Projeto Memórias do Comércio de Ribeirão Preto 2020/2021
Entrevista História de Vida HV_060
Thiago da Silva Alves Reis - Pedacinho da Canastra
Ribeirão Preto, 19 de abril de 2021
Transcrito por Selma Paiva
P1: Bom, Thiago, para começar, eu gostaria que você dissesse seu nome completo, a data de nascimento e o local que você nasceu.
R1: Meu nome completo é Thiago da Silva Alves dos Reis. Sou de Ribeirão Preto, natural daqui e minha data de nascimento é 06 de agosto de 1978.
P1: Legal. E qual que é o nome do seu pai e da sua mãe?
R1: Nome do meu pai é Alcir Alves dos Reis, falecidos, ambos, Glória Alves dos Reis.
P1: Legal. Você conheceu seus avós?
R1: Conheci.
P1: Teve contato?
R1: Só minha vó materna, só. Minha vó paterna. Só a minha avó paterna.
P1: Legal. E você sabe se eles vieram de fora de Ribeirão, para morar em Ribeirão? Tem alguma ascendência de outro país? De onde que eles vieram?
R1: Sim. A minha vó da parte paterna é descendente de italianos, né? Da minha mãe, eu não sei a origem, mas os parentes da minha família são da região de Igarapava, da área do meu pai, né? E da minha mãe é da região de Itapira.
P1: Ah, legal. E você sabe como é que seus pais se conheceram, em Ribeirão? Se conheceram, vieram a se casar.
R1: Eles se conheceram em São Paulo. Os dois eram trabalhadores da área do comércio na região central, se conheceram lá.
P1: Ah, legal. E você nasceu já em Ribeirão Preto, né? Em que bairro...
R1: Isso.
P1: ... que você nasceu e o que você lembra da sua infância lá em Ribeirão? Aí em Ribeirão, né?
R1: Eu nasci nos bairros mais violentos da cidade, que é o Simioni, né? Meu pai trabalhou trinta anos na Febem, Fundação Casa. Ele era funcionário estadual, público estadual e minha mãe funcionária da prefeitura, da área de educação. E aí a gente... no Simioni, eu tinha minhas amizades ali, né? Tinha os amigos bons e os amigos ruins. Só que eu comecei a trabalhar muito cedo, né? Com 12 anos, eu já era guardinha na Guarda Mirim da prefeitura de Ribeirão Preto. Então, acho que por isso, eu não parti para outros lados. E a gente... quando eu comecei a trabalhar com 12 anos, aquela época podia trabalhar, né, com 12 anos de idade e eu trabalhava meio período e meio período estudava. Então, o resto do tempo que sobrava, eu queria descansar.
P1: Certo. Mas na sua infância, assim, como é que era o Jardim Simioni, né? Você... o bairro, né?
R1: Então, o Simioni, eu quase não ficava no bairro. Eu tinha meus amigos da rua, não tinha amizades muito externa, fora da minha rua. Eu usava muito o Sesc aqui em Ribeirão Preto, por exemplo, para ir para o clube e tal e eu era sócio de um outro clube também, que é o Ipanema. Então, o tempo que tinha disponível, eu ia para os clubes jogar bola, nadar. Eu quase não ficava na rua, né?
P1: Sim, sim. E você tem lembrança de passeios aí em Ribeirão, com a sua mãe, com seu pai? Eles te levavam onde, assim? Onde que eram as...
R1: Meu pai, quando ele folgava, ele queria pescar. E aí a gente ia para os parentes lá em Igarapava, que tinham rancho. Então, meu pai trabalhava, a escala dele era três por dois, nesses dois dias de folga... eu perdi dois anos de escola por causa dele, porque a gente montava na moto, eu e ele e a gente ia pescar lá para Igarapava, ia e ficava na beira do rio, Rio Grande lá. E minha mãe, a gente ia em bosque, mas era mais com meu pai mesmo, pescar, jogar bola com os amigos, né? Eu ia muito para o clube com meu pai. Meu pai sentava lá, tomava o chopinho dele e eu ia jogar bola com meus amigos. Ficava o dia inteiro no clube.
P1: Legal. Muito bom. E, ô Thiago, na escola, o que você lembra da escola? Você foi estudar onde? Você ia a pé? Como é que era o seu dia a dia na escola?
R1: As minhas escolas sempre... eu fiz da primeira à quarta série no bairro, né? E, a partir da hora que eu comecei a trabalhar, com 12 anos, eu estudava no Centro. Então, eu estudei em Guimarães Júnior, fui aluno do Cemei, finalizei no Mousinho, né? Aí eu encerrei meu ensino médio no Otoniel Mota, por causa de necessidade rápida ali. Mas minha mãe, ela até trabalhou dez anos no Mousinho, em Ribeirão Preto, que é uma escola municipal também. Mas a minha adolescência foi em Guimarães Júnior, o Cemei, que é uma escola municipal também de... modelo, que a gente inaugurou essa escola, né? Então, eu estudei praticamente nas escolas municipais. Escola estadual mesmo foi a Otoniel Mota, finalizando o ensino médio.
P1: Sim, legal. E na escola você já teve alguma visão do que você queria ser? Você disse que começou a trabalhar muito cedo, né?
R1: Sim, sim.
P1: Mas a escola te deu alguma dica de que você queria ser comerciante? O negócio de queijos deve ter vindo depois, né, mas...
R1: Ah sim, sim. Não, a escola não deu visão nenhuma. Até esses dias eu estava vendo uma reportagem do presidente - eu o sigo - do Sebrae, que é o Carlos Melles, ele fez uma parceria com o MEC, falando do curso, de implantar o curso de empreendedorismo nas escolas. Aí eu até comentei lá, dei os parabéns, que isso é muito importante. Acho que é um dos poucos países... apesar da gente ser um país em desenvolvimento, mas eu vejo muitos países que já têm um curso de empreendedorismo e já ensina isso na Europa, né? Mas aí parece que a parceria do Sebrae agora com o Ministério da Educação é para fazer esse molde dentro da educação, né? Eu não tive nada. Isso daí foi bem posterior.
P1: Ah, tá legal. E aí você primeiro trabalhou na Guarda Mirim. E depois? Como é que foi seu...
R1: Aí eu fiz 14 anos. 14 anos eu podia ter meu primeiro registro em carteira, porque Guarda Mirim era contrato. Eu trabalhei numa instituição pública, dos 12 aos 14, que é o Daerp aqui da cidade, Departamento de Águas e Esgotos. Ficava lá auxiliando, tirando segunda via de conta. E, com 14 anos, o primeiro registro foi num posto de gasolina, numa loja de conveniência, de repositor. A partir dali, eu tive vários empregos, né? Pipocando, trabalhando de... um pouquinho mais, vindo de bairro pobre, então, a partir da hora que eu comecei a me formar, que eu fui para a faculdade, tudo, aí a gente começa a ter outro molde de vida profissional, né?
P1: Sim. E você foi fazer faculdade do quê?
R1: Em Ciências Econômicas, Economia.
P1: Ah, sim. Aonde? Aí em Ribeirão, mesmo?
R1: Aqui em Ribeirão, é. Uma faculdade particular, que ela chamava Faban, né? Depois, ela foi para Fapesp e hoje ela já não se encontra mais aqui em Ribeirão em Preto, né? Mas era Faban, Faculdade Bandeirantes.
P1: E você pensou em seguir a carreira de economista ou você...
R1: Não, era... é porque eu sou apaixonado pela área e eu gosto muito de estatística e o curso também era barato e uma faculdade que alinhava muito ao meu perfil, não era nem para seguir. E era mais para moldar a minha cabeça, minha visão, né? Melhorar os meus sentidos aí no mercado. Eu sempre fui comercial, sempre eu... quando eu comecei a trabalhar, com 14 anos, aí eu virei... lá dentro da lojinha de conveniência eu já tinha... eu gostei da aptidão de vendas, então, o comercial me chamou muita atenção. Mas, naquele primeiro momento, eu acho que passou pela minha cabeça de fazer Economia por causa disso, mas para dar uma evoluída aí.
P1: Você lembra do seu primeiro salário, que você recebeu?
R1: É, na guardinha, eu ganhava meio salário-mínimo. Era seis horas que eu trabalhava, era meio salário e esse meio salário, para mim, era muito, naquele momento.
P1: O que você fez com o dinheiro? Ajudou em casa?
R1: Ah, eu... não, meu pai pedia para pagar, né, para ter responsabilidade, cada... os irmãos trabalhavam também, né, que eu sou filho de... nós somos em cinco irmãos, cada um tinha uma conta ali: água, de luz, IPTU e tal, eu pagava uma continha e... mas o dinheiro eu gastava com os amigos, sentava no final de semana para comer um lanche, tomar um refrigerante. A gente... aí eu queria ter o tênis do momento, né, tinha meu Walkman.
P1: Coisas da época, né?
R1: Coisas da época.
P1: E, Thiago, aí você se formou. Você trabalhava com qual negócio, até chegar o Pedacinho da Canastra?
R1: Então, o meu boom na área comercial foi quando eu comecei, em 2000, trabalhar no call center da Atento, que é a empresa que toma conta da Telefonica, né? Eu fui o primeiro... a primeira equipe a entrar aqui em Ribeirão Preto, nem o prédio tinha sido construído ainda. E aí eu fiquei por lá dois anos. Eu já tinha casado, né? Já tinha... eu casei com 16 para 17 anos. Então, lá, eu tinha... eu atendia clientes, poucos clientes, mas eram clientes jurídicos, PJ. Então, eu tinha que fazer as vendas ali, negociar. Dali, eu saí, fui para uma distribuidora farmacêutica, 2002 a dois mil e... fiquei seis, quase cinco anos e meio na distribuidora farmacêutica, aí eu era televendas. E ali eu comecei a me destacar, eu sempre ficava entre os cinco melhores de vendas, de uma equipe de 80. E, além do salário ali dentro, a gente tinha as campanhas dos laboratórios, tanto laboratório farmacêutico, quanto perfumaria. E nesse momento que eu comecei a fazer o meu pé de meia, porque ali a gente ganhava muito dinheiro, né? Os laboratórios, tanto a área comercial externa, como o pessoal interno, aplicava muito dinheiro para colocar produto no mercado. E ali eu comecei a ter prazer na área de vender. Então, ali, eu comecei a me moldar. Fiquei quase seis anos na empresa, né? Na Sagra, Sagra Dimper, que eram duas empresas, né? E aí começou a dar um boom na minha vida aí. Melhorar a situação financeira, primeiro carro, primeira moto, né? Eu paguei a faculdade... a minha esposa fez... a faculdade da minha esposa foi paga com o meu salário. A minha esposa tinha trabalho, mas a gente tinha uma folga com o meu... que eu ganhava lá, ela fez. Hoje a minha esposa tem o MBA de Controladoria e Finanças pela USP, né? Então, tudo em cima desse trabalho aí.
P1: Certo.
R1: Aí eu saí de lá e fui para a Ambev. Aí a Ambev é aquela escola... aí a Ambev... aí eu virei um vendedor espartano dentro da Ambev.
P2: O que é um vendedor espartano, Thiago?
