P/1 – Bom, senhor Aldo, primeiramente, muito obrigado por ter aceitado o nosso convite pra participar do nosso projeto. Eu gostaria que a gente começasse essa entrevista com o senhor respondendo pra gente o seu nome completo, o lugar e a data do seu nascimento.
R – Aldo Minchillo, nascido em São Paulo, Capital, em quatro de Setembro de 1924.
P/1 – E qual é o nome dos seus pais?
R – Mínio Minchillo e Joana Barbie Minchillo.
P/1 – O sobrenome indica que eles são italianos né?!
R – Apenas o meu pai que veio para cá com 12 anos, a minha mãe é filha de pai e mãe italianos né?!
P/1 – E o senhor sabe um pouquinho da história da chegada do seu pai no Brasil, pra onde ele foi, de onde ele veio?
R – O meu pai é nascido no setor de Abruzzo, mais ou menos na altura de Roma, mas já é mais pro Adriático, na cidade de Campobasso. E lá é um local onde predominam as montanhas de granito, porque elas fazem a queda para o mar Adriático. Então, os residentes dessa pequena aldeia tinham como caminho na vida trabalhar com granito, tanto que as casas lá todas eram construídas em pedra, e o meu pai veio pra cá e trabalhou no ramo de granito e mármore, fez até algumas obras importantes, mas ele veio trazido por um tio que já estava aqui no Brasil mais ou menos no mesmo ramo.
P/1 – E o senhor sabe em qual região de São Paulo ele ficou, pra onde ele veio exatamente?
R – Ele veio direto aqui pra São Paulo, ficou perto do Largo do Arouche, onde moravam os tios, depois mudou para o Largo dos Pirineus, junto da Praça Marechal Deodoro, em seguida, quando teve o negócio próprio, na Mooca, na Rua Visconde de Parnaíba, nós mudamos próximo lá da oficina, era o local que eles tinham pra trabalho né?! E lá eu passei até alguns anos depois de me casar e hoje estou na Aclimação, já há 40 anos.
P/1 – O senhor mencionou que o seu pai chegou a trabalhar com granito aqui no Brasil mesmo...
R – Aqui em São Paulo principalmente.
P/1 – O senhor sabe onde ele trabalhou, como é que foi?
R – Ele trabalhava para o escritório Ramos de Azevedo e na ocasião tinha dois engenheiros que eram o doutor Severo e o doutor Villares, que a firma era Severo e Villares. Os locais que eu mais me recordo, que representaram muito mais pra mim – que eu era criança e vejo hoje – primeiro seria a Faculdade de Direito. Aquelas arcadas todas em granito trabalhado, aquelas colunas que são um verdadeiro absurdo porque entraram na oficina do meu pai pesando 13 toneladas e saíram com seis e meio, sete toneladas, pra que se fizesse o gosto de algum arquiteto. Fazendo uma peça só. É um absurdo, são seis colunas. Aquilo deu um problema sério, até de trânsito e de afundamento de esgotos (risos) no caminho da Visconde de Parnaíba até o Largo São Francisco. E hoje a gente olha para aquilo e quem sabe não dá o valor que merece (risos). Ele fez o prédio da Light que tem muito do prédio da Faculdade de Direito, fez alguma coisa da Caixa Econômica, fez muita coisa da igreja na Praça da Sé, que se prolongou por muitos e muitos anos. O granito era muito usado para túmulos, depois é que no ramo começou a entrar o granito serrado, que faz piso, e esse trabalho manual acabou, desapareceu. Ele fez a Bolsa de Mercadorias, uma série de prédios que estão aí para a minha lembrança.
P/1 – E o senhor mencionou que depois ele abriu um comércio na Mooca, qual que era o negócio?
R – Não, ele tinha a oficina dele na Mooca. Quem trabalha com granito o ramo é cantaria, é um nome especial pra isso. E eles então tinham um terreno muito grande, com galpões onde recebiam os granitos e os empregados faziam o trabalho, recebia, produzia artesanalmente ou lustrava, uma série de coisas e depois levavam e montavam, essa era a função da firma, é uma coisa que praticamente hoje desapareceu nesses termos. Existem serrarias que serram mármore e hoje existe tanto piso que imita o mármore, imita o granito, então, eu ainda perdôo as pias né (risos), pias de granito.
P/1 – Nessa época em São Paulo, esses trabalhadores da construção civil, muitos deles eram italianos que tinham as habilidades técnicas para realizar esse trabalho. O seu pai também tinha vários colegas italianos que realizavam esse trabalho, trabalhavam com ele?
R – Sim, eles costumavam até se reunir porque eram os conhecidos da cidadinha porque como a cidade era pequena todos eles se conheciam, os caras vinham chegando. Então, se houvesse um casamento todos os que eles chamavam de patrícios, iam participar da festa. Então, ele tinha muitos amigos que também tinham o mesmo ramo, eram concorrentes leais entre eles (risos).
P/1 – E esses concorrentes também ficavam ali no bairro da Mooca ou ficam espalhados pela cidade?
R – Olha , pra dizer a verdade o que eu me recordo (risos), tinha oficina na Rua 7 de Abril, era no centro de São Paulo, tinha oficina na Avenida do Estado, tinham oficinas na Mooca, assim, de memória, eu tinha pouco idade naquela ocasião né, eu me recordo de alguma coisa mas não tudo.
P/1 – E do bairro da Mooca, o que o senhor se lembra? Daquela paisagem, como é que era?
R – Eu, quando passei pra lá tinha três anos de idade. Eu me recordo até dos três anos de idade, não sei como, a casa onde eu morava. A rua onde eu fui morar, como todas as outras daquela redondeza, eram de terra e os veículos, principalmente os cavalos não podiam chegar na calçada, porque os dormentes de solda dos trens eram a marcação das calçadas para que as pessoas pudessem andar na calçada e não fossem atingidas pelo trem. E era um sistema completamente diferente, o abastecimento, por exemplo. O leite vinha, primeiramente tinham os homens com cabras, com aquela quantidade de cabras pra vender um leite especial de cabra e o leite de vaca era já de empresas grandes, acredito até que pela Vigor já naquela ocasião. E eles tinham carros tanques, não grandes mas carros e esses carros não eram frigorificados mas acho que eles vinham com o produto mais ou menos refrescado ainda, paravam em uma esquina, tocavam alguma coisa que chamava a atenção, as senhoras saiam de casa com uma leiteira ou com uma panela e lá eles tinham uma torneira. Meia volta era meio litro, a volta inteira era um litro, pagava e levava o leite pra casa (risos). Então, por aí vocês vêem o que era o comércio, o que eram as ruas em 1927, 1928. Eu peguei a revolução de 1930, peguei a revolução de 1932. E nós estávamos perto do que hoje se chama Imigração, aliás, Museu do Imigrante, que era a Imigração que recebia os trens que vinham de Santos. Lá eram só os de Santos, os do Rio não passavam lá, passavam na Mooca. E os que vinham na condição de imigrante desciam, recebiam o cadastramento e eram encaminhados para as fazendas. Infelizmente, muitos naquela ocasião, que a gente ficou até conhecendo, vieram ludibriados pelos próprios italianos que prometiam que aqui tinha dinheiro até no meio da rua. E eles foram substituir, em muitos casos, os escravos nas fazendas do interior, porque a habilidade deles era a terra, não era o caso do meu pai. Então, os italianos foram pra lá, depois veio uma leva de italianos diferentes que começaram a montar aqui as indústrias, as grandes indústrias que até hoje é o nome de São Paulo. Se bem que São Paulo... Eu estou misturando um pouco a história, não sei se isso é curioso ou não, mas mais ou menos em 1922, 1924, São Paulo tinha mais estrangeiros do que brasileiros. Os primeiros em número eram os italianos e curiosamente o segundos era os alemães, não sei pra onde foram, devem ter ido todos para o sul, provavelmente Santa Catarina, Rio Grande do Sul. Além de outras nacionalidades que, já na ocasião, representavam... Mas o italiano representou aqui por muito tempo a maioria, e o italiano ficou por muito tempo em alguns setores, em alguns bairros. O próprio Bom Retiro, foi um bairro de italianos tanto que tem lá a Rua dos Italianos e curiosamente o Corinthians Paulista foi fundado no Bom Retiro (risos), no meio dos italianos. A rixa de italiano com corintiano, do Palestra Itália, eu acho que ainda vem desse tempo.
P/1 – E esse período na Mooca durou quanto tempo, que o seu pai teve oficina ali?
R – É, agora eu precisaria pensar um pouquinho mas eu acho que ele teve até 1950 mais ou menos, ele teve a oficina. Eu casei em 1952, fiquei ainda uns três ou quatro anos, só depois que eu fui para o bairro Aclimação, onde eu estou até hoje.
P/1 – Então, a sua juventude, infância, adolescência toda foi no bairro da Mooca né?
R – É, foi.
P/1 – E como é que eram as brincadeiras ali, tinha muitas crianças também, como é que era o período da infância?
R – É o que não existe hoje né?! O meu pai tinha um terreno muito grande pra abrigar tudo aqui, então, os meus primos, amigos, depois da escola o lugar do nosso recreio era na oficina do meu pai. Depois das quatro, cinco horas da tarde, então, futebol lá, dava por dois ou três campos de futebol. Soltar balão ou pegar balão, empinar quadrado, hoje é pipa, antigamente era quadrado e assim por diante. Então, eu passei por uma infância muito alegre, muito saudável até, nesses lugares todos. Porque lá era muito aberto né?! E tinha já nessa ocasião outras atividades esportivas, nos casos dos clubes, mesmo de futebol de várzea, lá em volta né, era muito comum os clubes terem uma sede noturna. Por exemplo, a pessoa ia lá pra jogar ping-pong, hoje é tênis de mesa, mas era o ping-pong que se jogava naquela ocasião. E os jogos de futebol lá aos domingos, isso sempre teve né?! Ah, tinha espaços, na Mooca tinham muitas chácaras, então, os legumes eram comprados diretamente nas chácaras, mas o comércio já era mais ou menos desenvolvido. Tinha uma série de indústrias boas naquela ocasião, indústrias grandes, então, daquela ocasião... Na Mooca mesmo, pode pegar o Crespi, que está até hoje né, a estrutura, o Matarazzo em tantos lugares né, no Brás, na Rua Joli...
