Projeto 50 Anos do SENAC São Paulo
Depoimento de Pedro Barros Silva
Entrevistado por Cláudia Leonor Oliveira e Márcia Ruiz
São Paulo, 11/07/1995
Realização Museu da Pessoa
Código: SENAC_HV005
Transcrito por Tereza Cristina de Lima
Revisado por Ligia Furlan
P/1 - Bom, eu queria que o senhor começasse falando o seu nome completo, o local e a data de nascimento.
R - Meu nome completo é Pedro Barros Silva, nasci em Coqueiros, na fazenda de papai, no município de Amparo, isso em 21 de outubro de 1918. Posteriormente nós mudamos para Amparo, porque quando eu tinha um ano papai morreu, então mamãe teve que vender a fazenda, e nós mudamos para Amparo. E lá eu cresci, me eduquei, até ir para o colégio, porque mamãe, então com nove filhos, me pôs no colégio interno dos padres franciscanos, porque eu já tinha começado a estudar num grupo escolar que era dirigido pelos padres. E mamãe queria que eu fosse padre, então me pôs como interno no Colégio São Luiz em Rio Negro, no Paraná. E aí começa minha vida no colégio.
P/1 - E como é que foi assim, a educação dos padres salesianos que o senhor recebeu? O que mais influenciou o senhor?
R - Bom, os franciscanos têm uma educação bem liberal, uma educação em que a gente trabalhava, estudava, e brincava muito. Aprendia música... E como eram padres alemães, nós tínhamos que falar uma semana alemão e uma semana português, pra fixar bem a língua, as duas línguas. Então praticamente nós éramos bilíngues, porque falando desde criança, a gente aprendia a língua, além de estudar. E assim a gente viveu no colégio, estudava muito, passeava, brincava, e uma educação muito sadia e muito rigorosa. Levantava... Tinha disciplina, levantava às seis da manhã, tinha hora de estudo, hora de aula, hora de brincar, hora pra estudar música, que eles faziam muita questão de música, e assim eu me eduquei. Fiquei praticamente sete anos no colégio, estudando, quando voltei pra Amparo.
P/2...
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Depoimento de Pedro Barros Silva
Entrevistado por Cláudia Leonor Oliveira e Márcia Ruiz
São Paulo, 11/07/1995
Realização Museu da Pessoa
Código: SENAC_HV005
Transcrito por Tereza Cristina de Lima
Revisado por Ligia Furlan
P/1 - Bom, eu queria que o senhor começasse falando o seu nome completo, o local e a data de nascimento.
R - Meu nome completo é Pedro Barros Silva, nasci em Coqueiros, na fazenda de papai, no município de Amparo, isso em 21 de outubro de 1918. Posteriormente nós mudamos para Amparo, porque quando eu tinha um ano papai morreu, então mamãe teve que vender a fazenda, e nós mudamos para Amparo. E lá eu cresci, me eduquei, até ir para o colégio, porque mamãe, então com nove filhos, me pôs no colégio interno dos padres franciscanos, porque eu já tinha começado a estudar num grupo escolar que era dirigido pelos padres. E mamãe queria que eu fosse padre, então me pôs como interno no Colégio São Luiz em Rio Negro, no Paraná. E aí começa minha vida no colégio.
P/1 - E como é que foi assim, a educação dos padres salesianos que o senhor recebeu? O que mais influenciou o senhor?
R - Bom, os franciscanos têm uma educação bem liberal, uma educação em que a gente trabalhava, estudava, e brincava muito. Aprendia música... E como eram padres alemães, nós tínhamos que falar uma semana alemão e uma semana português, pra fixar bem a língua, as duas línguas. Então praticamente nós éramos bilíngues, porque falando desde criança, a gente aprendia a língua, além de estudar. E assim a gente viveu no colégio, estudava muito, passeava, brincava, e uma educação muito sadia e muito rigorosa. Levantava... Tinha disciplina, levantava às seis da manhã, tinha hora de estudo, hora de aula, hora de brincar, hora pra estudar música, que eles faziam muita questão de música, e assim eu me eduquei. Fiquei praticamente sete anos no colégio, estudando, quando voltei pra Amparo.
P/2 - E dessa época, senhor Pedro, qual foi o professor que mais marcou na sua formação educacional?
R - Eu gostava muito de um professor de história natural, porque ele nos levava na natureza para estudar essa parte, essa disciplina. Isso era muito interessante, porque ele mostrava, na prática, como devia se utilizar a natureza em benefício da humanidade. Foi um dos padres que mais me gravou, na minha memória.
P/2 - O senhor falou também que, nessa época, o senhor brincava muito. Que tipo de brincadeira vocês faziam no colégio?
R - Lá a gente praticava muito esporte, talvez por isso que eu me tornei um professor. Desde aquela época eu já era monitor de esportes do colégio, e depois, na minha vida, eu resolvi ser professor de educação física. O esporte, como meio de educação, é uma arma muito interessante, porque todo mundo gosta de brincar, de jogo, e nada melhor do que o esporte para educar uma criança e a juventude. E assim eu... Praticamente minha vida foi dirigida sempre como professor de educação física, utilizando esse meio para a educação, e sempre me dei bem nesse setor.