R1: Ah, eu tenho até dó dos meus concorrentes. Um vendedor espartano é um vendedor que... aguerrido. Porque dentro da Ambev... eu entrei em 2006 lá, deixa eu me recordar... a gente tinha, dentro da sala de vendas, adesivo das concorrentes: da Coca-Cola no chão, da Crystal e tinha... é o molde da Ambev, tá? Ela te ensina muitas coisas...
P2: É uma cultura, né?
R1: A cultura...
P2: A cultura da empresa.
R1: Isso. E ela te ensina muitas coisas, porque eu aprendi a mexer com relatórios, fazer plano de negócio para os meus clientes. Eu tinha relatório de manhã, fazia reunião de manhã, reunião à tarde, coisas que eu não tinha aprendido em quase seis anos de televendas. Televendas era só sentar e fazer venda para os donos de farmácias e distribuidoras, né? Na Ambev, eu aprendi a me tornar um cara mais técnico, tanto para relatórios, como ser um vendedor mais agressivo. Só que eu saí da Ambev, eu tive que fazer um trabalho psicológico comigo, para dar uma suavizada no mercado, até para não sair um vendedor Ambev. Mas, assim, o currículo Ambev, em qualquer empresa que eu fazia entrevista, era muito, muito bem-vindo.
P1: Sim. E depois que você saiu de lá?
R1: Aí eu fui trabalhar na Bunge, na quinta maior empresa de alimentos do mundo, uma divisão diferente, que é a divisão Food Services. Fui trabalhar... praticamente é farinhas e margarinas, né? Eu aprendi a área de produção, padarias, grandes padarias, as maiores do interior de São Paulo e supermercados. Então, eu falava diretamente com profissional...
P1: Certo. E só voltando um pouquinho a história: como é que você conheceu a sua esposa, a Mirian?
R1: A minha esposa eu a conheci no colégio, no ensino médio, no Mousinho, né? A gente... ela era promotora da Danone e eu, naquela época, estava trabalhando... eu acho que eu trabalhava em um escritório administrativo, não estava na área de vendas ainda e a gente estudava junto, né, fazia o ensino médio à noite.
P1: Ah, sei. Aí deu certo, casaram...
R1: Casamos, juntamos. Temos uma filha de 23 anos, que estuda também. Faz Química.
P1: Que legal! E aí, como é que... o Pedacinho da Canastra é o seu primeiro negócio próprio?
R1: Não, eu tive um varejão quando a gente... tentou empreitar com o varejão, mas eu não tinha muito conhecimento nenhum de empreendedorismo. Eu tinha o feeling para vendas, mas não tinha o conhecimento, não tinha faculdade, nem eu e nem minha esposa. A gente montou um varejão, ficou um ano e meio com ele, numa periferia de Ribeirão Preto. Esse varejão era do meu cunhado e aí ele mudou da cidade e falou: “Thiago, você quer assumir?” Eu tinha acabado de sair de um emprego, falei: “Ah...”. Assumi, né? Só que eu assumi sem ter conhecimento no ramo de empreendedorismo, fluxo de caixa e a gente, um ano e meio, tivemos que encerrar as atividades ali.
P1: Certo. Depois da Ambev, você foi para onde?
R1: Fui para Bunge, fiquei dois anos, quase dois anos na Bunge, da Bunge eu fui para LBR Lácteos que, naquele momento, era dona da marca Parmalat, fiquei quase três anos. A LBR Lácteos tinha, detinha naquele momento ali seis marcas de leites no Brasil, ela era a maior empresa de leites, de lácteos no Brasil, entre elas, Parmalat. Eu atendia praticamente... aí eu também comecei a dar uma melhorada, porque eu fui atender os __ (15:54), né, que são as redes Mackro, Atacadão. E ali eu fui conhecer um outro mundo também, que é ser gestor de promotor, né? Eu tinha promotor e tinha três PJs que a empresa tinha. Eu era direto, né, CLT, só que a empresa também tinha os PJs. Eu tive que assumir... aí eu comecei a lidar com dois tipos de profissionais que eu não tinha conhecimento, que eu não tinha... eu era só vendedor antes, vendedor técnico. Aí eu fui tomar conta de uma equipe de 14 promotores, que eu cheguei, eu tinha que mandar pelo menos metade embora para contratar novos, que meu gerente me deu esse desafio. E três PJs que eram pessoas de idade, que eram pessoas antigas da... que tinham a carteira de leites na região, né, entre Bauru, Rio Preto e Prudente e eu tive que aprender a lidar com esse tipo... duas gerações diferentes aí.
P2: Thiago, deixa eu te fazer uma pergunta.
R1: Sim.
P2: É assim: a sua carreira, você fica três anos numa empresa, cinco anos na outra, uma carreira muito diferente assim, do que os nossos pais devem ter desenvolvido assim, né?
R1: Sim.
P2: Meu pai ficou 35 anos no mesmo emprego, assim, né? Começou e aposentou e ficou 35 anos.
R1: Meu pai ficou trinta, né? Meu pai ficou trinta.
P2: Isso. Então, assim, como é que é, assim, essa facilidade de você mudar de emprego, de você ser chamado, esse mudar de empresa, de cultura organizacional? Como é que é isso? Como é que isso aconteceu na sua vida?
R1: A nova geração é assim, né? A nova geração, você... eles estão sempre... eles não ficam... no máximo dois anos em emprego, porque eles querem coisas novas, eles... a não ser que eles montem um negócio próprio. Eu sou da meia... da geração do meio. É que eu me considero um ótimo, um ótimo vendedor, né? Então, eu sempre recebia propostas. Aí eu saí em 2016, foi meu último emprego, que eu pedi demissão, encerrei meu LinkedIn. E encerrei não, deixei meu LinkedIn lá, coloquei o nome da empresa, mas até hoje eu recebo oferta de emprego. Mas é por causa das pessoas que eu conheço no mercado, que sempre me indicaram e sempre surgiam ofertas. E não é ofertas assim para você ganhar duzentos reais a mais. Eram ofertas, assim, absurdas. Eu fiquei 15 anos sem comprar um carro. A minha esposa tinha o carro dela, mas eu sempre andei com carro de frota e cartão corporativo, tinha bônus, né? Todas as empresas que eu passei, eu ganhava bônus. Chegava em março, eu não via... março e abril, para ganhar aqueles bônus maravilhosos que eu ganho. É diferente do meu pai e da minha mãe, que estão acostumados com o salário fixo no mês. Meu pai e minha mãe estavam acostumados... eu não acho que eu conseguiria ser um funcionário público de jeito nenhum. Ter sempre aquela rendinha. Eu não sou tão ambicioso com dinheiro, mas eu acostumei, eu tinha... eu sou aberto a desafios, né? E chegava a bater 20, 30% no ano. Quando eu passei pela L’Oréal, fiquei três anos na L’Oréal, que é a maior empresa de cosméticos do mundo, eu, primeiro ano, eu fiz 30% da minha região e aí eu ganho um bônus, a gente foi para fora, um puta de um dinheiro, né? Então...
P2: Uhum.
R1: E até hoje eu recebo oferta. Acho que agora, o ano passado, eu recebi uma oferta da Sadia, para assumir a região aqui, de supervisor de vendas. Eu falei: “Cara, agradeço”. Porque o gerente que está em São Paulo é um cara conhecido, ex Ambev e aí, ele namorando meu LinkedIn, fez uma oferta, um salário que eu não ganho hoje na Pedacinho da Canastra, tá? Me ofereceu um dinheiro lá, até hoje eu não ganho o que eu ganhava no meu último emprego, mas estou feliz, tá? Estou feliz, estou trabalhando, adoro acordar no domingo e fazer uma feira. (risos) Estamos aí.
P1: Sim. Muito bom. Ô, Thiago, e como é que foi o planejamento para abrir o Pedacinho da Canastra? Como que começou a sua história com esse negócio?
R1: O Pedacinho da Canastra é assim: eu estava muito bem profissionalmente, né? Não foi para mim, eu montei uma empresa para minha esposa. Por quê? A minha esposa tinha o MBA já há quase dois anos pela USP, né? A gente tinha a ideia de nunca mudar de Ribeirão Preto, a não ser para uma outra cidade menor ainda e ela estava frustrada com a carreira dela, porque ela tinha um teto de salário em Ribeirão Preto que ela não conseguia ultrapassar, mesmo com MBA, tendo experiência. Ela era responsável da área contábil, mas ela sempre ficava nesse teto de valor. Aí ela ficou... ela estava insatisfeita com o salário. Aí ela teve um baque, porque ela foi mandada embora de uma empresa que ela estava muito bem, lidava direto com o dono, uma empresa de quatrocentos funcionários, mas ela lidava com ele e tal, ela assumia muita bronca, né? Assinava as coisas na linha contábil. E aí ela ficou muito desanimada. Aí eu, percebendo essa chateação dela durante seis meses, final de 2014, 2015, eu comecei a fazer um plano de negócio para ela: montar um projeto de algo que a gente não tivesse no interior de São Paulo. Não para mim, para ela. Aí eu apresentei a Canastra para ela quando eu tinha 20 anos, eu já tinha ido com o meu pai algumas vezes. A gente começou a andar muito na Canastra, eu tinha uma moto, a gente andou pela Canastra, ia nas propriedades de produtores de queijo, comia queijo maturado em caverna. Aí ela começou a ter uma outra visão do que é queijo canastra, porque a cabeça dela, em Ribeirão Preto, é o queijo canastra falsificado, que tem aqui nos mercadões, que o pessoal compra queijo da região e fala que é Canastra, né? E aí ela começou a ter uma outra visão com queijo. E a gente começou a participar de eventos de queijo e tal. Aí eu fiz um plano de negócio para ela com uma empresa, o que a gente poderia fazer dentro de... não havendo a necessidade de montar uma loja física, né? Então, meados de junho, maio, junho de 2016, eu... meu cunhado tem uma empresa de Marketing, ele toma conta da conta nacional do Hemocentro, do Brasil inteiro, né? Ele que faz as reuniões e tudo. Tipo o que o Thiago fez aqui agora, ele monta uma empresa para fazer isso, né?
P2: Uhum.
P1: Sei.
