Projeto Memória dos Brasileiros
Depoimento de Alírio Santos
Entrevistado por Antônia Domingues e Thiago Majolo
Local: Sobradinho - Bahia
Data: 08/12/2007
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número MB_HV092
Transcrito por Ana Lúcia V. Queiroz
Revisado por Viviane Aguiar
Publicado em 05/02/2009
P1 – Para começar, eu quero que o senhor fale primeiro seu nome completo.
R – Alírio Santos.
P1 – Alírio Santos. Local de nascimento?
R – Muniz Ferreira.
P1 – Onde fica isso?
R – É próximo a Nazaré.
P1 – E em que dia o senhor nasceu?
R – 16 de novembro de 1940.
P1 – Qual era o nome dos seus pais, Alírio?
R – Maurício Santos.
P1 – Sua mãe?
R – Maria Sousa Santos.
P1 – O que eles faziam?
R – Mãe era doméstica, e pai trabalhava no campo. O homem trabalhava no campo destruindo a natureza (risos). Pela ignorância. Um homem destruindo a natureza naquele tempo era ignorância. Hoje, tem a pessoa que destrói sabendo.
P1 – Eles eram de onde?
R – Eles eram de São Felipe. Minha mãe era de Conceição do Almeida, e meu pai era de São Felipe.
P1 – Na sua casa eram quantos irmãos, Alírio?
R – Seis.
P1 – Quantos homens e quantas mulheres?
R – São duas mulheres e quatro homens.
P1 – E como era essa infância cheia de irmãos?
R – Ótima, passava, interessante. Naquele tempo, a gente passava necessidade de alimentação, mas tinha paz. E, hoje, você vê, cria os filhos, por sinal eu não posso reclamar, porque eu tenho três ouros. São esses três aí. Esse outro é um técnico em informática, de primeira, os outros já estão no mesmo caminho. Tem um que é programador, ele já é gerente de um cabra. Esse daí, quando eu aposentar, ele vai vender computador. Eu vou dar um carro a ele e vou ser muito bem motorista dele, para passar experiência para ele. Experiência de estrada. E os outros, eu tenho um irmão que é mestre de obras, que chama Antônio. Tenho uma irmã que é doméstica. Tem uma menina que é enfermeira, uma irmã. Tenho um irmão que trabalha de camponês ainda. E tem um outro que é motorista de praça, de táxi. Todo mundo alojado. É isso, que, até hoje, tive um arrependimento de quando eu fiz controle de natalidade. Porque tem cabra que faz controle de natalidade, nascem dois filhos e os dois não prestam. E antigamente você tinha seis, e prestavam. Entendeu? E, hoje, eu fico olhando assim, vejo os caras que fazem controle de natalidade. Quando chega lá na frente, não dá em nada. Eles fazem aquele controle, eu conheço família com 20 pessoas. E todo mundo. Eu conheço uma família que tem nove engenheiros, numa família. Tudo pobre. Esses meus, graças a Deus, todos os três, eles são técnicos em informática e estão se preparando para voltar para a faculdade. Por sinal, aquele mais velho fez vestibular agora, porque ele abandonou a faculdade por situação financeira. Vocês sabem, porque vocês estudaram, sabem o quanto os pais de vocês sofreram. Isso aí é uma coisa que nesse país melhorou. Nós não vamos dizer que o nosso país não melhorou, mas nós precisamos de mais melhora ainda, cultura. Em meu tempo, eu me preparei para entrar numa empresa federal igual à Chesf [Companhia Hidrelétrica do São Francisco]. Eu cheguei, e já cheguei acabando com tudo. Esses negócios de mecânica, esses negócio, tudo é comigo. Eu tenho uma pessoa da Chesf que me deu muito a mão. Um engenheiro que construiu aqui, chama João Paulo. Ele, por sinal, é um fenômeno esse cara, me ajudou muito. Eu fui, fiz estágio, trabalhei, fui emprestado cinco anos, fui o oitavo melhor em sismologia no Brasil, depois voltei, assumi o transporte da Chesf por sete anos. Fui primeiro lugar na Chesf toda. Fui primeiro lugar, eu tenho até carta aí. Eu tenho carta de elogio até de um ministro certa ocasião, quando, na campanha da meningite, eu fui recorde na campanha da meningite. A gente, a minha equipe, foram 285 pessoas que a gente vacinou. Eu ganhei até prêmio, foi ótimo. Foi ótimo, eu na vida não tenho nada de dizer sobre tristeza, não. Só tem vitória. Agora, você sabe que, na vida, quando a gente tem muita vitória, tem a complicação dos próprios colegas. Isso aí, até quando você se destaca numa sala de aula, uns gostam de você e outros não gostam. Vocês são jovens, estão no caminho certo. Agora, seja humano, caridoso, que eu sou daquela raça do Chico Xavier, que eu não esqueço daquele cara, porque para mim foi um dos maiores brasileiros, e o cara pensa que não foi. Mas um dos maiores brasileiros foi Francisco Cândido Xavier. Esse cara para mim é um desafio mesmo. A minha vida é ótima, ótima, ótima mesmo.
P1 – Só voltando um pouquinho, eu queria que você contasse como é que era essa brincadeira com as suas irmãs. Aprontava muito, trabalhava muito, como é que era?
R – Não, vocês sabem que o jovem, hoje, tem uma educação diferente. Mas brincava muito, brigava muito, tinha muito assim… Infância, o que era a infância? A gente saía de manhã, ia passear por aquela roça. Quando você está passeando pela floresta, você pensa que você não está no lugar que presta, mas você está no melhor lugar que deve existir. Você, quando volta da floresta, você volta com a cabeça completamente diferente. É completamente diferente. Eu fico hoje invocado, e esses meus aí foram criados de uma maneira, só computadores, só computadores. Isso aí acaba com o jovem. Você vê que o cabra tem que trabalhar sábado, domingo. Quando é fim de semana tem que ter um lazer. O lazer hoje de vocês não é igual ao meu. O meu foi melhor. Você vê que hoje eu me lembro de coisa que aconteceu comigo com cinco anos de idade.
P1 – Conta alguma história, então? Conta alguma coisa que aconteceu com você com cinco anos de idade?
R – Na década de 45, em 1945, eu tive a liberdade de visitar um avião. Quando eu estava na campanha da meningite, eu fui visitar o avião do dia que terminou a guerra, 1945. Em uma ocasião, fui fazer um psicotécnico com uma criatura em Salvador, ela disse que eu era maluco. Que eu me lembro, que eu estava com cinco anos quando terminou a guerra de 45. O avião rodando e jogando panfleto, e o povo se abraçando. Cinco anos. Hoje, se você procura saber, o cara que nasceu, com dez anos não sabe mais. Por exemplo, a gente teve um eclipse muito importante, foi em 51, ou foi 52, foi quando o dia virou noite, 15 para as nove. Eu me lembro até o horário. Quinze para as nove, a galinha começou a subir o poleiro, e o dia começou a escurecer. Demorou uns 15 minutos, o galo começou a cantar, e o dia começou a sair novamente ao normal. Eu já procurei saber das pessoas: “Não, não sei quando foi.” Eu não esqueço nada, não. Você vê, eu viajo com esse pessoal. Ave Maria, é um pessoal assim igual a tu, assim da tua idade, e dizem: “Ah, meu pai, agora só vou viajar com você.” Fazer o quê? Eu viajo com você daqui até Brasília, o cara não sente um choque, porque você sabe que hoje, na pista, a gente está com um problema sério, que os motoristas estão saindo das escolas e não têm capacidade. Você viu? Outro dia mesmo para aqueles lados lá do Paraná, aquele acidente foi grave aquilo ali. O cara com 7 quilômetros, invadiu a pista, por 7 quilômetros, e matou o pessoal. Tenha paciência, isso aí é falta de cérebro do cara. Ah, se deixar eu converso o dia todo.
