P/1 – Senhora Nalva, primeiramente muito obrigado por participar do nosso projeto, a gente queria começar perguntando o seu nome, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Lindinalva F. Vaz, nasci em Pedra, Pernambuco.
P/1 – E a data de nascimento?
R – Data do nascimento: 26 de junho de 1968.
P/1 – E o nome dos seus pais?
R – José Vaz de Noronha e da minha mãe Maria Felismina de Almeida.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Tenho.
P/1 – Quantos irmãos?
R – Eu tenho 13.
P/1 – Você é qual? Você está entre as filhas mais velhas ou mais novas?
R – Mais nova.
P/1 – Qual era a atividade dos seus pais?
R – Meu pai é agricultor, trabalhou na lavoura, foi muito difícil para ele, criar 13 filhos, muito difícil mesmo.
P/1 – E a sua mãe?
R – Minha mãe é de casa, dona de casa.
P/1 – Quando foi que a senhora chegou em São Paulo?
R – Eu cheguei em 90 e... Não lembro a data.
P/1 – Começo da década de 90?
R – Isso.
P/1 – Por que você saiu lá de Pedra?
R – Porque lá é uma cidade muito pequena, não tinha como arrumar emprego, então, eu vim tentar a vida aqui em São Paulo, igual ao que várias pessoas fazem.
P/1 – Antes de vir para São Paulo, a senhora chegou a morar em alguma outra cidade além de Pedra?
R – Não.
P/1 – E quando você chegou em São Paulo, qual foi a primeira impressão que você teve da cidade?
R – Nossa! Me senti perdida aqui em São Paulo, uma cidade muito grande e eu vim de uma cidade muito pequenininha, então, aqui era uma imensidão para mim, nossa! Me senti perdida, completamente.
P/1 – A senhora chegou sozinha?
R – Eu vim com a minha cunhada, ela foi fazer um passeio lá em Pedra e passou um tempo na minha casa e eu pedi para que ela me trouxesse para São Paulo que eu não conhecia. Ela era Testemunha de Jeová que foi fazer um trabalho religioso lá em Pedra e ela ficou seis meses e eu falei: “me leva com você”, e aí, ele me trouxe para a casa dela, eu não conhecia a família, a família dela também não conhecia e eu vim.
P/1 – Qual a idade que você tinha nessa época?
R – Eu tinha 21 anos.
P/1 – Qual foi o bairro que você foi morar aqui em São Paulo?
R – Eu morei em Jardim do Carmo, em Itaqua [Itaquaquecetuba].
P/1 – Como é que foi a sua infância lá em Pedra? Como era a casa onde você vivia?
R – Minha infância foi muito... Não sei se eu falar triste. Foi uma infância difícil, igual eu ao que eu te falei com 13 filhos. Então, eu lembro que a gente passava fome, dificuldade mesmo. Naquela época, tinha dia que não tinha o que comer, muito difícil.
P/1 – Como que era a casa?
R – Era uma casa de tijolos, mas era uma casa muito simples, não tinha lugar para sentar, não tinha cadeira, só tinha uma mesa. Meu pai mesmo que fez, tinha lá uns banquinhos, que ele fazia de madeira, a gente sentava, mas só tinha a cama, a mesa e o fogão, só isso não tinha mais nada.
P/1 – Além de seus pais e de seus irmãos, tinha mais alguém que morava ali?
R – Só meus pais e meus irmãos.
P/1 – Mas como era o cotidiano ali? As brincadeiras com os irmãos?
R – A gente brincava e inventava os brinquedos. A gente brincava com pedrinhas, não tinha bonecas. Tinham aquelas plantações de milhos, a gente fazia aquelas bonequinhas do milho e brincava, tinha cabelinho. A gente arrancava e ficava brincando, mas aí, a bonequinha murchava e a gente tinha que jogar fora. Não podia pegar várias bonequinhas de milho, se não tinha safra e a gente não tinha o que comer depois, porque ele plantava para nossa alimentação. A gente comia o que plantava. Então, era brincar com pedrinhas, fazia bonequinha de barro, brincava, fazia casinha de palha, era a nossa brincadeira.
P/1 – Como é que a senhora descreveria o seu pai e sua mãe?
R – Meu pai era uma pessoa muito ignorante. Ele batia quando precisava, ele era uma pessoa assim. A gente não podia pintar uma unha, colocar um batom, não saía para lugar nenhum, então, aquela pessoa bem rígida, só faltava colocar uma corda no pescoço e amarrar, mas ele era bem rígido. Mas eu lembro que na minha infância a gente era feliz, tanto é que eu gosto muito do meu pai. Ele é tudo para mim, meu pai, minha mãe, e ele criou os filhos que nenhum virou bandido. Todos são trabalhadores, todos tem sua vida, então, nenhum deu para ser gente ruim, assim, ninguém usou drogas, essas coisas todas, eu admiro ele que, com muita dificuldade, entendo. Ele é uma pessoa maravilhosa, ele é tudo para mim.
P/2 – Como é que era essa infância no meio de tantos irmãos? Tinha muita briga? Como é que era?
R – Não, nós éramos bem unidos, não tinha tanta briga não. A gente sabia dividir. A gente dividia as coisas: se tinha um pão a gente dividia entre todos, era assim, era bem unido, era humilde, mas bem unidos.
P/1 – E a senhora falou que seu pai era agricultor, mas ele tinha algum sonho além de ser agricultor? Era o que ele sempre quis?
R – Não, era opção mesmo, ele não sabia fazer outra coisa. Tanto é que até hoje ele está com 91 anos, então, o que acontece? Ele ainda vai, hoje ele não mora mais nessa fazenda, ele mora na cidade, mas ele anda uma légua todos os dias para ir lá e voltar, porque ele não consegue se desligar. Então, acho que ele gostava, não sei se era uma opção de vida mesmo, que ele não tinha outra coisa para fazer e tinha que sustentar os filhos.
P/1 – Tinha algum comerciante na família?
R – Não.
P/1 – Como é que era a vizinhança da casa que você morava?
R – Nossa! Era cada casinha pequena no meio do mato e tinha que andar bastante para achar outra casa, então, não tinha vizinho era muito longe. Era bem isolada mesmo.
P/1 – A senhora lembra aonde é que a sua família fazia as compras?
R – Lembro, tinha que andar bastante para fazer compra na cidade e trazer as compras todas na cabeça, porque não tinha transporte.
P/1 – Então, ia a família inteira, todos os filhos para ajudar a carregar as compras depois?
R – É. E iam trazendo as compras.
P/1 – E a senhora lembra o que sua família costumava comprar?
R – O básico, arroz, feijão, só era arroz, feijão, açúcar, café. A mistura também não dava que muita gente, então, só vinha mistura duas vezes por semana, só comia arroz, feijão e farinha. Então, era bem difícil mesmo.
P/1 – A senhora se lembra de alguma loja especial dessa época nas proximidades da sua casa? Uma loja que você preferia?
R – A única loja que eu lembro é que lá próximo não tinha. Só na cidade mesmo, mas eu cheguei a trabalhar numa lojinha na cidade, trabalhei uns quatro a cinco anos nessa loja, antes de vir para São Paulo.
P/1 – Essa mesma loja que a sua família fazia compras?
R – Fazia também.
P/2 – Do que é que era a loja?
R – Era de roupas. Você se refere há o quê? Alimentação?
P/1 – Ao comércio em geral, o que sua família comprava, qualquer coisa.
R – Eles compravam mais só nessa loja que lá chama bodega, antigamente chamava, até hoje ainda chama lá, bodega. Era uma mercearia pequeninha que só comprava o básico mesmo, porque o dinheiro não dava.
P/1 – E como que era a escola? O que você se lembra da escola?
R – A escola eu tinha que andar desse sítio até a cidade para ir para a escola. Então, íamos em quatro, os quatro menores, nós íamos para a escola, então, o que é que a gente tinha que fazer? Só tinha um chinelinho, um havaiana, para ir para a escola. A gente colocava o chinelinho na mão aqui, ia descalço, quando chegava na entrada da cidade, a gente colocava o chinelinho no pé para chegar na escola com chinelinho. Na volta, a gente fazia a mesma coisa, se não acabava e não tinha dinheiro para comprar outro (risos). Olha que difícil.
P/1 – Qual a matéria que você gostava mais de estudar nessa época?
R – Olha, que eu me lembre, eu não gostava muito. Eu ia mais por causa da merenda da escola. (risos)
P/1 – E os amigos? Além dos irmãos existiam grupos de amigos também?
R – Não, não tinha era tudo longe as casas, então, amigos eram só os irmãos mesmo.
P/1 – Na escola também não se chegou a formar um grupo de amigos?
R – Só na escola, aí, eu fiquei nessa escola até a quarta série. Depois, eu fui para a cidade, comecei a morar lá com uma senhora, a Joselita, uma pessoa que me ajudou muito e eu ficava na casa dela para estudar. Aí, minha vida começou a modificar, a mudar. Aí, não tive mais a convivência com a minha família, porque só via dia de quarta-feira. Eu fiquei morando nessa casa. Estudei, terminei até o segundo grau, depois eu comecei a fazer um curso de contabilidade em Arcoverde, mas no início desse curso de contabilidade, eu parei para vir para São Paulo, aí, aqui eu parei e não estudei mais.