R1: E aí fui para o meu cunhado pedir ajuda, né? Falei: “Cara, estou sem dinheiro. Preciso montar um e-commerce, uma loja virtual”. E, naquele momento, não existia aplicativos de e-commerce em lojas aí e tal. Ele me ajudou, em 2016 montou uma loja. Aí eu falei para minha esposa do projeto. Isso de madrugada, eu pensei tudo isso num dia de madrugada, o que... como o pontapé seria inicial. Aí no outro dia sentei no café da manhã, a gente conversou, expliquei para ela, eu falei: “Bem, vamos montar isso”. Aí mostrei para ela a realidade. Comecei... lojas de zona sul, do metro quadrado mais caro do interior de São Paulo à loja do Mercadão, que vendia o mesmo produto. Eu falei para ela: “Ó, vai ser um desafio. Eu tenho o carro da empresa, a empresa não tem limitação de km e tal. No dia da minha folga vamos montar no carro, a gente põe combustível do nosso bolso e a gente vai para Canastra e busca queijo, três a quatro vezes no mês”. Né? Primeira coisa é ter uma estrutura. Primeira coisa, a gente montou um quartinho de maturação de queijo. A gente montou um molde de um quartinho igual da Canastra, compramos uma minicâmara fria de inox e fomos atrás do Cnpj. Montamos um MEI, né, um Cnpj e... antes de tudo, de comprar produto e tudo, tá? E fomos atrás da Vigilância Sanitária de Ribeirão Preto, para entender o trabalho com queijo. A nossa surpresa, que a gente é um dos poucos em Ribeirão Preto que tem deferimento da Vigilância Sanitária para trabalhar com queijo artesanal. Nem loja chique, nem loja de Mercadão tem. E aí o chefe da fiscalização da Vigilância Sanitária marcou uma data para vir na minha casa, para conhecer os queijos. Eu falei: “Ó, eu ainda não tenho o estoque de queijo. Eu vim para saber, para trabalhar na legalização”. Né? Que eu queria fazer feira em shopping, queria estar organizando outros tipos de eventos. Então, eu falei para ele, marcamos um prazo. Eu falei: “Eu estou indo para Canastra, vou buscar o estoque de queijo”. Aí eu trouxe queijos da associação, da Procampo, que são os queijos lá que têm toda orientação das boas práticas e tudo e com o mínimo de inspeção, né, que é o SIM Municipal. E aí eu trouxe os queijos embalados, com rótulo, caixinha e tudo e a gente marcou a visita do deferimento da Vigilância Sanitária aqui em casa, que ele vem com uma fiscal, né? Ou vem o supervisor. Aí eu trouxe cafés também, trouxe mel, né, com inspeção federal e tudo, lá da Serra da Canastra e mostrei para ele o projeto que eu tinha, com tudo já moldado, né? Com Cnpj, com... e aí ele falou que ia fazer uma análise. Em trinta dias, ele me deu o aval de um requerimento da Vigilância Sanitária, para trabalhar com queijo artesanal, mesmo sendo ambulante, né? Sendo e-commerce e tal. E aí a paixão... eu comecei a me aprofundar mais por queijos, tanto eu e minha esposa, eu... a gente montou a empresa, em agosto de 2016 começamos com a empresa, né? E aí a minha esposa começou a estudar queijo e não parou mais. Só que, em seis meses, o negócio se tornou muito grande, porque o que a gente fazia, a gente não tinha em Ribeirão Preto, né, negócio de queijo, daí a gente foi fazer cursos de queijos, né? Isso no ano posterior. Acho que eu passei aí para frente a nossa conversa, né?
P1: Não, não, tudo bem. Mas vocês pegam o queijo que já foi feito lá na Canastra e trazem para vender em Ribeirão ou vocês estão produzindo aí também?
R1: Não, não, a gente é só especialista. A gente é conhecido como cheese monger ou cheese hunter, caçador de queijos. A gente sabe fazer queijo, porque a gente fez cursos. A minha esposa fez curso com o maior produtor de queijo do mundo, que é um francês, em 2017, três dias __ (25:35), ele veio dar curso para os maiores produtores de queijo artesanal do Brasil e tinha três lojistas. Entre os três lojistas, a minha esposa era uma delas. E eu fiz um curso com a professora da maior escola de lácteos do mundo, que é uma francesa, que dá aula na __ (25:48), na França. Eu fiz lá na Serra da Canastra. Naquele momento, quando a gente... eu fiz o curso, eu trabalhava com 14 produtores da Canastra, todos da associação, só Canastra. Então, eu fui convidado pela associação e pelo presidente dela, que é o Joãozinho, né? É um cara muito respeitado no mundo aí, politicamente, ele é dono de várias agências do Sicoob, corporativa. Então... só que a gente expandiu, cresceu muito. Hoje eu tenho mais de setenta tipos de queijos, do Brasil inteiro. Eu trabalho com queijo colonial, de Santa Catarina, queijo coalho e manteiga do Rio Grande do Norte, que vem de avião. Hoje, eu não busco queijo mais. Hoje eu tenho uma transportadora parceira, que é a Rodonaves. A dona da Rodonaves é minha cliente, inclusive, né? Que é a terceira maior transportadora do Brasil. Não só queijo, mas tudo, que eu busco azeite na divisa com o Uruguai, azeite fresco. Também eu faço um trabalho diferente com azeite, que não existe em Ribeirão, porque não é barato, você tem que conhecer de azeite, tem que conhecer de charcutaria, para vender. Eu trabalho com mais trinta, quarenta tipos de charcutaria, que é toda a linha de embutidos, tá? A gente fala charcutaria, mas vocês conhecem como embutidos.
P1: Thiago, e o queijo da Canastra tem vários produtores lá na Serra na Canastra, né?
R1: Sim. Na associação tem sessenta, se eu não me engano, sessenta ou cinquenta, mas registrado tem uns trezentos, pelo IMA, né? Instituto Mineiro de Agricultura.
P1: Sim. E tem uma fórmula para fazer, para ser o queijo da Canastra ou ele pode ter diferença de um produtor para outro? Para quem não conhece...
R1: Sim, sim. O queijo canastra, o que envolve todo é o terruá. O terruá é tudo que envolve ali: a propriedade, o clima, se ele está num ponto de morro, se ele está num vale, da Canastra ainda tem muito capim nativo, capim-gordura, que é meio raro hoje em outras regiões, por ter um outro capim que veio de fora e ele domina e o capim-gordura dá um percentual de gordura maior no leite. A Canastra tem... eu brinco assim: o irmão gêmeo, que tem fazenda um do lado do outro, ele não vai fazer queijo igual. Tá? Isso aí depende muito das mãos, da forma que foi feita a propriedade. A Canastra é só um queijo que existe, tá? Não existe parmesão canastra, não existe queijo capa preta da Canastra. É um tipo de queijo, três tamanhos diferentes, tá? Eu até brinco com os clientes que compram esses queijos coloridos que vêm, na cidade de Piumhi, a gente até brinca ali que Piumhi é o Paraguai dos queijos, porque tem muito laticínio ruim ali, né? E ali, eles querem fazer queijos diferentes, mas com conservantes, corantes, que fogem da regra do artesanal da Canastra, o Canastra que vocês veem na televisão. E o que eu trago para Ribeirão é um canastra legítimo, de produtor artesanal, que tem todo o cuidado das boas práticas ali de higiene, a gente acompanha todos os laudos, eu peço... eu sou um lojista que peço os exames do gado, para ver se eles tomaram a vacina de tuberculose, de brucelose. Então, hoje, o meu cliente, eu o educo para fazer isso. Até porque, se ele for no meu concorrente, ele vai sentir essa diferença na hora de conversar com quem está vendendo queijo para ele. Às vezes é chato, né, o cliente vai lá, me conhece, mas só que esse cliente meu que escutou essa conversa chata, do conhecimento de queijo... tem clientes que adoram, né? Mas aí tem clientes que escutam, ele vai - na hora que ele for numa próxima loja de queijo artesanal - sentir isso na veia. E aí, muitas vezes, você vê que ele voltou por causa disso: dessa confiança com o queijo artesanal.
P1: Ah, ok. Viu, Thiago, e aí, quando vocês começaram a vender o queijo, vocês já abriram o e-commerce, mas vocês iam na feira, né?
R1: É, eu corri atrás, em Ribeirão Preto, procurei saber, comecei a mapear comercialmente com a minha esposa... eu não tinha muito tempo, né? Que eu ficava viajando, a área comercial, eu tinha que correr. Aí eu ficava na santa internet, pesquisando quais eram os melhores pontos para venda. E eu gosto muito de cerveja artesanal, a minha esposa também. Aqui em Ribeirão tem 14 cervejarias, o que acontece? Eu comecei a correr atrás de cervejas, da... eu comecei a dar a cara a tapa nas cervejarias. Fui lá, falei para os caras. Falei: “Ó, eu monto uma mesa de degustação”. Comprei umas tábuas bonitas, fiz curso de corte de queijo e falei para o pessoal. Falei: “Cara, você vende sua cerveja, eu faço degustação de queijo artesanal”. Só que eu levava os queijos brutos, porque eu sabia que cerveja artesanal combina com queijo mais curados. E encantou o pessoal das cervejarias, né? Isso nos primeiros meses. Aí, nesses seis meses, eu corri atrás da feira da Portugal, que é considerada a maior feira do interior de São Paulo, maior feira livre do interior de São Paulo. Ela existe há sessenta anos. Coincidentemente, uma amiga da minha esposa, que fez MBA com a minha esposa, o tio dela estava há quarenta anos na feira e estava repassando o ponto, porque estava com a esposa doente e tal. E na feira de Portugal é só assim: você só consegue... lá, você não consegue... é um ponto dado pela prefeitura, mas é igual ponto de táxi, você tem que comprar, tá? A gente pagou quarenta mil reais. Foi um investimento. Eu não tinha esse dinheiro, a gente gastou quarenta mil reais, pagamos parcelado para o dono da feira. Eu comprei esse ponto investindo... na verdade, eu comprei um ponto lá em... a gente tem feira um, feira dois e feira três, eu posso fazer a feira a semana inteira, em vários pontos da cidade. Só que o e-commerce, eu falei: “Eu vou investir pesado no e-commerce”, porque a minha esposa também, sozinha, não teria condições de fazer a feira durante a semana, porque é toda uma estrutura que a gente monta, tá? Eu não sei se você chegou a ver as minhas redes sociais, hoje a gente vai para feira em quatro pessoas, então... porque ali na feira é uma feira turística, dá muito movimento. Ontem, ela ficou... ela ficou parada um mês, ontem voltou, a gente vendeu 50% que um domingo normal nosso, tá? A mais. Vendemos 50% a mais. O e-commerce eu montei para ajudar nas vendas, rede social investi muito pesado. Eu trabalho, a rede social é toda minha, tá, eu que tomo conta, mas a loja virtual eu pedi ajuda para o meu cunhado. Aí a gente pegou a loja virtual hoje, quem toma conta é a minha esposa, que tem o acesso ali, de atualização de produtos, estoque e tudo. E eu comecei a pesquisar feiras. Aí, aqui em Ribeirão Preto tem uma feira dentro de um local, que é voltado para o público AA de Ribeirão Preto, que é dentro do Fiusa Center, ali na Fiusa, na Avenida Fiusa, de frente ao Pão de Açúcar. Essa feira já existia há um ano mais ou menos, né? E lá já tinha uma feirinha de orgânicos, orgânicos certificados e tal e era da mesma pegada que a nossa. E eu fui lá, apresentei o tipo de negócio, mostrei meu plano de negócio para gerente, ela não tinha vaga, mas ela me colocou para dentro dessa feira, por causa do tipo de produto que eu estava oferecendo para o cliente. Então, isso agregou com os clientes que iam na feira, né? E aí eu comecei a atender um público que eu nunca tinha atendido na minha vida, que são pessoas de alta renda, que não se preocupam com crise, né? Só que eles queriam produtos diferentes. E eu comecei a trazer esse queijo canastra diferente para Ribeirão Preto, eles nunca tinham visto, né? Para eles o canastra era sempre aquele queijo branco furadinho também, mesmo esse pessoal de alta renda, eles viam esse queijo branco furadinho. Até que muitos deles têm casa em Escarpas dos Lagos, mas aí a gente indo para Canastra, a gente passava nos empórios de estrada, era a mesma coisa: era o canastra branco furadinho. Aí eu comecei a mostrar um canastra com mofo branco, perecível, um queijo maturado sessenta dias, que harmoniza muito bem com os vinhos que eles compram, né? E aí comecei a ter abertura. Fui convidado para outros eventos. Aí me chamavam para fazer bazar chique, para fazer... aí tinham vários eventos aqui voltado, por exemplo: Grupo das Mulheres, eu sou parceiro do Grupo das Mulheres que a Luíza Trajano é presidente, né? Eu sou parceiro da... e quem é presidente hoje é a Vera Naves, que é dona da Rodonaves, que tem três mil funcionários. Aí, por causa disso, a gente se tornou amigo e ela se tornou uma cliente. Com esse tipo de feira, eu comecei a atrair outros olhares. E, dentro das cervejarias artesanais, eu tenho um outro público, né? Nas feiras, eu tenho, por exemplo, da Fiusa, eu tenho um público, na cervejaria eu tenho um público, a galera que gosta de cerveja artesanal, mas gosta de um queijo bom, curado. Aí eu comecei a sair só dos queijos canastra e fui para os queijos do Serro. Hoje eu tenho seis produtores do Serro. O que é o Serro? O Serro é a região mais antiga do Brasil, é no norte de Minas, perto de Diamantina. Essa região é a primeira região a produzir queijo com os portugueses. Só que lá, os produtores já têm a expertise de maturação. Eles já me entregam o queijo sem lactose, com sessenta dias de maturação, todos com mofo. E lá é um queijo de outro terruá também, são três biomas, né? E hoje esses queijos do Serro agradam muita gente. Agradam muita gente. Eu tenho aquele senhorzinho de chinelo Havaiana, mecânico, que comeu esse queijo na feira de Portugal comigo, que vai na loja hoje de chinelinho, de bicicleta, comprar esse queijo e paga oitenta reais no queijo, oitenta reais numa peça de queijo. É um cliente que ele falou que só ia no Mercadão, comprava o queijo tal. Hoje ele compra o queijo de uma produtora específica, que é uma produtora que tem oito gerações produzindo queijo, mais de duzentos anos está na mão da mesma família, fazendo queijo na fazenda lá e ele se encantou com o sabor desse queijo. Ele não troca essa produtora, mas ele vai uma vez por semana buscar esse queijo. Entendeu?