P1 – Conta para a gente como era a brincadeira na floresta.
R – Ah, não! A brincadeira antes era porreta, era brincando de rodinha, por exemplo. Você não tinha recursos, hoje o cara já nasce com uma bicicleta. A gente fazia aquelas rodinhas de borracha e saía empurrando. Ia para a floresta comer fruta. Tem um engenheiro, que ele brincava comigo que eu nunca fui doente. Ele disse: “Alírio, o que é que tu tem que tu não adoece, não gripa, nada disso?” Eu disse: “Rapaz, eu tive uma infância muito ruim, minha mesa não tinha queijo.” Ele disse: “Como é que você se alimentava?” Tinha batata, era coco, inhame, esses negócios, isso era o que acontecia. Tinha até o prefeito de Nazaré, era um galeguinho igual a você. Eu ia para a escola, e levava batatinha enrolada não papel. Ele roubava. Hoje ele é médico, eu brincava com ele demais, até com vocês aqui eu brinco. Aí, eu digo: “Pronto, nego está roubando muita batata.” Ele roubava a batata que eu levava, e eu dizia assim: “Eu vou olhar quem é que tinha roubado a minha batata.” E suspendia a boca para ver quem é que tinha a massa da batata. Ele, hoje ainda, brinca comigo. “Alírio, você ainda está daquele jeito, tu era danado.” Agora, era um jovem muito danado, era um menino muito danado. Hoje eu fico olhando o meu, uma educação fora de série. E tem um negócio: é educado sozinho. Não tem aquele negócio de família. A geração e a tradição da família, isso influi muito. A gente tem muita influência da tradição da família. Muita mesmo. E eu tenho um problema: eu só andava com gente rico. Até quando eu cheguei em Sobradinho, era assim: só andava com as pessoas de cultura. Velho, ave Maria! Eu adorava conversar com velho. Eu me lembro que, numa ocasião, um velho chegou para mim, eu trabalhava, era motorista do prefeito em Nazaré, já estava escolhido, e disse: “Rapaz, você vai ser empregado federal ainda, com 32 anos.” Eu tinha 25. “Ainda vai demorar cinco anos, sete anos?” Eu comecei trabalhando e aprendendo. Quando eu vim para Sobradinho, eu tinha 32 anos. Eu era justamente mecânico de primeira qualidade, mecânico de máquina de tecido, e motorista de caminhão. Aí, eu vim para Petrolina. Eu disse: “Eu vou fazer o seguinte, se eu achar uma vaga, até para varrer rua eu vou.” Aí, é a disposição. Eu digo a vocês uma coisa: trabalho em qualquer coisa. Trabalho não é… Trabalhar, para mim, é uma honra. Eu fiquei em Petrolina, depois, quando eu estou sentado jantando, chegou um cara para mim. Ele era de família de bem, ele era gerente dos Coelho, sabe? “Alírio, você está fazendo o quê aqui?” “Eu estou desempregado.” “Estava, mas já está empregado.” Eu fui lá para os Coelho, ele já sabia que eu tinha bagagem, disse: “Eu vou arranjar emprego para você.” Eu disse: “Vambora!” Quando chegou lá, só tinha para montar filatório, chama fiadeiro. Eu só sei que comecei a trabalhar com o pessoal de São Paulo, no fim da conta eles queriam me contratar. Agora, eu não moro em São Paulo. Já fui muitas vezes lá descarregar caminhão, esses negócios, mas eu não moro em São Paulo. São Paulo é uma loucura. Vocês hoje por aqui, vocês estão de cabeça fria, mas, por ali, é uma loucura. Aí. ele disse: “Vamos, vambora para lá, eu já fiz chapa lá e já vinha direto para montar uma fábrica em Picos.” Aí, também, eu estava sem casar, né? Eu casei com 32 anos. Vim passear em Sobradinho, mas parece um destino de Deus. Aí, quando chegou em Sobradinho, eu cheguei na Chesf Engenharia, eu disse: “Tem vaga para carreteiro?” O cara disse: “Tem.” Eu era empregado. Naquela hora de folga, eu disse: “Nunca saia de um emprego, sem antes acertar outro.” O melhor é você se preparar naquele que você está e, aí, partir para outro, porque se o outro der certo… E ir caladinho, né? Fazer calado. Eu cheguei, falei com o cara, e o cara disse: “Tem vaga.” Aí, me chamou para fazer o teste. Peguei a carreta, comecei a fazer manobra. Ele disse: “Pronto, segunda-feira você vem.” Eu estava empregado, porque toda a vida eu fui treteiro. Resultado: saí a pé lá do escritório, quando foi subindo, disse: “Mas meu negócio é emprego federal.” Encontrei um acampamento da Chesf, cheguei parecendo um besta, que eu gosto muito de dar uma de besta. “Rapaz, vocês não têm vaga para motorista, não?” Tinha um cara, que por sinal ele se aposentou agora, por sinal ele gosta da minha cara como o diabo, ele chegou parecendo um besta. Ele disse assim: “Não tem, não, me dê sua habilitação.” Foi quando saiu a carteira classe C, C2. Eu peguei a carteira de habilitação, dei a ele. Ele chegou, olhou assim. “Sabe, doutor, é desse que a gente está procurando.” O negócio já melhorou. Aí, me chamou, mandou eu preencher uma ficha, eu preenchi, marcou o dia de vir fazer o teste. Eu trabalhava de dia, para poder trabalhar de noite, para ficar folgando de dia para poder vir. Eu vim umas oito vezes, aí encontrei uma pessoa que era amigo de meu pai, olha a coincidência aqui! Procurou saber: “Você é filho de Maurício?” “Sou.” “Rapaz, eu sou o chefe da comunidade aqui.” Encostei logo no cabra. Aí, apareceu outro, o cunhado de Roberto Freire. O cunhado de Roberto Freire morava em Petrolina. Sabe quantas vezes eu ia na casa dele por dia? Três vezes. No dia do concurso, que eu fiz concurso na Chesf, eram 36 para cinco vagas. Quando eu terminei o teste de direção, o cara disse: “Pode ficar sentado embaixo de pé de umbu, que você já está fichado.” E eu estava nos Coelho, assunto, só história. Eles me chamaram, naquele tempo era fichado só na Eletrobrás. Para fichar, era na Eletrobrás. Eu vim com a carteira e eu morava em apartamento em Petrolina, ali defronte à igreja. Eu me apavorei, entreguei o apartamento. Não, eu só vou ficar na Chesf, aqui só era o acampamento, tinha casa quase nenhuma. Eu digo: “Não, eu durmo por lá mesmo.” Era disposto, eu sou disposto. Resultado: quando chegou aqui, o cara fichava, mas já era fichado no Rio, também na Eletrobrás. Quando chegou, o cara disse: “Rapaz, não vai fichar mais hoje, não. Só no dia 8 de janeiro.” Eu não tinha mais casa para morar, não tinha nada. Eu falei para uma pessoa, que eu me dou muito bem com Fernando Pernambucano. Eu fui muito ajudado por Pernambucano. Aí, falei. “Não, lá em casa tem um quarto, fica você e meu filho.” Agora acabou, eu já estava despreocupado, fiquei. Fichei na Chesf, 32 anos. Estou com 34, no dia 8 de janeiro estou completando 34 só na Chesf. Eu já tive problema na Chesf, porque eu sempre briguei pelos menos favorecidos, eu tenho esse problema na vida. Já bati de frente com vários mesmo. Várias pessoas. Porque, dentro de uma empresa, eu não sei se vocês são empregados, ou não são, mas o dia que vocês forem empregados, vão ter muito problema, quando você é da parte social. No governo Fernando Collor, me botaram para fora da Chesf. Eu saí nove horas, voltei dez horas. E o diretor foi embora. Então, isso aí, problema dentro do emprego. Se você é a favor do social não tem problema, você está com Deus. Agora, essas pessoas você encontra muito. Meu maior problema na Chesf é o seguinte: é que eu sou muito da parte social. Já me disseram que era para eu trabalhar na parte social. Hoje, quando o cara vai para um hospital – você sabe que quando o plano acaba é um problema – eu vou lá e eu tenho um diretor que eu telefono. Já tirei várias pessoas de um hospital e botei no hospital pago. Eu faço isso, eu sou danado, sou danado para isso. Pode perguntar mais.
