P/1 – Vamos começar, Moisés?
R – Vamos.
P/1 – Eu queria que o senhor dissesse para a câmera, para a gente registrar, o seu nome completo, o local e a data de nascimento.
R – Olha, eu sou do dia 9 de setembro de 1931. Nasci em município de Esmeralda, chama Caracóis. Isso tem que ter né? Certo, né? Aí, com a idade de sete anos, eu vim para Belo Horizonte. Trabalhei com leite, entregando leite, sabe? Eu era pobre, não frequentei escola. Então eu vim vender leite em Belo Horizonte. Muitos anos, dos oito anos vendendo leite em Belo Horizonte. Depois que eu fui para, eu entrei no estado, para trabalhar no estado. Do estado, um chefe meu comprou um sítio, lá no Macaco. Comprou um sítio lá, e me levou para lá. Eu fui alumiado do estado. Eu fui alumiado do estado, eu sabendo que eu era analfabeto e coisa, mas o governador ficou gostando de mim porque eu fiz um serviço particular para ele. Assim, um serviço que ninguém quis fazer. Eu, como tive experiência, fiz. Então ele ficou gostando de mim. Sabia que eu era analfabeto, mas ele me botava lá em um lugar muito bom. Me alumiou com um bom serviço. Mas esse patrão meu me contou, sabe? Que ele era chefe, assinava meu nome lá, pagava como se fosse, é igual hoje, existe essas coisas, o estado, né? Aí então eu perdi essa parte. Fiquei como abandono do estado. Fiquei como abandono do estado, aí fiquei lá, aí me arranjei uma noiva, casei. Adquiri os filhos. E já tenho 50 anos que eu estou lá. Eu fui para lá com 17 anos. A vida inteira minha foi só trabalhar. Então, e lá, antes era Macacos, era Arraial, São Sebastião e Macacos. Depois que botou Águas Claras no meio. Arraial, São Sebastião e Macaco. Lá era um lugar antigo. Belo Horizonte era Curral Del Rey, ainda. Não era nem, não chamava Belo Horizonte. Não tinha coisa não. Era Curral Del Rey. Lá eles transportava lenha para abastecer a Maria Fumaça, que era a máquina do trem de ferro. Aquela máquina do trem de ferro. Então eles trazia lenha, carvão, e era tudo na base de tropa de burro, no lombo de burro. Lá às vezes andava lá a cavalo, _____________, né? E tinha, então eu fui conhecendo, apanhando aquele conhecimento com aquele povo ali. Com tropa, lenha, muita lenha. E teve, e lá fiquei sabendo de muito caso lá das antiguidade, né? Igual problema com a cabaça. É uma coisa que a gente fala, você duvida, mas não é para duvidar, é verdade. Antigamente, o povo tinha muita oração forte, sabe como é que era? Muita oração forte. Era um poder, de santo, né? Era Nossa Senhora do Rosário, tinha o Congado. Tinha o Congado. Então isso aí já, então eles tinha essas oração forte. E tinha esse senhor, ele tinha uma oração muito forte. Ele ia lá no mato, mexer, cortar lenha, e mexia lá. E ele gostava de um molhinho, né? Que quase nós todos gostamos, né? (risos) Então ele mandava, ele não podia sair lá do serviço, ele mandava a cabaça ir buscar cachaça para ele. Uma coisa impressionante. Vocês vai duvidar, mas é verdade. Você vê que uma cabaça não tem perna, mas ela ia rolando, ia lá. Era uma oração forte. Igual tinha benzedor, que benzia aí uma tempestade, apagava fogo, com a benzeção. Quer dizer, é uma oração, né? Aí a cabaça ia lá, o vendeiro sabia, botava cachaça ali ela voltava. Ninguém mexia. Todo mundo sabia. Que era pouca gente naquela época, quase todo mundo conhecia uns aos outros. Então ninguém envolvia naquela cabaça _____________ tirava a pinga do _____________. Aí ia embora. E igual tinha essa Congado, esse Congado era uma dança. Tinha Folia de Reis, tinha o Congado, e então você podia acompanhar, acompanhava ali aquele Congado, podia, tinha umas, mas não zombar. Zombar não. Se você risse e zombava, se você ficasse sentado, você tinha que ficar sentado. Se você saísse, saía carregando aquele velho, grudava na pessoa. Isso nas antiguidades sabia tudo isso. E muitas me contava isso. Eu não assisti, mas era verdade. Você podia ir, mas não zombando. Tinha graça e coisa assim, mas você não podia. Tinha Folia de Reis, tinha o velho. O velho sabia todas as rezas. Então às vezes as duas Folias de Reis elas podia encontrar. Eles davam, tiravam esmola, tinha bandeira. Chegava na casa, você queria que dançasse, dançava o velho e o Bastião. Tinha dois Bastião e o velho. O velho tinha uma crista grande. Esse velho ele era o mestre. Ele que sabia as oração tudo. Sabe como é que é? As rezas tudo direitinho. Então dançava ali, você dava a esmola e ia embora. Uma Folia não podia encontrar com a outra, se encontrasse os dois velhos tinha que disputar nas oração. E muito _____________ ia embora. _____________ (falha na gravação) Então, de maneira que é isso. Agora, a minha _____________ é igual eu estou dizendo: toda vida sempre trabalhando. Depois eu trabalhei muito com leite. Então é como se diz: (falha na gravação) aquela praça do outro lado ali, aquilo ali _____________ todinha. Eu tinha carroça. Porque antigamente _____________. Então foi muita gente criada com o leite que eu vendia, por isso não podia me prender. (falha na gravação) fazer exame de três em três meses renovar a carteira de saúde. Então nós era (falha na gravação) entrava às vezes na casa, então já tinha a chave, chegava lá, abria a porta de madrugada, _____________ o leite cedo, tinha que entregar cedo, né? Então abria a casa, colocava o leite lá, e saía. Então a gente era tarimbado para aquilo. Eles não botavam qualquer um. Então a polícia não podia prender a gente. Como o caso do Almir, uma coisa até impressionante. Eu entregava leite para os dois chefes da polícia _____________. Um era chefe da polícia de _____________, e outro que era chefe da polícia central, que era o Doutor Geraldo _____________. Entregava leite para os dois chefes. Tinha um que tinha esse jogo do bicho, e eu sempre fazia uma fezinha. E aquilo era proibido. Aquilo era proibido. Então em frente à Souza Cruz, da Avenida _____________. Você conhece, né, Belo Horizonte? Você conhece a Souza Cruz onde é que era? (falha na gravação) Então eu saí de lá e os dois ia chegando. _____________ "Todo mundo corre e você não corre?" (falha na gravação) Antigamente tinha só, mais era Chevrolet. Tanto era 48, depois que apareceu o 51. Sabe como é que é? Quando apareceu o Chevrolet 51. Mas era Chevrolet 48, tinha Ford, muitos, tudo 48. 1948 era a fabricação deles. Era raro. Belo Horizonte tinha pouquíssimo carro quando eu tinha lá, só tinha carro...
P/2 – Era o quê? Carroça?
R – Era, nós, hein?
P/2 – Bonde tinha?
R – Bonde tinha, bonde, tinha o bonde. Depois que começou o bonde, tinha o bonde. (risos) Ih, andei muito de bonde. E eu não pagava bonde não. Não, não pagava bonde não.
P/1 – Como é que o senhor pegava bonde sem pagar?
R – Não, eu tinha um boné, eu tinha um boné, esse boné não pagava não. Porque era o boné do leiteiro, né, não pagava bonde não. Então aí esse, vou voltar no que eu estava da polícia me querer liberar. Aí queria que eu corresse. Eu falei: “Olha, gente, vem cá”, eles falou, eu era criança, “Ô, rapazinho, por que é que os outros corre e você não correu por causa do jogo de bicho?" Eu falei: "Olha, chefe, presta atenção, eu acho que se eu correr eu vou ficar envergonhado, porque é um erro correr do outro, apesar que eu sou um menino. Mas eu vou correr do cês? Não, eu quero que vocês me corrige.” "Por quê? Esse negócio de jogo de bicho aí.” Eu falei: “Não, é verdade.” Aí eles começaram a entrar em mim, querendo que eu entrasse dentro do carro por uma agulha, né? Falei: “Chefe, presta atenção, o senhor vai me desculpar, apesar de que eu não vou nem, eu vou te falar. Olha lá, o senhor está vendo aquela carroça? É minha. Você não pode me prender não, ainda mais por esse motivo. Se eu estivesse bêbado _____________, que eu não vou fazer isso, talvez, eu não vou fazer. Se eu tivesse matado uma pessoa tinha 48 horas para se apresentar. Você procura saber _____________. Se vocês me prender aqui quanto de criança, quanto velho vai ficar sem o leite. _____________. Presta atenção, eu não precisava jurar, mas eu vou, mas vou jurar para vocês, vem cá. Vocês vê que eu não estou zombando de vocês. Vou te explicar.” A carroça era fechada de zinco, né? Aí estou de frente, aí a gente não tinha aquilo como maldade, mas a gente andava de madrugada. Antigamente não tinha ladrão, não tinha mesmo. Então abri a carroça, a carroça era fechada de zinco, para o leite conservar frio ali. Andava por cima, mas andava mais ali dentro. _____________ se o sol esquentasse tirava os leite de cima, os de baixo ficava dentro da garrafa, para conservar gelado. Aí eu abri a carroça assim, tinha uma caixinha que a gente via os cartão, e lá tinha _____________ 82, com a caixinha debaixo. Ele olhou assim, falou: “Ah, mas o senhor é autorizado?” Eu falei: “Eu sou autorizado e você é _____________ do seu trabalho. Eu tenho autorização para andar com isso. Se eu te mostrar para você, você está vendo essa carteira de _____________ aqui? Seu chefe que me deu. Ele mora na Rua Bernardo Guimarães, assim, assim, o nome dele.” Ele se assustou, falou: “Mas é mesmo?” Falei: “Ó, depois tem outra, Doutor Geraldo Sabre, ele é meu freguês de leite, Fulano de tal é meu freguês de leite, quer dizer, eu não estou, eu não quero usar isso porque eu sei que coisas, se fosse um erro que eu tivesse que apresentar lá, vocês tinham que prender o meu carro. Igual está constando aqui. Que eu não posso largar meu pessoal todo sem o leite, como é que eu vou largar? Com criança, com velho, com os adultos todos aí sem leite? Não pode.” Então, bem: “Não, não, não, se você conhece esse pessoal, é, não, não, não, não tem. Nós não vamos discutir nada, está certo, você trabalhou certo, olhou certo, toda a coisa certa.” _____________ “Dona Carola joga às vezes no jogo de bicho.” O guarda que leva _____________ e a investigação, até o tipo de investigação que provocava mais esse negócio de jogo de bicho. Então é isso. Ele liberou: “Não, não, não, não, não, não precisa nem de coisar.” Eu falei: “Pois é, o senhor vê.” “Ô, meu filho, você tem razão.” Que eu era criança mesmo, né? Eu falava: “Pois, senhor, eu estou falando para vocês em consideração, porque você já pensou eu sair despencado aí correndo? Um homem igual eu? Eu sou homem do mesmo jeito. Eu sou novo, mas eu tenho que ser corrigido se fosse o caso. Aí se fosse um outro motivo aí você tinha que me dar uma guia para mim apresentar com esse tempo que eu tenho. Porque aí eu tenho que avisar os freguês, eu tenho que botar outro no meu lugar para poder não deixar as crianças com fome.” Aí eles: “Tá, tá.” Aí _____________ eu trabalhei muitos anos com isso, com leite. Nunca tive assim, sabe como é que é? Não tive problema, até hoje não...
P/2 – Agora, me explica uma coisa: o senhor era contratado de alguém ou o senhor era dono da carrocinha?
R – Ah, dono da carroça era minha mesmo, era minha mesmo.
