Aqui em Luís Eduardo não existia nada. Tinha um posto de combustível com duas bombas, uma de gasolina e outra de diesel. Álcool não tinha. Fomos para a comunidade da Bela Vista, que fica a sessenta quilômetros daqui, e lá nós formamos uma comunidade. A gente que escolheu o nome, nós formamos onze famílias no dia em que chegamos.
Meu pai sempre tinha o sonho de ter condições melhores, então ele trouxe toda a família para cá para comprar mais terra. Na época a gente não sabia o que produzia aqui, e a gente achava que na verdade vinha para criar gado, porque não conhecia o cerrado. No começo plantamos arroz, depois começamos a fazer experiências com soja, na perspectiva de dias melhores para a geração futura.
A gente morava embaixo de barraca de lona, não tinha água. Tinha que ir buscar a vinte quilômetros daqui, em uma lagoa na cabeceira do Rio de Pedras, com tambor de lata. Às vezes o motor não funcionava, tinha que carregar tudo de regador, naquele morrinho para cima, encher os galões. A gente usava a água que lavava a roupa, lavava louça; era tudo para irrigar a horta, pra gente ter cheiro verde e algumas verduras. Foi muito difícil, sem moradia decente, sem água, sem luz. Não tinha geladeira, depois a gente teve geladeira a gás.
Uma noite eu estava esperando o Aristeu e eu escutei um barulho no piso. Tinha uma aranha desse tamanho entrando dentro de casa, aquela caranguejeira que eles falam, mas a gente enfrentava tudo, matava cobra a pau.
A gente saiu de uma cultura que a gente tinha de tudo; meu marido era funcionário do banco, saiu da cidade. Chegamos ali e não tinha nada, os animais vinham comer as coisas que nem lobo, chegavam até pertinho de casa. Tivemos que ter muita coragem.
Em 84 deu poço na Bela Vista. A gente não tinha água encanada, mas ia lá buscar, botava na caixa, daí nós tiramos uma água boa. Mas no começo, para tomar aquela água da represa, nós tínhamos que ferver, filtrar e ainda todo...
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Aqui em Luís Eduardo não existia nada. Tinha um posto de combustível com duas bombas, uma de gasolina e outra de diesel. Álcool não tinha. Fomos para a comunidade da Bela Vista, que fica a sessenta quilômetros daqui, e lá nós formamos uma comunidade. A gente que escolheu o nome, nós formamos onze famílias no dia em que chegamos.
Meu pai sempre tinha o sonho de ter condições melhores, então ele trouxe toda a família para cá para comprar mais terra. Na época a gente não sabia o que produzia aqui, e a gente achava que na verdade vinha para criar gado, porque não conhecia o cerrado. No começo plantamos arroz, depois começamos a fazer experiências com soja, na perspectiva de dias melhores para a geração futura.
A gente morava embaixo de barraca de lona, não tinha água. Tinha que ir buscar a vinte quilômetros daqui, em uma lagoa na cabeceira do Rio de Pedras, com tambor de lata. Às vezes o motor não funcionava, tinha que carregar tudo de regador, naquele morrinho para cima, encher os galões. A gente usava a água que lavava a roupa, lavava louça; era tudo para irrigar a horta, pra gente ter cheiro verde e algumas verduras. Foi muito difícil, sem moradia decente, sem água, sem luz. Não tinha geladeira, depois a gente teve geladeira a gás.
Uma noite eu estava esperando o Aristeu e eu escutei um barulho no piso. Tinha uma aranha desse tamanho entrando dentro de casa, aquela caranguejeira que eles falam, mas a gente enfrentava tudo, matava cobra a pau.
A gente saiu de uma cultura que a gente tinha de tudo; meu marido era funcionário do banco, saiu da cidade. Chegamos ali e não tinha nada, os animais vinham comer as coisas que nem lobo, chegavam até pertinho de casa. Tivemos que ter muita coragem.
Em 84 deu poço na Bela Vista. A gente não tinha água encanada, mas ia lá buscar, botava na caixa, daí nós tiramos uma água boa. Mas no começo, para tomar aquela água da represa, nós tínhamos que ferver, filtrar e ainda todo mundo vivia cheio de verme, porque imagina aquela água… Nosso tambor era enferrujado, era muito complicado.
Meus filhos nasceram aqui. É uma história bem complicada, porque Luís Eduardo não existia. E eu engravidei logo, fiz tratamento para ter esse filho em Taguatinga, no Tocantins. Só que quando cheguei lá para ter esse menino faltou luz e o médico fugiu do hospital, porque ele tinha medo que acontecesse alguma coisa. Naquele tempo, falavam que o gaúcho era bravo, que o gaúcho matava, e ele fugiu do hospital. Ele só falou com uma enfermeira para nós procurarmos outro hospital, e nós saímos dali, sem saber nem que rumo tomar.
Fomos rumo a Campos Belos, que estava a 122 quilômetros. Levamos quatro horas e 45 minutos pra chegar nessa cidade. Meu filho quase nasceu pelo caminho, foi uma experiência terrível para mim, como mãe de primeira viagem, passar tudo isso. Graças a Deus, optamos por Barreiras no segundo filho. Barreiras tem mais estrutura.
Foi difícil com as vacinas das crianças, não tinha quem vacinasse. Eu ia para Barreiras, pegava as vacinas, trazia em uma caixa de isopor no gelo. Vacinava as crianças no fim de semana e na segunda-feira levava a guia para lá, com tudo registrado - quantas vacinas foram feitas, quais foram feitas.
Teve um conflito de terra e botaram fogo na nossa propriedade. Queimaram tudo o que meu pai tinha, desde máquina, a casa de morar, tudo. Meu pai era uma pessoa muito corajosa, sempre teve muita fé em Deus. Ele falou assim para nós: “Isso aí está virado tudo em cinza, mas trabalhando tudo se consegue.” Com oito anos, meu pai já tinha de tudo de novo.
Quando viemos para a Bahia tínhamos dois sonhos: sermos felizes e ficarmos ricos. Ricos não ficamos, mas somos felizes, isso basta. Amamos essa terra, que é a Bahia, amamos de coração. Já estamos muito mais tempo aqui na Bahia do que a outra parte, que nós vivemos no Sul. Eu não voltaria mais. Hoje a Bahia é meu chão, eu me realizo aqui, eu gosto daqui, os meus filhos moram aqui. A gente se sente muito realizado, com tudo o que nós passamos. Acho que hoje, olhando para trás, valeu muito a pena.
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