P1 – Não, não. Estou ouvindo. Eu quero perguntar para o senhor uma coisa: quando o senhor chegou em Sobradinho qual era a diferença da cidade de que o senhor vinha para Sobradinho? O que o senhor sentiu?
R – Rapaz, o impacto foi enorme. É o mesmo que você sair de São Paulo para vir aqui. Você vê tudo diferente. Você está completamente em outro mundo. Quando eu cheguei em Sobradinho, eu vi só o acampamento. Quando a máquina cavava, encontrava só aqueles cemitérios antigos. Só era caveira. Mas eu estava com uma missão pesada, tinha pouco tempo que o meu pai faleceu, e eu tinha que arranjar um emprego para segurar minha família. Quando você entra numa dessa aí, igual a vocês quando entram no vestibular: é tudo ou nada, tudo ou nada. Aí, é o seguinte, é quando se chama disciplina. É quando a sua natureza está querendo que você volte, e você diz: “Eu fico, ou morro ou vivo.” Isso é uma coisa muito importante na vida da gente. É você ser terrível. Porque nada na vida, porque você só perde a esperança quando morre. Mas, enquanto você tiver vida, você tem que lutar. E a vida tem um negócio muito importante: você consegue o que você quiser, depende de você. Eu digo a meus filhos isso aí: você consegue o que você quiser, depende de você. Se você disser: eu quero ser um engenheiro, pode ser pobrezinho, você vai carregar feira na cabeça, e vai cumprir seu horário de escola. Eu trabalhei numa oficina de um cara por seis meses. Ele nunca me deu uma Coca-Cola. Minha paixão era saber fazer motor de carro. Hoje em dia, eu faço motor de carro brincando. Hoje não faço mais, eu chego para os mestres e digo: “Você vai fazer, é por aqui.” Você vê que, quando eu era chefe de oficina, era indiscutível. Você chegar dentro de uma empresa igual a Chesf e com quarto ano primário, os caras não gostam. A Chesf tem um problema meio diferente, que ela é meio racista, ela é racista. Vocês sabem que isso não acaba. Eu ganhar em primeiro lugar era difícil. Você vê, quando eu fui o primeiro cara, o oitavo cara melhor em sismologia, pegaram minha função e baixaram, botaram: homem observador em meteorologia, que é que eu faço, mas você tem que botar o pé para frente, não tem esse negócio de se amarrar, não. Você tem que ir para frente.
P2 – O que é sismologia?
R – Sismologia é quando você trabalha em abalo de terra, abalo sísmico, quando você trabalha em abalo sísmico, é sismologia. Eu sei fazer tudo, eu sei operar, eu sei fazer os cálculos, eu conheço o aparelho todo, eu aprendi tudo. Agora é que o cara que me botou, Doutor João Paulo, chora quando vê eu trabalhar. Ele foi procurar saber, numa ocasião, qual era meu grau de estudo. Não completei nem o primário. Começou a chorar. Hoje eu pego um projeto, eu sei o que é um projeto. Eu, quando cheguei aqui, não sabia, não. Eu só sabia rodar caminhão na estrada e mecânica. Mas hoje eu aprendi tudo de instrumentação. Teve serviço dentro da Chesf que mandou engenheiro, ele foi e quando chegou lá ele disse que não tinha jeito, não. Eu fui umas quatro vezes de avião por cima, disse: “Isso aí faz assim, assim.” Agora, esse cara é corda solta comigo. Numa ocasião, no dia que me botaram para fora da Chesf porque eu era contra o sistema deles, sistema radical, ele pegou meu retrato, mostrou, e disse: “Dê baixa em minha carteira e deixe a dele, que ele é um homem, um verdadeiro cidadão. Manda ele procurar um lugar para ele ir.” Tinha um engenheiro que era doido para ir para Salvador, eu sou de lá. “Alírio, vai embora para que agora?” Retornei para Sobradinho, foi aqui que eu cheguei quebrado e melhorei minha situação. Voltei a Sobradinho.
P2 – E conta uma coisa aqui para a gente: o senhor falou que, quando veio, eles estavam revirando os cemitérios. O que tinha aqui antes?
R – Aqui eram fazendas, aqui eram puras fazendas, aqueles cemitérios antigos. Existe em um livro de um americano. Ele diz que, aqui em Sobradinho, enterraram pessoas vivas. É mentira. Tinha muita caveira, como tinha aquela lá em Xingó. Eu participei daquela obra, a gente encontrou muita caveira, pessoas mortas de 2000 e poucos anos. Cemitério de índio. Por sinal, aqui não tinha, mas em Xingó eu vi, o índio e o pajé eram enterrados com uma panela aqui e outra aqui. Eu fui ver, eu sou danado, eu fui ver. Agora, quando eu cheguei aqui, era o seguinte, não tinha nada, não. Nós dormíamos lá no Rivero, era um galpão. Tinha umas 20 casas ali na frente do posto, e estava em construção. Tinha até um que eu botei um apelido, eu brincava muito: “Aqui parece que é filial do inferno!” O cara fazia a pista hoje, você passava hoje, aqui era pista, amanhã era asfalto. Eu fazia umas brincadeiras com os caras, e o pessoal dizia assim: “Aqui é filial do inferno.” Você passa hoje, não tem asfalto, amanhã você passa, tem. Era joia. Agora hoje, aqui já foi mais adiantado, nós tínhamos uma escola aqui que era um espetáculo. A Chesf, o cara terminava até a quinta série, ia para escola técnica, fazia o concurso, passava. O lugar que tem mais engenheiro formado e médico é Sobradinho. Existe uma equipe em Recife, que se ajunta agora em dezembro, só para comemorar. Tem aquele menino, que é secretário de obra de Rondônia, um galeguinho igual a você, eu vi aquele cabra nascer. Até a ser motorista, quem ensinou a ele fui eu, ele é secretário de obra em Rondônia, mas é daqui. O sonho dele é vir aqui, e diz que quer ficar comigo. Quem ensinou ele a dirigir fui eu, tudo fui eu. Aí, ele fez a faculdade de lá, se formou, foi para a Odebrecht. O cara que ganhou a eleição lá em Rondônia era engenheiro da Odebrecht. Levou ele, já vai completando seis anos, ele lá.