P/2 – É? E o senhor prestava serviço para a leiteria?
R – Não, eu comprava o leite para revender, é?
P/2 – Então conta como é, onde guardava a carroça?
R – Não, ficava lá em casa, lá na Lenha. Antigamente esse dinheiro aqui, olha para vocês ver. Essas prata de merréis aí, ó. Você com uma prata dessa você comprava, você comprava muita coisa. Muito trem mesmo. Antigamente igual as pessoas comprava era ovo, né? Aliás, era, era, essas pratas eu tinha uma mala de viajar de navio que eu ganhava, que teve um inglês, né? Inglês? Eu sei que ela viajava muito de navio, ela gastava seis meses. Ela mandava: “Tira _____________ surrado ali”, aí quando viajava ela voltava, quando ela voltava ela me dava um bom presente, que os ingleses trazia de lá. Então ela me deu uma mala. Menino, essa mala eu pus ela em cima da carroça assim, porque era uma mala grande. Ela tinha três gaveta e podia pendurar roupa. Era mala de viajar de navio. A mala tinha três gaveta e tinha lugar de botar cabides e de guardar roupa. Ficava aquele pessoal tudo atrás de mim, sabe esse pessoal mais graduado, né, que era: “Ô, leiteiro, faça o favor”, falava: “Quanto você quer nessa mala? Fala a quantidade eu te compro essa mala.” Que ela era muito bacana. Era de couro, mas um trem com perfeição, sabe? E eu acredito que ainda tenho até pedaço dela até hoje porque aquilo não acabava. Era toda cheia de tachinha, mas um trem de luxo mesmo. Tudo bem, né? Então eles ficava atrás de mim para mim vender a mala. Saía um, vinha outro, saía um vinha outro. “Não, chefe”, eu falei: “Não, essa mala aí eu não disponho de jeito nenhum." Então eu fui, entrei, como esse meu patrão me tirou eu do estado, eu larguei, parei com o leite. Cansei de vender leite, e fui lá para os Macacos, que é justamente onde é que eu estou lá com esse pessoal me trataram eu e pois eu nessa repartição.
P/2 – Mas, só para terminar a história da entrega do leite, que horas que o senhor tinha que acordar para trabalhar?
R – Quatro horas, quatro horas da manhã. Eu pegava a carroça, morava lá no Salgado Filho, no Mato da Lenha. Antigamente chamava Mato da Lenha, depois que passou a ser Salgado Filho. Então aí a gente chega lá no entreposto, o entreposto era na Avenida do Divino com Contorno, Barro Preto. Eu pegava o leite ali, entregava no Hospital Felício Rocho, ele nasceu, e eu ia entregando leite por lá mesmo. No começo dele. Hoje eu passo lá falando: “Gente, que prédio aqui, sô, eu entreguei leite no começo dele aqui.”
P/1 – Quando que foi que o senhor parou de entregar leite?
R – Aí eu cansei, sabe como é que é? Eu vou falar, eu cansei de mexer com aquilo, muitos anos com aquele trem. Aí saí, abandonei aquilo, aí fiquei um pouco à toa. Depois o moço lá falou: "Não, não, você vai trabalhar comigo lá no estado." Eu entrei para o estado. Foi justamente onde é que eu fui graduado lá. Com todos os direitos que um irmão que trabalhava lá anos e não saiu para ele, essa alumiação, né? Eu fui alumiado e ele não. Aí então foi onde é que esse chefe meu me cortou da minha alumiação. Eu fiquei lá como eu fiquei lá no estado como abandono. Fiquei como se fosse abandonado. Perdi uma nota violenta, sô. Se eu tivesse ficado lá hoje eu estava ganhando o quê? Eu tinha ganhado muito dinheiro. Depois larguei esse pessoal, casei. Continuei mexendo com leite a mesma coisa lá. Eu arrumei umas vaquinhas. Foi justamente onde é que eu estava fazendo o problema do meu telefone, eu tinha umas vacas dentro de casa, sabe como é que é? Dentro de um, como se fosse isso aqui assim, e a maior parte fechado, só tinha uma entrada. Então em nós fazer esse filme lá na casa da dona, aí eles saíram comigo lá. Eu falei: “Vem cá, vou mostrar para vocês uma coisa, vem cá.” “Eu vou entrar lá?” “Não, senhor, pode entrar.” Tinha três vacas lá e três bezerras. Aí eu falando pelo telefone e eles gravando, filmando, né, que é filmado, e as vacas de leite, _____________beleza. Fico certinho, fico certinho. Fez o filme, mas eles não podia apresentar porque a dona lá que eles tinha o negócio dela, estava tudo na coisa dela, né, para, então aí fiquei, aí ficou, passou só em São Paulo isso aí. Depois eu fiz um do telefone celular lá em frente à igreja. Essa foi filmada passou em 200 lugar. Isso foi para o mundo, mundial. Quem me conhecia, né? “Ah, o Moisés ali, está lá nos Estados Unidos.” Tinha um pessoal que tinha ido lá no Macaco: “Ah, o Moisés aqui.” Depois, na Cemig [Companhia Energética de Minas Gerais], na Cemig é, na Cemig foi, eu com punhado de fruta, né? E um cartaz ficou muito bom. Esse foi só em coisa. Saiu no bilhetinho do mineiro, saiu na revista. Eu saí na revista junto com esse presidente, o, o, como é que fala? Esse que foi duas vezes?
P/2 – Fernando Henrique?
R – O Fernando Henrique, é. Saí na revista junto com ele. Saí no bilhetinho da mineira, no jornal, revista, um punhado.
P/2 – Ficou famoso.
R – Não, não é fama, é igual eu estou falando menina: me escolheu. O que eu depois, falei: “Dona Regina, vem cá, como a senhora me…” Ela tinha uma filha e eu entregava leite para ela lá. “Dona Regina, a senhora escolher, a senhora no meio de tanto funcionário a senhora escolher eu para ser o ator desse…” Mas ela disse: “Eu sei que você tem categoria. Você pode apresentar no mundial, não pode?” “Pode.” Porque esse aqui, se você tiver uma mancha, igual por exemplo aqui mesmo, se eu tiver uma mancha na polícia, amanhã eles me pega. É ou não é? Que eu estou sendo entrevistado e é filmado, né? E eu não sei se isso vai passar para ser filmado? Vai ter passado, é, é filmado, passado? Quer dizer, que se eu tiver qualquer problema assim com polícia (risos) eles me pega, é ou não é?
P/2 – Agora, conta uma coisa para a gente: como é que era Macacos quando o senhor mudou lá?
R – Pois é...
P/2 – _____________ Macacos?
R – O Macaco era o seguinte, igual, lá não tinha eletricidade, não tinha nada disso. Não tinha eletricidade, era tudo escuro. Tinha muito doce de leite, muito leite, muito moinho fazendo fubá. Talvez você não conhece o moinho, conhece? Você não conhece não, conhece moinho?
P/2 – O que é que é?
R – Vocês são novo, né?
P/2 – O que é que é?
R – Moinho, de fazer fubá? Vocês conhecem fubá?
P/2 – Ah, tá.
R – Moinho d’água.
P/2 – Sim.
R – Tem o moinho d’água, que fazia lá, tinha muito. Tinha muita água, como tem. Só que depois entrou a mineração atrapalhou um pouco, né? Tinha muito lugar bom de pescar, assim, só peixe de água fria, sabe como é que é? Porque lá a água é fria para danar. Só tinha mais de, só mais era bagre mesmo, e o jundiá, não dava esses outros tipos de peixe. Mas essa mais era peixe de couro. Então...
P/2 – Mas como é que era Macacos?
R – Macaco era justamente, Macaco não tinha, mas lá o movimento do povo lá era somente com lenha, carvão, né? Igual eu te falei, eles levava lenha para abastecer a Maria Fumaça. A máquina, não é máquina de elétrico, a máquina de... Antigamente a gente saía de Belo Horizonte na máquina para ir para o Rio. Era tocada a lenha, tocada a água, lenha. Soltava em cima da gente uma fumaçada lá dentro. Aquele carvão desinfeliz. Eu fui daqui de Belo Horizonte eu fui para o Paraná. Nós fizemos a baldeação aonde? Barra do Piraí, parece que Barra do Piraí. Fizemos uma baldeação para São Paulo. De lá já era máquina já tocado a diesel, a diesel. Para cá nós não tinha ainda não. Aí fomos, foi onde é que eu passei em frente o campo do Pacaembu. A gente tinha um chão lá dentro do sertão, bem do sertão mesmo lá do Paraná. Menina, o vizinho mais perto nosso lá, era um dia de viagem, dentro do sertão. Eu era rapazinho novo, falei: "Ih..." Tinha, tinha, já estava começando a arranjar uma namoradinha aí, sô. E eu lá dentro do sertão. Mas não tinha nada, sô. Só vivia caçando. Nós plantamos muita roça, sabe? Lá dentro do sertão eu conheci gente lá, dentro do sertão lá, bom, eu sei que não era mentira deles porque o pessoal antigo, eles não sabia falar mentira, né? Você vive lá hoje é, se eu tivesse uma gravação igual vocês têm para gravar, ou mesmo um memória, ou pudesse ler para escrever, ou alembrar agora, porque tem muito tempo, né? A gente perdeu um pouquinho da _____________. O homem contava caso a noite inteirinha para a gente. Só caso de coisas. Esse homem, ele tinha 136 anos de vida, de idade, e ele era mais, quer dizer, ele tinha mais, saía, andava melhor do que eu, roçava melhor do que eu. Porque ele tinha técnica, ele era técnico, né? Ele tinha a tecnidade daquilo, sabia. Ele pegava, ele pegava 60 quilo nos dente assim ó, e sacudia. Não era, não era pesado e nem coisa não, porque lá não existia esse negócio. Ele pegava um balaio cheinho de milho. Milho mesmo, aquela espigona de milho, punha um cipó ali, porque não existia corda, eles não conhecia o que era corda de bacalhau. Porque antigamente mais era corda de bacalhau, nem essas coisas de coisa não tinha não. Ele amarrava aquilo ali, e: "Ó, meu filho, olha para você ver, para o velho." Pegava aquele peso assim, fazia assim ó, 60 quilos, os dentes perfeitinho. 136 anos. E a véia também. Ele, ele, quer dizer, esse pessoal eles sabia até, eles falavam para a gente, eles falavam se você tinha um verme. Eu não entendo assim, sabe? Só eles já conhecia: "É, meu filho, deixa ver. É, você é sadio." Eu falei: "Ô, seu João, vem cá, seu João." É que às vezes de lá a gente viajava. Então a gente tinha que ranchar nesse lugar. Você andava, andava, andava a noite, qualquer lugar eles dava à gente pousada, né? Igual, tem pousada aqui, você paga, etc e tal. Lá não. Lá não, meu filho. Você pensa que você dormia assim em colchão? Não, que colchão, era esteira. Era esteira no chão. Sabe o que é que é esteira? Não, não sabe. Você conhece esteira?
P/1 – Conheço.