P/1 – Na Água Branca também, tinha a Antártica também né?!
R –... defronte a Antártica porque uma coisa é o Parque Antártica que é onde está o Palmeiras, que era da Companhia Antártica, que era um jardim onde o pessoal ali ia fazer um happy hour pra tomar cerveja vai (risos). E defronte tinha o Curtume Franco Brasileiro que não tem nada com isso, foi um dos primeiros curtumes daqui e aquela parte toda de indústria do Matarazzo, e hoje, como recordação está sobrando...
P/1 – As chaminés.
R –... Uma ou duas chaminés que obrigaram a ficar lá como recordação. O Matarazzo tinha em muitos outros lugares, no interior, e muitas indústrias de tecido. Tinha o Gamba, as primeiras fábricas de chocolate, o Chocolate Falchi também era de italianos, esses eram perto da estação da Luz. É, os italianos acho que se espalharam muito aqui, fizeram de tudo né?!
P/1 – Uma curiosidade, o senhor ouvia muito italiano nas ruas, nessa época lá na Mooca? O que se ouvia mais português ou italiano ali pelas ruas do bairro?
R – Português era muito pouco, porque português tinha pouco, os portugueses foram mais pro Rio de Janeiro, pra Santos, um pouco, e eu acho que música italiana... Houveram fases um pouco curiosas né?! Quando houve a guerra, a guerra de 1940;1938,1939,1940, 1941,1942, o Getúlio Vargas era um pouco favorável a dois ditadores naquela ocasião que eram o Hitler e ao Mussolini. Isso não é muito claro, mas ele tinha uma preferência, tanto que aqui em São Paulo se criou um movimento mais ou menos igual ao movimento da Itália, que era o Plínio Salgado que foi o mentor desse trabalho todo...
P/1 – Integralista?
R – ... Eram os integralistas que tinham um sinal diferente, da esvástica. A esvástica são dois “Es” e eles tinham um E. Mas, durante a guerra, o que acontece aqui é que os Estados Unidos estava muito bem ligado ao Brasil, e tinha muito interesse no Brasil. Tanto que discutiu por muito tempo a possibilidade de ter uma base área em Natal, que tem até hoje né, eles conseguiram naquela ocasião. Então, começou uma ligação maior do governo brasileiro, principalmente do Getúlio, em interesses econômicos. Foram levando e aconteceu, detalhe, de ser proibido a movimentação dos italianos e dos alemães, principalmente dos alemães. Tanto que naquela ocasião houve um confisco de bens de todos os italianos, o dinheiro que eles tinham. Porque o normal era ter uma caderneta na Caixa Econômica (risos), que é a base que ficou. Eles assumiram todo esse dinheiro e as propriedades não podiam ser vendidas, tanto que o próprio terreno do meu pai, um pouco por desgosto que ele também parou de trabalhar, não podia mexer mais, nem no terreno dele ele podia vender. E com isso, os italianos e os alemães foram proibidos de uma porção de coisas. Era proibido rádio com ondas longas que pegassem a Itália e a Alemanha. Alemanha eu nem sei, porque não tinha relação...
P/1 – E Japão também né?!
R – Ah, isso já foi na outra guerra né?! Ah, não, na mesma guerra, desculpe!
P/1 – Na mesma guerra.
R – Mas quanto aos italianos houve, e sabe, aquela história de “Quinta Coluna”, que levavam notícias ou tragédias. Eu não sei, eu nunca vi isso na minha família, porque como eu contei a você, o meu pai veio com 12 anos e nunca desejou voltar para Itália, não era fanático. Então, em casa não se praticava. Lógico que ele gostava de ter as notícias também da terra dele né, mas era muito difícil, não era fácil não. Os rádios mesmo, se for contar a história de rádio (risos). Os primeiros radinhos, radinhos de galena que tinha que por no ouvido, no tempo do meu pai, pra conseguir ouvir a Europa, tinha bobinas só que tinha que tirar todas as bobinas do Brasil pra pôr as bobinas da Europa. Você abria a tampa pra tirar peças e pôr outras pra poder ouvir a Europa, muito mal né (risos)?! Ó, vocês estão me obrigando a falar coisa de... (risos)
P/1 – É história né?!
R – É história, realmente.
P/1 – O senhor mencionou rapidinho sobre o comércio ali da Mooca, que o pessoal passava com as cabras tirando leite. Eu gostaria que o senhor falasse pra gente qual que era a principal rua de comércio ali. Quando tinha que comprar alguma coisa, onde é que vocês iam? Se é que tinha algum lugar assim por ali.
R – Bom, supermercado não existia, porque supermercado é uma criação do tempo do Delfim Netto. No tempo do governo... Acho que foi do Médici. Que deu capital para os supermercados todos começarem a entrar e a entrada dos supermercados acabou com todos ou praticamente todos os pequenos comerciantes. Que eram as vendas, que a gente chamava de venda porque vendia todos os mantimentos. As quitandas que vendiam os legumes, as leiterias que vendiam o leite, o pão e assim por diante. Então, elas todas foram se recolhendo, e eram exercidas ou por italianos... Principalmente por portugueses, nesse caso, sim, mas o comércio foi se dilapidando né. Tinha bons açougues, tinha, além de indústrias né. Eu estou falando da parte de consumo, mas eu acho que é isso porque mesmo na Mooca tinha fábricas, de chocolate. Por exemplo, Chocolates Gardano, que era famoso naquela ocasião. Estava na Rua Ipanema, que era a rua onde eu morei e tinha na Rua Visconde de Parnaíba outras indústrias grandes de açúcar, de refinaria de açúcar. A Ciclope, que fabricava caldeiras. Então, a indústria não era tão insípida assim, já tinha alguma coisa. O comércio realmente teve essa dificuldade, depois a entrada dos supermercados. Houve uma tentativa dos mini mercados se organizarem. Tanto é que na Federação do Comércio eu cheguei a ter companheiros, e até hoje ele está lá, não está mais nesse ramo. Ele era presidentes dos mini mercados e eles se cotizavam, eles tinham um sistema de compra através de agrupamento. É uma cooperativa, e compravam, por exemplo, um contêiner de determinada mercadoria pra poder enfrentar a concorrência dos grandes mas isso é impossível né?! Hoje, com essa força que tem os supermercados... Mas ela foi criada por vontade governamental porque achavam que era um comércio mais moderno, mas isso não se discute né?! Mas cada ramo, eu acho, teve modificações grandes né. Se eu for falar do meu ramo, que é o ramo de couros e peles... O ramo começou de uma forma em São Paulo, tendo alguma força, porque eram atacadistas que revendiam a mercadoria. Recebiam mercadoria do norte, do nordeste, principalmente do sul. Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná e do interior de São Paulo. E eram os intermediários, quer dizer, nós éramos os atacadistas, intermediários pra fornecer a quem. No meu ramo, aos pequenos fabricantes de calçados, aos consertadores de calçados, alguém que fazia artefatos, alguma mala. E isso foi tendo, vamos dizer, dificuldades. Nós tínhamos o comércio do ramo de couros estabelecido aqui na capital, principalmente em dois ou três setores. No Brás tinha os primeiros revendedores que eram mais de origem italiana, tinha Defell, Andreoli, De Marco, De Marco e Contrucci. Aliás De Marco foi o primeiro presidente do Sindicato Atacadista de Couros e Peles em São Paulo, e tinha esse grupo. O outro grupo estava no Anhangabaú, porque os pontos de ônibus eram ou no Anhangabaú ou na Praça da Sé. Tinham outros do lado do Mercado, da Rua Antônio Paes, ali em volta do Mercado. Tinham alguns bons atacadistas mas o ramo foi se modificando, eu estou falando do meu ramo. Os curtumes começaram a se instalar em São Paulo porque, como São Paulo era um polo muito importante, eles preferiram ter aqui um depósito ou um representante, se eles tinham um depósito da própria mercadoria que nós revendedores trabalhávamos. Com isso, eles nos expulsaram do comércio no ato. A gente tinha que procurar um outro que não tinha representação. E enfim, foi nos desclassificando um pouco, fomos perdendo a força. Então, eu estava dizendo dos locais, e depois que o jogo foi se degringolando mais ainda... E só fomos atendendo industriais menores, foram sendo abertas lojas menores, por exemplo, do lado da Vila Mariana, do lado do Jabaquara, do lado da Avenida Santo Amaro e em Santo Amaro, do lado de Santana e Tucuruvi, do lado da Lapa, do lado de Pinheiros. Então, já foi abrindo um pouco, os grandes foram fechando no centro, abrindo menores. No meu caso, por exemplo, pra que eu pudesse ter condições de comerciar, eu tive uma evolução. Quando começou a ficar ruim o atacado aqui em São Paulo, nós passamos a fazer muito no interior, porque no interior ainda tinha pequenas fábricas de sandálias, no caso de Limeira. Tinha Birigui, que só fazia calçados de criança, já tinha Franca que fabricava calçado pra homem. Então, nós fomos procurando estes, mas tinha também um grupo muito forte de seleiros. Porque o forte no interior sempre foi a selaria que atendia as fazendas e eram um serviço diferente. Eles trabalhavam o ano inteiro vendendo para o dono da fazenda e só recebia quando tinha colheita, uma vez por ano ia lá pra acertar as contas (risos). Então, era um comércio completamente diferente no nosso ramo, mas as coisas foram indo. Nós tivemos que abrir filiais pra poder atender pequenos consertadores, então, nós chegamos a ter no meu negócio seis lojas. Tive loja na Avenida Santo Amaro, na Voluntários da Pátria, na Praça Marechal Deodoro, na Praça da Liberdade, no Belém que eram pontos intermediários mas até isso foi acabando porque se alguém abriu mais adiante, depois, também segurou e não tinha pra todo mundo. Então, nós também fomos diminuindo o número de lojas porque não tinha condições e começamos a colocar peruas na rua pra vender diretamente para o consertador de calçados, foi uma moda que foi inventada em São Paulo, peruas para levar mercadorias, perua, Kombi né?! Lá tinha outros comerciantes que também fizeram a mesma coisa, que também foi se exaurindo. Porque hoje, vou fazer uma pergunta pra senhora: “A senhora conserta o calçado?”