P2 – Seu Alírio, como foi, quem são as pessoas que vieram para cá para Sobradinho para trabalhar? O senhor viu todo esse movimento das pessoas chegando, não viu?
R – Vi. Vinham sete mil.
P2 – Como é que foi esse movimento das pessoas chegando?
R – Ah, bonito, era tudo bonito, assim de mala. Sobradinho era o seguinte, como era contratado esse pessoal? Se tinha o ônibus, ia para o Piauí, trazia o que chama peãozada, trazia tudo naquele ônibus, chegava aqui, fichava, dava o tíquete-refeição, e depois voltava e dava o alojamento. Bonito aqui de Sobradinho era quando os peões saltavam do gaiolão. Porque, antigamente, não era ônibus, o carro da obra era um gaiolão. Você precisava ver, era brincadeira. Saltavam 60, 70 peões de uma vez. E ali, onde vocês estiveram, onde está o bispo, para lá mais um pouquinho era um restaurante. No restaurante, era brincadeira. Até eu chegava lá dia de domingo, era uma brincadeira, era uma diversão. Era uma obra e a diversão. Agora, a pessoa que comandava Sobradinho era um cara de alta disciplina. Tinha até uma ordem que as mulheres não andavam de bermuda. A primeira coisa que se construiu em Sobradinho não foi a obra, foi, licença de eu falar, o brega. Primeira coisa construída. O cara da Veja fez uma reportagem uma vez, e ele perguntou uma vez, e a gente perguntou a ele, e a gente explicou a ele que lugar que tem sete mil homens, a primeira coisa que tem que construir é o quê? O cara não pensa. Foi a primeira coisa que foi construído. Aí, eles botaram o nome o Xililique (risos). Era tanto que, quando pegava um cara brincando com outro, dizia: “Eu vou mandar você lá para o Xililique.” Foi a primeira coisa que construiu em Sobradinho. Depois foi o quê? Primeiro o Xililique, segundo hospital e escola, que nós tivemos escola de qualidade aqui naquele tempo, é isso que eu acho que nosso país está atrasado. O menino saía aqui na quinta série, ia para a escola técnica e passava. Hoje, ele tira o segundo grau, vai e não passa. O que é que você acha? Está atrasado ou não está? A gente tem um hospital aqui que servia 21 mil pessoas. Não faleceram mais do que três pessoas durante o tempo de obra. E hoje não tem. Hoje, se o cara der um enfarte aqui tem que ir para Juazeiro. Você vê que eu tenho um carrinho, um Fusca. Comprei um Santana que eu tenho, 65, a falei para os meninos: “A hora que eu tiver com qualquer coisa, é só colocar dentro do Santana e tocar para Petrolina.” Porque, hoje, a gente gosta muito de Sobradinho porque é próximo a Petrolina e Juazeiro. Agora, nós precisamos de muita coisa. Você sabe, nosso político brasileiro, quando sobe no palanque, é para conversar besteira. Não bota ninguém para frente, não. A parte social aqui caiu muito, muito, muito, muito mesmo. Até que é uma parte aqui que o governo está atrasado. A parte social no Brasil está atrasada. Você vê que, com tudo, a parte social tinha muita gente precisando. No meu tempo de infância, a Medicina era pouca. Mas a alimentação não matava. E hoje você está encontrando o leite com soda cáustica. Rapaz, o que é que você acha? A mulher em casa, ela diz assim, é uma consciência muito pesada. Você tem um filho, você compra o leite pensando que você está alimentando seu filho, e você está fazendo o quê? Destruindo, destruindo. Precisa ver isso aí. Você vai na farmácia, compra o medicamento, pensa que você esta tomando um ótimo medicamento. Você está tomando medicamento de farinha. Eu tive um sogro aqui, eu disse à mulher: “Aquele cara morreu por causa disso.” A gente tratando dele lá no hospital, e o medicamento era aquele zero. Para esse lado, tem muita coisa a consertar. Aqui em Sobradinho mesmo, hoje encontrei o secretário, um secretário, e disse para ele: “Você, quando ia lá para casa, dizia que ia fazer e acontecer, e cadê você?” Ele baixou a cabeça e saiu, como quem vai continuar.
P2 – E, seu Alírio, como foi a primeira vez que você viu o Rio São Francisco?
R – Rapaz, é o seguinte: eu vi quando eu vim aqui. Eu vi a primeira vez, eu não conhecia o São Francisco. E, interessante, quando eu estudava o primário, eu estudei muito sobre a Cachoeira de Paulo Afonso, que ela media 73 metros de altura, que era uma queda-d’água muito importante. Aquilo tudo eu tenho na memória. Até que, um dia desses, eu estava em Paulo Afonso, eu fui olhar, só está a água no Véu da Noiva, que é onde sai a água da cachoeira, a verdadeira. A coisa mais original que tem lá é o Véu da Noiva. Coincidência, eu fui ver, com 32 anos de Chesf, eu fui ter tempo. Eu não tive tempo, não chegava lá e não tinha tempo. Chegava e voltava, chegava e voltava. Mas, ano passado, foi uma viagem tranquilona. Aí, eu disse: hoje eu vejo. O rio estava cheio o ano passado, eles abriram a comporta. Agora, o Rio São Francisco eu vim conhecer aqui. E por sinal eu sou apaixonado. Ontem mesmo, passando em Ibotirama, achei uma coisa triste: a água barrenta, e você vê um monte de areia para você passar andando de sandália. É o seguinte: essa briga do bispo está certa. O bispo não está proibindo de tirar a água do São Francisco. Está proibindo, porque é o seguinte: o Rio São Francisco é igual ao homem. Por exemplo, se você for doador de sangue, você não tem que ser bem alimentado? Você não tem que ser bem tratado? E não acontece isso com o Rio São Francisco. No Rio São Francisco, o cara só faz é depredar. Não tem ninguém para defender. A única pessoa que defende o São Francisco da Chesf é o engenheiro João Paulo. Ele está escanteado por causa disso. Você, por exemplo, tem um filho, um doador de sangue na sua família, ele tem que ser o quê? Bem tratado. Não é o cara só usufruir. Fez um levantamento de Xique-Xique a Paulo Afonso, eu nem digo a você a quantidade de motores que têm. E a água de irrigação? São águas que não têm proveito mais. Ela desce para o lençol freático. Você pode usar ela aqui, e ela ir até para o Piauí, ir para o petróleo, acontece. Uma coisa que eu não acreditava está aí. Quando eu vim da Bahia, eu não acreditava que, no Piauí, quando você cavava um poço, a água jorrava sozinha. Eu não acreditava, eu vi. É bonito. Eu conheci o São Francisco quando eu cheguei aqui. E me amarrei no São Francisco, eu acho que agora já era.