P/1 – Voltando um pouquinho nesse período, que idade você tinha quando começou a morar com a Senhora Joselita?
R – Eu tinha sete anos.
P/1 – Por que a senhora foi morar com a Joselita?
R – Porque eu queria estudar e achava dificuldade de sair da cidade para o sítio e nessa idade quando chegava aos nove, dez anos, 11 anos, meu pai já tirava da escola para ajudar na lavoura e eu não queria trabalhar na lavoura. Então, eu fiquei morando com ela, ajudava, fazia o serviço de casa, ela me dava o que eu precisava, não me pagava, ela me dava o que eu precisava, roupa, calçado, estudo, e eu fiquei cuidando dos filhos dela. Os filhos foram crescendo, e é uma pessoa que eu gosto muito, maravilhosa.
P/1 – Como é que foi falar para o seu pai que você iria morar numa cidade? Como foi a reação dele?
R – Ele era ignorante, então, ele não aceitava, eu chorava muito, tanto é que nessa fase, voltando um pouquinho atrás, posso voltar, né?
P/1 – Pode.
R – Então, eu tive um problema de saúde, mais ou menos dos cinco até os sete anos, mais ou menos, na época que eu fui morar com ela. Eu fiquei sem andar, eu não falava, eu não me movimentava eu fiquei um ano no hospital sem me movimentar eu só comia com a sonda e perdi todos os movimentos, minha boca travou. Até hoje, os médicos nunca me falaram o que é que era, eu não sei o tipo de doença que eu tive e ele falou que depois de um ano eu começaria a voltar os meus movimentos novamente com o tratamento. Eu engatinhei duas vezes, eu lembro ainda que eu ficava engatinhando. Eu tinha muita força de vontade para voltar com os meus movimentos. Eu acho que, por esse motivo, ele ficava com medo de eu passar algum nervoso e voltar tudo de novo, ele deixou que eu morasse com ela. Foi difícil para mim, eu nem gosto de lembrar muito, assim, dessa parte da doença, porque me traz recordações ruins.
P/1 – De quem foi a ideia de ir para a casa da Dona Joselita? Como é que foi que a conheceram?
R – Foi minha mesma a ideia, eu tinha uma conhecida que morava no sítio que conhecia a mãe dela, e estava precisando de uma pessoa para fazer companhia à filhinha dela, que era pequenininha, mais para brincar, aí, ela tinha comentado e eu fiquei querendo. E quando eu quero uma coisa, eu fico insistindo, insistindo, insistindo... Eu fiquei atormentando a minha família até eles deixarem, aí, eles deixaram eu ir.
P/1 – Quando a senhora chegou na casa da Dona Joselita, o que a senhora achou ali da cidade, da casa?
R – Eu estava num paraíso, para mim foi uma mudança radical, porque eu morava num lugar que não via ninguém, parecia bicho do mato, você não via ninguém, não conversava com pessoas diferentes, tanto é que até hoje eu sou tímida. Eu gosto, eu falo, mas eu sou super tímida, quando aparecia alguém lá, no sítio, a gente corria para o mato e se escondia, parecia bicho mesmo. Então, foi uma mudança radical mesmo. Eu gostei, parecia que eu estava no paraíso, eu falei: “nossa!” Minha vida mudou! Eu achava que estava rica (risos) com a vida que eu tinha, nossa! Para mim foi uma mudança, assim, completamente.
P/1 – Como era a casa da Dona Joselita?
R – Era uma casa super confortável, tinha de tudo, tinha luxo, assim, muito bom!
P/1 – Quantas pessoas moravam lá?
R – Moravam só três. Era a Josa, a mãe dela e a filhinha dela, a Maíra.
P/1 – Sei que você já falou um pouquinho, mas como é que era o seu cotidiano lá na casa da Dona Joselita? Você trabalhava ali?
R – Eu ajudava, assim, mais para brincar com a Maíra, que era ela sozinha e a Joselita ia trabalhar ficava a mãe da Joselita em casa e eu ficava com a Maíra brincando. A gente brincava bastante, brincava de boneca, brincava de fazer lição...Foi uma fase gostosa da minha vida, e às vezes, eu fazia alguma coisa também, ajudava, secava uma louça, mas era mais brincando mesmo. Depois que a Maíra foi crescendo e eu também crescia, eu ia fazendo as atividades, ajudando em casa, porque a mãe dela já estava doente, eu mesmo senti a necessidade de ajudar, de ser útil, de retribuir o que ela estava me passando.
P/1 – Como é que ficou o contato com a sua família nesse período? Continuava a ver seus irmãos na escola? Continuava vendo seus pais? Como é que era?
R – Então, eu via muito pouco.
P/1 – Nem na escola?
R – Não, porque eu já começava a estudar em outra escola, eles estudavam em uma e eu estudava em outra, mas eu ia todos os finais de semana para a casa dos meus pais. Ia no sábado e voltava domingo.
P/1 – Nessa casa nova, com essa amiga nova, outra escola, ampliou o grupo de amigos?
R – Eu comecei a ter novas amizades, maravilhosas, tanto é que eu conheci a Ilma. Ela morava num sítio com os pais dela e ela morava também com uma pessoa para estudar, e uma pessoa que marcou muito a minha vida, que também me ajudou bastante é como se fosse uma irmã.
P/1 – Era uma coisa comum às pessoas que moravam em sítio irem para a cidade morar com alguém para estudar?
R – Era muito comum.
P/1 – E o que vocês faziam para se divertir, então, nessa cidade? Você, a Ilma e a Maíra?
R – A gente jogava peteca, jogava bola, participava de basquete na escola, e fazia piqueniques, então, era gostoso.
P/1 – Frequentava-se algum tipo de lanchonete? Cinema?
R – Cinema não, porque lá não tinha cinema. Cidade pequena não tem cinema, mas a gente ia em festas e, com o tempo, eu tinha um grupo de amigos que era bem legal. Então, a gente ia em muitas festas, bailes, eu comecei a organizar festas, para arrecadar dinheiro para a escola, para a nossa formatura, fazia desfile de modas, era bem legal.
P/1 – Longe dessa vigilância do seu pai, começou a arrumar um namorado também?
R – Olha! Eu namorei muito pouco, eu tive, quase, vamos assim dizer, namorado mesmo eu tive dois, eu tive dois namorados, então, não fui uma pessoa que namorei bastante não. Na minha vida toda, eu tive dois namorados, depois conheci meu marido e casei.
P/1 – Você mencionou que trabalhou numa loja, que a sua família fazia compras, que idade você tinha quando começou a trabalhar nessa loja?
R – Eu comecei a trabalhar nessa loja eu tinha 16 anos.
P/1 – Onde era a loja?
R – Era na cidade de Pedra mesmo.
P/1 – O que essa loja vendia?
R – Vendia roupas, modinha.
P/1 – Como é que foi que você começou a trabalhar lá?
R – Então, eu estava na Josa, eu falei e agora, como é que vou falar para ela? Porque nesse tempo eu estava ajudando bastante ela, a mãe dela estava muito doente, eu falei: “agora eu arrumei um emprego numa loja e eu vou trabalhar nessa lojinha”, ela falou: “tudo bem, eu quero que você seja feliz, você pode trabalhar”. Ela me deu uma força, falou com a Dulce, que falou: “não tem experiência”, “Experiência a gente adquire com o tempo. Se você não me der uma chance eu não vou aprender nunca, então, você precisa me dar uma chance para eu aprender”, “Mas eu preciso de uma pessoa que tome conta da loja”, porque ela era psicóloga, ela tinha o consultório dela e precisava de uma pessoa. Eu falei: “me dê uma chance de uma semana, se você não gostar do meu trabalho você me dispensa”, ela me deu essa chance e eu fiquei até quando eu vim para São Paulo.
P/1 – Sua primeira patroa, então, tinha um consultório de psicologia na cidade?
R – Isso.
P/1 – E quais eram as suas atribuições na loja? O que é que você tinha que fazer?
R – Eu tinha que atender, tinha que administrar a loja. A loja era pequeninha em cidade pequena, então, não tem muita coisa para fazer. Você tem que esperar chegar um cliente e eu atendia, cuidava da loja, tentava fazer alguma coisa para que a loja tivesse bons rendimentos, atender os clientes, tanto é que teve, ela gostava muito do meu trabalho, consegui bastante clientes para a loja. Foi evoluindo e chegou num ponto que eu achei que estava pequeno para mim ali, então, eu precisava de espaço para mim.
P/1 – Nessa loja que você trabalhou de onde vêm as mercadorias? Era feito ali? Era comprado em outro lugar?
R – Comprava em Caruaru, na Feira da Sulanca, às vezes, ia vendedor lá também. Era cidade pequena, mas aparecia de vez em quando um vendedor.
P/1 – E era você que negociava com esse vendedor ou era?
R – A Dulce mesmo que fazia as compras e eu ajudava. Ela perguntava para mim o que saía mais e eu ia falando.