R – Pois é, é esteira, para ir para a água. Que a esteira, quer dizer, tinha lugar que nem esteira, era couro, couro de bicho do mato. Você deitava ali, passava a noite _____________. Tinha aquela chaleira, né? E aquela chaleira ali tinha um arame, que ali tinha que ser arame. Às vezes costumava eles não ver arame, eles vir fazer com cipó. Embaixo tinha que ser um pau para o fogo não queimar, e aquela chaleira garrada ali com a água quente para você tomar chimarrão. Não tinha café, não tinha nada desse negócio não, era chimarrão. Vocês conhece o que é que é chimarrão, né? Porque no Rio Grande do Sul, Paraná, tudo é o chimarrão, né? Ih, eu era, e gamei naquele trem, mas gama igual não sei o quê. Mas era gostoso. Tinha criança lá, menino, que bebia quase uma chaleira daquela de chimarrão. O menino era pequenininho, sô. E eu falava: “Ah, gente, espera aí, corta um pouquinho.” Porque a gente tinha mais ou menos um pouquinho de noções, né? “Olha, corta um pouquinho desses tanto mate que esses meninos, sô. Esses meninos quando chegar a certa idade eles têm mais barriga do que mesmo corpo, né?” “Ah, meu filho, isso aí não, eles vai crescendo e vai tarimbando.” Eu falei, a gente não podia falar nada porque eles era muito mais sabido do que a gente. “Não, meu filho, se eles quer pode deixar.” Menina, lá tinha esses, esses pernilongos, parecia até um helicóptero, grandão, dentro da mata. E tinha também o fumo, esse fumo, né? Eu fumava aqui esse cigarro de palha, de papel, e lá a gente tinha que fumar aquele cigarro de palha mesmo. Tinha aquele fumão grosso assim. A gente não sabia, cada tragada, quase que a gente cambaleava para cair.
P/2 – Forte?
R – É, forte mesmo. E aqueles menininho fumava aquilo. Você chegava em uma casa, por exemplo, lá ia eu, a minha dona e três filhos. Lá se tinha filho, se a gente já tinha filho, era, o homem fazia o meu cigarro, a mulher fazia o cigarro da minha dona, e os meninos fazia o cigarro dos meninos. Então, e aquele trem. E a gente estava lá dentro do sertão, dentro do sertão mesmo, aí você sabe que dentro do sertão tem aquelas onde é que vai, essa febre maleita. Dizem que é febre maleita. Mas não é totalmente devido à água não. É como se fosse, eu, a luz da gente, eu toda vida, graças a Deus, tive uma boa luz. Aquela água estava empoçada ali você não podia tomar dela. Você tomava dela com poucas horas você estava ali, ó, _____________ e matava mesmo. Nunca vi isso. Aquele pessoal lá dava à gente um chá, curava. Mas a gente não sabia. E ali dava cada pernilongo, puxava a gente mesmo, cada pernilongo parecia um helicóptero. Aí a gente puxava uma tragada daquele cigarro, vinha aquilo que saía zunindo, porque aquela fumaça eles não gostavam de jeito nenhum, que era fumaça brava daquele cigarro, né? Eles saía doido. Aí, sofri demais gente. Dormi dentro do sertão, perdido, menina. Eu saía assim, a gente antigamente caçava. Meu cachorro saiu acuando, tocando o bicho, eu saí atrás. Lá você ia mais na parte da tarde ou da noite, e entrei dentro do sertão. E achar o lugar? De jeito nenhum, não achava. Eu achava que eu estava indo embora, mas estava cada vez entrando mais dentro do sertão. Veio a noite, né, que lá era mata. Um _____________ desse aqui dava paulada que a gente, nós quatro aqui quase que não abaixava. Era um longe do outro. Ali, bem aquela coisa assim. Você não conseguia. Aí eu, e lá tinha muito bicho bravo, né? Muito bicho bravo. Então eu tinha um facão muito bom, uma espingardinha, um revólver. Tirei aquelas folhas assim, mais ou menos de volta, sentei em uma tronca de um pau, tinha uma encosta boa, eu falei: “Aqui os bichos não me pegam.” Eu com o facão, botava o facão assim, passando a noite assim para ver se eu escutava galo cantar. Porque eu tinha muita criação de galinha, tinha muito galo. Para mim prestar atenção para mim achar a direção. Que nada, sô. Passou noite, deu aquela garoinha de chuva, caía aqueles pingão em mim. Eu ficava ali. Quando o dia clareou eu falei: “Agora eu vou achar, certo?” seguinte _____________. Daí começou surgir uma nascentezinha d’água. Eu falei: “Isso aqui, essa água, ela tem que cair ou no Rio Capivari, ou no Rio Faxinal, uma dessas tem que cair.” Dizia: “E chegar em algum lugar. Lugar bom, lugar ruim.” Fui embora. Falei: “Gente, eu não podia estar muito longe. Onde que eu vim parar?” Eu pensando, sô, dentro do _____________, para a gente ir, _____________ não tinha jeito. Aí a água foi crescendo, graduando, graduando, graduando. Chegava em cada lugar, tinha cada peixe desse comprimento assim. Cada um bonito. Eu falei: “Ih, gente, quem achar, assim, era cada bagre, né?” e essa, cará, aquela _____________ mesmo. A gente passou por aqui. Quando eu vejo, thcóóó, caí dentro do rio. Quando eu cheguei do rio, era, eu morava mais na beirada do Rio Capivari, e tinha o Rio Faxinal, que desaguava no nome de Areia Branca. E eu morava em um tal de Pinhalzinho, para cima. Assim, não era muito longe. Quando eu cheguei no rio, eu falei: “Gente, isso aqui é o Rio Faxinal, sô?” Olha, eu não andei lá, eu não andei uma média mais ou menos daqui na pensão ali da, do, da comida. Eu achei um trilho que saía da Casa Branca, do Areia Branca, para ir para a minha casa. Eu falei: “Ah, mas não pode…” Lá eu conhecia, né? Eu falei, aí eu subi: tum, tum, tum, tum. Cheguei em uma roça minha, na nossa roça. Eu vivia sozinho lá, em deserto. Só tinha a roça lá, e muito porco, muita galinha. Cheguei lá já de noite, já escurecendo. Eu falei: “Poxa, que alívio.” Eu dormia no colchão de palha. Eu fiz um lugar que bicho nenhum não me pegava. Lá eu já tinha muita guaritana, esse palmito, guaritana, palmito. Jussara. A guaritana é que fazia a casa, fazia telhado de casa. As folhas dela. E eu rachei muito aquele palmito jussara, e fiz, fazia, parecia uma tábua, né? Eu só tinha que rachar ela. Aí fiz aquilo. Nem, acho que nem _____________ não me tirava lá. Tinha muita palha, fiz aquele colchão grande, né? Colchão de palha. Vocês nenhum não conhece. Não alembra disso. Vocês nunca usou esse tipo de coisa, né? Antigamente era por a palha... Eihn?
P/2 – O colchão ficava na cama ou em um jirau?
R – Não, era em um jirau, jirau de pau. Não tinha esse negócio de cama, esse jirau de pau. Fincava quatro pau de forquilha, e botava outro assim, e botava ali umas ali, e botava o colchão ali. Quando o colchão ia ficando muito grande, você dormia aquela palha esticava. (risos) Era gostoso. Quando ele ficava muito macio você enfiava a mão ali, que tinha uma lugarzinho de enfiar a mão, metia o dedo assim, e botava lá. ______________. Você entrava lá dentro do sertão, no meio da bicharada, eu ali dentro, eu nem tinha medo não. Eu não tinha medo de lugar nenhum, eu não tinha medo de nada assim.
P/2 – E como é que fazia com luz?
R – Ah, menina, que luz? Lá não tinha luz não, o fogo me alumiava. O fogo me lumiava lá. Você não podia deixar o fogo apagar não. E você pensa que tinha fósforo? Não. Você pensa que tinha esse negócio de lamparina, não tinha, querosene, não, nada disso, era só o fogo mesmo. Você acendia, você tinha taquara, você andava longe com a taquara acesa, né? Acendia taquara você alumiava o lugar para ir buscar água na bica. Para dar banho, a gente tomava banho de caneco. Quer dizer, eu não tomava banho de caneco. Antes era, porque antigamente era bacia, né? Vocês não alembra disso. Tudo hoje é, hoje em dia está tudo, colchão. Depois começou a surgir o colchão de capim. De capim. Como eu era muito amigo de um senhor, ele era delegado, sabe? Ele era capitão. Como eu era muito amigo, quando eu casei, ele me deu um colchão vindo de São Paulo. Colchão de mola. Um colchão, ninguém tinha isso lá no Macaco, não. É, colchão de mola. Eu digo que é. E todo mundo admirava, porque um colchão com a mola só, era um colchão bom, bacana. Durou muito tempo. A gente podia trocar o pano dele. De maneira que eu já sofri demais nesse mundo. Se diz, sofri não, graças a Deus eu estou com 76 anos. Menina, eu estive internado uns dias, era para eu ter saído com seis dias. Que eu operei as vistas, de glaucoma. Era para mim sair com seis dias, eles me prenderam lá 16 dias. Me prenderam lá 16 dias, sabe por causa de quê? Eu estava sendo um enfermeiro lá, ajudando os outros. (risos) Quando eu saí de lá, né, ele falou: “Ô, seu Moisés, é o seguinte: eu, nós vamos te liberar, senão você vai acabar, você vai acabar ambientando aqui e não tem uma pessoa que, você é amigo de todos!”
P/2 – Mas o senhor conversava com as pessoas? Ajudava?
R – Não, ajudava eles. É porque lá a pessoa quando chegava lá no hospital, né, é o melhor hospital que tinha antigamente, aquele Milton Rocha, lá na Rua Santa Catarina. Eu era muito amigo da médica que começou me tratar de glaucoma, né, então ela falou: “Seu Moisés, eu vou te dar…” Ela ia ganhar neném, ela pegou uma licença e falou: “Eu vou entrar de licença, mas eu vou, você vai ter que operar. Eu vou te dar o melhor médico, vou te conseguir, para ir tratando de você até ela liberar para você o lugar para operar.” Aí eu tratei lá. E lá eu arranjei amizade. Arranjei amizade lá com o pessoal, e eu olhava eles. É que eu ia lá, por exemplo, para você fazer um exame de vista, você pinga um colírio nas vistas. E a pessoa não passa a enxergar. Eu tirava ele, levava para o quarto, pegava outro, levava, ia com eles, né? Chegava lá pingava, não enxergava, levava no quarto. Ficava a noite inteirinha assim. Eu tinha muita, muita capacidade. Eu não tinha, assim, coisa de ficar parado. Eu fui um dia um guia de um senhor, ele era marinheiro. Eu não sei, eu pelejo, _____________, eu falei: “Eu preciso lembrar o nome dessa pessoa, o nome desse lugar. É um lugar de navio, eu não sei se é para o lado do rio.” “Como é que chama?” “Espera aí, sô. Eu sei que tem navio lá.” Ele é hoje aposentado, muito velho. Ele era, ele foi, ele acompanhou, se andou com o Capitão Galdino. Aquele cangaceiro. Você já ouviu falar?
P/2 – Já.
R – Ele andou com esse cangaceiro, andou por isso tudo aí.
P/2 – Então vamos lá, qual o senhor vai contar, retomando a nossa entrevista com o senhor Moisés, que é um contador de causo, nato...
R – É, causo verdadeiro, causo verdadeiro...
P/2 – O senhor vai contar...
R – Bom, aí de um boi...
P/2 – O que é que é um causo verdadeiro?
