto em braile, mas na moda não se fazia nada disso. Então ele teve uma repercussão midiática naquele momento: televisão, imprensa, revistas e jornais, alguma coisa de internet, que estava meio que começando. Aquilo nos levou, inclusive, a fazer um desfile no Dragão Fashion, em Fortaleza. Pelo novo que era, não tinha, esse tipo de produto não existia ali, no mercado, ainda e a gente não falava “moda inclusiva”, essa expressão ainda não tinha acontecido, entendeu? E muitas vezes, inclusive, a própria imprensa, quando chegava, pra poder fazer uma entrevista comigo, ou com o João, aí perguntava: “Vocês fazem moda para pessoa cega?”. Falava: “Não, eu não faço moda para pessoas cegas, eu faço moda para pessoas. Aqui a única diferença é que a gente tem uma preocupação com algumas características da roupa, para além da etiqueta, em função de trazer um produto que vista essas pessoas, de acordo com o ritmo de vida delas”. Então, se eu tinha uma informação que, por exemplo, muitos dos entrevistados, dos homens entrevistados, às vezes viravam e falavam assim: “Às vezes eu saio com a roupa virada do avesso, que eu chego, tiro a roupa e na hora que eu vou sair eu enfio o casaco, principalmente e saio”. Então, uma preocupação na hora de criar a roupa era pensar a roupa sem avesso.
(01:37:06) P1 - Os dois lados, né?
R1 - Os dois lados. Só que eu criava fazendo um modelo de um lado, um modelo do outro. Então, do jeito que ele quisesse sair, ele saía, não tem problema. Então, era uma roupa pensada para ter essa versatilidade também e isso automaticamente agregou um valor para a própria marca, não só o fato de ter a etiqueta, de pensar a questão da inclusão, mas também o tipo de pensamento que era feito a respeito dessas roupas em relação a coisas como essa: direito, avesso, tecidos, para poder falar o que eu estou usando desse lado da roupa, o que eu estou usando do outro, enfim, algumas coisas que foram, de alguma forma, impactando até no processo criativo. Elas foram, de alguma maneira, uma reverberando na outra e, tudo isso, no final das contas, me leva a um novo posicionamento: eu volto a estudar.
(01:38:21) P1 - E o que você começa a estudar?
R1 - Então, eu senti que, a partir dali, eu precisava de dar uma virada, eu precisava de um pouco mais de conhecimento, mas não esse conhecimento que eu já tinha já de muito tempo, de ‘chão de fábrica’, isso aí eu já sabia. Eu precisava de algo que me desse mais subsídios, para poder levar para o trabalho, por quê? A partir do momento que a gente lançou a primeira coleção, a ideia é que tudo que foi proposto na primeira coleção fosse reforçado na segunda coleção, na terceira coleção, na quarta coleção e daí para frente. Então, se na primeira coleção a ideia foi trabalhar a cor como elemento principal, porque a etiqueta ____ surge daí, então a gente tinha as cores trabalhadas nas roupas e com explicações, né? O que é o azul? Então, eu fui pesquisar. Então, o Israel Pedrosa, no livro dele, Da Cor à Cor Inexistente, eu fui lá e trouxe a informação. O que é o azul? O que é o cheio? O que é o vazio? E daí foi. A coleção seguinte já foi trabalhada em função da cidade: então quais são os perigos da cidade, para a pessoa com deficiência visual? Então, toda parte de estamparia remetia a esses elementos. Para aquela época, por exemplo, o orelhão era um obstáculo, assim como uma grade de jardim, assim como um bueiro, porque era tudo aquilo, um buraco no meio da rua, então tudo isso virou elemento para poder trabalhar cada uma das coleções e assim, sucessivamente, a gente foi fazendo uma série de coleções, todas elas ligadas com a vida da pessoa com deficiência visual. Então, não foi simplesmente eu falei: “Vou fazer essa coleção”. Não, ela teve uma sequência e aí, depois, outras coisas foram acontecendo e a gente foi seguindo, mas sempre com a ideia de ter as etiquetas na roupa e cada vez trazendo mais informação. Porque se no começo a gente tinha só a etiqueta que falava a cor da roupa, com o passar do tempo outras etiquetas começaram a entrar dentro da roupa, quando precisava. Então, se eu tinha uma etiqueta que falava qual era a coleção, ela também estava em braile. Se eu tinha uma etiqueta… enfim, para cada coisa nova que eu queria trazer a ideia dessa informação para pessoa com deficiência estava presente, isso coleção após coleção, até quando a gente parou com a marca. Mas antes de parar com a marca, então eu voltei a estudar para ter mais subsídios, para ter mais informações, para eu saber onde eu vou fazer pesquisa. Aí eu fiz uma pós-graduação em moda e cultura. Na sequência da pós-graduação em moda e cultura, a ideia era só fazer isso, para poder ter um pouco mais de retorno, mas aí surge a oportunidade de eu fazer um mestrado. A Universidade Anhembi-Morumbi estava abrindo o mestrado em Design e eu fiquei sabendo e pessoas que, a partir dessa pós-graduação, eu fiquei conhecendo e começaram a me falar e é quando eu vou para uma outra mudança de carreira, ainda com a confecção, ainda com a loja, eu faço o mestrado e começo a dar aula, na própria Universidade Anhembi-Morumbi.