P2 – O que o senhor pensou quando viu o São Francisco?
R – Pensei que, para mim, era uma das maiores coisas. Apaixonei! Porque é o seguinte: você, quando chega num lugar, não se apaixona por uma coisa? Eu apaixonei pelo São Francisco. Eu sou muito apaixonado. Eu já levei muita cacetada dentro da empresa por causa disso. Eu sou um dos maiores defensores do São Francisco. Porque tem várias famílias, que os cara não olham isso, tem família com cinco filhos, tudo doutor, o cara trabalhou onde? Na Chesf. A primeira médica num congresso nacional saiu de Paulo Afonso, filha de um motorista. Quem foi que deu a luz, não foi o Rio São Francisco? Eu sou apaixonado pelo Rio São Francisco, isso aí não resta dúvida, não. Ali debaixo, aqueles meninos vão indo, nós brincávamos muito. Eu não chamo Rio São Francisco, eu chamo papai. Hoje, você tem uma empresa igual à Chesf, tem grandes irrigações, tudo que você tem hoje é com o Rio São Francisco. Nós todos dependemos do Rio São Francisco. Depois de Deus, nós dependemos do Rio São Francisco. Disso aí não resta dúvida. Esse negócio de desviar o Rio São Francisco, se era para ter água ali, o rio tinha nascido e ido para lá. Agora, esse problema do desvio do rio tem condições. O governo está fazendo um trabalho político, não é um trabalho social. Você chegava, fazia barragem em todas as bacias hidrográficas, igual ao Açude de Orós, não fez ele? Por que não fez até o Rio Grande do Norte? Mas, não. Fez isso até lá. Se você quer tirar água do São Francisco, tem condições? Você precisava de uma barragem e tirava água de lá, mas não quer. Mas não querem, só querem do lugar justamente político. Não tem condição. O São Francisco não tem condições, e eu peço a qualquer pessoa: trabalhe pelo São Francisco. Que ele é um rio que é pai de família. Pai de família mesmo. Quando eu passo por ali… Vocês vieram por onde? Veio por Barreira, não? Vitória da Conquista?
P2 – Juazeiro.
R – Não, quando você saiu lá de cima? Vocês não vieram de carro?
P2 – De avião.
R – Ah! Eu queria que vocês passassem em Morro do Chapéu. Para vocês verem que existia um rio ali em Morro do Chapéu. Os meninos dão risada comigo. Há dez milhões de anos existia um rio ali. Você precisa ver. Você vê o rio, só não tem água. Precisa ver. Eu digo a eles: “Em breve, o São Francisco está assim.” Desse jeito, que o São Francisco está morrendo, está. Tem que se cuidar logo cedo. O trabalho que eles estão querendo fazer aí é muito fraco. Ele precisa de dragagem. O Rio São Francisco é isso. Aqueles pés de árvores que tinham na ribeira caíram todos. Tem mais não.
P2 – Queria que o senhor falasse como é que foi essa transformação. O senhor chegou aqui antes da Barragem de Sobradinho, viu o São Francisco, as máquinas, e aí começou a transformar a paisagem, certo? Como é que foi essa mudança?
R – Meio ambiente. Você já está na parte do meio ambiente.
P2 – O senhor acompanhou tudo isso, acompanhou todo o processo. Conta para a gente o que o senhor viu, como é que foi?
R – Acompanhei. Aquilo era o seguinte: era um processo que, para você conseguir fazer a barragem, você tinha que destruir a natureza. Isso não resta dúvida. Aqui tinha muita umburana, não tem mais. E você sabe que aqui era um lugar que tinha 200 habitantes. Quando passou a ter 10, 15 mil, tinha a invenção de alguns de querer destruir, fazer um trabalho, derrubar uma árvore, fazer um negócio tipo o que acontece no Amazonas, não teve preservação. Não teve. Não foi preservado. É o seguinte: quando fez a barragem, eu tive pena de uma coisa, quando a barragem encheu. Você atacou o meio ambiente com seriedade mesmo. Hoje, tem lugar que, quando o reservatório seca, você ainda vê os esqueletos das árvores. Você vê. Agora a gente esta com um problema sério no Brasil, não é em Sobradinho. Hoje, ou nós construímos barragem, ou vai para a energia nuclear. Se você for escolher, você quer o quê? Vocês três, se forem escolher, vocês querem o quê? Energia nuclear ou energia mecânica?
P2 – Não pode ser energia solar?
R – Não. Energia solar não tem rendimento, não. O rendimento é pouco. Eu acho que a energia mecânica é melhor. Energia nuclear até eu tenho medo, que já estou no fim de carreira. E vocês que estão novos? E o Brasil que tem um problema sério? Você, para encontrar pessoa séria é difícil. É difícil. Porque você pode ter energia nuclear, você pode ter um problema lá, e o problema ser mecânico, pessoal. Você pode estourar um reator, pela mão de obra do homem. O homem, rapaz, se vende por besteira. Por besteira. Outro dia, vi Lula falando sobre o problema de energia, e disse: “Ih, Lula, tu vai ter que fazer barragem mesmo, não tem jeito não.” Agora, as barragens de hoje em dia, já tem barragem sem destruir a natureza. Já tem sistema sem destruir a natureza. Esse mundo de água que nós temos aqui, você vê, a gente tem 300 quilômetros de comprimento, 34 bilhões de metros cúbicos, quando ela está na cota, e 13 quilômetros de largura. Hoje, não precisa de mais muito, não. Hoje já tem um sistema completamente diferente. Essa ignorância já passou. Você vê que em Xingó a gente tem a barragem de Xingó. Não destruiu a natureza em nada. Nem um pé de manga não perdeu com aquela barragem. Foi ótimo, uma das barragens, eu dei nota dez. E só tem aquela. Uma no Brasil, outra na Alemanha.
P1 – Então, Alírio, eu queria que você contasse um pouco como é que foi se transformando a cidade, com o senhor trabalhando aqui. Conta um pouco como é que foi o começo.
R – Das transformações, né?
P1 – É.
