Projeto Educação Para o Mundo
Memória dos 30 Anos da Escola Cidade Jardim/PlayPen
Entrevistado por Fernanda Prado e Camila Prado
Depoimento Marcia Elizabeth Plessmann
Local São Paulo, 03 de novembro de 2010
Realização Museu da Pessoa
Depoimento MECJ_HV002
Transcrito por Maria da Conceição Am...Continuar leitura
Projeto Educação Para o Mundo
Memória dos 30 Anos da Escola Cidade Jardim/PlayPen
Entrevistado por Fernanda Prado e Camila Prado
Depoimento Marcia Elizabeth Plessmann
Local São Paulo, 03 de novembro de 2010
Realização Museu da Pessoa
Depoimento MECJ_HV002
Transcrito por Maria da Conceição Amaral da Silva
Revisado por Bruna Ghirardello
P/1 – Então, Márcia, boa tarde.
R – Boa tarde.
P/1 – Primeiro eu gostaria de agradecer a sua presença aqui no Museu para essa entrevista. E para começar eu queria pedir para você falar o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Márcia Elizabeth Plessmann. Meu local de nascimento foi aqui em São Paulo mesmo, em 18 de fevereiro de 1948.
P/1 – E qual é o nome dos seus pais?
R – Oscar Marcondes Plessmann e Ernestina França Plessmann.
P/1 – E o que eles faziam?
R – Meu pai era Fiscal de Rendas, funcionário público do estado. E a minha mãe sempre trabalhou em casa, prendas domésticas.
P/1 – E os seus avós, você se lembra dos seus avôs?
R – Eu lembro, eu só tive contato com a minha avó materna, porque os outros avós ou morreram antes mesmo de eu nascer, ou teve um que foi... Eu não tinha nem um ano ainda. Então, não me lembro. Agora, com a minha avó eu convivi até ela falecer em 1983. Então, eu tive um tempo grande de muito contato.
P/2 – De onde são seus pais?
R – Os meus pais são de São Paulo mesmo. Meu pai nasceu em Campinas, a minha mãe em Guaratinguetá.
P/1 – E você sabe como é que eles se conheceram? De Campinas e Guaratinguetá?
R – Não, eles já moravam aqui, foi só o nascimento, eles se conheceram já aqui em São Paulo numa festa de aniversário, acho que foi uma coisa assim. E aí começaram aquele namoro, primeiro aquela paquera, que naquele tempo era de olhar, passar perto da casa. Minha mãe morava bem no centro aqui de São Paulo, não sei se era Rua Cruzeiro, numa pensão. Ela com a mãe, a irmã e o meu pai numa outra. Então, ele estudava e passava sempre na frente da casa dela e sei que foi assim que eles se conheceram.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Tenho. Eu sou a mais velha, depois eu tenho uma irmã que chama Evelyn, mora também aqui em São Paulo e um irmão caçula, com o nome do pai: Oscar Junior, que também mora aqui.
P/1 – E onde foi a sua infância? Onde é que vocês cresceram?
R – Olha, eu nasci aqui em São Paulo e morei aqui até os sete anos, mais ou menos. Eu morava na Vila Mariana, comecei a estudar aqui foi no Santa Catarina, no Sagrado Coração de Jesus, se não me engano. Eu lembro porque foi pouco tempo, porque a gente entrava na escola naquela época já para a primeira série. E meu pai foi transferido para uma cidadezinha perto de Presidente Prudente. E eu passei a minha infância até 14 anos nessa cidade, em Presidente Prudente. Ele, meu pai que trabalhava, mas como a cidade era... Não oferecia muitas condições, e naquela região a melhor cidade era Presidente Prudente.
P/2 – A tua família, qual que é a origem dela?
R – Olha, do meu pai a descendência mais assim dos... Seria meu tataravô que era alemão, e da minha mãe italianos. Aí era mais próximo, a minha bisavó era italiana.
P/1 – Onde é que ficava essa sua casa aqui em São Paulo, da primeira infância?
R – A primeira era na Coronel, onde eu me lembro mais, na Coronel Diogo, na Vila Mariana. Eu me lembro bem dessa casa, que aí eu já tinha uns cinco, seis, sete anos. Então, a memória ainda é viva nessa época.
P/1 – E como é que era?
R – Era assim, inclusive é uma casa que me marcou muito, porque era uma ladeira e até hoje tem a casa lá. A gente grava, era Coronel Diogo número 81. E era em frente do Cemitério da Vila Mariana. Era um sobrado, então da janela da sala você avistava o cemitério. E tinham períodos que eu tinha medo disso, e outros depois que acaba acostumando. Mas volta e meia, essas memórias me vêm, às vezes, em sonho desse cemitério. Acho que nessa idade de criança é uma coisa que marca na memória.
P/1 – E como é que foi a mudança pra...
R – Então, a mudança eu estava aqui, já tinha começado o primeiro ano, numa escola ali perto até. Aí nós fomos, acho que foi no meio do ano, e foi difícil assim chegar nessa cidade com essa... Eu detestei a escola que minha mãe tinha me posto. E eu lembro que ela fala, eu não me lembrava disso, mas ela disse que o motivo que ela acabou me trocando de escola foi porque eu achava a escola muito suja. Então, eu não ia ao banheiro, essas coisas assim, que depois ela me contou. Aí eu fui, ela me colocou num colégio de freira, Cristo Rei, que eram madres beneditinas. E lá eu fiquei até a oitava série.
P/1 – E como é que foi essa primeira escola? Você se lembra do por que você detestou? Foi mesmo por causa da sujeira?
R – É, foi, foi... Sabe? A escola, eu acho que eu me lembro da estrutura, era uma escola estadual um pouco abandonada, então eu acho que foi isso. Depois, do Cristo...
P/1 – Você ficou até que idade? Desculpa, Marcia.
R – Nessa primeira eu fiquei meses, não. Porque logo ela me trocou, eu acho que eu devo ter ficado uns dois, três meses, aí eu já fui para essa escola Cristo Rei. Essas escolas de freiras: os prédios são muito bonitos, muito grandes, muito limpo, muito cuidado. E lá passei, foi difícil também no começo, eu acho, para fazer as amizades, eu lembro que era difícil. Eu era muito tímida, então tudo muito estranho: a cidade, ainda muitas mudanças nessa idade. Então, eu lembro que no começo foi difícil, mas depois foi, praticamente... Eu tive a minha infância e a minha adolescência lá. E foram onde aconteceram então, fatos mais importantes, ou assim, de início, que depois desencadearam na própria vida.
P/1 – Quais eram as brincadeiras que vocês costumavam fazer?
R – Eu gostava muito de brincar de queimada. Porque lá também primeiro eu morava numa casa, primeiro foi numa casa que era grande, tinha um quintal maravilhoso, tinha tudo. Tinha mangueira, parreira, laranjeira, e coqueiro. Então, era um... E tinha assim uma entrada enorme, que aí a meninada da rua, era aquelas garagens enormes, era um lugar próprio, maravilhoso para jogar queimada. Então, era uma das minhas brincadeiras preferidas. E outras era... A gente brincava muito lá mesmo nessa, de escolinha, acho que toda menina brinca, tanto que tinha, lembro que os meus pais mandaram fazer, uma lousa de verdade na garagem. Era o máximo. Aquilo com giz, a gente poder estar brincando. Nessa ocasião, eu me lembro que eram as brincadeiras que eu mais buscava.
P/1 – E tinha assim na sua família que tenha te marcado de comemorações? Tem alguma data assim que vocês comemoravam mais, de eventos festivos?
R – Em menina eu acho que eu me lembro só – e que até hoje é – o Natal. Que eu me lembro assim, uma coisa que era e aí que a gente, porque toda a minha família mesmo essa, a minha avó, todos moravam aqui em São Paulo. Então, era época que era sagrada para a gente vir para cá porque aí era aquilo de no Natal reunir todo mundo. Então, essa eu vejo que até hoje é uma celebração que tem muito sentido para a família. Agora que já está, minha mãe ainda está viva, tem 85 anos. Mas as pessoas foram crescendo, casando, tendo filhos, e Natal e Ano Novo divide. Então, ela faz um Pré–Natal. Todo mundo brinca que é o Pré–Natal da avó Tina. Porque aí é um pouquinho antes para garantir que todos se encontrem. E ela até hoje ainda fala que é o momento mais feliz ela poder ver todo mundo num clima de muita alegria. Então, ela faz questão de na casa dela fazer. Isso que eu me lembro que é uma data que se perpetuou na comemoração. E para todo mundo, geralmente fala que muita gente eu conheço que tem com o Natal uma certa tristeza. Na minha família acho que por conta disso sempre foi de muita alegria, sempre.
P/1 – E tem um fato da sua infância, uma história que tenha te marcado?
R – Olha, na minha infância uma coisa que é muito marcante, porque as minhas netas sempre ficam... Adoram: “Vó conta as suas histórias de verdade”. (risos) E elas gostam muito da minha história com um cachorro que eu tive. Foi logo também quando eu mudei para lá, acho que um ano depois, então eu ganhei um cachorrinho. Era um vira–lata, ele chamava Baby. E acho que foi a primeira criação, a primeira ligação que eu tive assim com animalzinho, eu devia ter uns oito anos. E tinha que dar leitinho para ele. Então, aquele instinto acho que materno (risos) em vez de brincar com boneca, que eu não era muito ligada, mas com esse cachorrinho eu lembro que eu ia para a escola e ficava sonhando com a hora de voltar para poder estar com ele. E foi um cachorro que, até eu morar lá, ele estava com a gente. Quando nós viemos embora para São Paulo, que eu tinha 14 anos, que aí ele ficou lá com a empregada que a gente tinha e depois a gente soube que ele sumiu. E era um cachorro muito inteligente, a gente diz assim. Tem muitas peripécias, muitas histórias dele. Porque ele seguia a gente em todos os lugares. A gente prendia para ele não ir atrás, ficava preso e a gente ia.
Daqui a pouco eu estava no cinema, ou na casa de alguém, ele aparecia. Ele ia pela cidade cheirando, cheirando, procurando, alguns lugares ele já sabia. Ele era pequenininho, vira–lata, mas era assim super atrevido, vamos dizer assim, de enfrentar os outros cachorros. Com muita autonomia, brincava. Meu irmão também tem muitas recordações boas desse cachorro. Era um companheirão. Então, tem um pouco as histórias dele e eu acho que esse fato também me fez ficar sempre muito ligada com cachorro. Até a última que eu tive, e eu falo... Era uma basset–hound. Quanto tempo que a Luma morreu? Acho que as meninas ainda moravam aqui, não?
P/2 – Basset–hound é demais, né? É o cachorro do Sherlock, não é um cachorro de detetive? Que tem aquelas orelhonas?
R – É, com aquela orelhona, é uma delícia aquela cachorra. E eu falo que esses cachorros todos, depois com o tempo quando você vai olhando, foram grandes mestres na minha vida. Eu aprendi com eles. Esse Baby era assim, essa coisa da autonomia, da liberdade, sabe, da iniciativa, de não ter medo, de coragem. Então, são elementos que você vê num animalzinho que enquanto você está convivendo e brincando você... Chama a sua atenção. No que é a vida, como se, as pessoas... Às vezes, você começa vendo as pessoas. E a Luma eu acho que já foi bem numa outra, fazem o quê? Acho que uns oito anos que ela morreu ou mais? Por aí. Ela era uma cachorra zen. Nada de agressiva, era outro esquema. (risos) Um doce, uma paz. Aquela cachorra não latia, muito raro. Quando ela ficava ou brava ou muito triste aí ela uivava. Aquela coisa bem de dentro mesmo. E muito companheira, aquilo de... O Baby era mais independente. Ela não, ela era mais... E assim, eu lembro de um fato também dela, a minha neta tinha um ano e pouquinho. E ela nasceu em Barcelona. Aí eles vieram de volta pra cá e enquanto estavam procurando casa, tudo, moraram na minha casa: meu filho, minha nora e ela. E ela amava essa cachorrinha, porque era tão boa, vivia com ela. E um dia eu ouvi, elas estavam juntas, eu ouvi um barulhinho dela aí eu ouvi como um latido da Luma, da cachorra. Aí eu corri, porque normalmente ela... Nem ficava preocupada de ver. Quando eu ainda cheguei deu para perceber: a minha neta mordeu o fuço da cachorra, (risos) porque geladinho... Tudo eles querem e ela gritou porque foi mordida. (risos) Eu acho que esses são fatos marcantes.
P/2 – Só voltar um pouquinho e perguntar uma coisa que eu fiquei curiosa: você falou que você brincava de escolinha, como era?
R – Ah, era bem, hoje eu ainda vejo criança fazer assim, né? Que aí tem os alunos, você é a professora. Você fica, a gente copia, começa a imitar o que a gente ouviu a professora falar. E põe o A, E, I, O, U na lousa. Chamava o aluno pra fazer. Era...
P/2 – E você era a professora?
R – Eu sempre era a professora. Também porque era a mais velha na minha casa. Então, mesmo se juntasse os meus irmãos, ou os amigos, depois como era na minha casa que tinha a lousa (risos) então, eu tinha o direito de ser professora.
P/1 – E falando agora dessa escola que você foi, a das freiras, como é que você ia para a escola?
R – Então, a das freiras também tem uma marca interessante. Porque algum... Como eu passei a infância e depois o início da adolescência era só meninas. Então, também aquela coisa que fecha. Se eu já era tímida em relação a isso eu percebo que eu tive uma... Não fui estimulada. Tanto que eu nem queria, eu falei assim: “Eu não quero neto meu, nem filho meu nenhum em colégio de freira”. (risos) É que hoje não é mais assim. Mas lá também eram mais as freiras que eram, e elas são muito rígidas. Até hoje as beneditinas são freiras mais tradicionais, elas ainda têm hábito. Então, era de uma disciplina extremamente rígida. E tinham algumas freiras, eu lembro que tinha uma, Madre Rafaela, elas eram assim muito de ameaçar com medo, sabe? Contavam muitas histórias de demônio, essas coisas de pecado. Que eu vejo que depois mais velhas eu e a minha irmã conversando sobre isso, nós duas ficamos com alguns medos nas nossas vidas que a gente depois conseguiu identificar que era muito do que as freiras faziam com a gente. Em vez de aproximar da religião, porque era aquela coisa obrigada, se você não fosse ficavam vigiando se a gente não foi à missa no domingo, aquelas coisas. Quando chegou na... Quando eu entrei na faculdade foi aquela coisa, mais adolescente se afastar. De achar tudo aquilo um absurdo, uma bobageira muito grande, aquela coisa que invés de você começar estabelecer um diálogo maior com a espiritualidade em si, mas do jeito que era – eu acredito que hoje também seja diferente – afastava a gente dessa possibilidade. Mas eu vejo que mesmo assim afasta, mas fica uma experiência do sagrado que eu vejo que acompanha o resto da vida. Então, eu falo assim, eu me lembro que chegou uma ocasião, quando já estava bem distante, mas eu sentia que tinha assim uma saudade de Deus, vamos dizer assim. De uma coisa... E aí eu entrei na PUC, e na PUC foi ótimo, foi as minhas pazes com a espiritualidade. Porque lá também a gente estudava todas as, na Teologia, as várias religiões comparadas. Então, aquilo que era muito infantil, muito medíocre, vamos dizer assim, dá aquele salto. Eu vejo que pra minha irmã também. Então, trilhar esse caminho mais espiritual sempre foi um objetivo da gente. Ou no desenho da vida ele sempre aparece de alguma forma. Teve isso, das freiras, que tinham muito essa questão do medo, dos demônios, do pecado, mas foi marcante por outro lado nesse sentido. Teve algumas ocasiões que também foi uma experiência muito interessante, a gente gostava, eu e minha irmã. Às vezes, meus pais tinham que viajar então, a gente ficava interna. Eram três dias. Então, a gente sabia que era pouco, então era, eu ficava muito curiosa porque o ambiente de convento é muito misterioso. As clausuras que você não pode ir, a hora que elas acordam. A gente ouvia na missa, cedinho as cantorias. Elas cantavam muito bem. Tinha uma capela muito bonita. Depois também achei muito interessante como eram os dormitórios. Aquele monte de camas tudo igualzinho com aquele cortinado que tinha cada cama. Os horários...
P/2 – Para as crianças internas?
R – Porque tinham, naquela ocasião, muitas pessoas de cidades ali não tinham escola. Fazendeiros, e tinham posses, então tinha o internato. A gente tinha aquela curiosidade de saber como que era o internado.
P/1 – Durante o dia estudava todo mundo junto, quem era interno e quem não era?