P/1 - Bom, o senhor ficou no colégio em Rio Negro até que idade, mais ou menos?
R - Até, praticamente, 17 anos eu fiquei lá. Depois, quando eu cheguei aqui, fui para Amparo, fiquei seis meses em Amparo, e minha mãe me empregou pra aprender a fazer as coisas, mas trabalhando de graça. Eu, então, cheguei um dia pra mamãe e disse: "Olha, mamãe, eu quero trabalhar". E o único meio era vir pra São Paulo, porque eu tinha um irmão aqui em São Paulo, vim morar com ele. Mas quando fui procurar emprego, todo mundo exigia o certificado de reservista, então foi quando eu entrei no Exército. E, como arrebentou a guerra, fiquei sete anos no Exército, fui à guerra, e só depois da guerra é que pude pedir baixa e ingressar, então, na vida civil. Como Professor de educação física fui trabalhar em Santos.
P/1 - Durante quanto tempo, mais ou menos, que o senhor serviu o Exército?
R - Sete anos, de 38 a 45, foi quando eu dei baixa e fui ser professor nos grupos escolares de Santos. Porque eles me convidaram para jogar basquete, queriam me pagar para jogar, mas eu não queria ser profissional, eu disse: "Eu prefiro que vocês me deem o emprego", e aí eles criaram a cadeira de educação física nos grupos escolares de Santos. Eu fiquei um ano lecionando lá, quando então fui convidado a trabalhar no departamento de esportes do Estado de São Paulo.
P/2 - Vamos voltar um pouquinho. O senhor falou da questão da guerra, senhor Pedro, o senhor trabalhou esses sete anos no Exército, mas o senhor foi colocado onde? Onde o senhor trabalhou enquanto o senhor esteve no Exército?
R - Em que setor do Exército eu trabalhei?
P/2 - Isso.
R - Normalmente no quadro de instrução, porque eu já era graduado, então eu sempre tive função diretiva dentro do Exército. Trabalhei no setor de escritório, tudo no regimento que eu servi. E comandei o pelotão durante o início da guerra, guarnecendo a Light na Serra de Santos. E lá fiquei mais ou menos um ano trabalhando, quando parti pra Itália.
P/1 - Quando o senhor partiu pra Itália, o senhor contou pra gente que se alistou por vontade própria.
R - Ah, pra Itália foi. Eu vi todos os meus colegas escolhidos para irem, então eu disse: "Por que é que eu vou ficar aqui, também?" Eram muitos amigos, nós tínhamos um grupo muito unido, então eu me apresentei junto e nós fomos. Fizemos exames médicos, porque tinha que fazer. Fizemos treinamento no Rio [de Janeiro] de uns três meses, e daí nós seguimos no U.S. General Mages para a Itália, lá fiquei um ano. Quando regressamos ao Brasil, graças a Deus, sem nada acontecer, inteirinho, sem ferimento. E depois fui trabalhar novamente como professor, em Santos.
P/1 - Quando o senhor chegou na Itália, em quais regiões o senhor ficou? O que o senhor se lembra dessa época?
R - Bom, a guerra tem os seus momentos de dureza, mas tem os seus momentos também de folga, então foi uma coisa... Agora, o que a guerra traz é que é triste: famílias desintegradas, sem casa, passando fome, o que ela deixa, a população é a que mais sofre na guerra. E assim, passei um ano lá com alegrias, com tristeza, com muito frio, mas, graças a Deus, voltei são e salvo, sem neurose nenhuma.
P/1 - E quando o senhor voltou, o senhor foi pra onde?
R - Fui trabalhar como professor de educação física em Santos. Quer dizer, eles lembravam ainda que eu jogava basquete, e me convidaram para jogar no Santos Futebol Clube. E lá fiquei 46, 47, quando eu vim pra São Paulo trabalhar no departamento de esportes.
P/1 - O senhor comentou que morava com um grupo de jogadores também que...
R - É. Bom, aí nós morávamos juntos, um grupo de jogadores moravam numa pensão, cuja dona era a mãe do nosso jogador, e o nome da pensão, que nós demos, era Pensão Vitamina. Lá nós vivíamos num grupo praticamente integrado, e assim a gente formou um conjunto homogêneo dentro do esporte.
P/2 - E esse grupo, vocês participavam de competições?
R - Ah, nós tínhamos o Campeonato Santista da Liga, e depois, em competições da cidade de Santos, na seleção. Porque eu tive a honra de participar nos jogos abertos de 1946 como atleta escolhido para representar a cidade de Santos. E no Santos recebi o título de atleta laureado pelos diversos campeonatos que nós tivemos em prol da sociedade santista.
P/1 - Nessa época o senhor já era professor de educação física?
R - Já, já era formado. Eu me formei em 1940, e mais ou menos em 46... 44, 46, joguei aqui em São Paulo, pela Atlética São Paulo. Posteriormente é que eu fui lá pra Santos pra jogar pelo time do Santos Futebol Clube e lecionar nos grupos escolares.
P/1 - Em que grupos escolares o senhor lecionava, em Santos?
R - São diversos grupos. A prefeitura tinha um conjunto de grupos escolares, e eu lecionava em todos. E o tempo que eu tinha dava para trabalhar em todos eles, duas vezes por semana eu dava aula em cada grupo escolar.