R – Aqui era acampamento, juntaram aqueles políticos interesseiros, transformaram em cidade. Interessante que, na transformação de acampamento para cidade, se era de melhorar, piorou. Por sinal, o pessoal “chesfiano”, que é o cara que produz o dinheiro para aqui, tem o dinheiro, foi tudo embora. Por quê? Porque o padrão de vida de todo mundo caiu, acabou. Aí, começou a ter eleição. O que aconteceu? Entrou um cabra morreu, um cara que tinha interesse pelo social, esse tinha interesse, chamava Geraldo Silva. Eu trabalhei com ele, eu sempre ia mais ele, ele me adorava, porque a gente ia à missa. Ele ia celebrar missa, e eu ficava olhando. O cara tinha muita cultura, gostava muito de igreja, adorava o social, eu cansei de viajar para Recife, ele, o diretor mais João Paulo, e ele ia comprar só toalha para aquele pessoal pobre, que vinha com menino desenrolado, para a gente oferecer uma toalha. Era eu que oferecia. E você me pediu as transformações. De acampamento para cidade, piorou. Hoje, você não tem mais nada a desejar. Não tem mais escola que preste, não tem hospital, não tem supermercado. Hoje é um Deus nos acuda. Até que o cara espera soluções, mas vai ser difícil. E na prefeitura daqui trabalha gente que parece castigo. Só o pessoal dele, né? Agora executar? O lixo aqui passa oito dias. No tempo que era acampamento, igual você procurou saber, tinha apanho de lixo todo dia. Pois hoje é assim, de oito em oito dias. Você estava ali, passou o carro de oito em oito dias. E a Chesf entra com a taxa de um milhão todo mês para a prefeitura. Piorou, piorou. E tem um negócio que, se você tem um problema, que você, para resolver, resolve, mas é difícil. Porque não tem problema que não se resolva, mas é difícil resolver o problema daqui.
P1 – E o senhor trabalhava no quê nessa época?
R – No hospital. Olha eu comecei na Chesf trabalhando no hospital. Do hospital, fui servir a diretoria, da diretoria eu fiz o concurso. Eu digo: “Não vou ficar parado, não.” Fiz o concurso para auxiliar de campo com cinco caras, eu passei. Até que os caras ficaram foi zangados. Trabalhei de auxiliar de campo. Era o quê? Era sismologia. Fui para frente, só dirigindo e com duas funções. De lá, eu já saí para Itaparica, para fazer os estudos sismológicos. Eu já era o chefe, junto com o pessoal da USP [Universidade de São Paulo]. Os caras da USP fechavam os olhos, e eu já mandava os relatórios tudo prontos. Fui para Itaparica e montei todo o sistema de sismologia. Aí, fui convidado para Xingó. Em Xingó, não tinha ainda a precisão da sismologia, que é um estudo que a gente faz quando o reservatório está se aproximando por causa de falha geológica. O engenheiro com que eu trabalhava, o diretor, disse: “Não sei o que botar, só dá você.” Aí, me entregou a parte civil. Eu tinha que estar com o livro na mão, igual vocês vão precisar. Para baixo e para cima, feito um doido. Os caras me chamavam de “o leão”. Eu comecei a me entrosar com aquelas pessoas que era boas em construção. Resultado: trabalhei, o diretor me entregou a escola com 46 salas de aula. Tinha um engenheiro, o engenheiro era devagar. “Você vai trabalhar, você vai ficar com ele, agora o carro fica em sua mão.” Ele me entregou a escola, que era para entregar no mês de novembro, eu entreguei prontinha em outubro. O dia em que vocês passarem por aquela região de Xingó, vocês vão conhecer. Aí, a gente construiu. Eu me dei muito bem. “Vamos fazer o seguinte: você já vai construir a escola das crianças, com 18 salas de aula.” Eu fui, construí. Quando terminou o serviço de construção, eu fui montar o sismógrafo. Mas lá a gente montou só uma estação. Era assim: montei uma, por sinal eu fiz uma estação com sismo, fui capturar um sismo com 23 mil quilômetros. Aí, o engenheiro que era meu chefe disse: “Alírio, vai capturar nada com 23 mil quilômetros.” Quando foi com três dias que eu montei o aparelho, deu um sismo, no Japão. Não. No fim do Japão, 23 mil quilômetros, ele registrou como se fosse local. Aí, eu fiquei lá. Depois, deu um problema de transporte. Eu era a menina dos olhos do cara. Eles tinham um chefe de transporte, e o cara estava bem sabido. “Alírio, você vai para o transporte. Mas ninguém vai saber que você é o chefe.” Eu fui, consertei todinho. Quando eu fui aprovado lá, eu vim embora, que eu tenho um problema aqui. Sim! Em Xingó, a gente queria fazer o quê? Toda cidade que tivesse 50, 60, 70, 100, 200 pessoas, a gente ia preparar duas enfermeiras e fazer uma casinha como um posto, para colocar. Aí, o pessoal de Fernando Collor disse: “Esses caras querem derrubar a gente. Bota esse homem para fora da Chesf.” Foi quando chegou a minha demissão, e procuraram saber por que estavam me demitindo. Ele pegou na mão do presidente do sindicato. Você viu o que foi que aconteceu. Pegou na mão do presidente do sindicato. Foi quando eu vim para Sobradinho. Vim de volta. Já morei aqui duas vezes. Tem uma rua ali que chamava Rua Peixoto, eu morava lá. Fui embora. Corri o mundo todo. Quando voltei, voltei a morar na mesma rua. Na Rua Peixoto. De lá, eu comprei essa casa aqui. Eu comprei, e fim de papo.
P1 – O senhor tem alguma história muito boa do pessoal que morava por aqui, alguma historia interessante, da barragem?
R – Tem histórias muito boas. Tem pessoas que, na hora de serem desapropriadas, não aceitaram que a barragem ia dar certo. Eu estive conversando com um cara essa semana lá em Barreiras. Teve cabra que ficou dentro da casa até a hora que a água invadiu a casa. Aí, você vê que é um pessoal, a parte de índio que esse pessoal tem. Eles não acreditavam que a barragem funcionasse. Não acreditavam, não. Eu tenho uma história bonitinha. Tinha um enfermeiro que trabalhava comigo, Seu José, muito bom enfermeiro, cultura, né? O cara tinha cultura. A gente foi olhar as escavações da barragem daí do bloco, e a gente não tinha onde ir dia de domingo, o lugar para a gente de passeio era ali, só era passear por aqui mesmo. Quando ele olhou lá o buracão com 25 metros de profundidade de rocha, ele disse: “Eu só quero ficar vivo até o dia em que essa barragem ficar pronta.” Quando rodou a primeira máquina, eu disse: “Seu Zé, hoje esta no dia do senhor ir.” Ele disse: “Agora não quero mais, não. Vamos partir para outra.” Ele trabalhou aqui, aposentou, está morando em Petrolina. Tem muita, tem muita coisa. Sobradinho tem muita história para se contar. Passa mesmo do pensamento, que não é possível.
P2 – Conta mais sobre as pessoas que saíram, para onde elas foram? O senhor as conhece?
R – Ah, tem pessoas que saíram.
P2 – Conta para a gente.