- porque você nem conserta né (risos)?! Não conserta mais porque mudou a moda, a senhora ao invés de ter três ou quatro pares de sapato, como era antigamente, a senhora tem 20, 30 que encosta por causa da moda, então, não chega nem a gastar. Nem o saltinho a senhora não gasta né?! E ele que é homem, ele tem um outro problema, ele está andando de tênis. A senhora não faz idéia do que isso fez pra desarticular o ramo do couro e não é só essa questão. O automóvel, o automóvel foi o maior inimigo do calçado, porque se eu andando de automóvel o dia inteiro, então, eu não ando mais, então eu não gasto calçado. Esse sapato aqui eu não tenho meia sola, nem nunca vou pôr. Então, são situações curiosas né?! Também o couro tem uma história curiosa. Se hoje estivéssemos no auge, fazendo as malas que se faziam, as malas de viagem ou a pasta, tudo de couro como se fazia, os sapatos, nós não teríamos nem 10% do couro para poder atender isso. Então entrou o sintético, o tal de courvin, e outros sintéticos que levaram o mercado a se alterar e inclusive borracha. Nós tivemos a entrada da sandália Havaiana há muitos anos atrás, não é isso que se vê hoje, esse comércio até do Brasil vendendo e exportando para a Europa e com sucesso. No começo da sandália Havaianas não tinha nada disso, era a São Paulo Alpargatas, não tinha nada disso. Hoje é a coitada da São Paulo Alpargatas, é uma faculdade né (risos) e assim por diante. Então, o ramo foi se alterando completamente, não tem mais condições. E tem coisas até curiosas, se você pegar, por exemplo, há 50 anos atrás ou 40 anos atrás, isso eu posso dizer com certeza, o sapato só se vendia se o sapato tivesse uma sola de couro, a sola sintética que os americanos trouxeram pra cá, principalmente a companhia Clarck naquela ocasião, não tinham aceitação, pra exportar o sapato menos ainda, a Europa não queria saber do sintético. Na verdade, hoje eles mesmo trabalham muito mais com o sintético do que com a sola por duas razões: aprenderam que o sintético na hora da neve não molha o teu pé é muito mais apropriado, a sola sofreu um processo, pra se fazer uma sola pegava-se o couro do boi, tinha que tirar o pêlo, aquela tramitação toda durava mais de 20 dias, até pintar e sair pro comércio, então, a sola tinha uma resistência, hoje a sola se faz em 24 horas, é um produto químico ou dois que você põe lá dentro. E quando você tira, matou 70 % das fibras, porque praticamente curtiu o couro com muito mais rapidez e o que acontece? Hoje, não sei se é o seu caso, não dá pra perceber, se tiver um sapato de sola e se você pegar uma chuvinha, você põe o pé no úmido o seu pé vai ficar molhado. Essa falta de propriedade não existia antigamente, o bom era quando não molhasse o pé e hoje molha, parece que aspira a água né?! Então, o ramo foi se mudando completamente, os ramos que há desaparecem por causa do uso, acho que tem outros que poderíamos falar, de alfaiate, de marceneiros e uma série de outros né, ternos, roupa mas na verdade eu acho que o que vale é o progresso, esse é o verdadeiro, é o progresso. Ah, houve uma outra interferência muito séria, na hora da entrada dos produtos sintéticos. Não é que permitiu, aconteceu, a entrada dos comerciantes asiáticos no ramo, então, hoje todos os estofados, sofá de couro não tinha boi que cheirasse né, tem ainda mas é muito caro. Então, eles entraram nesse mercado novo de courvin, de borrachas, de mantas, uma série de produtos que se permitiam a entrada deles, depois disso permitiu a vinda de material importado por eles a um preço três vezes mais barato do que o de São Paulo, vem naquelas condições que a gente sabe, que não permite, vou ser mais comercial, você larga, eu tive produtos, produtos simples, um zíper criado pra bolsas, só pra dar um exemplo, era de uma firma internacional que vendia em São Paulo, vendia no mundo todo e eu vendia, por exemplo, um zíper de 80 centavos o metro vendia-se por um real, no máximo um e dez, quando muito, o mesmo zíper trazido por um oriental, no sábado de tarde quando não havia fiscalização para os contêineres serem descarregados, ele vendia por 33 centavos, eu cheguei a comprar dessas pessoas e largar dessa firma, curiosamente, essa firma era a mesma marca daqueles que eles importavam lá, a mesma firma brasileira, que eu não vou citar o nome, era a mesma de quem eles tinham na China, eu cheguei a conversar e eles:”Ah, o mundo é assim, não tem jeito, eles lá tem uma mão de obra mais barata sabe?! Tem também tem o problema do não pagamento de imposto.”. Então, isso criou uma situação muito difícil no mercado, tem outros ramos também né, quem sabe? Mas no meu ramo foi mais uma razão preponderante para essas modificações, além da moda né?!
P/1 – Só pra entender como é que o senhor se encaminhou pra essa indústria do couro, do comércio do couro? Eu gostaria que o senhor falasse um pouquinho de quando o senhor começou a pensar em uma atividade profissional, pelo menos no período da escola, como é que era, o que o senhor pensava nesse período?
R – Eu fui mais ou menos levado porque no início da firma também era junto com um tio meu que já tinha uma certa ligação no ramo mas não bem assim, isso foi na Rua Carneiro Leão, no Brás, foi o primeiro emprego que eu tive em 1941, eu formei-me em 1942 e fui pra lá pra ser contador da firma e eventualmente também ajudar nas vendas.
P/1 – Essa era uma firma de?
R – A mesma firma.
P/1 – De couro?
R – De couro. Era uma firma individual do meu tio, depois ela foi evoluindo, eu entrei de sócio alguns anos depois, eu fiquei sócio com o dinheiro que o meu pai me ajudou e nós transformamos a firma e ultimamente tinha o nome de Casa de Couro São Crispim, nós mudamos da Carneiro Leão para o 1.010 da Rangel Pestana, fomos crescendo então, mudamos de fronte para o 1.051 e tivemos uma infelicidade de ter um vizinho imprudente e nós sofremos um incêndio porque iniciou-se nesse vizinho o incêndio que destruiu a nossa casa, fiquei sem casa comercial em 1953, 1954 e já tinha algumas filiais, o que acontece é que nós tínhamos seguro, isso é bom que as pessoas entendam um pouco, não era o seguro atual, o seguro era feito pelo valor da compra, então, se queimasse uma determinada peça precisava justificar com a nota da compra, isso se não queimasse a contabilidade né, o preço que eu tinha comprado porque eles já punham o preço mas se você tivesse uma mercadoria com mais de um ano em casa, o que não seria impossível, estoque, ela estava valendo a metade do valor porque a gente estava em uma época de inflação, então, possivelmente...
TROCA DE FITA
P/1 – Então, senhor Aldo, o senhor estava falando pra gente desse comecinho do seu negócio com o seu tio, que vocês saíram da Carneiro Leão para a Rangel Pestana.
R – É no 1.010, depois 1.051, depois 1.067 que era junto das Porteiras do Brás, eu assisti a extinção da Porteira do Brás e a construção do viaduto que hoje chega no Largo da Concórdia e o viaduto era na rua Paralela a Rua do Gasômetro. A história da Porteira do Brás é muito famosa porque parava todo o trânsito né. Era uma coisa quase que inaceitável, e o movimento era justamente dos trens que saiam da estação da Luz para descerem pra Santos. Não tinha a ver com os trens do Rio, que saíam do Largo da Concórdia fazendo uma volta e descendo por um caminho completamente diferente. Parava na Rua da Mooca, na Rua Visconde de Parnaíba, dificultava mas não era o principal, o principal era esse caminho que interditava muita coisa que foi solicitado por muitos anos. Tanto que houve uma festa na hora da demolição. São Paulo era muito diferente.
P/1 – Como é que se chegava no Brás naquela época, sem o viaduto, pelo menos o resto da cidade?
R – Bom quem vinha da Penha?
P/1 – Da Penha ou do centro né?!
R – Da Penha, vamos dizer ou conseguia entrar pela Rua do Gasômetro que não era fácil porque a Rua do Gasômetro não nascia ali né, no Largo da Concórdia ele tinha que desviar pra pegar a Rua do Gasômetro ou então, vir do lado Rua Oriente pra dar uma volta e entrar por lá mas a maioria vinha pelo Belém, pela Penha, pela Celso Garcia, que era o caminho, da Rangel Pestana, Celso Garcia e ia até a Ladeira da Penha, era uma reta né que se chamava, até a igreja da Penha, ficava sujeito a interrupção do trem, muitas vezes fechava duas, três vezes era um semáforo demorado vai mas aquele foi o atraso de vida na questão do trânsito mas existiam outros casos, existia na Barra Funda, em outros lugares também tinham o mesmo problema.
P/1 – E pro comércio o que significou a instalação do viaduto, a facilitar o acesso?