(01:42:45) P1 - Essa formação você falou que era moda e cultura, né?
R1 - É.
(01:42:51) P1 - Você dava aula nesses assuntos também?
R1 - Não. Aí, o que aconteceu? Quando eu fiz essa pós-graduação em moda e cultura, eu comecei dando aula na pós-graduação de Jornalismo de Moda, que eles tinham lá. E depois dessa pós-graduação… e tinha um MBA de Moda também. Então eu dei aula nesses dois cursos, mas eram módulos, a pós-graduação são módulos, então eu dava aula só naqueles módulos. Aí, no meio desse caminho é que abre o mestrado em Design lá na universidade e aí eu vou para a primeira turma, eu entro na primeira turma do mestrado e, ao final do meu mestrado eu já faço uma prova para poder entrar como professor do curso de Design de Moda e depois eu vou dar aula também no curso de Negócio da Moda. Só que isso acontece sem que eu feche a loja. A loja continua aberta, a confecção continua existindo e eu entro com a docência, como uma terceira coisa.
(01:44:11) P1 - Nossa! Você ficou nos três ao mesmo tempo?
R1 - É. Então, percebe? Eu fui falando para você da época da faculdade: eu começo a trabalhar com dança, dança me leva para o figurino, o figurino me leva para a moda, a moda me leva a ter uma confecção, depois a loja e a loja, com essas coleções, me levam para a Academia.
(01:44:40) P1 - E a loja durou quanto tempo?
R1 - Nós ficamos abertos… a confecção durou vinte anos, desde que a gente abriu até fechar. A loja, entre a Galeria Ouro Fino e um outro espaço, foi basicamente a metade desse tempo, uns dez anos que a gente teve a loja.
(01:45:02) P1 - E você continua com a docência?
R1 - Agora eu estou entrando em um novo momento, literalmente. Eu dei aula até junho desse ano de 2023 e me desliguei da Universidade Anhembi-Morumbi, depois de quinze anos e meio e agora eu estou partindo para outros planos.
(01:45:27) P1 - Quais são?
R1 - Que ainda não posso.
(01:45:29) P1 - Ah, tá, tudo bem.
R1 - (risos) Por enquanto eu ainda não posso abrir.
(01:45:33) P1 - Mas você ainda não pretende se aposentar, né?
R1 - Não. Quer dizer, aposentado eu até sou, mas não pretendo encerrar a carreira.
(01:45:40) P1 - Entendi. E voltando um pouquinho: o que te levou a... foi a coleção que te levou a dar curso pra pessoas, sobre inclusão?