R – É, acontecido. Quer dizer que foi acontecido, né? Então esse é verdadeiro. Agora, eu tenho um que não é bem verdadeiro não. Esse vai ser uma coisa de pescador. É, pescador tem sempre aqueles causinho dele. Então tá. Então vou começar do boi. Esse é verdadeiro. E do Chico Simeão também, é verdadeiro. Então do boi, era um açougueiro que matava boi. E toda, todo Sábado de Aleluia, ele matava o boi. Isso foi lá no Macaco mesmo. Aí então ele, e o boi era, só podia abater ele depois de nove horas, sabe? Porque tinha o respeito, né? Até nove horas, e antes de nove horas ainda era sagrado. Era sagrado. Aí quando foi o dia ele prendeu o boi lá e falou: “Ah, eu vou abater esse boi é agora.” Ainda não era nove horas, era bem mais cedo. Ele chegou, sangrou o boi, esse tipo de coisa, o boi caiu ele começou a tirar o couro. Aí já tinha meio boi sem couro. E o boi levantou e correu, e foi lá para a beira do rio. Tem o córrego, né, tem o riozinho. Aí lá que ele acabou de matar o boi, destrinchou lá, e lá eles puseram apelido no rio: Rio do Couro. É, (risos) Rio do Couro. Isso foi acontecido, isso foi verdade. Agora, desse, essa é isso aí. Agora, do Chico Simeão é verdade também. Eu sou nascido em município de Esmeralda, chama Caracóis. E eu tinha um irmão que trabalhava em uma fazenda. Muitos anos trabalhava lá. Eu era pequenininho, minha mãe lavava roupa e eu ia lá levar roupa para ela. E tinha um senhor que, um pretinho mesmo, preto, velhinho, e ele trabalhava lá e antes do meu irmão. Mesmo junto com meu irmão lá. Mas ele já estava muito velho, não aguentava mais serviço. E esse fazendeiro dava a ele as coisas para comer. Ele não aguentava mais trabalhar. Antigamente não tinha esse negócio de aposentadoria, não tinha indenização, não tinha nada. A pessoa trabalhava a vida inteirinha, saía dali, coitado, com uma mão na frente a outra atrás. (risos) Meus irmãos mesmo foi isso, saiu assim. Não ganhava nada. Depois que o Getúlio inventou essa aposentadoria, essa indenização, carteira assinada, né? INPS [Instituto Nacional de Previdência Social], pagava o INPS. Bom, aí esse senhor, é pretinho mesmo, velho. E eu era bem longe de casa. Então eu vou lá levar roupa ele já estava lá, que ele ia bem de madrugada. Aí lá esse fazendeiro tinha uma vasilha que chama picuá. Picuá vocês não entende. Picuá é um saco dividido em dois, sabe como é que é? Para a gente carregar você pode botar o peso, você não precisa de, aí você __________ e cria, mareado. É como você ter duas sacolas. Uma comparação. Só que ele era de pano, esse saco de açúcar. Eles costurava ele ali direitinho, era mais comprido. E ele tinha duas divisão, uma para a frente outra para trás. Você botava, dividia ali o trem. Então ele ganhava aquele toucinho salgado, aqueles toucinho grossão, salgado, ele punha em uma parte. E na outra parte ele botava ali arroz, arroz era limpado no pilão. Não tinha esse negócio de marca, esse arroz limpinho, coisa não. Ele era limpado no pilão. Então botava arroz, levava arroz, você escolhia lá, botava fubá, que ele tinha o moinho. Moía o fubá ali. E muitas coisas. Então ele pegava aquele trem, ele era muito velhinho, ele morreu com 120 anos. Agora, isso aí foi lá em Caracóis. Aí eu apanhei um pezinho, mas pequeno ainda, e vim para Belo Horizonte.
P/2 – Mas esse senhor, como que ele chamava?
R – Chico Simeão.
P/2 – E ele usava o picuá?
R – Não, é, ele pegava, ele carregava isso aí no picuá, eu até que carregava para ele. Quase aquele trem arrastava no chão que eu era tão pequenininho. Mas eu tinha força e ele muito velhinho, e ajudava ele trazer. E passava um regão d’água para ir para a fazenda, muita água mesmo. Para eles tocar moinho, né? E a gente caçava beirando esse rego. Tinha lugar que a gente atravessava ele, tinha aqueles mata-burro, tinha aquelas pontinha, né? Aí esse senhor ele descia assim para tomar água, nesse rego d’água. Eu ficava olhando ele tomar aquela água. E eu ficava olhando o pescoço dele. Daí ele levantava: “Vamos embora.” “Vamos embora.” “Ih, seu Chico, as vacas está tudo ali no caminho, elas vão pegar nós.” “Não, meu filho, pode me acompanhar as vaca não pega nós não.” Ele era meio macumbeiro mesmo. Ele tinha uma mandinga danada. Ele tinha muita oração boa, forte. Aquele da cabaça eu contei para vocês ontem, não foi?
P/2 – Foi.
R – Então essa aí, aí nós vamos. Aí até que eu entrava, atalhava para mim chegar na minha casa. E ele morava mais em um arraialzinho, mais para baixo assim em um arraialzinho. Eu ainda levava as coisas para ele lá, mais perto para ele. Passou esse tempo, muito tempo mesmo, muito tempo. Ele tinha um neto. Eu não conhecia, né? Não conhecia nem, eu só conhecia uma filha dele. Eu não sei se era essa, qual era que era, que ele tinha diversas filhas. E essa filha casou, e ele, ela adquiriu filho. Esse filho já estava adulto já, trabalhava de pedreiro. E lá onde é que eu moro lá no Macaco, tinha um senhor lá, já estava comandando lá, que era meu vizinho. Ele morava na cidade, mexia com geladeira. E eu quem olhava para ele esse sítio. Menina, esse pedreiro ele estava assentando os azulejos assim do banheiro e como eu estava olhando, como eu ia eu olhava esse Chico Simeão avô dele, tomando água. Eu fiquei olhando ele assim, falei: "Gente, como esse pescoço parece do Chico Simeão." Mas tinha anos que eu não via, nem conhecia ele. Nem era essa mãe dele não era nem casada ainda. Eu olhei bem assim, esse, mas é o pescoço do avô dele. Pensando eu comigo. Lembrei do Chico Simeão. Olhei bem a cara dele, falei: “Eu vou, não custa eu perguntar. Não vai levar a mal. Não vou fazer discriminação nenhuma, né?” Eu peguei, eu falei: “Ô, rapaz”, falei o nome dele, que agora eu não me alembro o nome dele, falei: “Vem cá, você por um acaso, você não tinha um avô com o nome Chico Simeão, não? Lá de Caracóis?” Ele pegou o azulejo assim... (falha na gravação) Não, eu ia fazer o sentido porque ele levantou, né, e levantou o azulejo (FALHA NA GRAVAÇÃO) estava assim, e eu _____________ olhando o azulejo. Ele olhou para mim debaixo em cima, ele falou: “Mas, você é de Caracóis?” Eu falei: “Sou.” Ele falou: “Mas você conheceu o meu avô?” “Muito, eu trabalhava na fazenda do Alcino Camargo.” Ele assustou mais ainda, porque foi verdade, né? Que a mãe dele que contava, ela acho que ela ainda era viva ainda. Esse tipo de passagem eu não gravei muito. E chamou o _____________ falou: “Olha, o Moisés, eu nunca tinha nem visto falar nele, ele é lá de Caracóis, conheceu meu avô Chico Simeão. Você sabe que meu avô morreu com 120 anos? Morreu agora há pouco tempinho aí, tem poucos dias, pouco tempo. Já pensou? Ele é meu avô mesmo.” Ele pegou e falou: “Mas, vem cá, por que é que você me conhecer, não me conheceu e me disse isso? Me achou em mim uma aparência? Porque eu sou novo.” Ele não era muito assim novo, já era assim adulto, pedreiro e tal. “Nunca te vi, eu sei que eu mudei de lá aqui para Olhos D’água, porque que você me disse isso?” Eu disse: “Olha, eu vou explicar. Vai entender bem direitinho. O seu pai, o seu avô, o Alcino Camargo dava a ele produto para alimentar. Porque ele trabalhou lá muitos anos e seu Alcino dava a ele, toda semana dava a ele uma quantidade, que não dava ele de mais porque ele não aguentava carregar, que ele era muito velho. E eu sempre ia levar roupa lá para o meu irmão, e dava para nós ir junto. Então eu gostava quando nós ia junto.” “Ele andava muito devagarinho?” “Não, ele andava bem, ele já era bem velho mesmo. Então seu avô descia para tomar água, ele agachava assim para tomar água e eu ficava em pé olhando o pescoço dele. Aí você está aí assentando o azulejo aí e eu estou olhando o seu pescoço e alembrei dele.” E olhei bem seu rosto, falei: “Olha, tem uma semelhança. Pode que não seja, mas…” “Você acertou em cima da mosca.” Chamou o patrão dele, falou: “Olha, o Moisés me conheceu o meu pescoço pelo pescoço do meu avô. E ele acertou em cima da mosca, está certinho.”
P/2 – Mas, qual era a característica do pescoço que seria o seu...
R – É diferente, era uma coisa inevitável mesmo. O pescoço dele era tão pretinho, né, que aquilo até alumiava. E tinha aquelas rugazinha, e eu achando, sabe como é que é, aquela coisa imitando mesmo. Eu vi, eu falei: “Esse _____________ não tem aonde sair, é parente mesmo. Se não for imita mesmo.”
P/2 – (risos)
R – E foi verdade. Menina, mas isso tinha passado muitos anos, gente, muito tempo. Esse menino, com quantos anos que ele podia ter? Uns 20 anos, 20 e tantos anos, uai. E ele nem nascido ainda não era. Que eu já estava com quantos anos? Eu já estava aí eu já estava com 70, 72 anos. Quer dizer, não era isso tudo. Quer dizer, passou muito tempo para mim diferençar, eu achei aquilo, é, não, mas imitava mesmo. Se você olhava o pescoço de um, olhava o pescoço do outro era igual. O que eu achei gozado foi de eu recordar, né? Ele assim assentando azulejo, eu estava com tempo, né?
P/2 – Mas o senhor fazia alguma traquinagem com esse Simeão? Não?
R – Esse Chico não, ele era bravo mesmo.
P/2 – É?
R – É. Um dia ele passava assim em frente a minha casa, assim, onde é que eu morava, e ele era violento no olho. Ele era maldoso, não ele não era maldoso, ele não gostava de ter discriminação contra ele. Era um preto mesmo. E ele não gostava disso. E eu também nunca gostei. Eu nunca, minha mãe me ensinou que não risse de ninguém, que nós todos somos iguais, _________. E eu nunca tive assim, para mim eu não acho defeito, sabe como é que é? Vamos, todo mundo tem aquela natureza que Deus deu. Eu não vou fazer discriminação. Mas a coisa impressionante, no ele passar assim eu achei, eu estava até arrancando batata doce, vocês conhece batata doce. Eu estava arrancando batata doce, e achei a batata doce assim meia esquisita e danei a rir. Era criancinha, era criança. E ele escutou aquilo. Ah, menino, foi só de eu virar assim, eu quase que eu morri.
P/2 – Por quê?
R – É, mas tinha a benzedeira muito boa. Aí: "Ô, meu filho”, a minha mãe, “Ô, meu filho, que é que você arrumou?” Aí ela tinha visto o Chico Simeão. Ela falou: “Ah, pode deixar que eu vou, você vai em uma tal de Maria de Leves.” a Maria de Leves ela chamava Dona Maria, e o marido dela chamava Leves, né? Então todo mundo botava o nome do marido com a mulher. Ela boa para benzer. Vinha benzer gente com alecrim, outra hora com arruda, benzia que saía na hora também. Boa benzedeira.
P/2 – Aí o senhor foi lá benzer?
R – Aí eu fiquei bom, eu sarei. Minha mãe falou: “Ô, meu filho, eu já falei para vocês não rir dos outros?” Puxava a orelha mesmo. Qualquer coisa que a gente errasse, nossa mãe, era muito corrigido. Eu falei: “Não, mãe, eu não ri de ninguém. Eu ri da batata doce que eu estava arrancando ali. Eu não ri de ninguém.” Menina, tem gente, vou incluir nesse mesmo sentido, essa é uma pequenininha a palavra. Vocês sabe bem o que é que é cobra, não sabe? Conhece?
P/2 – Hum, hum.
