Correios 350 anos – Aproximando pessoas
Depoimento de: José Souza de Araújo (Bode)
Entrevistado por: Karen Worcman
Padaria, Laranjal do Jari, 26 de julho de 2013
Realização: Museu da Pessoa
HV_060_José Souza de Araújo (Bode)
Transcrito por: Pedro Carlessi
História de vida
P/1 – Eu sei que é difícil, assim, porque tem a câmara, daqui a pouco você vai relaxando.
Você já gravou alguma vez?
R – Música.
P/1 – Você é músico?
R – Eu já gravei uma música, mas não fez sucesso.
P/1 – Você canta? Você toca?
R – A gente canta somente, um pouquinho.
P/1 – O que você canta?
R – A gente cantava música brega, música do povão, que gostava na época, mas hoje ainda faz sucesso por aí a fora.
P/1 – Você foi cantor então?
R – Dois anos.
P/1 – É mesmo? Aonde que você foi cantor?
R - Comecei aqui em Laranjal do Jari e cheguei até em Almeirim, e de Almeirim eu voltei para cá para o interior, porque desisti! (risos).
P/1 – Você desistiu? Por quê?
R – Condição financeira, essa vem uma parte de muita delicadeza sobre a minha condição financeira, porque geralmente se a gente entrar num jogo e não tiver dinheiro suficiente para dar continuidade no sucesso com certeza vai parar.
P/1 – Vamos começar direitinho.
Eu vou começar perguntando o seu nome, data e lugar que você nasceu.
Fala para mim seu nome completo.
R – O meu nome é José Souza de Araújo.
P/1 – E lugar que você nasceu?
R – Eu nasci na comunidade da Boca do Braço, no Pará, localidade de Monte Dourado.
P/1 – É perto de Monte Dourado?
R – A distância é baseada em 40 minutos de Monte Dourado para Boca do Braço.
P/1 – E como é Boca do Braço? É uma cidade grande?
R – Boca do Braço é uma comunidade igualzinha essa minha aqui, que é a Padaria, que hoje faço parte.
É a comunidade que nasci lá.
Sai de lá com nove anos de idade e fomos para outras localidades, conhecida como Bom Jardim, no Pará também.
Lá nessa comunidade eu fiquei baseadamente uns 15 anos.
Me formei lá, bem dizer, adulto e voltei novamente a andar no Jari.
P/1 – Vamos voltar antes, me conta o nome inteiro do seu pai e da sua mãe?
R – O nome do meu pai é Nilo Ferreira de Araújo.
P/1 – E ele é que te deu este apelido?
R – Foi ele que me deu este apelido de Bode.
P/1 – Por que ele te deu esse apelido?
R – Ele acostumava torcer minha orelhinha devagarzinho, esquentar orelha ela chamava: “Bodinho, vamos esquentar a orelhinha”.
(risos).
Fui crescendo e me adaptei com esse apelido e hoje o apelido se tornou aí um nome, bem dizer, da realidade em qualquer lugar que eu chego é Bode mesmo.
P/1 – E a sua mãe, como que ela chamava?
R – O nome da minha mãe é Luciana Souza Carvalho.
P/1 – Você é o primeiro, segundo, terceiro filho?
R – Não.
Eu sou o quarto.
P/1 – Quantos filhos eles tiveram?
R – Nós somos 19, somos 19.
P/1 – E o que ele fazia o seu pai e sua mãe?
R – Meu pai sempre com a minha mãe trabalharam na agricultura.
P/1 – O que é que eles faziam?
R – Eles trabalhavam com a roça, eles faziam a farinha, eles produziam também abóbora, milho, essas coisas de agricultura, que não tem outras coisas melhor do que trabalhar com a agricultura familiar, quando vem trazer o sustento para a sua família.
P/1 – Então, eles trabalhavam com isso ali perto.
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R – Boca do Braço.
P/1 – E quem que era daquela comunidade, era ele ou era ela?
R – Na verdade eram os dois, naquela comunidade.
Ele nasceu lá, minha mãe também se ajuntou com ele e foram fazer parte daquela comunidade, então eu acredito que são os dois daquela comunidade.
P/1 – E dos seus 19 irmãos, todos estão vivos?
R – Está faltando um só, o Rosevaldo.
P/1 – O que aconteceu com ele?
R – O Rosevaldo, quando a gente mudou lá para essa outra comunidade, Bom Jardim, ele foi passear com um colega e levou um terçadinho.
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P/1 – O que é um terçadinho?
R – É um facão.
Ele pegou o facão e colocou assim, aí ele foi pegou um escorregadio e o terçado cortou o pulso dele, chegamos ir até Monte Dourado, mas não teve jeito ele faleceu.
P/1 – Foi o próprio terçado dele?
R – O próprio terçado dele.
P/1 – E todos os outros 18 nenhum morreu criança?
R – Nenhum, todos estão vivos.
Graças a Deus!
P/1 –E como era a casa, quem educava vocês pai, mãe, como é que eles eram? Me conta um pouquinho.
R – Assim, nem o meu pai e a minha mãe eles não conhecem letra nenhuma, são leigos mesmo de verdade.
P/1 – Nunca foram à escola?
R – Não tiveram oportunidade de ir para a escola eles.
Então, geralmente colocando letras na posição, que hoje a gente vê tantos pais e tantas mães responsáveis pela leitura dos seus filhos, mas eu dou graças a Deus por eu ter a mãe que eu tenho no sentido de colocar nós à vontade.
Certamente, às vezes deixando trabalhar sozinho com o meu pai e nós brincando, ou nós para a escola.
Então isso já é uma educação que nós tivemos, como uma mãe que se preocupa, dá alimentação, dá um bom dia, mas também dá uma boa educação deixando nós estudar.
P/1 – Vocês não iam trabalhar na roça?
R – Geralmente nós começamos a trabalhar com a idade de oito anos, que essa parte da agricultura a gente já nasce trabalhando.
P/1 – Vamos voltar lá para o seu pai e para a sua mãe, eles eram analfabetos, eles nunca tinham ido à escola.
R – Eles nunca foram num banco de escola, e a gente teve esse privilégio de sentar já na escola já, sendo filhos deles, coisa muito importante.
P/1 – Mas me explica, por exemplo, como é que é que você estava me contando que a criança nasce na.
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R – O sentido da agricultura a criança já nasce sendo agricultor.
P/1 – Como é que é?
R – Esse sentido é de que a criança vê o pai com a mãe trabalhar, os outros irmãos sente desejo de fazer a mesma coisa.
P/1 – Você lembra disso? De você querer?
R – Com certeza.
P/1 – Como é que era? Você via quem?
R – A gente vê aquela ansiedade da pessoa está trabalhando e quando a pessoa tem um pouco de animação pelas coisas, não deixa você fazer só, você quer fazer também.
Hoje eu vejo os meus filhos, se eu tiver numa atividade, seja lá em que for das seis, meus filhos querem estar dentro, agora eu proíbo sempre de ter essa criança hoje perto de mim.
P/1 – Por quê?
R – Eu não quero que eles tenham a mesma carreira que eu tenho.
(risos)
P/1 – Não quer.
Você não gosta da sua profissão?
R – Eu gosto, mas só que eu quero uma melhor para eles.
A minha mãe, com certeza, pensou um pouco nessa parte, mas não tinha como dar uma outra oportunidade a não ser trabalhar na agricultura.
P/1 – Então você começou a ir trabalhar na agricultura quando?
R – Comecei a trabalhar na agricultura desde criança.
P/1 – Desde oito anos?