P/1 – Mas você já dava suas opiniões na época?
R – Já.
P/1 – Você lembra o que é que você fez com o seu primeiro salário?
R – Meu primeiro salário eu comprei roupas, eu comprei a prestação e ia pagando e ia era roupa só, tanto é que eu sou compulsiva, eu adoro fazer compras.
P/1 – E o que é que você sentiu mais dificuldade nesse início de trabalho?
R – O que eu achava mais difícil? Eu acho que era o cliente mesmo, que tinha pouco cliente e eu queria demonstrar o meu trabalho. Então, você tinha que ficar o tempo todo ali parado, esperando entrar um cliente de vez em quando. Eu não tinha muita coisa para fazer na loja, então, eu ficava muito parada naquele tempo. Eu achava até melhor quando eu estava na Josa, porque lá eu tinha alguma coisa para fazer, e lá era demorado para aparecer um cliente para atender, então, eu nunca senti dificuldade no meu trabalho.
P/1 – Até que idade você ficou trabalhando nessa loja?
R – Olha! Eu fiquei até os 20 anos, porque aí eu vim para São Paulo, e aí, fiquei um ano aqui, trabalhei, depois voltei e ela me chamou de novo para a loja, eu fiquei ainda três meses lá e eu falei: “não, eu acho que não quero mais ficar em Pedra, vou voltar para São Paulo” e voltei.
P/2 – Você diz que começou um curso de contabilidade como é que foi?
R – Então, foi logo próximo de eu vir para cá, eu fiz o primeiro e o segundo ano de contabilidade eu me deslocava de Pedra para Arcoverde. Tinha um ônibus que levavam os estudantes. Eu comecei a gostar, mas depois a ideia de vir para cá foi mais forte, então, eu desisti de tudo.
P/1 – Nessa primeira vez que você veio para cá foi com sua prima?
R – Não, eu não conhecia a pessoa, foi a minha cunhada, só que eu não a conhecia. Eu vim sem conhecer, não conhecia ela, nem família e nem ninguém, e foi outra briga com o meu pai para poder vir. Ele não queria, e que não queria que a filha saísse de lá, eu falei: “mas eu vou, mas eu vou. Se o senhor não deixar eu vou de qualquer jeito”, e aí, ele acabou cedendo eu vim e estou até hoje.
P/1 – Por que é que você voltou nessa primeira vez? Você veio para São Paulo depois voltou para lá por quê? Por que você voltou?
R – Então, por que eu voltei? Porque eu tinha deixado uma pessoa que eu gostava muito, então, eu voltei ainda para ver se dava certo, e aí, eu vi que não dava, então, eu desisti.
P/1 – Já era um namorado seu em Pedra?
R – Era.
P/1 – A segunda vez que você veio como é que foi? Quem é que deu ideia?
R – Eu que desci de vir, de voltar.
P/1 – E foi para o primeiro lugar que você tinha ficado da primeira vez?
R – Mesmo lugar.
P/1 – Como foi a negociação com a Josa? Ela também ficou muito triste nessa época?
R – Então, na época, eu fui trabalhar na loja, voltando... Ah, é tanta coisa, né? Então, eu fiquei um tempo com ela e, depois, tinha a Ilma a minha amigona, que eu guardo aqui no meu coração e a mãe dela comprou uma casa na cidade para que ela fosse morar com os irmãos dela para estudar. Aí, ela saiu dessa casa que ela estava para ficar na casa da mãe dela mesmo, que tinha comprado uma casa, e ela me fez um convite: “vamos morar comigo?” Eu fiquei com aquele sonho de ser independente, de morar com uma amiga, e o que é que eu fiz? Outra conversa com a Josa: “Josa eu estou indo embora, vou morar com a Ilma”, ela conhecia muito a Ilma também, era uma pessoa que ela gostava muito e mais uma vez ela falou: “se é para a sua felicidade você pode ir” e eu todos os dias estava na casa de Josa, ia lá eu almoçava, eu jantava, ela é um amor de pessoa, um amor. E eu morei com a Ilma, nesse período eu fiquei, foi uma época muito boa, então, são pessoas importantes para mim.
P/1 – Aí, a senhora voltou para São Paulo em Itaquaquecetuba, na verdade, e essa segunda chegada como é que foi? Foi procurar um emprego?
R – Eu fui à luta. Fui procurar um emprego e é muito difícil, porque aqui eles queriam pessoas com experiência, que tivesse registro em carteira. Eu não tinha nada disso e eu não conhecia nada, não sabia por onde começar. Não sabia andar, o que é que faço agora?
P/1 – Teve alguém que te ajudou?
R – Teve a Nair amiga da minha cunhada, que ela ia, de vez em quando, em São Miguel Paulista e ela me levava, já procura emprego. Eu tinha medo de andar só. Aí, eu fui com ela e, nesse primeiro dia que eu saí, eu vi umas placas em lojas, eu entrei, perguntei se não estava precisando e ele: “não tem que ter experiência”, “mas eu aprendo, vocês me ensinam, eu sou fácil de aprender”. Ele disse: “não a gente precisa de pessoas que sejam bem ágeis”, que era uma loja que tinham grande movimento, era época de final de ano, “mas vocês precisam me dar uma chance, eu preciso trabalhar. Eu preciso trabalhar!”. Eu falava só isso, “mas eu preciso de pessoas com experiência moça, você não escutou?”, eu falei: “escutei, mas eu quero trabalhar, me dê uma chance!”. Aí, ele: “não eu tenho já um monte de gente fazendo experiência”, eles pegavam três, quatro meninas, faziam experiência. Se passasse no teste pegavam, se não passasse mandava embora, naquele mesmo dia. “Moço, eu preciso de uma chance, vocês não vão me dar?” E ele: “não vou dar uma chance, porque tem muita gente que está com currículo bom e você não tem nem currículo”, e eu falava assim: “o que é isso, currículo?”. Eu não sabia! Lá no nordeste você nem aprende essas coisas e ele: “você tem que ter um bom currículo, ter trabalhado em outras firmas, ter cursos e um monte de coisas”, “mas, moço, eu preciso trabalhar, vocês tem que me dar uma chance”. Quando eu ia, ele: “não tem como”, virei e falei: “está bom, então”, aí, ele chamou: “moça, quer fazer um teste hoje?”, eu falei: “quero, agora?” Ele falou: “sim”, eu falei: “está bom eu faço agora”, e aí, eu conversei com a pessoa que me trouxe, se ela poderia vir me buscar mais tarde, ela falou: “está bom, eu venho”. Aí, comecei a trabalhar, não sabia onde tinha nada, estoque, e eu falei: e agora para eu me virar? Tenho que conseguir esse emprego, e eu peguei, tinha umas bancas de promoção que eles colocavam, eu falei: “vou nessas bancas de promoção mesmo, não tem que pegar sapato lá em cima, não tem que pegar roupa, nada, vou onde está mais fácil” e ralei que só! Trabalhei muito, ele viu que eu tinha força de vontade mesmo, que eu tinha garra, aí, chegou entre seis meninas para saber quem é que ia ficar. Ele escolheu e ele falou: “tem três meninas selecionadas”, eu falei: “tomara que seja eu”, aí, ele falou: “Lindinalva, eu conversei com os outros funcionários, que a opinião deles também conta, você foi uma selecionada, eles gostaram muito de você. Você é bem dinâmica, trabalha rápido e você foi selecionada”. Eu falei: “muito obrigada, nossa! Amei”. Aí, eu comecei a trabalhar nessa loja. Eu fiquei trabalhando dois anos, só que também não tinha registro, era sem registro, eu aceitei, porque eu estava precisando. Aprendi muita coisa também na loja que foi a partir daí que eu fui adquirindo mais experiência como ia lidar, com as pessoas e tudo. Enfim, foi uma fase, tudo que eu faço, eu acho que eu vou aprendendo: pode ser coisa ruim ou boa, eu aprendo e sigo em frente.
P/1 – E como que era esse cotidiano, então, de morar em Itaquaquecetuba e ir para São Miguel? Como é que você para ir e voltar do trabalho?
R – Então, eu anotei o número do ônibus na mão, eu anotava para poder ficar toda hora olhando, eu lembro que um era o Jardim das Oliveiras que eu pegava, quilômetro 29, eu anotava, quando chegava perto, assim, eu perguntava para o cobrador e ele: “está chegando”. Eu fiz amizade rápido, aprendi rápido, questão de uma semana e eu já sabia ir e voltar, não tinha mais nenhum problema.
P/2 – Era uma loja de quê? Como é que era? Você falou que contratava no final do ano, era uma loja grande?
R – Era uma loja grande, eles vendiam muito mesmo. Vendia sapatos e moda feminina e masculina.
P/1 – Bom, você começou a ter segurança para andar por São Paulo, né?
R – Foi.
P/1 – E isso alterou suas oportunidades também, você começou a sair? Fazer umas amizades por aqui? Como é que foi?
R – Conheci sim, comecei a andar, conhecer outros lugares, enfim.
P/1 – E o que você fazia para se divertir?
R – Eu não fazia muita coisa não. Meu divertimento era mais ir em shopping, assistir um filme...