R – Então tá, a cobra tem uma que não, uma ela sobe, tem uma que ela vai até nas árvores, pega o filhote de passarinho e come. Uma cobra. Essa não tem veneno, essa não é muito venenosa não. Porque tem a jararacuçu,, tem a cascavel, e tem esses outros, que ele é muito venenoso. Ele, para pegar um passarinho, ele não precisa de andar não, ele não precisa. Uma distância, conforme a distância, ele atrai ela, sabe? Ele atrai o passarinho, o passarinho vai ali na boca dele. Isso eu já vi e é verdade. Ele mesmo com o olho ele atrai. E lá na minha terra tinha um senhor do mesmo sentido. Ele não podia ver, assim, ele mexia muito com criação, gostava muito de criar passarinho na gaiola, para aquilo cantar e tal. Então, mas ele não podia encarar no passarinho, ele mesmo, ele sabia. Ele sabia que ele tinha um olho forte. Um passarinho podia está lá na grita daquele pau, ele pelejava para pegar ele cá ele não vinha na gaiola, ele já era velhaco, né? Ele não era bobo, ele já tinha fugido de outra gaiola ele via aquela ele saía fora. Mas ele cantava ali, e ele olhava aquele passarinho assim, pelejava, botava alçapão, botava tudo lá para pegar ele, ele não vinha. Quando ele não vinha, aí ele estava com pouco tempo ele batia o olho no passarinho assim, e ó, o passarinho vinha e caía lá no chão. Aquele passarinho não prestava mais, morria. Eu saí assim e peguei um curió. Curió era um passarinho muito caro, não sei se vocês entende disso, não entende, né? De passarinho vocês não entendem. Sabe, é um passarinho que canta muito bonito, e ele é caríssimo. Então, mas a gente, eu peguei um curió desse. Eu botei ele na gaiola, estava lá, até que esse filho do Simeão passava pertinho assim da minha casa, e esse homem passou. Ele chamava Juquita esse homem. Não esqueço do nome dele. Seu Juquita veio, passou assim: “Ô, Moi!”, que eu tinha apelido, eu chamava Moisés e eu tinha apelido de Moi. “Ô, Moi, quanto você quer nesse passarinho?” Eu falo: “Não, seu Juquita, eu não vou vender não, eu peguei isso aí esses dias já está até querendo cantar.” E ele era alucinado por passarinho, né? “Me vende ele.” Eu falei: “Não, seu Juquita, não vou vender ele não.” Ele ficou lá assim uns poucos minutos. Eu saí assim, quando eu voltei o passarinho já estava ele no fundo da gaiola, morto. Eu danei a chorar, que eu era pequeno, né, fui gostando do passarinho. Eu falei: “Mas que é isso?” Eu falei com uma pessoa, como é que era? Mugango, ele chamava-se seu Mugango. Eu trabalhava com ele, às vezes, eu ia capinar uma _____________ com ele lá, com a mãozinha assim, né, porque, eu falei: “Ô, Seu Mugango, peguei um curió, um passarinho bacana, pretinho assim, e ele morreu. Seu Juquita ficou doido para mim vender para ele.” Quando ele virou: “Ah, meu filho, o Juquita viu?” “Viu.” “Ah, então é o olho dele, ele mata.” Gente _____________
P/2 – É um causo verdadeiro?
R – Esse é verdadeiro, isso aí é verdadeiro. (pausa)
P/2 – Então vamos lá...
R – Então tá, a causa do boi?
P/2 – O causo do boi.
R – Não, não é do boi, é do pescador. O pescador é uma pequenininha, mas é um caso. Esse aí é um caso, né? Então tinha dois senhor, todos os dois trabalhava em uma firma só. Então vamos supor que foi na Souza Cruz, a fábrica de cigarro. E eles dois morava tudo em uma rua só. Então um tirava férias em um ano e o outro tirava férias no outro ano. E eles ia lá no Poço do Caixão, pescar. Isso é lá no Rio Pará. Então, você conhece, você sabe esse relógio de bolso, né? Até era uma mega ferradura, tinha o bolso, tinha uma correntinha. O primeiro saiu de férias, e todo ano que eles saía de férias um ia pescar. Todos os dois ia pescar, só que um ia em um ano e o outro ia no outro ano. Aí esse foi pescar, com o relógio, era do relógio o primeiro, do relógio. Foi pescar, chegou lá ele foi olhar as horas, o relógio foi, caiu dentro d’água. Aí ele falou: “Pronto, agora eu fiquei sem meu relógio.” Foi embora e tal, chegou lá, contando para o colega dele, falou: “Meu relógio caiu lá dentro do poço, lá.” “Mas é impossível, agora você está sem ele.” Aí ele no outro ano ele foi pescar. Ele chegou lá, ele estava ali, que ele mexeu daqui e dali umas horas ele esbarra na correntinha do relógio, puxou: “Ai, meu relógio aqui.” Ele ficou todo satisfeito. “Meu relógio. Quanto, tem um ano que o relógio está aqui.” Ele olhou, o relógio funcionando direitinho. Isso é _____________. O relógio funciona direitinho. Chegou lá, chamou o colega dele, falou: “Olha aqui meu relógio, funcionando.” Contava direitinho as horas, certinho. Ele era de corda, dava corda nele para ele poder funcionar. Um ano lá trabalhando dentro d’água. Aí o outro fechou aquilo, falou: “É, tá bom.” Aí o outro foi pescar lá, né? O outro não tinha relógio não. Aí o outro foi com lampião. Chegou lá, acendeu o lampião de noite, está lá, a isca, o anzol, está lá pescando. Sai um gambá de lá do mato, menina, e pá no lampião dele, puf, lá dentro do rio. Coitado. “Agora fiquei sem o lampião.” Foi para a barraca, falou: “Sem lampião aqui não vai ter jeito.” Veio embora, quando foi no outro dia veio embora. Chegou lá: “Você não acredita uma coisa!” “Que é que foi?” “Ó, (risos) eu estava lá no poço pescando veio um gambá de lá, trombou no meu lampião, jogou ele dentro do rio, aceso.” Tá bom. Passou no outro ano ele foi pescar. Chegou lá, pegou o lampião, é, aceso, estava aceso. Ele foi para a casa do: “Ô, colega, vem cá, vem aqui, olha meu lampião. Peguei igual você pegou seu relógio. E peguei ele aceso.” Aí ele falou: “Ah, mas que é isso, você pegar o lampião aceso dentro d’água?” “Não, o seu relógio não trabalhou lá sem corda?” (risos) É essa, piada de pescador.
P/2 – (risos)
R – Serviu? Tá boa ou não está? Piada mesmo, é uma piada de pescador. Um pegou o anzol e o relógio dele ficou um ano lá trabalhando, certo? E o outro ficou o lampião aceso dentro d’água um ano. (risos)
P/1 – E o causo do açúcar?
R – Tá, não. O caso do açúcar esse é verdadeiro também. Esse é verdadeiro mesmo. Lá na minha terra, isso era já lá no Macaco, sabe? Ele, eu não sei bem assim o sobrenome dele, ele chamava João. O seu João. Olha, dos Macaco em Nova Lima eu vou botar 20 quilômetros, deve de ter mais. E dos Macaco, do arraialzinho na casa dele, devia de ter um quilômetro e meio… Mais, dois quilômetro também. Então botando um pouquinho de menos. Quer dizer, que vamos supor que vai dar dois, 22 quilômetros, né? Vinte e dois quilômetros. Isso é verdadeiro, não é mentira não. Isso, aí, e ele mexia com doce, fazia doce de leite, que ele usava muito açúcar. E açúcar ia só em Nova Lima que vendia aquele saco de açúcar. Antigamente o saco de açúcar era 60 quilos, agora que passou para 50. Aí ele comprava o saco de açúcar lá, ainda comprava mais uns outros trenzinho. Botava na capanga. Capanga é feito de pano. Punha aqui, outra hora vinha na mão. Ele pegou e, pegava o saco de açúcar, punha na cabeça ali, punha na cabeça, e era estribinho, trilho mesmo, não era estrada larga assim coisa. Era trilho. Ia embora. Passava dentro do Arraial com esse saco de açúcar, não botava no chão nem para nada. Ele era fortudo mesmo. E muita gente via aquilo. Ele já era, acabava aquele fazia o outro. Fazia aquilo direto e reto, você encontrava mesmo. E fazia esse sentido mesmo. O pescoço ficava até inchado, coitado (risos) de tanto, era ali mas era costume dele. E os outros, aqueles pessoal mais antigo, mais velho, arranjava assunto com ele, assunto comprido para ver se ele punha o saco de açúcar no chão. Não, não punha. Você podia contar para ele diversos tempos, muito tempo ali, que ele ficava com o saco de açúcar rodando para lá e para cá assim, conversando com o saco de açúcar na cabeça. E só ia tirar na casa dele. 60 quilos. Ele andava 22 quilômetros, vou botar 22 quilômetros, mas até dá mais. Pode perguntar para a Íris que ela te fala a quantidade. Ela tem carro, ela mede _____________. Isso é verdadeiro, uma coisa impressionante.
P/2 – Ele era forte mesmo.
R – Forte. E ele não era grandão não, não era homem fortão, gordão não. Lá onde é que eu moro lá no Macaco, ele, lá nós tinha, logo, logo na ocasião que eu morei, que eu comecei, que eu mudei para lá, lá não tinha serviço. O pessoal só mexia com lenha, sabe? Eles andava muitos quilômetros para levar, trazer lenha, aquela Maria Fumaça, se alembra do trem de ferro era tocado à fumaça, à, com lenha. Era tocado à água e lenha, né? Vocês não conheceram isso. Menina, era gozado, eu fui daqui de Belo Horizonte para o Paraná, quer dizer, até em Barra do Piraí a gente ia nessa Maria Fumaça. De lá para lá parece que era a óleo, parece que era. Aí, menina, (RISO) essa Maria Fumaça ela jogava tanta aqueles pozinho de carvão na gente, é gozado mesmo, ela quando ela apitava: "Uh, uh, uh", era bacana mesmo. Você precisa de ver. Tem ela ainda funcionando. Às vezes acontece até de esbarrar lá. Sabe por que Ouro Preto é um lugar de muita, de muita coisa assim de turismo, sabe? Se vocês for esbarrar lá ela funciona. Acho que é Ouro Preto? Acho que é em Ouro Preto mesmo. Ela funciona lá no mesmo sentido, se tocar à lenha, tem a linha, tem tudo. Só que trecho pequeno. E antigamente era de Belo Horizonte até no Rio. Ia no Rio de Janeiro.
P/2 – Seu Moisés, o senhor estava falando, explica para a gente como é que é o alambique lá de Macaco, que o senhor estava explicando como é que fabrica cachaça.