R – Acredito que até menos do que isso.
P/1 – E o que é que você ia fazer?
R – Geralmente nós íamos fazer o que? Quando a minha mãe ia com o meu pai buscar mandioca no roçado nós não ia.
Mas na hora de descascar a mandioca ou lavar, porque já está dentro de casa de forno a gente mete a mão na massa.
Então isso aí vem trazendo, aí na continuação o que acontece? Nós tomamos conta sabe do que? “Vamos fazer uma para nós.
” Até as minhas irmãs eles faziam aqueles pedacinhos de roça para elas, para ver só que a gente tem vontade de trabalhar, no sentido que aprender o que o pai sabe.
P/1 – Então, as suas irmãs e vocês iam botando roça de mandioca?
R – Mandioca, aqueles pedacinhos.
P/1 – O que mais vocês faziam?
R – O que acontecia? Eu posso falar de uma separação?
P/1 – Deve.
R – Quando eu tinha 12 anos o meu pai totalmente deu uma afastada de nós.
P/1 – O que houve com ele? Ele bebia?
R – Bebia, mas não foi essa bebida não.
Ele foi embora por conta própria mesmo.
P/1 – Por causa de outra mulher será?
R – Não, não.
Ele foi embora, muito trabalhador, gostava muito do meu pai e ele gostava de nós.
Mas ele sentiu vontade de ir embora e foi embora.
Eu fiquei com 12 anos, até que o mais velho era um outro meu irmão, que nós ficamos responsáveis por tudo.
P/1 – Você com 12 e seu irmão com quanto?
R – Meu irmão com 15.
P/1 – E os outros tudo eram mais novos?
R – Os outros todos mais novinhos, e ainda a minha mãe ficou grávida!
P/1 – E o seu pai foi para onde?
R – Meu pai foi para Porto Grande.
P/1 – E onde é isso?
R – Em Macapá, em direção de Macapá.
P/1 – E ele avisou a sua mãe que não ia voltar mais?
R – Avisou que não ia voltar.
Ele só voltou com uns três meses após ele ter ido para vir me buscar, mas infelizmente não me encontrou em casa.
Que eu sempre gostei estar trabalhando com o meu tio, que meu tio era seringueiro.
Meu tio gostava muito de mim, porque sempre a gente era obediente, deixava os filhos dele e me levava, sabe? Se dava comigo, talvez os filhos dele não poderiam ir com ele.
E, aí, quando ele chegou em casa para me buscar, eu estaria com o meu tio.
P/1 – E isso foi bom ou foi ruim?
R – Para falar a verdade não é bom.
Não é bom, porque a gente começa a ter uma responsabilidade muito cedo, em busca de sustentar a família, ou seja, ser responsável pela casa, responder pelo tem que acontecer e, aí, a gente começa a amadurecer desde cedo.
P/1 – Quer dizer, você com 12 e seu irmão com 15 ficaram responsáveis por todo mundo?
R – Porque lá onde a gente mora a gente era bem pobre, a minha família era bem pobrezinha mesmo.
Lá não tinha esse negócio que hoje, graças a Deus, a gente tem por aqui, vai fazer uma casa de uma madeirinha cerrada, madeirazinha plainada, de alvenaria, lá não, onde nós morávamos o esteio da nossa casa, ou seja, a madeira completa era açaizeira.
A coisa mais fácil do mundo, ir lá no mato tirar açaizaira, cortar, apontar e colocar lá e pronto.
P/1 – E o telhado era de quê?
R – O telhado era de ubim, uma palmeira que dá umas folhas largas, que a gente acostuma fazer as casas do interior com isso.
P/1 – E o chão?
R – E chão nós rachava paxiúba, que é o açaizeiro e fazia as tábuas.
P/1 – Era de tábua, não era de terra?
R – Fazia as tábuas da paxiúba, fazia as tábuas da paxiúba.
P/1 – E vocês dormiam aonde?
R – Nós dormíamos em casa.
P/1 – Mas numa rede?
R – Nós dormíamos na rede.
Graças a Deus éramos assim uma família, bem vamos supor, bem pobrezinhos como nós somos ainda hoje, mas a gente sempre procurou manter do jeito que a gente podia, para não dormir no chão, porque dormir no chão também já é demais.
Vamos ser carentes, pobres, mas num jeitinho que dê de dormir pelo menos sossegado.
P/1 – Então cada um tinha uma rede?
R – Cada um tinha uma rede, mosqueteiro, porque lá onde nós morávamos dava muito carapanã.
P/1 – Ah é?
R – Muita carapanã.
P/1 – E dava algum mosquito de doença?
R – Na minha adolescência eu nunca soube que lá deu esse problema.
Geralmente dava a malária, a gente sabe que vem de um mosquito, mas tirando isso aí eu não conheço outro.
P/1 – E com a saída do seu pai quem ficou responsável pela roça? Pela comida?
R – Todos fomos nós, a minha mãe somente ficou responsável pela comida.
P/1 – Então, a sua mãe ficava cozinhando?
R – Eu com o meu irmão maior nós fazíamos a roça, fazíamos a atividade da agricultura, e a minha mãe, como ela é uma mãezinha muito guerreira, se ajuntava com as vizinhas lá e ia pescar de caniça no igarapé.
E olha que da onde nós morava para o igarapé eram 40 minutos para chegar lá no igarapé.
P/1 – Para trazer o peixe?
R – Ia pescar e trazer o peixe, e nós ficávamos cuidando das outras responsabilidades como da roça, atividade da agricultura.
P/1 – E a comida mesmo, então, qual que era?
R – Peixe e farinha.
A minha melhor comida que eu acho é peixe, nós comemos bastante carne em casa hoje, mas não é como comer o peixe, sempre o peixe é o melhor.
P/1 – Então, você lembra de faltar comida? Ou sempre teve?
R – Não calma aí, faltou muito! Muitas vezes nós poderíamos almoçar bem, mas jantar, às vezes, não podia jantar, tomava um mingau.
P/1 – O mingau era de que?
R – De arroz ou até mesmo de tapioca, essas coisas assim.
P/1 – E no café da manhã, o que vocês tomavam?
R – No café da manhã sempre a gente costumava uma macaxeirazinha.
Era o que a gente tinha lá, cará, essas coisas assim.
P/1 – E café tinha? Leite?
R – Somente o café, mas espera lá tinha café, mas não tinha açúcar às vezes.
Nós íamos no quintal tirar a cana para a minha mãe bater e tirar o caldo da cana e adoçar o café.
P/1 – E aí vocês faziam café com macaxeira.
R – Macaxeira e o adocil era a cana mesmo.
P/1 – Aí vocês saíam para trabalhar? Como que era o dia? Me conta.
R – O dia era meio corrido, um pouco fechado.
P/1 – Vocês acordavam que horas?
R – Nós acordávamos seis horas, sete horas, porque lá nós tínhamos que acordar cedo, como hoje nós acorda cedo, nós podemos até pegar sete e meia o trabalho, mas o horário de acordar tem que ser seis horas, seis e meia tem que estar já se organizando.
P/1 – Aí, vocês acordavam muito cedo, você, seu irmão mais alguém?
R – Eu tinha mais duas irmãs, essas também eram parceiras nossa dos dois, eu e o Edivaldo, que ficamos responsáveis por tudo, então nesse período nós tivemos duas irmãs, que também encaravam a mesma cena junto conosco.
P/1 – Quantos anos elas tinham?
R – A mais velha tinha 18 anos e tinha uma com 21 anos.
P/1 – Então, ficou ela de 21, 18, 15 e 12?