P/1 - Durante as aulas o senhor dava aula só de basquete ou tinha outros esportes?
R - Não, educação física, né? Eu dava porque era uma matéria oficial dos grupos. Naquela época, Santos já foi uma cidade adiantada, e já dava aula de educação física nos grupos escolares. E eu e minha colega Alice Delbuono, que também jogava basquete no time feminino, então nós dois trabalhávamos juntos nos grupos escolares.
P/1 - O senhor permaneceu em Santos até quando?
R - Eu fiquei, praticamente, um ano e meio lá. Depois, quando vim aqui pra São Paulo, trabalhar no Departamento de Esportes de São Paulo para organizar os esportes no Estado de São Paulo, juntamente com o major Silvio de Magalhães Padilha, que foi o Diretor do departamento naquela época. Praticamente nós implantamos aqui no interior do estado de São Paulo todo o movimento esportivo do estado. E São Paulo então teve a primeira organização oficial esportiva do país, isso levou... Porque todas as nossas delegações, 80% eram de paulistas.
P/2 - O objetivo principal dessa organização qual era, senhor Pedro?
R - A função? A função técnica. Nós visitávamos o interior dizendo que o esporte ia salvar o mundo (risos). E assim nós conseguimos implantar no Estado todo a primeira fase, que seriam as construções esportivas, porque o Estado não tinha nada, a não ser o futebol. Então que... Para alicerçar o esporte começamos, então... Fizemos regulamento em que cada cidade que sediasse os Jogos Abertos do Interior deveria ter ginásio, piscina, pista de atletismo, campo de futebol; então estávamos dando a infraestrutura do esporte no estado de São Paulo. Isso floresceu tanto, e nós tínhamos um grande calendário esportivo que atendíamos a parte colegial, a parte de clubes e a parte de seleções. E com isso o esporte floresceu aqui no estado de São Paulo.
P/2 - E a formação das pessoas que iriam trabalhar no interior, como é que era feita, senhor Pedro?
R - No interior?
P/2 – É. As pessoas que se formavam, no caso os professores de educação física, tinham uma preparação?
R - Normalmente eram voluntários. Porque o trabalho voluntário é o que mais se consegue atingir do que o próprio trabalho do professor, porque o voluntário ele trabalha sem... Como é que se diz, sem querer usufruir, ele dá tudo de si para que a atividade floresça. Eu sempre gostei de trabalhar com voluntários. Não vou dizer que o profissional não entre, mas o profissional às vezes se acomoda, e o voluntário não, o voluntário dá tudo de si, porque quando ele não quer mais, ele deixa. Então esse trabalho voluntário é o que eu valorizo imensamente. Foi o que deu ao esporte no estado de São Paulo, por esse trabalho voluntário. Porque nós éramos em sete funcionários, como é que nós íamos atingir os 500 e tantos municípios do estado? Agora, nós, no interior, conseguíamos colaboradores pra que esse trabalho florescesse. E, de fato, atingimos um nível muito alto nesse setor.
P/1 - Senhor Pedro, nessa época, quais eram as principais modalidades de esporte?
R - Normalmente nós trabalhávamos com quatro modalidades: atletismo, natação, basquete e vôlei. Posteriormente entrou futebol de salão e outras atividades, mas o núcleo básico nosso, em todas as áreas de clube e colégio, eram esses quatro esportes. O atletismo, que era esporte básico, a natação, o basquete, e o vôlei, dois individuais e dois coletivos.
P/1 - E como que a cidade se mobilizava? A cidade que vocês estavam indo, implantando esse trabalho, como é que ela se mobilizava?
R - Nós tínhamos um calendário. Dentro desse calendário nós, normalmente, íamos discutir com cada... Porque o estado foi dividido em 29 regiões, então nós íamos discutir com eles esse calendário, ver as possibilidades de execução do calendário. Feito isso, nós começávamos a executar o calendário, e assim nós começamos a interessar o interior a participar. A participação veio paulatinamente e, pela continuidade do trabalho, foi crescendo. E hoje São Paulo é uma potência no esporte, no Brasil.
P/1 - Senhor Pedro, e aí o senhor fez esse trabalho, e continuou fazendo o que, depois?
R - Chegou um dia, me convidaram para trabalhar numa entidade que foi criada, que foi o SENAC. Nesse ínterim eu tive dois convites, trabalhar no Mackenzie ou trabalhar no SENAC.
P/2 - Que ano foi esse, senhor Pedro?
P/2 - Que ano foi esse, senhor Pedro?
R - E o que é que aconteceu? Como eu já tinha assumido o compromisso de trabalhar no SENAC, desisti de trabalhar no Mackenzie quando o Professor Naim Couri me convidou. Mas eu disse pra ele: "Naim, eu já assumi o compromisso, eu não posso voltar atrás." E aí fui pro SENAC. Foi uma das maiores realizações da minha vida eu poder trabalhar com gente humilde e gente que necessitava. E como educador, eu acertei nessa escolha 100%, porque o Mackenzie seria mais uma elite a ser trabalhada, agora o SENAC não, pegava menores carentes e que levava pra lá. Isso então foi das maiores realizações da minha vida, porque eu trabalhei 17 anos como professor na Escola Brasílio Machado Neto, cinco como diretor, e depois fui para a administração central. Foi a realização da minha vida, porque todos os depoimentos dos meus ex-alunos foi o maior agradecimento que eu tive dentro desse meu trabalho. Por isso, praticamente, eu me realizei. Fui pra sede por contingência, a gente não pode nunca dizer não, ainda mais quando é promovido. Então tristemente eu abandonei a minha escola, porque o que eu gostava daquela escola em que eu servi 22 anos... E deixei minha vida praticamente lá.
