Meu nome é Eugênio Antonelli. Eu nasci no dia 29 de novembro de 1915, na cidade de São Pedro, Estado de São Paulo.
FAMÍLIA
Meus pais são italianos. Quando eles vieram aqui para o Brasil eles eram crianças. Os pais vieram, imigraram, eram imigrantes, eles vieram juntos. Meu pai veio antes e minha mãe veio depois. O pai dele veio trabalhar em São Paulo, depois ele montou uma industriazinha em São Pedro. Tinha o moinho, beneficiava milho, fazia fubá...
CASA
A minha casa era uma casa muito boa, casa de alvenaria, na rua principal de São Pedro. Era uma chácara, tinha muita fruta no quintal, meu pai plantava, tudo isso. Ao todo foram 11 irmãos que moraram lá nessa casa. Todos nasceram nessa casa.
FAMÍLIA
Muito boa, uma convivência familiar muito boa. A gente se dava muito bem com os irmãos, meus pais. Meu pai e minha mãe conviviam bem, mas quem exercia mais autoridade familiar era ele. Ele era exigente. Ele exigia muito da gente.
FUTEBOL
Eu brincava muito era de futebol, a coisa que eu mais gostava na vida. Eu jogava bola no pátio da Prefeitura de São Pedro, bolinha de gude, pião, tudo isso. A prefeitura ficava numa praça muito grande, e toda brincadeira era nessa praça. Jogava pião, bolinha de gude e futebol.
IRMÃO
Eu entrei na escola com sete anos e saí com 14. Quando eu saí da escola, eu montava a cavalo, ia levar o almoço para o meu irmão na sonda.. Ele era sondador. Ele começou a trabalhar muito jovem em sonda, com 15 anos ele já estava trabalhando na sonda. Foi ele que veio para a Bahia e perfurou o petróleo do Lobato. Ernesto Antonelli. Eu sempre trabalhei com ele.
ENTREGANDO LEITE
Comecei a trabalhar cedo. Primeiro, tinha vaca de leite, ia no pasto buscar as vacas, prendia as vacas, minha mãe tirava leite, eu ia entregar o leite, tudo isso. Comecei cedo.
PERFURAÇÕES
Ernesto, meu irmão, o mais velho, começou a trabalhar em sonda desde muito criança. Era o emprego que ele arranjou. Ele trabalhava em São Pedro. Tinha um lugar, chamava-se Graminha, tinha a fazenda do Ângelo Fransim, onde deu água sulfurosa, água mineral, lá em São Pedro. Por ali. Fazenda de meu tio, João Giocondo. Todos esses lugares foram explorados pelo petróleo.
CONSELHO NACIONAL DO PETRÓLEO
Quem explorava petróleo no Brasil, naquela época, era o Serviço de Fomento da Produção Mineral. Pertencia ao Ministério da Agricultura. Aí, quando deu petróleo aqui no Lobato, o Cordeiro - Oscar Cordeiro, graças a ele tem petróleo no Brasil - foi que exigiu, ficou pedindo fomento, sonda, para a Bahia. Dirigiu-se até Getúlio Vargas pedindo sonda para a Bahia. Quando foi em 1937, chegou uma ordem do Fomento para desmontar as sondas que estavam funcionando no Estado de São Paulo, inclusive as que estavam no depósito, para mandar para o Norte e Nordeste. Eu trabalhei na desmontagem de duas sondas, uma no município de Guaraí, e outra no município de... Quando deu petróleo no Lobato, que o Brasil todo tomou conhecimento, Getúlio criou o Conselho Nacional do Petróleo. Aí, o serviço aumentou muito. Chegaram americanos com sondas modernas. A sonda que a gente usava antigamente era sonda pica-pau. Depois vieram sondas modernas, americanas. Aí Getúlio criou o Conselho Nacional do Petróleo. Aí precisou de muita gente, principalmente com experiência. Aí meu irmão me chamou. Eu vim. Eu ia levar o almoço para ele e ficava o dia inteiro na sonda. Eu via toda a perfuração como fazia. Ajudei na desmontagem de duas sondas. Eu praticamente passava a tarde inteira na sonda com ele. Eu sabia trabalhar. Aprendi. Aí, vieram sondas para o Norte e Nordeste. Meu irmão veio para a Bahia, Rafael Contador foi para Alagoas, Antônio Aníbal Fracassi foi para o Piauí, e João Batista Baltiere, para o Amazonas. Então esses lugares foi onde a sonda começou a perfurar. Quando deu petróleo em Lobato, vieram todos para a Bahia.