P/1 – E quanto tempo durou essa passagem, nessa casa que você ficou em Itaquaquecetuba?
R – Eu fiquei nessa casa, depois eu comecei a namorar com o irmão dessa menina. Nós casamos logo e a minha sogra mudou para Campo Grande e eu comprei a casa dela e estou lá até hoje, na mesma casa. É minha agora e continuo a minha vida.
P/1 – E, nesse período de dois anos, você ficou nessa loja em São Miguel e como é que foi a saída de lá?
R – Então, eu pedi a minha demissão porque eu queria trabalhar em um lugar que fosse registrado e lá eles não registravam. Eu achava que estava perdendo muito tempo sem registro. Então, eu saí, pedi as contas e fui a procura de outro emprego. Foi aí que eu fui para Penha, e procurei e emprego, também a mesma coisa, ninguém queria me dar emprego, porque eu não tinha registro em carteira, eu falava que tinha experiência, mas ninguém acreditava, aí, fui à loja do Mazhar Haddad, e tinha ido também em outras lojas, e aí, consegui nas outras lojas, já para começar no outro dia, aí, entrei na loja do Mazhar, e tinha uma plaquinha e estava precisando de vendedora, e ele: “só com registro”, e eu falei: “eu não tenho e eu preciso trabalhar, como é que é?”. A Sueli gostou muito de mim pela conversa que eu tive com ela, Mazhar não queria, ele fazia assim, a Sueli falando: “você vem amanhã” e ele falava por trás que não era para aceitar, que não queria, e a Sueli era psicóloga e tudo ela falou: “eu gostei da moça”, mas ele não falava para mim que não queria, mas fazia o sinal para ela, que não era para ela me pegar para trabalhar na loja. Foi que ela mandou ir na terça feira, eu lembro como se fosse hoje, e aí, eu desisti dos outros empregos que eu tinha conseguido, eu ia ganhar menos, também não ia ter registro. Eu fui nesse dia e a Sueli não estava, ele chegou e falou para mim: “então, você vem amanhã que a Sueli está aí”, eu falei: “não, ela mandou vir hoje”, e ele: “mas eu estou mandando você vir amanhã que ela está aí e conversa com você como você vai fazer o trabalho”. Eu disse: “não, Senhor Mazhar, a Dona Sueli mandou eu vir hoje, vou começar hoje e amanhã converso com ela”. E ele: “vai, fica”, desse jeito, eu fui e fiquei trabalhando, eu sempre fui firme nas minhas coisas, eu quero e não tem que deixar para amanhã. Combinou é o combinado. Então, e estou lá até hoje, vai fazer 21 anos.
P/2 – E como foi essa coisa, você falou que morava em Itaquaquecetuba e ainda mora, e procurar um emprego na Penha o que é que era? Já era um bairro comercial? Tinha muita loja? Porque é que ir para a Penha?
R – São Miguel era um bairro que tinha poucas lojas, não tinha muita opção de loja. Na Penha, o comércio era bem maior, então, lá era melhor de vendas do que em São Miguel. Foi por essa opção que eu fui, porque nós ganhávamos por comissão, então, você tem que entrar numa loja que venda bastante para você, a partir da comissão, tirar o seu salário. Se você não vender nada, você não ganha também, se é de comissão, você tem que vender bastante para ter lucro.
P/1 – Então, você saiu da loja de São Miguel, porque não tinha registro, foi procurar um emprego na Penha de comerciante, porque a Penha tem um bem mais forte? Nesse meio tempo você não chegou a pensar em algum outro tipo de trabalho? Ou retomar o curso de contabilidade?
R – Pensar eu pensei, mas o comércio em si ocupa muito o nosso tempo, então, você tem que trabalhar até mais tarde e você acaba não tendo tempo, e foi o que aconteceu comigo, eu acabei deixando de lado os meus estudos, por quê? Porque não tinha tempo de estudar, e depois começou a vir filhos, aí, eu não poderia deixar o meu filho para puder abandonar eles, eu já passava o dia todo fora e, para poder estudar... Mas eu penso ainda, eu ainda vou estudar, vou fazer faculdade, só estou esperando a minha filhinha crescer mais um pouquinho.
P/1 – E esse início de trabalho com o Senhor Mazhar, na Casa da Sogra o que é que ano?
R – Foi em 91.
P/1 – A senhora escolheu de propósito esse ramo do comércio de roupas, enxovais ou poderia ter sido algum outro tipo de comércio?
R – Poderia ter sido outro, mas foi só a opção que eu achei naquela época, e aí, eu fui ficando e ficando.
P/1 – A senhora falou que no começo o Senhor Mazhar não queria, por quê?
R – Porque ele achava que eu vim do Nordeste, tudo era ainda meio assim, até hoje eu ainda falo, falava muito alto, eu era assim, como é que se diz, mais pela aparência, eu não tinha uma boa aparência, não me vestia muito legal, essas coisas. Então, eu tinha tudo isso no comércio hoje em dia conta, naquele tempo também, na maneira de você se vestir, de falar. Ele não queria, porque queria uma pessoa mais exótica, uma pessoa mais moderna, que se vestisse melhor. Eu não me vestia muito bem, era qualquer roupinha que eu colocava, não ligava muito para aparência.
P/1 – Então, nesse começo a senhora ficou mais próxima da Senhora Sueli, que é esposa do Mazhar. Como é que era trabalhar com ela?
R – É uma pessoa muito legal, uma pessoa, assim, bem amiga, nós conversávamos bastante, ela me dava conselhos, ela era uma pessoa muito boa, perguntava como é que. Ela se envolvia com os meus problemas, e eu com os dela, ela contava as coisas dela, eu contava os meus para ela, então, uma pessoa bem amiga mesmo, Senhor Mazhar também, uma pessoa bem amiga, uma pessoa muito boa, ele não é um patrão, ele assim um amigo.
P/1 – Você falou que foi firme nessa decisão de trabalhar ali na Casa da Sogra, você tinha ouvido antes falar antes da loja? Qual foi o motivo que te fez querer ficar lá?
R – Eu acho que pelo aconchego. A maneira deles tratarem os funcionários, deles acolherem... Uma família. Eu achei uma família ali na loja, então, eu fui ficando, não que eu não tivesse oportunidade de ter outro trabalho melhor, tive, mas foi uma opção minha. Eu fiquei lá, porque eu me sentia mais família.
P/1 – E como foi seu início? Quais eram as atribuições nesse início?
R – Eu era vendedora, eu atendia. Atendo até hoje também. Ajudava em tudo que a loja precisasse de mim. Eu estava ali, pronta para ajudar, mas foi difícil no início para mim na loja, por causa dos outros funcionários, tanto é que eles me criticavam muito, foi difícil muito, mas eu fui firme, tanto é que ele até mandou umas funcionárias embora, por causa que eles ficavam desfazendo, entendeu?
P/1 – O que é que a Casa da Sogra comercializava nessa época?
R – Eram uniformes escolares e moda feminina e masculina, mas puxada mais para pessoas de segunda idade, não assim jovem, mais adulto.
P/2 – E como que era a loja? A fachada? Por dentro?
R – Era uma loja pequena, bem antiga, porque essa loja vem dos avôs, era dos avôs do Mazhar. Ela era na Penha de França, e depois eles mudaram para a Padre João, que era uma loja feinha, pequeninha, bem antiga, sabe? Lembrava as coisas antigas.
P/1 – No bairro da Penha, a Rua Padre João era bastante conhecida como a rua das noivas, né?
R – Sim.
P/1 – E a senhora acha que o Senhor Mazhar comprou um ponto ali por causa dessa fama da rua?
R – Não, na realidade essa loja foi montada nessa rua, porque eles eram onde eles moravam, era uma residência. Ele abriu esse comércio na frente da casa. Eles tinham a loja e moravam nos fundos. Então, foi uma das primeiras lojas, a segunda loja que abriu naquela rua, na Padre João, foi a Casa da Sogra e ao lado tem a Casa do Povo, que existe até hoje, que são as duas lojas mais antigas dessa rua.
P/1 – Então, antes da Casa da Sogra a rua ainda não era conhecida como rua das noivas?
R – Não, não era, era uma rua de residências, tinha mais residências.
P/1 – E como foi que a rua começou a ter bastantes lojas assim, que tem essa fama?
R – Então, as pessoas iam colocando comércios, iam se mudando para outros bairros e ali, onde que era a casa, virou comércio, foi virando comércio, e foi evoluindo, evoluindo... Começaram a montar, a abrir lojas de noivas, por isso que é conhecida como rua das noivas, só nessa rua na Padre João.
P/1 – Então, a rua deve ter aumentado muito o número de pessoas que passavam ali? Começou a ter muitas lojas. Como é que foram essas mudanças de trânsito? De pedestre?
R – Tem o trajeto que vem de São Miguel, que pega ali a Amador Bueno, então, é avenida. Fica a rua principal ali, porque passa ônibus, vai tudo para o centro da cidade, para o Brás, para o Parque Dom Pedro, então, é uma rua bem movimentada.
P/1 – E a Casa da Sogra saiu da Penha de França, a senhora falou que era uma loja bem pequeninha?