R – O comércio teve até um certo progresso quando tinha maior movimento. Mas o Brás já estava se desenvolvendo, porque na Rua do Gasômetro se anexou o mercado – que não tem nada com o ramo de couro – que é o mercado de madeira, todas as madeireiras foram para a rua do Gasômetro. Então, lá se juntaram dois ou três mercados interessantes e que levaram pra lá muito movimento, foram um ponto de referência. O Brás, quer queira, quer não queira, sempre foi um ponto de referência, e os anos vão passando e as coisas vão se complicando. Hoje, se for verificar o tipo de comércio que está lá, é completamente diferente mas... Até as diversões, lá mesmo. O Brás foi lugar de cinemas, cinemas que tinham uma dimensão que não era comum, Cine Piratininga foi um dos maiores cinemas, a Sinfônica de São Paulo todo domingo de manhã dava um concerto gratuito pro pessoal, na esquina quase que da Rua Piratininga. O Cine Universo foi o primeiro que construiu uma cúpula para abrir à noite, abria e se via o céu. O Cine Universo é quase na esquina da Rua Bresser onde já é Celso Garcia, ao lado da antiga casa Pirani que também desapareceu. O Cine Roxy, que estava do lado esquerdo, que hoje é a maior Igreja Universal, né, que está lá. Antes tinha o Brás Politeama, tinha o Mafalda, na Rua do Gasômetro tinha outros. É que a diversão estava concentrada nesses lugares né?! É curioso, mas o bairro tinha até alguns restaurantes. Bom o Brás foi famoso. Eu estava no 1.010, vocês devem ter ouvido falar na cantina do 1.060, né. Era um lugar que o pessoal ia, principalmente os italianos, a cantina ficou popular, não ficou mais só pra italiano. E depois foram pro Bexiga, como vocês falaram. Muito disso. A comida toda foi pra lá, hoje tem em todo lugar. Hoje você vê que até nos bairros melhores você tem, a alimentação progrediu muito aqui, muito mesmo.
P/1 – O que o senhor gostava de freqüentar? Cinema, restaurante, qual era o seu programa ali pelo Brás?
R – Bom, se eu falar no meu tempo de solteiro, de moço, além disso né... (risos)?! Existia o que chamavam de footing, nas avenidas os moços e as moças faziam footing. Então, por exemplo, se juntavam duas ou três moças e vinham de braço, vinham de lá pra cá e os moços de daqui pra lá. Havia um encontro às vezes, um esbarrão, era isso. Vamos lá pra fazer um footing, às vezes parava pra conversar e ás vezes tinha até amigos importantes que faziam, isso era natural, de fazer o footing. O cinema era sempre depois de você já ter alguma outra coisa. Pegava e juntava uma porção de amigos e iam pro cinema. Mesmo os da cidade que vieram depois, nós íamos. Os mais moços também, nós íamos. Mas tinha alguns que tinham restrição. Por exemplo, o Cine Ipiranga você não entrava se não estivesse de terno e gravata, você tinha que ter a gravata, tinha gente que alugava gravata pra você entrar né?! Isso aconteceu no ramo de chapéus (risos). Eu digo chapéu porque eu tinha aqui na Companhia Prada, que era em Limeira, tinha chapéu mas também trabalhava com couro. Porque o que se chama carneira, a carneira do chapéu... Sabe o que é a carneira do chapéu? É aquele courinho que ia dentro chapéu que era pra segurar um pouco da transpiração, era feito de couro de carneiro, então, essas fábricas de chapéu tinham ligação com o ramo de couro porque compravam a carneira. Eu estou dizendo isso porque na Prada, no Ramenzoni, os vendedores só entravam se tivesse chapéu, ao lado tinha um barbeiro, aqui no Ramenzoni (risos) que ele alugava chapéu. A pessoa ia lá, entrava com o chapéu na mão pra dizer que tinha chapéu, depois voltava e devolvia. Então, veja que preocupação diferente no comércio e na indústria. Se você falar isso hoje, que pra eu entrar em um lugar eu tenho que levar o chapéu que o homem fabrica... Mas isso era natural, não era estranho não. Bom, nós estávamos dizendo, o cinema era uma diversão, mas o baile era uma grande diversão também, o baile não é que hoje está ai. Existiam clubes, clubes de bailes de bairro, que tinham um baile bem frequentado. As pessoas eram bem disciplinadas, não existiam bailes sem a entrada das moças, vocês eram muito requisitadas naquela ocasião né (risos)?! Se eu chegasse em um baile e quisesse entrar sozinho, eu não entrava, precisava ter uma companhia feminina para que tivesse companhia suficiente lá dentro, para que não tivesse só homem, só mulher. E era muito comum você abordar uma moça que vinha em duas ou três: “Dá licença...” e acabava entrando com a moça (risos). Mas não deixava de ser uma exigência né, e nós tivemos lugares em São Paulo famosíssimos. Eu vou citar um só porque tem a ver com a história de São Paulo, é o Trianon. O Trianon é onde hoje está o MASP, era um salão de baile. Eu, quando me formei, a minha formatura foi no salão do Trianon. Depois derrubaram aquilo, porque já naquela ocasião era um... Trianon é uma expressão de um local de visão, já tinha visão para o centro da cidade. Aí fizeram o MASP e deixaram aquele, mas o Trianon mesmo desapareceu. Tinha outros, salão, da Associação Comercial, que era na Líbero Badaró. Tinha no Anhangabaú, tinha ao lado do Hotel Esplanada, tinha uma porção de lugares. Da CMTC. Então tinha bailes no sábado, durante a semana, tinham bailes à noite. Esses já eram de um outro estilo, mas o domingo de matinê era muito comum o baile, até em clubes. Em clubes tradicionais, como o Esperia, tinha clube todo domingo a tarde.
P/1 – Eu queria pontuar um pouco do comércio ali no bairro então. Nessa época o bairro já tinha esse perfil de comércio de atacadista ou era diferente, se era diferente quando é que começou, o senhor consegue rememorar essa história pra gente?
R – No meu ramo?
P/1 – Do Brás, é do seu ramo e do comércio em geral.
R – Do ramo em geral? Ah, é difícil situar uma data, cada um eu acho que tem um perfil aí de começo. Mas eu acho que a partir de 1960 já começou um movimento nesse sentido, uma transformação já nesse sentido. Porque era muito comum você ter lojas de ferragens, por exemplo. Hoje, onde é que você encontra loja de ferragens? Você encontra em um bairro perto de casa, mas no centro que era distribuidor, entretanto, tem ainda loja de ferragens, gente filiada a Federação do Comércio. Mas são estilos diferentes porque você comprava também de casas como se fossem atacadistas, de material de construção. Hoje, você conhece, eu não vou citar nomes, mas se você pegar a Radial Leste você vai ver duas, três grandes firmas que tem em tanto outros lugares e tantos outros bairros. Que tem firmas muito grandes, que não tinham na ocasião, a ferragem não tinha esse desenvolvimento, material de construção não tinha esse desenvolvimento, também São Paulo deu condições com tanta construção, são variações né?!
P/1 – E no seu ramo, como é que foi?
R – Ah, o meu ramo foi se exaurindo, como eu expliquei, os mais antigos foram ficando velhos, alguns filhos continuaram, outros não quiseram continuar porque já não era rentável e foram se afastando e o ramo obrigou mesmo o afastamento porque já não tinha mercado, a pessoa tinha que fazer malabarismo pra continuar vivendo, estavam fadados a… a mesma que o senhor dizer: “O senhor conhece alguma casa de casimira hoje, que venda casimira pra fazer um terno?”, entretanto naquela ocasião tinha grandes casas de casimira, R. Monteiro, Saraiva, ali no centro da cidade, eram firmas que vendiam corte porque a gente comprava um corte e levava no alfaiate, a mesma coisa, não deve ter alfaiate hoje, eu conto assim nos dedos os que têm, como é que desapareceu? Por causa também da forma de se fazer um terno, o terno não tem a mesma estrutura e a mesma, vou dizer, a mesma durabilidade, não deram uma entretela, não tem um troço, aqui é tudo feito a mão hoje vai na máquina né, não é pior, é mais comum, é mais popular mas tem a grife, você compra um terno nessas condições com um nome pomposo que custa um bom dinheiro né?! Esse, então, não desapareceu, desapareceu o alfaiate e o vendedor da casimira mas o da confecção melhorou, a indústria de confecção melhorou muito, não tem nada com o nosso comércio né?!
P/1 – Eu queria que o senhor falasse um pouquinho agora, o senhor foi crescendo dentro do comércio que era do seu tio e que depois você virou sócio, então, quais funções o senhor foi agregando ali, com o que o senhor chegou a trabalhar? Eu queria que o senhor comentasse sobre isso, sobre ser responsável pelo setor administrativo, setor pessoal ou tudo ao mesmo tempo, como é que era?
R – Bom, principalmente o sistema comercial, só grandes instituições hoje é que tem essa divisão, no tempo era você mesmo administrar, você mesmo vender por causa da substituição, por quê? Em uma determinada hora eu ia para trás do balcão também pra vender e houve época em que eu viajei pro interior pra vender, como viajante e época em que eu ia pros fabricantes para vender e depois entregar, a venda era o principal mas a administração da casa tinha que ficar na mão de alguém, se eu tinha 20, 20 e poucos funcionários sempre tinha algum problema trabalhista mas era muito comum você se utilizar de escritórios de contabilidade pra executar, o trabalho da contabilidade, não tinha, eu cheguei a ter contadores sozinho mas depois de um tempo não ficou mais econômico, era mais fácil você ter um escritório que fizesse a sua contabilidade, entendeu? Então, isso tudo foi se modificando também mas isso ao longo de tantos anos, a gente fica lembrando uma época e não aconteceu assim, a coisa foi indo e cada um foi procurando o que era melhor pra si e hoje o comércio é isso, é uma busca constante de uma melhor situação, disso não tenha dúvida!
P/1 – E o senhor se lembra de preferir alguma função, de gostar mais de alguma parte do que de outra ou se especializar mais em alguma coisa?
R – Não, eu fiz todas porque veja, se eu me formei contador, a contabilidade e a administração eram do meu ramo, a venda é uma coisa natural e quase que, eu não digo inata mas que você tem que ter condições boas senão também não vai pra frente. Viajar era uma coisa meio desagradável porque você tem que deixar, eu ainda viajei no tempo de solteiro mas muita gente era no tempo de, já tem a família constituída, tem que viajar, voltar mas hoje também isso tudo desapareceu também porque as primeiras viagens eu ouvi de pessoas estrangeiras que vieram pra cá, era feito no lombo de cavalo, a venda no interior, subia em um cavalo pra ir vender as coisas, não era o mascate né, às vezes nem no lombo do cavalo, no ombro dele mesmo.