DE LOBATO A ARATU
Quando eu cheguei na Bahia, fui trabalhar numa sonda que estava instalada no Largo da Ribeira. Depois do Largo da Ribeira foi para o Lobato. Quando foi 1942 - o superintendente do Conselho nessa época era jovem, era o Nero Passos. Ele me chamou no escritório no dia 2 de fevereiro de 1942: "Antonelli, vamos parar essa perfuração do Lobato aí, você vai com a sua equipe para Aratu”. O campo de Aratu. Depois que criou o Conselho... O petróleo do Lobato só foi o marco inicial, a produção, muito pequena, não era uma produção comercial. Aí a sonda saiu para o interior. Passou em Itaparica, Aratu. Aratu era um campo de gás. Candeia, Pojuca, Catú e Araçá. Em todos esses lugares deu petróleo. Aí ele me chamou no escritório, no dia 2 de fevereiro de 1942: “Você vai com a sua equipe para montar uma destilaria, para produzir gasolina e diesel para o Conselho. Com esse torpedo, navio não está vindo, petroleiro, e o nosso estoque está no fim”. Eu disse a ele: "Antonelli, montar uma destilaria. Eu não faço a menor idéia de como seja uma destilaria”. Aí ele brincou: "Você conhece alambique de cachaça?" Eu falei: "Conheço. Na minha cidade de um, de vez em quando eu ia lá.” “É aquilo, com alguma diferença. Mas não tem problema, não - trabalha no campo de Aratu um americano, por nome Witeng, ele já trabalhou em refinaria, vai lhe ajudar." Aí lá fui eu para o campo de Aratu. Montamos a destilaria, uma destilariazinha, muito bonitinha, bem feitinha, botamos para funcionar. Produziu gasolina, gasolina primária, nafta e querosene. Mas o equipamento não agüentava levantar a temperatura para tirar diesel. Ele disse: "Antonelli, não vamos levantar, não, que pode explodir tudo. "Ele aí foi embora para os Estados Unidos, mandaram de volta. Fiquei sozinho. Mas eu já tinha conhecimento da causa, não tinha mais problema. Aí eu fui ao doutor Nero Passos, comuniquei o fato a ele. Ele me disse: "Olha, na cidade de Santo Amaro tem sucata de locomotiva. Locomotiva é aquela Maria Fumaça de antigamente. Você conhece. Então, você escolhe três caldeiras, que estiverem em melhores condições, para a gente usar como retorta, somente a carcaça, que ela agüenta a temperatura”. E lá fui eu para Santo Amaro, escolhi as três caldeiras, tirava a tubulação de dentro, o Conselho foi buscar, trouxe as três caldeiras para Aratu. Lá eu botei o fundo da frente, botei entrada e saída de óleo, entrada de vapor, botei tomada para temperatura, tomada para pressão, e visor de nível em todas as três. Instalei as três e botei para funcionar. Deu ótimo resultado. Produzia diesel também. Aí acabou o problema de combustível do Conselho. O Conselho abastecia o serviço público de Salvador, e o Exército levava a parte dele. Cheguei a processar 270 barris de petróleo por dia. Aí, quando foi... tinha um problema no campo de Candeias. Todo ano, quando chegava o inverno, o terreno do Recôncavo baiano é massapé, quando molha, escorrega. Então todo ano tinha problema no campo de Candeias. Não podia chegar caminhão com combustível, e faltava combustível. Muitas vezes parou o serviço por causa disso. O transporte, quando chovia, era feito com carro de boi. Transportando equipamento para as torres. Aí, nesse tempo o superintendente não era mais o Nero Passos, era Pedro de Moura. Ele me chamou, disse: "Você vai no campo de Candeias montar uma destilaria de tamanho menor, para abastecer o campo de Candeias”. Lá fui eu. Escolhemos o local, montei a caldeira, botei a refinaria para funcionar. Depois que estava funcionando, ele me mandou de volta para a Aratu, dessa vez como chefe do campo. Tinha até americano trabalhando lá, o chefe era eu. A gente morava no rancho que tinha lá. E a comida básica da gente era arroz, feijão...Conselho Nacional do Petróleo. Ainda não tinha a Petrobras. Aí, a comida básica nossa era arroz, feijão e carne do sertão. Carne do sertão é charque, aqui chama carne do sertão. Esse era o alimento nosso. Uma vez por semana ia carne. Pão, a