R – Era na Penha de França, depois mudou para a Padre João e continuou sendo uma loja pequena, porque era na frente, porque eles ele tinham uma casa, compraram essa casa e eles moravam nessa casa, então, eles fizeram uma parte na frente e montaram a loja.
P/1 – Como é que a senhora descreva a loja? Tem uma vitrine? Como é que é?
R – Tinham duas vitrines, uma de um lado e outra de outro, mas era bem pequenininha, tinha uma prateleira com os uniformes, umas duas araras com as roupas penduradas, só.
P/1 – Nesse início quantas pessoas trabalhavam lá?
R – Nós éramos em quatro.
P/1 – E como é que foi a sua acessão ali na loja? Quanto tempo demorou para a senhora superar aquelas dificuldades do início?
R – Então, a dificuldade foi mais no início quando eu não tinha muito conhecimento ali com uniformes, que eram várias peças de tamanhos diferentes, mas aí, eu peguei rápido! Com um mês, eu já estava dominado tudo ali: já sabia numeração, preço, porque era por preço. Cada tamanho tinha um preço, então, tinha um pouco de dificuldade de você aprender, porque um avental tamanho até o 48 era um preço, 50 outro, 52 outro, cada modelinho diferente era um preço, mas com um mês eu já sabia tudo, já sabia onde estava, já ficou tudo normal.
P/1 – Um vendedor tem várias atividades né? Cuidar do estoque, atender ao cliente, qual era a que você mais gostava?
R – Eu fazia tudo: eu atendia, eu fazia vitrine, eu arrumava estoque, eu gostava sempre de deixar sempre organizadinho, tamanho por tamanho, então, eu fazia de tudo, nunca ficava parada.
P/1 – Tinha alguma que você gostava mais?
R – Eu sempre gostei de atender, de atender o cliente.
P/1 – E como que a Casa da Sogra foi se transformando com o passar do tempo? Você falou que no início era uniforme escolar e roupas para idosos né?
R – Foi quando abriu o shopping Penha.
P/1 – Quando é que foi?
R – Eu não me lembro bem a época, mas tem bastante tempo. Eu acho que tem uns 15 anos mais ou menos. Não sei bem a data, mais ou menos isso. Depois que abriu o shopping, o movimento da Penha foi diminuindo, outros bairros foram crescendo, abrindo novos comércios iguais aos da Ponte Rasa, que é próximo da Penha. Os clientes foram se dividindo. São Miguel cresceu muito. Hoje, São Miguel é um dos bairros mais fortes, ali da região, daquele pedacinho, mais forte do que a Penha. E a Penha antes era mais forte que São Miguel, para você ver como muda. Eu acho que devido ao Brás, Tatuapé, tem ali Ermelino Matarazzo também, que o comércio está evoluindo bastante. Então, abriu o shopping, pronto as vendas começaram a cair, então, as roupas que vendiam lá já não tinham mais saída. Aí, tinha que fazer alguma coisa. Conversando com o meu patrão, eu falei: “nós temos que colocar mercadorias que tem um giro rápido” e ele sempre teve medo de mudanças, ele sempre queria ficar só naquilo, não sair daquele ramo, porque vinha da mãe dele, da avó dele, sempre nesse ramo, então, ele não queria ter mudança: “mas o senhor precisa mudar, as coisas estão mudando, Senhor Mazhar. O senhor tem que mudar sua loja, não pode continuar com a loja desse jeito”. E ele: “não, não pode é loja de família”, já tinha vínculos familiares. E aí, eu fui falando e ele: “então, o que é que você acha? Mudar o quê?”. Eu falei: “vamos colocar enxoval de bebê”, “mas eu não quero sair do uniforme” eu falei: “mas o senhor não precisa tirar o uniforme, continua com uniforme e enxoval de bebê, tira essa roupa moda adulto, que não está vendendo nada”. Comprava mercadoria e ficava, comprava coleção de inverno e chegava a de verão e não vendia a de inverno. Tinha que vender a baixo custo para poder pagar as dívidas, não estava tendo lucro. Foi aí que ele aceitou e nós começamos forte com enxoval de bebê. Vendeu muito o enxoval de bebê, bastante mesmo. E aí, o que aconteceu? Foram mais ou menos uns cinco anos bons mesmo. Com a chegada do Shopping, aí, foi modificando, porque os clientes iam para o shopping e o comércio foi ficando fraco e foi abrindo muita loja de bebê na Penha. Ficaram muita loja de bebê, e ficou difícil trabalhar com roupa de bebê, porque tinha muita concorrência no comércio e já não estava dando mais lucro. Vendia, mas não estava como estava dando antes, que era para estar melhorando cada vez mais: “precisamos fazer alguma coisa Senhor Mazhar, novamente”. Eu de novo, ele: “não vem com ideia de mudança”, eu falei: “Senhor Mazhar o senhor precisa mudar”. Ele disse: “não vou mudar, porque eu já estou modificando a loja, não está mais sendo aquela característica da Casa da Sogra de ser familiar e tal, já está modificando”. Ele não queria sair disso, queria continuar com aquela lojinha pacata de 1900 e bolinha, porque a loja tem o quê? Quase uns 50 anos. Aí, o que aconteceu? Eu falei: “Senhor Mazhar, não está dando certo, vamos modificar” e ele falou: “então vamos por o quê?” Eu falei assim: “você não quer tirar o bebê? Então, vamos por moda infanto-juvenil, roupas de batizados, porque está tudo uma coisa só, quem vem comprar enxoval, já vê uma roupinha para o filhinho mais velho, já compra, vê uma roupinha de batizado já compra, para uma festinha”. Ele disse: “está bom, então”. Aí, colocamos, deu certo. Vendeu muito, mas o comércio ia caindo em geral, não era só lá na loja. Era geral, tanto é que várias lojas fecharam da Penha. As lojas que tem hoje não são lojas muito antigas, são lojas novas, de pouco tempo. Tem poucas lojas antigas na Penha são mais as lojas mais novas. Aí, foi vendeu bem e tudo só que cada vez mais as vendas caindo. Tanto é que até hoje, tem gente passando dificuldade, porque as vendas estão cada vez mais caindo, e para não fechar a Casa da Sogra... E eu novamente... Foi um momento que ficou difícil de pagar as dívidas, porque você comprava as coleções e não vendia. Por mais que você tivesse preço baixo, a concorrência era muito grande com loja de bebê e o movimento fraco também, aí, foi outra mudança: “Senhor Mazhar, a gente precisa fazer alguma coisa, vai continuar assim? Tem que ver o que vai sair, Senhor Mazhar.” Ele falou: “Ah, eu não vou mudar mais não, você nem inventa que eu não vou mudar mais nada!”, “mas, Senhor Mazhar, você precisa mudar a loja, precisa reformar a loja. A loja está feia, está antiga, velha...” E para ele aceitar essa mudança de reformar a loja foi muito difícil, foi briga viu? Eu já briguei muito com o meu patrão por conta disso. E ele fez uma reforma. Reformou a loja e tudo e a mudança agora da mercadoria, já vendíamos roupas de batizado, vestidinhos de festa, e as pessoas sempre procuram e falavam: “olha, você não aluga? Vestidinho para batizado?”. Eu falei: “não meu anjo, não alugamos, só vendemos”, “mas eu não quero comprar, eu quero alugar” e a loja já ali na Rua Padre João, já tinha bastante loja de noiva, eu falei: “Senhor Mazhar, eu acho que eu já achei a solução...” ele: “Olha, não abra a boca, não fala nada que eu não quero escutar!” Eu falei: “achei a solução para o senhor”, “não, não fala nada” e eu: “Mazhar, vamos alugar roupas?”. “Você não entende nada de aluguel, menina!” Eu falei: “não entendo mesmo. Não sei costurar, não sei nem por onde começar, mas a gente pode fazer!”, “não, não inventa! Eu não quero, depois a pessoa não devolve a roupa, fica com a roupa, não devolve”, coisas de pessoas de idade. Eu falei: “não, vamos fazer sim!”, “Não, não inventa”, nisso eu fiquei dois anos atormentando ele, isso porque eu sou insistente.
P/2 – Você falou dessas mudanças de mercadorias, primeiro vieram enxovais, depois infanto-juvenil, sempre foi uma coisa que você fala para ele mudar, de onde veio exatamente essa ideia de mudar para o enxoval, ou para o infanto-juvenil, é uma coisa que as pessoas vinham na loja e vocês não tinham ou era uma coisa que você gostava e por isso queria colocar na loja?