R – 15 e 12.
P/1 – E vocês que encaravam tudo?
R – E nós encarava tudo.
P/1 – E os outros pequenininhos ficavam com a sua mãe em casa?
R – Ficavam em casa.
P/1 – A sua mãe ficou com raiva do seu pai que ele foi-se embora?
R – Geralmente, assim, eu não posso até afirmar assim, porque praticamente foi a gente estava muito novo, na verdade a gente nem percebia que estivesse ido embora, porque antes isso acontecia pelo um segredo talvez, “Cadê papai?” pode até dizer uma pessoa ir embora, aí, minha mãe dizia assim: “Teu pai está trabalhando só vem daqui um mês” e nisso foi acostumando.
P/1 – Ela falava assim?
R – É.
Talvez para não machucar dizer que tinha ido embora de verdade, para não machucar.
P/1 – Mas antes disso a sua lembrança do seu pai, ele bebia muito?
R – Bebia, bebia bastante.
P/1 – E ele era bravo, ele batia em vocês?
R – Não, ele não batia em nós.
P/1 – Batia na sua mãe?
R – Eu, para falar a verdade eu soube, eu nunca vi não, mas eu soube que ele ainda deu um tapa na minha mãe.
P/1 – Mas não batia de surrar, assim, não?
R – Eu lembro que ela me falou uma vez que ele tinha batido nela, mas geralmente assim, diariamente, essas coisas não, meu pai era muito trabalhador, era carinhoso conosco, foi embora eu não sei o porquê.
P/1 – Você encontrou com ele depois?
R – Não.
P/1 – Nunca mais?
R – Nunca mais eu encontrei ele, mais de 30 anos.
P/1 – Sua mãe nunca contou para você, porque é que ele foi embora?
R – Não, nunca contou.
Quando ele foi embora eu estava com 12 anos, hoje eu estou com 40 anos, 40 anos eu tenho.
P/1 – Você sabe que ele está vivo? Ou se está morto?
R – A última informação que eu soube, que ele tinha ido para o garimpo e o barranco tinha caído em cima dele, aí, ele faleceu para lá.
Essa notícia é o que a gente sabe.
P/1 – Você soube disso como?
R – Foi bocalmente, parceiros dele trabalhando lá, aí, visita não fala para mim mesmo, mas fala para o irmão dele, e o irmão dele que é o meu tio fala para mim, é uma passagem de comunicação.
P/1 – Mas Bode, nunca te deu vontade de ir atrás do seu pai?
R – Na verdade eu chorava, chorava bastante, porque era um pai que dava vontade da gente estar perto, pela brincadeira, um pai que não tomava cachaça e estaria oferecendo para os seus filhos, porque isso eu considero um grande respeito da pessoa que não oferece um copo de cachaça, seja lá para que idade for, não é meu parceiro se ele oferecer.
Então, eu nunca vi meu pai está oferecendo para os filhos, nunca vi ele está querendo brigar por causa de cachaça.
Então, essa parte até a gente sente um pouco e responsabilidade dele de ter tudo isso aí, hoje eu não bebo, tenho exemplo dele, hoje eu não bebo, não quero que os meus filhos bebam, essa é uma preocupação grande que eu tenho em casa com meus filhos, então, para mim não ver meus filhos bebendo, eu também não bebo, para mim ter o direito de falar, e assim, sucessivamente a gente ficou aí.
P/1 – E, aí, vocês ficaram naquela vida muito pobre?
R – Nós ficamos pobre.
P/1 – E nesse período vocês iam na escola?
R – Nós tínhamos escola, nós morávamos no Amapá e estudava no Pará, no município de Almeirim.
Eu estudei até a segunda série lá, meu maior grau hoje é a terceira etapa.
Já vim concluir aqui na Padaria já.
P/1 – E o que é a terceira etapa?
R – Terceira etapa significa a quinta série, ou sexta, então, para que eu pudesse ter mais um grauzinho de escolaridade eu tive que engatar, mesmo com essa responsabilidade e toda que hoje eu tenho, para ocupar mais o cérebro para a gente viver.
P/1 – Porque naquela época não deu mais tempo?
R – Não deu mais tempo no sentido, porque a condição era precária, quando a gente parou lá de estudar, foi essa correria chegamos num ponto de adolescência, ficamos correndo né.
Em 91 foi a minha primeira viagem para cá, para o Alto do Jari, que eles chamam, Alto Jari, então foi a minha primeira viagem.
P/1 – Você estava com quantos anos naquela época que você foi para o Alto Jari, você estava com quantos anos?
R – Eu estava com 21 anos.
P/1 – Quer dizer, você ficou nessa vida lá no Bom Jardim.
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R – Até os 21 anos.
P/1 – Trabalhando na terra?
R – Trabalhando na terra, nesse sentido nós viemos com o meu irmão, que é o Edivaldo, parceiro meu, encostado, ele com 15 e eu com 12 tivemos uma etapa de brincadeira, porque todas as profissões que eu tenho para mim veio da brincadeira.
P/1 – Quantas profissões são?
R – Eu tenho seis profissões.
Primeiramente a profissão civil, que hoje o calendário do Bode, eu construo as casinhas aqui na Vila Padaria, hoje eu estou completando 12 casas já que eu estou construindo.
P/1 – Você trabalha com a madeira?
R – É com a madeira só aqui na Vila Padaria eu estou com 12 casas, mas num total eu tenho um total de 80, 90 casas já concluída por aí no Jarí.
Aí, nós ficamos na adolescência lá aonde nós praticamos a profissão naval, de brincadeira, o meu irmão era guerreiro, eu apanhei muito dele, apanhei no sentido de correr atrás para ver se eu alcança a profissão que ele tinha.
P/1 – Foi ele quem te ensinou a trabalhar com a madeira?
R – Não foi ele.
No sentido assim, ele entrou primeiro brincando e eu corria atrás, desenhando para ver se eu chegava aos pés dele, mas eu não conseguia chegar, porque eu nunca tinha olhado ele fazer os barquinhos.
P/1 – Ele fazia barquinhos?
R – Fazia os barquinhos de madeira, a gente fazia barquinhos de um metro, um metro e 20, 80 centímetros, conforme o pedido.
Aí, a nossa adolescência foi toda isso aí, viemos buscar lá da brincadeira, viemos, viemos, hoje estamos no ponto alto, que já pode se chamar engenheiro naval.
Aí, nós ficamos brincando, a gente pegava muitas encomendas e a gente ia desenhando o barquinho que a pessoa pedisse e nós íamos desenhando, de madeira.
P/1 – E como vocês aprenderam a fazer isso?
R – Aquela coisa, sempre a minha mãe não se preocupou deixava a nós brincar, eu dou graças a Deus por ter a mãe que tenho, ser responsável nessa vida que nunca proibiu nós de brincar.
P/1 – Ela deixa mesmo naquela confusão?
R – Deixava mesmo ela trabalhando, pescando, mas eu tinha o privilégio de estar brincando e ela está atrás do peixinho, ou talvez fazendo a farinha para a nossa alimentação e eu brincando lá e graças a Deus a gente foi caminhando, caminhando, hoje nós estamos no décimo barco já construído já tudo grande.
P/1 – Não é mais barco pequeno agora?
R – Agora nós fazemos barco grande de verdade.
P/1 – Você com seu irmão?
R – Não só eu, o meu irmão aí sim.
Deixa eu voltar um pouquinho, meu irmão resolveu parar e ficar só na reforma e eu resolvi construir.
Foi quando eu me casei com a minha esposa, voltamos para lá para o interior, onde eu morava.