gente comia pão dormido três, quatro dias, não podia ir à cidade, porque não tinha folga. Não tinha férias, o Conselho não pagava hora extra. Durante a guerra teve isso tudo. Aí, quando foi dia 1º de abril de 1939, 1º de abril de 1949, aí Pedro Moura me chamou e disse: "Olha, vai se instalar aqui na Bahia uma refinaria moderna, e escolheram o campo de Candeias, num lugar chamado Mataripe. Eu quero que você vá para lá para assistir a montagem”...Pedro Moura, superintendente do Conselho. “Quero que você assista a construção dessa refinaria desde o começo.” Lá fui eu. No dia 2 eu cheguei lá. Estava terminando a terraplanagem do terreno. Não tinha casa, não tinha rancho, não tinha nada. Depois de uns 15 dias, chegaram uns técnicos brasileiros. Queria acompanhar a construção da refinaria. O projeto da construção da refinaria foi uma companhia americana Kellogg. Eles tinham que montar a refinaria e entregar funcionando. Aí chegou a equipe de brasileiros, Carlos Eduardo Paes Barreto, que seria o superintendente, Jacque Lorem Parker engenheiro, Roque Consone Perrone, químico, que seria responsável pela operação da refinaria. Petrônio de Areia Leão, que seria técnico da instrumentação, porque montou toda instrumentação da refinaria, e Edgar Moreira, chefe da segurança. Todos os cinco estiveram nos Estados Unidos estagiando na refinaria. Aí começou a se construir escritório, almoxarifado, casa do ponto, posto de saúde, refeitório. Aí melhorou a coisa muito. Aí precisava de água na refinaria. "Tem uma lagoa a uns cinco ou seis quilômetros de distância, você vai com a sua equipe botar água na refinaria, para iniciar as obras." Eu montei o tanque e fui com a minha equipe por dentro do mato, botamos água na refinaria. Aí nessa ocasião também começou a construir a vila de Mataripe, onde nós moramos quatro anos lá. Tinha de tudo na vila, época muito boa. E precisou de água na vila: "Você, Antonelli, vai..." Tudo que acontecia mandavam eu fazer. Quando o equipamento começou a chegar em Mataripe, vinha de barco, saveiro, pegava no navio em Salvador e levava para lá. Lá tinha um guindaste, e tirava o material do porto e botava no chão. Tinha dois caminhões de guincho: um operava um motorista, o outro operava eu. A gente pegava o material no porto e levava para a área onde ia ser instalada a refinaria. Fizemos isso tudo. Aí começou a construção da refinaria, até entrar em operação. E lá eu fiquei até me aposentar, no dia 12 de novembro de 1976, com 38 anos e meio de serviço na Bahia.
RLAM
Aí construíram a refinaria e botaram para operar. Naquela época se produzia 2.500 barris por dia. Depois foi ampliado para 5.000, montaram uma outra. Depois veio a construção das unidades de lubrificação, ampliação da refinaria. Chamava Matamplia. Construíram as unidades de lubrificante, parafina, ampliou a C1 para 5.000. Nós tivemos o laboratório.
CARGOS
No começo eu era chefe de uma turma, operador 3. Eu fui para lá como refinador de petróleo. Eu era chefe do campo de Aratu, e a função minha na ficha era refinador de petróleo. Como refinador de petróleo, eu fui para Mataripe. Quando começaram a operar, mudaram. Era operador 1, 2 e 3. O operador 1 era responsável pela turma. Depois eu fui para supervisor de turno. Depois de supervisor de turno, passei a supervisor geral de operação, aí não trabalhei mais de turno, supervisionava a área. Aí tinha plantão, fim de semana tinha plantão, não podia sair de Mataripe sábado e domingo, permanecia lá. Aí, fui promovido a técnico especializado Em 59, em janeiro, a refinaria me mandou para... a Petrobras me mandou para a Venezuela, estagiar numa refinaria de lubrificantes. Eu fui em janeiro, passei seis meses lá, em 59. De janeiro a março. Depois eu voltei para Mataripe, fui chefiar as unidades 10, 11 e 12 de lubrificantes. Chefiei essas unidades durante oito anos. Depois eu fui para a unidade 18... essas três unidades produziam lubrificantes, depois eu fui para a unidade 18, que produzia parafina.
