IDENTIFICAÇÃO Sou Alpheu Gofredo Barbosa, nascido em São João da Boa Vista no dia 30 de junho de 1931. FAMÍLIA Meu pai era Benedito Ribeiro Barbosa e minha mãe, Antônia Gofredo. Eles nasceram na Itália. Lembro muito pouco dos meus avós; eles trabalhavam em zona rural. Tenho uma irmã que é cabeleireira em São João da Boa Vista. MIGRAÇÃO Eu vim para Campinas em 1953. Vim sozinho. Depois me casei. Eu mudei porque nessa minha profissão de barbeiro, lá em São João da Boa Vista, naquela época, era muito fraco o serviço. Era barato demais e não tinha perspectiva de futuro. Foi quando resolvi vir para Campinas e até hoje estou, graças a Deus. Me acertei aqui e estou muito bem, não tem problema. Campinas, naquela época, era uma cidade já bem avançada, uma cidade muito humana. Consegui meu primeiro trabalho em um dos melhores salões daqui que se chamava Salão Rio. Ficava na Rua Barão de Jaguará, perto do Café Regina, que até hoje existe. Ali fiquei trabalhando alguns anos. INFÂNCIA Na época da minha infância, em São João da Boa Vista, quase não tinha automóvel, não existia essa violência, as ruas eram todas desertas, a cidade era pequena. Então, nós brincávamos muito com a garotada do bairro de bandido e mocinho. E assim fomos crescendo com futebolzinho em um campo que tinha lá no bairro. Depois eu me enveredei pela natação. Me saí muito bem, modéstia parte; era um exímio nadador, assim foi indo, foi indo. Depois eu entrei para corrida de pedestres, ganhei algumas provas de corrida de cinco mil metros; tudo isso antes de vir para Campinas, em 1953. Quando cheguei, mudei radicalmente de esporte. Aqui eu pratiquei muito ciclismo, muitos anos competindo com ciclismo. Nós tínhamos as melhores equipes do interior do Estado, era uma equipe muito respeitada. E assim passaram-se todos esses anos e eu sempre dedicado ao ciclismo. TRANSPORTE Eu ia sempre a São João da Boa Vista...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Sou Alpheu Gofredo Barbosa, nascido em São João da Boa Vista no dia 30 de junho de 1931. FAMÍLIA Meu pai era Benedito Ribeiro Barbosa e minha mãe, Antônia Gofredo. Eles nasceram na Itália. Lembro muito pouco dos meus avós; eles trabalhavam em zona rural. Tenho uma irmã que é cabeleireira em São João da Boa Vista. MIGRAÇÃO Eu vim para Campinas em 1953. Vim sozinho. Depois me casei. Eu mudei porque nessa minha profissão de barbeiro, lá em São João da Boa Vista, naquela época, era muito fraco o serviço. Era barato demais e não tinha perspectiva de futuro. Foi quando resolvi vir para Campinas e até hoje estou, graças a Deus. Me acertei aqui e estou muito bem, não tem problema. Campinas, naquela época, era uma cidade já bem avançada, uma cidade muito humana. Consegui meu primeiro trabalho em um dos melhores salões daqui que se chamava Salão Rio. Ficava na Rua Barão de Jaguará, perto do Café Regina, que até hoje existe. Ali fiquei trabalhando alguns anos. INFÂNCIA Na época da minha infância, em São João da Boa Vista, quase não tinha automóvel, não existia essa violência, as ruas eram todas desertas, a cidade era pequena. Então, nós brincávamos muito com a garotada do bairro de bandido e mocinho. E assim fomos crescendo com futebolzinho em um campo que tinha lá no bairro. Depois eu me enveredei pela natação. Me saí muito bem, modéstia parte; era um exímio nadador, assim foi indo, foi indo. Depois eu entrei para corrida de pedestres, ganhei algumas provas de corrida de cinco mil metros; tudo isso antes de vir para Campinas, em 1953. Quando cheguei, mudei radicalmente de esporte. Aqui eu pratiquei muito ciclismo, muitos anos competindo com ciclismo. Nós tínhamos as melhores equipes do interior do Estado, era uma equipe muito respeitada. E assim passaram-se todos esses anos e eu sempre dedicado ao ciclismo. TRANSPORTE Eu ia sempre a São João da Boa Vista por causa dos maus pais que moravam lá. Ia de ônibus ou de trem. Eu também tinha uma noiva lá e, muitas vezes, eu ia de trem até porque era mais divertido. A viagem de trem era pela Mogiana e demorava muito; praticamente, você perdia um dia para ir daqui até São João