R1 - Ah, tá. O que acontece? Não. Quando eu estava na Universidade Anhembi-Morumbi a gente já tinha, dentro da matriz curricular - são coisas que também… tudo na minha vida é meio assim: meio que vai andando no paralelo - a disciplina de Moda Inclusiva, mas simultaneamente eu fico conhecendo a Daniela Auler que, na época, era responsável pela gestão de Moda Inclusiva, junto à Secretaria do Estado de Direito da Pessoa com Deficiência. Aí a Dani passa a me chamar, para eu poder dar cursos na secretaria. Então eu começo a dar cursos de Moda Inclusiva na secretaria, isso há uns dez anos atrás, ou onze anos, doze, sei lá, tem tempo. Eu começo a dar curso junto a secretaria, sobre Moda Inclusiva. Ao mesmo tempo, eu vou aprofundando todo esse conhecimento na própria universidade, com a disciplina de Moda Inclusiva, então isso vai [se] sedimentando. Simultaneamente a isso tudo, em 2013, a Universidade Anhembi-Morumbi, onde eu tinha feito mestrado, abre o doutorado em Design. Eu já estava dando cursos na secretaria e eu resolvo abrir um outro curso, em um espaço que a gente tinha. Eu e o João tínhamos um espaço na Matias Aires, chamado Casa Três e eu resolvo, então, abrir um curso falando de moda, tratando de moda para pessoas com deficiência visual. Eu começo a dar curso para pessoas com deficiência visual. É diferente do curso que eu dava na secretaria. Os cursos que eu dava na secretaria eram destinados a pessoas enxergantes, que poderiam até ter alguma deficiência, mas eu não me lembro de nenhuma pessoa, de todas as turmas que eu dei aula lá, com deficiência visual. Cheguei a dar curso para pessoa cadeirante, moda para pessoa cadeirante, uma pessoa que depois a gente veio a ser até amigos. Só que aí eu resolvo abrir um curso voltado para pessoas com deficiência visual, curso de moda para pessoas com deficiência visual, na mesma época que eu estou começando a fazer o meu doutorado. E aí isso, esse curso acaba virando, na realidade, a minha hipótese.
(01:49:12) P1 - Da tese, né?
R1 - Para a minha tese. Então, a minha hipótese era... eu estou dando esse curso aqui, que não tinha a menor pretensão de formar designers, mas a minha hipótese se baseia exatamente nisso: uma pessoa com deficiência visual poderia ser um designer de moda? Então, eu desenvolvo muito mais o curso, eu começo a aprofundar, vou fazer uma outra pós-graduação, simultaneamente, em neurociência, para poder entender como é o processamento cerebral, como é que a gente entende, como é que eu formo uma imagem, como é que eu construo todo tipo de imagem que eu absorvo e essa absorção de imagem a partir de qualquer sentido sensorial, então eu trago a neurociência para conversar com o designer, com a educação e desenvolvo um método.
(01:50:13) P1 - Como é esse método?
R1: Esse método se chama See Beyond, é exatamente voltado para poder pensar como que a pessoa… agora esse método já é aplicado para pessoas enxergantes também, mas a ideia dele nasce pensando na pessoa com deficiência visual, como que essa pessoa poderia ver, além daquilo que está na frente dela. Até porque é importante dizer, o verbo ver é usado pela pessoa com deficiência visual, elas falam: “Eu não estou vendo”, mas não no sentido que eu não estou vendo a partir da visão, é a partir do “não estou entendendo”, “não estou compreendendo”, “não estou…”, então o verbo passa a ter uma outra conotação, então esse “ver”. E aí também isso vai estar conectado lá atrás, com a primeira coleção que eu lancei, que se chamava Olhar, Olhares, então ele se conecta aqui e eu faço toda essa pesquisa junto a um grupo de pessoas com deficiência visual. A gente trabalha durante um ano e meio para desenvolver a metodologia, com aulas que vão passando por todas as etapas de formação, só que de uma maneira mais ‘enxuta’, vamos dizer assim, porque um curso de graduação, se for um tecnólogo demora dois anos, se for um bacharelado pode demorar três ou quatro anos. O curso que eu desenvolvi demora um ano e meio, mas também era um curso intensivo, junto com pessoas com deficiência visual e aí a gente vai passando por todas as etapas do desenvolvimento do processo, para projetar.
(01:52:17) P1 - Entendi.