NÚMERO 1 DA PETROBRAS
Nesse tempo, a única refinaria no Brasil era aqui na Bahia, e o petróleo era a Bahia. Então a transferência do Conselho para a Petrobras realizou-se em Mataripe. Chegou lá o presidente do Conselho, o doutor Hélio Beltrão, que era o consultor jurídico do Conselho; foi diretor da Petrobras. O presidente do Conselho nessa época era Plínio Catanhede. E foi o general Juraci Magalhães. Aí, nós do Conselho éramos funcionários públicos federais. Todo mundo já com estabilidade, eu mesmo já tinha 13 anos de funcionário público. Depois da transferência, assinados os papéis da transferência, deu a posse do primeiro presidente da Petrobras, que foi o general Juraci Magalhães. Depois disso tudo, o Beltrão se dirigiu aos operários. “Quem quiser ser operário da Petrobras tem que pedir demissão do serviço público.” O único que levantou a mão foi eu. Eu assinei o termo de pedido de demissão. Depois disso ele perguntou: "Mais alguém aí?" Ninguém. Ele disse: "Antonelli, você é o operário número um da Petrobras." Eu era chamado de Antonelli, todo mundo me chamava de Antonelli. Depois que eu passei a empregado da Petrobras, minha matrícula passou a 0001. Aí ninguém me chamava mais de Antonelli: "01!" O 02 era o Carlos Freitas. Porque aí a Petrobras requisitou todos os empregados do Conselho, para trabalhar para ela. Com o tempo, alguns desistiram, foram embora, não aceitaram. Depois, com o tempo, todo mundo foi passando para a Petrobras. Inclusive admitiram gente nova. Esse Carlos Freitas mesmo era apontador no campo de Candeias, foi para lá como apontador para ser o número dois. O Teixeira o número três, e o outro número quatro, Ecídio Pascal o número cinco. Assim. E aí está minha vida de Petrobras.
TRABALHO DURO
Nesse tempo do Conselho não tinha folga, não tinha férias, não tinha Instituto de Previdência. Em 42, Getúlio começou a criar férias, folga, oito horas por dia, Instituto de Previdência. Aí melhorou tudo.
DINHEIRO
Em termos de salário melhorou quando eu fui para Petrobras. Mas o que ganhava dava para viver satisfatoriamente.
VILA EM MATARIPE
Na vila tinha de tudo. Tinha o centro de abastecimento, tinha a concha acústica, tinha cinema - todo dia era um filme diferente -, construíram um hotel, tratamento de água. Tudo. Nós moramos 18 anos na vila. Vila residencial da refinaria. Alguns funcionários moravam lá, os principais. Os que não podiam sair de lá. Tinha outros que podiam sair, iam morar em Candeias, Mata de São João, Feira de Santana.
AMOR À PRIMEIRA VISTA
Eu me casei 25 de setembro de 1947. Eu conheci ela em Candeias. Ela foi visitar uma prima, foi lá com a prima, passar uns dias, e a gente se conheceu. E aí começamos a namorar. Logo de cara. Foi amor à primeira vista. Eu gostei dela logo que vi. Aí eu estava morando em Candeias, que eu estava construindo a refinaria de Candeias. Nessa época, eu estava construindo a refinaria de Candeias, por isso que eu estava lá. A refinaria não, estava construindo a destilaria de Candeias. Depois eu voltei para Aratu. E quando eu estava trabalhando em Aratu foi que eu me casei com ela.
VIDA NA VILA
A convivência era ótima na vila de Mataripe, uma maravilha. Todo mundo se dava. Foram 18 anos de alegria e satisfação. Todas as senhoras se davam, conversavam. E a professora disso, professora daquilo, todas elas tomavam curso, vivia muito bem.
INTERVENTOR NO SINDICATO
A criação do sindicato foi em Mataripe também, ainda era Conselho. Em 1959. Foi na concha acústica lá de Mataripe, teve uma reunião. E aí criou-se o sindicato. O primeiro presidente do sindicato foi Osvaldo Marques, o primeiro presidente. O segundo foi Mário Lima, que hoje continua na Petrobras. Eu só fui interventor do sindicato na revolução, em 1964. O general Ariovaldo, o sindicato acabou, botou a Integração. Eu passei nove meses como interventor do sindicato. Como interventor, fiz muita coisa. Pagar salário atrasado, INPS atrasado, luz atrasada. Botamos tudo em dia o pagamento do pessoal, entreguei o sindicato com 150 mil reais no banco. Foi em 1964. Ah, não sei por que fui convidado para ser interventor. A revolução demitiu todos os sindicatos, aí então botaram a intervenção. Para não acabar com o sindicato, botaram a interventoria. Eu não quis ir. Eu disse ao general Ariovaldo: "Eu não vou, não. Sindicato, comigo, está fora." Ele disse assim: "Ô, vai servir a Petrobras no sindicato. Fim de conversa." Aí eu tive que ir. Com Paes Barreto somos amigos, com Roque Perrone, nem se fala. Pessoalmente, que eu me dava muito, foi o general Ariovaldo, Roque Perrone e Paes Barreto. Os outros depois não teve muito contato. Mas com o general foi demais. E eu saí, aposentei por causa de um superintendente lá que eu não ia com ele, nós não nos dávamos bem, eu saí por causa disso. Não devia ter saído, não, devia estar trabalhando até hoje. Eu não vou citar o nome dele, não.