R – É, o alambique é igual, é, o alambique eu comecei, essa não foi falado não. Não, então tá. O alambique de cachaça é o seguinte: você tem um coxo grande, coxo grande. Você tem o canavial, tem aquele coxo grande de madeira. Ele é muito bom de madeira. E a madeira que não, você curte ele com água, depois você põe a cachaça, a garapa no vaso. Mas geralmente a maior parte da madeira é feito com madeira mesmo que não veda água, não passa água não. Aí então você molha a cana ali, enche ali de garapa. Essa aí, aí você põe um fubá ali, com 40 minutos, essas cachaças que faz hoje. Sabe, a purinha mesmo? Eu vou explicar como é que ela é, que eu fiz. Então ali com pouco tempo ela já está, já está azeda, já está o tempero ali. O alambique, ele pega, vamos supor que ele pega cem litros, vamos supor assim: cem litros. Você vai botar só 50 de garapa. A tampa é igual fosse uma panela de pressão. Ela não tem aquele furo com aquele trem que roda ali? É a mesma coisa aqui. Só que aquele não roda não, ele é fixo. E ali tem um conduite. Um conduite no alambique ele chama cabelo. Ele comprido, ele é assim cheio de voltinha. E aí ele sai de lá do alambique e vai para fora. Você vem com um cano de água ali, você enrola um pano naquele cabelo, do alambique é o cabelo. Então você enrola um pano ali e aquela água vai cair naquele pano. E ali vai ferver. Ali ele vai ferver. E o suor que é a cachaça. Então se você não botar a água, ela passa ali e avoa. Vai embora. Não, não cai cachaça na vasilha não. Vamos supor que você vai botar 50 litros de garapa, vai sair ali uma média de 20, 22, 23 litros de cachaça, mais pura. Depois passa a cair uma água, uma água fraca. Ela tem um pouquinho de álcool mas é pouco. Um pouquinho de cachaça, mas é pouco. Não vou falar álcool, né? É, evitando. Aí aquela você guarda também. Vamos supor que deu, desses cinco litros, dos 50 litros deu 25. Você vai fazer novamente, porque consome muito, então tem que fazer muita. Você volta aquela que foi água fraca, você repete ela ali. Então ela, coisa ali ela já aumenta um pouco mais. Que ela pega mais um pouquinho de vitamina e aumenta mais. Vamos supor que vai dar 25, vai dar 30 litros. Aumenta mais uns cinco litros ali, um pouquinho a mais. Bom, isso aí essas cachaça de comércio, essas cachaça de muita fabricação. Agora, uma cachaça purinha mesmo, aí, eu hoje eu não estou muito bem a par das horas não, os dias, sabe? A quantidade de tempo. Porque a gente perdeu esse tempo, _____________. Eu tinha um alambique, eu não tinha não, lá no Paraná tinha um alambique lá. Ele _____________ de 50 litros, igual eu estou falando. Então nós pusemos o coxo lá, fez aquela garapa. A garapa purinha mesmo, vamos supor, o coxo ele é comprido. Um coxo assim e comprido. Então você vai no paiol de milho, tem que ser o milho, ou se não tem você vai no lugar que tem. E você tem dois metros de comprimento, ou um metro e meio, você vai medir um palmo assim de, no coxo lá. Aí você vem com uma espiga de milho, ali de qualquer jeito, você tirou só a palha dela e põe ali, de palmo em palmo ali, aquela espiga de milho. E vai deixar. Aí leva, eu sei que parece que leva mais de quatro dia, sabe, direto assim. Você vai olhar assim, está aquela escuma, aquele trem. Cheiroso, menina. Porque ela azeda um pouco. Para você fazer um bom vinagre é só você botar um pouquinho de bago de milho em uma garapa, você faz um vinagre daqui. O primeiro vinagre. O melhor vinagre que existe. Então, e essa fica aquela espuma bacana. Eu falei, olhei assim, eu falei: “Ah”, a primeira vez que eu ia fazer. Eu falei, aí eu fui ali, pus ali a garapa, arrumei a lenha tudo direitinho lá, botei a água para correr lá, tudo direitinho. Arrumei tudo direitinho, botei a garapa, acendi o fogo. E fiquei horas. Aquilo levou tempo. Começou, quando eu vi, nessa época eu gostava do golinho, eu estava novinho, eu tinha um limite e gostava muito pouco. Eu estava lá longe assim, jogando milho para uns porco. Eu olhei assim falei: “Gente!” Larguei assim, pulei do paiol do milho, a vasilha já estava quase cheia de cachaça, menina, uma cachaça que cheirava. Eu falei: “Gente, que é isso?” Eu fui esperando, esperando, eu mais ou menos fui. Você controlava assim, e eles falavam, os velho lá falou: “Olha, cachaça purinha.” Uma dose de pinga, ela mesmo, desse tipo que eu estou te falando como faz, uma dose de pinga, aqui não, ali. Você chega ali, você joga ela para cima, não cai uma gota no chão. Não cai não. Essa purinha. Você bebe uma dosinha, você fica satisfeito. Agora, aqui não, aqui cai, porque ela bate ali, né, ela não tem o ar. A purinha.
P/2 – Joga? Como é _____________
R – Você pode, não, vamos supor que você vai pegar uma dose de pinga, uma dose assim, né? Você chega ali e faz assim, ó.
P/2 – Ela volta para o copo?
R – Não, ela não cai no copo e não cai em lugar nenhum.
P/2 – Ela evapora?
R – Evapora, some. É, ela some. A pura mesmo. Essas outras não. Essas outras você pode jogar que ela cai na mesma hora. É, porque ela é feita com pouco tempo, ela não fermenta direito. Aquilo chama fermentação. Ela para fermentar direitinha ela leva dias. E essas ________ lá leva nem hora. Eu falo porque lá no Macaco tem muito alambique. No Macaco mesmo não tem não. Em um tal de Paropebas, sabe? Lá a região tem muita fazenda, faz muita cachaça. Aí então é isso.
P/2 – Agora, o senhor estava falando que tem que fabricar cachaça na época da chuva, por quê?
R – Não, isso aí eu não estou, eu aqui, porque lá é tocado às vezes elétrico, é tocado às vezes a boi, o engenho. Tocado a boi. Ou pode ser elétrico também.
P/2 – Para moer a cana?
R – Para moer a cana. E daí eu ia te explicar isso. Então, para moer a cana, tem o engenho grande ali. Você põe quantas canas. Mas tem que ser tocado a boi, porque gente não dá conta. Você pega ali e coisa. Agora, esse aqui você vai lá você vai ver, é uma moenda grande assim, sabe? Grande. Aí eles liga a água, a água bate naqueles coxo, e toca rapidinho.
P/2 – Da roda dágua?
R – Da roda dágua. É a roda dágua. Aí, é justamente agora eles não estão fazendo devido a ser da seca, as águas está pouca, não está dando para tocar. Assim o moço falou lá. E você pode comprar dela lá, eles vende a cinco reais. Eu não sei se é da colheita daí. Mas é daqui mesmo, é da região daqui. Tem outros alambiques por aqui, tem muito alambique.
P/2 – E, seu Moisés, como é que surgiu na vida do senhor o trabalho que o pessoal desenvolve de ser um Mestre Griô? Lá do Kairós, como é que surgiu isso? Como é que surgiu o convite para o senhor...
R – Olha, o convite saiu de lá, saiu pelo, assim, porque eu faço diversas entrevistas, sabe como é que é? Então essa Taís mesmo, ela já me fez muita entrevista, com a turma de escola, que ela é professora, né? Então ela achou aquilo adequado, né? Você sabe, caso, ensinar, né? Aí ela nem me consultou, sô, de por eu nessa repartição. Quando ela me falou eu falei: “Ah, não, eu não, não. A senhora vai mexer com logo eu, analfabeto?” “Nós queremos o senhor mesmo. O senhor é analfabeto, isso não é repartição de não saber ler e nem escrever, mas o senhor tem, o senhor tem o que é natureza.” Quer dizer, da natureza justamente, eu sei como é que se planta uma planta, eu sei como é que toca, trata de uma criação. É diversas coisas que a gente sabe para ensinar esses meninos mesmo, né? Mostro os dinheiro que eles nunca viu, essas prata que eu mostrei para vocês, vocês nunca conheceu. Ela nem tinha falando, ela nem tinha coisado nisso. Tinha esses meninos de escola, eu enchia o bolso dessas pratinhas de 200 réis que eu tenho muitas, né, e levei. Cheguei lá expliquei para eles, falei: “Ó, meus filho, antigamente a gente comprava, ó, antes a gente não comprava nem feijão, nem arroz..."
R – … Nem fubá. Comprava muito era querosene, era querosene, sal. Que a gente sempre que ia na roça muito aquilo, né, sempre tinha lá daqueles fazendeiro, comprava na mão daqueles fazendeiro. E o sal, que é muito difícil, que o sal vem de longe. E o querosene, que lá não tinha luz e usava o querosene, lamparina.” Então eu mostrava: “Olha, eu filho, com isso aqui você comprava rapadura, e comprava litros de querosene, e comprava pacotes, quilos de açúcar. Com isso aqui, essas pratinhas. Hoje é cruzeiro. Agora já é real. Antigamente esse aqui era merréis. Antes, depois passou cruzeiro.” E mostrava, tinha o cruzeiro e tinha o merréis. “Então antigamente era esse aqui. Agora hoje, depois passou a esse aqui. Agora virou o real.” (risos) De maneira que hoje é desse jeito. Então ela me achou contente. E eu já fiz diversos, diversos, é, já fiz diversos, essa do telefone, né, que eu falei para vocês.
P/2 – Propaganda.
R – Propagando dos telefones, que já fiz para a Cemig. Para a Cemig eu saí nos bilhetes da mineira, saí na revista até com o Fernando Henrique. Quando o Fernando Henrique era governador, era, era...
P/2 – Presidente.
R – … Presidente, né? Tenho a revista, saí no jornal. E está mundial. É uma foto, né, com eu cheio por causa de verdura, e escrito ali da Cemig. Então é isso, e depois fiz o telefone celular, esse já foi pela televisão. Esse vai mundial também. Eu cantando, aliás, eu falando o Leonardo e o coisa cantando. Tem até aquela _____________, como é que é? Como é que é?
P/2 – Pense em mim?
R – É, pense em mim, é. (canta) “Pense em mim, não liga pra ele, liga pra mim.” Ele cantando eu lá em frente à igreja. (risos) Isso foi pela televisão.
P/2 – E as crianças que o senhor ensina, elas gostam do que o senhor conta...
R – Gosta.
P/2 – … O senhor conta essas histórias todas?
R – Não, assim, já, já, conto sempre algumas historinha lá. Mas ainda não, não, já, já contei, mas não foi muitas não. Tem muitas ainda para, muitas para ser apresentada ainda. Eu já ensinei como é que se planta uma mudinha, né? Mas não tem uma área que eu tente, eu até falei: “Ô, gente, para ensinar criança não vamos ensinar desse sentido, eles vão aprender uma coisa que não é de, eles não vão ser o que precisa. Tem que ser uma área que vai aproveitar, eles vão ver produzindo. Agora, uns canteirinho, uma coisinha, você planta duas muda não tem espaço, né?”, eu falo: “Ó, isso aqui para mim ensinar é um pouco mais de, é um pouquinho, não é errado porque nós não podemos ensinar o menino uma parte errada já. Eles já quer aprender, tem que aprender uma coisa fixa, uma coisa para aprender mesmo, para aprender o certo.” Agora, aí nós vamos acompanhar, a gente tem que ver, eu tenho que ver, eu tenho que prestar atenção quando eles fala, quando a gente olhar.” Bom, a época, por exemplo, uma couve, uma semente, tudo assim nas lua, né? Não é na lua, é no modelo da lua. Tem a lua cheia, a lua minguante, a lua nova, então tem. Tem um sentido de plantar esse tipo de muda. Você quer colher um bom cacho de banana, banana cheinha mesmo, com bastante banana? Ela não dá desigual no cacho, ela dá toda igual. Aí você vai prestar atenção. Você fura uma cova bem funda, ali, 90 por 90, para ficar muitos anos. 90 por 90, vem com uma mudinha, você pode ser já grandinha, uma média aí de um metro e meio, por aí. Faz um buraquinho já no centro da cova e põe ela ali, aperta bem a terra e vem com um pouco de capim ali, se tiver, conforme a terra não precisa nem de botar esterco. Mas conforme a terra é bom botar o esterco. Capim é um adubo bom para a bananeira. Capim seco. Ele vai secar ali. Aí põe na lua, tem que ser na lua crescente. Esse tipo de cacho, tipo de fruta assim é lua crescente. Aí ela dá bons cachos, dá boas, bom produto. Dá cada cacho enorme mesmo, e cheinha, igual. Se você plantar na minguante ela mofina, vai embora. E dá uns cachinho, uma hora está cheio em cima, outra hora está mais embaixo. Não é adequado. Isso aí é sobre a fruta de cima da terra. Agora, batata, batata, seja qual batata que for, seja qual tipo da terra, batata. Batata inglesa, batatinha doce, cebola, alho, _____________ é na lua minguante, sabe? Na lua minguante. Essa é a lua. A lua está sendo minguante, da cheia vai passar para minguar, aí você planta. Você está com as mudinha aí, aí você vai e planta. Você vê aquelas raminha pequenininha, pequenininha, mas a batata embaixo dá aquela batatona. É para quem sabe. (risos)
P/2 – (risos)
R – Isso aí tudo, nós somos governados pela lua. Nós somos dependendo mais é pela lua. Só que é uma parte assim: não pode ser violento, né, mais fraco. Você corta o cabelo hoje na lua crescente, que a lua vai crescendo, amanhã está grande de novo. Você está na minguante, aí ele vai, aí ele custa a crescer. Custa mesmo. É igual barba. Por exemplo, faz a barba na lua crescente, você vê tá cheia de novo. Você faz na minguante custa a crescer. Cresce, mas demora. Eu faço, vamos supor que eu faço de 15 em 15 dias, se eu for na lua minguante eu levo 20 dias, de 20 em 20 dias. E se for na lua crescente deu dez dias já está grande de novo. É, uma coisa…
P/2 – Seu Moisés, com quem que o senhor aprendeu essas coisas?