R1 - Todas as etapas, eu vou aplicando de acordo com cada um dos módulos. O curso é dividido em três módulos: o primeiro módulo, que se chama Fundamentação, então toda a base para que as pessoas possam entender o que é que eu estou falando, está ali. O segundo módulo se chama Potencialização, então a partir disso que eu tenho, o que eu faço com isso, como é que eu vou começar a erguer esse meu projeto. Aí entra a parte de pesquisar materiais, pesquisar público, pesquisar cor, pesquisar imagens, pesquisar sentidos, o que eu quero fazer com isso tudo. E a terceira parte, que é a Materialização, é exatamente quando eu pego isso aqui que eu potencializei e dou vida para isso, e aí eu construo literalmente a coleção. Então, essa é a base. E aí, isso, depois do desenvolvimento do método, passa a ser incorporado na minha própria rotina enquanto docente. Em todos os projetos que eu oriento, eu uso exatamente isso ao longo do projeto. Então, você tem isso aqui para fundamentar o seu projeto, a partir daqui nós vamos potencializar o que você tem para poder materializar.
(01:53:52) P1 - E você falou que deu aula até junho, né?
R1 - Até junho.
(01:53:58) P1 - Você continuou ensinando o seu método?
R1 - Então, o que acontece? Na realidade, eu nunca dei aula sobre o meu método, eu aplico o meu método em aula, entendeu? Então, eu nunca dei aula. Pra dizer a verdade, são poucas as pessoas que utilizam a minha metodologia como metodologia de ensino, o método em si, como eu nunca... para além da tese, em si, que está na internet e tal e dos artigos que foram escritos, explicando e que foram apresentados em congressos nacionais e internacionais, não existe um livro sobre o método, ainda.
(01:54:50) P1 - Ainda.
R1 - Então, (risos) eu já estou te dando uma dica. Eu falei que eu não ia falar nada a respeito disso, mas eu já estou meio que abrindo a história. Então, ainda não existe esse livro, mas essa é uma ideia, exatamente para poder difundir mais essa metodologia de ensino, que ela hoje não é só aplicada no curso de Design, ela é aplicada em cursos de arte e até de negócios. Então, como é que eu transfiro isso aqui? Porque, apesar dele estar fundamentado no design, ele é aplicável em praticamente qualquer área, porque o desenvolvimento da metodologia está diretamente ligado com o processamento cerebral. Então, ele não está ligado com o assunto, ele está ligado como eu desenvolvo o assunto, como é que faço aquilo virar alguma coisa. Aí, mais recentemente, voltando só um pouquinho, no ano passado eu também dei aula lá na Adeva, que é Associação de Deficientes Visuais e Amigos, junto com uma aluna com deficiência visual que participou do desenvolvimento do meu método, nós dois demos aulas para duas turmas formadas por pessoas com deficiência visual, sobre moda.
(01:56:35) P1 - Nossa, que incrível!
R1 - Então, a coisa já começou... agora ela já está começando a ir para outros lugares.
(01:56:44) P1 - E como é que isso: passar para frente o método que você desenvolveu e uma aluna estar ensinando junto com você?
R1 - É isso. O método é muito vivo, ele não é uma coisa ‘engessada’ e a partir do momento que você percebe quais são as engrenagens que fazem esse método mover, se você captou aquilo, você transfere. A Ana Cláudia, que é exatamente... foi a minha aluna e atualmente é uma parceira, digo como professora, também é formada em pedagogia. Então eu tenho aí um apoio, que também é muito importante. Ela é uma pedagoga, independente de qualquer questão, que participou do desenvolvimento do método. Então, ela trouxe isso e ela se interessa por moda e aí não havia outra, porque eu acho que chega em um determinado momento que você começa a estabelecer outras conversas, que você precisa da pessoa com deficiência junto. Então, isso aí eu fui entendendo ao longo de toda essa trajetória e hoje eu percebo que tudo acontece, porque começa acontecer dentro da Fundação Dorina. Então, eu começo a desenvolver a etiqueta. Não eu, mas eu com uma pessoa com deficiência e é o que eu venho carregando desde então. E aí hoje me interessa ter como parceiros profissionais pessoas com deficiência, exatamente para poder dar continuidade ao trabalho. O trabalho só vai andar se eu tiver junto delas, e ele não é um trabalho meu, ele deixa de ser uma coisa… eu posso até ter as minhas ideias, mas eu vou também trabalhar com as ideias dessas outras pessoas e ele passa a ser um trabalho nosso.