P/1 - Como é que era o funcionamento das aulas de educação física lá na Escola SENAC Brasílio Machado Neto?
R - No início, você sabe, criança gosta de esporte. Então a gente tinha que ensinar tudo, até tomar banho, porque eles não tinham nada em casa, eram tudo da periferia. Então a gente tinha que educar, o uso de papel higiênico, tudo isso. A gente praticamente... Como eu sempre dizia, educar é água suja que entra no filtro e nós temos que filtrá-la, filtrá-la, filtrá-la e torná-la limpa. E assim era esse trabalho de educação. E o SENAC, nesse setor, no início, foi um dos pioneiros dessa educação a pessoas mais carentes, porque o patrão, quando mandava o aluno pro SENAC, ele, às vezes, escolhia o pior elemento possível, ele não gostava muito da lei que obrigava ele mandar o menor a trabalhar meio dia e meio dia estudar. Quando... Então, essa primeira fase do SENAC foi uma fase de aceitação e afirmação. Como é que nós íamos fazer com que o patrão aceitasse em que o aluno trabalhasse meio dia e estudasse meio dia? Foi difícil. O SENAC teve que manter o corpo de fiscais para ir cobrar na firma, pra que ele mandasse pra firma. Não foi uma aceitação, assim, espontânea. Eles sempre reagiram contra, quando então veio a segunda fase que seria a afirmação. Aí eles viram o quanto lucro a firma tinha com esses alunos que eram educados no SENAC, e assim começaram a aceitar. Veio a segunda fase, mas faltava essa fase, como eu disse, de afirmação. Porque o menino, no início, lá na escola, era só preparação e treinamento pra ofício, o trabalho que eles realizavam na firma. Mas faltava algo mais a ele que aspirava alguma coisa na vida. Então, após dez anos, foi instituído o Colégio Comercial, que dava possibilidade ao aluno a progredir na vida em seus estudos. Isso foi uma vitória que nós conseguimos, e também, graças ao professor Oliver Cunha, que tinha uma visão de educador, ele começou a construir, em vez de alugar prédios e fazer escola, ele começou a fazer escolas SENACs no interior, dando continuidade nesse trabalho, e fazendo raízes na entidade com diversas escolas que ele mandou construir no interior. Ele e o doutor Rubens Leme Machado, que foram os dois que compreenderam a verdadeira finalidade, juntamente com o doutor Brasílio Machado Neto.
P/1 - Fazia parte desse pensamento do SENAC?
R - É, o doutor Brasílio era o presidente da Federação do Comércio, o doutor Rubens foi Diretor Regional numa época, e depois veio o professor Oliver Gomes da Cunha, que tinha uma visão ampla de educador, até hoje ele está na Álvares Penteado, dirigindo a Fundação Álvares Penteado. Quer dizer, o professor... Além de começar como Orientador da Escola Brasílio, ele era um professor, e quando ele foi guindado, ele entendia da necessidade de educação. E isso mudou aquela visão do SENAC em treinar, puramente, o aluno pra coisa. Porque nós recebíamos alunos lá, desde o analfabeto, que a firma nos mandava porque nós éramos obrigatórios, até os com pouca escolaridade. Mas essa fase passou, e depois o SENAC era tão procurado pelo valor do ensino, principalmente na área de secretariado, que nós ombreamos com o Mackenzie, com a Álvares Penteado. Então na escola do SENAC noturna, com secretariado, era um dos cursos mais procurados do SENAC.
P/1 - E essa filosofia toda de trabalho, ela incluía um bem estar também dos alunos, né? O senhor falou um pouco dos exames biométricos que vocês começaram a fazer.
R - É, no início, quando nós chegamos lá, o aluno fazia exame médico, exame biométrico, exame dentário, então ele era amparado de todo jeito, tanto que o SENAC tinha gabinetes dentários na própria escola. E o aluno marcava, fazia os exames dentários, e eram atendidos na escola durante as aulas; quer dizer, sem sofrer solução de continuidade.
P/2 - E a questão do exame biométrico, ele foi implantado no SENAC junto com a ideia das aulas de educação física? Porque me parece que isso foi uma coisa inovadora, não foi, professor Pedro?