R – Não. Eu analisava sempre o que as pessoas procuravam naquele momento, a procura do cliente, porque o comércio é assim: às vezes, você tem uma mercadoria, mas a procura é outra. Essa mudança era mais para atender os clientes, o que eles estavam procurando, realmente o que eles queriam comprar. O que o bairro estava necessitando naquele momento? Quando eu mudei para a loja de bebê, tinha poucas lojas, tinha uma ou duas lojas de bebê. Tanto é que eu incentivei para que ele colocasse de bebê, porque não tinha loja de bebê no bairro, tinha uma ou duas lojas, mas não vendiam de tudo. E lá nós vendíamos de tudo: de carrinho de bebê, enxovalzinho, tudo, vendia tudo de bebê. A partir daí, as outras pessoas que tinham loja também viam o movimento da loja e achava que a gente estava vendendo muito e o que é que eles faziam? Foram colocando lojas de bebê e chegou a um ponto de ter muita loja de bebê. Então, já não tinha cliente para tanta loja, isso que aconteceu. Por isso que foi tendo essas mudanças, pela necessidade do cliente da Penha mesmo, porque se você tem muita concorrência, você tem que procurar colocar uma coisa que tenha pouca para você atender o cliente e ter bastante lucro também.
P/1 – A partir da experiência, você passou a ter uma visão bem empreendedora do negócio. Você sempre via o que estava faltando para os clientes e buscava. E além de convencer o Senhor Mazhar, que era o primeiro obstáculo, onde é que a senhora ia buscar essas mercadorias novas? De quem a senhora comprava?
R – A Sueli ia fazer compra no Brás e me levava para eu escolher as mercadorias, que eu achava que ia sair na loja. Então, ia fazer compra junto com ela. Fazia compras para a loja nas fábricas, na Brascol, que era só atacadista. Nós íamos fazer essas compras, a gente ia toda a semana, porque acabava mercadoria. Eu lembro. A gente passava o dia todinho, às vezes, dois dias colocando preço em mercadoria, que era tudo coisinha pequeninha. A gente trabalhava tanto! Coisinha muito pequena e pondo preço, pondo preço e não vencia. Tinha época, que a gente ia duas vezes por semana pegar mercadoria. Vendia muito. Depois, caiu de uma tal forma que não tinha mais como você continuar, porque tinha muita loja e o movimento caiu muito, então, você tinha que procurar alguma coisa para continuar com as portas abertas.
P/1 – Essa queda do comércio ali da Penha a senhora acredita simplesmente a fundação do shopping? Por que é que teve essa queda?
R – Tem alguma coisa com relação ao shopping e também pelos bairros próximos, que foram montando o seu próprio comércio. Foram se dividindo os bairros, aí foi diminuindo... Porque a Penha fica no meio, então, tem o Tatuapé, o Brás, a Ponte Rasa, Ermelino Matarazzo, tem o Cangaíba que já tem um comercinho pequeno. Eu acredito que futuramente a Penha pode até o comércio ficar bem pior.
P/1 – E a senhora vê que atualmente as pessoas saem da Penha para comprar nos bairros?
R – Saem. Os clientes que eram de São Miguel que vinham para Penha não vem mais, os que eram do Itaim Paulista não vem mais porque no Itaim Paulista já tem o seu comércio, já está começando um comércio bom no Itaim Paulista, e São Miguel é próximo do Itaim Paulista. Quem mora em Itaqua vem para São Miguel, não vem mais para a Penha. Vinham para a Penha, Poá, Suzano, vinha tudo para Penha. Como São Miguel não era um bairro que era muito forte, que tinha pouco comércio na Penha tinha mais, eles se deslocavam desses bairros e iam tudo para a Penha, Guarulhos, para Penha, nós temos muitos clientes de Guarulhos, mas Guarulhos já tem um comércio fortíssimo, então, já não vem aquela quantidade de pessoas de Guarulhos para a Penha, não vem mais. Então, o comércio vai ficando fraquinho, porque não tem cliente e vai sobreviver quem puder.
P/1 – Esses clientes que ainda restam ali, quem são?
R – Eu acredito que são pessoas... O cliente da Penha é mais dali da Penha, Cangaíba, aqueles bairros mais próximos.
P/1 – Como é o sistema de pagamento ali na Casa da Sogra, vocês aceitam cartão de crédito?
R – Só cartão de crédito e dinheiro. Cheque, nós não trabalhamos.
P/1 – E quando é que foi que começou a aceitar cartão de crédito?
R – Faz tempo, desde quando eu comecei a trabalhar nós já trabalhávamos com cartão de crédito, só que o cheque era mais forte, aceitava muito cheque.
P/1 – Qual o motivo de não aceitar mais?
R – Porque muito cheque foi devolvido, sem fundo, ele teve um prejuízo muito grande de cheque. Devido a esses cheques, ele teve muito prejuízo mesmo, muito, muito, muito, não teve mais retorno.
P/1 – É uma tendência ali do bairro?
R – Olha, eu acredito que seja, porque a maioria das pessoas quase não aceitam mais.
P/2 – Eu queria voltar um pouquinho, você estava falando da mudança que foi para essa área de aluguel de roupa e tudo mais. Você falou até que vocês não tinham muita experiência, como é que foi entrar nesse ramo? Como ele funciona? Como é que o estoque?
R – Foi bem interessante essa mudança de aluguel de roupa, porque nós saímos de uma coisa totalmente diferente. De vendas, para aluguel. Foi difícil convencer o Mazhar a aceitar essa ideia de aluguel, tanto é que ele cedeu. Eu me lembro que o primeiro aluguel que nós fizemos foi para uma noiva que precisava de 15 daminhas iguais, floristas, e os vestidos eram todos iguais. Você imagina você começar a fazer aluguel e fazer 15 vestidos iguais? Precisa ter coragem para você enfrentar, não é verdade? E eu enfrentei, ele: “menina, como você vai fazer? Eu só quero ver a confusão que você vai fazer? Vou ter que mudar a loja totalmente, tenho que abrir firma para prestação de serviços da loja com aluguéis”. Tudo isso era mudança. Ele teve que abrir, agora ele tem para venda e tem para aluguel. Ele teve que ir para a prestação de serviços, ele teve que fazer isso. E nós começamos: teve uma noiva que queria os 15 vestidos, eu falei: “eu faço os 15 vestidos”. Não sabia por onde começar. Tinha essa cliente que fornecia esses vestidos, ela tem a fábrica, vestidos de batizados e eu conversei com ela: “você não quer fazer uns vestidos sob medida para mim? Eu tiro as medidas das crianças e você me faz?”, “mas eu não trabalho com medidas, eu só faço por atacado”, “mas faz para mim sob medida? Eu tiro as medidas direitinho e você me faz?” Ela: “mas Nalva, eu não trabalho dessa forma”, e eu falei: “mas não custa nada!”. E ela: “está bom então, eu faço.” Aí, eu fui passei o modelinho para ela do vestido que eu queria, era até um modelinho que ela já fazia, a cliente tinha gostado, e ela fez sob medida. Eu nunca tinha tirado medida na minha vida. Não entendo nada de costura e tirei as medidas, não é que deu certo?! Gente, ficou perfeito! Fiz os vestidos e a noiva adorou. Ficaram lindas as meninas! A partir daí, já apareceu outra noiva que queria alugar os mesmos vestidos, aluguei mais cinco, desses mesmos aluguei. O Mazhar falou: “esse negócio não vai dar certo, tenho que modificar a loja”. Eu falei: “vai precisar mudar mesmo”, e aí, ele: “Nalva é muito difícil, como que a gente vai fazer? Assinar promissória? Fazer o quê?” Ele estava totalmente deslocado, eu falei: “deixa comigo, que eu resolvo tudo”, “só quero ver!”. Tanto é que hoje, o forte da loja é o aluguel. Eu fui começando a rabiscar no papelzinho, desenhar modelinho. Imaginava o modelo manda para ela, ela fazia, mandava o vestido só a carcaça e eu enfeitava o vestido. Bordava eu mesma o vestido, montava o vestido e hoje já tem vários modelos que foi eu que criei, que são lindos! No dia que vocês puderem ir na loja ver, vocês vão adorar, eu acho que você já viu alguns? Sou eu quem desenha os modelinhos no meu jeito. Não tenho o curso de desenhista, mas pretendo fazer. Hoje o forte é o aluguel. Alugamos bastante, é uma das lojas que mais aluga vestido de daminha e noivinha da Padre João. E nós temos modelos diferentes. Não é igual as outras lojas. Eu estou sempre procurando fazer modelos novos e o Senhor Mazhar está gostando.
P/1 – Hoje, a Casa da Sogra tem uma estrutura pronta para esse tipo de serviço? Ou ainda está faltando alguma coisa?
R – Falta bastante, porque o Mazhar não me deixa ir mais adiante, ele tem medo, tem que ir sempre com cuidado com ele. Ele tem medo de evolução, de crescer, ele tem medo, não sei o porquê. Sempre que eu quero mudar uma coisa é uma briga. Ele não queria colocar ternos masculinos, tem que ter por porque quando aluga já um monte de uma vez, porque a gente trabalha com festas de 15 anos, a gente aluga 15 vestidos de meninas e aluga 15 ternos para meninos, não é uma boa? Então, ele sempre tem medo de mudança, ele nunca quer sair daquilo, nunca quer. Quer ficar só naquilo, então, eu que tenho que estar empurrando ele. A loja hoje não cresceu muito, muito, porque ele não deixa, se ele deixasse, ela cresceria bastante.
P/2 – E como é que funciona esse aluguel? As pessoas vão lá retirar? Vocês entregam? Existe uma costureira de vocês? Uma parceria para fazer as roupas?