R – Todo mundo junto. Só que lá também era meio período. A gente estudava de manhã e ia pra casa. E as internas ficavam. A gente queria também conhecer. Eu lembro era uma rotina: aí almoça, depois descansa, depois vai fazer a lição. Tudo muito silencioso. Depois eu lembro que tinham as coisas assim, que as... Acho que era sobremesa, cada interna tinha um espacinho como se fosse um armário que elas recebiam doces dos pais e cada uma guardava o seu ali. Então, era uma festa em quem podia pegar o quê, o que é que era gostoso, para trocar. Um momento interessante esse, que tudo isso a gente sabia o que é ser interna. Acho que todas experiências assim inusitadas são fantásticas. Até hoje eu acho bem isso.
P/1 – Como é que vocês iam para essa escola, você com a sua irmã?
R – Deixa eu pensar, era a pé mesmo, eu lembro.
P/1 – Era pertinho?
R – Não, não era, era longinho. Quer dizer, longinho, era mais ou menos um quilômetro. Eu lembro que a maioria era a pé. Depois eu acho que a minha mãe aprendeu a dirigir e aí ela levava ou buscava de carro. Eu lembro qualquer coisa assim.
P/1 – E como é que vocês iam para a escola, uniformizadas, com a mochila?
R – Ah, sim, a freira eram aqueles uniformes, de acho que, não, não tem. Esse é do Normal. Tem uma foto depois eu mostro. Esse colégio não tem. Mas era saia azul–marinho toda pregadinha com suspensório, uma blusa de manga comprida. Um calor infernal, mas tinha que ser de manga comprida, uma gravata. E eu lembro que tinha assim, era um botão vermelhinho conforme o ano que você estava. O primeiro ano era só um botão, o segundo ano dois botões. E tinha também muito esse aspecto de ganhar medalha. Tinha medalha de aplicação e medalha de comportamento. Que aí a gente ganhava e naquele mês (era mensal o boletim), quem tinha tido bons resultados ou num aspecto ou no outro ganhava então essa tal dessa medalha.
P/1 – Ficava com a medalha?
R – Ficava com a medalha. Fazia parte do uniforme naquele mês, era assim. Eu ganhei algumas vezes, mas eu sempre acabava perdendo por causa do comportamento.
P/1 – Por quê?
R – Porque eu não era muito disciplinada, eu não era muito quieta. Não era nem que eu fizesse muita, mas assim, não pára quieta, vai num lugar, vai no outro, conversa com um, conversa com outro. E tinha algumas coisas, depois mais velha das freiras, que a gente... Aquela coisa de criança de fingir que não está ouvindo, esconder uma coisa dela e que elas ficavam procurando. Essas malvadezas. E, às vezes, a gente era pega. Agora é interessante porque hoje mesmo eu estava, eu reencontrei este ano uma amiga desse tempo, que nós fomos, né? Então volta e meia... Agora a gente está fazendo algumas atividades juntas, a Cristina, então mais de 50 anos que eu não a via. E a gente fica lembrando essas coisas das freiras, o que a gente fazia com elas. Que eram bem essas coisas dessas, que hoje a gente fala: “Nossa, que bobeira”. Mas na ocasião era como se você tivesse transgredido a maior regra. (risos) Eu acho que essa coisa, de adolescente, a importância que você está sentindo porque você está transgredindo alguma coisa. Mas ao mesmo tempo eu tinha também muito medo da bronca, ou de, porque o que elas faziam era isso. Era bronca, chama a mãe, chama o pai, perde a medalha. Não tinham grandes coisas. Mas a gente era, aquilo era como se você fosse... Uma sensação de exclusão, que eu acho que ninguém queria ter. Então, acho que foi isso nessa escola.
P/1 – Tinha algum material que você usava, que encostava mais, assim, se você tinha um caderno...?
R – Não, aquele tempo não tinha muito isso que nem tem essa variedade hoje. Você tinha lápis, caderno, sabe?
P/1 – Tinha um livro didático?
R – Era aquela... Não tinha, não, lá eu não me lembro. O único livro didático que eu me lembro era ainda quando eu entrei na escola aqui em São Paulo, no comecinho do primeiro ano que era aquela “Caminho Suave”, uma cartilha. E depois trocou era uma, que tem umas coisas que a gente grava, que eu lembro que era assim, começava assim: “A pata nada, a pata pa, nada na”. (risos) Era essa a história. Agora lá não, e lá também era o que tinha assim que era uma loucura quando a gente pensa hoje, aí que a gente vê como o tempo passa, o uniforme de Educação Física era um calção aqui. Assim fofo, com corpinho aqui (risos) de também suspensório com uma blusa por baixo. E do lado do colégio, um colégio grande, enorme, acho que tinham dois quarteirões, tinha o Instituto de Educação Estadual. Então, a gente morria de vergonha já bem adolescente, porque, principalmente os meninos, adoravam olhar quando a gente estava fazendo Educação Física para ficar tirando sarro! Era vergonhoso, era vergonhoso. Assim: “Eu não entendo como que elas não percebiam, que coisa horrorosa”. (risos)
P/1 – E tinha uma matéria que você gostava mais?
R – Eu acho que eu sempre gostei mais de Português, História e Ciências. Essas foram as matérias que sempre... Até na faculdade também sempre gostei. Matemática não, Geografia também não gostava nem um pouco. Detestava na ocasião, mas o jeito que era, Música. Porque eu gostava de música, mas aí você tirar aquela, você tinha que solfejar, você tinha que saber ler, tal. Quer dizer, a sensação que me dava é que picava toda, mutilava a música. E era aquela coisa se você não solfeja direito, perde nota. A parte de Artes também que são coisas que eu sempre gostava, hoje também, mas também era dessa forma. Não era voltado, e isso também refletiu depois na minha formação como professora, da criatividade. Então, pelo contrário, era o oposto. Acho que essas experiências negativas também me fizeram ver bem três aspectos que é a criatividade, a ludicidade e o sentido do que você aprende. Que significado tem aquilo para a sua vida? E então, esses foram elementos que eu vejo que, na hora que eu fui professora, eles começaram a tomar corpo, começaram a ser a minha... A marca do meu trabalho como educadora, que vem dessas experiências todas. Por isso que as experiências negativas também são positivas, porque aí faz você ver o oposto daquilo que você não quer ou não acredita ou não acha saudável.
P/1 – E nessa escola teve alguma professora que marcou?
R – Teve. Eu lembro que tinha, eu não digo que marcou, mas é interessante como a gente grava o nome. A minha professora da primeira série, porque nas outras escolas eu não me lembrava o nome, era da segunda. Essa eu lembro e ficou muito forte. Ela chamava dona Benedita, ela não era freira. Depois as outras foram todas freiras. Então, tinha duas freiras que eu gostava também: a madre Modesta, ela... Porque era assim, depois tinha uma freira que ela era a orientadora, monitora que a gente chamaria, daquela turma. Então, teve essa Madre Modesta que eu gostava muito, ele era uma pessoa doce, era brasileira. E depois uma outra, que era a Madre Taís, apesar dela ser professora de Matemática, ela também era orientadora, ela era descendência alemã, mas eu tinha uma grande admiração por ela. Ela era mais rígida também. Agora, teve outras que eu odiava. Tinha uma que chamava Ruth, que inclusive teve um episódio nessa escola ligado com dança, que marcou também muito, aquelas marcas dolorosas que depois, em terapia, vai aparecer. Eu tinha muita vontade... Eu era tímida e eu era bem gordinha. E eu tinha muita vontade de entrar nos tais dos balés, que tinham lá de primavera. Porque aquelas roupas todas muito leves, com aquele chapéu de flores. Eu achava uma coisa linda. Mas não tinha, aí um belo dia eu resolvi me manifestar que eu queria entrar. E acabei entrando com aquela insegurança, com aquele medo, mas ao mesmo tempo com aquele sonho e com aquela expectativa. E era ela quem ensaiava, essa tal dessa Madre Ruth. E aí ela me judiou muito, sabe? Eu falei assim: a palavra que ficou pra mim, eu acho que ali eu aprendi sentindo, o significado do que é ser humilhada. Era bem isso que ela fazia. Ela me chamava de pata–choca na frente de todo mundo, de não sei que lá. “Olha, não sei o quê.” porque era aquilo, não era o expressar pela dança, o corpo. Não, tinha que seguir e girar. Então, essa freira marcou muito pra mim de um jeito negativo e esse fato também. Depois eu fui resgatar de outras formas a tal da dança.
P/2 – Como eram as aulas, fora essas que você citou de Música, de Artes, e as demais aulas nessa escola? Como que era o esquema?
R – Era esse esquema bem tradicional, mas eu não vejo hoje em dia que tem grandes diferenças, não. É isso que a gente fala, a escola é a que menos mudou. Com tudo que mudou, eu ainda sinto que a escola mudou muito pouco em relação a todas as mudanças, mesmo de tecnologia, tudo. Porque tem o mesmo esquema que era antes: aquele currículo, com aquelas mesmas matérias, hoje acrescenta uma ou outra, mas não tem grande diferença. No ginásio é aula por aula, 50 minutos, entra uma professora sai outra, explica. Você tem o livro, você faz a lição, depois tem a prova. Era exatamente esse esquemão. Não tinha nada de diferente.
P/2 – E a relação com as professoras?
R – Também aquela coisa de... Que, às vezes, até senti falta depois. Você entra você fica em pé, você cumprimenta. Nunca a gente sai antes da professora da sala. E não era uma coisa ruim, nem imposta. Eu acho que tinha...
P/1 – Era um código.
R – É, era um código e tinha fila para entrar, fila para sair. Aquela coisa mais, que hoje ainda tem muitas escolas que tem. Algumas até tiveram que resgatar de uma outra forma de poder ver que isso também às vezes facilitava a organização. Então, eram assim as aulas. Que mais?
P/1 – Você contou que depois dos 14 anos, do fim da oitava série você...
R – É, aí eu me formei lá e aí eu fui lá não tinha continuidade. Aí ficou assim, eu queria fazer Científico na época. Porque tinha Clássico, Científico e o Magistério que chamava Normal. Aí eu queria fazer os dois. Queria fazer o Normal e queria fazer o Científico. Porque um pouco eu tinha idéia, como eu gostava muito de Biologia, eu queria seguir nessa carreira. Mas aí os meus pais na ocasião me desanimaram muito disso. Naquela ocasião também era meio complicado, não seria lá. Aí eu acabei ficando só no Magistério. Eu fiz um ano lá no Instituto de Educação, esse que era... Gostei. E aí eu voltei pra São Paulo. Eu terminei o Magistério aqui.
P/1 – E você se lembra da formatura da oitava série do colégio de freira?
R – Não lembro. Eu não sei se teve formatura, eu acho que não teve, sabe? Eu me lembro, acho que as comemorações, que eu acho que naquela época não tinha isso. A única celebração que eu me lembro da escola, que eu vejo fotos e tudo é a Primeira Comunhão. Isso tinha. Mas de resto, não me lembro de nada. Não tinha comemorações de festas. Tinha na época da Semana da Pátria, que aí a gente tinha que desfilar na cidade. Mas eram, juntavam as escolas. E tinha também, ah, eu acho que era na época de Corpus Christi que aí tinha a tal da procissão que a gente também tinha que ir. Então, essas eram as celebrações da escola.
P/1 – E como é que foi a mudança do Ginásio assim, da Oitava Série...
R – Então, nessa ocasião, aí também estava assim, porque eu comecei a namorar, que era o, que foi o meu marido depois que morava lá também, que eu conheci em Prudente, eu tinha 13 anos. Então, mudar pra cá também foi meio conflitante, porque eu não queria vir. Como que eu ia ficar sem o namorado? Mas aí depois ele veio também. Ele veio para estudar aqui, logo depois que eu vim. Então, a mudança da oitava série para o Colégio, em termos de escola foi ótimo, eu adorei. Porque era outra realidade, tinha uma porção de gente, meninos e meninas, parece que era uma sensação meio de liberdade que a gente tinha. Então, eu lembro que foi muito bom. Eu gostei do primeiro ano. Tem algumas professoras, eu lembro uma que me marcou que depois eu fui encontrar em São Paulo, sabe? Então, eu acho que foi um primeiro pé na área de Educação, um primeiro passinho pequenininho, meio levada, mas que eu me identifiquei. Tanto que eu voltei pra cá, eu poderia ter mudado, mas aí eu quis continuar o Magistério. E o voltar para São Paulo tinha isso de eu não querer, por causa das amigas... Desde os sete anos lá, e também por causa do namorado.
P/2 – E seus pais? Você começou namorar super cedo, como que eram eles?
R – Era escondido. Eu lembro que ficava a minha irmã sempre ameaçando, qualquer coisa... Se eu não fizesse isso, aquilo, ela: “Ah...” Ela ia contar para minha mãe, nã–nã–nã–nã–nã. (risos) Essas coisas. E o namoro era assim, a gente ficava no jardim, na praça, olhando um para o outro um tempão. Às vezes, sentava um pouco junto. Ia ao cinema, mas a gente entrava primeiro, e você guardava o lugar, ninguém podia ver, depois que ficava tudo escuro aí o namorado sentava. Era assim. Tinha, imagina! Ainda nessa época lá, tinha o tal, não sei se vocês sabem, aqui vocês devem ter feito tanta entrevista, do tal do footing, que era também uma loucura. A rua principal, os rapazes ficavam em pé nas calçadas e aí a rua era fechada para esse footing. E as meninas ficavam no vão pra lá, vão pra cá. (riso) E eles olhando. Era assim que apareciam alguns namoros, que aí você ficava de olho e aí depois... Isso também tinha lá. Também vivi o tal do footing. (risos)
P/1 – E aí então a mudança para São Paulo vocês vieram com a família, veio só você?
R – Veio todo mundo. Porque meu pai foi transferido para cá de novo. Porque enquanto a gente morou lá, ele trabalhou em algumas cidades ali perto e depois em Presidente Prudente, mesmo. E depois ele veio aqui para São Paulo, e então veio todo mundo.
P/1 – E como é que foi a mudança para você?
R – Então, a mudança eu não queria muito por causa disso. Adolescente, eu tinha os meus amigos lá, tinha uma turminha boa. Em cidade do interior a gente ainda é mais... Você tem até mais – até hoje eu vejo que é assim também – liberdade. Porque todo mundo sabe onde, mais segurança,
P/1 – Escala menor.
R – É. E tinha a questão do namorado. Lá em Prudente também foi quando eu fiz 15 anos. Tinha, ainda tem isso, o baile de debutantes, quando você vai entrar para a sociedade, aí é apresentada a noite no primeiro baile. Também foi interessante isso.
P/1 – Mas e chegar aqui assim? Como que foi nessa reconstrução?
R – Então, aí aqui eu vim assim, como que a gente fala? De cara feia. Mas eu era... Meus pais, meu pai não, mas a minha mãe sempre foi muito autoritária. Não perguntava, não. Não tinha de ficar: “Ah, está triste”. Nada disso. Tem que ser, fez, acabou. “Não quero saber de reclamação”. Bem assim. Então, fica uma coisa mais interna. Mas aí depois quando... Logo o meu namorado veio, aí as coisas mudam. Porque inclusive com o namoro, mesmo lá, aí a gente já ficava muito mais com o namorado do que com os amigos. Não é que nem hoje que é mais amigos e turma, era mais aquela coisa assim: quando você está namorando um pouquinho mais sério, aí é só mais com o
namorado. E lá também foi isso, que começou namorando escondido, depois eles descobriram. Minha mãe falou que queria então, conversar com ele, achando que ele não iria, porque ele tinha 15 anos, também era muito novinho. Mas ele foi. E aí ela teve que pôr as regras e autorizar. Então, foi assim que ficou oficializado e aceito o namoro. E a vinda pra cá foi assim, a experiência também na escola foi interessante: eu fui para uma escola estadual aqui também no Ipiranga, que tem até hoje, que é o, como que chama esse... Aí, daqui a pouco eu me lembro. É Alexandre de Gusmão. Então, foi também. Mas dele eu gostei. Porque aí também isso foi interessante. Como você vem para um lugar que você ainda conhece, você tinha as primas tudo, mas o cotidiano do dia–a–dia... Aí eu fiquei muito voltada para o estudo. Parece que era um espaço, abre um espaço maior que não está ocupado com amizade, com você ficar conversando. Então, eu lembro que eu... Isso foi interessante, porque eu me interessei por muitas coisas nessa parte de Educação.
P/1 – Como que era esse colégio?
R – O Alexandre de Gusmão? Então, também era um colégio enorme. Tinha todo mundo junto Científico, Clássico, a normalista. Então, tinha uma dinâmica gostosa, de vida. Geralmente no Magistério, até hoje também quando tem, sempre é mais só, predomina o feminino. Mas também fiz algumas amizades e também foi pouco tempo, porque foram dois anos só.
P/2 – Você se lembra de alguma coisa que você aprendeu nessa época que te marcou, impressionou?