O PETRÓLEO É NOSSO
Teve aquela campanha: “O Petróleo é Nosso”. Quem criou foi o sindicato. Porque ia acabar com a Petrobras, "O Petróleo é Nosso!"... Porque o problema, no Conselho de fomento, não queria tirar petróleo no Brasil.
O INÍCIO
Petróleo existe hoje no Brasil, agradece a Oscar Cordeiro, foi o responsável pela produção de petróleo do Lobato. Ele era diretor da bolsa de mercadoria. Como foi que surgiu o petróleo do Lobato? Oscar Cordeiro era conhecido na Bahia toda. Onde tinha mineral, ele estava lá. Sertanejo conhecia ele, arranjava uma pedra diferente, trazia na bolsa para mostrar a ele. Trabalhava com ele também o geólogo Manuel Inácio Bastos. Um cidadão morador do Lobato, que morava num lugar mais alto, cavou um poço para água. Quando chegou no nível do mar, encontrou água, tal, parou, deixou lá para decantar, a água para limpar. No outro dia de manhã, que ele foi olhar o poço, tinha uma camada de óleo em cima. Um óleo com um cheiro diferente: "Quem foi que botou esse óleo aqui do lado?" Quem podia achar esse óleo? Aí chegou ao conhecimento de Cordeiro. O Cordeiro foi lá com o geólogo, colheu a mostra, mandou analisar: petróleo. Aí o Cordeiro ficou maluco. Se dirigiu logo ao Conselho de Fomento pedindo sonda para Marinha, foi até Getúlio Vargas. Aí foi que, em 37, chegou a sonda para lá, Norte e Nordeste. A primeira perfuração na Bahia foi no Tabuleiro de Camaçarí. Terreno arenoso, sonda de percussão, perfurava batendo. À medida que ia batendo, ia desmoronando. O desmoronamento chegou até perto da torre, aí pararam. Aí vieram para a Bahia, o meu irmão. Ele era o sondador. Montou uma sonda rotativa no Lobato, na beira da linha, para o mar, Península de Itapagipe, a estrada de ferro, e o perfuro assim. Quando foi no dia 15 de janeiro de 1939, o petróleo aflorou. Naquele tempo só se trabalhava de dia. De sol a sol. Não tinha iluminação, de noite parava. De manhã, quando chegaram, o petróleo estava correndo pela linha do trem. Aí chamaram o Cordeiro. O Cordeiro, quando viu, ficou maluco. Aí começou a pedir sonda, até que a sonda chegou. Aí, chegaram sondas modernas, americanas, da Companhia Drilling, que explorava petróleo. Aí o petróleo do Lobato só foi o marco inicial, produção muito pequena. Dez, 12 barris por dia - não era uma produção comercial. Aí mandaram a sonda para o interior. Foi sonda para Itaparica, foi sonda para o Campo de Aratu. Campo de Aratu deu muito gás. Foi sonda para Candeias, Catu, para o Pojuca, e Araçá. Em todos esses lugares deu petróleo. Aí já tinha petróleo na Bahia para uma refinaria de pequeno porte. As sondas vieram dos Estados Unidos, eram americanas. Vieram só dois técnicos para fazer treinamento. Eu não tinha convivência com os técnicos. Eu trabalhei todo o tempo no Conselho. A Drilling tinha a administração dela separada do Conselho. Eu sempre trabalhei para o Conselho.
MONOPÓLIO
Quando Getúlio criou a Petrobras, tinha um monopólio estatal, a Petrobras só podia ser dirigida por brasileiro nato. Os presidentes da Petrobras todos foram generais. E vendiam ações a todos os brasileiros que quisessem comprar, principalmente a motoristas de táxi. E muita gente comprou. Depois, quando veio o programa de privatizar a Petrobras, eu não quero nem ouvir falar nisso. A Petrobras foi a melhor coisa que aconteceu nesse país, não pode ser privatizada de jeito nenhum. O ex-presidente Fernando Henrique colocou à venda ações. Brasileiro qualquer um podia comprar ações. Eu não comprei, nunca comprei. Depois, o estatuto da Petrobras foi alterado pelo senhor cidadão Fernando Henrique Cardoso, que foi o pior presidente que esse país já teve. Ele acabou com o monopólio, botou até um francês para dirigir a Petrobras. Antigamente o pessoal era brasileiro nato. Ele botou até francês par dirigir a Petrobras. Você imagina. Foi ele. Foi a quebra do estatuto, foi Fernando Henrique.