R – Nós continuamos até hoje com essa costureira, ela tem fábrica, confecciona para os atacadistas e ela nos ajuda. Ela faz para a gente até hoje todos os modelos que eu desenho. Ela faz e eu monto, ela corta a peça do jeitinho que eu desenhei, do jeitinho que eu pedi: a cor, os detalhes, ela corta, e vai para a loja o vestido sem nada, só costurado, cortado, e ali eu termino o vestido do meu jeito, eu monto o vestido, eu bordo.
P/2 – Se o cliente precisar de uma coisa, por exemplo, de uma barra ou qualquer coisa?
R – Fazemos barra, tudo, se precisar bordar, pregar um botão tudo nós fazemos manual, e os clientes gostam, procuram bastante e uma loja bem procurada.
P/1 – A senhora falou desse período de crise que teve com a fundação do shopping, teve algum outro período de dificuldade, por exemplo, quando mudou a moeda em 94? Teve outro período de dificuldade que a senhora lembra além desse, da abertura do shopping?
R – Tudo isso é um conjunto. Quando muda também a moeda, as pessoas ficam com medo de comprar, de fazer dívidas. Então, uma coisa puxa a outra. Mas eu não diria que fosse tanto por causa disso, que se as pessoas têm dinheiro, elas compram mesmo. Só precisa ter o cliente, então, eu acredito que seja mais falta de cliente mesmo.
P/1 – Quais são as suas atribuições hoje na loja? A gente viu que cresceu bastante ali dentro, agora a senhora já dá suas opiniões, administrar essa coisa do aluguel, quais são suas atribuições hoje lá na loja?
R – Acho que eu sou de mil e uma utilidades na loja! Eu faço de um tudo, eu gerencio, eu faço compras, eu atendo, tudo, tudo, qualquer decisão que tenha que tomar, eu tenho autoridade para tomar. Se tiver que fazer compra, eu faço. Se tiver que cancelar um aluguel, eu cancelo. Eu tenho autoridade para fazer quase tudo ali na loja, que eles me passam.
P/2 – Depois de todas essas transformações de produtos, e tal, como é que a loja é hoje? Como é a fachada? Como é que é por dentro?
R – Olha, a vista do que era antes, hoje eles aumentaram a loja, mas precisaria aumentar mais, tem espaço, mas ele ainda tem medo, porque não está suportando a quantidade de vestido de aluguéis, então, ela precisa aumentar mais, já tem condições de abrir uma filial, só que depende muito do meu patrão, ele tem medo, acho que de crescer.
P/1 – Você tem uma ideia onde seria aberta essa filial?
R – São Miguel.
P/1 – É onde está o comércio mais forte agora?
R – Eu sugeriria São Miguel.
P/2 – E como é que são os vestidos? Eles estão expostos para as pessoas verem? Ou existe um catálogo e ela olha e depois você pega?
R – Eles são expostos. Uma parte dos vestidos é exposta, outras ficam guardadas no estoque. Tem a revista, qualquer modelinho da revista, nós fazemos. Então, a gente atende o cliente do jeitinho que ele quiser: se ele quiser aquele modelinho, nós fazemos. Se quiser modificar uma peça, nós também modificamos. A gente deixa o cliente bem a vontade para ele se realizar também, porque a noiva quer se realizar. Então, a gente procura passar isso para eles, se quiser mudar de vestido, tem uma parte de cima do vestido que você gostou, a saia de outro, podemos modificar, sim, e a gente atende o cliente dessa forma. O atendimento que tem muito a ver com os rendimentos do comércio. Você precisa atender bem para que o cliente volte. Isso é muito importante, por isso que é bem procurada a loja por esse motivo também. Eles têm um atendimento diferenciado, eles gostam muito, voltam sempre, sempre quem aluga volta, e se eles olharem na loja e provar uma roupa, eles andam as outras lojas todinhas e retornam: “olha, voltei por causa de você, você atendeu muito bem e o vestidos são lindos e maravilhosos!”, então, não é bom você ouvi isso? Maravilhoso.
P/1 – Essa revista é uma revista que você falou é uma revista que vocês fazem? Ou o cliente traz uma revista e pede para copiar o modelo?
R – Eles trazem a revista, às vezes, já tem aquele modelo em mente já, e querem casar com aquele vestido, querer que as meninas vistam aquele vestidinho, e aí, traz e a gente também faz.
P/1 – Vocês fazem encomenda também?
R – Faz, faz para venda também, eles querem comprar, nós fazemos. Aniversários, teminhas de aniversários, cinderela, branca de neve, tudo nós fazemos, para venda e aluguel.
P/1 – E se vocês gostarem do vestido que o cliente propôs vocês colocam no mostruário de vocês? Continua oferecendo aquele vestido depois?
R – De aluguel sim, continua, aluga.
P/1 – Você falou da importância de um bom atendimento. Quantos funcionários têm hoje lá na Casa da Sogra?
R – Hoje, nós somos em quatro, então, eu tenho a minha sobrinha, duas sobrinhas que trabalham comigo. É um ambiente bem gostoso, não tem brigas, uma ajuda a outra, é bem legal.
P/1 – E como que foi o treinamento para elas serem vendedoras? Quem é que deu esse treinamento? Como é que foi?
R – O treinamento? Geralmente, no início dos funcionários lá da loja, quem dava o treinamento seria a Sueli, antes, devido ao fato de ela ser psicóloga, ela sempre gosta das coisas certinhas e falava como que queria que atendesse o cliente, no tempo que ela ficava na loja. Hoje, ela não fica mais na loja, então, eu sempre estou auxiliando as meninas como deve atender, como deve conversar com o cliente.
P/1 – Vocês fazem algum tipo de publicidade? Em jornal de bairro?
R – Não faz.
P/1 – Mas tem planos de fazer?
R – Olha, eu acho que é interessante, mas não adianta eu só achar. Meu patrão que tem que decidir, igual ao que eu te falei, ele tem medo. Eu tenho que empurrar ele. Às vezes, cansa. Eu já falei: “eu vou te deixar na mão e montar o meu próprio comércio e vou te largar”, eu tenho medo de deixá-lo. Eu tenho dó de deixar, mas se ele quisesse, poderia ir bem mais em frente.
P/2 – Você estava falando agora que a loja não faz muita publicidade eu queria saber quais são as formas de atrair os clientes, só por esse atendimento ou vocês fazem promoções? Como é que é?
R – No meu ponto de vista, eu acredito que a propaganda atrai muito. Se ele fizesse isso, nós não iríamos conseguir atender tanta gente, porque a divulgação é tudo e ele não divulga. Eu já estou tentando o primeiro passo para ele fazer: “abre um site”, para vestido de aluguel é importante ter um site. Os clientes perguntam: “vocês não tem site para eu ver os modelos”, porque a gente tem uma clientela muito forte, bastante mesmo. Acredito que se ele fizesse isso, ele ia ter que contratar mais funcionários. Acho que é o medo que ele tem, de contratar mais funcionários, de aumentar a loja, esse é o medo dele, entendeu? Às vezes, eu não posso fazer muita coisa.
P/2 – Mas vocês fazem algum tipo de promoção, por exemplo, a pessoa aluga três vestidos e tem um desconto no quarto? Como é que é?
R – Sim, no kit de 15 anos, alugando o kit das 15 meninas, ganha uma cortesia para a debutante e dos meninos ganha uma do príncipe. Se a noiva fecha o pacote também. Ela ganha cortesia ou num vestido ou então num desconto no vestido de noiva.
P/1 – Como é que as pessoas ficam sabendo da loja? É de passar em frente, porque é uma rua movimentada? Por que um fala para o outro? Como é que é?
R – A rua é movimenta, mas os nossos clientes eu acredito que a maioria não é da Penha mesmo, seriam pessoas que se deslocam de Guarulhos. Agora, no momento, nós estamos trabalhando por ter a fama da rua das noivas, e nós trabalharmos com roupas de noivas. Então, vem gente de Itaqua, do Itaim Paulista, de São Miguel, mas por curiosidade de conhecer a rua das noivas, de ver os modelos... Eles fazem uma pesquisa primeiro. Eles não vão direto na Penha e já alugam, eles vão em vários lugares, vão na Rua São Caetano, então, muito dos nossos clientes vem da São Caetano para alugar na Penha, porque é mais barato. Na São Caetano é caro. Então, tem tudo isso, mas no ramo que nós estamos hoje, no aluguel. Em termos de vendas, é igual ao que eu te falei antes, no comércio em geral, o movimento está caindo cada vez mais, mas no ramo de aluguel, os nossos clientes mais forte são Guarulhos, São Miguel, Cangaíba, ali próximo da Penha. Ali do centro mesmo são poucos, são mais de fora dos bairros vizinhos.
P/1 – Você tem várias ideias para o futuro da loja, criação do site, abertura de filial, como é que está essa negociação com o Senhor Mazhar está difícil?