R - Não, normalmente o exame era uma rotina no início de ano, todos os alunos faziam exame médico, nós tínhamos um médico, tínhamos a parte biométrica que nós mesmos, professores, fazíamos, o SENAC contratava, e o exame dentário. Porque o Brasil, você sabe, o serviço dentário da meninada era uma calamidade. E eram tratados lá, e o aluno se recuperava. Quer dizer, a alegria da gente que via o aluno entrar e o aluno que se formava, era uma realização do pessoal que trabalhava. Na minha direção, como diretor, eu tinha um corpo de professores e de orientadores educacionais que era uma beleza, das quais a Giselda ainda deve estar trabalhando no SENAC no estado, a Giselda. Então eram orientadores que faziam, porque eu achava que uma escola, o principal elemento da escola, seria a biblioteca. Eu sempre lutei pra ter uma grande biblioteca na escola. Primeiro, o aluno que era mandado fora da classe por indisciplina, o lugar dele era ir pra biblioteca. Lá ele tinha que escolher o que ele ia ler, porque aluno que ficava fora de classe zanzando pelos corredores nunca deu certo. Assim a bibliotecária cuidava do aluno que o professor mandava fora por indisciplina. Então eu sempre quis ter uma biblioteca pra dar oportunidade ao aluno a desenvolver e a gostar de leitura, isso eu consegui na Escola Brasílio, tinha uma boa biblioteca. E depois, na Escola Brasílio, o ensino era muito bom. Você tinha salas ambientais com Escritório-Modelo, Loja-Modelo, aulas de geografia e história eram em salas de aulas já individuais; uma bela sala de datilografia, sala de ciências, a escola era muito bem montada.
P/2 - Como é que era o dia a dia dessa Loja-Modelo, professor?
R - O dia a dia?
P/2 - Na Loja-Modelo. O que era Loja-Modelo?
R - Loja-Modelo o aluno aprendia a vivenciar o que ele iria viver no emprego. A venda, sob a orientação do professor, como ele ia vender, então ele já praticamente aprendia na prática tudo que ele ia fazer no trabalho dele, assim como o Escritório-Modelo. Ele aprendia a preencher todos os tipos de notas, de coisa, que havia necessidade de firma.
P/1 - Senhor Pedro, o senhor participou assim, dos primeiros Torneios Interescolares?
R – Escolar, participei. Aliás, o primeiro torneio escolar foi oriundo do décimo aniversário do SENAC, quando o professor Oliver me chamou a fim de que eu organizasse a Olimpíada Escolar. Era um sonho que eu tive sempre, porque nada como o esporte de fazer o congraçamento dos alunos entre si, se conhecer. Então, o que aconteceu? Dessa primeira Olimpíada que seria uma festa do décimo aniversário, ela se prolongou 16 anos. E nós fazíamos paralelamente ao torneio esportivo, o Torneio Cultural, porque para que o aluno pudesse participar, que participasse da Olimpíada, também fosse um bom estudante. Porque era praxe ter a noção que o bom esportista não era bom estudante. Pra tirar essa pecha, nós obrigávamos o aluno a ter uma média cinco, no mínimo, pra poder participar da Olimpíada. Nessa Olimpíada, além da parte esportiva, ele era obrigado à parte cultural do torneio.
P/1 - E vinham estudantes de todas as outras unidades?
R - De todas as nossas escolas, eles participavam. A gente escolhia uma cidade sede e grupos de meninos e meninas, numa média de 30, eles eram escolhidos pelas escolas, e iam participar do Torneio Esportivo e do Torneio Cultural. E assim faziam intercâmbio entre si.
P/1 - E quais eram as modalidade de esportes que tinham?
R - Eram basquete, vôlei, futebol, tênis de mesa... E o que mais? Acho que eram essas modalidades, e mais o Torneio Cultural.
P/1 - E no começo havia um desfile na rua da cidade? A população ia assistir?
R - Ah, sempre tinha, eles tinham que ter conhecimento, então na viagem que eles faziam, eles faziam reconhecimento do itinerário e cada um descrevia, então, essa parte, e a cidade também era conhecida.
P/2 - A cidade era mobilizada pra esses torneios, senhor Pedro?
R - Cidade?
P/2 - É, a cidade era mobilizada? Tinha uma participação muito grande da cidade?
R - Era, aí teria que mobilizar toda a cidade. O comércio local, tudo isso era mobilizado, e nós tínhamos esse amparo e essa proteção toda para poder realizar uma Olimpíada. Desde a prefeitura até o comércio local.
P/2 - E o comércio participava como, em relação a esses torneios?
R - O comércio, às vezes, dava brindes e colaborava com a organização. Mas a maioria, a diretoria regional é que assumia esse compromisso, porque o movimento de hotéis... A gente levava entre 500, 600 alunos, era uma organização que não era muito fácil de fazer. A gente tinha que preparar tudo, mais ou menos, uns três meses antes. Visitar a cidade, ver a possibilidade de alojamento e tudo mais, e de praças esportivas. Mas sempre nós tivemos o apoio da prefeitura, dos clubes locais, e o SENAC nunca teve dificuldade nesse setor.
P/2 - E esses torneios, eles ocorreram em todas as cidades de São Paulo, praticamente, nesse tempo?
R - Nós começamos aqui em São Paulo, e depois, todo ano era escolhida aonde tinha uma escola. A escola seria a base, a sede da Olimpíada. Então nós, praticamente, passamos todas as cidades do Interior: Botucatu, Ribeirão, Marília, São Carlos, enfim, todas as cidades; Bauru, São José do Rio Preto, todas as cidades aonde o SENAC tinha escola, que era mais ou menos um número de 15 cidades. Mais alguma pergunta?