R – Porque eu pedia que não saísse. Por exemplo, dos meus colegas, foram cinco. Só ficou eu. Tem gente que quebrou a cara. Eu dizia não saía, não, porque a Chesf é boa. A Chesf era o seguinte: você tinha um salário muito pequeno, mas ela dava o tíquete-refeição para você pegar marmita, porque o cara trabalha mais que carburador, trabalha mais pela comida. O cara ia lá, pegava marmita, comia duas vezes. Salário era pequeno. Foi passando, e uma parte do sindicato começou a atuar. O sindicato, teve uma ocasião que teve uma melhora de salário de 250%. Essa foi a maior vitória, 250%. Aí, foi melhorando. Melhorando, melhorando, e a gente chegou lá. Hoje em dia, a política da Chesf é meio devagar. Ela abre para uns, mas, se o cara é bem esclarecido, ela não gosta, não. Comigo mesmo, eu chamo todo mundo atenção. Eu trabalho com chefe, se ela errar, eu chamo ele. Você errou. Um dia, um chefe meu, um chefe excelente, eu estava em Irecê, às sete horas, ele telefonou. “Rapaz, você tem que fazer um serviço em Bom Jesus da Lapa.” Para você fazer um serviço de subestação, você tem que pedir o prazo, o horário, tudo tem. Daí, ele chegou. Estava em Irecê, dá 540 quilômetros, e a estrada não valia nada, a estrada não vale nada, só tem buraco. Ele pediu sete e meia, para a gente chegar lá meio-dia e meia. Eu cheguei duas horas da tarde, correndo, parecendo um cão. Andando a uns 160. Quando eu cheguei, eu chamei ele, o cara não gostou, não, que o cara é chefe, eu digo: “Quando você fizer as programações, coloca para quatro e meia ou seis horas, porque o que acontece? Eu vou com cinco pessoas, se esse carro vira, e você sabe que hoje acidente é fácil, vai todo mundo para o brejo. Então, você agora vai aumentar o prazo que a gente vai chegar lá.” Quando foi no outro dia, ele disse: “Não, Alírio, agora quando tiver programação, eu vou fazer assim.” A gente tem muitas histórias. Vá, pergunte mais.
P2 – A gente queria saber mais sobre essas histórias das pessoas que tiveram que sair por causa da barragem. Outras histórias que o senhor lembre, de outras pessoas.
R – Tem. Têm várias pessoas.
P2 – O senhor se lembra de alguma história?
R – Tiveram 75 famílias que saíram. Nessa semana, chegou um velho me procurando, problema de indenizações, me procurando, não. Procurando os advogados. Eu chamei ele, eu chamo eles e explico: “Existe uma pasta, com mais de 200 ou 300 escrituras.” Porque eu sou jogo aberto. Naquele tempo que o pessoal saía, existia um negócio sério, que quem tinha o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] não era indenizado. Isso aí é meio pesado, mas a gente teve um problema sério. Essa barragem foi construída no sistema militar. É o seguinte: você tinha uma casa, o cara fazia a avaliação em três mil, ou você aceitava ou perdia. Agora, tinha um engenheiro que é muito dez, o engenheiro João Paulo. Quando ele sabia de um caso desse, ele ia lá. Agora, ele fez uma “reindenização” para o pessoal. Outro dia ele estava aqui. Quando ele vem aqui, ele almoça comigo, ele é meu apaixonado mesmo. É tanto que os caras têm uma inveja desgraçada. “Eu gosto do negro Alírio, que é meu chegado mesmo.” Resultado: uma “reindenização”. Tem pessoas que saíram daqui, foram desapropriadas e ficaram mal. Mas você sabe que esse problema de ficar mal é o seguinte: tem pessoas que recebem uma indenização e jogam fora, e tem outro que aproveita. Se não fosse assim, não existia pobre no mundo, que o mundo não pode ficar sem ter pobre. Se não tiver pobre, não tem caridade. Mas tem muitas pessoas que sofreram. E você sabe que, até nas notas da escola, existem. Você sabe que tem vezes que você merece uma nota e é injustiçado. A injustiça já começou desde o princípio de mundo. Não tem esse negócio de dizer que não existe. Que existe, existe. Aqui, a gente precisa de muito apoio hoje. Eu não. O pessoal. Na parte política, que hoje, se você não tiver um apoio na parte política, você não tem escola boa. A gente tem uma ilha lá em Salvador, Salinas da Margarida, eu andava lá no meio da rua, passeando. Hoje é uma das maiores cidades, tem três universidades. Porque ACM [Antônio Carlos Magalhães] não saía de lá. O pessoal dele gostou do lugar e aplicou muito recurso. Hoje, Sobradinho precisa disso. Sobradinho é um fracasso. Agora, não merece. Olhe, nós temos água, temos o Rio São Francisco, que é o pai, papai. Nós temos muitas irrigações aqui, nós temos usina, nós tínhamos que ter uma escola de qualidade. Eu expliquei isso ao Doutor Dênis, o diretor da escola, expliquei a ele. Disse: “Olha, nós não temos. Aqui era para ter uma escola técnica, por exemplo, perderam os prédios tudo aí.” Chamei o prefeito, falei: “Rapaz, com 50, 60 reais, você resolve isso.” Você vê, teve um concurso da Chesf agora, filho de funcionário, quase nenhum. Porque o pessoal mais pobre daqui não pode se deslocar daqui para Petrolina, o problema é esse. Não fazem uma escola técnica. Porque o pobre tem um negócio: ele faz uma escola técnica primeiro, vai trabalhar e estudar. Depois, ele vai para a Engenharia, você sabe disso. O cara tem dois degraus para subir. Quem pode sobe logo dois degraus de uma vez, mas quem não pode… Por exemplo, vocês fizeram faculdade, com o que é que vocês sonham agora? É mestrado. Mestrado, é ou não é? Estão sonhando com o mestrado. Porque o sonho só acaba na hora que morre. É meio que velhice, dou risada com os caras. O cara pensa que o cara é velho, não sonha. Sonha. E você, para viver aqui na Terra, para você viver muito tempo, você tem que ter compromisso com Deus. Você sonhar que vai fazer e fazer mesmo. Meu sonho mesmo é trabalhar não em hospital de caridade. Por exemplo, quando eu tiro uns dois mil, eu tiro 100 que é para minha irmã dividir. Agora mesmo eu estou devendo trinta cobertores, estou devendo. No ano passado, em fevereiro, eu passei numa igreja em São Roque, eu vi tudo estragadinho, telefonei para minha irmã e disse: “Mande fazer as toalhas que eu pago.” Por sinal, deu uma sorte imensa. Eu passei 97 dias viajando. Durante a viagem, são 90 contos todo dia, e eu não gastei. Você tirou mil e ganhou cinco, o que você quer mais? Se todos nós, o que ganhasse, dividisse, era porreta. O problema, eu digo a vocês que estão estudando, que estão chegando lá: “Não esqueça que a caridade, em primeiro lugar.” Não é caridade de sem vergonha, não. Tem pessoas que vieram ao mundo para merecer caridade mesmo. Disso não resta dúvida.
P1 – Alírio, qual o seu sonho agora?