P/1 – O senhor se lembra de alguma viagem especial que tenha te marcado?
R – Viagem que eu fiz ou pra negócio?
P/1 – É de negócios que tenha sido especial.
R – Não porque as viagens que eu fazia eram aqui dentro de São Paulo, por exemplo, quando fazia, eu fazia a Paulista inteira ou a Mogiana ou São Paulo – Minas, era o tempo do trem, isso é outra coisa que pra mim me deixou saudade, a falta do trem que eu acho uma coisa que não devia ter acontecido da forma que aconteceu, eu acho que devia ter continuado e melhorado e hoje estão tentando reativar, com toda a razão mas era uma coisa, o trem era uma coisa muito interessante mas também o número de habitantes era muito menor, agora é mais fácil disso tudo acontecer né?!
P/1 – Eu queria que o senhor comentasse agora também quem é que fornecia o couro para o senhor, de onde vinha, quem eram os produtores e como é que esse produto chegava pro senhor, já pronto ou o senhor tinha que fazer um tratamento, como é que era?
R – Não. Bom, como nós éramos intermediários, éramos intermediários de couro pronto, a aplicação do couro era pro calçado, preferencialmente, pra bolsas e malas, pra mochilas, pra carteiras e o couro vinha, bom fazia pra carmeira mas tinha uma série de outras aplicações, até pra peças de máquinas, teares levavam o couro, eram uns breques, uns encostos, era para bater a máquina e até carro se você lembrar, onde você segurava...
P/1 – Uma tirinha de couro né?!
R –... Uma tirinha de couro que ficava lá. Então, tinha utilidades múltiplas mas foi desaparecendo por essas razões, a entrada do sintético, essas modificações, o banco de couro no carro hoje é um artigo de luxo né, não deixa de ser mas eu acho que não tem muito o que dizer não.
P/1 – E da onde vinha esse couro, de onde que era trazido?
R – Ah bom, o lugar, me desculpe. O lugar, bom, o melhor couro, eu digo o melhor como qualidade, é a que vem do sul porque ela tem um pouco daquilo que tem o couro de fora do Brasil no sul, da Argentina e do Uruguai vamos dizer, por quê? Porque na Argentina não tem montanha, então, o pasto é bem liso, bem reto, bem tranqüilo, inclusive, tem um tratamento por causa do clima, melhor do que no nordeste, certo? Então, o Rio Grande do Sul, importou isso, agregou a ele mais ou menos o que a Argentina, o gado é mais saudável, é um gado que tem mais gordura porque ele é bem alimentado, é um gado que foi bem tratado, então, não tem berne, berne seria o bicho que dá no couro que quando você pegava uma pele estava todo furado né, por quê? Porque dão banho no gado pra matar essas pestes todas que aconteciam, então, era um couro de qualidade muito melhor. Então, quando estava pronto era um couro que tinha mais brilho, que não tinha riscos, que não tinha furo, mais elasticidade, era um couro de qualidade muito melhor o do Rio Grande do Sul, disso não tenha dúvida. No interior de São Paulo nós tivemos muitos curtumes, em Botucatu, Campinas, Leme e grandes curtumes em Leme, Piracicaba, uma série de locais pelo interior que tinha curtumes que tinham um produto bom mas o principal o principal produto aqui do interior de São Paulo era a sola mas também tinha o que a gente chama de pelaria, peles. No nordeste, norte e nordeste, o couro é pior, primeiro porque é muito mais seco, segundo porque eles andam no meio de pedra e se coçam em uma pedra. Ah, eu esqueci de falar do gado que é obrigado a coçar o berne em uma cerca de arame farpado, se ele vai se coçar naquela pecinha do arame farpado ele marca todo, então, também se usou durante um tempo ou o gado depois confinado ou aquele que tinha um outro tipo de cerca, que é uma cerca de arame liso, que não acontecia nada disso, é uma preocupação para a qualidade final do couro mas no norte e nordeste quase não existia essa grande preocupação e era um couro muito mais ressecado, o gado era muito mais magro por causa da temperatura, do sol, então, era um couro de qualidade inferior, muito fabricantes não utilizavam, tinha uma diferença de preço mas ele quase não utilizavam o couro. Isso foi continuando, o sul ainda continua, tanto que se instalaram no sul fábricas muito boas, até de cintos que eram fábricas mistas, por exemplo, se você pegar, porque couro, quando a gente fala couro parece que é uma coisa só mas no norte e nordeste tem um que a gente chama de mestiço, não é nem um cabrito, nem uma ovelha, é misto, ele tem um pouquinho de lã nas costas e o corpo não tem mas é magro, fraquinho, isso repercute na qualidade do couro. No sul tem os carneiros que são tosados, você vê até hoje a lã e aquele couro não tinha grande resistência, servia pra isto e servia para o forro do calçado de senhoras, que também absorvia, era macio e absorvia a transpiração, tinha o couro de cabra, a pelica, hoje se fala muito em pelica mas pelica é um couro de cabra, é um cabrito, uma cabra pequena e ela tem aquela marca que hoje é copiada no couro de boi, hoje pega – se uma pele de boi, faz – se uma estampa de metal toda trabalhada, estampa, quando você olha é uma pele de cabra, não é uma cabra, é um couro de boi, tanto que sapatos de homem não usam, fala – se cabra porque é feito com uma curtição macia mas a mulher usava muito sapato de pelica, acredito que ela não tenha visto isso, era um couro muito delicado mas que também se desse uma batida, um raspão lascava, saía uma lasquinha, perdia, tinha que colar, tinha que pintar, era muito bonito mas ele não tinha essa resistência externa mas também se usava muito. O que muito se usava, que era um couro muito resistente, que era isso que eu queria dizer, era o couro de porco, os frigoríficos, Sadia, todos eles matam porco mas eu vou pegar o caso do que ficou junto com a Sadia agora, Perdigão. O Perdigão, todos esses frigoríficos quase todos eram de família italiana, do sul, o Perdigão, por exemplo, era da família Ponzoni Brandalise, eles tinham depósito em São Paulo na Rua Antônio Paes na esquina da Rua Cantareira e na esquina tinha a Sadia, quer dizer, na mesma rua tinha os dois depósitos pra vender a carne fresca mas eles lá tinham quantidade muito grande de couro, então, montaram um curtume de carne de porco, o couro de porco é o forro mais comum pra se usar no sapato de homem, o porco tem exatamente a nossa...
P/1 – Textura?
R – Não é estampa, como é que se diz?
P/1 – Textura, pele?
R – O desenho da nossa, tem um nome especial que agora eu não me recordo, é o couro do porco, é muito resistente. Então, esses são os couros principais, tinha couro de coelho pra fazer enfeites, pra fazer chinelos e uma série de outras coisas mas sempre tinha uma saída muito pequena, o crocodilo foi um couro que se vendeu muito no norte, depois houve a proibição mas o que se vendeu de sapato de crocodilo e bolsas de crocodilo também não está registrado mas foi muito grande. Couro de cobra muito menos mas também tinha alguém mas são especialidades né?!
P/1 – O senhor já até falou rapidinho pra gente do que aconteceu depois com o seu comércio, do advento do tênis, dos comerciantes asiáticos...
R – Do automóvel?
P/1 –... Do automóvel. Então, eu gostaria que o senhor falasse pra gente como é que a indústria e o comércio lidaram com essas situações, cada uma delas, com o tênis, com o automóvel, qual foi a resposta dos comerciantes e dos industriais pra essas coisas, pra essas novidades?
R – Eu acho que muito poucas saíram fora desta mas eles saíram através da constituição de uma firma bem constituída, com muito capital que produziram um sapato que entrou no mercado bem, por causa do preço da qualidade, da variedade dos modelos e eles conseguiram derrubar os pequenos porque os pequenos ainda fazem muita coisa muito mais manual do que o grande, se bem que o couro ainda é uma dificuldade, até pra cortar você vê de vez em quando tem a pessoa que está cortando com um modelo mas tem estampa ou põe diversos e corta diversas peças de uma vez, então, tem fábricas muito grandes no Rio Grande do Sul porque antigamente se você tivesse uma fábrica que fabricasse cem pares por dia, duzentos, quinhentos pares, quinhentos já era um colosso, mil pares então mas no Rio Grande do Sul era pouco, no começo três, quatro mil pares era fácil encontrar, hoje deve ter gente com dez, vinte mil pares diários. Então, essa situação só permitiu a presença de poucas indústrias e a fixação de indústrias em alguns lugares, você mesmo conhece que o sul faz muito sapato de mulher, Franca faz o sapato de homem, é que ele foram desenvolvendo e é difícil, lógico que tem o paulista que faz um sapato às vezes de muito mais nome, isso é muito comum, você hoje em um shopping vê marcas de valor muito mais alto de alguma firmas que ainda continuaram, Pellegrini, Fascar, Di Pollini, Di Pollini não é tão velho mas são firmas que se firmaram pela qualidade, pelo nome, por uma forma especial de trabalhar e criaram uma clientela da qual eles administram bem, não é o grande exportador e você viu que a própria São Paulo Alpargatas que fabricava, os sapatos que entraram também que eu não falei, foram os sapatos vulcanizados, Vulca Brás, não teve um sapato que era fundido junto a sola? Então, houve muita movimentação nesse sentido, muita novidade né?! Se bem que se é pra lembrar, o primeiro sapato que a Alpargatas fabricou era o nome dela Alpargatas, era um sapato de corda, o primeiro sapato era um sapato de origem, vamos dizer, espanhola, é alpercata que o espanhol usa com corda de sola hoje é esportivo, uma sola de corda é esportivo mas se usava isso né?! Outra coisa, vocês não são desse tempo mas se usava tamanco, uma mulher pra lavar a casa ela não lavava com sapato, ela punha um tamanco, era um tamanco de madeira com um couro rústico em cima pra poder molhar o pé e depois punha no sol pra secar e aí trocava e punha o sapato, hoje vai com a mangueira e vai com o sapato melhor que tem né (risos)?!