P1: Que legal!
R1: Só que ele compra um doce, compra um café hoje, que eu trago uns cafés especiais também, né?
P1: Sim. E, ô Thiago, além desse local que você acabou de citar, no norte de Minas, ali perto de Diamantina, onde são os lugares mais importantes de produção de queijo no Brasil? Além da Serra da Canastra também. Onde mais...
R1: Minas Gerais, eu trago queijo de várias regiões. Eu trago Vertentes, trago do Cerrado Mineiro, que é um queijo mais leve, o Cerrado Mineiro eu posso trazer queijo com sete dias, então, é considerado fresco. Canastra eu não posso trazer com menos de 22 dias. Agora acabou de ser aprovado pelo Ministério de Agricultura, a Tereza Cristina aprovou, então abaixou para 14 dias, né? Então, agora, a gente vai poder trazer canastra com 14 dias. Até brinco com os meus clientes, falo: “Ó, queijo branco canastra não existe”. Aí a gente fala: “Existe lá, para o produtor mineiro ou em Minas Gerais”. Então, eu trago sempre...
P2: Por que... desculpa. Desculpa, termina.
R1: Aí o queijo canastra, ele tem que sair no mínimo de 14 dias tendo inspeção, porque se ele for pego menos de 14 dias, ele tem essa... ele pode perder a inspeção sanitária, seja municipal, estadual, entendeu, ou federal. Então, ele não pode arriscar dessa forma e ele pode tomar multas, né? Por ele está dentro de uma legislação ali, ele pagar para ter inspeção, então ele tem que seguir essas regras. Acabou de abaixar de 22 para 14. Eu trabalho com Canastra, Serro, que é a região mais antiga do Brasil de queijos artesanais. Estou trazendo faz um ano e é um sucesso, os parmesões da Mantiqueira. A gente trabalha com parmesão de leite cru, que é feito em oito municípios, que a gente conhece a região lá, chama Terras Altas da Mantiqueira, é um parmesão feito só no Brasil. Porque o parmesão que a gente conhece de supermercado, dos empórios aí, é de leite pasteurizado, que é a receita tradicional italiana. Eu trago um parmesão de leite cru, que é um queijo que não precisa ir para geladeira. Trago dois tipos de queijos de um produtor que está há trinta anos no mercado. E trago da região da Mantiqueira, Canastra, Cerrado Mineiro. Triângulo Mineiro eu trago queijo de Monte Carmelo, tem muito queijo. A gente fala Triângulo Mineiro, as pessoas só vinculam Uberlândia e Uberaba, mas Triângulo Mineiro são 11 municípios. Porque cada região do queijo tem uma delimitação que eles fiscalizam. Que nem a Canastra, tem mais de 18 municípios, se eu não me engano, se eu não estou falando besteira, mas só oito fazem parte da associação, que podem ter queijo com o nome Canastra.
P1: Você falou até Rio Grande...
R1: Oi?
P1: Você falou até de Rio Grande do Norte você traz queijo?
R1: É, eu trago queijo manteiga, que é o que a gente faz com requeijão do sertão, requeijão do norte. Trago queijo coalho e a manteiga de garrafa, dessa produtora. Ela é uma lojista, ela faz parte da associação que a gente está dentro e a gente faz parte da associação. Todo esse trabalho nosso engrandeceu o nosso trabalho, a gente faz parte da associação Comerqueijo, que organiza o maior prêmio de queijo artesanal da América Latina. Até em 2019, eu fui o organizador. Eu cortei os queijos para os jurados e tal, eu sou um dos organizadores.
P1: Legal.
R1: E aí, essa colega nossa, a família dela é da terceira geração de produtores de queijo do Rio Grande do Norte e eu estava procurando parceiro e lá está tendo problema de adulteração, porque o pessoal está pensando, alguns produtores estão pensando mais no business do que na qualidade. Então... e foi até uma indicação do... conversando com o gerente do Sebrae lá de Rio Grande do Norte, ele tinha comentado desse queijo, coincidentemente essa colega entrou na associação e aí a gente começou a namorar. Só que o problema da logística, né? Muito longe, eu tenho que receber o queijo rápido, tudo e a Rodonaves não vai... não ia para o norte, nordeste. Aí começou a... não pela Rodonaves, mas aí a gente conseguiu um bom frete pela Azul, né? Então, o queijo, ela posta num dia e no outro dia chega aqui na minha loja. Isso, há seis meses, a gente começou a trabalhar com esse queijo. Conseguimos reduzir o preço de logística para o queijo não chegar muito caro, o pessoal não assustar, né? Mas aí é um queijo maravilhoso. Eu trago queijo de Santa Catarina pela transportadora, via rodoviária. Eu trago um queijo colonial de uma família italiana que tem o selo Arte, né? Agora eu vou trazer queijo serrano. Já mapeei três queijos serranos, que são do Rio Grande do Sul, né? O queijo colonial que eu trago é de Santa Catarina. Vou trazer... agora também estou... fiz um pedido agora, já está encomendado, que é artesanal assim: você encomenda trinta dias para esperar o queijo. Tá? Não é igual indústria, que você liga e já tem o queijo lá pronto. Eu encomendei com um italiano que ele nem tem telefone no Brasil, o telefone dele é italiano ainda, que chama Amedeo. Ele faz uns robiolas, que é um queijo tipo iogurte com um paninho em volta, que é um queijo supercremoso, ele faz nas montanhas capixabas. Aí ele vai despachar de Vitória para mim e vai vir via rodoviária também, pela Rodonaves. Aí ele coloca no isopor todo com forminha de gel, né? Vem todo o cuidado que a gente, eu oriento o produtor mandar, porque eu sei o tempo da minha logística, então eu falo para ele. Eu falo: “Ó, coloca no isopor, já coloca... embute o custo do isopor, embute o custo das forminhas de gel, né, para o produto chegar com qualidade para o meu cliente”.
P2: Agora, Thiago, você falou desse prazo de 14 para 21 dias. Por que acontece esse prazo que ele precisa ter para circular?
R1: Esse daí foi uma determinação pelo Instituto Mineiro de Agricultura, que cada região é fiscalizada por veterinários, né? Então, é o risco da contaminação. Aí eles falam: “Ó, essa região aqui pode mandar queijo tal. Essa região pode mandar queijo tal”. Isso depende do terruá. É uma determinação que quem manda isso são os órgãos fiscalizadores do estado. Fala: “Canastra tinha 22 dias”. Aí foi uma briga da associação dos produtores, para baixar de 22 dias para 14 dias. Aí eles têm que mostrar comprovadamente que o queijo não tem o risco de contaminação com menos de 14... acima de 14 dias, né?
P2: Quando você fala “contaminação” é deterioração, estragar...
R1: É deterioração para transporte. Porque, como eles mandam queijo para o Brasil inteiro, o risco da contaminação externa, né? Do queijo do transporte e tal. Que nem o queijo do Cerrado Mineiro, eu recebo, mas embalado à vácuo. Eu o recebo com sete dias fresco, né? Ele tem essa liberação pela região dele, o Triângulo Mineiro é 11 dias. Cada região tem uma...
P2: Tem uma legislação própria.
R1: Tem, própria para sua região. E isso é determinado pela região do queijo. Por exemplo: região de Araxá aí tem uma. Araxá eu vou voltar a trabalhar agora, tinha parado também. Araxá, o pessoal confunde muito, por causa dos mercadões lá em Minas, que tem os queijos também falsificados, queijo canastra de Araxá. E Canastra é uma região de queijo e Araxá é outra. E às vezes a gente fala que ele tem tríplice fronteira, porque ele aparece aqui no rótulo “Queijo Canastra de Araxá produzido em Cerrado Mineiro, Cruzeiro de Fortaleza”. Aí é um queijo de três regiões. A gente até brinca nos grupos de WhatsApp de lojista e de produtores, né? Eu estou em vários grupos de WhatsApp de produtores, especialistas, né? Inclusive, nesse grupo, está o parente do Ariano Suassuna, que produz queijo, que é a Fazenda Carnaúba, lá no nordeste, na Paraíba. Eu vou trazer os queijo dele, queijo de cabra, é o sobrinho do Ariano Suassuna.
P2: Olha!
R1: Queijo muito famoso.
P1: Ô, Thiago, e esse conhecimento que você adquiriu, você acabou de dar uma aula aqui para gente sobre um monte de coisa de queijo, de região, de conservação. Você leu muito em livros específicos...
R1: Sim, sim.
P1: ...na internet. Onde você foi buscar essa bagagem?