Tentei me localizar lá e não deu certo, olha, aqui nós temos que procurar criar asas e voar para outro lugar, foi que a gente voltou para cá, vamos buscar recurso, chegamos aqui planejamos de fazer um barco de nove metros, era o suficiente para a gente, uma capacidade para três toneladas.
Batalhei, consegui o dinheiro e mandei o serrador tirar a madeira.
Fui e construí o barco, passei um ano para construir um barco de três toneladas.
P/1 – Você que fez?
R – Eu que fiz, os conhecidos no beiradão eles procuram cadê a sua motosserra? Que é o Machadindo, motosserra era o machado.
P/1 – Você fez o barco no machado?
R – No machado, a plaina era um pedaço de terçado, eles chamam cutela, cadê tua cutela?
P/1 – Eles achavam engraçado?
R – Achavam engraçado.
Quando não eu disse: O cara que faz o barco sobra um pedaço de machado, essa brincadeira toda, mas isso para mim é privilégio, porque pelo menos a gente vai tendo conhecimento com as pessoas, a gente concluiu fazendo o barco dentro de um ano, aí, nós vendemos o barco fomos para a cidade.
P/1 – E fez o barco para vender?
R – Fiz para vender.
Aí, eu voltei para a cidade e morei sete anos na cidade, aí, eu vendi esse barco lá para o seu Raimundo, lá da Ilha de Marajó, pertinho de Belém.
P/1 – E ele pagou bem o barco?
R – Pagou direitinho o barco, não me deu o que eu pedi não, mas deu para compensar, eu vendi o barco por mil e 500, olha que um barco para três toneladas na época era para ser uns três mil reais, eu vendi por mil e 500.
Aí, eu empreitei o acabamento, que chama zona morta, essas coisas todas, aí, ele me deu mais 400, lá ficou mil e 900 reais o serviço do barco todo.
Me pagou direitinho, graças a Deus, até hoje tenho documentos aí reservadinho, pagamento, de venda.
Isso aí foi me incentivando, aí, hoje eu voltei novamente aqui para Padaria, estou aqui 10 anos fechado aqui na Padaria e já construí mais nove barcos.
P/1 – Barco, então, nós estamos na primeira profissão foi de carpinteiro.
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R – Carpinteiro civil, do civil viemos para naval.
P/1 – E qual é a outra profissão?
R – A terceira profissão temos aí como operador de máquinas, ou seja, motosserras, nós desfia, nós derruba.
P/1 – Como é que você aprendeu a fazer isso?
R – Essa era uma das profissões que eu não queria.
Eu acharia que fosse uma coisa muito acidental, porque corre ali uma lâmina muito perigosa, que chegar afastar de lá, uma morte, um acidente mesmo cruel, pode até vir a ser fatal.
Como eu mandei na época o rapaz tirar essa madeira para mim, ele disse: “Prova rapaz, tira uma tábua aqui” eu disse: “Não quero não, essa profissão eu não quero, essa não serve para mim”, mas era só o medo da lâmina sair de lá e me cortar, quando acaba não lá existe um segredo na lâmina.
P/1 – Ele te ensinou o segredo?
R – Ele me ensinou o segredo, olha, a lâmina na hora que tu pegar, tu colocar ela no saibro, tu tem que testar se ela vai sair ou não, o que é testar? Encostar ela na madeira de um lado e de outro para ver se não vai sair, se ela não sair naquele horário pode deixar, ela não vai sair mais de lá, livrando de alguma bicada que dá na madeira, está livre de tudo.
Aí, o que foi que aconteceu? Trisquei a mão na máquina e até que eu tirei um pedaço lá, ele disse: “Essa daqui não serve para mim descarto essa.
”
P/1 – Mas você aprendeu a usar?
R – Acabei tendo necessidade para desenvolver o meu trabalho, tanto na civil, quanto na naval eu tive que aprender a operar máquina.
P/1 – Por que você mesmo ia lá pegar a madeira?
R – Era no sentido assim, porque quando eu cheguei aqui na Padaria eu vim bem lá de baixo, bem pobrinho mesmo.
P/1 – Quando você chegou aqui na comunidade?
R – Quando eu cheguei aqui, a gente morava em casinha alugada, enquanto a gente planejava fazer um barco de 35 toneladas, então, foi um período que passei muito apertado aqui.
P/1 – Você veio já casado?
R – Já vim casado.
Já viemos com dois filhos, aí, foi um período muito assim sabe? Fechado mesmo e imprensado com as coisas, mas graças a Deus nós lutamos.
P/1 – Mas aí você estava imprensado e o que você fez? Pegou a motosserra?
R – Aí facilitou, veio o pensamento de nós buscarmos o aprendizado, fazer o curso para trabalhar com operação de máquina, aí o que foi que aconteceu? Porque num período no primeiro barquinho que eu fiz era no serrotinho.
Eu passei dois anos para mim fazer um barco de 30 toneladas, dois anos.
Hoje eu passo seis meses operando a máquina, hoje eu passo seis meses sozinho e Deus, então, isso fez desenvolver muito o meu trabalho.
Aí, temos a profissão naval, que é a segunda, e temos de primeira a construção civil.
P/1 – Construção civil, naval, motosserra e a quarta?
R – Nós temos o segundo grau de pintor letra boa mesmo para pintar, nós temos aí também que a gente mexe com agricultura familiar.
P/1 – Mas antes disso, me explica essa do pintor, como foi que você começou a mexer com isso?
R – Vejam só, os pintores, você sabe que os melhores pintores que hoje nos encontra seja qualquer parte do Brasil, são os pintores de embarcação, são uns pintores qualificados, sabe? Nas áreas que eles fazem, tanto na parte de letra, tanto na parte de pintura mesmo, são um dos melhores pintores que existem em decoração.
Então, você vê um barco, que eu aprendi lá onde eu morava tinha um rapaz que ele calafetava, reformava barquinho, e a gente sempre gostou de meter a mão na massa, ajudar, só por causa do almoço, entendeu agora o que eu falei?
P/1 – Por causa de que?
R – Só por causa do almoço.
P/1 – Do almoço.
R – Porque se eu tivesse lá trabalhando na hora do almoço ia me dar um pouco do almoço dele, com certeza, eu trabalhei muito de graça, mas hoje para mim se tornou escolaridade.
P/1 – Então, você ficava ali pintando barco.
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R – Eu ficava pintando de graça para ele, e mesmo nessa parte que estou fazendo de graça fico estudando.
P/1 – Aí ele te dava comida.
R – Me dava comida.
P/1 – Com quanto tempo você ficou fazendo isso?
R – A gente ficou ali praticamente uns dois anos nessas coisas, não diariamente que não era o trabalho da gente ir lá fazer.
P/1 – Que época da sua vida é isso?
R – Isso era em torno dos 15 anos, então essa não era a atividade da gente fazer, ir lá trabalhar de graça ou trabalhar diretamente por causa da comida mesmo, mas sim em busca de um aprendizado no futuro.
P/1 – Então, com 15 anos o que você aprendeu foi reformar barco?
R – Reformar barco, aí foi que veio o sentido da pintura, que ele me dava para pintar, dava para mim massear.
Então, tudo isso aí hoje eu tenho aquilo ali um começo de aprendizado, ou seja, uma escolaridade que hoje eu tenho o meu grau de pintor.
P/1 – Você tirou? Depois você continuou estudar?
R – Não, eu continuei a fazer logo o trabalho.
P/1 – Pintar.
Hoje você corta a madeira, trabalha a madeira, monta o barco e pinta o barco?