P/1 – Diminuiu o público consumidor de couro de uma forma geral ou manteve – se? Como é que está hoje?
R – É muito pouco, só os que conseguem manter, por exemplo, em bolsas, devem ter marcas conhecidas de mulher que fazer mas que não fazem uma produção enorme, fazem produção menor e tem uma clientela especializada ou então, um preço especial, eu acho que são nichos, não é o grosso do comércio, são nichos que foram ficando e que a pessoa encontrou um caminhizinho e vai ainda, quem sabe até vai bem né?!
P/1 – O senhor ainda está bastante envolvido com o seu comércio, o senhor ainda atua diretamente ou o senhor já se afastou, como é que está?
R – Não, eu já estou mais afastado a minha firma continua ainda ativa mas eu não tenho mas quase trabalhado no ramo né?!
P/1 – Há quanto tempo já?
R – Uns seis ou sete anos que eu já deixei.
P/1 – E está com a sua família agora, tem que alguém que te sucedeu ali?
R – Não, nós transferimos tudo, até a minha família também poucos ficaram daqueles que estavam comigo já naquela ocasião, o tempo vai passando né?!
P/1 – E durante esse período em que o senhor atuou diretamente no comércio, o Brasil passou por diversos planos econômicos, crises, enfim. Eu gostaria que o senhor dissesse quais foram os maiores períodos de dificuldade, por quê.
R – Eu acho que sempre a inflação, eu acho que pegar um tempo do Sarney em que o normal era 40, 44, 45 em um determinado tempo chegou a 80, 82, isso não tem cabeça que entenda isso, não dá pra entender né?! O plano Collor que também veio com uma idéia mas desestruturou porque também segurou o dinheiro de todos, depois soltou de uma forma que eu acho que não foram saudáveis, eu acho que tentaram alguns e realmente o plano Real parece que foi o que deu mais certo no começo, inclusive eu acho que do Fernando Henrique e posteriormente eu acho que conseguiram e hoje a gente vê que o Brasil já tem força pra dizer: “Não, vou fazer isso, vou fazer aquilo”, antigamente dependia muito do comércio internacional, da dívida do Brasil, o que é estranho é que o Brasil ainda tenha tanta dívida né mas a dívida principalmente estrangeira que não tinha como pagar, que era quase pra dar risada mesmo, era impagável mas conseguimos sair fora disso tudo, eu acho que foi uma guinada que o governo conseguiu, os governos conseguiram através de tantos que falaram, alguns teóricos que estavam mais certos mas não é fácil, a gente vê que mesmo um presidente tem uma dificuldade tremenda de conseguir impor alguma coisa que ele acha ou que ele tem quase certeza que vai bem, é um jogo partidário que isso eu acho que tem dificultado a vida do brasileiro. Se bem que a gente achava que a maravilha das maravilhas era os Estados Unidos e os Europeus, quem viajou e viu uma Espanha florescente, uma França bela e viu uma Alemanha que conseguiu sair da guerra e fazer milagres, quem viu até Portugal se modernizar e viver uma fase mas Portugal é um pouco diferente, a gente vê isso na Grécia ver o que está acontecendo hoje, é o fim e o Brasil conseguindo por a cabeça pra fora vocês às vezes nem acredita, parece até propaganda mas é uma verdade, quer queira, quer não queira é uma verdade, o Brasil precisaria saber aproveitar bem isso tudo mas é uma briga constante, você vê que o Brasil dentro da América Latina tem que brigar com os amigos vizinhos ou alguns outros vem e desestruturam até grandes, se a gente pegar, por exemplo, algumas concessões que foram feitas, eu não gosto de falar disso mas eu acho que é importante, concessões que algum governo anterior aí fez, por exemplo, o Evo Morales tirando, diminuindo a nossa cota de gás pra ajudar um vizinho, eu acho isso fantástico mas desde que não nos prejudique. Por exemplo, essa história do gás, eu posso te dizer com certeza que prejudicou tanto que o Brasil tinha uma termoelétrica que abastecia Cuiabá e era através do gás O duto, com a redução Cuiabá ficou sem eletricidade mas Furnas supriu. A termoelétrica que levava e leva o nome de Mario Covas está fechada, teve que despedir quase seiscentos funcionários e não está funcionando, por quê? Porque foi desviado do Brasil o gás que eles tinham necessidade e petróleo pra levar lá não tem condições. Eu estou fazendo uma crítica que é minha, pessoal pode ter algum erro nisso mas eu vejo resultado, a termoelétrica está fechada, não está fazendo muita falta porque felizmente está chovendo e nós temos águas nas outras hidrelétricas mas senão estaria fazendo falta né?! Quer dizer, é difícil eu entender que essa política de bons amigos tenha que, às vezes, chegar a esse ponto de prejudicar o próprio país pra ajudar um outro. Vocês lêem jornal? A cada 15 dias nós temos uma briga com a Argentina, será que é preciso tudo isso? Isso não desvia um pouco da economia nossa? Eu acho que nós estaríamos na frente se não tivesse essas brigas todas né, sei lá.
TROCA DE FITA
P/1 – Então, pra fechar essa parte do comércio eu gostaria que o senhor falasse um pouquinho pra gente como o senhor vê o futuro do comércio no bairro do Brás e também depois como o senhor vê o futuro do comércio do seu setor, o setor de couros.
R – Eu vou inverter, o ramo de couros já está, não está desaparecendo, ele já desapareceu, não tem condições, muita coisa foi substituída, a gente pensa ainda que esse produto poderia ainda ser de couro mas nem é a praticidade né?! Hoje com os plásticos todos, com esses estofados, com as malas, hoje com um estilo de mala completamente diferente, nem sei se seria viável fazer malinha de roda com couro, ela é feita às vezes de lona, ela é feita com o sintético, as pastas mesmo porque hoje você olha pra um grupo de pessoas mais jovens, 90% tem mochila nas costas né?! Você vê que não tem mais utilidade a pastinha, então, eu acho que caiu em desuso e o preço pra voltar, eu acho que muito difícil porque é um produto caro, eu acho que sempre a concorrência que vai ganhar, vai aparecer outros produtos aí como (risos), hoje não tem a sacolinha do supermercado mas já estão inventando uma outra que é pra jogar fora, isso vai ser comum e a gente não aceitava isso, quando há muitos anos se ouvia dizer: “Não, os Estados Unidos está fazendo geladeira pra quando estragar não consertar”, é ou não é uma verdade já pra nós isso em muita coisa? Não vamos dizer da geladeira mas quanta coisa que é mais fácil você comprar uma nova e jogar fora a velha, quanta? É um consumo forçado, isso eles conseguiram fazer mas não é todo ramo que consegue não é?
P/1 – E o bairro do Brás como é que o senhor vê o comércio?
R – O bairro do Brás eu acho que não vai mal porque sempre foi um bairro com preços mais populares, não são tantos moradores no Brás, são pessoas que afluem pra lá. Eu acho que a existência de núcleos no comércio, por exemplo, quando você pega, por exemplo, que é muito chamada, na Rua Oriente, então, inclui, a Rua Maria Marcolina, a Rua Joli, até a Rua Bresser todo esse setor tem ótimas casas e é um comércio que se preocupa com o preço, com a variedade, às vezes, a qualidade não é o forte mas as pessoas também hoje sabe que tem certas coisas que, eu não sei, por exemplo, o uso de camisetas hoje, é uma fábula perto do que seria porque é a prática, a praticidade hoje e uma camiseta entre custar dez e custar 50, acho que é uma questão de grife, um pouquinho da qualidade mas não é essa diferença de dez pra 50, modo de dizer. Então, eu acho que o Brás sempre vai ser um comércio popular, enquanto tiver, eu acho que vai ser. É o caso do Bom Retiro né?! O Bom Retiro tem uma vantagem, é que ele lança a moda, lança coisas mais, copia né, mais moderno mas é um outro centro o Bom Retiro. E assim, comércios que foram se fixando, você pega na Theodoro Sampaio um que tem móveis, outro que tem música, outro tem né?! São Paulo se modificou muito mas o Brás eu acho que não vai mal não.
P/1 – Bom, agora eu queria que a gente falasse um pouquinho sobre a sua participação em associações comerciais, em federações, como é que começou, com que intuito o senhor começou a participar? Como é que é essa história?
R – Porque eu achava que tinha uma dificuldade muito grande no nosso ramo de disparidades, havia pouco entendimento entre os comerciantes e eu fui convidado a ser presidente do meu sindicato porque eles sabiam já o que eu estava fazendo extra sindicato, me convidaram e não tinha outro candidato, eu entrei, fui reeleito em três mandatos, três anos, foram nove ou dez anos, eu não quis depois continuar e procurei fazer pro ramo alguma coisa que era interessante. Houve uma união, troca de idéias mas quando vocês, às vezes, tenta fazer alguma coisa vem alguém que quer fazer mais e começa a falar em preço e quando chegou ao ponto em que estavam querendo unificar preço, eu digo: “Agora acabou” porque o comércio não é isso, comércio é disputa né?! Lógico podemos ter uma noção da necessidade de cada um porque o comércio era feito de uma forma até empírica demais, vou dar um exemplo fácil, tudo o que nós tínhamos no comércio todas as despesas são calculadas sobre as nossas vendas e toda a forma de calcular, pelo menos teoricamente, 70%, 80% dos comerciantes calculam sobre o custo da mercadoria, nunca soube o preço que ele ia vender, não sei se eu deveria explicar melhor, se eu vendo uma peça e tenho 10% de imposto, vamos emitir cem reais, vai passar a 110, se eu comprei ela por 50, pra ela chegar a cem eu tenho que por 50% mas se eu puser 50% eu não chego no 110, eu chego só no cem. Então, a conta não pode ser feita sobre o preço de custo, tem que ser feita uma coisa de divisão, um coisa simples, saber por quanto que você tem que vender, não teoricamente você achar: “Eu vou ganhar 20%”, está ganhando 20% porque todas as suas despesas: salário e tudo são baseados, isso confunde muito a história do comércio, muita gente não consegue entender. É até estranho eu falar uma coisa dessas mas for a maior batalha que eu tive pra que todos entendessem que o comércio não é baseado no preço do custo, é baseado no preço da venda, você precisa saber o que você vai fazer na hora de vender, isso foi difícil mas tudo bem, eu acho que foram indo, eu acho que muita gente conseguiu entender melhor, o comércio ainda se manteve, ganharam um pouco mais mas não é o que salvou o comércio (risos), o meu comércio não foi salvo por isso não.