(01:59:09) P1 - Colaborativo, né?
R1 - Ele é colaborativo. E aí tem tudo a ver com o que falam as pessoas com deficiência: “Nada sobre nós, sem nós”.
(01:59:26) P1 - Interessante. A gente já está encaminhando para a parte final. Pensando agora em tudo que você falou da sua carreira, tem algum momento que é extremamente marcante?
R1 - É muita coisa, né, Grazielle. Eu acho que eu tenho muitos momentos marcantes, mas uma das coisas que eu acho interessante, em como a minha carreira acontece, são esses entrecruzamentos. Então, eu vejo que os momentos marcantes, na realidade, decorrem dessas passagens, que nunca são de uma hora para outra. Então, um momento marcante da coleção Olhar, Olhares, por exemplo, é o fato de eu e o João termos loja. Então, a loja antecipa esse momento, a abertura da loja antecipa esse momento, por exemplo, como várias coisas que aconteceram antes dela, para poder chegar aqui, nesse momento. Então, a loja é um momento marcante na carreira, a abertura dela, porque a partir dela um monte de coisa começa acontecer. Eu diria que eu tenho uma carreira até a loja e uma carreira que começa na abertura da loja e que vai se transformando ao longo do tempo e aí tem momento especialíssimos. Por exemplo, a própria docência me traz momentos incríveis e coisas que você vai descobrindo ao longo do caminho, que muitas vezes você não estava percebendo. Eu acho que esse contato, inclusive, com os jovens é e continua sendo importante para a continuidade do trabalho, porque é quem vai estar fomentando coisas aí e questionando coisas e que talvez não tenham ainda a maturidade, vamos dizer assim, para chegar em determinados posicionamentos, mas tem para poder levantar polêmicas e questões. Que essa convivência também é marcante.
(02:02:30) P1 - E a dança e o figurino, ainda é presente na sua vida?
R1 - Não. A dança e, principalmente, o figurino eu já não trabalho com isso já tem alguns bons anos, até por todo encaminhamento da minha carreira. Então, o último figurino [que] eu fiz, em 2015, eu estava no meio do doutorado, quase finalizando. A partir do doutorado dá uma reviravolta muito grande e eventualmente eu cheguei a fazer alguns pequenos figurinos para websérie e tal, mas só e sem tanto aprofundamento, quanto era o meu trabalho. E a dança, hoje em dia, não está com muito espaço, mas a não ser como um grande espectador.
(02:03:34) P1 - Eu queria saber também, na época da pandemia, que ela estava superforte, como é que foi para você, o seu trabalho e também pessoalmente.
R1 - A época da pandemia foi... como é que eu vou te dizer? No começo de 2020, eu assumi a coordenação dos dois cursos de moda da Anhembi: Design de Moda e Negócio da Moda e eu assumi essa coordenação em janeiro e em março começou a pandemia. E aí eu fiquei nessa coordenação até 2021, até o segundo semestre de 2021. Então, o que acontece? Durante todo período da pandemia, eu estava coordenando dois cursos, dando aula e tudo sendo feito à distância. Eu tive que fazer uma grande adaptação na minha vida, porque eu já acompanhava a coordenação anterior, que vinha dos cursos de Negócio da Moda e de Design de Moda, eu era muito próximo, trabalhando ali, junto mesmo, como assessor acadêmico, mas eu estava acostumado a um contato presencial e, de uma hora para outra, a nossa vida virou uma vida remota, então foi muito complicado entender isso tudo e entender todo o processo de ser um profissional atuando em uma coordenação de cursos (risos) de uma maneira como a gente nunca tinha vivido. E aí, o começo da pandemia, os primeiros quatro meses, a gente viveu dentro desse apartamento e aí eu tive a oportunidade, tive uma semana de folga no ‘meio do caminho’ e essa semana foi uma coisa maravilhosa, porque a gente já alugava uma casa em São Francisco Xavier e nós fomos para o interior e lá a gente se preparou exatamente para poder ter toda a infraestrutura, uma internet legal, essas coisas todas, para poder trabalhar à distância. Mas não foi fácil, com certeza não foi fácil você tentar entender esse outro ritmo de vida, em que, apesar de eu estar em um lugar que eu estava no meio da roça, então tinha área verde, essa coisa toda ao meu redor, mas mesmo assim você estava levando toda uma condução de trabalho de uma forma completamente diferente e não era virar e falar assim: “Semestre que vem a gente já vai estar mais acostumado”. Não, não estava mais acostumado, porque cada hora era uma coisa. Então, a gente tinha que viver a cada momento achando que aquele momento não fosse durar, mas durou e tivemos que lidar com as perdas, lidar com um monte de coisas, então a gente perdeu muita coisa, acho que ganhou muita coisa em termos de aprendizado próprio, mas perdeu muita coisa, inclusive pessoas e foi muito triste, muito complicado.