R – Lembro que eu gostava demais, eu acho que era porque tinha uma certa ligação com o que eu queria antes de ir pra área de Saúde. Eu tinha uma professora de Biologia, dona Gabriela ela chamava. Naquele tempo, ela tinha um cuidado muito grande... Ela ficava com a gente, acho que a partir do segundo ano já começava. Porque ainda tinham muitos casos de pessoas que se formavam como professora e depois iam dar aulas em fazendas no interior. Eu lembro, eu conheci amigas que ficavam... E geralmente era uma pessoa que era a que tinha mais conhecimentos naquela região e era muito respeitada e muito solicitada. Então, ela fazia de tudo, orientando famílias, até quanto à saúde, e muitas faziam até parto. Porque não tinha na região, se era uma coisa de emergência, então ela achava que a gente tinha que se preparar para todas essas emergências. Então, ela instruía muito bem e a gente depois nas férias fazia estágios em hospitais. A gente ficava na Pediatria, ficava na Urgência de crianças, ficava na Maternidade assistindo parto, recebendo criança, vendo todo o processo de limpar, de marcar o pezinho, de pingar remedinho no nariz, aquele nitrato de prata para limpar. Detalhes que hoje nem se passa de alguém pensar em ter que aprender isso. Como cortava o cordão umbilical, tudo isso a gente tinha que aprender. Eu amava. Nunca esqueci, mesmo a experiência de você estar na Pediatria, eu lembro que me marcava muito. Crianças chegavam às vezes muito queimadas, aquela queimadura, toda deformada. Como era dolorido para fazer. Foi um contato com a realidade muito forte que ela... Tinha gente que não agüentava, desmaiava. Eu acho que foi um contato, eu acho que ela me ajudou muito com essa proposta dela, a ter bem o pé no chão, a já lidar com dor, com sofrimento. Que eu tinha o quê? Eu fiz 14, 15, 16 anos. Então, com o Ricardo Misson foi isso. Uma outra coisa que também eu lembro que marcou, que hoje eu reclamo que eu acho um absurdo que não se saiba cantar o Hino Nacional. (riso) Lá também tinha uma coisa tão bonita, sabe, da gente? Que eu vejo que quando eu canto até hoje, como faz sentido para mim! Então, quando eu vejo os nossos jogos e aqueles... Eu falo assim: “Todo treinador devia no treinamento dos jogadores treinar isso”. Porque você vê um absurdo fora do país, às vezes eu fico reparando, os outros países sabem cantar e cantam. Os nossos não cantam, você percebe que cantam errado. Então, isso também foi uma coisa interessante no Ricardo, no Alexandre Gusmão.
P/1 – Vocês cantavam o Hino todo dia, ou era na aula de Música?
R – Não, era toda semana. Mas na aula de Música ele... Eu lembro até do professor, essas coisas, era o Clóvis. Ele tinha um respeito, uma coisa com aquilo. Ele trabalhava intensamente, de todas as formas para a gente compreender o significado, saber a partitura como é que foi feita, toda história: quem é que compôs a música, quem fez a letra. Então, a gente mergulhava. Eu acho que isso foi dando sentido. Por isso que quando a gente cantava vinha assim de dentro mesmo. E depois eu descobri na escola também, lá na PlayPen mesmo, quando a gente começou também trabalhar com as crianças, como o Hino para eles era... Eles amavam essa musicalidade do Hino que é uma coisa que era muito diferente para eles. Então, a gente começou a selecionar os hinos e poder estar cantando com eles. E a gente ficou surpresa, porque a maioria das professoras detestava isso. Sempre associava com aquela obrigação de dever, de civilidade, que não tinha, repetir aquelas palavras que não sabia o sentido de nada. Ficava uma coisa muito decorativa só e chata. E as crianças foi uma surpresa ver como com o ritmo de hino elas ficavam empolgadas, foi bem legal. Que mais?
P/1 – E como é que dando sequência no seu estudo?
R – Então, aí deixa eu ver como foi. É eu acho que quando eu já estava no final do ano eu já tinha me decidido então, que eu queria mesmo fazer Pedagogia, continuar na área de Educação. E tinha uma outra colega minha também. Nós duas fomos e aí a gente fez o vestibular pra PUC. Então, foi assim, já de um ano, de terceiro Magistério a gente já entrou no...
P/1 – No Magistério você já tinha algumas matérias, no Normal, você já tinha umas matérias direcionadas...
R – Para a área de Educação. Tinha Didática. A Didática é que pegava todos esses outros conteúdos já trabalhando como você vai ensinar.
P/1 – Tinha alguma que você já tinha preferência?
R – Eu gostava de, como é que chama mesmo? Metodologia e Prática de Ensino. Acho que a professora também, que eu sempre percebi que a personalidade da professora, o tanto que ela expressa pra você que ela gosta daquilo que ela faz, isso ficou pra mim depois na formação de professores como... Porque eu vivi isso, eu percebo que essas professoras que até hoje eu lembro o nome é porque elas tinham no olhar o brilho de que elas faziam aquilo porque realmente fazia sentido, eles gostavam daquilo. E essa depois que eu lembro, dessa professora... Depois eu encontrei com ela, ela ainda estava, ela era lá do Alexandre de Gusmão no terceiro ano, Dona Leonor. Depois eu encontrei ela na PUC, e ela faleceu. Eu lembro que isso também me marcou, depois eu soube que ela tinha. Então, eu acho que a minha matéria predileta mesmo era Metodologia de Ensino e Psicologia também, porque aí está muito ligada. Foram duas coisas que eu... E aí entrei na PUC, foi um momento muito feliz na minha vida. Eu me senti assim muito privilegiada, muito importante porque eu achava uma delícia falar que eu estava na universidade. Então, tinha uma coisa assim, na PUC era muito gostoso naquela época.
P/1 – Seu pai chegou a fazer universidade, não?
R – Meu pai sim. Meu pai fez duas. Ele tinha assim uma... Em relação a estudo, a conhecimentos, sabe, ele, era um grande valor na vida dele. Com todas as dificuldades do tempo dele ele fez duas faculdades. E o sonho dele era que os filhos fizessem. No fim eu fiz completa. A minha irmã entrou em Psicologia, no primeiro ano depois já saiu. E meu irmão fez Educação Física, mas nunca atuou também na área. Então, eu lembro que ele ficava muito, ficou muito feliz quando eu entrei. Que eu me lembro até que ele me deu de presente um Fusquinha, meu primeiro carro, vermelhinho.
P/2 – Que ano que você entrou?
R – Eu entrei em 1965. Logo depois de 1964, então foi uma vida na universidade assim maravilhosa. Eu participava de tudo, comissão paritária. Só não me deixaram ir nas passeatas. (risos)
P/2 – Não deixaram, seus pais?
R – É. Sabe, mas eu tive uma vida muito participativa na faculdade, muito. Era uma... Tanto que eu falo, eu vejo hoje em dia alguns cursos assim que você começa com uma turma, depois pelos créditos você vai migrando para outros, não tem aquele vínculo que forma da turma. E muita gente tem que fazer a noite porque aí trabalha de manhã. Então, você viver na universidade todo aquele clima, eu acho uma aprendizagem que na minha vida foi fantástica.
P/2 – O que é que mudou? Sua essência mudou quando você entrou na universidade, ainda mais naquela época?
R – Mudei. Dá aquele salto de maturidade, sabe? Até nessa parte da religião, que eu te falo que a gente tinha os cursos, aí toda essa atuação política, de você ter que estar ligada no que está acontecendo, ter que se posicionar. Por mais sonhadora que fosse ou não tanto com o pé no chão, mas realmente é um exercício interno fascinante. E ao mesmo tempo... Aí nessa época eu entrei também, como era na PUC, comecei a participar de um grupo, era da missa comunitária. Então, nós tínhamos o... Era o pessoal que, a gente fazia junto com o padre a missa. E era assim uma missa bem politizada. A gente depois ia para as comunidades de base fazer trabalho nas periferias. E também foi, criou um grupo muito que até hoje eu tenho contato com algumas pessoas. O padre que nos acompanhou também foi interessante. Porque o Marcos, depois eu fui ver, ele era o padre da PUC e desse grupo. Depois eu fui identificando, quando eu estava no Magistério no Alexandre de Gusmão na formatura, ele era seminarista. E ele, porque era lá do Ipiranga, e ele que fez a missa, então aparece na foto. Depois eu o reencontrei na PUC, então na formatura da PUC também ele foi. Aí ele era desse grupo, aí ele fez meu casamento, ele fez o batizado dos meus filhos, foi uma pessoa que foi acompanhando. Depois ele deixou de ser padre. E hoje é meu compadre. (risos) Continua na PUC, ele foi meu orientador de Mestrado. Então, foram amizades assim, vínculos muito fortes que até hoje, porque aí nessa missa o que aconteceu? Nós éramos universitários, tinham de outros cursos também, não era só de Pedagogia. E aí todo mundo foi se formando, e também foram se casando. E aí não ia mais na missa dos universitários, e a gente quis criar a dos casais. Então, deu uma continuidade aí com esse mesmo trabalho social que a gente ia pra fora. E nisso a gente ficou o que? Acho que uns 10 anos com esse grupo.
P/2 – O que é que era o trabalho? Vocês iam na comunidade de base o que vocês faziam?
R – A gente reunia as pessoas, fazia mutirões, pra estar trabalhando a esta questão. Não era muito ligado à religião, propriamente à religião. Mas era mais assim de qualidade de vida, que a gente diria hoje, de ver como eles se organizavam, ajudar a se organizar, reivindicar. Eu lembro que uma vez a gente ficou num trabalho enorme com essa parte dessa estrutura básica de higienização, de esgoto, de, então eram essas coisas. Porque eram pessoas de várias profissões então, aí todo mundo entrava. Quem fez Direito, dava uma assistência assim. A gente lidava com os pais e com os alunos em termos de escola, como é que estavam as escolas, quem tinha feito Pedagogia. Então, foi muito rico isso.
E também, então foi aí que eu falo que eu fiz as pazes e muito bem com a religião nesse sentido. Que eu lembro que também as comemorações de Natal, de Páscoa que a gente fazia eram plenas de sentido, plenas! A gente ia construindo tudo. Lembro que na Páscoa a gente ia para uma espécie de retiro, mas ia a família inteira. Então, tinha o momento que ficavam com as crianças, as pessoas. E a gente fazia várias dinâmicas, que na Páscoa o sentido de transformação desde os adultos com as crianças, até em fazer pipoca e ver em que é que o milho se transforma. E aí poder, sabe? Então, era de outra forma. E também, era muito voltada para essa parte educativa, vamos dizer assim. Não de informação, mas de formação mesmo. Então, esse também foi, tem uma marca forte, acho que no meu jeito de ser e estar no mundo. Essas experiências todas, eu tenho um grande carinho. Por isso que depois eu quis voltar também para PUC para fazer Mestrado. É uma ligação forte nesse espaço.
P/1 – Nesse período de formação lá na PUC no curso de Pedagogia você entrou em contato com as várias correntes pedagógicas.
R – Isso, foi.
P/1 – Teve alguma que marcou, que você se identificou mais ou que autores que você estudava que...?
R – É, como eu te falei como é que estava, até quando eu falei que esses aspectos de ter tido experiências como aluna e aí depois você vai você tem um outro olhar. Não, isso eu não quero. Isso não é bom. E ainda não sabia o quê. Mas à medida que vem apresentando essas novas propostas, eu lembro que na época era muito a Escola Nova, que aí transformava o aluno em vez de paciente era muito mais sujeito ativo, teve a Escola de Aplicação aqui da Lapa, que a gente tinha muito contato. Então, foi nessa parte de, me atraía tudo que viesse com uma proposta de inovação, de transformação. Isso também sempre foi uma marca. Então, eram esses conteúdos que me interessavam. E como na época também a gente vivia isso politicamente, que queria transformação, uma coisa mais humana, mais verdadeira. Então, em tudo na minha vida era esse aspecto. Eu lembro que na Psicologia também, até hoje eu vejo, quando eu fiz depois trabalho com as professoras que a gente fazia uma árvore genealógica das pessoas, dos teóricos que seria da profissão. Então, aí eu identificava algumas pessoas que me marcaram dentro da Psicologia e que até hoje eu vejo que era o Karl Rogers, que eu vi, assisti, eu vi pessoalmente. Eu lembro que era a proposta era muito essa relação muito mais direta da pessoa, não é aquela coisa que afasta também o terapeuta. Era uma relação mais de empatia. Ele fazia algumas colocações que era impossível você poder fazer algum trabalho terapêutico de um vínculo quando tinha a autoridade, essa diferença de papel muito grande. Então, coisas desse tipo. Dentro da Educação também tinha e todos esses que foram aparecendo. Pestalozzi, Dewey, todos esses outros.
P/2 – Você fazia Pedagogia...
R – Pedagogia.
P/2 – Você lembra dessa época que você escolheu, só voltando um pouquinho, você já
está um pouco mais pra frente, só para entender um pouco tua escolha. Você fez Magistério, a coisa foi indo, mas teve uma decisão sua?
R – É, era uma continuidade. Teve aí já teve.
P/2 – Assim: “Ai, eu quero ser educadora”.Você lembra dessa...?
R – Teve, exatamente por causa disso. Quando eu vim pra cá que aí eu comecei me dedicar mais ao estudo, porque aí não tinha toda aquela, aquele lazer que tinha na cidade do interior, e aí eu fui descobrindo isso. Como eu gostava, como eu queria atuar, como eu queria modificar um pouco essa estrutura de educação. Tinha uma coisa assim, sabe? E aí já estava no ar, pairando um pouco essas desejos de mudanças até no país e tudo. Então, aquilo bateu forte em mim. Como eu conheci alguma coisa e estava gostando da área de Educação, que eu queria ser uma professora transformadora. Eu fui aluna do Paulo Freire, tive ele no mestrado juntinho comemorando coisas assim do meu lado. Trabalhei com a filha dele. Então, eu fui buscando esses caminhos, essas pessoas todas que eram, de uma certa forma, revolucionários na área de Educação. Fui muito feliz nesse caminho. Amei ter escolhido. (risos)
P/1 – E na faculdade, teve que fazer estágio?
R – Tinha. Trabalhei uma época na Escola de Aplicação também. E eu me saía muito bem. Tanto que aí logo já era convidada para trabalhar nas escolas, porque era bem isso, de você querer trazer uma coisa nova e as pessoas que queriam gostavam disso. Então, foi tranquilo nesse sentido, de logo... Aí o que aconteceu? Quando eu estava no finalzinho começou surgir também essas coisas sempre de inovação e me chamava atenção, que era Pedagogia no Trabalho. E a gente foi convidada, eu e minhas outras amigas, para fazer um curso que seria, mas era junto com o último ano mesmo, mas uma espécie de especialização, que era no CENFOR, que eu nem sei como que chama hoje, mas eu lembro que existiu ainda muito tempo. CENAFOR, era CENAFOR. E ele chamava Pedagogia no Trabalho, mas que hoje é a área de Recursos Humanos, entendeu? E a gente gostou muito. Nós achamos fantástico! E aí um dos professores acabou logo nos convidando para ir nessa área, eu e mais duas colegas, para a prefeitura. Então, eu desviei dessa parte de educação formal e fui pra área de trabalho. Então, eu fiquei 12 anos na prefeitura na área de Recursos Humanos.
P/1 – Qual que era a sua atuação?
R – Então, eu comecei desde estagiária, depois eu fui... Hoje, na época a gente chamava coordenador, mas que seria assim um gerente de uma determinada área. Foi um processo crescendo, assim.
P/2 – Na área de Recursos Humanos da prefeitura?
R – É, Seleção e Treinamento. Ela não chamava RH, porque RH surgiu depois, que hoje também ainda não é. Desenvolvimento Potencial Humano. Vai mudando os nomes, mas na época era Seleção e Treinamento de Pessoal. E fomos depois desse curso, formamos na Pedagogia, fizemos esse curso, aí fomos fazer estágio. Já tinha uma colega que trabalhava na prefeitura lá na Prestes Maia, e tinha esse estágio, mas era remunerado também. Eu e uma outra, a Rosali, nós fomos. Nós trabalhamos esses anos todos lá. Nas administrações regionais, teve uma pessoa também que foi muito marcante, que foi com quem a gente primeiro trabalhou, que hoje até tem uma praça dele no Brooklin, ele chamava Werther Krause. Então foi... Ele era coordenador das Administrações Regionais, um homem brilhante, assim também muito revolucionário nesse sentido de democratizar a prefeitura. E eu lembro que a gente teve que preparar um treinamento e a base toda do treinamento era Piaget. Então, a gente teve que apresentar e foi muito bem visto. E esta experiência na prefeitura, o que foi muito rica é porque eu trabalhei com profissionais. Como era... Mais treinamento, porque na seleção a gente não atuava tanto. Ainda não era essa seleção, eram concursos, eram coisas assim, então não tinha. Era depois que você organizava, mais no recrutamento, tal. Mas treinamento não. Então, a gente tinha que fazer desde levantamento de necessidades, quando aparecia alguma reclamação, depois ir atrás de todos os recursos também humanos para ver quem poderia trabalhar aquela falta de habilidade. E a gente trabalhava desde o pessoal que tapava buraco, então era isso, até Engenheiros, Arquitetos de parques e jardins. Não era a gente que dava, mas era a gente que organizava. Então, esse contato também de trabalhar com várias profissões foi uma coisa que me ensinou muito. Essas realidades tão diferentes. Por isso que depois quando eu voltei para a escola o maior tempo do meu trabalho foi trabalhar com professores. Exatamente porque eu tinha, vinha com uma bagagem grande das necessidades, das dificuldades, tanto da habilidade que não se tem, não sabia muito bem o que se esperava da pessoa, tinha isso. Como também a própria dinâmica de equipe, de trabalho em equipe, de relacionamentos. Então, foi aonde, depois o meu mestrado, tudo, foi muito em cima da formação de professores.