P/1 – E da presidência do sindicato o senhor já tinha contato com as suas relações?
R – Bom, eu então fiquei presidente do sindicato e tinha um representante do meu ramo na Federação do Comércio e no SESC, era filho do dono, era dono de uma das casas de couro boa em São Paulo, ele parece que ele também não quis mais continuar. Então, eu fui convidado pra ser da Federação do Comércio e a Federação do Comércio tinha reuniões regulares e o SESC tinha reuniões um pouco diferentes, eu estava assoberbado, eu não tinha muito tempo, apesar de eu gostar de participar de entidades, como eu fui do próprio sindicato do clube, de outras associações mas da Federação eu pedi ao presidente na ocasião que ele não pusesse, não me destinasse nada na Federação e sim se fosse possível no SESC, ele disse: “Tá bom” e eu entrei como conselheiro suplente naquela ocasião, fiquei diversos anos, depois acabei ficando como conselheiro efetivo, depois assumi algumas atribuições internas pra ajudar o presidente, como é assim que eu estou de supervisor com delegação do presidente para o setor de gerência de pessoal, algumas licitações, também eu estou na comissão de licitação e tenho ajudado o SESC naquilo que me é possível ajudar e eu fiquei todos esses anos no SESC. Independente do SESC, eu tive uma outra atividade grande também em um clube, que é o Clube Esperia, eu entrei há muitos anos, eu entrei com 13 anos, eu estou com 75 anos de clube, fui diretor, fui do conselho, secretário do conselho, passei a ser vice presidente, passei a ser presidente, passei a ser presidente do conselho administrativo, fui o primeiro coordenador do conselho de orientação. Então, eu sempre quis ajudar entidades que me pareceram que o meu trabalho, não é que seria importante, pra mim me daria satisfação porque na verdade nós não temos remuneração nenhuma nem no clube, nem no SESC e a minha grande satisfação no SESC é ver que eu estou ajudando, colaborando com uma entidade que pra mim é extraordinária. Eu entrei no SESC, o SESC tinha 16, 18 unidades em São Paulo e no interior e graças a um trabalho especial do presidente Abram Szajman e do principal colaborador dele no SESC que é o Danilo Santos de Miranda que está ajudado por poucas pessoas, o SESC tem três, quatro superintendentes apenas para dirigir tudo, tem gerentes mas os gerentes são específicos para unidades ou para determinados setores, não abrange tudo e o SESC consegue administrar. Hoje nós já estamos quase com 40 unidades, estamos .caminhando para passar as 40, já temos algumas bem encaminhadas, nesse último ano o SESC teve a felicidade de inaugurar o Belenzinho, que é o complemento do Belenzinho que é da administração porque o terreno é um só, era da Santista, o SESC comprou o terreno porque o SESC normalmente na capital ele compra os terrenos e no interior ele recebe quase sempre doação dos prefeitos, os prefeitos disputam muito pra que o SESC vá fazer e mantenha uma unidade. O SESC nesse ano inaugurou o Belenzinho, aliás no fim do ano passado, acho que foi Outubro ou Novembro, inaugurou Santo Amaro, que era uma garagem de ônibus, que estava instalado provisoriamente e inaugurou o Bom Retiro, que era uma agência de automóveis ao lado do Liceu Coração de Jesus, bem de fronte a casa do Santos Dummont, perto do Palácio do Governo, então, ele está se incorporando lá em uma área muito cultural porque tem uma série de atividades que estão lá, Sala São Paulo, a própria estação da Luz, o Parque da Luz, a Pinacoteca, o Museu da Arte Sacra, bom resumo, lá o SESC está fazendo um trabalho muito interessante. O SESC inaugura este ano, até Setembro, no comecinho do mês de Setembro inaugura Sorocaba que deixou de ser há muito anos atrás um pólo industrial que nunca atraiu o interesse do SESC mas de uns anos pra cá que ele se transformou completamente, o SESC vai onde tem um comércio substancial para poder atender os comerciários. Nós estamos com Jundiaí bem adiantado, estamos adiantando bastante a Rua 24 de Maio com a Rua Dom José de Barros que é o antigo prédio da mesma. Nós estamos adiantando os projetos pra começar de Osasco que já está funcionando de forma provisória porque o SESC inaugurou um sistema provisório que permite a ele construir o definitivo, quase sempre em um reaproveito provisório e às vezes teve até que destruir o provisório pra fazer o definitivo mas no máximo de velocidade. Continuando, nós vamos ter também uma unidade em Guarulhos porque a prefeitura também nos cedeu, também estamos lá de forma provisória. Vamos ter provavelmente a compra de uma outra na zona leste, vamos ter no interior, nós vamos ter Franca, Marília, bom em resumo, nós temos uma porção de unidades pra serem inauguradas ou começadas. Infelizmente o SESC tem tido uma dificuldade trazida pela insistência de alguns setores do governo em querer considerar que o SESC não é uma entidade privada e sim uma entidade pública, eu acho que há um erro crasso nisso, o SESC afinal de contas nasceu de um projeto em 1946 em que se reuniram os líderes do comércio e da indústrias, acho que também do transporte na ocasião em Teresópolis e emitiram uma carta de idéias pra que fossem criadas algumas entidades mantidas pelo comércio e pela indústria através de uma contribuição do comerciante, através da folha de pagamento e incluída no recolhimento feito ao INSS. Então, eu acho que pra ter uma segurança acharam que deveria passar pelo INSS, foram muito difíceis os primeiros anos porque o acerto de contas com o governo e as entidades, o governo sempre foi coisa difícil mas felizmente está caminhando tudo bem e essa entidades foram se desenvolvendo. Umas das razões daquela ocasião, que é importante que se saiba, foi um começo de movimento, que eu entendo assim, pode até ter tido outras razões mas essa foi preponderante, foi a entrada em um movimento comunista no Brasil e através das fábricas, eu falo fábrica porque era comum, a palavra indústria não era tão comum a gente usar (risos), eram fábricas e isso aconteceu, então, o governo aceitou a idéia de que fosse criado dentro do que chamou – se SESC, Serviços no Comércio e da Indústria né, o SEBRAE e o SESI, com um setor de aprendizado, de ensino técnico, que é o SENAC no SESC que é um ensino comercial e no SENAE o ensino técnico que é o de mecânica, que é um excelente curso, um excelente aprendizado e o SESC e o SESI, não são homônimos, eles são dentro da mesma linha, foram criados com a intenção de cuidar do bem estar social, presta bem atenção, do bem estar social, por quê? Porque eles queriam a união das famílias, queriam a integração das famílias, dos funcionários, inclusive dos operários para que fosse anulado esse movimento fabril contra a democracia e sim o comunismo né?! Tanto que tem até algumas coisas curiosas, não sei se algum de vocês já esteve lá em Bertioga? Bertioga foi a primeira grande unidade em 1948 porque o SESC foi fundando em 1946, o pessoal da indústria iniciou um pouquinho antes e o SESC começou com duas ou três pequenas unidades em São Paulo alugadas e logo em seguida construiu a Bertioga que foi a primeira, a segunda foi a Consolação, que quem construiu foi o SESC que construiu o primeiro prédio na vertical pra esporte. A Bertioga tinha um esquema que construía as casinhas ainda em cima da areia da praia, ficava recuado já da praia mas as casinhas antigas, se vocês perceberem, elas eram pra duas famílias, então, tinha a casa número um, por exemplo, tinha o lado B e o lado A, o lado A tinha um dormitório e um banheiro, a B tinha um dormitório, um banheiro e uma cozinha integrada e um quintal pra todos. Então, a idéia era integrar duas famílias estranhas no mesmo domicílio pra que houvesse um entrosamento. Daí nasceu também o tipo de alimentação que era geral, mesas grandes, todo mundo sentando nas mesas e os garçons trazendo pra você comer junto com os amigos na mesa, esse foi o grande passo inicial do SESC. Hoje há uma certa restrição na questão das duas famílias juntas e o SESC também não precisa mais disso porque ele mesmo fez instalações hoje, estão sendo inaugurados apartamentos individuais para quatro ou cinco pessoas, com entrada independente, com um chuveirinho, uma sauninha na entrada, uma rede a entrada, ar condicionado, televisão de 40 polegadas, banheiro com ar condicionado, camas boas e retráteis, quer dizer que a instalação hoje do SESC está procurando caminhar para a família mas sem restrição nenhuma, então isso é e o SESC tem procurado aumentar muito. Lá na Bertioga hoje tem trezentos lugares diários também no balneário, então, são 1.300 pessoas por dia, está começando no SESC da Bertioga uma escola do SENAC pra seiscentos alunos da Bertioga, grátis, gratuitos, está começando um projeto de crianças, não do Curumin, que é da criança menor, mas pra mais de seiscentas crianças. Então, o SESC vai ter 1.100 ou 1.200 que vão na colônia, trezentos que vão no balneário com direito a almoço por 18 reais, seiscentos pra fazer um curso técnico durante seis meses graciosamente e mais seiscentos pra fazer esporte. Então, nós vamos ter lá 3.000 pessoas no mínimo, 2.500, 3.000 movimentando aquilo tudo e com aquela capacidade que o SESC tem. Eu estou falando de lá por ter sido a primeira, que era diferente mas se pegar as outras unidades, o SESC tem se surpreendido porque ele já nasce pequeno, por exemplo, nós inauguramos Santana e demorou muitos anos pra aquilo poder ser construído, quando inicia está tudo tomado. Iniciamos agora Bom Retiro e