R1: A internet ajuda muito, mas é mais leitura, né? Eu comecei a pesquisar pessoas do mundo do queijo. Um deles trabalha com indústria, mas ele é um cara muito especialista, chama Múcio Furtado. Ele tem seis livros, inclusive eu tinha os livros dele físicos, na mão, esses dias eu recebi on line, porque a gente sempre está atualizando, qualquer dúvida... ele fala sobre efeitos de queijo. O francês, quando veio no Brasil, veio falar sobre curas de queijo e defeitos de queijo, né? Ele tem 57 queijarias pelo mundo, em Nova York ele tem três. Ele é... há oitocentos anos a família dele faz queijo, esse que a minha esposa fez queijo, que chama Hervé Mons. Então, a partir dali, a gente começou... deu um... acendeu a faísca: “Vamos estudar, vamos estudar”. Muitas vezes, hoje, eu e minha esposa sabemos mais que alguns produtores que a gente vai visitar. Às vezes, o produtor anda muito naquele ritmo dele...
P1: Só o dele.
R1: Só do queijo dele. É. Hoje eu trabalho com queijo de cabra, búfala, ovelha e vaca. Eu trabalho com mais de 14 tipos de queijo de cabra, que é um público bem paladar mais afinado para queijos, né? Tem desde queijo fresco de vaca a queijos maturado dois meses. Você tem que saber o público que você vai oferecer um queijo desse, porque parece que você está mastigando o bode lá no curral, tá? Então, os queijos de cabra são bem fortes. Mas tem público que é apaixonado, você vê o olhinho dele até brilhar, porque eu cheguei em Ribeirão Preto com esses queijos aqui e hoje eu vejo as pessoas que têm muito dinheiro, não tinham acesso a esses queijos de cabra. As pessoas tinham acesso sabe onde? Quando viajava para Europa, quando tinha férias, quando sentava num restaurante na Suíça, sentava num... porque lá, você chega, tem uma tábua de queijos infinitos. Aqui, você vai em qualquer restaurante, qualquer hotel que você se hospeda, é muçarela ou queijo frescal, né? E eu comecei a degustar. Ontem, por exemplo, foi um casal na feira lá, ficou um mês sem comprar queijo de cabra com a gente, eles são apaixonados por queijo de cabra, eles viajam o mundo inteiro e eu sempre estou - faz noventa dias que eu abri a loja, né - lá com o banner, tem o QR Code lá para o cara cair, cai direto na minha loja, cai no meu endereço. E eu falei para eles, eu falei: “Gente, a loja está aberta” “Ai, meu Deus do céu, eu não sabia”. Aí, ontem eles compraram 250 reais de queijo de cabra, um exemplo, eles compraram oito tipo de queijo de cabra, oito tipos. Estavam, assim, sabe, sedentos por queijo de cabra. Aí você vê que a pessoa... e assim são pessoas que não acham. Ele falou: “Cara, eu não acho”. Eu falei para eles: “Ó, uma pena vocês não terem percebido, mas eu estou há três meses falando que vou abrir a loja física”. (risos) Eles: “Ai, tudo que você falar agora, eu vou prestar atenção, a gente ficou sem queijo um mês”. Porque ficou um mês fechada a feira. Então, tem essss coisas que a gente tem que pegar no ar, né? Eu, assim, eu sou... eu falo para a minha esposa que eu vendo dormindo. Então, a minha esposa não é... ela não tinha nada de feeling comercial, nada, nada. Era totalmente da área financeira. Hoje, ela aprende vender. A minha filha hoje, por exemplo, já trabalhou com a gente, fez alguns bicos também, está fazendo faculdade, mas ela está aqui em Ribeirão, porque está parado, ela estuda em Foz do Iguaçu, na Federal de Química lá. Hoje, minha filha é uma boa também, sabe vender, né, por causa do pai. E eu faço tudo isso no automático. Eu estudo, leio muito e, de queijo, a gente tem que estar sempre conhecendo. E como eu estou nesses grupos de WhatsApp e debates, estou em grupos no Facebook também, de produtores de queijos, tanto paulista como no Brasil inteiro e de consumidores. E ali dentro dos grupos, eu às vezes... consumidor com muitas dúvidas, né? Esses dias estava tendo uma dúvida de queijo provolone. Infelizmente, no Brasil, o provolone, 80% deles é dominado pela indústria que usa uma marca provolone e fazem a defumação líquida. Aí teve uma moça lá que falou um depoimento muito chocante, que ela teve uma reação muito alérgica e eu expliquei para ela. Falei: “Ó, o que acontece? Defumação líquida...”. Eu sou formado em charcutaria, eu me formei em charcutaria também o ano passado, tá? Pela Escola Curato lá em São Paulo, mais para ser um vendedor técnico como eu era nas empresas que eu trabalhei. Do queijo, a mesma coisa, por isso que eu estudo. Essa moça, o depoimento dela foi o seguinte: ela teve uma reação muito alérgica, foi parar no hospital, ficou internada três dias, ela inchou o rosto, fechou os olhos dela, por causa desse provolone. Aí eu expliquei para ela que não foi o queijo. Foi a defumação líquida que foi colocada nesse queijo provolone, que quando é da indústria, a indústria faz isso porque quer rapidez, fazer queijo, já defumar e já colocar no mercado. E eu falei para ela tomar muito cuidado, mesmo com inspeção federal, esse queijo acontece isso, porque as pessoas têm essa reação alérgica. E essa fumaça líquida é liberada pelo governo brasileiro, tá? Como alguns agrotóxicos aí que não são liberados, por exemplo, fora do Brasil, mas são liberados aqui. E eu expliquei para ela quando ela for comprar provolone, comprar provolone artesanal e tem que saber do lojista se é feito com defumação de madeira. Eu trabalho com dois com defumação de madeira. Aí ela agradeceu, me elogiou. Aí teve alguns produtores que estão nesse grupo de queijo, foram lá, comentaram, me agradeceram. Teve dois produtores do Paraná antigos, que ele falou que é a terceira geração e que nunca tinha ouvido falar e eles veem os provolones industriais nos mercados, mas não sabia a diferença para vender o provolone que ele produz. Ele tem o provolone e ele não sabia a diferenciação. Aí, com a minha argumentação, com o meu depoimento ali, ele vai usar essa argumentação para vender o provolone dele, nas feirinhas que ele faz lá no Paraná, em Londrina. Aí eu passei o meu WhatsApp para eles. Falei: “Cara, qualquer dúvida, qualquer ajuda que vocês quiserem, pode entrar em contato comigo”.
P2: Porque agrega valor, né, Thiago?
R1: Agrega demais. Mas você precisa saber tudo que você está vendendo. Eu falei para minha esposa. Hoje eu vendo um azeite 250 mls a sessenta reais, qual que é a diferença do meu azeite para o do mercado? O meu azeite é fresco, extravirgem fresco. O meu azeite acabou de ser feito agora em março, foi envazado em março. A diferença é que as pessoas vão atrás da acidez do azeite, não vão da frescura do azeite. O azeite é o inverso do vinho: quanto mais novo, melhor é. E, no Brasil, não acha azeite importado fresco, você acha de um ano de safra. E às vezes você compra aqueles azeites na promoção no Pão de Açúcar e ele está oxidado, amargo, por causa dessa oxidação. Eu comecei a participar de eventos de queijo e, dentro dos eventos de queijo em Minas Gerais, quando a gente vai em Belo Horizonte, que são os eventos que reúnem todos os produtores, iam produtores de azeite. Aí a gente começou, na papila gustativa, degustar azeite fresco, eu e minha esposa, extravirgem fresco, acidez 01, acidez 02, mas azeite acabado de fazer, envazado. Falei: “Bem, que azeite é esse?”. E a gente é apaixonado por azeite. Azeite, café e queijo. Cafés... aí eu comecei a degustar azeite fresco e tal. Me assustou os preços no começo, né, porque tem azeite no mercado, Gallo Reserva, vinte reais no mercado. Falei: “Como que eu vou vender um azeite de sessenta contos?” Beleza. Aí a gente começou a ir visitar olivais aqui na Mantiqueira. Só que o meu primeiro pontapé com azeite não foi da Mantiqueira. Por quê? Fui atrás do Rio Grande do Sul, que já tinha mais de cem anos de experiência, né?
P1: Sim.
R1: E aí, o azeite do Rio Grande do Sul, peguei um dos melhores lá e comecei a trazer para Ribeirão, duas caixinhas bem modestas, né? E começou a ter um sucesso também, porque o cliente também não tinha visto o queijo canastra que eu vendia, não tinha visto azeite fresco. E aí comecei a pegar o mesmo público de perfil de público do queijo, com o do azeite. E a mesma coisa da charcutaria também, né? A charcutaria, por exemplo, eu trabalho com três produtores, né? Comecei com carne de porco na lata, com inspeção sanitária, que é raro no mercado, tá? Eu trabalho com aquela carne de porco mergulhada na banha e é um produtor mineiro que tem inspeção sanitária. Aí, a partir daí, eu comecei a trazer produtos curados, né? Salames curados feito de porco raiz, porco preto. Hoje, eu trabalho com defumados madeira de macieira e laranjeira, um produtor de Vinhedo que tem inspeção estadual. Esse outro de Tietê que faz a linha de curados. Joelhinhos de porco, eu trabalho com guanciale, que é bochecha suína, para fazer o melhor carbonara da vida. Então, a gente tem produtos diferenciados para os clientes que compram, já, o queijo. Então, o queijo me ajudou com a venda circular: eu vendo azeite, eu vendo café, vendo doce, né? Vendo a charcutaria.
P1: Ô Thiago...
P2: Thiago...
P1: ...eu ia até te perguntar isso, você abriu a loja agora há pouco tempo, né? Noventa dias, você disse.
R1: Sim. Fiquei noventa dias... que a gente a abriu.
P1: E na loja... na feira você já agregava esses outros produtos em volta do queijo, né?
R1: Na Avenida Portugal, eu sempre... eu tenho um trailer loja, na feira eu levo um trailer loja, eu moo o café arábico especial gourmet. Esse trailer meu tem geladeira, tem pia, então fica uma pessoa operacional lá, cortando degustação de queijo, fazendo toda a manipulação, com os cuidados necessários. Eu tenho... na feira a gente levava todos os produtos. Antes da loja, eu levava todos. Hoje, com a loja, eu levo 60%, não leva tudo. Aí, os queijos mais delicados, por exemplo, de cabra fino e alguns outros queijos, alguns outros produtos, eu não levo para a feira.
P1: Sim.
R1: Aí eu falo para o cliente, o cliente vê na rede social, no Instagram, Facebook: “Ah, você não trouxe aqui?” Eu falei: “Mas eu tenho na loja”. Eu meio que o obrigo ir na loja, eu quero que, na loja, ele vá conhecer outros produtos, conhecer a loja. Eu montei uma loja clean, uma loja slim, bem limpa visualmente e eu tenho trezentos e vinte produtos. Então, na loja, eu montei uma loja limpa, com visual bem legal, ampla, né? E com facilidade para o cliente ir, porque eu tenho 12 vagas de estacionamento lá. É uma galeria, com várias vagas de estacionamento.
P1: Muito legal. Ô, Thiago, você diria que o seu cliente é um... está numa faixa mais alta financeiramente, né? Porque você escolheu um ramo que busca esses artigos específicos, mais...
R1: Então, Luís...