P/2 – O teu contato com o Paulo Freire na PUC foi já no mestrado?
R – Foi no mestrado, foi já no mestrado.
P/2 – Ele era professor também?
R – Ele era professor de Políticas Públicas. Foi, teve a época também que ele foi prefeito. Estava na PUC nesta ocasião.
P/1 – E seu primeiro trabalho foi esse então na prefeitura?
R – Foi. Eu tinha entrado também na área de RH na Eletroradiobraz, chamava na época, mas fiquei poucos meses porque aí a prefeitura chamou então a gente queria, eu queria mesmo ir para a prefeitura. E foi muito bom também porque não era um trabalho sozinha. Como a gente começou como estagiária tinha essas duas colegas que até hoje, uma é minha comadre, até hoje a gente se vê sempre. A gente começou essa carreira junto e foi muito bom. tinha um apoio gostoso. Até como a gente tinha a mesma formação então, o trabalho pode, acho que tem melhor resultado também, flui mais, porque não era uma pessoa implantando alguma coisa, eram três. Chamavam a gente das Três Marias. (risos)
P/1 – E aí o mestrado você foi fazer você estava na prefeitura ainda?
R – O mestrado eu fui fazer muito depois. Não, já estava na escola. Eu fui fazer o mestrado, eu fiz acho que em 1991. Eu me formei em 1969. Eu me formei em 1969, no final de 1969, casei no início de 1969. No último ano da faculdade eu já estava casada. E aí depois o mestrado eu fui fazer só em 1991. Foi muito bom também porque aí eu fui com questões que eu tinha durante todo esse meu período, o meu problema, que eu queria pesquisar era em relação ao que eu tinha vivido como educadora. Porque aí olha, na prefeitura eu fiquei então uns 12 anos. Aí o meu marido foi transferido não, teve uma oportunidade em Uberaba, em Minas. Ele era Engenheiro Químico, foi pra negócio de fertilizantes e tal. Então, aí nós fomos todos pra lá. E aí lá não tinha como eu trabalhar nessa área porque ainda era novidade. Deixa eu ver que época que foi isso, porque o Guilherme estava com, entrou na quarta série tinha nove anos, é 1986, essa época. Então, eu fui pra lá, primeiro eu não, ainda não conhecia ninguém. Fui com os três, foram para a escola. O Guilherme tinha nove, a Daniela tinha sete ou oito e a menor tinha quatro para cinco anos. E lá foi outro caminho também. E aí lá que eu voltei pra escola. Porque nessa área já era mais difícil e eu fiquei ligada ainda à prefeitura. Eu fiquei... Era como se eu estivesse em licença ou emprestada para outra. Sem remuneração, mas contando o período porque podia ter a idéia de voltar pra cá. Como depois não se efetivou, acho que depois de uns dois, quatro anos, porque era o Maluf, aí quis que organizasse. Aí tive que pedir demissão. E lá eu fui fazer concurso no estado para professora, entrei, peguei uma escola de periferia. Também foi uma experiência muito rica. Fui alfabetizar, adorei também. Também é muito essa coisa de transformar: a criança entra não sabendo ler e no final do ano você vê uma... Eu gostava disso. Como professora eu acho a melhor série é a, o período em que você alfabetiza. Eram crianças muito pobres, que eu tinha que levar às vezes coisas para elas comerem. Tinham crianças que depois eu descobri que não podiam ir à escola porque não tinham uniforme. Então, foi uma experiência muito rica, marcou pra mim. De lá também criei um pouco de... Fiquei um pouco revoltada com a diretora porque tinha uma coisa assim, até acabei fazendo uma denúncia. Essas coisas de querer. (risos) Porque depois eu vi que era comum isso lá. Essas escolas, que era da prefeitura, ou era do estado? Eu já nem me lembro. Do estado? E elas faziam umas festas para arrecadar dinheiro para a escola porque só a verba de governo não dava. E aí eu descobri que ela dava umas desviadinhas em coisas que a gente sabia que estava querendo. Então, trabalhei que nem uma louca por isso, mesmo não concordando muito com as coisas, porque era a eleição da menina mais bonita, uma coisa assim. E você via que era mais quem vendia mais voto. Eram umas coisas que eu comecei a achar meio estranho. Eu nunca tinha trabalhado em escola. E aí depois então, eu fiz, e teve alguns problemas lá assim, aí eu vi que não adiantava, que aquilo já
era da cultura, que já
estava. Eu acabei saindo, pedindo também afastamento da escola.
P/2 – Você denunciou ela e saiu?
R – Não, fiquei ainda porque ainda tinha esperança que aquilo se consertasse, mas, sabe aquilo? Que ainda hoje a pessoa nem quer nem ver muito “Isso é assim, nem era muito grave”. E aí eu fui trabalhar na escola onde os meus filhos estudavam. Também fui ser alfabetizadora lá. Também foi muito bom.
P/1 – Era uma escola particular?
R – Era. Eu trabalhei em vários tipos de escola. Escola também rural lá em Uberaba, uma época.
P/1 – Também alfabetizando?
R – Nem dava para ser, porque aí são salas de todas as idades. Então, você desde alfabetizava como também tratava. Não era sozinha, era com outro grupo de pessoas que a gente fazia esse trabalho lá, perto de uma carvoaria. Muito interessante esse também. De ver todo o processo das crianças, nem nome elas tinham clareza da identidade delas. E todo o processo depois quando assinava os desenhos, nossa, são coisas assim que tocam profundamente. E lá, depois dessa escola também, aí eu fui... Aí eu comecei também, é que eu queria ir para a universidade, eu não me lembro direito também tanto como que foi. Mas aí eu acabei fazendo parte de um grupo. É foi muito engraçado isso, agora que eu estou lembrando. Eu estava no clube... Eu já tinha ido levar o currículo daqui, dali, tá-rá-rá. Mas eu sentia lá em Uberaba assim, era um pessoal muito fechado para as pessoas de fora, principalmente para os paulistas, eu acho que tinha um pouco medo de concorrência. Porque o paulista tem, eles eram mais acessíveis aos cariocas do que os paulistas. Isso eu pude perceber forte depois. No começo você nem sabe. Mas acho que eles sentiam a gente como uma concorrência maior, eu acho isso. Então, eu não conseguia. Todo mundo achava ótimo. Aí um dia eu estava no clube e sentou perto de mim, estava lá vendo as crianças brincarem, e fiquei conversando com uma senhora, ela comigo. Bom, enfim, foi um papo muito bom e ela era diretora da universidade, lá da faculdade. E ela falou: “Ai, mas eu queria tanto, estou tão procurando uma pessoa assim, que tenha essa experiência”. Eu falei: “Pois é, mas meu currículo está até lá”. E aí que eu acabei entrando, entendeu? Foi uma conversa informal. E também foi uma experiência rica, porque eu entrei num grupo de vários professores, tinha um professor que era, eu não me lembro se era uruguaio ou paraguaio, o Raimundo Dinello, ele chamava. Mas ele era um professor que atuava na universidade na Bélgica e na Suíça. Era um homem maravilhoso. E ele foi parar lá em Uberaba quando ele viu que lá tinha um projeto muito interessante que era o Circo Itinerante. E esse circo ficava cada tempo num bairro, e as próprias... Tinha o pessoal do circo, mas tinha... Eles iam trazendo as pessoas do bairro, os talentos que as pessoas tinham. Então, tinha uma questão de inclusão muito interessante. E não sei onde ele ficou sabendo disso, e aí ele se mandou também pra estar lá. Entrou em contato com a universidade. E a proposta dele fazer uma pesquisa, ter um grupo para ver como que estava o ensino em Uberaba. Então, avaliar mesmo. E aí eu fazia parte desse grupo e eu fiquei com o grupinho que ia analisar pré-escola até a quarta série. E a gente fez toda uma pesquisa de realidade mesmo, de depoimentos, de registro, toda aquela coisa. E a gente chegou mesmo à conclusão de que nas palavras assim... Isso eu relato na minha dissertação. O ensino era assim muito um sacrifício para os alunos, eles gostam. Até hoje ainda eu acho que é muito assim, de ir pra escola por causa dos amigos. Mas em termos de relação com o conhecimento não tem. E para os professores também. Era um mal estar docente, como a gente falava. Cada vez mais desvalorizados, tanto em termos sociais como financeiros, era uma realidade triste. E aí a proposta era a gente interferir para mudar isso. Aí eu fui acabando, eu fui ser a primeira diretora da Escola de Aplicação da Universidade.
P/2 – De lá?
R – De lá. E com esse orientador. Foi aquela revolução na escola. Porque era a parte de artes, de criatividade, de tudo isso, de ludicidade era boom! E a gente foi fazendo e foi checando alunos. Porque era uma escola, tinha algumas classes muito difíceis. E deu para se perceber que quando você entra com esses princípios ou trabalhos mais integrados de oficinas, que a gente chamava na época, e oficinas de arte, eram livres, os alunos não eram obrigados, mas aí chovia. Comportamento, a aplicação deles começou a se modificar. Então, não era nem agir diretamente no conteúdo, mas era abrir esse espaço de você resgatar outros talentos ou habilidades que o ser humano tem, e que aí ele leva. Então, foi uma experiência maravilhosa. Acho que foi uma das minhas melhores como Pedagoga. Por quê? Primeira vez que eu ganhava muito bem, que como era Escola de Aplicação não tinha... E tinha esse espaço, você tinha desde pessoas muito pobrezinhas, e tinham também muitos filhos dos professores da universidade. Então, foi riquíssimo isso. Aí o que aconteceu? Mudou o reitor. Ele já começou a querer fechar porque todas as coisas muito, né? Gastava dinheiro, sabe? Tinha. Porque a gente viajava com as crianças, (risos) esse tipo de coisa que, tinha, a gente sabia que podia. Mas aí entrou com aquela coisa, “tá-rá-rá”. E começou a interferir muito, e queriam trocar a equipe. Aí eu resolvi que eu também queria sair, que na hora que começou essas negociações, que a minha equipe era maravilhosa. Porque a gente fazia esse trabalho realmente em equipe. Quem ajudava muito nisso era esse orientador. E ele tinha também um dinamismo. Porque nessa ocasião ele fazia congressos que, como ele tinha muitos conhecimentos em outros países, então ele fazia intercâmbio nessa parte. Então, eu recebi na minha casa uma chilena, depois eu tive duas suíças, depois eu fui pra Suíça, para Neuchâtel, num congresso também. Fiquei primeiro em Portugal com os professores que ele conhecia, depois eu fiquei na casa de uma diretora de uma escola lá na Suíça. Então, era assim uma, você olhar em termos de Educação de mundo, fez vuuummm, abriu.
P/2 – Vou voltar um pouquinho antes, porque assim, você passou de professora a diretora. Mas eu queria saber quando você ainda estava em sala e essas experiências todas de escola que você teve, tão variadas, como que era a tua relação com os alunos?
R – Ah, era ótima. Até hoje assim, em termos... E quanto menor, quanto menor não. Eu acho que eu me identificava muito nessa fase das crianças quando eles estão na alfabetização, sabe? Então, enquanto professora, era onde eu me sentia melhor e numa relação com os alunos e com os pais também excelente. Porque acho que é aquilo que eu falei, como era uma coisa que eu adorava fazer. Então, eu lembro que a primeira experiência ainda naquela escola, a primeira que eu entrei, tinha aquela diretora, também depois que eu saí de lá a relação com as crianças era muito forte. E também eu fiz uma descoberta fantástica, porque a minha filha estava no primeiro ano nessa escola particular. Eu era professora do primeiro ano nessa escola com crianças problemáticas e muito pobres. E eu pude descobrir no final do ano que os meus alunos tinham produções escritas e resultados muito melhores do que da turma da minha filha. Porque depois eu fui ser professora lá.
P/2 – Mas como era tua aula, você lembra? No que você se baseava?
R – Ah, lembro. Eu lembro que era o máximo também isso, porque eu tive que trabalhar com a tal da cartilha “Caminho Suave”. Porque era a que tinha lá, tinha que ser. Mas eu transformei aquilo. Tanto que depois eu fiz um trabalho que me pediram para apresentar. Como é que eu mexi com a... Então, eu dramatizava. Eu lembro que era assim, porque essa cartilha é assim: tem, por exemplo, o pato. A imagem do pato. No desenho do pato tem a letra que é assim a cara do pato e o pescoço. Então, tudo é assim uma imagem, dentro da imagem tinha a letra que era para a criança poder firmar. Aí vinham as famílias: pa, pe, pi, po, pu. Essa coisa toda. Eu fazia um suspense, não deixava eles com a cartilha. Eu não me lembro como é que eu fazia, mas assim, apresentava um bicho sem a, ou qualquer imagem, sem a letra. E aí ficava brincando com eles que letra que poderia ser que tem no corpo desse bicho. E um fazia uma coisa, outro fazia outra. Eu lembro que eu dramatizava algumas que davam para inventar uma história, que não era a que estava na cartilha.
Não trabalhava as famílias. Eu comecei a trabalhar assim, pegava, não sei também da onde que veio da minha cabeça isso. Eu fui a cartilha inteira só com o A. Então era, tanto que chegava um pedaço que era difícil (riso) porque eles queriam escrever mas só tinham com o A. Mas era bem assim de experiência, mas eu ia indo. Lá também ninguém te orientava, ninguém falava nada, você fazia. E isso eu acho muito bom, porque aí você era livre para fazer, você só ficava vendo se estava dando certo. Mas estava. Porque as crianças estavam aprendendo a ler. E não demora muito pra você fazer tudo isso. Porque você só pega a letra com a vogal A.
P/2 – Mas você pegava palavras que sempre tinham A e ia apresentando, é isso?
R – É. Então aprendeu desde o A, depois ba, ca, fa, lá, era só assim, entendeu? Aí vai rápido. Quando eu voltei e dei ba, be, bi, bo, bu, aí fez tchum. Eles já sabiam tudo de uma vez. Então, foi muito mais rápido do que você ficar família com família até dar o clique deles perceberem, sabe? (risos) Então, foi uma coisinha inventada que eu ia vendo com eles que deu muito certo isso. Então, eu acho que essas experiências assim de estar vendo como é que a criança te pergunta, como é que é esse olhinho dela, que são super curiosos. Então, você entrar nesse mundo infantil e, principalmente, da ludicidade foi, acho que aonde eu fui. Depois esse uruguaio, esse suíço que às vezes a gente falava, a proposta dele era uma metodologia lúdica e criativa. Chamava assim o trabalho dele, a proposta dele. Então, bateu muito de encontro com essas coisas que eu estava procurando. E depois também na... Que eu fui para a escola da minha filha alfabetizei também foi muito bom. Porque a minha classe era de crianças que vinham de várias outras escolas. Porque eles sempre davam assim para a professora que estava começando as turmas mais difíceis, as outras que estavam lá já escolhiam. E, geralmente, nessas escolas existem quatro, cinco primeira séries. E também foi muito interessante. Porque também dei conta, era mais dinâmico justamente por ter ido, foi difícil. Era uma coisa desgastante.
P/2 – Mas depois é, eu, na verdade, que voltei, né? Você estava contando do seu começo de experiência como diretora depois dessa vivência toda? Você quer perguntar alguma coisa?
P/1 – Não, era mais um acompanhar agora a parte da Direção, como é que foi depois com a mudança de reitor, o que é que aconteceu?
R – Então, aí em Uberaba teve isso de fechar essa escola, de estar trocando, voltava ao esquema tradicional. E aí alguns pais que eram professores da universidade começaram a pedir muito, a incentivar que a gente abrisse uma escola. E aí a gente acabou fazendo isso. Até eu lembro que aí a gente teve uma boa indenização, por ter sido mandada embora, no fim foi ótimo. Porque aí com isso a gente fez uma sociedade, éramos cinco que trabalhávamos lá, cinco ou quatro? E chamava Escola Criativa de Uberaba.