R – Olha, menina, é uma coisa impressionante. Eu não tive tempo assim, é vendo, sabe? Esse senhor que eu falei, que esse Mudango falou que esse homem era coisa do passarinho, eu era pequeninico mesmo ele mexia com horta, com plantação. Então poucos dias que eu fiquei mexendo com ele eu aprendi muitas coisas. Porque meu pai mesmo era, ele mexia com tropa. Ele até morreu muito novo. Nós era 11 irmão. Ele morreu acho que foi com 48 anos, ou 50. Um negócio assim. Eu não me alembro bem, porque eu era analfabeto aquele tempo. Nós era 11 irmão homem, tudo homem. Agora resta só três, eu e mais dois. Morreu _______ assim, mais velho. De maneira que tem isso, sabe? (risos)
P/2 – Aprendeu...
R – Aprendendo assim, igual eu estou te falando. Menina, eu não tive, eu não tive um segundo para ir na escola. Não fui. E minha mãe ela podia ser igual, antigamente, podia ser professora. Ela tinha muito, ela tinha boas letras, bom, entendia bem de leitura. Mas e o tempo? Tinha que trabalhar naquela, o salário do meu pai era muito pouco. Então ele vivia viajando com tropa, ficava aí 15, 20 dias viajando com burro. E carregando cachaça, carregando certas coisas, e produto que lá não tinha. Ia longe buscar sal, querosene, aqueles pico de querosene, para lá para o Arraial. Isso aí eu assisti muito pouco, porque de repente ele morreu.
P/2 – E qual a importância de hoje o senhor estar aqui em um encontro de mestres griô, e ser um mestre?
R – Como?
P/2 – O senhor estar aqui com a gente nesse encontro, aqui na Serra do Cipó?
R – Você acha que eu estou achando bem?
P/2 – O senhor está gostando?
R – Não, eu olha, eu estou achando bem. Eu estou achando estou ficando conhecendo diversas gente, né? Apesar de que a gente ser analfabeto mas a gente fica conhecendo, né? Os outros, estão brincando uma coisa que a gente sabe. Quer dizer, isso aí, é o que eu estou falando, desses causos às vezes um é invento, quer dizer, um caso, né? É caso de pescador. E agora essas outras coisas do preto, do, né, do boi, da cabaça carregando cachaça, isso aí tudo é verdadeiro.
P/2 – É caso verdadeiro.
R – É caso verdadeiro. Lá, nós navegava muito com tropa. Nossas funções lá no Macaco, eu não, eu era, mexia mais era com criação de porco, de, plantando alguma coisa. Mas a função do povo lá mais era com tropa. Meu sogro mesmo ele carregou muito dormente para assentar as linhas...
P/2 – De trem.
R – … As linhas de trem de ferro. Era. Menina, e eu, eu, quando eu morava lá em Belo Horizonte, que eu mexia com leite, que eu fui leiteiro, trabalhei muitos anos com leite antes de ir lá para o Macaco. O tempo inteiro. Aquele Hospital Felício Rocho, você conhece? Não, né? Em Belo Horizonte você não conhece.
P/2 – Que?
R – Aquele Hospital Felício Rocho de Belo Horizonte?
P/1 – Não.
R – Não, né? Vocês não conhece lá. Nem a Praça _____________, nem nada. É, tem um outro caso também, esse aí parece que vocês não, não sabe disso.
P/2 – Então conta esse causo para a gente.
R – É, esse caso é verdadeiro também, é um caso certo, esse eu assisti. Eu trabalhava com leite, e entregava leite em uns prédios. Tinha diversos prédios ali na Praça Osório, vocês não conhece, não adiante te explicar. Muito prédio. Conheço tudo. Tinha o de 14 andar, tinha diversos andares. Entregava leite em Casa Branca, Indaiá, em todos os prédios. Eu chegava lá o prédio, o elevador era meu, ninguém podia envolver nele. Eu subia lá para cima vinha descendo desligando o elevador. Então, entregando leite. E nessa ocasião, teve uma ocasião, eu não me alembro, é tempo, sô. Mas tem muita gente de lá de Belo Horizonte que alembra disso. Dessa idade, que tem muita gente da minha idade ou mais, alembra. Tinha, de lá eles atravessava em um cabo de aço de um lado a outro, de um prédio no outro de cabo de aço. Assim como se tivesse andando em uma pinguela. Vocês entende o que é que é pinguela?
P/2 – Entendo.
R – Pois é, ainda de moto, ainda. Ainda passou de moto também. Isso aí eu assisti o cabo lá amarrado. Não foi, penotise. Não é que teve penotise. Não sei, vocês não entendem penotise.
P/2 – O que é?
R – Penotise é como se fosse, antigamente tinha muito, agora eu não posso te dizer que ainda tenha. Antigamente tinha coisa como se fosse um aparelho, você já viu aqueles negócio de televisão, que eles aumentam e tal? O penotise é uma pessoa que ele tem um estudo para ele. Hoje eu não vejo mais falar nisso. Tem coisa exagerado, mas não é, é tudo normal. Por exemplo, tem um sentido assim, esse é um caso: duas donas… A caneta caiu no chão...
P/2 – Depois eu pego.
R – Tinha duas dona, elas buscava lenha no mato. Então elas fazia aquele cesto de lenha, punha na cabeça, e vinha dali. E tinha um senhor, esse fazia o penotiso. E era um circo, ele trabalhava em um circo, era dentro do circo. E parava assim, parou assim, tinha um galo, um galo, arrastando uma tora. Para todo mundo lá era aquele galo arrastando uma tora. Uma tora amarrada ali, arrastando uma tora. Então elas: “Ô, comadre, olha lá aquele galo arrastando uma tora, comadre. Como é que aquele galo tem tanta força no pé daquele jeito?” Uma torinha, né? Não era, era um pau ali. “Mas como é que aquele galo tem isso?” “É, comadre, ele está arrastando ali é uma palha.” “Não, comadre, é uma tora.” “Não é.” Ela com o peso de lenha na cabeça. “Então vê direito.” “Vamos ver direito, vamos.” Botou o peso de lenha no chão, botou o peso de lenha no chão. “Bom, comadre, é verdade mesmo, é uma tora.” Ela não estava com o peso de lenha na cabeça não, nenhuma delas. “É uma tora mesmo, é um pau de, é um pau mesmo.” “Ué?” Aí botou o feixe de lenha na cabeça, voltou a ser uma palha. Aí voltou uma palha. Discutiu daqui, coisa dali. Aí dentro do, dentro da lenha, do feixe de lenha tinha uma cobrinha, sabe? Tinha uma cobrinha. E essa cobrinha ela não deixava ela ser hipnotizada não, sabe, não deixava. Isso é verdadeiro. Aí eles descobriram, eles descobriram. Uma lagartixa, uma cobrinha, um trem assim e a pessoa não é hipnotizada. Agora, se quiser ser hipnotizada é só cortar o rabinho. Aí já fica sendo hipnotizado. Vê coisa exagerado.
P/2 – Entendi.
R – Você entendeu? Isso aí é gente de circo, e é verdadeiro esse caso. Das antiguidades.
P/2 – Entendi.
R – A gente da antiguidade tinha coisa de, de, de impressionar a gente. Impressionar mesmo.
P/2 – Bacana, né?
R – É, tinha coisa, oração forte. Muita oração, muito forte mesmo. Tinha essa parte de festa de Nossa Senhora do Rosário. O Congado, o mestre dançava aquele Congado tudo _____________, tudo bem. Aquela porção de gente que tocava caixa, e se fantasiava um pouquinho e dançavam ali. Era festa de Nossa Senhora do Rosário. Tinha a bandeira, você beijava aquela bandeira. As coisas e tal. Agora, aí você tinha às vezes alguma coisa que você podia rir. Alguma coisinha que você podia rir, não tinha problema nenhum. Mas essa parte o mestre sabia, ele sabia como é que você estava rindo. Era zombando? Tá. Você está zombando, mas você não vai zombar mais. Vamos supor, você está ali sentada, né, ri, zombando. Tem o tipo de zombar, podia rir sem ser zombando e podia rir zombando. Você não levantava daquele lugar. De jeito nenhum. Saía arrastando aquele trem e aquele trem na desgrudava de você. Ele, o mestre, estava sabendo daquele trem todo. Eles ficavam apertado com aquele trem, né? Aí ele vinha, falou: “Olha, presta bem atenção, você vai sair, mas você nunca faz isso mais não. Você não zomba de ninguém, de nada disso mais não. Você pode zombar na hora que é de fazer graça, mas na hora de ser dezombado não pode não. Por isso você recebeu esse castigo. Agora você vai levantar.” Aí todo mundo respeitava, né? (risos) É uma coisa que isso aí é coisa verdadeiro. Ih, menina, antigamente tinha aqueles pessoal que mexia com roça, nossa, eles era benzeção, muitas benzeção boa, sabe? Era ____________de cobra, né? Isso eu já vi também e nessa parte eu vou te falar: isso eu vi. Benzeção de cobra. A cobra fere a pessoa, aquilo não valia nada, menos que um marimbondo, mas ele benzendo. Não benzendo morre mesmo. Hoje não, hoje eu pelo menos eu sei curar. Dependendo eu sei mais ou menos curar. Então eu tenho (risos) força também para poder aguentar. Eu conheci dois senhor, dois, um aqui em Belo Horizonte e outro lá em Paraná. O de lá, esse aqui eu não sabia o nome dele não. Chamava Pedro Carvalho, o de lá. O filho dele foi tomar banho na beirada desse Rio Capivari. Um rio grande mesmo. Ele tinha o ponto de ele tomar banho que não era muito correntoso e não era muito fundo. Não, era fundo, e ele sabia nadar. Assim ele não sabia. Só fiquei sabendo desse caso que aconteceu com ele. Ele foi lá em casa fazer uma benzeção lá. Então ele, quando foi o filho dele tirou a roupa para tomar banho e veio a cascavel e pegou ele. Até aí para ele não daria nada, só que ele tinha que andar mais rápido porque ele ficava cego. Com o prazo de poucos minutos ele fica cego. O cascavel ele é bravo. Aí chegou lá: “Pai…” Falou, não dá nada, acabou, não valia nada mesmo. Você podia fazer, se você acreditar e ver, isso é verdadeiro mesmo, não é mentira não. Ele foi lá na nossa, onde é que nós vivia lá benzer umas cobras lá, mesmo. Você podia pintar uma cobra, vamos supor assim, você acreditar verdadeiro. Você ficava aqui, você benzia, você pintava uma cobra ali, marcava ela, não é para dizer coisa, vamos supor que, você não sabia se ali tinha, se não tinha. Mas você pôs uma lá para saber o que é que ele era. “Ô, seu Pedro Carvalho, tem uma cobra ofendendo aqui, isso, isso, e isso.” Mas isso aí você tinha, você não podia falar que estava ofendendo não porque aí você estava mentindo. “Ô, seu Pedro Carvalho, o senhor chama a cobra assim, o senhor chama a cobra ela vem?” “Vem.” Então tá. “O senhor podia chamar para mim ver.” “Então tá.” Você sabia que ela estava lá pintada, né, que você pintou ela bacana. Chegava ele, subia em cima do rabo ela vinha, nos pés dele. Ela não mordia ninguém não, vinha ali no pé dele. É verdade. Esse chamava mesmo.