R – Pinto o barco, faço tudo dele.
P/1 – E sexta profissão qual que é?
R – Ainda vai aparecer mais uma que a gente está querendo ingressar, a sexta mesmo nós estamos trabalhando na agricultura, na verdade essa foi primeira a raiz.
P/1 – Primeira raiz.
R – Primeira raiz, então, eu não abandono.
Eu costumo falar em casa que essas coisas de dinheiro, essas coisas de ter boas coisas, não muda o meu jeito de ser, não encontrei ainda endereço para mudar o meu jeito de ser.
Então, a agricultura para mim hoje é o sustento da minha família.
Nós trabalhamos em parceria com a Fundação Jari, reflorestamento de eucalipto, estamos completando já seis anos, vai fechar seis anos em fevereiro, então, nós temos aí uma agricultura familiar que garante o sustento da família.
P/1 – E o que é que vocês plantam?
R – Planta eucalipto, nós temos também ali como agricultura nós temos o cará, a macaxeira, o açaí, que a gente hoje está entrando no ramo do açaí, que está difícil hoje na nossa região, tinha muito, mas com o impacto da barragem veio afastar o nosso açaí.
P/1 – O açaí foi tirado com a chegada da EDP?
R – Com certeza.
Com a chegada da empresa aí, acabou 90% dos açaizais que tinha que o pessoal, não só eu, mas de forma geral o pessoal do Laranjal do Jari, Monte Dourado fazia parte dessa coleta.
P/1 – Todo mundo ia lá coletar açaí lá?
R – Todo mundo ia coletar lá o açaí.
P/1 – E aí vocês não reclamaram com a empresa?
R – A gente sempre trabalhou pelo outro lado, que é a religião.
Então, nós geralmente não podemos, nós temos que respeitar muito nossa religião e os parceiros que está do nosso lado para mostrar que somos bom cristão, mas tem representante da comunidade que pode fazer essa parte de requisição nessa área.
P/1 – Então por causa da sua religião, você não peita?
R – Porque nós não podemos criar problemas, eu tenho que ser mais amigo, eu tenho que ser mais irmão, mais colega, isso é o meu papel de fazer.
Nós não podemos lutar muito contra os outros, a gente sabe que a gente tem direito, mas por ter essa administração nós não chegamos lá, já colocamos outra pessoa para fazer essas perguntas e responder.
P/1 – Bode, volta aqui, você me contou da formação das suas profissões, e agora me conta como é que foi você se envolvendo o seu lado religioso?
R – A área religiosa veio lá da escola.
P/1 – Não da sua casa, sua mãe não era tão religiosa assim?
R – Ela é religiosa sim, era na época, agora faz um tempão uns 20 anos, a minha mãe mora ali em cima logo, ela não tem participado da palavra de Deus.
Hoje a gente chega numa sala de aula, a gente vê, a gente acompanha, a gente mora dentro da escola, a gente não vê professor praticando nem dá o bom dia, muito menos rezar, ensinar alguma orações boa para os alunos antes de começar a estudar.
No período que eu estudava nós tínhamos que rezar, tinha que se concentrar com Deus, primeiramente, para nós poder pegar no lápis.
Hoje nós não vemos mais isso aí, então está em seguida isso a gente foi crescendo e amadurecendo nas comunidades, porque isso envolve muito jovens, a chance 90% são dos jovens, os jovens é que não querem hoje em dia fazer parte dessa jornada, mas a gente vê no período que eu era jovem a responsabilidade de dirigir a celebração, ou seja, o culto dominical era os jovens.
P/1 – Mas me conta que religião é essa?
R – A católica.
P/1 – Então você começou, você ia muito para a igreja quando era criança? Ou não foi depois?
R – Com certeza.
Sempre a minha parte melhor de fazer, hoje eu sou coordenador de setores, mas a minha parte preferida é fazer o comentário inicial.
P/1 – Como é que é o comentário inicial?
R – Comentário inicial é aquela primeira parte, que você dá o bom dia e em seguida você entra com a parte do rito inicial, que seja uma pequena leitura na frente, após o bom dia, um bom acolhimento, aí você entra, você deixa já por conta do presidente.
P/1 – Mas me explica melhor Bode, eu não sou católica, então, eu não sei direito, então, explica melhor, não é o padre que tem que fazer tudo isso não?
R – Na paróquia, ou seja, na cidade a maioria das missas celebradas são os padres, como o padre não pode estar diariamente na nossa comunidade, ou seja, todo o tempo, é que vêm os animadores, vem os coordenadores já com essa responsabilidade de que? De dirigir a missa aos domingos, isso é aos domingos, é uma missa que o padre só faz dentro da cidade, no interior só se tiver condição dele está lá mesmo, ele pode celebrar esse culto aos domingos.
P/1 – Quando ele não está quem é que celebra?
R – É o coordenador, é animador o povo da comunidade que celebra a missa.
P/1 – Mas é o padre que diz você vai ser coordenador?
R – Não essa parte foi muito delicada, hoje eu estou coordenador precisamente eu vou completar três anos e isso foram as três comunidades que dirigiram esta responsabilidade para cima de mim.
Hoje nós estamos comandando as três comunidades.
P/1 – O seu papel qual é?
R – Meu papel é coordenar.
P/1 – O que é que coordenar?
R – Coordenar é administrar o que é que nós temos que fazer.
Vai ter um encontro de comunidade lá no Iratapuru? Vai, aí que eu entro, eu vou colocar você, você é animador lá do Iratapuru, você é da Cachoeira, vamos entrar com parceria, vamos fazer aquela administração para nós termos um encontro para tudo dar certo nós precisa ter essa parceria entre coordenador, animador de setores, então, essa parte é delicada, vamos fazer administração de almoço, como nós vamos trabalhar durante o período do encontro.
P/1 – Esse é o seu papel?
R – Esse é o meu papel.
P/1 – E aquele que você disse que você gosta de falar a palavra inicial também?
R – A palavra inicial essa é minha parte preferida, que hoje quando eu vou visitar uma comunidade, quem dirige sou eu, eu sou o presidente.
P/1 – Você faz o culto?
R – Eu faço o culto.
P/1 – E como é que você decide qual que vai ser a palavra inicial?
R – Primeiramente eu dou um sorriso bem grande para ver se abre aquelas coisas boas, entra o amor, entra aquela palavra mesmo de sinceridade, aquela palavra cristã, para que nós possamos dar uma boa acolhida.
Então, a minha primeira palavra eu digo: “Bom dia! Sejam todos bem vindo nesse encontro com o Nosso Senhor Jesus Cristo, que hoje se faz presente na nossa comunidade, na nossa família, na nossa vida, e quero agradecer, principalmente, Deus por nós estarmos mais uma vez reunido aqui”.
Aí, eu passo já para o rito inicial, que é o comentário, ele quem vai dar o passezinho lá, segundo passe, mas é o primeiro que tem que falar era ele, bom dia, eu já entrava com parte de presidente, mas como eu vou dirigir o presidente vai ser eu mesmo.
P/1 – Aí o comentário é você que faz?
R – Não é o outro comentarista.
P/1 – E você chegou a estudar a bíblia?