P/2 – O Aplicação era...
R – Era da universidade.
P/2 – Não, mas era Fundamental, era...
R – Era, ia até a oitava.
P/2 – Tinha Jardim também?
R – Tinha Jardim também. E numa dessas propostas o Jardim, nessa Criativa também era, a gente não separava a idade das crianças. Era uma turma de três a seis, sabe? Então, tinha muito isso do valor da heterogeneidade. Tinham umas coisas assim diferentes e que no começo, às vezes era difícil das pessoas aceitarem. Porque realmente rompia com alguns padrões educacionais.
P/2 – Você foi direto de professora a diretora. Então, um grande salto assim.
R – Fui, quando eu fui para o Colégio de Aplicação aí eu já fui como diretora.
P/2 – Como foi essa mudança de papel?
R – Olha, você sabe que não teve tanta assim? Que é engraçado, aí parecia mais o papel que eu tinha quando eu estava trabalhando com RH na prefeitura. Então, não era uma coisa... Aí eu estava no papel mesmo, como aqui eu era coordenadora e as professoras, os profissionais. Então, esse trabalho... Por isso que aí começou forte eu poder resgatar o trabalho de formação de professores. E nesse projeto era tudo que precisava. Por isso eu acho que inclusive a diretora da faculdade falou na época, né? Porque não adianta você implantar uma metodologia diferenciada, tem que se trabalhar os professores. Então, foi nesse sentido. Como eu tinha uma experiência grande de trabalhar com profissionais, vamos dizer assim, na formação me facilitou muito. Então, não foi assim muito, vamos dizer, um desafio difícil. Foi como quase que um reconhecimento de... Então, foi muito bom, muito bom.
P/2 – Aí você abriu a escola?
R – Aí abrimos a escola, e na escola também eu era Diretora. Mas lá também era uma escola tipo cooperativa, e também a gente fazia um rodízio na Direção. Mas eu fiquei na Criativa, no fim eu acabei ficando pouco porque depois eu voltei. Foi só a implantação. E foi muito interessante porque quando a gente começou a escola eu lembro que quando a gente abriu a procura foi tão grande que tinha gente que ia de madrugada para ficar na fila. (risos) E a gente passou por experiências e a pessoa vinha e não tinha mais vaga chorava. (risos) Olha. Então, e dessa ocasião também que a gente viajou pra fora, foi levar essa experiência toda da escola. Foi uma escola... Eu trouxe também, tem material aí, que eu lembro que uma vez era Dia dos Professores, e aí o jornal de Uberaba foi fazer uma entrevista, porque era uma escola diferente. E tem um livro, um livrinho também, um folheto que a gente escreveu junto com esse Dinello que a gente também apresentou, que era assim, chama: “Dialogando com uma Escola Criativa” que era exatamente todas as questões que as pessoas: “Ai, e se a criança sair da escola? Ai, e se não sei o que lá?”. Porque a alfabetização também era só com sete anos. Tinha muito isso de desenhar, de pintar, de dramatizar, bem essa parte lúdica mesmo. Então, as pessoas estavam um pouco assustadas, porque em relação à escola tradicional ficavam com medo de uma mudança. E aí todas as perguntas, e a gente selecionou o que mais inquietava a sociedade, aos pais e fez esse livro. Então, conta um pouco da metodologia. E quando... Aí foi isso. Depois eu voltei pra São Paulo porque eu já tinha um filho que já
tinha vindo pra cá pra fazer cursinho. A segunda filha também veio. Aí eu me separei, estava só com a menor. Aí eu quis voltar para a minha cidade. Porque nessa época que eu estava atuando lá como diretora, tudo, também isso facilitava. Porque eu tinha muito contato com São Paulo. Pela ligação que eu tinha com a PUC. Então, tudo quanto é congresso, Emilia Ferreiro. Porque na cidade, em Minas, o pessoal é um pouquinho mais assim fechado, não é muito disso.
P/2 – Que escolas te inspiraram a construir?
R – A Criativa? É, eu acho que vinha aquilo da Escola Nova, mas não que eu tivesse visto alguma escola. Eu acho que talvez o pouco que eu conhecia da Escola de Aplicação da Lapa, na época que eu estava na faculdade, tinha algumas coisas que... Mas eu acho que também aí eu estava sempre nesses congressos todos que sempre estavam acontecendo e aí eu que levava um pouco isso pra lá. Então, quando eu vinha pra cá eu tinha muitos contatos, até de colegas minhas da faculdade, da Pedagogia. Uma que estava aqui, outra que estava lá, mesmo esse, o Marcos Mazetto, que era o padre aqui da PUC que depois tá-rá-rá-tá-rá-rá, então foi muito fácil. Eu achei que ia ser tão difícil eu vir pra cá, também foi uma decisão assim, eu vim pra cá eu falei assim: “Não, eu vou”. Não tinha casa, não tinha trabalho, estava separada. Mas foi uma das coisas na minha vida que era muito clara assim: “É isso que é pra fazer”. Eu vim em novembro, que aí eu conversei com um e com outro para fazer algumas entrevistas. Nas duas entrevistas primeiras que eu fiz eu já, eu já estava trabalhando. Uma foi no Galileu Galilei e a outra foi na escola com a filha do Paulo Freire, que não tem mais essas duas. Era o Poço do Visconde. Aí eu fiquei trabalhando nessas duas escolas um tempo.
P/2 – Tentando lembrar a mãe de um amigo meu que, acho que foi diretora no Poço. Flávia, ai gente, já eu lembro, mas tudo bem, me desculpe.
R – Flavia? Ela está viva?
P/2 – Tá.
P/1 – E como é que foi a decisão de sair de Uberaba?
R – A decisão? Foi por causa disso.
P/1 – E de deixar a escola.
R – É, foi por causa disso. Porque os filhos estavam aqui já. E eu acho que chega um tempo, eu já... A escola eu gostava muito, mas assim, dava assim: “Chega daquela cidade.” eu queria voltar pra São Paulo. Então, foi isso, porque eu também tinha me separado, aí eu queria estar de volta aqui com a minha família, resgatar os amigos. E foi muito bom isso. E aí eu fiquei nessas duas escolas. Aí foi a época que eu resolvi fazer o mestrado.
P/2 – Você voltou pra cá para fazer o quê nessas escolas?
R – Numa eu era assessora, lá no Poço do Visconde, fiquei com um grupo de assessoria. A ideia era depois talvez ficar na coordenação. Mas aí eu não dei conta de ficar com duas escolas. Porque São Paulo era difícil, porque era um trânsito. Uma era no Morumbi a outra era Sumaré-Pompéia, era loucura! E no Galileu eu era, fui orientadora e coordenadora. Orientadora também educacional do Ginásio eu nunca tinha sido. Também foi uma experiência interessante. Não que eu tivesse gostado muito não, essa eu não voltaria. Achei muito chato.
P/1 – Não? O que é que você tinha que fazer?
R – Era, eu achava que, porque eu não percebia que tinha resultado, sempre achei isso, de ter orientadora e coordenadora separado. Uma que olha o currículo dos professores e a outra que olha os alunos com dificuldades tanto de disciplina como de conteúdo. Então, eu não conseguia, eu achava que não dava para ser separado porque você não resolve o problema. Se o aluno está com dificuldade ou mesmo de comportamento você vai ver: ou é em relação ao conteúdo que, ou ele não tem, ou tem um furo ou está sem sentido, é a metodologia do professor, entendeu? Então era uma coisa...
P/1 – O orientador entra em classe, né? Entrava em classe, o orientador?
R – De vez em quando, é, uma vez por mês você dava uma aula para eles para levantar um pouco assim o que é que está acontecendo naquela sala. Mas mais é ficar lá na sala atendendo. A professora, o aluno não tem comportamento manda para a sua sala. Aí você vai ver você vê que, às vezes, o aluno tem razão. Então, ficava assim: a orientadora defensora dos alunos, e tinha mesmo essa... Até eu perceber que era isso, e a coordenadora era a que defendia os professores. Então, eu falei: “Mas são inimigos, isso?” quer dizer, não tinha muito sentido. E aí você atende o pai, tem que explicar para o pai. Não gostei desse trabalho. Mas aprendi muitas coisas, porque é bom, você trabalha com os pequenos, depois vê
o que é que acontece lá em cima. Eu acho que essa visão, porque lá na Criativa quando eu saí nós tínhamos até o primeiro e o segundo ano só. Então, o grande trabalho, o envolvimento foi... No Colégio Aplicação eu tive um pouco, mas onde a gente estava mexendo mais era com os pequenos mesmo, principalmente a parte de alfabetização. Então foi... Aí eu estava no Galileu quando uma amiga falou da PlayPen.
P/1 – Só uma coisa antes da gente ir para a PlayPen. O Galileu e o Poço do Visconde tinham linhas metodológicas bem diferentes?
R – Parecidas.
P/1 – Parecidas?
R – Não, parecidas. Eram numa proposta mais, tinha assim, eu acho que o do Paulo Freire tinha muito isso de ter sentido o que você está estudando. Então, uma linha mais de temas que eram criados junto com as crianças mesmo, invés de ser tanto aquelas matérias tão já programadas. Tinha uma espaço maior de liberdade, de escolha de conteúdo, de envolvimento das crianças. A parte de... Essa parte lúdica e de Arte também tinha um olhar mais cuidadoso. Não era aquela só para fazer o trabalhinho no final do mês, a capinha. Mas tinha um conteúdo todo voltado mesmo de você estar olhando o potencial da criança e olhar de um, aquilo que fala: educação integral. Mas aquilo era muito no papel, poucas escolas entendiam que era isso, e de você estar olhando essa criança inteira, tentando identificar a potencialidade e estar trabalhando isso. Quando começa já desde pequenininho achar que quanto mais cedo ela vai fazendo a coordenação motora, que a gente chamava de coordenação motora, e pára de desenhar, então eu tinha clareza disso por estudos, que era o contrário: que quanto mais a criança rabiscasse, desenhasse, interiorizasse, mergulhasse com aquilo, mais condições mais tarde ela tinha. E a alfabetização também, besteira também começar muito antes já com ela. Porque na hora é assim, é rápido. Quando começa muito cedo fica uns dois anos para alfabetizar. Se você não lida com isso, depois em seis meses você alfabetiza. Aquilo da criança estar pronta. Então, mas que é que era que você estava...
P/2 – Você ia começar a falar da PlayPen.
R – Então, da PlayPen foi assim, aí o Galileu também estava passando por umas crises, sabe? Briga entre pequenos sócios que tinham lá. Então, também tava uma situação que não estava muito agradável não. Aí sempre esses problemas de equipe, é em todo lugar. A gente vê em empresa, tudo, sempre esse jogo entre sócios. E aí uma amiga me falou da PlayPen, que estavam querendo e eu fui conhecer. Até eu estava com uma amiga minha de Uberaba, que era minha colega, era companheira lá, parceira da Criativa, a Raquel. Eu falei: “Vamos lá conhecer essa escola?”. Bilíngue, eu nunca tinha conhecimento nenhum de escola bilíngüe. E foi um papo muito bom com a Guida. Muito mais da vida e das coisas do que essencialmente... Ainda mais que a Guida é mineira. Aí foi uma descoberta, assim, naquela hora. Ninguém nem sabia. Essa minha amiga que era de Uberaba, que é mineira, então, sabe aqueles papos que aparecem alguns elementos de muita ligação. Então, foi muito gostoso. Só que eu lembro que eu falei pra ela, ela estava com problema sério naquela ocasião que ela queria, estava... Ela quis crescer da Escola Infantil para o Fundamental I, começou mas estava outra vez regredindo. Os alunos indo embora, já não ia mais ter quarta série, nem a terceira, porque foi diminuindo. Então, ela estava numa crise. Ela, inclusive, estava na dúvida se ela voltava a ficar só com a Educação Infantil, porque a Educação Infantil era assim de não ter vaga, né? E ela queria abrir o Fundamental porque muitos pais então, às vezes, até queriam pôr a criança lá, mas não punham: “Ah, depois vai ter que tirar de novo?”. Então, era um pouco essa questão. Mas aí eu não podia deixar o Galileu. Eu lembro que era no meio do ano. Eles também estavam nessa situação, eu falei assim: “Não, é sacanagem sair agora de lá. Até o fim do ano eu fico porque aí eu dou um tempo e tal”. Aí eu falei: “Você fica livre.” Aí foi uma outra pessoa no meu lugar, porque ela precisava. Porque quem estava lá que começou essa ampliação, que foi a Ana Maria Machado...
P/2 – Que estava desde o começo, não?
R – É, que estava desde o começo do Fundamental. Porque primeiro era só a Guida. Educação Infantil, foi o que ela começou, era só ela. Quando ela resolveu dar continuidade aí ela contratou essa Anna Maria. Mas a Anna Maria tinha ido embora, então, ela estava sem ninguém. Então, ela estava desesperada nesse sentido. Veio outra professora também, alguém tinha indicado. Mas quando chegou no final do ano aí ela me ligou de novo, dizendo que não estava dando muito certo com a pessoa que estava lá, e se ainda estava em pé de eu ir para lá. Foi assim que eu fui. Porque aí também deu para encerrar no Galileu, que não aconteceu nada mais positivo para resolver aquela situação, e eu comecei lá.
P/2 – Como é que foi entrar numa escola totalmente diferente? Você tem uma vivência bem plural, em termos de escola.
R – É, saí de vários lugares.
P/1 – Mas ainda ao mesmo tempo nunca tinha tido uma experiência...
R – Bilíngue. Mas sempre essas coisas que são diferentes, até hoje é assim pra mim, sabe? Essa marca de você sempre querer, uma curiosidade, desde criança. De ser xereta. Tinha muito essa questão. Porque eu sou mesmo. Até hoje sou muito curiosa, muito que qualquer coisa que eu sei um pouco que apresenta, aquilo me instiga a ir atrás. Acho que dá um gosto diferente na vida. Então, é bem isso. Aí eu ficava olhando, porque eu falei assim: “Jesus amado, como é que pode uma criança de um ano e meio entrar numa escola...”. Eu participava de outras escolas, a gente sabe a dificuldade que é de adaptação. Aquela choradeira, que tinha mil estratégias que a gente tinha que criar, deixa o pai entrar, deixa o pai entrar, polêmicas mil em todos os lugares que eu ia cada um estava buscando um jeito, mas é problemático. Falei assim: “E aqui a criança vem...”. A professora era obrigada a só falar em inglês. Eu falei: “Então aqui, é um horror isso, porque a criança não vai conseguir nem se comunicar. Quer dizer, uma pessoa estranha”. Eu falava pra Guida, né? Mas estava com aquela curiosidade de saber. E aí foi muito surpreendente porque não tinha nada disso, era igual. Eu fui descobrir, eu ficava lá xeretando, olhando, olhando. Eu fiquei seis meses... Até eu falei pra Guida: “Olha, não me cobra nada antes de seis meses. Eu vou ficar mais quieta, não vou participar muito nem vou falar nada, porque eu quero entender aqui”. Eu fiquei seis meses assim: fazia reunião com os professores, estava direto lá assistindo aula, vendo isso, vendo aquilo. Exatamente como se fosse fazer um diagnóstico de ver aonde que eu podia entrar. Como a dúvida dela um pouco era se ela continuava ou se ela fechava, então era sério uma decisão. Então, durante seis meses foi assim. Eu ficava muito olhando. Eu fui descobrindo isso, que era... A criança não tem a mínima idéia que é outra língua. Para elas, sabe, está na escola, estão começando a falar, aquilo como tudo é diferente numa escola: o grupo, os brinquedos, a língua também, era junto. Até uns três anos elas não tinham muita noção de que eram duas línguas. Para elas, inclusive, ficava assim, era um vocabulário a mais. Então, falar cavalo e horse, para elas era a mesma coisa, eram sinônimos. Achei muito interessante isso, sabe? E assim foi indo. Eu fui contratada não para trabalhar na Educação Infantil nem com a parte de Inglês. A Guida ainda assumia mais isso, era só na parte de Português. Porque até hoje lá é assim: a Educação Infantil é mais Inglês, que é o... A criança vem então para adquirir isso também. Depois de pesquisas que a gente foi vendo quando eu estava lá, a gente aprofundou isso, de que ainda o cérebro mais plástico da criança, até a parte auditiva, de pronúncia, tudo ainda é como se não existisse nada que obstrua. Então, entra com muita facilidade. Como ela vive no Brasil, que ela, fora, ouve a maior parte do tempo Português, então se você cria esse espaço de quatro horas, mas em inglês, é o que facilita. Depois quando ela vai começando com cinco anos aí começa a entrar o Português. E depois, na alfabetização inverte, porque a criança é alfabetizada em Português, na língua materna. Também a gente tem explicações, ou tomou essa decisão por uma série de estudos.