(02:07:27) P1 - E por que São Francisco Xavier?
R1 - Olha, São Francisco Xavier aconteceu na nossa vida exatamente em função de uma pessoa que a gente perdeu na pandemia, que nos apresentou São Francisco Xavier lá no comecinho dos anos 2000. Eu não lembro direitinho que ano que foi isso, se 2002, 2003, mas lá no comecinho. Quando a gente conheceu São Francisco Xavier não era o que é hoje, evidentemente, e a gente começou a ir, de tempos em tempos, à São Francisco. Até que de 2008 para 2009, indo pra São Francisco, veio a ideia e eu mais o João, mais a Eloíse, mais a Mirian, a gente ia alugar uma casa em São Francisco Xavier, aí a gente aluga e fica nessa casa. Na realidade, eu e o João ficamos menos tempo, a gente acaba voltando pra São Paulo, porque quase vai coincidir com o meu período de começar a fazer o doutorado, um pouco antes, só que a vontade de ir para São Francisco estava sempre ali presente, porque lá é um lugar muito especial, é muito linda a cidade, a região é muito bonita. E aí, quando foi há cinco anos, eu falei que queria passar o meu aniversário de sessenta anos em São Francisco Xavier e aí a gente acabou alugando uma casa e foi a casa que nos acolheu durante a pandemia. Então, a gente tem um afeto, uma afinidade, e hoje, com pessoas que moram lá. Então, a gente começou também a ter um vínculo com pessoas que moram na cidade, que fica especial.
(02:09:49) P1 - (risos) Sim. Além do trabalho em São Francisco Xavier também, que você comentou, vocês têm algum hobby, alguma coisa que vocês gostam de fazer?
R1 - Olha, antes a gente adorava ir para cinema, teatro especialmente e tudo mais. Eu faço uma coisa que eu adoro, que é pilates, então eu adoro fazer, praticamente toda semana eu estou ali, marcando presença, porque eu acho uma delícia, mas tinha essas outras coisas mais de ordem cultural, vamos dizer assim, que depois da pandemia isso não voltou, por incrível que pareça. Não sei se a gente vai acostumando com o tal do streaming e a comodidade que isso vai trazendo para a vida da gente, mas a gente, hoje, fica mais quieto dentro de casa, sem muitas atividades externas, sem muitos hobbies. Eu tenho um hobby que eu adoro e que já tem um tempo que eu não estou fazendo, mas que é marcenaria. Então, em São Francisco Xavier eu tenho lá as minhas maquininhas e tal e eu fico inventando algumas histórias e fazendo algumas coisas na madeira, que eu adoro e mexer com algumas coisas, a pintura que a gente fazia, lá atrás, nas camisas, então de vez em quando eu ainda faço alguma coisa, desenho. O João borda, então a gente até faz uns trabalhos ali, tem um trabalho que é feito por nós dois, o desenho é meu e o bordado é dele. Depois eu te mostro. Posso até, depois, mandar uma foto disso, para ilustrar. E é isso.
(02:11:48) P1 - Antes de ir para as perguntas finais, mesmo, eu queria te perguntar uma coisa: a casa que você cresceu ainda existe, lá em Belo Horizonte?
R1 - Existe.
(02:12:01) P1 - E não é mais aquele lote vazio?