P1: O que você diria do seu público?
R1: Eu tenho docinho de oito reais, tenho docinho de três reais. Eu tenho um queijinho canastra, que eu trago, o merendeiro, porque eu te falei para você, na canastra é um tipo de queijo, mas três tamanhos: merendeiro, tradicional de um quilo... merendeiro pesa 350 a 400 gramas e o canastra real, que eu quase não trabalho, que é de cinco a oito quilos. Tá? Eu atendo hoje, na feira da Portugal, todas as classes sociais. Todos. Aquele senhor que vai comprar um requeijão do norte lá, porque ele saiu do Rio Grande do Norte há quarenta anos, ele vai de bicicletinha e ele é uma lembrança gastronômica efetiva. Tem aquele senhorzinho que vai comprar carne de porco na lata, porque nunca viu uma carne... aqui em Ribeirão, se você andar, você vai ver carne de porco na lata em pote de plástico, sem inspeção. Então, a minha é uma carne de porco mineira, um pernil curtido na banha. Então, eu vejo... tem gente que junta o dinheiro, pergunta se eu aceito ticket, eu não aceito ticket por causa da exploração que existe dessas empresas, né? E aí, na feira da Portugal tem todas as classes sociais. Eu já cheguei a atender, por exemplo, pessoas bem pobres, que vão lá comprar docinho, vão comprar manteiga de garrafa e pessoas de classe alta, muito alta, né? Eu tenho, por exemplo, um cliente famoso, que é o Augusto Cury, que é um dos maiores escritores do Brasil, que ele já foi na feira Portugal indicado por outro cliente. Só que ele vai disfarçado, tá? É duro que vai ficar gravado isso, talvez ele possa ver, ele não gosta de dar autógrafo, tá?
P1: Está legal.
R1: E eu tenho também o maior chef de cozinha do interior de São Paulo, que foi recentemente, que é o Renato Aguiar. Ele faz casamento de globais, tal. Ele foi com a mãe dele, comprar uns queijos do Serro, para fazer um evento de vinho em São Paulo, né? E aí ele foi, porque só eu tenho queijo do Serro em Ribeirão Preto. E aí, queijo do Serro maturado, ele foi comprar uns queijos específicos, ele só queria queijo do Serro, para levar para São Paulo, para fazer um evento de vinho, que era contratado.
P1: Legal. Ô, Thiago e...
R1: Por isso que eu amo a feira, tá? Por isso que eu amo a feira. A feira eu atendo todas as classes sociais. A pessoa que chega com o dinheirinho contado, pede desconto e eu dou. Pessoas que chegam... que nem ontem, lá, dei um desconto para o cliente, até brinquei com ele, ele é um cara que sempre pede desconto, pede desconto, pede desconto, compra bastante, mas pede desconto, desconto, desconto, cara chato. Aí ele veio me falar que é dono de um hospital particular. Aí ele falou: “Eu sou dono do hospital tal”. Eu falei: “Ah!”. Aí ele pegou e falou assim: “E eu não estou atendendo Covid não, viu? Só atendo convênio __ (55:03)”. Aí eu até brinquei, eu falei para minha esposa, eu falei: “Ó, Mirian, não dá mais desconto para ele não, viu?”. Aí ele saiu de lá rindo. Aí eu falei: “Não dá mais desconto, não”. Sacanagem.
P1: Ele tem condições, é verdade. Ô Thiago, e a propaganda? Você já disse, eu já percebi que você tem bastante penetração nas redes sociais, mas você já chegou a fazer propaganda em rádio, jornal, folheto, essas coisas?
R1: Então, eu participei de um evento... antes de... há uns seis meses, a gente participou de um evento do Sebrae nacional, com uma pessoa de Brasília. Ela pediu também para fazer um evento, a gente fez lá, falando de empreendedorismo, colega de São Paulo, do Rio, aí ela me deu um voucher de duzentos reais, para gastar no Facebook e no Instagram. Rapaz, não me gerou retorno nenhum. Estou lá gastando e tal, mas o que acontece? Eu sempre mantenho o meu Instagram atualizado, um a dois posts, no máximo, por dia, eu sigo um padrão. Porque eu sei que a internet é tudo algoritmo hoje. Eu sigo um padrão, o que é? Está sempre com os stories com os produtos que eu trabalho sempre bonitinho, fotografia. Hoje a gente é muito de imagem, então eu estou com os stories sempre atualizados, faço os posts corretos, marcando o endereço, loja virtual, e-commerce. E eu tenho... desde quando eu montei a empresa, um WhatsApp comercial, separado do meu particular, eu tenho o WhatsApp Business, dentro desse WhatsApp Business eu tenho catálogo, tenho o horário de funcionamento. Hoje, por exemplo, eu estou de folga, mas já tem três clientes lá fazendo pedido comigo lá, só que eu vou responder só amanhã. Essa é uma educação para o meu cliente. E desde quando eu comecei, eu tenho delivery gratuito em Ribeirão Preto, dois dias na semana, não entrego todos os dias. Mesmo na pandemia, desespero, o cliente querendo as coisas, eu entrego só de quarta e de sexta-feira e nunca terceirizei. A gente tem a... faz as coisas todas diferente dos meus concorrentes. Eu tenho delivery gratuito, não cobro, não tem mínimo para compra e somos nós que fazemos. Eu deixo bem claro para o cliente. Falo: “Ó, o delivery é nosso e eu entrego para você. Eu vou no seu condomínio”. Porque eu atendo um cliente diferente também. Imagina um cara do iFood - não é desmerecendo o iFood - com aquela mochila cheia de sujeira, que eu vejo os caras entregando sujos, entrar num condomínio de alto padrão, para fazer uma entrega de um queijo que eu estou vendendo para o cara lá, um pedido de duzentos reais de queijo, né? Então, eu tenho meio que esse preconceito ainda de entregadores, né? Eu escuto relato dos amigos meus, que têm empresas que eles contrataram lá em São Paulo, que estão dando golpe nos clientes deles. Por exemplo: o cliente já paga o pedido e vai entregar na casa da pessoa e a pessoa não está lá, mas tem um parente e cobra de novo, leva a maquininha dele e acontece isso. Relato, né? Nesse momento da pandemia está aparecendo muito golpista, muito, muito, muito. Então, eu deixo a minha empresa fechada em nós e, se eu for colocar um entregador, esse entregador vai ser um entregador nosso, CLT, vou registrar, né? Inclusive, eu estava procurando moto agora para comprar, para entregar, porque o combustível está aumentando muito, eu queria comprar... eu só entrego de carro, né? Eu queria comprar uma moto para loja para entrega, para a possibilidade de aumentar até um dia de delivery mais, só que eu estava procurando moto usada, só que era tanto golpista querendo vender moto, gente. Aí eu chamava os caras no WhatsApp, eu falei: “Cara, não vai fazer malandragem comigo não, eu cresci no bairro mais violento de Ribeirão Preto, meu pai trabalhou trinta anos na Febem”. Aí eu falava para o cara, falei: “Irmão...”. Aí era moto roubada, que não tinha documento. Aí eu desisti. Eu falei: “Vou esperar abrir as lojas de motos usadas em Ribeirão Preto, que eu vou na loja, olhar”. Eu estava tentando comprar pela internet, mas pela internet estava um banho de golpista querendo vender moto. Hoje, a internet, eu tomo conta dela. Quando eu for terceirizar, eu vou ter que multiplicar isso para uma pessoa, porque eu sei que vai chegar o momento de eu estar passando isso para outra pessoa. O Google Meu Negócio eu invisto muito, que é atualização ali no Google. Quando a pessoa pesquisa hoje, eu tenho esse domínio, tá? E eu pergunto, pessoa, cliente novo que chega na loja, eu falo: “Como que você achou?” “Ah, eu pus no Google ‘queijo de cabra’, apareceu você; ‘queijo de búfala’, apareceu você”. E, assim, concorrentes em Ribeirão Preto que põe patrocínio, que pagam o Google para aparecer em destaque. Eu nunca paguei. Eu pago lá por cada acesso que o cliente coloca no Google. E eu sempre falei pros meus colegas lojistas que estão sofrendo nessa pandemia, que aprenderam agora também, na dor, né? Tem lojista há 25 anos e nunca tinha delivery, só que na pandemia ele teve que aprender. Ele tinha trinta funcionários, mandou metade embora, porque não tinha um delivery ativo. Eu falei: “Paulo...”. E ele é o presidente da nossa associação, inclusive, tá? Eu já tinha o delivery antes da pandemia, então não sofri com isso. Eu fui ficando mais atento à rede social, mais cuidados, né? O Google Meu Negócio, por exemplo, ajuda muito, muito. Eu estou ali no... eu estou aqui perto da minha casa, na zona leste, a minha loja fica aqui próxima ao Novo Shopping. Por que eu montei do lado da minha casa? Se eu vou ter funcionários, eu quero que meus funcionários sejam da minha região e peguem pouca condução para ir, ou nem peguem, né? Eu estou bem pertinho, eu estou há quatro quilômetros da minha casa, mas um local bem privilegiado. Eu estou perto do quarteirão mais jurídico do interior de São Paulo: tem o Fórum, Justiça Federal, o Ministério do Trabalho, Procon. Então, eu escolhi a dedo o ponto que eu estou e negocio um bom aluguel. E a rede social me ajuda muito. Aí, quando eu montei agora o Google Meu Negócio, eu vi mais o retorno dele, por quê? Eu não tinha endereço fixo e as pessoas me ligavam de sábado: “Ai, cara, onde é a sua loja?”. Eu falei: “Cara, eu não tenho loja”. Porque eu coloquei no Google Meu Negócio lá. Eu colocava assim: “Feira de domingo na Avenida Portugal”. Só que a pessoa não prestava atenção. A pessoa ia, às vezes, na feira: “Ah, fui na Portugal e eu achei que você estava lá”. Eu falei: “Não, eu coloquei como endereço feira da Portugal domingo”. Quando eu montei a loja, aí começou a aparecer clientes que eu nunca tinha visto. “Ah, eu comecei a colocar no Google ‘queijo de cabra, queijo de canastra artesanal’, aí aparece você em destaque”. E isso faz... desde quando eu abri a loja foram muitos clientes lá e eu falo para os meus colegas. Eu falei: “Gente...”. E eu pago... desconta no meu cartão trinta reais por mês do Google Meu Negócio, que são as pessoas clicando para como chegar, telefone, acessar minha loja virtual. São esses retornos que o Google me cobra. Mas é bem baratinho, sabe? Questão de cliques ali, de centavos, mas como as pessoas acessam bastante, isso é muito interessante. E rede social, tomar conta. O Facebook não me dá muito retorno, mas eu faço... sempre quando eu posso no Instagram, eu coloco no Facebook também. Instagram é dez vezes mais ativo e mais lucrativo.
P1: Legal. Ô, Thiago, a pandemia começou o ano passado, né? Te afetou de que maneira, assim e como foi o desafio? Porque você não tinha a loja ainda, né? Mas você já entregava queijo. Como que ela te afetou e o que você fez para passar pelo desafio?