da Boa Vista. O trem saía daqui às dez horas da manhã e ia chegar lá às três e meia, quase quatro horas, da tarde. Quando não atrasava um pouco. Praticamente você passava o dia todo viajando. Mas que era muito gostoso porque nós viajávamos na plataforma dos vagões. Naquela época, as máquinas eram todas de carvão, de fornalha. Soltava aquelas labaredas de fogo e nós andávamos sempre com um guarda-pó por cima da roupa para não queimá-la. De vez em quando, você olhava e tinha uns buraquinhos nos guarda-pós; vinham daquelas fagulhas da locomotiva. E até tem um caso pitoresco, eu vi um camarada que queria fumar e não tinha fósforo; como vinham aquelas fagulhas, ele com o cigarro, colocou a cabeça para fora da janela do trem para acender o cigarro. JUVENTUDE Eu só gostava de esporte e me limitei nas outras atividades sociais. Eu me dedicava muito aos esportes, mas sempre arranjava um tempo para ir ao cinema. COMÉRCIO DE CAMPINAS Naquela época, tinha feira livre todos os domingos no bairro onde eu morava. Era uma das maiores feira livre de Campinas, no bairro de São Bernardo. Semanalmente, nós íamos à feira, fazíamos as compras necessárias da semana e tudo eu encontrava aqui em Campinas. No comércio, não eram lojas pomposas como existem hoje, mas a qualidade era excelente. Eu comprava muito na Ezequiel, que até hoje existe, e em outras lojas de menor porte. A Ezequiel sempre foi uma casa maravilhosa. Do ponto de vista comercial, hoje, Campinas está sendo uma das grandes praças, é a melhor do Brasil, mas do ponto de vista do interior. É bem difícil outra cidade dar combate a Campinas no setor. Porque aqui, mesmo em matéria de cheque compensado, parece que era a terceira praça do Brasil. Isso se nota, uma cidade rica com grande potencial. Construíram aqui também esse Shopping Dom Pedro, dizem que é o maior da América do Sul. Por que escolheram Campinas? Você vê, quantos shoppings têm aqui, todos grandiosos, populosos. E muitas casas comerciais espetaculares também. E todo mundo vem e está querendo Campinas. Precisa ver o setor imobiliário agora, cada lançamento que tem, condomínios fechados que saem adoidado, uma expansão grande na cidade. Isso é motivo que a cidade está muito bem administrada e é uma ótima cidade. Porque senão, não aconteceria isso TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Comecei a trabalhar no mesmo dia que cheguei a Campinas. Eu morava aqui perto, na Andrade Neves porque eu tinha uma tia que morava lá. Trabalhava aqui no Centro, na Rua Barão de Jaguará e era uma distância de uns quinhentos metros que eu percorria a pé. Nesse salão que eu vim trabalhar eram dez cadeiras. Tinha duas manicures e dez barbeiros. Na frente eram quatro engraxates; logo na entrada do salão. Era um dos maiores salões de Campinas. O mais bonito que havia na época. E havia outros salões, o Salão Paris e alguns outros. Tem uma história engraçada: quando um freguês é novo, você geralmente não sabe como ele corta o cabelo; eu fui e perguntei a ele: "De que forma o senhor quer que eu corte o seu cabelo?" Ele olhou para mim e falou: "Em silêncio." (risos) Pronto, acabou o assunto. Verdade Cortei como eu quis, porque nós temos idéia como fica melhor o corte de cabelo na pessoa. Hoje estamos em três barbeiros. Nós éramos quatro e hoje transformaram tudo em unisex. A única no estilo barbearia é a nossa. Nessa parte do centro de Campinas, não tem barbearia, são todas unisex. Lá nós só servimos a área masculina, mas não a feminina. Nem temos mais a manicure. ESCOLHA DA PROFISSÃO Escolhi ser barbeiro por causa do meu pai. Ele foi motorista de uma empresa de ônibus e, naquela época, usava-se - era tempo da guerra - usava-se o gasogênio para fazer funcionar os veículos. Então, o meu pai ia duas horas antes de o ônibus sair para acender o gasogênio, para formar o gás para o ônibus sair. Ele vinha todo sujo de carvão, de graxa. Um dia, minha mãe falou: "O que você quer ser quando crescer?" "Quero ser mecânico." Daí, ela disse: "O quê? Já não basta o seu pai? O trabalho que me dá limpar essa roupa e você também quer?" E o meu pai falou: "Vou arrumar um serviço limpo para você." Porque, naquela época, não tinha indústria, não tinha nada. Você tinha que aprender a ser barbeiro, sapateiro, serralheiro ou marceneiro. Daí me apertaram para trabalhar como barbeiro. Eu comecei, gostei da profissão e até hoje eu estou nela; nunca quis largar. OFÍCIO DE BARBEIRO Meu aprendizado foi na própria barbearia em São João da Boa Vista. Eu não sabia nada. Fui ao salão, passei a fazer a limpeza do salão e a aprender o ofício. Foi passando o tempo, eu aprendendo como se afia uma navalha, uma tesoura, como se amolava, fui aprendendo essas coisas básicas. Até comecei cortar alguns cabelos da garotada lá de graça, para poder aprender. O barbeiro ia me ensinando, o profissional, e fui adquirindo experiência assim. Mas levou tempo, não foi do dia pra noite não. Demorou, mais ou menos, um ano e meio até eu começar pra valer. Teve uma época que fui fazer um aperfeiçoamento em São Paulo, no Sesc [Serviço Social do Comércio]. Eu fiz um curso de mais de seis meses, aperfeiçoamento de cortes modernos, essa coisa toda. Foi um detalhe pra aprimorar mais a profissão e foi muito útil. FAMÍLIA Casei em 1955, em São João de Boa Vista. Minha noiva era de lá. Casamos e viemos pra Campinas. Tivemos três filhos, dois homens e uma mulher. Minha mulher é dona de casa e meus filhos se aperfeiçoaram mais nos estudos. Um deles já se formou, já tem duas engenharias. E o outro formou em escola técnica. Um chama José Rui Peres Barbosa e o outro Alpheu Peres Barbosa. O Alpheu trabalha em São Paulo e o José Rui trabalha em Salvador, lá na Bahia. CIDADES / CAMPINAS / SP Campinas era uma cidade tranqüila que se transformou muito com essa industrialização. Campinas começou a tomar outra feição e, inclusive, naquela época, houve uma grande revolta aqui porque as empregadas domésticas começaram a trabalhar para os engenheiros americanos, enfim, todos os estrangeiros. Passaram a ganhar salários melhores e foi um caos nesse setor doméstico. Foi até engraçado porque todo mundo reclamava: "Eles podem pagar mais do que nós e agora nós estamos sem empregada. Ninguém quer trabalhar, ninguém quer ganhar como as outras." Ficou aquele rebuliço. No setor do comércio começaram a ter alguns restaurantes melhores e a cidade foi crescendo. A cidade era tranqüila, não tinha violência, não tinha nada. Era muito gostoso morar aqui. Depois começaram essas invasões, muitos migrantes, começou a deteriorar o nível de vida. Campinas recebeu migrantes demais e isso deu um impacto muito grande na administração da prefeitura, que não acompanhou todas essas invasões que tiveram. A cidade cresceu demais e a prefeitura tem dificuldade de acompanhar o crescimento porque a infra-estrutura não é assim “alguém monta um núcleo ali e já vai correndo com a infra-estrutura lá”. Não é assim. Leva tempo, é muito dispendioso e, com isso, todo mundo começa a reclamar, reclamar. Até hoje acontece isso. CLIENTES Essa barbearia é muito tradicional. Nesse salão eu trabalho há 41 anos. Onde ele está agora tem 42 anos; mas ele, na Rua Barão de Jaguará tinha quase 50 anos. Depois ele mudou de lá porque o ponto foi vendido, e foi para a Rua Lusitana. Ele é muito tradicional, eu tenho muita clientela, desde aquela época. Aqui em Campinas trabalhei em três salões: Salão Rio, Salão Elide e agora nesse Astúrias. Aquela tradição, aquela velha clientela se mantém. Esse nosso salão é barbearia, está lá a placa, porque a maioria dos os salões de Campinas são unisex. A barbearia é a única que tem no centro. É como qualquer outro ramo, mas o forte de nossa barbearia é de cabelo branco para cima. Tem freguês lá de mais de 40 anos, já desde quando o salão era na Rua Barão. Eram freqüentadores e continuam até hoje. O corte de cabelo é o tradicional. Em barbearia você mantém a tradição e os cortes que já eram de costume da época; ninguém muda. Tem os cortes modernos de época. Antigamente, usava-se muito cabelo comprido na época dos Beatles, Roberto Carlos. Você tinha que acompanhar o modismo, eu tive de fazer o curso para acompanhar. Mas isso passou. Agora os jovens