P/1 - Bom, e o senhor continuou dando aulas de educação física, fazendo esses trabalhos com os Torneios, com as Olimpíadas, e aí o senhor foi designado Diretor de uma escola?
R - Aí eu trabalhei 17 anos como professor. Como diversas vezes eu tinha sido convidado pra ser diretor, eu não podia assumir porque eu trabalhava no departamento de esportes, não podia dar meu tempo integral, somente quando me aposentei do departamento de esportes, convidado novamente, eu assumi a Escola SENAC Brasílio Machado. Fiquei lá como diretor cinco anos, e pude dirigir a escola do jeito que eu sempre pensei em poder dirigir e orientar os meus alunos nesse setor. Então, o que aconteceu? O homem, o indivíduo, ele tem sempre algum interesse. Ou é música, ou é teatro, ou é esporte, enfim, o que é que eu desejava criar? Áreas de atividades para que o aluno saísse da rua e fosse viver na escola. E de fato isso aconteceu. Quem gostava de teatro ia pro teatro, quem gostava de música, fazia seu grupinho de música, quem gostava de esporte praticava esporte, quem gostava de estudar, de ler... Eu tinha uma área em que das seis às sete e meia eu tinha a parte de filmes, cinema, era livre pra quem quisesse assistir. Porque tinha turma que vinha do comércio, estudantes da noite, e ficavam lá perambulando, então eu ia aos consulados, pegava filmes e passava o filme, eles se entretinham nessa hora. O SENAC tinha outra coisa muito boa, o refeitório dos alunos, ele dava alimentação aos alunos por um preço módico. O aluno chegava lá, saía da escola 11 horas, mais ou menos, almoçava e ia trabalhar. Isso era importante. Como o aluno que saía do emprego, ele vinha, jantava e ia pra estudar, isso serviu a muito tempo pra facilitar o trabalho do aluno em vez de ele procurar ficar andando por aí comendo porcaria. E o SENAC dá uma alimentação sadia, através do SESC. Nesse ponto o SENAC foi uma escola admirável.
P/1 - Como é que o SESC ajudava nessa parte de alimentação?
R - O SESC tinha um serviço de alimentação normal, e tem até hoje, então ele mandava em marmitões lá pra escola e nós fazíamos a distribuição.
P/1 - E o que é que os alunos achavam disso?
R - O quê?
P/1 - O que os alunos achavam disso?
R - Adoravam, porque só ter que ir pra casa, correr... Saía meio dia, correr para o emprego − que eles entravam meio-dia no emprego −, eles tinham uma hora. Então eles já comiam na escola, já iam satisfeitos para o emprego. E o preço ajudava muito o aluno.
P/1 - Mudou o perfil do aluno de quando o senhor começou a dar aula de educação física pra quando o senhor foi diretor?
R - Fazer o quê?
P/1 - O perfil do aluno mudou?
R - Demais. Se você visse o aluno que entrasse lá na escola, e visse o aluno que saísse, era completamente diferente. Hoje eu tenho médicos formados na escola, engenheiros, até hoje eles ainda entram em contato com eles. É coisa admirável. É o que eu disse pra você, foi um período de afirmação do homem, porque o homem, às vezes, na contingência, quando ele é jovem, tem que trabalhar, mas como o início o SENAC não dava essa oportunidade de estudo, que posteriormente deu, ele pode sair de lá, e além de ficar comerciário, ele poderia estudar na parte da noite, trabalhava e estudava e se formava em alguma coisa que ele tinha desejo. Isso foi uma das coisas importantes do SENAC, e que foi compreendido, apesar de muita luta. Porque o doutor Brasílio achava que o comerciário tinha que ser sempre comerciário, até que enfim ele compreendeu que nós tínhamos que dar oportunidade ao homem a progredir na vida. Quem fosse inteligente e quisesse estudar, tivesse essa oportunidade, porque treinar é uma coisa, educar é outra. Treinar eu pego o homem com o martelinho e mando ele bater, bater, bater, ele aprende. Agora, educação é camada sobre camada, a gente tem que... E não é da noite pro dia que isso surge. Eu treino o homem seis meses, e pra educar eu levo anos, anos e anos. E o SENAC tinha uma grande coisa, tirava essa meninada da rua e punha dentro da escola. Infelizmente preferiram outros caminhos, eu não vou discutir quem tem razão, mas eu acho que nós podíamos, paralelamente, trabalhar com essa juventude necessitada, como nós trabalhávamos, e dar essa oportunidade aos mais antigos nesse setor, as pessoas mais velhas. Eu acho que o Brasil ainda não está à altura de ter um ensino sofisticado, nós temos que educar essa juventude que está na rua, e cada vez aumenta mais. É como eu digo sempre: se nós rodearmos nossas casas com jardins floridos e bonitos, nós sentimos o perfume das flores. Se nós rodearmos de lixo, nós sentimos a tristeza de pisarmos em lama, em lodo, e nada mais, e é o que está acontecendo agora. A minha briga no SENAC foi essa, infelizmente não quiseram compreender. Preferiram números a um trabalho mais longo e educar uma juventude. Não sei como é que está agora, porque há muito tempo estou afastado da obra, mas infelizmente eu prefiro trabalhar. Às vezes eles diziam: "Mas é pouca gente." Trabalhar com pouco e que cada um faça esse pouco, que do pouco nós seremos muito, e não teríamos essa calamidade que nós temos hoje. Infelizmente é isso.