GREVE DE 60
Teve uma greve pedindo a equiparação do salário com Cubatão, em São Paulo. Em 1960. Acabou equiparando. Parou a refinaria. Aí foi dada a equiparação, voltou a funcionar. Teve gente que ganhou muito dinheiro, inclusive eu. A equiparação, a diferença lá era grande. Teve um operário em Candeias que recebeu tanto dinheiro, que tinha uma cortina na sala, ele pendurou nota de mil reais na cortina toda. Depois, em 64 teve outra greve. Não concordavam com a situação. Os militares do Exército ocuparam a refinaria. Primeiro tinha um coronel, o coronel Futuro foi quem assumiu, controlou tudo. Eu fui contra a greve, sempre fui. Na greve, o superintendente era Roque Perrone. Chamou o Carvalho, que era supervisor, Odilon, que era supervisor, João Tavares, para trabalhar, não parar a refinaria. A refinaria não chegou a parar nunca. Paravam algumas unidades, em função das outras. Até engenheiro trabalhava de turno nessa época. Aí Roque Perrone me chamou: "Antonelli, não estamos querendo parar a refinaria." "E aqueles colegas ali?" "Se vocês trabalharem, eles trabalham também." Eu digo: "Está bom." Um bocado de companheiro foi contra, me chamou de traidor, e tal. Mas passou. A refinaria não parou, não. Parou somente a área de lubrificantes. A gasolina, diesel e querosene continuou produzindo.
O MESTRE
Todo mundo gostava de mim, que eu tratava todo mundo bem. Eu admiti dezenas de operários no Conselho e na Petrobras, nunca demiti nenhum. Eles me adoravam, me chamavam de mestre. Todo mundo gostava de mim.
SONDADOR
Quando eu cheguei na Bahia, vim como sondador.
FAZ-TUDO
Sondador era aquele que montava a sonda, instalava a sonda e botava para perfurar. Tinha, um bocado de equipamento. A sonda toda, caldeira, motor que acionava a coisa. O sondador era responsável por tudo. No Conselho eu fiz de tudo. Fui pedreiro, mecânico, soldador, encanador. Porque naquele tempo, para você montar uma sonda de um lugar para o outro, não vinha técnico não, era a gente que tinha que fazer. Construir a torre, 45 metros de altura. Tudo a gente que fazia.
ACIDENTE
Graças a Deus não sofri nenhum acidente nesses anos todos. Teve um acidente ao vivo em Mataripe, explodiu um compressor, matou cinco companheiros. Dois engenheiros, dois supervisores e um mecânico. Foram carbonizados. Quando botaram... o compressor estava com defeito, em vez de pararem aquilo ali, foram consertar. Acharam uma pecinha no chão: "Ah, acho que é essa peça." Botaram. Quando botaram, esse compressor comprimia gás, milhares de metros cúbicos de gás para a desparafinação do óleo lubrificante. Quando botaram o compressor para virar, o rapaz que estava na válvula de escape não abriu a válvula, o compressor explodiu. Explodiu e incendiou. Era gás, morreram carbonizados. Isso foi 60 e quanto? Eu não presenciei, quando foi quatro horas, eu já estava morando em Salvador, e eu estava do lado de fora para pegar o ônibus. Escutamos a explosão. Mas eu estava pegando o ônibus para vir para cá. Teve um companheiro, de Pernambuco, vestiu aquela roupa de incêndio e foi lá, fechou a válvula do gás e fechou a válvula de vapor que estava fazendo um barulho danado. Foi o primeiro que chegou no acidente. Sempre que tinha um acidente, ele era o primeiro a chegar. Jandir Guadalupe Lima.