R1 - Não, agora lá é um bairro super urbanizado, movimentadíssimo e o prédio, em si, virou outra coisa. O prédio ainda existe, com a mesma arquitetura, mas hoje ele é um pouco diferente: o tipo de mercado, o comércio que está em baixo, a loja de roupa, de brinquedos e eu nem sei como são ocupados os apartamentos, para dizer a verdade.
(02:12:31) P1 - Mas não pertence mais à sua família?
R1 - Não pertence mais a minha família, não.
(02:12:37) P1 - E eu queria te perguntar também: hoje quais são as coisas mais importantes para você?
R1 - Saúde e bem-estar, acho que essas duas são as mais importantes.
(02:12:56) P1 - E você tem ainda um sonho?
R1 - Nossa! Eu acho que vai ter só um dia que eu vou parar de sonhar e espero que esteja bem distante. É muito sonho, tem muita coisa que eu tenho vontade de fazer, algumas delas que eu quero, inclusive, começar a ‘tocar’ a partir de agora. Então, a própria saída minha da universidade não quer dizer que eu vou parar de dar aula, mas não quero continuar dando aula da maneira que eu dava aula, eu quero um outro ritmo para isso, mas a minha saída é exatamente para eu poder pensar em alguns dos sonhos que, durante o período de docência, você acaba não conseguindo. Eu era um professor muito envolvido com toda a dinâmica dos cursos, então eu estava sempre ali, muito próximo, até por conta da quantidade de tempo que eu fiquei como professor. Então, a minha saída foi a do professor mais antigo dos cursos de moda da universidade Anhembi-Morumbi, fiquei lá quinze anos e meio, então é muito tempo. Eu dei aula para professoras que estão agora comigo. Então, várias professoras dos cursos de moda hoje foram minhas alunas e que já fizeram mestrado e estão acabando doutorado, entendeu? Então, agora muito sonho pela frente, espero poder concretizar.
(02:14:42) P1 - Qual você acha que vai ser o seu legado pras próximas gerações?
R1 - Uau! Olha, sinceramente, eu gostaria que essa ‘sementinha’ da inclusão que eu estou ‘plantando’ nesses anos todos, que isso virasse ‘árvore’ e que desse muito fruto. Eu sei que é muito difícil. Então, eu estou aí envolvido com essa história há 21 anos, desde que eu comecei a minha pesquisa, ainda na época da loja, e os passos que foram dados, na realidade, são desse tamanhozinho. Então, eu acho que ainda tem muita coisa para acontecer. Essa ‘sementinha’ eu acho que é só um ‘brotinho’, por enquanto. Ela ainda precisa ‘ganhar corpo’. Então, eu sinceramente gostaria muito que isso fosse um legado.
(02:16:03) P1 - Tem alguma coisa que eu não perguntei, mas você gostaria de acrescentar?
R1 - Eu acho que não, porque eu falei tanta coisa também, eu falei demais, não sei se de repente...
(02:16:16) P1 - Vocês querem perguntar alguma coisa? Não? E, por fim, a última pergunta é: como foi contar um pouco da sua história para mim, hoje?
R1 - Emocionante. Foi emocionante, inclusive, reviver, passar por muitos momentos da minha vida. Eu não imaginava o que ia acontecer, eu não me preparei para isso, eu deixei que a coisa acontecesse. Eu sabia o que seria, até porque eu cheguei a entrar no Museu da Pessoa para poder ver como estava o trabalho mais recente, porque eu já conhecia o Museu da Pessoa para trás e eu queria ver o que era o trabalho mais recente, aí eu assisti e falei: “Eu não vou me preparar”. Para eu dizer a verdade, a única coisa que eu me preparei, eu virei para uma das minhas irmãs e falei: “Onde é que papai nasceu?”, (risos) que eu não sabia, aí ela me deu a informação e também me falou sobre os meus avós maternos e paternos, então ela foi um pouquinho para trás aí, dizendo alguma coisa a respeito disso, mas eu não me preparei e eu fiquei muito comovido de fazer essa passagem, contar um pouco dessa trajetória e agradeço por isso.
(02:17:39) P1 - A gente que agradece. Muito obrigada, de verdade. Pra gente é um prazer.
R1 - Obrigado!
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