P/2 – Nossa.
R – Ele se chamava Pedro Carvalho.
P/2 – (risos)
R – Mas, menina, cobra estava picando lá as nossas criação, você precisava de ver, lá no Paraná. Um dia tinha uma égua morta, com ____________, uma hora tinha uma vaca morta. E aí dos pouco esse já foi outro tipo de bicho, eu vi, eu não tirei ele, mas foi mandado também. Aí estava tranquilo, esse seu Geraldo, um mineiro, mesmo, meus conterrâneo, de lá daqui, nós estava lá ele já vivia lá. Já vivia lá primeiro do que nós. Ele já era de lá mesmo. Daí ele foi lá benzer essa cobra. Esse mineiro montou um cavalo, arriou um outro, foi lá na casa dele. Ele morava em um lugar por nome de Areia Branca, e nós morava no tal de Ilha. Ele montou no cavalo com o outro cavalo arreado, foi lá, chamou esse ____________. Chegou cá, ele deu as volta lá assim, em volta da coisa lá, falou: “Olha, eu já retirei, eu já retirei a que mordeu, e todas as que está aqui tem tantos anos, muitos anos. Não ofende mais nada, não ofende mais nada.” Não ofendia mesmo não. Lá no Macaco era três, lá no Macaco também tinha um que era, que benzia também.
P/2 – É?
R – Só que ele já morreu. Esse agora eu não alembro mais. Nesses lado os dois já deve ter morrido, esse outro aqui também já deve ter morrido. Esse eu fiquei sabendo de três que benzia. Eles retirava as cobras, eles não gostava de matar não.
P/2 – O senhor retirava?
R – Ele retirava. Ele retirava. Ele retirava as cobra. Ele chegava ali, falava: “Olha, gente, aqui é o seguinte: vocês quer que elas fique aqui ou vocês quer mandar elas para algum lugar? Vocês tem que ver um lugar para elas ficar.” Quer dizer, que você tinha muito terreno, você ia ali, ele dava uma volta lá assim, sabe, uma área grande. Dava a ele aquela área, ele andava ela ali, deixava um caminho, e ficava ali. E elas passava tudo ali. Ele falava com elas: “Vocês vão viver aqui.” Agora, aí ele não queria, se você falava: “Não, só não deixar elas ofender, elas podem viver aí.” Se ele benzia elas, elas podia entrar dentro de casa elas não mordia ninguém mesmo. Tinha uma quantidade de ano, sabe? Passasse aquela quantidade aí já nunca valia mais não. (risos) Aqui aconteceu uma gozada, aqui mesmo em Belo Horizonte. Nós foi, eu peguei umas mudas de jabuticaba lá na casa do meu sogro e vim plantar para esse homem mesmo que estava comigo lá no Paraná. Então ele era, foi meu patrão quando eu era mais pequeno. Aí esse homem não podia ver cobra não. Cobra até nele pulando nele. Parece que ele tinha um ímã, cobra coisava mesmo com ele. Aí eu sempre, eu mais ou menos, eu entendo onde é que elas gosta de ficar, sabe? Elas gosta de ficar. Aí nós foi levar umas jabuticaba lá e passou em uma fazenda para comprar umas vacas, em um lugar lá para comprar umas vacas. Eu já tinha, eu e esse homem já tinha começado a negociar com ele as vacas, e ele passou lá para fechar o negócio. E nós andando assim tinha um lugarzinho assim, tinha um buraco, assim um buraco lá. No meio de uma ladeira, uma área grande. E muita pedra. Eu olhando assim, e falei com o outro, nós era três. Eu falei: “Antônio, ali, olha, presta bem atenção, eu sou capaz de apostar que naquela região ali tem cascavel. Elas gosta muito desse sentido, onde é que o sol bate.” E esse homem ficou assim, me escutou, me olhou assim, né? Me olhou assim, aí eu estava mostrando lá um outro lá, e falou: “Ô, meu filho, vem cá, por que é que você me falou que ali naquela região tem cascavel?” Eu não sabia que ele chamava as cobras também não, e nem benzia não. Ele foi pegou e falou assim: “Olha, lá tem tanto, cascavel, e aqui tem dois.” Aí nós assustamos que: “Aqui tem dois.” Tinha um garotinho com ele, um menininho, um moreninho, catatauzinho do menino: “Ô, meu filho, vai lá e busca aquele assobio lá para mim. Vai lá e apanha aquele apito lá para mim.” Mostrou mais uns pés de milho, o milho já estava, já tinha passado o ponto de apanhar para comer verde, né? Vocês entende. Aí ele mostrou para nós: “Você está vendo esse pé de milho aqui todo quebrado?” “Tou.” “Você está vendo aquelas casas que tem lá naquele cantinho lá?” “Estou.” “Eles passava ali e vinha aqui, vinha roubar meu milho. Não era roubar, apanhando o meu milho. Aí fui e trouxe duas, dois cascavel para aqui e mandei guardar o milho cada uma.” Nós ficamos olhando assim. O menino chegou, o garotinho chegou com o apito, assobiou. Um estava pertinho de nós assim, menina, um cascavel com sete nó, né? Que você sabe como o nozinho deles, aquele chocalho. Que ele avisa a gente, ele bate aquele chocalho. A cobra é mansa, aquela cobra, ela só pega a gente se a gente esbarrar nela. Ele falou assim: “Ai, meu Deus do céu.” Eu falei, eu fui e peguei: “Ô, seu _____________, esse homem aqui não compra e não paga ele não que você vai ver.” “Não, não, essa aqui a gente pode pegar ela. Pode chegar lá e pegar.” “Não.” Ele quase que ele morreu. Falei: “Não, sô, não convém. Nem ele gosta, a cobra não pode ver ele. Às vezes é capaz que nem…” “Não, meu filho, eu benzo, não tem perigo não.” Aí ele falou com nós, falou: “Olha, aqui, ela sabe que eu benzo, ela pegou o milho. E estava lá, sentindo, sentindo muito. Eu sabia. Que ela ia lá em casa, mandaram ela em casa para mim benzer. Eu mandei benzer e mandei falar com ela que não viesse pegar mais milho não, que aquilo foi só beliscadinha, que depois que ela ia aprender direito.” (risos)
P/2 – (risos)
R – Olha, isso aí é um caso verdadeiro, sabe?
P/2 – Verdade.
R – Esse é certo.
P/2 – Seu Moisés, com quem é que o senhor aprendeu a benzer?
R – Não, eu não benzo.
P/2 – Ah, o senhor não?
R – Não, não sei benzer não.
P/2 – Ah, desculpe.
R – Não, eu não sei benzer. Não, é muito difícil e benzeção eu não sei não. Agora, eu como eu falei, esse negócio de curação de cobra não é benzeção não, sabe como é que é? É outra, você mesmo tem que fazer. Você mesmo que vai fazer. Assim, Deus livre e guarde, né? Por exemplo, vamos supor assim, como se fosse um iniciado. Se uma cobra ofender a gente, a gente nunca que vai lidar no mato sem fogo, né, com fósforo. Vamos supor um fósforo, um isqueiro, né? Porque ali se Deus livre e guarde uma cobra ofender, você queima o lugar. É menos do que nada, não vale nada. Mas você tem que queimar mesmo, é.
P/2 – Mas tem que ter fé?
R – Não, não precisa de fé. Ali não depende da fé não. O veneno sai tudo ali, menina. Sai tudo ali. Sai tudo ali. Meu irmão, pegava ele, assim diz ele, eu não coisa. Essa urutu cruzeiro não tem cobra mais, que ele já tem até uma cruz, ou aleija ou mata. Que tem diversos tipos de cobra, né? Porque vocês não conhecem esse tipo de bicho, vocês só vivem na cidade, né? Mas tem, bicho veloz mesmo. E essa região aqui dentro tem muita, nossa mãe! Que eles gosta desse lugar, prospera muito. Agora esse cascavel ela pode fica aqui ó, pode trançar para cá e para lá, não tem perigo nenhum. Se você, se essa linhazinha aqui esbarrar nele, ele trrrrrrrr, e bate o chocalho, trrrrrrrrr, bate. Aí você para, ele sossega. Mas se você começar a mexer, aí ele vem longe na gente, bate o dente e aquilo mata mesmo. Aleija mesmo.
P/2 – O senhor já foi picado?
R – Não, não, eihn?
P/2 – O senhor já foi picado?
R – Graças a Deus, nunca! E já mexi muito no mato. Muito mesmo. Já carreguei eles com feixe de capim que eu tinha vaca, carreguei essa jararaca no feixe de capim, menina! Eu não sei que arrumação foi, acho que eu estava botando capim assim na corda para amarrar, né? Eu acho que ela veio andando, porque eu não ia pegar, eu cortando o capim com facão eu nem sinto, eu, né? E essa época eu enxergava muito bem, é impossível que eu não ia ver. Eu acho que no eu botar ali ela enrolava no capim, eu botava o outro em cima, amarrava e levava. Quando chegava lá: “Oh, meu Deus do céu, esse bicho aqui.” Em tempo de eu pegar ele na máquina, passar ele na máquina matar as minhas criação e me morder também. Já aconteceu três vezes isso comigo. Eu falei: “Ah, não, isso não pode, uai.” Uma época foi com o meloso, outra hora foi esse capim mais comprido. Duas vezes foi com o meloso. O meloso eu acredito que eu devia ter carregado ele junto com o capim. Porque eles ficam uma trouxinha assim, porque ela não cresce muito não. O máximo dela, essa jararaca, é a melhor, cobra brava mesmo. Aí então é um caso, esse é verdadeiro.
P/2 – Para a gente encerrar a nossa entrevista, seu Moisés, assim, o senhor já fez muita propaganda, comercial, o senhor já é famoso, né?
R – Não.
P/2 – Mas assim, o que o senhor achou de ter dado a entrevista para a gente aqui, contando a história do senhor e esses casos que o senhor viveu? O que é que o senhor achou?
R – Olha, bom, olha, eu fiquei satisfeito, você está compreendendo? Apesar de que é que eu sou analfabeto. Uns casos, né, muito simples, né? Um caso simples. Mas eu fiz isso com o maior prazer. O que eu vou lembrando, porque às vezes sabe de muito, mas você sabe, a gente encuca, com certos tipos, com algum problemazinho, então é difícil a gente ir recordando e vai decifrar tudo.
P/2 – Mas o senhor lembrou de muitos hoje aqui.
R – Não, tem, eu não sei se aí agora, vocês tem que ver se ficou bom para vocês apresentar. Porque tem caso, né? É um caso que às vezes não precisa, é vagabundo, como é que você vai apresentar um trem que não está adequado. Esse pode apresentar?
P/2 – Ô, com certeza. (risos)
R – Então tá bom, então eu fico muito satisfeito com isso. E tenho o maior prazer e quantas vezes for preciso, né?
P/2 – Então tá jóia. Eu queria agradecer então a presença do senhor.
R – Pois então, obrigado para vocês também, me desculpa a minha analfabetice e eu tratar vocês mal, né? Porque eu não sei bem...
P/2 – Não, está ótimo.
P/1 – Está ótimo.
P/2 – Obrigada.
R – De nada. (risos) Então acabou.
P/2 – Acabou.
R – Então tudo bem.
(palmas)
R – Não, não, obrigado para vocês.
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