P/2 – Ela não é alfabetizada em inglês?
R – Não. É, alfabetiza praticamente sozinho. Então assim, primeiro em português, agora eu acho que é com seis anos, parece. E aí inverte, aí a manhã inteira é português e fica um pouco mais a tarde em inglês. Agora está quase equivalente, em termos de carga horária, mas ainda o Fundamental ainda é mais o português. Mas aí a criança já adquiriu a fluência, já adquiriu... Então, é só ir aprimorando mais. Então ainda é, eu acho que essa troca, aí eu fui aprendendo. E eu era para ficar só com a parte do Português mesmo. Como era uma...
P/2 – Do Fundamental?
R – Do Fundamental. Mas também para mim era extrema, eu fiquei muito curiosa. E foi bom porque eu percebi que lá existiam duas escolas, uma em Inglês outra em Português. A equipe era diferente. O valor das professoras eram diferentes. Porque as meninas que naquela época falavam inglês a maioria delas não tinha formação de professor. Então, eram meninas de classe alta que tinham morado fora, e aí vem e vai dar aula lá. Então, a parte didática era pobre, sabe? E elas ganhavam inclusive mais do que as professoras de Português. Então, lá estava um caos em termos de equipe, essa... E a Guida um pouco perdida. Porque tinha um: “A outra pessoa que fala duas línguas tem que ser valorizada”. Mas aí também eu como educadora, aí também a gente, e sempre foi um papo muito franco. Eu não concordava com isso de jeito nenhum.
P/2 – A equipe devia ficar cindida de certa forma.
R – É, por isso que era um dos fatores que ajudava a estar morrendo, sabe? O Fundamental estava mesmo. Porque a Guida me falou assim: “É como se tivesse com um câncer, não vai pra frente o negócio”. Eu lembro que ela falou que eu até achei uma imagem forte. E chegou um momento que eu achei que ela não deveria continuar com o... Porque era tão boa a pré–escola. E então... Mas ela... Não adiantou, era bem claro para ela que ela queria continuar. E aí a gente foi ajeitando. Praticamente eu troquei a equipe toda. Alguns... Acho que uns dois só que eu tive que mandar mesmo embora, que é sempre muito desagradável. Mas os outros também foram vendo que daquela forma não era muito o que eles queriam. Porque também estava um pouco, eles sem energia, eu acho, por conta de toda essa história. E foi muito rico, porque pra você começar a selecionar, contratar. Então, já
dentro de uma outra perspectiva. Ficou só uma professora que era da outra...
P/2 – Isso você fez no segundo ano lá, no começo do segundo ano?
R – É, então já foi para o outro ano para começar foi já
essa equipe nova. Foi uma seleção assim bem cuidadosa. Aí também com a experiência já que eu tinha de prefeitura, e blá–blá–blá, tudo isso vai aproveitando. E o meu foco sempre foi de integrar as duas equipes. Então, também o salário era igual. Teve aí que lidar também com as outras, tudo, mas por fim deu... Foi muito bom. E eu trabalhei... O tempo que eu trabalhei lá foi acho que um dos desafios mais difíceis foi integrar a equipe Português/Inglês e fazer uma única escola. Porque era bem separado.
P/2 – O que é que você fez? Que tipo de iniciativa que você...
R – Eu acho que teve o meu próprio jeito de querer saber sobre o bilingüismo, e aí descobrir coisas, e aí eu começava a levantar isso para as de Português: “Vocês sabiam que isso é assim? Vamos lá observar?”. Como era uma equipe nova, não estava com vício nenhum, também elas foram entrando com isso de querer saber como é que funcionava. E aí com isso, a professora de Inglês vendo que os outros estavam interessados, também foi abrindo espaço. Porque aí começa a perguntar, você faz algumas reuniões juntas, começa a ver como é que... Então, aí começou a esse, vamos dizer, esse diálogo.de um querer um pouco saber do outro quando uma coisa: “Não, você faz o seu, eu faço o meu.” e aí também tinham passado por uma experiência que não tinha sido positiva, porque a escola estava se prejudicando. Então, acho que houve uma série... Então, você aproveitar essa pequena consciência e aí trabalhar em cima, que foi o que eu fiz nesses anos todos que eu fiquei lá. E foi rico nesse sentido, porque eu acho que o trabalho teve uma mudança na metodologia também no Fundamental. A gente trabalhava (hoje não é mais, a Célia não quis muito continuar) por projetos. Eu fui com algumas professoras para Barcelona, ficamos lá, fizemos estudos. É assim: você tem o currículo esse que a gente fala básico, a gente chamava de, como é que era? Agora não vou me lembrar os termos. Mas a dinâmica mesmo do currículo era por projetos. Então, você tinha temas, questões que a gente acabava levantando com as crianças e, sempre assim, questões da vida, sempre como perguntas que não têm respostas – você não vai ver num livro. E a gente tinha todo um trabalho com professores de ver todas as ligações de conteúdos que você teria que ir buscar, ou que você poderia acessar, como se fossem os links todos, para poder ir, ver que correspondência tinham aos conteúdos daquela série. A gente fazia uma rede, um mapa de rede. E aí trabalhava com as crianças em cima essencialmente de pesquisa. Então, por exemplo, eu lembro que um dos projetos, que depois um aluno já estava o que, na sexta série? E quando eu voltei pra lá, eu já tinha saído, já tinha me aposentado. Aí eu fui substituir a coordenadora que a Guida me pediu: “Ah, porque ela vai ficar só quatro meses, você não pode vir?”. Eu fui. E encontrei esse aluno e perguntei: “O que mais pra você foi significativo?” e ele me falou desse projeto que ele tinha feito quando ele tinha seis anos. Ele sabia o nome do projeto, todas as coisas que eles descobriram. E era assim a pergunta: “Carro: sonho ou pesadelo?”. Então, eram esses tipos de coisa assim. Tinha um outro que era o corpo humano, a pergunta era se o corpo humano é uma máquina. E a gente envolvia os pais, tinha as respostas dos pais. Uns achavam que sim, outros achavam que não, qual a diferença. Desse do carro é porque surgiu de alguma coisa das crianças de atravessar, de ser perigoso, de atropelar, ou de um acidente que alguém tivesse tido. E, ao mesmo tempo, a gente vê que todo, principalmente, menino sonha em ter um carro. E, olha, foi pesquisa, pesquisa. Até eu lembro que eles entrevistaram uma professora. Esse menino lembrou disso, que ela tinha sofrido um acidente de carro e ficou cega de um olho. Eles quiseram entrevistar–la quando souberam e tudo. E quiseram ver, ela levou a radiografia. Aí a gente entrava nas Ciências para poder entender aquilo. Então, era super interessante. (riso) A gente também aprendia coisas. As professoras gostavam muito. E, paralelamente, a gente tinha que dividir um pouco o currículo para também estar trabalhando esses conteúdos que não eram contemplados nos projetos, mas que eram daquela série. Então, era um trabalho difícil, desafiante, mas aconteceu. Eu acho que as crianças depois tinham algumas que saíam, entravam em escolas. Não teve assim da gente falar: “Aí, ficaram em defasagem.” aquelas que tinham dificuldade lá também continuariam tendo em outras escolas. E também aí o pessoal de Inglês foi entrando para querer aprender como que trabalha com projetos, então isso também foi um outro link para a gente poder... Então, às vezes trabalhavam juntas o mesmo projeto numa perspectiva... A professora em Inglês pegava algumas temáticas daquele projeto para estar estudando e a de Português outra. Depois sempre tinha a socialização, quando você fecha aí tem uma apresentação pública de todos os saberes que eles conquistaram. Esse também, eu acho que trabalhar com projeto, depois veio uma professora americana trabalhar, que também foi fantástica, com informática. Era um outro projeto que também foi muito rico, muito inovador. Mas também não continuou.
P/2 – Quando você entrou você ficou um ano mais diagnosticando aí pegou...
R – Não, um ano não. Eu fiquei seis meses, quatro meses com as férias.
P/2 – Aí vocês decidiram manter para o ano seguinte a terceira e quarta séries?
R – Manter, é. Depois de um ano dobrou o número de alunos. Foi muito legal isso.
P/2 – Isso era 97?
R – Então, como eu não sei bem se foi em 94, 95, mas eu lembro assim que quando eu entrei no Fundamental tinham 49, 48 alunos porque estavam saindo muitos, aí a gente passou para cento e poucos no outro, de procura, sabe? Foi muito rico isso. Aí dá aquela fortalecida para os professores também. Então... E a gente criou muita coisa lá, que foi interessante quando foi o workshop que teve. Eu fiquei feliz de ver na linha do tempo tudo que acontecia de importante (riso) foi no período que eu fiquei. Eu tive o privilégio de viver aquele momento da escola. Não vou dizer que fui eu. Eu e toda a equipe. Mas enfim aquilo foi marcante, tudo para, naquela ficou aquele meiozinho ali daquela década cheia de acontecimentos. Então, foi a parte de tecnologia. Tinha um aluno que falou desse projeto da Quinta Dimensão, que era também completamente diferente, porque também era aquela de ter o computador. Aula de computador também era uma coisa que a gente estava vendo que não estava dando certo. E fechamos tudo. Eu falei: “Não, enquanto a gente não souber um jeito direito de fazer isso não dá”. Aí veio essa americana. Uma proposta de uma universidade, Berkeley, super fantástica. Tanto que depois foi de um tal jeito que o pessoal da Unicamp soube desse projeto e pediu para acompanhar. Fazer, escrever uma matéria, depois uma aluna fez esse trabalho. Não vou falar para vocês agora, mas é uma coisa também maravilhosa que teve lá, de socialização, de troca. Era muito essa visão muito mais democrática, muito mais de inclusão. Nesse dia também teve uma mãe que ela falou que o mais marcante, porque também foi na minha época, que se abriu essa perspectiva da escola trabalhar com inclusão. E foi a filha dela, que também pra mim foi uma lição maravilhosa. Porque eu que recebi essa mãe. É uma menina que tem uma doença... Saber a história dela é demais. Ela começou, ela queria ir para a escola mas, ela não tinha condições porque ela... É uma atrofia muscular e até com dificuldade. Porque também os músculos do pulmão, tudo. Então, ela ia cada vez... Tanto que os médicos falaram que ela não passava de uns oito anos. Ela tem acho que 16 já. E aí ela foi na cadeira de rodas, com a enfermeira, com aparelho para respirar. Mas aí começou a ficar doente, porque no convívio com tantas crianças: resfriado, que a gente acompanhou. Eu achei que ela ia morrer no Einstein, ela ficou internada umas duas vezes. O médico então, proibiu dela continuar na escola. Um tempo a professora ficou com o computador. Depois de um tempo ela se fortaleceu, voltou. Só que dentro da doença dela piorada, deitada, já nem sentada quase ela ficava, a Ana. Mas essa menina fez tudo, hoje não está na faculdade? Até festa de 15 anos essa menina fez nessa cama e dançou na cadeira de rodas com o pai! Gente, sabe, e essa mãe estava lá, porque foi marcante. Mas ela foi também uma mãe muito... Então, ela falou que isso também, nessa ocasião também que aconteceu. E aí depois foi síndrome de down, pá–rá–rá. Mas a gente aprendeu. Eu lembro bem que eu falei: “Olha, nós não sabemos, nunca fizemos, mas eu acho que eu gostaria muito. Vou conversar com professora que vai recebê–la.porque não sou eu que vou ficar diariamente com ela”. Eu fiz uma porção de perguntas: “E vamos tentar juntas. Você vai nos dizer muitas das coisas. Vamos precisar do médico dela. Quer dizer, vamos juntos, se você topar isso. Porque ninguém sabe”. E a partir disso, e aí foi. Acho que foi o que deu certo. Então, teve isso também. Que foi lá, que eu estou falando isso da inclusão, da Quinta Dimensão. A gente fez as bienais de arte, que também começou na escola, porque também não tinha essa visão assim. Então, a primeira foi com a Tomie Ohtake. Sempre tinha um artista que a gente selecionava. Era um projeto que chamava A Arte e a Criança. A Criança e a arte, então tinham algumas obras... Escolhia um artista vivo para a criança poder ter essa relação. Então, foi muito legal todo o trabalho que a gente fez com a Tomie. Ela foi lá na escola, que aí termina com uma exposição, inclusive com quadros dela. E eu achei muito interessante naquela ocasião porque os meninos foram ficando muito envolvidos, as crianças todas.
P/2 – Como que era o trabalho? Como foi essa idéia?
R – Então, tem essa coleção que chama Arte e Criança. E esse livro com que a gente se deparou, era a história da gota d'água. E era escrito em português e em inglês. E o processo do livro era assim: primeiro ela tinha, selecionou imagens que eram da Tomie Ohtake. E aí contatou, agora eu não vou lembrar o nome, mas é um escritor também conhecido, para em cima da imagem ele criar uma história. É o inverso do que acontece. E ela tinha todo um preparo. Porque como queria divulgar nas escolas, ela tinha tudo: até filme de quando a Tomie Ohtake veio de navio do Japão, contatos que a gente fazia, as obras dela, uma série de recursos que facilitavam muito. Ela dava um apoio muito grande. Então, a gente resolveu com ela fazer esse trabalho. E permeia todos os conteúdos também. Não era aquela coisa só separada. Depois no final a Tomie foi. Eu lembro que as crianças, elas foram se apaixonando à medida que vai envolvendo. Eu lembro que para um menininho pequeno ela virou uma heroína. E, naquele tempo, era tudo Power Rangers, só isso, fortes, bonitos, super–mulher. E eu lembro que ele chegou perto dela, velhinha, agora ela já está com 85 anos (ela tinha uns 80 já) beliscou assim, e falou: “Ela existe de verdade”. (risos) Que até foi a gente conversou muito sobre isso, como essa questão de heróis é muito o adulto que apresenta para a criança, entendeu? Porque ela ficou sendo uma heroína para esses meninos. E eles falavam de arte. Arte abstrata, figurativa, os pequenininhos. Tinham definição do que é arte. Quando eles diziam que a arte abstrata é quando o pincel dança no papel, sem formas. Depois o segundo, porque era de dois em dois anos junto com a Bienal de Artes que a gente tinha. Então, ficava um clima interessante também. O segundo também foi maravilhoso, foi quando a PlayPen fez 15 anos. Faz exatamente 15. Foi com o Ianelli, não sei se vocês conhecem. Também foi fantástico, porque aí ele nos recebeu no ateliê dele, na casa dele, as crianças foram conhecer todo aquele espaço artístico. Ele estava inaugurando uma escultura no Jardim da Aclimação, e no dia da inauguração foram os pais, foram as crianças. Então, essa relação com arte foi se transformando. Até esse ano era para ter, mas é o primeiro ano que não vai ter. Também não sei por que, o que é que aconteceu que...
P/2 – 2010?
R – É. Então foram coisas assim novas. Que isso... Aí o que aconteceu na PlayPen? É isso mesmo, que aí vocês já devem estar sabendo do resto. Que como a escola foi crescendo a casa foi ficando pequena, e a gente foi ampliando também para o número de alunos para o Fundamental II. Aí alugou uma casa do lado.
P/2 – Isso foi em que ano, mais ou menos?
R – Se eu saí em 2005? Isso é 2000, 2000 e pouco, no começo. Aí tivemos que... A Guida conseguiu, aí estava uma luta para ela comprar aquele terreno, que a casa era alugada. Para desmanchar e construir uma escola nova. A gente teve que sair, procurar uma outra escola nesse período que ia desmanchar essa. E nessa ocasião a gente já começou a perder muito aluno. Porque já no fim, que não estava cabendo, então os do Ginásio, você não tinha laboratório, não tinha biblioteca, eu fui um pouco contra com a Guida de querer já fazer o Fundamental II. Mas era aquela pressão dos pais.
P/2 – Vocês estavam numa casa, ela comprou a outra para fazer...
R – Do lado. É, para ter espaço para esses alunos para sair da quarta série e continuar. A gente queria também continuar um projeto que fosse inovador. Eu tentei, mas não deu muito certo porque tinha muito pouco aluno. Porque aí não era por matéria, a gente tinha alguns professores que assumiam... Um pouco como no Vera Cruz: quinto e sexto ano um professor só, os outros vêem como apoio, para ainda fazer essa passagem e não ficar fragmentando o conhecimento de uma forma ainda mais cuidadosa. A gente teve no Vera, a gente foi fazendo pesquisa, não era só da cabeça. E estava... Mas é difícil porque você não tem professor preparado, porque no Vera eles preparam, entende? Então, demoraria, e com todo esse drama estava complicado. Aí fez isso, aí a casa também começou a ficar um pouco abandonada porque ia sair de lá, então as coisas que tinham que fazer de reforma foi deixando.
P/1 – Vocês foram para outro lugar?
R
– Outro lugar.