CASA QUE APITA
Teve diversos incêndios. Uma vez os operários, no clube, estavam numa festa, todo mundo dançando, quando tinha acidente, a casa dele apitava diversas vezes. Aí todo mundo deixou a festa e desceu para a área, apagar o incêndio. Sujou de lama. A casa dele apitava, todo mundo descia. O pessoal na vila, ficava todo mundo prestativo. Teve uma ocasião, um barco foi buscar gás de cozinha lá em Mataripe, e carregou o barco com botijão de gás. Ia para Fortaleza. O mestre do barco lembrou que tinha que entrar no barco para apanhar qualquer coisa, foi lá, já estava de noite, acendeu um fósforo. Tinha vazamento de gás, pegou fogo. Menina, foi tanta explosão de botijão de gás! Aí só botijão boiando, aceso, por dentro do rio. O pessoal mergulhou lá, ia lá, e baixava o botijão. Teve muita explosão. Nessa ocasião, o pessoal foi todo para a rua, para ir embora. Teve empregado que pegou no alojamento, botou a roupa, saiu de cueca. Nunca mais voltou. Teve um incêndio na C-1... que tinha um motorista que era operador, ele não era mais motorista, era operador. Quando ele viu o incêndio, ele saiu correndo pela tubulação, o tubo abriu, a perna dele entrou. O tubo fechou. Ele: "Me acuda" Me acuda!" Depois que apagou o incêndio, foram lá com a alavanca, abriram o tubo, ele foi embora, nunca mais. Não veio nem receber o dinheiro. Teve um operário lá, que ele era analfabeto. Casou com uma moça, andava muito com a gente. Mas ele não foi no escritório assinar, porque ele era analfabeto, e tinha vergonha de dizer isso. Trabalhou nove meses sem receber salário. Como você entrava? Na hora do bolo, na casa do ponto eu passava aqui. A mulher dele desconfiava que ele tinha mulher na rua. Não levava dinheiro. Trabalhou nove meses. Aí, o chefe do escritório dizia: "Eugênio, esse cara que você botou aí, como ele não vem aqui para assinar o negócio?" Aí eu peguei e levei para lá. Ele não sabia assinar. O doutor Rolph Jank soube do negócio, ficou com pena dele, mandou pagar os nove meses de salário. O Perrone chegou para mim: "Arranja mais uns 20 desses." Ele já estava cabeludo, o cabelo já estava no ombro, não podia nem cortar o cabelo. A mulher dele vinha se queixar com nós: "Ele está com família fora! E teve um outro. Tinha lá um rapaz que trabalhava na limpeza da unidade 10, 11, 12, o apelido dele era querosene. Ele pegou um copo de querosene e bebeu. Maluco. Teve muitos casos, não lembro. "Eu não fico mais nessa droga por dinheiro, eu vou embora!" Teve diversos incêndios. O pessoal do escritório corria para apagar o fogo. Todo mundo, tinha brigada de segurança.
NA VENEZUELA
O que mais me marcou foi esse estágio na Venezuela e a eleição de operário-padrão, essas duas coisas. Eu fui para Venezuela mandado pela Petrobras, estagiar numa refinaria de lubrificantes. Queriam fazer uma refinaria de lubrificantes em Mataripe, eu fui adquirir experiência lá. Passei três meses. Quando voltei, fui para a unidade 10, 11 e 12 - essas três unidades, durante oito anos. E operário-padrão, eu fui operário-padrão da Bahia, o primeiro operário-padrão da Petrobras. Fui muito homenageado pela Petrobras. O presidente era um general que eu não me lembro o nome agora, me tratou... Conheci todas as refinarias, na ocasião, que ele me andou ir.
NA PLATAFORMA
Quando foi os 40 anos da Petrobras, eu fui convidado a embarcar numa plataforma. Depois eu disse a um engenheiro conhecido: "Eu gostaria muito de conhecer a plataforma." Ele chegou, o diretor responsável pela perfuração: "Doutor fulano, o Antonelli quer conhecer a plataforma." Ele disse: "Perfeitamente, amanhã mesmo. Agora, vai todo mundo que está aí com você ou vai só você?" Todo mundo levantou a mão. Tinha umas 13 ou 14 pessoas. Passamos o dia na Petrobras. Pegamos um ônibus no hotel, fomos para Macaé, em Macaé pegamos o helicóptero e fomos para a plataforma. Passamos o dia lá.
APOSENTADORIA
Ficar sem fazer nada não é bom, não, para a saúde. Eu trabalhei, trabalhei numa empresa no pólo petroquímico, pouco tempo, trabalhei na Caraíba Metais pouco tempo também. Mas era aposentado, aí saía, me mandavam embora. Depois não fiz mais nada, fiquei em casa aqui, enchendo o saco da mulher. Eu me aposentei dia 12 de novembro de 1976, com 38 anos e meio de serviço na Bahia. Eu tinha direito inclusive a aposentadoria especial, de 25 anos. Eu fui no INPS e consegui. Mas não saí porque eu não queria sair. Aí fiquei até completar 38 anos. Saí por causa de um superintendente que eu não ia muito com ele, acabei saindo. Mas também já estava com idade.
PIONEIRISMO
O primeiro lugar foi no Lobato, na Bahia. Depois foi para Itaparica, Ilha de Itaparica, Campo de Aratu, Campo de Candeias, Campo de Catu, Pojuca e Araçá. Em todo esses lugares deu petróleo. Campo de Aratu deu gás, muito gás, por isso que montou a destilaria lá. Aí, a primeira refinaria foi em Mataripe, a segunda foi em Cubatão, em Santos.