R – Quer dizer, a gente estuda, mas geralmente a gente anda muito preocupado essa é uma parte, você pode dizer assim, você estudou a Bíblia? Tem que ser padre e tem que fazer só aquela atividade, porque no meu caso, o caso da nossa região aqui está dividido, você estuda um pouco a Bíblia, você vai fazer um trabalho, e a Bíblia você pega muito pouco ela para ler, já o padre é diferente, só faz aquilo, aí tem tempo para aprender tudo, aí sempre nós continuamos sendo os mais, vamos supor assim, menos explicador, eu prefiro falar pouco nas minhas explicações, eu sempre partilho a reflexão com a comunidade, eu acho bonito quando eu compartilho, você fala um pouco daquele texto que chamou a atenção, outro chamou atenção, então isso é partilhar, eu saber o que você está sentindo.
P/1 – Mas me explica, como que foi no meio dessa confusão toda da sua vida, que você assumiu a sua família, foi aprendendo a fazer barco, que você foi aprendendo também essa parte do culto?
R – Essa parte do culto é uma parte muito delicada, é se dedicar um pouco, é coisa que a gente não faz, quase para segurar, falei lá na frente, padre se dedicou totalmente, mas nós não a nossa função nós não podemos, poder nós podemos, agora não dá, porque se não nós deixa, porque está escrito lá na bíblia que não só de pão viverá o homem, mas sim de todas as palavras que vem da boca de Deus.
Então, essa parte me chamou atenção até porque eu quero dar exemplos para a minha família, se eu acredito que Deus é o meu pai, ele é pai do meu filho, se eu acredito que Jesus vai me salvar, ele vai salvar o meu filho, então eu quero que o meu filho vá para o mesmo caminho, é uma profissão que eu quero que meu filho vá atrás de mim, se eu me salvar eu quero que ele vá atrás de mim, sabe? Porque eu acredito que Deus é tudo para nós, Deus é vida, Deus é amor, Deus é paz, sem essas palavras e sem esse espírito nós não vivemos bem.
Em qualquer sociedade que você estiver, se não tiver paz, amor, solidariedade, confraternização você não vive bem, então para você viver, ter uma vida saudável em comunidade você tem que ter tudo isso.
P/1 – Teve algum padre que foi especialmente importante para você? Que te explicou todos esses conceitos de amor, solidariedade? Ou você foi aprendendo sozinho?
R – Não, eu fui aprendendo.
Com o gesto, como nós trabalhamos a minha vida toda foi fazer parte um pouco, eu não sou profissional nessa área, mas a gente tem uma tarefa bastante comprida nesse período cristã.
Então, essa daí foi uma das coisas que chamam atenção, a gente hoje sente na pele que talvez o outro lá fora também esteja sentindo.
Para tudo isso acontecer tem que ter amor e o amor vem da solidariedade, é você vê que o outro está sofrendo você poder ajudar, é você vê o outro que está gritando por socorro e você ir lá e prestar socorro para ele, então, isso já é um bom começo já de iniciação cristã.
Claro, que a partir do que você entra numa função dessa você vai enfrentar muitas barreiras, para isso você tem que ter muito aquilo que eu falei, amor, paz na sua vida, porque se não você não vai passar por cima desse monte.
P/1 – Você tem essa paz?
R – Essa parte, graças a Deus, com a minha comunidade, nós estamos aqui dez anos, a gente não tem problema, não como coordenador, mas sim como participante, eu tenho aí nove anos como participante da igreja, participante da família cristã, e principalmente como cidadão dentro da comunidade, aí a gente já tem essa função, essa responsabilidade, porque isso é uma responsabilidade, de hoje eu estar conversando com vocês aqui olhando olho no olho é preciso ter uma responsabilidade cristã.
P/1 – Vamos voltar um pouquinho, que eu me perdi na sua vida, com os 21 anos você saiu daquele lugar, foi então para?
R – Com 21 anos foi a minha primeira viagem para cá.
P/1 – Você veio para cá.
R – Primeira viagem, não era casado.
P/1 – Você veio para cá por quê?
R – Como eu tenho muitos parentes, mas toda classe pequena, essas coisas, então a gente prefira certamente conhecer os familiares.
P/1 – Aí, você veio atrás de alguém?
R – Como eu tinha gente, parente que moravam lá, mas fazia parte daqui no período de castanha, essas coisas, então o pessoal comentava: “Rapaz! Vamos lá para o São José, vamos lá para Cachoeira, Padaria, lá é muito bom, no período da castanha dá para ganhar dinheiro”, e era isso que eu queria ganhar dinheiro.
P/1 – Você estava pobre?
R – Pobre, no período a questão era facilitar o quanto antes a vida, aí quando foi em 91.
P/1 – Então, nós estávamos falando um pouco da sua chegada aqui, que você estava pobre, você veio procurar trabalho e trabalhar no castanhal.
R – Trabalhar no castanhal, então isso aí foi com meus familiares, tio, tia, então a gente chegou aqui fomos trabalhar na castanha.
P/1 – E onde ficava a castanha?
R – A castanha fica aqui na área do São José, foi uma comunidade pequena ali da Dona Antônia, que eu fui localizar lá.
P/1 – Você parou lá?
R – Eu parei lá, vim direto do Bom Jardim e fiz o meu estabelecimento lá, na casa da minha vó e do meu tio.
P/1 – Você é parente da Dona Antônia?
R – Sobrinho dela.
P/1 – Ela é irmã de quem?
R – É uma parentagem que a gente chama tia, mas ela vem ser tia da gente também, porque dobra as coisas lá e tal, mas ela é minha tia, o pai dela é irmão da minha mãe.
Aí, eu vim fazer parte dessa colheita de castanha.
P/1 – Junto aqui com o pessoal da Dona Antônia?
R – Uma coisa muito boa, uma coisa boa mesmo de se produzir, ou seja, conseguir recurso.
P/1 – Lá já tinha todas aquelas casas ou tinha pouca casa?
R – No período era muito menos do que hoje são, hoje graças a Deus, a gente vê a diferença, batendo na porta deles, a gente vê umas casinhas mais arrumadinhas.
P/1 – Era muito pobre?
R – Era muito pobrezinha, que nem a gente quando chegou na região, muito pobrezinhas, certas casas lá eram cobertas de plástico, ubim, outras palhas qualquer.
Então, hoje a gente já vê a diferença na vida daquela comunidade lá.
P/1 – Então, você chegou lá foi com o pessoal da Dona Antônia para o castanhal?
R – Para o castanhal, eu tirava as minhas castanhazinhas, agora eu fazia juntar e carregar para mim, que quebrar mesmo eu não sabia, eu não sabia nem como colocava, eu ia aprendendo essa atividade com eles.
Com o prazo de um mês eu já comecei produzir o meu produto e jogar mesmo no doze, lá o dizer da gente, joga no doze vamos fazer produção.
A gente entrou nesse primeiro ano a gente fez sucesso, graças a Deus, daí para frente.
P/1 – O seu produto era castanha?
R – Castanha.
P/1 – Ou você caiu no barco logo?
R – Nós não mexia ainda com barco grande.
Então, o que acontecia nós mexer com a castanha mesmo, no período.
Aí, passei uma safra de castanha e tornamos voltar para lá, novamente.
Nesse mesmo período a minha mãe também veio para castanha também tirar, sabe o que ela arrumou aqui? Aquele velhinho que ela mora até hoje.
P/1 – Sua mãe está aqui do lado então?
R – Aqui do lado, tudo de já, viemos todos de lá.
P/1 – Ela mora aqui na Dona Antônia?
R – No período que a gente veio para cá a minha mãe com um mês veio atrás, ela chegou aqui se enroscou ali com um senhor de idade também já, e graças a Deus está até hoje aí, ela sustentando ele, ele sustentando ela, nessa parceria toda, graças a Deus, eu agradeço dela ter encontrado ele, porque aí ele acabou de criar mais três meninos que veio pequeno.