P/2 – E nesse outro lugar implementaram o Fundamental II ou ia ser quando voltasse?
R – Não, já estava nessa. Por isso que teve que ir. Nessa primeira casa, porque teve assim: teve uma... Era um terreno que tinha uma casa quando começou Educação Infantil. Quando ela fez o de primeira a quarta série, comprou a casa do lado. Aí quando fez de... Abriu de quinta até a oitava comprou uma outra, que era pegada, que era uma escola de balé. As pessoas saíram e ela comprou. Quer dizer, que o Fundamental II começou ainda aí. Mas assim, tinha quatro alunos na quinta série, entendeu? Isso também não era legal. Então, já começou a dar uma... E aí a gente teve que mudar. Porque ela também achava: “Acho que os alunos não ficam porque o espaço é muito pequeno, você não tem condições”. A escola não é barata, é uma escola cara por ser bilíngüe. Aí era óbvio que os pais viam que não atendia todas... Não correspondia, o que eles tinham que pagar com as condições do prédio. E os alunos também, nessa idade, queriam cantina, queriam quadra de futebol. E aí piorou, porque nós fomos para uma casa que era outra casa, que não tinha condições. E as salas eram os quartos, não tinha espaço para ter aula de Educação Física. O professor (até nesse workshop lembraram disso) foi fantástico. Ele tinha que usar toda a criatividade dele para inventar. E os alunos amavam. Aí até a gente dava aula dentro da piscina, uma série de coisas que foi lá... Mas foi problemático, porque nessa ocasião ainda era assim: finais de semana, eu não sei o que é que a Guida combinou, nem me lembro na época, que aí às vezes usavam para fazer festa nessa casa. Bufê que ia lá e tira as coisas, aí alguns pais souberam, olha começou um drama naquela escola, que foi a época das vacas magras, vamos dizer assim. Mil problemas, um desencadeia o outro. Aí começou a construir. O que aconteceu? Embargaram a obra, porque não podia... Começaram os vizinhos a brigar porque não podia, porque ia ser grande, porque não sei que lá. Olha, mas tanta... Foi uma luta aquilo. Aí que os alunos foram embora, ficaram muito poucos mesmo dos pais com a esperança. Mas a maioria achou muito arriscado, porque até o advogado falava que não sabia quando ia poder resolver isso. E no fim a gente viveu todo mundo isso. Professor...
P/2 – Embargaram a obra no meio do ano letivo?
R – É. A que estava fazendo, não a que nós estávamos, mas estava um espaço horrível. E estava todo mundo esperando poder ir para lá. Aí fecha, põem aquelas coisas, papel, aqueles dramas todos. Nossa, que horror que foi aquela época. E aí foi um trabalho... Também lembraram muito, acho que foi a coisa que mais disseram como marcante na PlayPen, professores, pais que estavam no workshop, que foi essa ocasião que embargaram a obra e os professores todos, eles... Isso que eu falei como era uma equipe mesmo, que a gente via com tantos de inglês com português, eles se juntaram e precisava colher assinatura. Se tivesse naquela região um número x de assinaturas de pessoas que concordavam que a escola ficasse lá, era um dos fatores primordiais para a gente conseguir que desembargasse. Foi esse trabalho. Eles saíam de manhã, trocavam quem estava na aula, finais de semana. E foi muito interessante, porque tinha um outro abaixo–assinado pedindo para fechar. Por isso que tinha que fazer isso, porque mesmo alguns professores até no workshop falaram, que eles chegavam para falar com as pessoas as pessoas nem lembravam, nem sabiam o que é que elas tinham assinado naquele abaixo–assinado. E a maioria foi a favor. E eu acho que isso e a própria proposta que a gente desenvolveu muito tempo é que garantiu de ficar algum número de quem realmente não ficou com medo. Depois foi a maior, foi muito difícil, esse período foi muito difícil.
P/1 – Vocês voltaram para essa casa?
R – Desembargou, fez a construção toda. E eu acho, quando que a gente foi? A Guida vai saber, eu acho que a Célia também sabe. Porque se eu saí, acho que foi em 2000, 2001. Não, em 2000 não, porque em 2000 a gente ainda estava na primeira casa, acho que foi 2002. Foi em 2002. E também foi muito difícil, porque você voltar para aquele prédio muito bonito, enorme, com aquele pingo de alunos. Também começou um desgaste grande daquela insegurança, daquele medo. E não era nem dos pais, era dos próprios professores. De você se ver com aquele desafio: “Agora nós vamos ter que encher essa escola”. Então, aí também foi um período que deu muitas... Eu senti assim, que era como cada um esperando do outro alguma coisa que você não sabia bem o que é que era. A Guida também, os de Inglês, os de Português, sabe? Começou ficar meio assim um pouco perdido. Eu também, diante dessa situação de muito grande, aí começa um monte de professores, eu estava achando muito difícil poder fazer o trabalho que eu... E eu também tinha ficado muito, muito, muito cansada. Porque como era, a Guida é a única dona então eu estava muito junto com ela. Então eu vivi tudo isso como se fosse a minha escola mesmo. Eu fiquei muito cansada, muito. Sabe quando você fala assim, sem energia? Eu já não estava, eu falei assim eu achei que, tinha saído já a minha aposentadoria em 2003. Eu fiquei mais dois anos e eu falei assim: “Não, agora chega de escola.” foi nesse período que eu falei: “Não, agora, sabe...”. Eu falei para ela: “Agora você precisa de uma pessoa muito executiva, que vá passando para lidar com essa situação. Não dá para ficar muito em cima tanto de metodologia, de equipe.” não tinha condições. E eu falei: “E é isso que eu consigo fazer bem. Acho que esse período vai ter...”. E eu fui atrás de pessoas. Eu que fui atrás da Célia para falar para ela. Eu falei: “Olha, a Célia tem esse perfil, porque ela nem é pedagoga. A Célia é historiadora. Trabalhou muito sempre em direção. Então, ela é muito assim, despachada, decidida, vai acontecendo e vai fazendo. Não tem muito isso de vamos sentar, decidir junto”. E era o que a escola precisava, e eu acho que foi muito bom. Porque foi chegando, foi chegando, foi chegando e hoje está outra vez na maioria das salas não tem vaga mais.
P/1 – Precisava de alguém com um olhar mais gestão, é isso que você fala, da gestão?
R – Eu falo de executar mesmo, entendeu? Não tão educativo, reflexivo, que é mais onde eu quero de novo. Para decidir alguma coisa sempre fazia em conjunto com a equipe para garantir. Então, demora mais. Com alunos também, trabalho com projetos demora mais. E eu vi que não tinha essa coisa de demorar, não. Não podia estar consultando muito as pessoas, tinha que ir fazendo e depois resgatar. Que eu acho que agora que vai, que está no momento de poder resgatar isso, que a equipe não está tão unida de novo porque cresceu muito. E eu tenho impressão, pelo que eu vi da Guida que agora está se pensando até pela Gabriela, que é a coordenadora que trabalhou comigo, que era minha assistente, de estar resgatando esses aspectos. Agora eu acho que já está no estágio que antes não ia adiantar. Não ia adiantar você querer ir por esse caminho sem ter aluno. A escola não ia se sustentar. Então, eu acho que um pouco essa história que foi.
P/1 – E agora depois que você contou um pouquinho da sua trajetória para a gente, se você pudesse dizer qual foi o seu maior desafio que você enfrentou na escola.
R – Na PlayPen?
P/1 – É, na PlayPen.
R – Olha, eu acho que o primeiro grande desafio foi logo quando eu cheguei, que eu fiz o diagnostico, eu posso dizer de estar concordando com a Guida, que a escola estava doente, entre aspas, com esse risco de morrer. Então, esse foi um grande desafio que eu mesma, no primeiro momento, achei que era melhor, que não tinha cura o Fundamental. Então, antes que contamine os pequenos é melhor fechar. Mas a garra dela, o desejo, ou os pais, eu acho que isso superou. Então, esse foi um grande desafio. Eu acho que foi o primeiro e, realmente, de multiplicar a escola, de dar outra cara para aquela escola. O bilingüismo super se estabilizou. Esses congressos internacionais que tem agora, eu e a Guida que começamos. A gente chamava Centro de Estudos das Escolas Bilíngües. A gente fez alguns com escolas do Brasil todo, não era internacional ainda. Exatamente mesmo sem eu estar no bilingüismo, mas essa questão do bilingüismo ficou não como duas escolas, entendeu? Os professores de Português também eram professores bilíngües. Mudou muito essa perspectiva. Depois veio o Lyle, não sei se vocês conhecem, mas vão conhecer, que é o diretor da parte do Inglês, também trouxe uma experiência interessante do Canadá. Então, aí foi só fortalecendo essas coisas. Mas eu acho que o primeiro foi esse, e que foi bem sucedido. O segundo foi esse da escola, que eu diria assim, não poderia dizer que foi um desafio, que a gente conseguiu atravessá–lo, mas eu não digo que eu superei. Porque ainda quando eu saí de lá já
tinham alguns alunos voltado, mas não estava ainda aquilo que a gente queria.
P/1 – Na verdade, pelo que você está contando, acho que teve dois momentos assim de, não sei se crise, mas quando você estava entrando tinha o risco de fechar o Fundamental.
R – Isso, e isso também, exatamente.
P/1 – E quando você estava saindo foi a crise da mudança da casa que também deu uma reviravolta e depois começou a se encontrar.
R – Também com o mesmo perigo, que eu acho que de uma escola é isso, né? Como é que ela aqui em São Paulo com tantas que têm, aquelas que permanecem, quais são os motivos, todas as implicações que a gente tinha que estar sempre atento. E aquelas que acabam. Então, acho que foram dois grandes momentos. E os pedagógicos, que eram desafios todos foram muito positivos. Muito, eu vejo que ficaram marcas em mim, nas pessoas, nos funcionários, que também eram todos envolvidos, os pais também. Então foi um, eu vejo as professoras que não estão lá mais, que eu tenho contato. Elas levaram isso também para outros espaços. Então, essa parte de formação de professor, de ser um profissional, de trabalhar essa competência, essa visão, eu acho que esses professores têm marca. E elas, às vezes a Guida mesmo, a Gabriela, falam que percebem na equipe aqueles que têm aquele brilho no olho. Isso para mim foi desde a... Porque estão entendendo e estão fazendo acontecer. Não estão seguindo o manual que tem que seguir dos livros didáticos. Tem algo mais, você percebe.
P/2 – E você acha que isso tem a ver com o fato da escola ser bilíngüe. Você que deu tanta, você fez tanta alfabetização na sua vida?
R – Não, eu acho que não, eu acho que o bilinguismo... Eu vejo assim que é uma coisa hoje muito boa para a criança ter essa conquista. Eu estou com as minhas duas netas lá, né? Eu falo assim: “Ai, que delícia”. Outro dia, eu falando para essa que tem 10 anos, ela entrou esse ano. Então ela ainda... Mas eu já
fiquei boba de ver como ela já
está boa no inglês, sabe?(riso) Ela estava no carro comigo ouvindo música e falando, traduzindo algumas coisas, ela não está nem há um ano. E não sabia inglês. Eu falo: “Que bom, pelo menos você, pelo menos vou ter uma neta que desde pequenininha já vai”. Porque eu não consegui, né? Quando eu estava na PlayPen eu travei. O pouco de inglês que eu sabia travou. Porque eu não conseguia admitir, lá naquele espaço que eu via os pirralhinhos tudo falando inglês (risos) a diretora não falar direito. Ainda bem que eu não era de inglês! Mas tive aulas, voltei tudo, mas é aquela assim: eu entendia, eu conseguia ir até em congresso e ouvir, mas não conseguia abrir a boca. A Guida até hoje não se conforma. E me faz uma falta danada, para as coisas que eu trabalho, faz muita falta. Ainda falei: “Vou ver se o ano que vem eu volto a fazer outra vez Inglês. Quem sabe algo acontece e agora destrava”.
P/1 – Agora para conversar com as netas.
R – É.
P/1 – Tem mais alguma coisa da escolar que você quer perguntar?
P/2 – Ah, eu queria saber um pouco da tua relação com os pais, do perfil dos pais, dos alunos, saber quem são essas pessoas que freqüentavam lá...?
R – É muito, lá mesmo no tempo que eu estava era muito diversificado. Você tem desde gente muito, muito, muito rica, ainda é assim. E tem também os filhos dos professores, ou gente que tem um filho só que faz de tudo na vida para manter um filho numa escola. Porque para pagar, eu não sei nem quanto está a mensalidade, mas sempre foi muito cara. Ainda mais que é período integral. Então, para pagar aquela escola tem que, sabe, ou ter bolsa, que eu sei de muitas pessoas que têm. E então, você tem tudo isso, entendeu? Essa diversidade de, pelo menos quando eu estava lá, que a escola era menor era mais ainda assim.
P/2 – Mais diversa.
R – Porque eu acho que agora com muitos pais deve ter mudado um pouco esse perfil. E eu lembro que uma vez a gente fez uma pesquisa da profissão dos pais. E foi interessante porque a gente viu que a maioria era Médico. E aí a gente foi tentando entender, até foi aprofundando a pesquisa, eles tinham uma relação que eles sentiam na PlayPen, como eles eram dessa área do cuidar da saúde, do bem estar eles sentiam, era isso que eles buscavam na PlayPen. Eles sentiam que lá tinha isso. Então, acho que um falava para o outro, por isso que ficou interessante quando a gente viu de repente. Até eu comentei com a Guida ela falou, é interessante, porque mais no começo da escola, uma vez também elas fizeram isso e a maior parte era Publicitário.
P/2 – Ah, agora?
R – Não, no começo da escola.
P/1 – No começo, depois passou a Médico.
R – Depois passou, nesse período que a gente fez essa pesquisa era um número significativo de Médicos. Então, tinha também isso.
P/1 – Na verdade, o que eu fico pensando vendo sua trajetória, me dá curiosidade de olhar você como educadora, o que é para você ser educadora? Assim, você passou por filhos de carvoeiros e filhos de médicos, ou enfim, gente de classe A e gente de classe, sei lá, E. Porque carvoaria é condição mais sub–humana de trabalho, né? Qual que é teu olhar como educadora diante de crianças tão...
R – Então, eu sinto assim, que eu aprendi a olhar, e criança pra mim não tem essa diferença. É tudo que a gente desejaria que a gente pudesse... Gritante. É lógico que diferença sempre vai ter. Mas quando eu contei para vocês que as minhas crianças bem pobres produziam textos, que até foram premiados, diferente das crianças da escola particular, que você vê que na criança... A possibilidade é imensa. Então, eu gosto muito desse mundo infantil. E eu acho que eles trazem isso pra a gente também. Você conviver com criança, conversar com criança, brincar com criança você resgata em você essa visão de diversidade porque elas também não fazem diferença entre elas. Mesmo as de inclusão, era lindíssimo de ver. Nas mais velhas vai aparecendo mais, mas quanto menor a criança elas têm um outro jeito de estar vendo, não olha isso. Então, acho que eles ensinam coisas pra a gente, apontam, que se você prestar atenção, você se torna uma pessoa melhor quando você convive com criança. Que nem eu falei que eu aprendia com os cachorros? Também eu acho que as crianças são sábias. Se você prestar atenção, e o convívio é...
P/1 – Você lembra de alguma coisa assim marcante nessa questão da criança apontar coisa para você que você fala: “Nossa.”?
R – Por exemplo, mesmo dessa menina, da Ana Clara, eu lembro que teve uma ocasião que até a gente estava assim: “Ai, eu estou achando ela tão isolada, o que será que aconteceu? Os colegas não procuram”. Eu conversei com a professora, tudo, ela falou: “Vamos perguntar para eles como é que é isso, se está acontecendo alguma coisa?” “Vocês têm conversado com a Ana Clara?”. Eles falaram assim: “Claro.” “Mas como que eu não tenho visto?” aí ela falou assim: “Mas a gente fala todo dia pela internet.” porque como ela tinha dificuldade já de falar, e eles também era difícil ouvir, mas eles descobriram uma forma. E você olha, você tem a impressão: “Pronto, está isolado”. Que é um preconceito um pouco que a gente tem. E eles falaram com tanta tranqüilidade isso, sabe? Imagina, descobriram uma outra forma e continua do mesmo jeito. Isso foi uma coisa! Eu lembro quando a gente fez um trabalho também com cegos, que a gente foi no Lara Mara com as crianças também. Foi lindo ver como que eles lidavam com esse contato. Isso com os artistas, dos heróis. A hora que esse menininho falou, que me deu aquele estalo eu falei assim: “Pois não é que a gente também cria determinados tipos de herói?”. Por isso que as crianças gostam brincadeiras. Era uma delícia você ver como eles iam pular corda, amarelinha, tudo aqueles outros que a gente trazia, eles gostam muito disso. E eu acho que no mundo adulto também é, eu vejo isso. Quer dizer, hoje eu me dou ao luxo de separar as coisas que eu quero. Eu falo: “Já vivi tanto agora eu escolho um pouco aonde eu quero, o que é que eu quero continuar fazendo”. E disso de não muita pressão, de espontaneidade, de criatividade, de ter coragem de experimentar coisas sem medo de ser ridícula. Tudo isso eu aprendi com as crianças, tudo. Tem uma carta que eu fiz quando eu me despedi da PlayPen e que eu falo exatamente esses aspectos com cada, desde os funcionários, professores, com a equipe da coordenação, com as crianças menores, com as crianças maiores. Quando teve o Fundamental II eu fiz um trabalho com a turma, assim tudo que eu aprendi com eles. Isso que, até porque quando eu saí, eles fizeram, de surpresa, um scrapbook, que tem todo um pouco a minha história lá. E eu não sabia, também eu trouxe também, porque aí tem tudo lá. Tenho todos esses períodos.