P/1 - Bom, e o senhor trabalhou como diretor até quando, mais ou menos?
R - Olha, eu acho que foi até 70, que eu trabalhei como diretor da escola. Que todos os alunos me deram uma despedida em que eu me senti realizado, como ser humano e como gratidão humana. Tudo que nós ensinávamos na escola eles gravaram. Em seus discursos finais de minha despedida eu senti isso. Eu nunca pude esquecer o carinho, o amor que eles tiveram comigo como diretor. E no seu livro de ouro eles disseram: "Professor, dirigir com amor é uma das maiores coisas do ser humano." E isso eu tive para com eles. Compreendi todos eles nas suas dificuldades, na sua luta pela vida, e sempre dizia a eles: "Aproveitem, porque as oportunidades são poucas; enquanto eu tenho cinco mil aqui dentro, tem milhões lá fora que querem ter essa oportunidade, e nem todos têm." É essa gratidão que eu tenho com o SENAC, que pôde dar alguma coisa a esses necessitados, que é a educação. O SENAC é uma grande obra, às vezes incompreendida, mas eu garanto que todos eles que passaram pela Escola Brasílio vão recordar dessa entidade que foi criada para o bem, para o comércio e para o bem dos indivíduos.
P/1 - Deixa eu perguntar uma coisa pro senhor. O senhor conhecia pessoalmente os alunos quando o senhor era diretor?
R - Nós tínhamos um serviço de orientação muito bem feito, um serviço de acompanhamento. Quer dizer, o SENAC muitas vezes arranjava um emprego para o aluno, acompanhava ele no emprego e o orientava no trabalho. Eu tinha uma equipe de orientadores fenomenal: era dona Heloísa, dona Giselda, e o homem já não me lembro mais, era um descendente de japonês, que é professor universitário agora. Eram pessoas encantadoras, que davam tudo de si pelos alunos. Então, com essa equipe, a equipe de professores que eu tinha, o SENAC pôde se realizar. Eles davam o aluno e tornaram a escola uma grande... Uma grande escola, que era procurada, que foi a afirmação da obra do SENAC, a Escola Brasílio Machado Neto. Eu cheguei a ter dois mil e poucos alunos quando foi extinta a Escola SENAC João Nunes Júnior.
P/1 - Mas o senhor continuou dentro do SENAC?
R - Eu continuei, trabalhei na obra 42 anos, quando o doutor José Papa Júnior resolveu... Achou que o meu trabalho como esportista seria mais interessante no SESC. Foi quando eu fui dirigir, nesses últimos anos de minha vida nas entidades, a divisão de esportes do SESC. E em 1990 eu me aposentei na entidade.
P/1 - Mas o SESC aqui de São Paulo?
R - O SESC de São Paulo.
P/1 - E o trabalho que o senhor fez foi diferente? Como é que o senhor direcionou esse trabalho?
R - Bom, ali era mais trabalho de lazer, não era um trabalho educacional, era mais de lazer, atividades de esportes dentro da entidade. Eu trabalhei na divisão lá muito tempo com o doutor Virgílio Barato. Quer dizer, o SENAC teve gente de muita projeção, e gente que se interessou pela obra, por isso ele cresceu. Não cresceu espontaneamente não, cresceu por um trabalho dessa gente honesta. Professor Rubens Leme Machado, professor Oliver, com o apoio da diretoria do Conselho Regional, o SENAC foi crescendo, crescendo, crescendo, e atingiu essa grande obra que é a entidade hoje, reconhecida por todos.
P/1 - Senhor Pedro, o senhor tinha contato com os comerciantes, com as pessoas que empregavam os alunos do SENAC?
R - Gozado, doutor Brasílio obrigava você fazer dez visitas diárias aos comerciantes, foi a implantação da obra. Dizer que era uma obra digna de ser apoiada, então nós éramos obrigados a visitar os comerciantes, dizer a eles e explicar o que era o SENAC, o que conseguia, o que fazia, toda essa parte. E assim nós fomos incutindo, tanto que depois eles telefonavam pra escola: "Eu queria um aluno assim, assim, assim." Eu dizia pra eles: "Eu sei que o senhor quer, mas o que eu tenho aqui nesse perfil é aluno que está aqui há quatro anos educado, é de outras firmas. Mande o seu aluno pra mim agora que daqui a quatro anos eu lhe dou o aluno como o senhor quer."
P/1 - E eles mandavam?
R – Mandavam, porque eles reconheceram, no fim, que nós tínhamos razão.
P/1 - Mas no começo era difícil convencê-los?