R1: Então, a gente... na verdade, não afetou, ela melhorou, por isso que eu abri a loja. A gente... faz noventa dias que eu abri a loja, mas eu fiquei dois meses montando-a. A loja estava em construção, a gente já tinha assinado contrato dela em final de novembro, né? E eu a abri dia 14 de janeiro, mas a gente ficou dois meses montando a loja. O que acontece? Na pandemia parou tudo, né? As pessoas comiam muçarela nos restaurantes, nas padarias e parmesão industrializado. E como eu atendo um perfil de público que tinha renda também para comprar briga, as pessoas de pouca renda, da feira, continuaram... a feira da Portugal não parou no auge da pandemia, então... e é uma feira turística, a gente só tentou redobrar os cuidados, né, por causa do medo do vírus, porque a gente tinha um vírus que a gente não sabia o que estava acontecendo. E a feira da Portugal, como estava tudo fechado, eu bati três domingos, que foram o maior recorde meu em quase cinco anos de feira, na feira da Portugal e as pessoas pararam de comprar muçarela e o delivery aumentou bastante. As pessoas pararam de consumir queijo industrializado e queriam comer um queijo artesanal de melhor qualidade, não só um queijo, mas uma manteiga pura, que eu trago da Canastra, que é só creme de leite e sal, um café melhor. Então, isso houve a demanda. Aí a gente começou a ver a necessidade de ter um local fixo para ter mais queijos, mais queijos delicados, porque eu comecei... as pessoas começaram a procurar queijos mais frescos. E o nosso portfólio até 2020, eram mais queijos curados. Eu era conhecido pelos queijos curados, mais afinados, né? Só que as pessoas queriam queijo para o dia a dia. Até aquele momento, eu não trabalhava com queijo fresco, eu não investia muito em queijo de búfala também. Só que começou a aumentar a demanda. O que é um queijo de búfala? Ele é um queijo do dia a dia, a muçarela, um palitinho. Queijo fresco, eu demorei três anos para pôr na minha grade, porque eu visava que o queijo fresco era um queijo de um cliente que não é o cliente fiel, aquele cliente que acha o queijo fresco em qualquer lugar e vai comprar. O queijo curado, ele sabe que só eu vou ter. Mas só que no momento da pandemia, uma pessoa queria, queria porque queria, um queijo fresco. Só que eu comecei a trazer um dos melhores queijos frescos para cá. Hoje eu trago queijo fresco do Cerrado Mineiro, que você vê e não tem um furinho no queijo, é inspecionado, maravilhoso, parece um requeijão. Trago queijo de búfala, hoje a gente vende muito queijo de búfala, que são queijos mais leves do que de vaca. E aí a gente começou a ver necessidade de um local físico para gente começar a organizar, porque a gente fazia tudo aqui em casa, com a nossa estrutura, né? Quartinho de maturação. E, ah, eu também não falei para você, mas eu sou o único empório na Agrishow, há três anos. A gente fez em 2019. Então, eu levei esse pontapé também para feiras, tá? Além da feira livre, eu faço feira de agronegócio. Eu sou o único empório também nas feiras de café especial da Alta Mogiana. São três feiras que existem lá, né? Da associação, do sindicato e de uma cooperativa. E essas feiras são feiras de negócio, para produtor de café. Só que, por exemplo, o último evento que eu fiz o ano passado, antes da pandemia, em março, foi uma feira que chama Alta Café, que é do Sindicato Rural de Produtores, a previsão de faturamento em quatro dias era trinta milhões, eles faturaram quarenta milhões de reais. E eu fui... eu sou o único empório... porque foi uma novidade, eu cheguei nos organizadores e falei: “Cara...”. Como eu tenho esse conhecimento comercial das empresas, eu levava para ele. Falei: “Cara, me dá um cantinho para mim aí, em qualquer lugar, para eu montar uma bancada de queijo?”. E eles me davam. Eu levava um queijo para eles de presente, um café, um doce, né? E eles começaram a abrir porteiras para mim. Muitas vezes, nos primeiros, eles nem me cobravam. Falou: “Não, vou te colocar no meio ali do...”. Por exemplo, o Fran Café, em Franca, é uma feira que eles montam quarenta quiosques e são os produtores dos cafés da Alta Mogiana especial, são café de exportadores e tal. Eles me colocaram lá no meio dos produtores e eu degustando queijo para produtor de café, que ia com a botinha. Mas assim, conversa assim deles: “Ah, eu tenho 5 mil pés de café, eu tenho 20 mil pés de café”. E cara que ficava na lida e não tinha acesso também a esses produtos que eu tinha. E aí eu comecei a ter uma demanda louca. Em quatro dias eu chego a faturar dez, 12 mil reais vendendo queijo, né? Só que eu tenho que ter toda uma estrutura. Eu tenho um carro utilitário, eu tenho uma Kangoo, que é tipo uma Fiorino, tenho gaiola em cima. Então, quando eu ia, eu levava uma estrutura toda bonita de madeira, montava tipo o que eu fazia dentro do Walmart, do Atacadão, para os promotores, para montar um layout de... para chamar atenção do consumidor que entra no supermercado, eu fazia com o meu produto, mas direcionado para o queijo, né? Montava uma escada expositora, os doces, o mel, né? Então, tudo isso chamou a atenção desse público. Aí o sindicato começou a me chamar, começou a me chamar. Só que aí comecei... eles começaram a cobrar também. Aí eu, beleza. O último desse aí que eu fiz em março, eu paguei em queijo, mandei 14 quilos de queijos com mel e uma cachaça para eles darem... ele deu para cada dono de quiosque que comprou. Porque, quem que era os donos de quiosque? __ (01:06:39), a New Holland, cara vendendo aquelas colheitadeiras de café de 500 mil reais, né? E eu falei para eles assim: “Eu sou MEI”. Sempre choro, né? “Eu sou MEI, sou pequenininho”. E aí... só que eu levava um produto de qualidade. Imagina um cara tomando um café especial, degustando um queijo da Canastra ali. Engrandece o evento, né? E na Agrishow eu fui bem agressivo, eu fui atrás da gerente comercial, em São Paulo, eu estava numa reunião em São Paulo e eu fui no escritório da Abimaq, ela chama Marilda. E aí eu falei para ela: “Ó, eu quero montar isso na Agrishow”. Ela falou: “Ah, tem um cara lá e tal”. E quando montavam, eles montavam uma casinha de queijo e era produtor, mas só que não ia para vender, eles iam para degustar queijo para o pessoal da Secretaria da Fazenda do Estado.
P1: Sim.
R1: Eu falei: “Não, eu quero ir vender queijo”. Eu falei para ela: “Ó, tem aquele pavilhão”. Eu já tinha ido na Agrishow visitar, várias vezes. E eu falei: “Eu quero vender queijo”. Ela falou: “Ah, Thiago, mas quanto você consegue pagar no quiosque?”. Eu falei: “Dentro do pavilhão?”. Que é um local coberto e tal. Eu falei: “Eu tenho essa renda aqui”. Aí ela conseguiu subsídio do Banco do Brasil. Não só para mim, mas para três parceiros lá, que eram de cachaça e tal. E eu comecei com um quiosque no primeiro ano, no segundo eu já tinha dois e todo ano, na Agrishow, eu bato 50% do meu faturamento. Em cinco dias da Agrishow, em 2019, eu faturei setenta mil reais. Só que eu levo cinco pessoas para trabalhar e uma pessoa falando inglês, entrevistado pela CBN e tal. Em 2019, foi a última Agrishow, porque ano passado não teve, mas a gente já tinha pagado para 2020.
P1: Que legal!
R1: E o projeto do ano passado, o que era? Em janeiro de 2020, eu comprei o trailer loja, porque eu não queria ficar mais no quiosque, eu imaginei que o meu negócio ia crescer muito dentro da Agrishow, porque lá dentro da Agrishow fica uma rua cheio de pavilhões. Em 2020, mesmo escutando o negócio do vírus lá na China, em janeiro, eu fui, falei: “Bem, vamos sair de férias não?”. Porque a gente sempre fica 15, vinte dias lá em Ilha Bela. Falei: “Bem, vamos sair de férias, não. Vamos comprar um trailer loja?”. Ela falou: “Vamos”. Aí pegamos o dinheiro das férias, investimos no trailer. Só que foi o ano da pandemia, né? Aí eu falei: “Nossa Senhora!”. Eu nem o pilotei. Aí, o que era a intenção desse trailer? Levar para Agrishow, porque o valor que eu ia alugar um contêiner e tal lá dentro, com esse trailer, eu ia alugar uma tenda, meter um gramado daquelas gramas sintéticas, só que eu ia ficar na área externa. O valor que eu pago no pavilhão, eu ia ficar com três vezes mais de espaço na área externa, dentro da Agrishow, né? A minha intenção era ficar na área externa, né, que é mais destacado, montar um trailer loja, colocar aqueles carretéis de madeira, fazer um negócio de decoração. Isso era o projeto para 2020 da Agrishow. Só que mudou todos os planos, né? Aí, o que que acontece? Eu tive que mexer, eu fiz uma adaptação no trailer loja, o levo para feira.
P1: Sim.
R1: Eu sou o único trailer loja na feira da Portugal aos domingos, que tem nove quarteirões, eu consigo levar isso, apesar de não ser autorizado, mas eu tenho... como o chefe da fiscalização é meu cliente, ele autorizou para mim. Aí eu mostrei para ele, tanto ele e para os fiscais, que ali dentro, eu consigo fazer manipulação de alimento e ali, às vezes, eu vejo os feirantes antigos, eles manipulam alimento de uma forma tão drástica, sabe? Na pandemia, eles não usavam luva. Eu comecei a conversar com os meus colegas. Falei: “Gente, usa luva”. Chegou os meus colegas em frente ali, que vende verdura, não ter garrafinha de álcool em gel, eu começar a comprar garrafinha. Porque eu vou na distribuidora de material de limpeza e comprava. E aí, por que todo esse diferenciamento? Mesmo eu tendo esse conhecimento da indústria, a minha esposa tem o deferimento da Vigilância Sanitária, está no nome dela, ela tem que tomar vacina a cada seis meses, ela tem que fazer o curso de boas práticas, né? Que, para quem tem deferimento, tem esses cursos. As pessoas que não têm ficam desprovidas disso.
P1: Ô, Thiago, apesar que o trailer que vocês compraram não serve só para Agrishow, né? Vocês podem ir para qualquer feira.
R1: Sim.
P1: Fora de Ribeirão Preto também, né? Já é um investimento...
R1: É, mas a intenção... a compra dele foi para feira da Portugal, era para usar na feira de Portugal, mas para usar na Agrishow, né? Que o valor dele seria o valor de aluguel de um contêiner, né? Hoje eu uso na feira de Portugal, né?
P1: Sim. Não, é porque tem feira para tudo quanto é lado, né?