R – Olha! Está difícil, eu falei no site para ele e é uma briga, ele não aceita de maneira alguma, seria uma boa para a loja, as pessoas ligam: “olha! Eu vi o telefone no site”, eu não sei, eu acho que tem alguma coisa no site que eles colocaram comércio as lojas de aluguéis, mas não é um site da loja. É um site com as lojas que alugam vestidos, então, tem muita gente que entra nesse site e que liga: “Onde você pegou esse telefone da loja?”, “No site”, vejam só? “Mas o telefone da loja?”, “Sim” e as pessoas: “posso ir aí dar uma olhada?”, “Sim, claro!” Eles vem e muitos desses alugam. Eles andam nas lojas todinhas da Penha e vai para a Casa da Sogra, por quê? Atendimento, importante o atendimento, eles falam: “eu fui em todas as lojas, fui na São Caetano, fui em São Miguel, fui aqui da Penha e não tive o atendimento que tive aqui”, e muitos, às vezes, falam: eu prefiro que a Nalva me atenda, prefiro a Sandra, depende de quem atende, entendeu? Mas é muito bom, eles gostam bastante do nosso trabalho.
P/1 – A senhora falou brincando com o Senhor Mazhar, um dia vou te deixar, essa ideia um dia pode render um fruto, abrir uma loja própria?
R – Olha! Eu já penso nessa hipótese, que como ele não quer crescer, mas eu quero! Eu não quero ficar parada ali, só ali, eu já penso em abrir meu próprio site, com os vestidos que eu mesma criei, já penso. Futuramente eu penso em fazer isso, eu estou dando a chance para ele, ele não está querendo, então, eu não posso parar no tempo, eu penso futuramente sim. Eu acho que já está na hora de eu usar a minha ideia para mim também, eu estou querendo ir junto com ele, mas ele se prende muito, ele não quer.
P/1 – E teria uma loja física também? Em que bairro você escolheria?
R – São Miguel, até talvez ali na Penha, porque em São Miguel está ficando forte no comércio em geral, agora já tem bastante loja em São Miguel de noivas, mas não tem ali aquela rua fixa. São espalhadas as lojas. Eu acredito que se surgisse isso ficaria um bairro fortíssimo. Ou São Miguel ou Penha. Penha é forte em aluguel, não para o comércio de roupa e essas coisas, mas para aluguel é.
P/1 – E esses planos de voltar a estudar seria em que área? O que é que a senhora gostaria de estudar hoje?
R – Hoje, eu penso em moda que eu quero fazer, penso em fazer um curso em relação a moda mesmo, na minha área.
P/1 – Fora o trabalho o que é que a senhora mais gosta da fazer? Qual a sua atividade de lazer?
R – Eu gosto muito de curtir meus filhos, brincar com eles. O tempo que eu tenho é para os meus filhos.
P/1 – A senhora gosta de fazer compras?
R – Gosto, eu sou compulsiva.
P/1 – O qu? E aonde?
R – Eu faço sempre na Penha mesmo eu não vou para outro bairro fazer não, já tem os lugares certinhos de comprar. Se gostar eu compro.
P/1 – O que é que a senhora gosta de comprar?
R – Tudo! Se eu gostar, eu não fico pensando deveria comprar. Eu compro mesmo, eu acho que eu tenho essa, como é que fala? Essa carência por compras, não sei se é por causa da minha infância que eu não tinha as coisas. Se eu puder comprar, eu compro, mas na medida do possível também. Eu não vou me endividar, graças a Deus. Não gosto de fazer dívida. Eu compro se eu puder. Se eu não puder pagar também, eu não compro e na loja lá eu também não posso reclamar do Senhor Mazhar. Eu faço todo esse trabalho todo por ele, mas ele me dá recompensas por isso, eu não tinha falado isso, mas vou deixar bem claro assim.
P/1 – Descreve para gente um pouco como é o seu dia-a-dia hoje, que horas a senhora chega lá na loja? Como é que é?
R – Olha! A minha vida é bem corrida, eu saio às oito horas de casa, chego às nove, dez, na loja, sempre atrasada agora, por causa do trânsito de São Miguel. Eu pego aquele trânsito de São Miguel, nunca cheguei atrasada, nunca faltei um dia de serviço, mas agora o trânsito de São Miguel está terrível. Eu , chego sempre 20 minutos atrasada, não tem jeito, mas eu saio às 18, chego em casa às oito, por causa do trânsito, e o tempo que tenho é para dedicar aos meus filhos, eu fico muito tempo longe deles.
P/1 – Tem que levar as crianças na escola?
R – Não, não tenho, tenho uma pessoa que faz isso para mim.
P/1 – A senhora hoje é casada?
R – Sou.
P/1 – Quantos filhos?
R – Três.
P/1 – A senhora gostaria que eles fossem comerciantes também?
R – Acredito que não.
P/2 – A senhora poderia contar para a gente como a senhora conheceu seu marido?
R – Então, ele é irmão dessa menina, da Zeneide, que foi para Pedra e me trouxe para São Paulo. Eu o conheci e nós namoramos pouco tempo, uns seis meses, casamos e estamos até hoje.
P/1 – Quando é que foi esse casamento?
R – Foi em 92.
P/1 – E hoje o que é que ele faz?
R – Ele é pintor de autos, um ramo totalmente diferente do meu.
P/2 – Como é que foi criar esses filhos com a loja, como é a distribuição do tempo? Você os levava para a loja?
R – Levava. Meus patrões sempre me deram liberdade. Eu poderia levar minha filhinha, tanto é que ela ficou comigo até um ano na loja. Eu a levava todos os dias. Ela ficava comigo e para eu ter mais um tempo com eles. Quando eles começaram a andar, eu vi que não estava dando mais certo de eles ficarem na loja, porque eu nem trabalhava, eu ficava preocupada de alguém poder pegar e eu distrair um pouquinho... Eu mesma que não queria que eles fossem, mas por segurança. Eu curtir bastante meus filhos no início, porque eles ficavam comigo o tempo todo. Eu cuidava deles até um ano, um ano e meio, mais ou menos, eu levava para a loja tinha o cantinho deles, tinha lugar para dormir. Meus patrões ficaram com eles, colocavam no colo, brincavam, então, foi gostosa essa época, foi muito bom.
P/1 – Que idade eles têm?
R – O mais velho tem 17, o Felipe; o Gabriel tem 11 anos, fez agora em agosto, e a Rebequinha tem oito anos.
P/1 – O mais velho já tem uma profissão? Já está encaminhando para algum tipo de profissão?
R – Ele disse que quer ser engenheiro eletrônico, não sei ainda, diz ele.
P/1 – O que é que a senhora gostaria para eles?
R – Eu deixo a vontade, porque eu acho que você não tem que escolher a profissão de um filho. Ele que tem que saber o que realmente ele quer para fazer bem feito. Não adianta eu falar que eu desejo que ele seja isso e ele depois não exercer a profissão como deveria. Tem hoje muita gente formado de médico e não tem vocação para isso, mas porque os pais queriam que eles fossem, então, o que eles acharem melhor para eles.
P/1 – Quais são as lições que a senhora tirou dessa atividade, de ser comerciante? O que é que a senhora aprendeu?
R – Eu aprendi muita coisa. Aprendi a lidar com as pessoas, que é difícil, muito difícil mesmo, cada pessoa tem um jeito de ser. Você tem que saber conversar com cada cliente, você tem que ter a palavra de conversar, de oferecer a mercadoria a cada cliente, e você vai aprendendo. Cada pessoa tem um jeito diferente e você tem que saber lidar com elas, aceitar e respeitar também. Então, você vai aprendendo tudo: a respeitar as pessoas, tudo da maneira como elas são, você aprende muita coisa no comércio. Tem pessoa chata, pessoas legais, pessoas ignorantes e você tem que ser humilde, abaixar a cabeça e não se alterar. Às vezes, você é humilhado e você tem que ser educado. Tem pessoas que fazem isso e você tem que ter um jogo de cintura e ser bem educado com eles, mostrar que as coisas não são dessa forma, então, você vai aprendendo essas coisas, é uma lição de vida.
P/1 – Fora comerciante, a senhora gostaria de ter tido alguma outra profissão?
R – Sim, meu sonho era ser psicóloga. Relacionado a área da saúde, psicóloga ou médica. Até hoje a minha letra parece letra de médico. Os clientes não entendem o que eu escrevo. Sério, eu sempre achava tão bonitinho o médico passando a receitinha, mas meu sonho mesmo era ser psicóloga.
P/1 – A senhora tem algum sonho para o futuro? O que é que a senhora deseja para o futuro?
R – Meu sonho é vou montar minha loja e vou ser uma grande empresária, com certeza.
P/1 – Fazer a faculdade e montar a loja?
R – Sim, vou fazer. Só preciso criar coragem.
P/1 – E o que é que a senhora achou de ter participar aqui dessa entrevista?
R – Foi legal, mostrar um pouco da minha vida, relembrar as coisas do passado, não é verdade? Então, foi bom.
P/1 – Tem alguma coisa que a gente não perguntou, mas você gostaria de falar?
R – Acho que vocês perguntaram tudo.
P/1 – Então, está bom a gente queria agradecer muito sua presença aqui em nome da equipe do Museu da Pessoa, muito obrigado.
R – Obrigada vocês.
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