Santo Amaro, todas as aulas já estão tomadas, todos os cursos, toda a sauna, toda a ginástica na água, enfim, tudo, os espetáculos, quer dizer, o SESC está correndo atrás, não tem condição de cobrir pela qualidade que ele oferece, eu acho que é uma qualidade excepcional, você me desculpe mas eu vejo que eles se esforçam ao máximo pra atender o público. Hoje está atendendo também não só ao comerciário mas também ao público, com uma pequena diferenciação de valores o SESC tem conseguido fazer milagres, tem gente que aproveita bem essa parte cultural e o SESC conseguiu provar, eu acho que até na justiça mas pelo menos ao governo que o SESC faz uma educação complementar porque o governo quis que o SENAC desse tantos cursos grátis e o SESC não tem que dar cursos grátis porque ele já faz e é complementar porque levar alguém pra uma peça de teatro, dar um esporte, dar um aprendizado de natação, dar aulas de internet, dar odontologia, em resumo, tudo o que o SESC dá é um complemento da educação né?! Então, o SESC não precisa ainda abrir portas para ser mais de graça do que ele já é e a qualidade com que ele faz, olha, eu sou entusiasta da qualidade do SESC e o grande defeito do SESC é que ele não consegue fazer muito mais depressa (risos), por quê? Porque infelizmente alguns setores do governo querem rotular o SESC como entidade pública e nós estamos hoje com algumas grandes dificuldades de velocidade, eu falei que demora – se muito, hoje pra uma construção, se nós recebermos hoje um terreno, compramos um terreno quando a documentação está pronta, certa, o que é muito difícil, principalmente de prefeitos do interior, vão no mínimo quatro anos pra nós construirmos e inaugurarmos por quê? Porque eles estão nos igualando a entidade pública, nós temos que fazer licitações do mesmo estilo, com as mesmas dificuldades, até para os funcionários nós temos que fazer licitação para você completar o quadro de funcionários, você não pode mais fazer uma prova pra a pessoa se habilitar, pra mostrar determinada qualidade necessária porque a qualificação do funcionário do SESC é um dos segredos também, o estimulo que eles tem e tanto que o SESC hoje também está desterceirizando muita coisa porque ele estava com dificuldades de dar curso aos terceirizados porque isso fazia uma certa ligação na jurisprudência trabalhista que vem prejudicar um pouco o SESC né?! Mas o que eu quero me referir é que o SESC tem dado uns passos com uma dificuldade mas vai com galhardia, vai pra frente porque já tem muita coisa que já está começada mas é um absurdo você precisar de quatro anos pra construir alguma coisa, se tem o dinheiro, tem tudo em ordem, tem o projeto, é que é tão complicado, eu não sei se é má vontade de alguém querer achar que aqui tem que virar repartição pública, eu só acho que se for repartição pública não vai ter um diretor e quatro super intendentes (risos). Então, se eu tenho que dar uma nota não pode ser nunca menos do que dez pro SESC, você pode achar que eu estou vendendo aqui, não, eu tenho orgulho de pertencer ao SESC e quem me dá esse orgulho além daquilo que eu vejo é o testemunho das pessoas de fora que chegam e dizem: “Pô, o senhor é conselheiro do SESC”, até parece que estão vendo algum fantasma e não vejo reclamação, lógico, deve ter mas também em um lugar onde nós temos hoje cinco mil e quinhentos funcionários pra tocar 30 e tantas unidades, quase 40, multiplica isso pra você ver como o número não é tão grande em cada unidade, lógico, temos unidades com quatrocentas, quinhentas pessoas mas temos unidade com 150 só e funcionando a todo vapor, atendendo o número máximo que é permitido porque hoje o SESC quando começa alguma coisa, por exemplo, odontologia, começa fazendo um atendimento no período da tarde mas aquilo fica fervilhando, já vem um pedido do gerente, já faz o pedido da manhã e logo mais vem o pedido da noite, quer dizer, começa com um período e termina em três né?! Mas o dinheiro do SESC é muito bem administrado, o SESC tem condições, está muito bem administrado, olha, nós temos um presidente que não faz política, eu não sei se vocês vão querer gravar isso mas eu gostaria (risos). Eu respondo pelo setor de pessoal, eu falei né, de pessoal. Eu não recebi até hoje um pedido do presidente pra por um funcionário porque passa por mim e eu tenho que assinar, um, sabe o que significa isso? Que ninguém tem coragem de ir pra ele pedir emprego também é uma questão de inteligência administrativa, isso no Brasil você já viu? Eu não vi, isso é um exemplo que pra mim só isso diz quem são as pessoas que estão lá.
P/1 – Bom, pra gente ir finalizando a entrevista, pra gente ir pra parte final na verdade, eu gostaria que o senhor dissesse pra gente hoje, o senhor já até mencionou a sua participação no SESC mas eu queria que o senhor falasse pra gente como é que é o seu dia-a-dia hoje, quais são as suas principais atividade, com o que senhor está envolvido hoje tanto no campo profissional, quanto no campo pessoal. Como é que é o seu dia-a-dia hoje?
R – É, está um pouco diferente do que ultimamente era. Eu tenho um problema que eu já passei a você que é um problema de saúde em casa, da minha senhora que me tirou um pouco fora do eixo mas eu tenho no SESC, no Clube Esperia e mais uma outra associação eu tenho uma atividade que me preenche um pouco do tempo porque essa delegação do SESC dada pelo presidente ela envolve uma série de documentos que já vem preparados, com visto, encaminhados mas depende também do meu visto, da minha assinatura, isso é muito comum, até os aumentos mensais, as promoções, as demissões, tudo isso eu tenho que estar presente. Eu estou no SESC indo em algumas licitações de obras também que tomam algum tempo porque a gente vai de manhã pra fazer essas licitações, é uma comissão de cinco conselheiros. No Clube eu tenho uma participação porque eu tenho uma experiência muito grande e eu tenho ajudado. Nessa outra associação eu também faço alguma coisinha, gosto muito de escrever alguma coisa, de fazer todas as minhas coisas por escrito mas também estou com uma idade que será que eu tenho que trabalhar muito ainda (risos)?
P/1 – Entre todas essas atividades que o senhor tem sobra tempo pra ter um lazer, pra fazer alguma coisa?
R – É, hoje eu estou um pouquinho mais prejudicado porque eu não sou capaz de sair de casa e deixar a situação só não mão de terceiros, então, deixa pra lá, eu acho que faz parte da minha obrigação.
P/1 – O senhor gosta de fazer compras, de sair pra comprar?
R – Não, isso eu ainda faço, eu também ainda dirijo um pouco automóvel apesar dos filhos dizerem: “Ô, está na hora de largar o automóvel” (risos).
P/1 – E o que o senhor gosta de comprar?
R – Ah, não é o do dia-a-dia, nem tenho mais essa porque pra mim a moda já passou né, só se a boca da calça ficar muito grande aí tem mandar no alfaiate pra diminuir ao invés de comprar uma nova (risos), não estou brincando mas como eu não tenho uma atividade continua, roupa, comida, tudo se acomoda com muito mais facilidade né?!
P/1 – Por falar nos filhos, quantos filhos o senhor tem?
R – Eu tenho dois filhos, uma filha e um filho. Uma filha professora e um filho administrador, tenho quatro netos homens...
P/1 – Todos homens?
R –... Todos homens, dois de dois. O mais velho tem 33 anos é advogado procurador do município, o segundo é administrador, o terceiro é um menino especial e o quarto o meu neto menor que está com 22 anos terminando a PUC.
P/1 – E quando os seus netos, os seus filhos eram mais jovens o senhor chegou a pensar em um dia eles assumirem a sua função?
R – O meu filho mas já nem pensei muito não, pensei um ou dois dias (risos) porque eu vi logo que ele não queria, eu até cheguei a levar ele na loja, ele aprendeu uma coisa mais prática, do que era uma duplicata, alguma coisa mas já vi que o interesse dele era bem diferente, felizmente ele pegou um ramo em que progrediu muito na vida, ele está no caminho certo dele.
P/1 – Bom, pra fechar a entrevista eu gostaria que o senhor falasse pra gente o que senhor achou de ter dado essa entrevista de ter participado do projeto.
R – Olha, eu acho uma coisa maravilhosa porque eu aqui botei o coração pra fora né (risos) e falei coisa que eu acho que pra muitas pessoas que gostam, não vamos deixar de lado a minha vida mas é um pouco de história, eu misturei muito né, um pouco de história, um pouco de história do comércio que se fazia antes, é uma coisa mais ou menos curiosa e alguém tem que fazer essas coisas né?! Eu mesmo no Clube acabei terminando um livro de 73 anos quando eu entrei com 13, então, eu, relato, tudo isso, eu sempre gostei de registrar as histórias né?! Tem alguém que pode dizer: “Ah, deixa pra lá” mas eu acho que a gente deixa uma lembrancinha aí né?! Eu acho que vocês estão fazendo um papel importante, registrar isso, eu sei que acaba sendo um volume grande de trabalho que vocês vão juntar, nem todo mundo pode mas vai ser uma fonte de referência, não tenha dúvida que amanhã o pessoal vai escolher o que é mais interessante pra eles e vai clicar e ver aquilo que interessa pra eles né?! Não é assim?
P/1 – Exatamente.
R – E vocês estão contribuindo, eu acho isso importante, muito importante, fiquei muito, muito feliz, muito contente pelo convite.
P/1 – Então, senhor Aldo, nós agradecemos muito a sua participação em nome do Museu da Pessoa e do SESC São Paulo, muito obrigado.
R – Obrigado, não tem nada não.
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