P/1 – Dele?
R – Dela.
P/1 – Mas ela teve com ele? Ela trouxe os três?
R – Do meu pai, isso veio do meu pai ainda.
P/1 – Ele acabou de criar?
R – Ele acabou de criar, hoje a gente considera ele como um pai mesmo, porque acolheu a minha mãe e está acolhendo toda a família.
Então, essa parte eu agradeço a Deus por ter colocado ele no caminho dela, que talvez hoje ela tivesse muito, assim, dependente da própria família dela, hoje não ela é dona do negocinho dela para lá.
P/1 – E aí fez uma casa ali para ela?
R – Ela tem a casinha dela lá, graças a Deus, todos os dois trabalham, são aposentados e mesmo aposentados eles dão um jeitinho de trabalhar para não ficar no fundo da rede lá não.
P/1 – Então, ela ficou na castanha, você ficou na castanha.
.
.
R – Quando ela chegou na época ela foi trabalhar comigo, foi trabalhar comigo na castanha, eu já ajudava a quebrar para ela, ela já ajudava juntar, então ela trazia o dela, eu trazia o meu.
P/1 – Quem mais? Seu irmão Edivaldo?
R – O Edivaldo já tinha ficado para trás, estava na parceria só eu os outros, e até hoje a gente enfrenta com mais frequente na casa da mãe só mesmo duas irmãs minha que moram aqui na cidade e eu, todo domingo a gente está lá para conversar.
P/1 – Sempre próximo da sua mãe.
Você ficou na castanha muito tempo?
R – Na castanha nós estamos até hoje, não como tirador, mas como comprador, graças a Deus, a gente foi criando o nomezinho devagarzinho, graças a Deus, e hoje nós representamos a compra da castanha aqui no Vale do Jari.
P/1 – Você sai, sobe.
.
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R – A gente compra para uns patrãozinhos na cidade, eles fornecem o dinheiro para a gente e a gente sai atrás da castanha para comprar.
P/1 – Você sobe o rio?
R – Sobe o rio, mas até ali na Cachoeira, quando vai na Cachoeira a gente pega o carro em Laranjal e roda vem atrás da Cachoeira pega a castanha e leva para lá, essa parte aí, largando de tirar, partindo para compra da castanha, hoje eu estou comprando já os castanhais para ver se garante o futuro.
P/1 – Você está comprando os castanhais?
R – Comprando os castanhais para ver se garanto o futuro, continuar comprando.
P/1 – Então agora você tem uma sétima profissão que é o castanheiro? Comprado de castanha.
R – É! Esse ano aqui no Vale do Jari, o único comprador que aguentou foi eu, porque não teve parceria do pessoal de São Paulo, de Belém, não teve os outros e eu como dependo de comprador daqui mesmo da cidade, eu tive essa parceria com eles e eu garanti o sucesso da compra esse ano.
P/1 – Por quê? O que é que aconteceu? Me explica melhor.
R – Falta de recurso para os grandes compradores que vem de São Paulo, Belém para cá para o Jari.
P/1 – Eles estavam sem dinheiro?
R – Estava fora da área, não teve recurso, dinheiro, os patrões lá estava muito cheio, então, não liberaram dinheiro, aí eu agradeço a um rapaz que tem aí na cidade, que é o Aldemir, parceirão, forneceu dinheiro e a gente garantiu a compra da castanha a safra toda.
P/1 – Porque se não subir e comprar o pessoal passa dificuldade?
R – Dificuldade cruel, cruel mesmo.
P/1 – O pessoal daqui desse Rio Jari o principal sustento vem da castanha?
R – Isso aqui o pessoal já tem como atividade anual ganhar dinheiro anual, anual quer dizer, só no período da castanha, a maioria, assim, dos agricultores é só nome, mas está lá na atividade é bem distante, não são todos, mas a maioria, eles não faz parte da agricultura.
P/1 – O que é que eles fazem?
R – Na coleta da castanha eles se mantem da safrinha da castanha, porque no período que cheguei tinha muita banana, aí caiu um mal em cima das plantações que arrasou.
P/1 – Com a banana?
R – Com a banana, eu cheguei a comprar mil e 500 cachos de banana por viagem aqui de sexta e segunda, eu passei três anos fazendo isso.
Então, isso aí eu comecei a comprar mil e 500 por vez, eu comprava o estoque e entregava o estoque.
Aí eu passei três anos, desses três anos que eu comecei a compra ela veio baixando, até hoje para você encontrar a banana, é uma realidade na região aqui.
P/1 – Por que deu praga?
R – Porque deu praga.
P/1 – Então aqui tinha banana, castanha.
.
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R – Tinha banana, tinha castanha, tinha açaí.
Hoje estamos só com a safra da castanha.
P/1 – O açaí?
R – O açaí quem tem um pouquinho plantado ainda fazem uma pequena colheita e quem não tem compra do outro que tem para colher aqui dentro mesmo da região, que antes vendia, hoje já compra na cidade para vim para cá.
P/1 – O açaizeiro foi a empresa que acabou com ele?
R – Com certeza.
Porque a maioria dos açaizais veio a ficar de baixo desse estruturamento grande da empresa.
P/1 – Onde está a obra aquilo era açaizal?
R – Aquilo tudo ali era açaizal.
A hora que você desembarcava era açaí.
P/1 – Aquilo era terra livre?
R – A terra ali era do povão, do povo de Deus.
Todo mundo vinha gente de Laranjal fazer a colheita lá.
P/1 – E vocês não reagiram? Como é que ficou isso?
R – Ficou um pouco, até porque quando explodiu, eu fiquei um pouco lá atrás eu não participei, não fazia parte das reuniões que tinha com a empresa que ia construir.
Então, eu fiquei um pouco esquecido, sem pensar, porque eu fui duas reuniões eles nunca tiveram oportunidade de colocar, sabendo eles nunca tiveram a oportunidade assim: olha vai afetar os açaizais de vocês vai acabar, os peixes vai acabar.
Se eles não colocaram essa posição, eles sabendo, porque se eles falassem essa posição aí a população ia fazer o que? Ah não, essa parte não pode acontecer, é da onde tira o nosso sustento, e a barragem estava paralisada.
Então, quando surgiu a barragem foi uma explosão, eu fui saber com um mês que a barragem estava sendo construída.
P/1 – Não foi assim veio avisando, veio conversando?
R – Não, já veio avisando não, veio na surdina por trás.
P/1 – E o peixe, mudou muito?
R – Na verdade umas safras de peixe mudaram de posição.
Hoje nós estamos aí com uma safra de peixe, que a gente vê os pescadores que não pescam não, se eu não for comprar eu não como peixe, então a gente vê os pescadores falar que só tem o pintado, que é o surubim.
E a gente vê, de vez em quando a gente vai na Cachoeira e compra só o surubim.
P/1 – E antes, tinha o que?
R – Antes nós tínhamos o pacumê, nós tínhamos o aracu, pescado então e aquela sardinha, ou seja, branquinha flecheira, esses peixezinhos assim sumirão tudo, não tem.
P/1 – E vocês não estão negociando com a empresa o impacto?
R – Ela tem uma responsabilidade um compromisso de assumir com nós aqui, porque se ela não assumir, ela tem um papel a assumir com a comunidade, porque se ela não assumir o Ibama não libera a geração de energia, então ela só vai poder gerar energia, a partir do que ela assumir a responsabilidade assinada que ela tem com as comunidades.
Isso nós espera que ele conclua junto com a gente, atrás desse benefício.
P/1 – Mas na comunidade o pessoal está um pouco nervoso?