OPERÁRIO-PADRÃO
Eu fui convidado para a inauguração da refinaria de Rio Grande do Sul, Alberto Pasqualini, estive na refinaria de Minas Gerais, de Cubatão, na Reduc - isso tudo na época de funcionário padrão.
PRIVATIZAÇÃO
Quando houve as discussões sobre o monopólio estatal, da desestatização eu nunca me meti.
A ORIGEM
Petróleo é a decomposição de material. Onde tinha muito animal, floresta, o mar cobriu tudo. E a decomposição desse material produziu o petróleo. Muitos animais, floresta, tudo isso junto produziu... deu um nome que eu não me lembro agora.
SER PETROLEIRO
Ser petroleiro é gente que trabalhou no petróleo, todo mundo que trabalhou no petróleo é petroleiro. E para mim o Petrobras foi a melhor coisa que aconteceu nesse país, eu amo a Petrobras. Eu gostei logo de nome, simpatizei demais com o nome, Petrobras. Hoje em Mataripe não tem mais ninguém conhecido, toda gente é nova, do meu tempo não tem mais ninguém. Chegar lá é estranho. Quando é aniversário de 50 anos, nós estivemos lá, ela foi também, não tem mais conhecido não.
A MAIOR
A Petrobras, para mim, vai se tornar a maior empresa do mundo. Aqui na Bahia, no litoral, se furar, vai encontrar muito petróleo. Camamu, para mim, tem muito petróleo, porque Maraú tem xisto betuminoso. Camamu fica perto, se perfurar... Agora estão falando em perfurar nos Abrolhos. Abrolhos é patrimônio cultural, onde as baleias vêem cruzar. Nós estamos falando em perfurar em volta. Todos esses lugares têm petróleo. O Brasil, segundo os técnicos, em 2005 será auto-suficiente em Petróleo. Mas para mim será auto-suficiente antes disso. Porque hoje nós importamos 300 e poucos barris de petróleo. Com essa descoberta agora de Espírito Santo, vai cobrir tudo. Se Deus quiser vai exportar.
REALIZAÇÃO
Estou muito satisfeito com o que eu fiz.
VIDA EM FAMÍLIA
O meu maior sonho agora é a minha família. Meus filhos, meus netos. Já estou no fim da vida quase. Me dou muito bem com todos, minha mulher. Nenhum filho mora comigo. Paulo morou até pouco tempo comigo, depois casou. Já casou pela terceira vez. Morava aqui comigo.
OS NETOS
Eu cochilo o dia todo, de noite não tenho sono. Cochilo, deito nessa rede aí, tiro meu cochilo. De noite eu quase não durmo. Acordo de manhã todo dia às cinco e meia, para acordar os netos para ir para o colégio. Depois eles vão, eu volto para a cama, levanto oito horas, oito e meia. Todo dia. Acordo todo dia cinco e meia da manhã para acordar eles. Quando falta dez para as seis acordo eles, abro a porta, o pai vem buscar, toda manhã ele vem buscar e leva eles para o colégio. Eu volto para a cama. Fiz a maior besteira na minha vida foi operar essa catarata. Eu não conseguia ler, enxergava muito bem, só não conseguia ler. Fui operar, tem sete meses que ainda não consigo ver direito. A vista está boa, mas tem um embaçamento que me prejudica. Eu não consigo ler também.
50 ANOS
Estou aguardando o aniversário da Petrobras. Quero viver até lá. Até o aniversário da Petrobras, 50 anos, em outubro. Espero ser convidado. Nos 40 anos eu fui convidado.
OPERÁRIO-PADRÃO
Foi o general Ariovaldo, superintendente que me convidou para ser operário-padrão. "Você vai concorrer a operário-padrão." Aí eu fui... Pelo meu tempo de serviço, a minha função, meu critério, ele achou que eu devia concorrer a operário-padrão. Eu fui e consegui vencer. E com isso fui o primeiro operário-padrão da Petrobras. Prêmio não teve nenhum, o único prêmio que teve foi esse diploma aí. Não me deram prêmio nenhum.
LOTERIA
Minha filha, dinheiro dá para viver. Eu jogo na loteria toda semana na espera de ganhar. O dinheiro dá para viver. Não sobra muito, não. Pelo contrário, devia ser mais.
IRMÃO
Meu irmão não chegou a entrar na Petrobras. Ele morreu no Conselho Nacional de Petróleo, em 44. Não chegou à Petrobras, não. Ele era mais velho do que eu. Foi ele que teve a honra de descobrir o petróleo no Lobato.
RECLAMAÇÃO
A única coisa depois desses anos todos que eu acho é o meu salário, que eu acho pouco. Devia ganhar mais. O resto, está tudo bom.
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