R - Dificílimo, tanto que a gente... Era obrigatório, o que é que eles faziam? Mandavam, às vezes, o pior rebotalho da sociedade, aluno até ladrão ia, aparecia lá. A gente tinha que educar e mostrar a ele que a vida não era assim. A vida era uma coisa que cada um tinha que lutar pra seu engrandecimento, e essa luta só era possível através de uma educação. Isso é importante, sem educação nós nunca seremos nada. Não adianta você querer fazer um trabalho mediato e imediato. Tem que ser longo prazo, com paciência, com luta e trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, essa é a verdadeira realização de nossa vida. Fazer as coisas no "vipt vapt", como diz lá, não adianta nada, você não colhe nada. Porque quando você planta uma árvore, ela tem que crescer, desenvolver e dar os frutos, frutos nós vamos colher, assim é o nosso trabalho. Se eu não trabalhar, trabalhar, trabalhar, não adianta nada, eu continuo é fazendo aquele “oba oba”, mas não vamos conseguir nada. É muito bonito você fazer 300 mil alunos, mas o que é que nós vamos pegar? É trabalhar como o SENAC. Ele formava anualmente oito mil bem formados em todas as escolas do Estado, do que fazer treinamento. Paralelamente nós podíamos fazer outras coisas. Agora, por que eles abandonaram? Dava muita despesa, talvez. Eu não sei qual era a filosofia dessa turma mais jovem, não conheceram nossa luta inicial, né? A mania do jovem, se ele vê a árvore, ele quer cortar a árvore pra começar tudo de novo, nem todos... Nunca se esqueçam que a grandeza de um país nós podemos construí-lo sem jamais esquecer o passado, é o que não acontece. Todos nossos governantes chegam, querem modificar tudo de uma vez. E ao que leva? A esse desperdício que nós temos aí, obras inacabadas, ao invés de dar continuidade ao trabalho. Naturalmente temos que evoluir, porque o mundo não é estático, temos que ter essa amplidão de abertura. Graças a Deus o professor, principalmente na área esportiva, tem essa visão ampla de abertura. Nós temos que evoluir, mas não esmagando o passado, quer dizer, tudo que foi feito agora não presta, será que não presta? Vamos modificar, vamos aperfeiçoar, vamos evoluir, vamos lutar, vamos aproveitar os aparelhos e a aparelhagem moderna para desenvolver como auxiliar, mas o que é a base principal é o trabalho? É como um professor falava: ele chegava na classe e ligava seu aparelhinho de... E dava controle, então ele saía. O que aconteceu? Os alunos também compraram todos os aparelhinhos, ligavam e iam tudo brincar. O humano, na coisa, desapareceu. E é o que não pode desaparecer, o humanismo ainda é um grande auxiliar de educação, isso é importante.
P/1 - Deixa eu perguntar uma coisa pro senhor que eu acho que ficou faltando. O SENAC sempre tinha participação nos desfiles das escolas, datas cívicas e tinha sempre a missa da Páscoa. Os professores de educação física participavam disto?
R - Olha, por que é que o professor não ia participar? É o que eu dizia, normalmente quem não participa não está colaborando com a entidade. Nós tínhamos que participar, e a organização era nossa, toda nossa. Atividade cívica, nós tínhamos que organizar desfile e participar com outras entidades. Páscoa, nós tínhamos que congregar e organizar toda essa parte. Festa cívica na escola, nós tínhamos que participar, reuniões de professores. Gozado, então eles dizem: "Não, o professor de educação física não se integra, por exemplo, com nossas matérias." Eu digo: como não? Matemática, todos os campos têm forma geométrica, é retangular, é isso, é aquilo, geografia e história, você tem que ter conhecimento do mundo através de onde está acontecendo uma Olimpíada, uma atividade esportiva e assim por diante. Matemática, todos os cálculos são feitos através de coisa. Então você se alienar dentro de um grupo de educadores, é um crime, porque eu tinha maior força que cada professor possa ter, porque atividade esportiva quem é que não gosta? Tinha uma professora lá que para punir o aluno, ela proibia de fazer educação física. Eu digo: "Professora, eu vou punir o meu aluno, vou proibir ele de assistir aula de português ou de matemática, a senhora acha isso justo?" "Ah, mas eles têm interesse em jogar futebol, em jogar basquete e atividade física, então eu estou punindo." Eu digo: "Não senhora, esse ponto eu não aceito, ou lançamos a reciprocidade, tem que ser verdadeira, na hora que for punir meu aluno eu proíbo ele de ir na aula de português", e assim fui me enquadrando entre eles, foram acreditando, eu sabia dar meus palpites também. Professor de educação física não é alienado, ele é um educador por excelência, professor que não for educador e não conseguir uma liderança dentro do colégio é porque ele é muito vagabundo.
P/1 - Senhor Pedro, infelizmente nosso tempo está acabando, eu queria fazer uma última pergunta pro senhor.
R - Pois não.
P/1 - Saber o que o senhor achou de ter passado essa hora com a gente, contando a sua experiência de vida, a sua história?
R – Me sinto orgulhoso, viu. Vou dizer a vocês, porque relembrar o passado é viver o presente e viver o futuro. Eu, dentro da minha idade, vou repetir o que eu disse a vocês lá: "O diabo é sábio não porque ele é diabo, mas porque ele é velho." (risos) E eu, dentro dos meus cabelos brancos, aprendi muita coisa dentro da entidade. Sofri muito, às vezes injustiças; fui mal compreendido, mas sempre amei essa entidade em que pude dar oportunidade aos mais carentes a se realizarem na vida. Ao SENAC o meu muito obrigado.
P/1 - A gente é que agradece.
R - Espero ter contribuído com alguma coisa.
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