P/1 – E essa carta?
R – É, e aí que eu peguei, ela estava enfiadinha, eu li eu falei assim: “Nossa, e é mesmo, é isso que eu aprendo”. E eu falo um pouco isso. Com as crianças é essa espontaneidade, esse jeito mais livre de não trabalhar ou de não estar sempre atuando na expectativa do outro. Coisas muito boas.
P/2 – Essa carta você trouxe?
R – Ta aí.
P/1 – Falar um pouco de futuro, como é que você vê a PlayPen daqui uns cinco anos?
R – Aí, eu estou torcendo muito para que agora essa nova diretora resgate um pouco esses aspectos, que nem sei... Eu acredito porque eu sempre me dei muito bem com a Guida, que a Guida também é bem isso de inovação. Ela é uma mulher que está sempre com olhar não no comum. E não só para ser diferente, mas algo que faça um pouco mais de sentido. Então, eu acredito que ela possa, que ela deve estar procurando alguém assim que aí volte um pouco a inovar, sabe? Que agora já está bem estruturado, eu acho de estar... Para inovar. Como eu falei para ela: “Agora é ótimo uma pessoa que possa, quando fica um vazio, porque com a Célia saindo aí você tem possibilidades de fazer um diagnóstico, de ver necessidades, onde que está precisando cuidar”. Então, eu estava comentando isso com ela, que seria bom ela, e não só a pessoa, achar que a pessoa vem e faz, mas estar já
envolvendo os professores que estão lá, o que eles têm percebido. Fazer até uma retrospectiva com eles e ir identificando que coisas que eles gostariam que fossem priorizadas, aproveitar. Porque lá, até uma carta que a Guida escreveu com a saída da Célia, que ela tinha comentado comigo que ela estava querendo que ela... Ela percebeu que a escola teve grandes mudanças assim como se fossem cíclicas. Mais ou menos em volta a cada década do Fundamental todo. Então, teve mais ou menos dez anos com a Ana Maria, depois mais ou menos dez anos comigo e mais ou menos, não chega a dez com a Célia. Eu estava conversando com ela, a gente viu em cada uma dessas décadas teve algo que se sobressaiu como necessidade. E que essas pessoas responderam. Porque se não fosse a Ana Maria lá naquele comecinho a ter dado esse primeiro passo não estaria hoje assim. Se não fosse eu naquela ocasião, garantir a equipe para a escola não morrer, sair na rua, que não era nem minha função, também não estaria assim. Se não fosse a Célia fazendo esse movimento enorme de trazer, de dinamizar essa entrada de aluno na escola também não estaria assim. Então, a gente... Fica esse ponto de interrogação, de estar tentando olhar qual é a necessidade agora dessa década que vai entrar. Porque tudo sempre muda. É bem aquilo, a gente nunca, cada pessoa, cada ano, cada perspectiva e tudo que vai mudando, eu acho que a escola tem que estar atenta e fazendo essa leitura de que não... O que paralisa morre mesmo. Então, eu acho que é uma outra, um outro momento da escola com outras necessidades. Eu acho que o que estava precisando, acho, não estou lá é bem de achismo mesmo. Mas conversando com a Guida, é trabalhar um pouco mais a equipe de novo. Porque saiu muita gente, entrou muita gente, então fragmentou isso. Então, para manter uma escola unida...
P/1 – O fato de ser bilíngue já pode ter corroborado com isso, né?
R – É. Então, essa troca de professores não é positiva. Eu tenho a impressão que isso é um dos aspectos que precisaria estar olhando. Até chutando para ver se é mesmo isso, tem saído muito, quanto são as novas, se estão integradas, se não estão.
P/1 – E da educação como é que será que vai estar? É uma perspectiva e tal.
R – Então, eu acho que tudo está ligado com isso. Dependendo de como você tem uma equipe, de como o professor está, a educação acontece. É aquilo que eu te falei: se ele está integrado, há troca entre eles, há um brilho nos olhos do que está fazendo, aí a educação acontece com qualidade. Agora, se quem está dinamizando isso se sente pressionado, sente competindo com o colega, sabe essas coisas assim? Não faz um bom trabalho. Aí é aquilo de fazer de conta aqui, então eu vou fazer porque estão me pedindo, mas não é bem isso que eu quero. Então, se não é bem isso que espaço você tem para poder trocar o que é que você professor acha de educação. Porque para mim era muito claro isso, que professor pra mim, ainda é... Tanto que eu sempre falo se me perguntar: “Como põe?” Você me perguntou. “Professora.” porque pra mim é uma profissão, pra falar uma palavra que talvez fica, mas é nobre, pra mim é. De muita dignidade. É que foi perdendo, mas se você convive com pessoas que assumem esse trabalho de educar na linha de transformar não só de informar, mas que você interfere nisso numa criança eu acho... E cada vez a criança passa mais tempo nesse espaço. Então, eu acho que ele tem que ter muita voz para também poder perceber quem ele é, o que ele pode fazer. Então, eu acho que a metodologia de uma escola depende da equipe fundamentalmente. Porque você tem pessoas brilhantes, eu já vivi isso, mas cada um na sua? Por pouco tempo dura.
P/1 – E agora voltando para as questões mais pessoais, você falou que tem três filhos, netos, tem netos também?
R – Tenho, tenho. Então, eu tenho as duas netas que moram aqui, que são do meu filho. A Aline e a Luana que estão na PlayPen. Uma tem dez e a outra tem sete. E depois eu tenho uma filha. Não, aí eu tenho a do meio, que não se casou, ela está na Irlanda faz dois anos. Ela é Publicitária. E agora está indo para Holanda. Eu estive lá em julho ano passado. Não conhecia também Irlanda, uma experiência muito boa. E tenho a minha filha mais nova que é Nutricionista, que mora em Ribeirão Preto, tem
dois meninos, um de dez e um de quatro. E os meninos, e ela também trabalha na Escola Waldorf, de lá, que eu também adoro. Sempre foi uma referência, um diálogo muito rico na minha atuação com a Filosofia Waldorf, muito. Então, são esses.
P/1 – E quais são suas atividades agora?
R – Então, depois quando eu resolvi que eu ia me aposentar eu tive primeiro uma coisa assim, que eu não queria mais, eu queria alguma coisa que eu queria continuar na relação com as pessoas, mas eu não queria mais falar. (risos) Era uma coisa que era claro para mim, chega. Fui professora 30 e tantos anos falando, falando, falando. Eu resolvi que eu já tinha feito alguma coisa de... Eu falei assim: “Então, eu vou fazer massagens”. (riso) E comecei. Fiz curso, eu tinha ido pra Índia, fiz também com indiano e tal, achava fantástico. Mas aí também eu me dei conta, fiz, a Guida fez. A Guida, a Dani, a Guida falava: “Ai, a massagem dela era ótima”. Massagem comigo, na minha casa. (riso) Mas depois eu vi, claro, que não era isso, que não dava porque para ser não dá para brincar de ser massagista. Porque aí começa a aparecer gente com problema e eu sentia que eu não estava preparada para isso. Aí foi muito claro para mim, que eu trabalhei a vida inteira com a seriedade da formação profissional. Como é que eu ia agora inventar de querer ser uma boa massagista de repente, entendeu? Eu falei: “Não”. Agora eu faço massagem assim de hobby, quando alguém pede. E eu vi que o meu espaço mesmo é na Educação. E eu já freqüentava também o Instituto de Filosofia, Centro de Estudos Filosóficos, não sei se vocês conhecem a Palas Athena? Então, e eu fui, eu já
freqüentava, sempre freqüentei lá fazendo vários tipos de curso.
P/2 – Na Vila Mariana?
R – Não, é ali na Leôncio de Carvalho, pertinho da minha casa.
P/1 – É no Paraíso.
R – E agora eu sou da equipe de professores lá.
P/1 – Minha mãe é uma aluna assídua da Palas Athena.
R – Quem é sua mãe?
P/1 – Ela chama Marina. Ela vai nos cursos de formação, parte da Filosofia Chinesa.
R – É capaz de eu conhecê–la.
P/2 – Você dá aula de quê?
R – Eu dou aula de Cultura de Paz e dou aula de Atenção e Práticas Meditativas.
P/1 – Acho que ela fez esse curso.
R – Ela deve ter feito, se ela é assídua ela fez. Por isso que eu estou falando, deixa eu tentar ver quem que é a Marina.
P/1 – Depois lá fora a gente conversa. (risos)
R – E eu adoro lá o que eu faço. Também faço trabalhos sociais, eu dei um curso na prefeitura de Práticas Meditativas, lá em São Miguel Paulista. Um pessoal da prefeitura que eles têm um projeto interessante de Medicina Integrativa. Os médicos mesmo dão Lian Gong, ou Ioga. Fiz também Ioga, curso de Ioga, também dou aula de Ioga. Também não profissionalmente. Dei já para a Terceira Idade no Hospital das Clínicas. Mas eu me descobri que quando eu estou em qualquer sala de aula, não interessa muito o conteúdo. (risos) Muito bom, muito bom. Foi bom até, acho que eu fiquei uns dois anos descansando de dar aula, e aí quando eu voltei...
P/2 – Sem falar.
R – Sem falar, sabe? Então, agora eu estou em paz. Às vezes eu preciso tomar cuidado porque eu vou mexendo em tanto, agora eu estou com um projeto também, Vivenciando. Hoje, até esteve lá em casa que é uma, de uma mulher também incrível. Ela é russa, mas ela mora na Suíça. Ela vem duas vezes por ano e trabalha muito a arte na vida, a vida na arte, empreender com arte. E aí ela faz na minha casa algumas oficinas, alguns encontros. E também tem sido uma experiência muito boa. E agora ela também vai dar, a próxima vez quando ela vier, ela já
manteve contato com a Paula. Aí você vai vendo assim como as coisas vão. Tem outro grupo também que eu participo, que a gente até brinca que era a minha terapeuta, uma junguiana, a Araceli. Porque eu fui fazer terapia quando eu resolvi me aposentar. Eu queria muito claro saber o que é que eu ia fazer. Esse conceito de aposentadoria também é tão triste. E eu fiquei um ano e meio com ela revendo. Então, foi muito bem pensado o que é que eu... E depois eu lembro que ainda antes de decidir foi quando eu fui pra Índia. Fiquei um ano na Índia, um mês na Índia. Eu voltei muito através desta, foi outro momento daquela clareza. Foi quando eu saí de Uberaba para vir para São Paulo, e foi quando a decisão era aposentar. E então aí terminando, porque eu tinha tomado essa decisão, tinha um livro que eu tinha lido que chama “As Deusas”. É de uma junguiana que trabalha a mitologia, “As Deusas e a Mulher Madura” que ela foi fazer depois que ela passou da menopausa e ela quis revisitar aquela jornada dela. Eu falei para ela: “Você não está...”
P/2 – Ela escreveu um livro sobre a Era também, não é ela?
R – Não sei se é. Sei que ela escreveu há 10 anos, 12 anos atrás era “As Deusas e a Mulher” que ela pega todas aquelas deusas: Era, porque são mais não as romanas, são as gregas todas, e trabalha o que a gente tem hoje, os arquétipos em nós mulheres hoje. Você identifica qual é a sua característica mais... E depois de 10 anos ela quis rever pra ver se tinham deusas velhas, como ela chama, anciãs. E ela teve que ir ver outras, de outras tradições, porque as gregas são todas, a maioria são muito jovens. Eu achei muito interessante. Eu falei: “Você não queria ler, a gente forma um grupo com mulheres de mais de 50 anos, esse é o critério, não pode entrar. E a gente lê junto”. Então, já tem três anos esse grupo. De 15 em 15 dias. Primeiro era esse livro, terminou esse livro a gente passou para “As Mil e Uma Noites”. E ela como junguiana, ela vai ajudando. Então, é um grupo também fantástico. Essas coisas que vão acontecendo, sabe que eu falo, que eu me sinto muito feliz assim de escolher esses espaços, até os conteúdos. Eu gosto de dar aula, mas não é qualquer conteúdo. Então, de poder estar lá e ver o que faz sentido. É isso que eu estou fazendo atualmente.
P/1 – Tem alguma coisa que você gostaria de falar que a gente não perguntou, ou que você quer deixar registrado?
R – (risos) Não, falei já bastante. Se eu pensar mais um pouquinho sempre tem, porque afinal eu estou com 62 quase 63 anos. Eu fico vendo é muita coisa já vivida. Volta e meia eu tenho que fazer por trabalhos, autobiografia, então tem um monte. Eu também fiz um trabalho na PUC já depois de aposentada com o grupo de Espiritualidade, Envelhecimento e Memória. Até eu já tinha lido a Bosi, todas esses, tem material assim interessante. E nesse curso, que eram oficinas de memória que a gente chamava, para trabalhar com idosos. Aí também escreve a autobiografia. Quando tem nessa na linha Waldorf que a gente faz o autobiográfico, não sei se você já ouviu falar também? É muito rico, fiz duas vezes. São setênios que eles chamam. Então, primeiro você faz toda a sua história, desenha toda, então eu vejo quanto, cada vez eu descubro uma coisa que eu não tinha lembrado, que eu não tinha me dado conta que hoje ainda aparece. Então, tem muita coisa mesmo.
P/1 – Que é que você achou da PlayPen fazer esse projeto de contar os 30 anos?
R – Aí, eu fiquei tão feliz, eu achei maravilhoso. Eu adorei o workshop da Marcia. Foi tão bonito, muito gostoso. Receber aquelas pessoas, a dinâmica, mesmo que foi pouco tempo. Você vê que é com, isso que eu falo, que é com competência. Porque tem muita coisa que é feito meia boca, como a gente diz. Então, eu achei muito legal todo esse cuidado, todas as coisas que são levantadas, como é que... Eu
achei bárbaro. Achei muito bom, idéia fantástica!
P/1 – E o que é que você achou de ter participado dessa entrevista?
R – Ah, dá para perceber, porque eu falar dessas coisas todas que para mim foram, é a minha vida! Foi dando sentido, acho que foi fazendo esse desenho da minha vida. Eu vejo até que ponto eu fui, até que ponto veio de lá. Então, e não foram coisas que foram paralelas. Eu acho que...
P/2 – Como assim?
R – Você tem uma vida e trabalha numa outra coisa que não tem muito sentido, entendeu? Desde o momento que eu entrei na área, eu até diria, na área de Recursos Humanos ainda foi um pouco separado. Mas no momento em que eu entrei na Educação as coisas se juntaram todas. Porque eu acho que aí tem muito a ver, talvez, a gente como mulher, como mãe. Então, faz parte da sua vida isso, esse educar. Educar–se, educar, educar adulto. Então, eu acho que, tanto assim que tantos os meus filhos sempre participaram muito, eles sabem de todos os momentos, participaram em várias atividades, e era uma coisa natural. Como eu vejo que hoje eles também solicitam para as coisas deles que eu possa estar junto, acompanhando. Porque esse sentido do seu trabalho ser você também, fazer parte da sua identidade, não como você é aquilo, aquela posição. Não, é uma coisa mais interna eu acho, quando faz sentido de alguma coisa que... Valores que você acredita e que você encontra um espaço. Então, tanto faz, são tão fortes, que tanto acontece no se trabalho como acontece na sua casa. Eu achei interessante que meus filhos sempre diziam que nenhum deles queria ser professor, porque achavam muito difícil, ganha pouco e trabalha muito. Mas no fim os três foram por alguns momentos. Falei: “Ah, tá vendo?” Mas também não acreditaram não. Foram mas acabaram desistindo.
P/1 – Ah, Márcia, então em nome do Museu e da Escola PlayPen a gente agradece a sua participação aqui na entrevista.
R – Eu agradeço a paciência também de vocês, a generosidade de estar ouvindo. Eu imagino quantas histórias vocês devem ouvir, não é? Todos aqui. (risos)
P/2 – Foi muito boa, muito obrigada.
[Fim da Entrevista]Recolher