R1: Mas eu analiso muito as feiras que faço, que vem feira para eu atender hoje no máximo... a da Portugal, essa do Fiusa. Tem uma feira na cidade aqui do lado, Cravinhos, que eu queria muito fazer, uma feira noturna de quinta-feira, mas só que com a loja, eu estou... está demandando muito tempo e chega na quarta-feira, a gente tem uma demanda muito grande na loja, né? E como eu faço delivery, eu que saio para fazer as entregas, então eu deixo a minha esposa com a colaboradora, a gente não pode assumir muito compromisso. Inclusive, o chefe da fiscalização mora num condomínio de mais alto padrão, que é o Alphaville, em Ribeirão Preto e ele me chamou para fazer uma feira noturna lá de terça-feira, eu recusei. Porque ele reclamou que quem vai lá vender queijo nessa feira, é o cara que só vende queijo branco furadinho, com perfil de classe AA de Ribeirão Preto. Aí eu falei: “Ah”.
P1: Pois é. Ô, Thiago, e quanto ao futuro, né? Os projetos futuros, você e sua esposa, o que vocês pensam de ampliação, onde vocês podem chegar, se vocês vão romper as fronteiras de Ribeirão Preto. Já rompeu, né, porque você manda coisa para fora.
R1: Não mando, queijo artesanal eu não mando pelo Correio, eu indico lojistas, eu indico parceiros que fazem o mesmo trabalho, do molde que a gente faz, tá? Ah, e tem isso também: a gente não manda queijo pelo Correio de jeito nenhum, porque é queijo artesanal. Tem cliente que insiste, insiste, insiste, eu falei: “Cara, eu trabalho com queijo mofado aqui que cheira a chulé, imagina eu mandar um queijo desse” - porque o gosto, o sabor é outro – “o Correio já me prometeu algumas coisas que eu mandei, que não foram queijos, ficaram quatro dias e chegou com 14 dias lá em Macaé. Imagina esse queijo! Antes dele chegar no cliente, o carteiro já jogou fora, falou: ‘Ó, tem um bicho morto dentro dessa caixa’. Então, é melhor você me falar a cidade que você mora, ou mais próximo, eu te acho um lojista”. Porque eu estou num grupo de um WhatsApp aqui de noventa lojistas do Brasil inteiro, de Manaus a Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, interior de Minas, Belo Horizonte. Então, eu indico lojistas, né? Não mando pelo Correio. O nosso projeto, o que é? A gente consolidar essa loja, esse ponto, que eu já tenho os meus clientes, eu tenho uma carteira de lista de transmissão, de 900 clientes ativos/mês. Eu faço muito bem essa lista de transmissão duas vezes por semana. Então, eu tenho essa lista de transmissão, que é muito valiosa. É o meu ouro, são os meus clientes ali cadastrados. Tem a loja física e tem o ponto da feira de Portugal. O meu projeto, eu e minha esposa, daqui cinco anos, é vender todo esse negócio, vender nossa casa, que é quitada e ir para Ilha Bela, montar o mesmo negócio lá em Ilha Bela.
P1: Ah, que legal!
R1: Eu quero montar... a gente já está pensando em comprar um terreno lá na área mais desocupada, lá perto daquela última praia lá e começar do zero. E aí eu quero fazer uma loja com contêineres, três, quatro contêineres, né? E levar cervejas artesanais da minha cidade, que é muito conhecida e muito famosa, levar cafés da Alta Mogiana, porque lá tem o perfil de público também que gosta dessas coisas. E os queijos, né? Como eu tenho transportadora, eu tenho uma tabela diferenciada, a transportadora negocia uma tabela que ninguém tem e eu tenho 80% de desconto nessa tabela, espero manter essa tabela também, eu consigo receber tudo o que eu recebo em Ribeirão Preto, eu recebo lá em São Sebastião, né, não em Ilha Bela. Então, a minha intenção é a gente ter uma qualidade de vida melhor, eu adoro nadar no mar, eu gosto de nadar mesmo no mar, a minha esposa gosta de pescar, a intenção dela é comprar um barquinho e estar pescando de madrugada com a minha sogra. A gente vai levar a sogra, tá? E a intenção é cada um ter o seu contêiner ali, fazer umas hortas suspensas e ter uma loja na entrada da loja, com estacionamento para os clientes pararem, mas eu quero ficar bem longe do centro de Ilha Bela, também eu quero montar algo diferente, não quero ficar montado perto de shopping, essas coisas, quero montar lá perto da Mata Atlântica, que tem lá os terrenos mais baratos também e fazer tudo sustentável, colocar energia fotovoltaica, né? Já começar com projeto bem, bem estruturado mesmo. E dali é aposentar, né? Trabalhar de quarta-feira a domingo, que é o boom lá em Ilha Bela e o restante da semana folgar.
P1: Passear. Muito bom.
R1: Mas quem comprar o meu negócio em Ribeirão, vai comprar o negócio já moldado, eu vou vender tudo: vender o trailer, vender o ponto da Portugal, vou vender a loja e os meus clientes. Falar: “Ó, tudo”. O nome, né? Lá vai ser outro nome e aqui ó... que nem o meu colega de São Paulo, o Bruno, que foi nosso último presidente da Comerqueijo, ele vendeu o Mestre Queijeiro, vendeu a marca dele e foi para Espanha, ele montou uma loja lá em Barcelona, na Catalunha. E hoje ele está lá morando com a família, ele foi convidado pelo governo da Catalunha, que ele organiza agora os eventos dos queijos da região da Catalunha. Então, ele vendeu a estrutura dele aqui para uma colega nossa, que é a Mônica, que assumiu, mineira e foi para Espanha, aí ele vendeu toda a estrutura.
P1: Que legal! Thiago, queria te agradecer muito. Cláudia, você tem mais alguma pergunta?
P2: Eu tenho aquela que eu gosto de fazer. Thiago, você já é conhecido, né? Assim, tem esse trabalho todo, muito interessante, que é um nicho de mercado, né? Eu conheço a região do Serro e superconcordo, assim, é lindo, maravilhoso.
R1: É lindo, lindo.
P2: É lindo. É uma paisagem também, né?
R1: Não, as pessoas lá, as quitandas, as quitandeiras.
P2: As quitandeiras, né? A gente teve lá fazendo esse trabalho de memória também. Então, assim, você deu uma entrevista que é diferente, não é uma entrevista jornalística. O que você achou dessa experiência de deixar registrada a sua história, a sua trajetória desde a Ambev, até você empreendedor, assim, da área de queijo, essa experiência de você deixar sua história registrada para o museu?
R1: Então, a minha preocupação com as pessoas que vão ver um vídeo desse, sobre empreendedorismo, terem cuidado. Tem que saber fazer tudo planejado, tá? Eu não comecei ontem, eu deixei minha história bem analítica aqui, porque tem pessoas que... eu fico... as pessoas ficaram desesperadas na pandemia, apareceu... a gente até brinca nos nossos WhatsApp aí de lojista, que apareceu muito e-commerce de Minas, né, agora na pandemia. Pessoa que ficou desempregada, está montando e-commerce, vendendo queijo de qualquer forma, não sabe cuidar do queijo, né? Inclusive, teve um louco lá que comprou do meu lado o ponto da Feira da Portugal, apareceu um cara que para aproveitar do meu ponto da Portugal, ele comprou do meu lado, foi vender queijo de cabra famoso de uma produtora que eu conheço, ela me conhece, só que clientes compravam o queijo e o queijo estava estragado. Não foi a produtora que mandou o queijo estragado, o cara que não soube cuidar do queijo. E é um perigo real, tá? O que eu explico para o empreendedor: tudo o que ele for querer trabalhar, tem que fazer um planejamento antes. Eu comecei um ano antes, para montar para minha esposa. Em dezembro de 2016, eu pedi demissão de um emprego que eu era gestor de seis distribuidoras farmacêuticas, eu trabalhava na Cremer, eu era representante... eu tomava conta de seis distribuidoras farmacêuticas, né? Eu só dava... eu tinha que dar treinamento, cada distribuidora tinha mais de cem representantes no estado de São Paulo. Então, eu falava do meu produto, né, que são as linhas de curativos, adesivos, ataduras, né? Então, eu larguei uma profissão que eu dava curso para representante, para montar o negócio, eu montei para minha esposa e hoje eu explico para as pessoas. Muito na Feira de Portugal apareceu pessoas desempregadas, perderam emprego do nada na pandemia e querendo montar. “Ah cara, eu quero montar um negócio desse”. Eu falei: “Cara, primeira coisa: vai no Sebrae, fazer um cursinho lá de empreendedorismo, é de graça. Você vai aprender fluxo de caixa”. Tem gerente do Banco Santander, uma pessoa que pediu... que foi mandada embora, 15 anos, está com dinheiro. Falei para ela: “Colega, vai estudar queijo”. Ela quer montar um negócio. Eu falei: “Ó, vai na associação na Canastra, vai estudar queijo. A internet está aí, se você não quiser...”. Esqueci de falar: a minha esposa produz cosmético natural. Na pandemia, ela queria dar um up na cabeça, porque a gente ficou um pouco ocioso, né? Parou a feira do Fiusa, ela começou a fazer uma pós-graduação de cosmético natural, hoje ela desenvolve shampoo sólido, condicionador sólido, mas ela foi estudar primeiro, está estudando e está desenvolvendo produtos, loções e tal, né? Então, tudo tem que estudar e planejar. Empreendedorismo é isso, não adianta a gente montar no frigir... como se diz, na correria, porque o negócio está fadado ao fracasso. Se você não estudar... e a gente tem as instituições, tem o Sesc fazendo um vídeo comigo aqui, tem o Sebrae, né? Tem vários aí, que a gente pode indicar aí.
P1: Legal.
P2: Maravilha.
P1: Queria te agradecer muito, Thiago, por ter participado. Logo mais, daqui alguns dias, semanas, o nosso fotógrafo vai entrar em contato contigo...
R1: Sim.
P1: ... para fazer uma sessão de fotos na loja, com todo o distanciamento e tudo mais, mas fazer uma sessão de fotos com você, com sua esposa na loja, ou na feira, se você preferir. E ele vai pedir...
R1: Pode ser ambos, eu prefiro, eu gosto da feira e da loja. É bom destacar as duas.
P1: E, se você tiver...
R1: A loja, eu falo porque a loja é bem aberta, tá? A loja fica com as portas abertas, o ar-condicionado soltando ar para fora, então...
P1: Porque depois da pandemia, no caso da gente publicar o livro do Memórias do Comércio de Ribeirão, né, a gente precisa ter um material fotográfico. E, se você tiver fotos antigas, de quando você começou, mesmo que seja de trabalhos anteriores, ele copia também, para gente poder montar...
R1: Aham.
P1: ...um arquivo aqui com você. Está bom?
R1: Tem bastante. Está bom?
P2: Aí, se você puder separar umas dez imagens já, para hora que ela ligar. Tá?
R1: Tá. Eu não sei se vai estar em alta, mas eu vou mandar para vocês Agrishow, da primeira feira que eu fiz. Tá? Eu mando para vocês.
P2: É, o que tiver em alta melhor, porque é livro, essas coisas, você já sabe, né? ((risos))
R1: É.
P1: Então está bom, Thiago. Muito obrigado.
P2: Obrigada, viu, Thiago?
R1: Obrigado eu, tchau.
P2: Tchau, tchau.
R1: Se cuidem. Se cuidem, viu?
P2: Bom dia e boa semana.
R1: Tchau, tchau.
P2: Tchau, Thiago, até.
P1: Um abraço. Terminou, Thiago. Obrigado.
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