R – Rapaz, um sonho que mais tarde você vai ter, ela vai ter: ajudar meus filhos a se estruturarem. Sempre não esquecendo dos menos favorecidos. Porque, primeiro, a gente sonha com a família da gente. Em primeiro lugar, a gente sonha com a família. Meu sonho agora é aposentar, continuar um pouquinho, dar mais um pouquinho de mim. Daquele dinheiro que eu ganhar, tirar uma parte para aqueles menos favorecidos e aplicar em meus filhos. Eu tenho um que é empregado, ele ganha pouco, é gerente de um cara, mas eu estou vendo que ele é um bom programador, ele vai vender computador. É isso aí. Comprar um carro, e dar para ele, e ele vai vender computador, mas vende muito. Nesse mês, ele já vendeu uns três. Ele mesmo monta. É tudo fera criada, ele não para aqui, não. Procurado como um diacho. Você se sente muito satisfeito. Se vocês casarem e tiverem filho, vocês vão ficar muito satisfeitos como o pai de vocês ficou. No dia que você recebe sua formatura: “Olha, papai, minha formatura está ali, tal dia.” É a maior alegria de um pai. Quer ver a maior tristeza de um pai? Usar droga. Acabou a vida de qualquer um. A vida é boa, é bela, agora quem faz é a gente. Os problemas existem, você não pode viver sem ter problema. Tem problema do invejoso, do olho grande. Você viaja, outro não viaja, você tem mais cultura. Então, isso é um problema, mas isso aí tudo a gente passa por cima. Teve uma história importante: numa ocasião, eu estava com três engenheiros no carro, eu era o motorista, até hoje sou o cara que eles respeitam mais, sou o mais respeitado. Um engenheiro chegou lá em Recife, coincidência, eu fazia daqui a Recife, sete horas, 860 quilômetros. Aí, o engenheiro João Paulo ia com Doutor Bené. Aí, perguntou a João Paulo: “João Paulo, vou lhe perguntar um negócio.” “O que foi?” Isso foi uma coisa que me marcou um bocado. “Por que esses caras só arranjam motorista bonito e tal?” Aí, ele disse: “Não me importo da boniteza, eu quero ver o profissional.” Arrasou o cara, e eu, dirigindo meu carrinho ali, eu fui e fiz de conta que eu não ouvi nada. Ele já estava querendo, ele era racista, ele era racista e quem resolvia tudo de João Paulo era eu. O diretor olha na gaveta do confidencial, a secretária não mexia, não. Quando ele estava no outro escritório, ele telefonava. “Alírio esta aí?” “Está.” “Vai na tal gaveta, põe tal documento, tal número.” E a secretária dizia: “Isso é que é interessante, eu sou a secretária e não tenho a confiança sua.” Já conversei muito desse negócio. Já aconteceu numa ocasião, eu viajando, eu vinha com um diretor da Chesf, presidente. Ele disse: “Alírio, saíram uns dez carros na sua frente, eu quero que você passe por eles todos.” A estrada era ruim. Quando eu passei todo mundo, tinha uma assistente social, que ela era caroneira. “Seu Alírio, o senhor não acha que está correndo muito, não?” “Converse com o doutor aí, que foi ele que pediu. Foi, e fim de papo. “Eu tenho confiança em quem está dirigindo o carro.” Agora, eu sou mais é gozador. Chegou aqui, saltei, e disse para ela: “Tu viu o que foi que tu ganhou?” Aí, ela ficou quieta. “Não é que você é o peixe do homem?” (risos) Tem muita história muito interessante na vida da gente. Tem muita coisa. Sim, o que é que você quer saber mais?
P1 – Quero saber o que o senhor espera agora para o São Francisco, para o rio? Daqui para frente?
R – Rapaz, eu tenho na minha ideia que, se não tomarem posição que estão tomando, ele morre. Que é o seguinte: o rio, há 15, 20 ou 30 anos, está precisando de um tratamento. O rio está um problema, igual a um canceroso. Se você abandonar um canceroso, ele morre logo. Se você tratar dele, ele sobrevive, e vai embora. Você sabe disso. O problema do São Francisco é sério, eu digo a você, é sério. Não é brincadeira, não. Eu ando por aí e vejo o assoreamento. Tem que se fazer urgente, plantar árvores, esgoto, eliminar o esgoto do rio. O homem achou que o que mata mais o rio é o esgoto, você sabe disso? É o esgoto. Agora, você vê, a gente está com um problema, porque só toma água mineral. Porque aquele Rio das Velhas estava jogando um veneno verde, acho que você chegou a ver, o veneno verde. Está atrapalhando a vida do pessoal, peixe morrendo, o surubim tudo morrendo. Já duas vezes, eu saí daqui para fazer um estudo, eu e Luís Henrique, eu e o engenheiro, para ele fazer, né? Mas eu digo logo a ele: “Rapaz, é o seguinte: esse peixe está morrendo, isso é um veneno.” Agora mesmo, eles atenderam uma reivindicação minha. O Rio São Francisco agora tem um problema sério: ele, quando seca, o pessoal planta roça, por exemplo. Ele agora está na cota 14, o cara vai lá e planta melão, cebola e feijão, e tome veneno pulverizado. Aí, colhe aquela roça. Quando for agora em dezembro, enche, tem lugar que ele vai a oito, dez quilômetros. Aquele lugar que vai a oito, dez quilômetros, ele vai lá e lava aquele veneno, traz, e a gente aqui embaixo bebe. Um médico em Salvador procurou saber por que na região do São Francisco o câncer é mais acelerado, por que tem mais gente com câncer. Eu expliquei a ele. Outro dia, um cara chorou lá em Irecê, porque ele perdeu duas sobrinhas. Aqui em Petrolina. Eu disse a ele: “Olhe, eu fiz uma reivindicação, porque o rio está aqui, quando ele enche, ele vem parar aqui, e aqui o cara planta cebola, melão, tudo. Quando ele encher, ele está aqui, ele vai fazer o quê? Lavar o veneno que foi pulverizado.” Você sabe que veneno não se acaba. E você sabe que a gente não suporta veneno, veneno é miligrama. Aí, o que acontece? Juazeiro, Petrolina, nessa região que pega aqui o Rio São Francisco está morrendo gente de câncer direto, e a trovoada vai atrapalhar a gente. Vai jogar terra.
P1 – Eu queria falar só mais uma coisa. Alírio, o que você achou de conversar com a gente aqui? O que o senhor achou de bater esse papo com a gente, o senhor gostou?
R – Ah, é dez. Todo dia, se quisesse, a gente fazia. Se vocês viajassem junto comigo, vocês tanto davam risada como iam aproveitar. Os caras novos viajam comigo, ainda ontem viajei com um cara novo que disse: “Alírio, na próxima, a gente vai.” Eu disse: “Se eu estiver aí.” Porque eu sou difícil. Você vê que a menina ligou, até eu peço desculpa que eu atendi mal. Porque eu pensei que era cartão de crédito. Ela fala parecendo a fala de Célia da USP. Eu digo: “É Célia?” Ela disse: “Não.” Eu digo: “Rapaz, você quer o quê?” “Não, eu queria conversar com senhor.” Eu digo: “Cartão de crédito eu não quero nem saber!” Ela tem a fala enrolada. Tem paulista que tem a fala limpa, tem outros que têm a fala enrolada. Aqueles lá, para lá de Campinas, vai chegando quase que gaúcho. Aí, já começa a chamar porta (risos).
P1 – Está bom, Alírio, obrigado pela entrevista.
R – Quando vocês quiserem qualquer coisa, vocês liguem direto para aqui, procurem.
“Ele não esta aí, não? Que dia ele chega?” Eu viajo demais, menino, você está pensando que é brincadeira? Esse ano, em fevereiro, eu saí 97 dias. Os caras ficam atrás de mim. Esse negócio de cartão de crédito, lá por Barreiro. Agora mesmo, avisaram que eu tenho aqui, tenho lá.
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