usam outro tipo de cabelo; quem gosta mais comprido já é diferente. Nunca fizemos promoções porque não há necessidade. A clientela é aquela, então que promoção você pode apresentar? É o trabalho artesanal. FORMAS DE PAGAMENTO Os pagamentos, geralmente, são à vista. Não trabalhamos com cartão de crédito, nada disso. Cheque sim Até tem um ditado que diz assim - que um freguês chega e pergunta - "posso pagar em cheque?" "Não tem problema, mas só vou dizer uma coisa para o senhor: o dinheiro traz felicidade, mas o cheque também ajuda." Não temos inadimplência; é com muita raridade que acontece. Às vezes, o pessoal esquece, faz um corte e esquece, mas não é por maldade, é esquecimento mesmo. Às vezes, acontece. É muito difícil, mas acontece. Já põe no livro lucros e perdas e pronto. MOBILIÁRIO O sistema que nós trabalhamos já teve várias reformas. Até ar condicionado tem já há uns 30 anos. As cadeiras ainda são originais; as cadeiras de trabalho. Agora, os móveis já foram mudados, o salão já foi reformado várias vezes. De vez em quando, tem de fazer uma renovação, mas mantendo a tradição. Aquele que chega, fala: “É aqui mesmo. É o salão de barbeiro.” Não pode sair fora disso. Colocar essas cadeiras super modernas, não é aqui não. Já vai tirando o estilo, tem que procurar sempre manter aquele que a turma quer. Se mexer muito, a turma não gosta. TRANSPORTES Campinas é muita controversa em termos de transporte porque, dependendo de onde você mora... Por exemplo, eu moro no São Bernardo e eu não fico um minuto no ponto de ônibus. Tem muito ônibus, passa muita perua por ali. Mas tem outros bairros que eu vejo a reclamação da turma. Sofrem com a demora. Depende muito do local que a pessoa mora. É relativo. RODOVIAS Em Campinas temos todas as saídas para qualquer lugar que se vá, qualquer cidade. Todas elas são de pista dupla. Campinas não tem pista simples. Isso é uma riqueza para cidade. Por exemplo, eu tenho um filho que mora em Salvador; lá, uma cidade que é o dobro de Campinas, ou mais, até há pouco tempo só tinha uma estrada com pista dupla, que fazia de Salvador a Feira de Santana. Há pouco tempo que fizeram uma Estrada do Coco, que vai margeando o mar. Há pouco tempo que terminaram a segunda pista dela. Mas ela é relativa até Praia do Forte, que duplicaram. O resto tudo é pista única. Você vê a pujança dessa cidade Não sei quantas rodovias saem daqui, tudo com pista dupla. Isso é maravilhoso. VIRACOPOS O aeroporto é uma judiação. Desde quando eu ouço falar desse aeroporto, já era pra ser o maior do Estado de São Paulo, do Brasil, até quiçá da América do Sul. Ele precisa de muito de investimento. Tem uma grande área lá e aquela área era para ser, para aeroporto, uma área de desapropriação. Mas invadiram toda aquela área e agora está aí esse problema; tem que ser expandido e está meio difícil tirar aquele povo de lá. É uma pena que está acontecendo isso porque esse aeroporto devia ser a menina dos olhos do Brasil. Porque ele tem tudo para ser excelente, como já é. Uma pena que a política, todos esses desmandos que nós vemos... Parece que o aeroporto de Campinas está ficando de escanteio, isso que nós notamos. LIÇÕES DO COMÉRCIO Eu não tenho sonhos elevados; tenho uma profissão e dentro do padrão que temos, eu não posso ter queixa. Graças a Deus, tudo que eu precisava ter, eu tenho, ganhei na profissão. Muitos conhecimentos, por exemplo, relações públicas, porque nessa profissão é muito importante, você aprende a lidar com o público. E a educação, uma série de coisas que você vai aprendendo com o tempo com essa união: clientela com os profissionais. Eu acho que foi muito gratificante sim. MEMÓRIAS DO COMÉRCIO DE CAMPINAS Foi muito bem elaborado. Eu acho que é válido porque, afinal, tudo tem que ter uma memória. Tudo tem que ter. Oxalá, vocês consigam outras pessoas em outras profissões também, que alcancem esse êxito que vocês querem. Isso é importante, sim. Muito bacana. Eu fiquei contente, por isso estou aqui. Eu faço questão de contribuir. Agradeço pela oportunidade.
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