R – A gente vê, porque assim o comentário, buscando um pouco distante, eu como empreendedor de investimento aqui atrás, o linhão passou dentro do meu empreendimento.
Eu fui lá busquei negociação fui bem atendido, graças a Deus, já chegamos a concluir, já está tudo resolvido, mas tem certas atividades da comunidade que não é bem recebido, mas eu graças a Deus a gente tem uma conversa legal, um afinamento bom.
P/1 – O seu empreendimento aqui de trás qual é?
R – É o reflorestamento de eucalipto.
P/1 – Você é que tem este empreendimento?
R – Eu que tenho.
P/1 – Você faz isso junto com o Jari? Ou não?
R – Uma parceria, que a Jari é responsável pela compra do empreendimento.
P/1 – O que é que você faz? Me explica.
R – O que eu faço é atividade inicial, limpar a área, e segundo é a gente coviar, terceiro é fosfatar, quarto plantar, quinto capinar as mudas, essas são as atividades, que nós temos que fazer.
A empresa entra com recurso para a gente dependendo para que vai ser beneficiado, se nós vamos trabalhar no plantio, vem um certo total de dinheiro para plantio e será esse investimento todo será descontado na hora da venda do eucalipto.
Então, a gente começou com cinco pessoas e aí por falta de animação, falta de conhecimento, falta de interesse a gente foi buscando o sucesso, enquanto os outros foram deixando de lado.
P/1 – Hoje em dia quantas pessoas estão na empresa?
R – Somente eu.
P/1 – Só você?
R – Só eu.
P/1 – Mas você vai sozinho lá fazer o trabalho?
R – Não, somente eu que estou exercendo o cargo de reflorestador.
P/1 – E quem trabalha com você?
R – Que trabalha comigo agora nesse período depois que entrou o empreendimento aí ficou escasso funcionário aqui, eu tenho que trazer de Laranjal do Jari.
Nós estamos aí anualmente tivemos 12 funcionários, porque eu mesmo não faço, a gente tem como segurar o pessoal para trabalhar para a gente, aí eles vão fazendo o serviço para a gente, e a gente como patrão vai ficando.
P/1 – Então, Bode, quer dizer, eu já descobri a sua oitava profissão? (risos)
R – Que vai entrando assim, as coisas vem gerando.
Aí, os parceiros desistiram e eu como sempre interesse pelo menos para ter conhecimento, porque eu não desisto da coisa se eu souber que não tenha um final, ou um final bom, ou final infeliz eu quero saber de fazer, eu quero saber em que vai dar, então, eu desafio as dificuldades.
Então, os meus parceiros que eram também empreendedor deixaram de mão, aí, eu fui comprando as ações deles na empresa, eu comprei ação de três pessoas.
P/1 – Então hoje a empresa é só sua?
R – A empresa é só minha.
Agora nós estamos já querendo fazer uma primeira colheita de eucalipto agora em outubro, a empresa já está voltando a funcionar.
P/1 – Então hoje o seu maior trabalho é a empresa do eucalipto?
R – O maior trabalho hoje é reflorestamento de eucalipto, e a construção civil e a naval.
P/1 – Você continua fazendo barcos?
R – Continuo fazendo barcos, eu tenho aquele barco ali, está completando um ano, por condições financeiras, que é um investimento muito alto, a gente não teve ainda como comprar um máquina para ele para botar para funcionar.
P/1 – Aí você vai vender quando você terminar?
R – A gente pretender funcionar, mas a gente sabe que o dinheiro.
.
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Fazer o barco é mais fácil do que arrumar o dinheiro.
P/1 – E casa aqui, quando você faz a casa quem te paga? Comunidade?
R – Dependendo do contratante, vamos supor, o vizinho me contratou fiz a casa dele, empreitei, ele me pagou, já conclui está bom demais e assim sucessivamente a gente vai.
P/1 – Bode, agora conta da sua vida afetiva, como foi que você casou? E seus filhos?
R – Bom agora, vejam só (risos), essa parte foi um desafio! Porque eu estava com 22 anos, quando eu arrumei família.
P/1 – Você conheceu a sua esposa aonde?
R – Eu conheci ela aqui.
P/1 – Ela morava aqui na Dona Antônia?
R – Não, ela morava aqui na vila ela.
Eu estava com 22 anos quando eu me casei, arrumei família, então o que veio trazer tudo essa responsabilidade eu ter casado cedo.
P/1 – Ela ficou logo grávida?
R – Com três anos depois de ajuntado.
Ela passou três anos para arrumar o primeiro bebê e aí a gente ficou nesse vai e vem, procura local para se arrumar, não dá certo? Vamos embora criar asas vamos voar, partimos para outra, fomos lá para o interior, eu arrumei a família aqui e voltei para o interior no Pará, Bom Jardim.
Não deu certo, eu vim para Laranjal e morei sete anos.
P/1 – Lá fazendo o que?
R – Construção civil.
Morei sete anos lá, aí que veio o planejamento, vamos para Padaria no interior, aí foi que eu cheguei aqui, por aqui assim com vontade de trabalhar, metendo o carão por aí no serviço fomos devagarzinho até chegar hoje onde nós estamos.
P/1 – E você não saiu mais daqui?
R – Não saí mais daqui, às vezes vou fazer um serviço para Laranjal, mas isso não querendo mais, porque já tomo conta do meu negócio, então essa parte não é muito acolhedora mais para mim.
P/1 – Quantos filhos vocês têm?
R – Nós temos sete.
Nós temos um com 16 anos, outro com 14 e ai vai baixando até chegar em quatro anos.
P/1 – Aí, você parou?
R – Nós estamos pretendendo mesmo dar uma parada, que o recurso para a educação, não é difícil criar, o problema é educar.
P/1 – E eles vão na escola aqui?
R – Aqui, agora esse outro ano já vão partir para Laranjal do Jari, porque aqui já terminou para eles.
P/1 – E você tem que arrumar dinheiro para mandar eles para lá?
R – Tem que arrumar dinheiro, se não tem o transporte que leva e trás todos os dias.
P/1 – Você tem que pagar?
R – Não, é bancado pelo governo.
P/1 – Então você precisa de dinheiro para que?
R – Só mesmo para o lanche deles lá, para os materiais, é isso aí.
P/1 – E o que é que significou para você os filhos? O que é que mudou na sua vida?
R – Os filhos, mudou totalmente, porque a gente olhando como assim uma pessoa que procura sempre visar o futuro das coisas, querer o bem para si é querer o bem para todo mundo, mas o que veio despertar assim que a família trouxe uma grande responsabilidade, porque hoje assumir família é ter responsabilidade.
Então, nessa parte buscando conhecimentos, buscando encarar as dificuldades para garantir o sucesso da família, tem que ser guerreiro mesmo.
Então, isso veio despertar e mudar a vida do Bode (risos).
Veio mudar a vida do Bode, veio buscar conhecimento, aparece algumas atividades para fazer em parceria com as empresas Jari, qualquer que aparecer a gente está recebendo, mas o que eu quero mesmo me parece que o futuro é eu ter conhecimento das coisas.
P/1 – O que você quer mesmo do futuro.
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R – Conhecimento.
P/1 – E o que é conhecimento para você?
R – Conhecimento é eu ter parceria legal, parceria sólida.
Ter o meu respeito, ter a minha dignidade, minha moradia, o meu empreendimento para eu poder servir a minha família e servir o lado do meu vizinho também, quando eu puder.
P/1 – Obrigada, Bode.
FIM DA ENTREVISTA
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