MINHA HISTÓRIA DE SUPERAÇÃO
Meu nome é Antonio José, nasci no bairro Matadouro, zona norte de Teresina, precisamente na rua São Paulo, próximo à Escola Municipal Bezerra de Menezes, região que, na época, era considerada periférica e tinha como principal fonte de renda um matadouro. O verde da floresta que se estendia da minha rua até as margens do rio Parnaíba, acompanhado do cântico de pássaros, proporcionava um aspecto agradável da natureza, que era incomodado apenas pelo barulho surdo das espingardas nas mãos de ávidos caçadores. Também havia um campo de futebol no centro do bairro, para onde afluíam os jogadores amadores e pessoas simpatizantes do esporte, e sempre havia um campeonato para movimentar os finais de semana.
Meu pai costumava levar-me para as partidas de futebol, visto que ele era o treinador da equipe do bairro. Mesmo não tendo ainda idade para participar da equipe infantil de futebol, eu recebia uma camisa do uniforme, imaginando um dia também ser um bom jogador de futebol. Esse passatempo era tão importante para os moradores do bairro que atraía até atletas profissionais, sendo o meu tio Regino uma dessas atrações, visto que jogava em uma das equipes profissionais da cidade. Tudo aquilo era acompanhado pelos olhares curiosos de uma criança.
Vivia em um ambiente de pobreza e escassez. Não possuíamos a nossa casa própria e a residência em que morávamos era de taipa, bem apertada, sem as mínimas condições sanitárias onde as “necessidades” eram feitas no quintal, a céu aberto. A luz era de lamparinas e a comida era feita no fogareiro. O calor era muito grande porque a casa recebia irradiação do sol o dia todo e não havia janelas para facilitar a ventilação. O quintal, de onde provinha um forte odor, era o mesmo para vários moradores, com uma parte constantemente úmida em que era despejada a sujeira das casas; talvez esses...
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Meu nome é Antonio José, nasci no bairro Matadouro, zona norte de Teresina, precisamente na rua São Paulo, próximo à Escola Municipal Bezerra de Menezes, região que, na época, era considerada periférica e tinha como principal fonte de renda um matadouro. O verde da floresta que se estendia da minha rua até as margens do rio Parnaíba, acompanhado do cântico de pássaros, proporcionava um aspecto agradável da natureza, que era incomodado apenas pelo barulho surdo das espingardas nas mãos de ávidos caçadores. Também havia um campo de futebol no centro do bairro, para onde afluíam os jogadores amadores e pessoas simpatizantes do esporte, e sempre havia um campeonato para movimentar os finais de semana.
Meu pai costumava levar-me para as partidas de futebol, visto que ele era o treinador da equipe do bairro. Mesmo não tendo ainda idade para participar da equipe infantil de futebol, eu recebia uma camisa do uniforme, imaginando um dia também ser um bom jogador de futebol. Esse passatempo era tão importante para os moradores do bairro que atraía até atletas profissionais, sendo o meu tio Regino uma dessas atrações, visto que jogava em uma das equipes profissionais da cidade. Tudo aquilo era acompanhado pelos olhares curiosos de uma criança.
Vivia em um ambiente de pobreza e escassez. Não possuíamos a nossa casa própria e a residência em que morávamos era de taipa, bem apertada, sem as mínimas condições sanitárias onde as “necessidades” eram feitas no quintal, a céu aberto. A luz era de lamparinas e a comida era feita no fogareiro. O calor era muito grande porque a casa recebia irradiação do sol o dia todo e não havia janelas para facilitar a ventilação. O quintal, de onde provinha um forte odor, era o mesmo para vários moradores, com uma parte constantemente úmida em que era despejada a sujeira das casas; talvez esses fatores contribuíram para a debilidade de minha saúde, pois enfrentei uma série de doenças, dentre as quais, uma enfermidade nos olhos e inchaço no corpo inteiro, decorrente de problema nos rins.
Não obstante essa situação, os meus pais faziam todo o possível para proporcionar um ambiente aconchegante no lar, visto que eu era o primeiro filho e tudo era novidade. Meu pai, Luís, trabalhava em “canto” de carro (enchendo e descarregando caminhão, com o mesmo proprietário). Minha mãe, Maria, cuidava da casa e dos filhos e ainda lavava roupa de pessoas de fora, no Rio Parnaíba, a fim de aumentar a renda de casa. Mesmo assim, algumas vezes não tínhamos nada para comer e, para aplacar a minha fome, ela utilizava vários artifícios como me dar café, para enganar a fome.
Nesta casa ainda nasceram outros três irmãos: Jorge, Marisa e Luís Carlos. Sendo que o último faleceu com apenas um ano de idade. Os filhos nasciam na própria casa, com a ajuda de parteiras. E o cheiro do incenso que se espalhava por toda a vizinhança era o sinal de que um novo bebê chegara à casa. Havia também um banho de enxofre para sarar as feridas que se espalhavam pelo nosso corpo. Contudo, o que mais me marcou desta época, com os meus irmãos pequenos, foi um acidente com o Jorge, em que água quente caiu sobre ele, largando a sua pele; minha mãe ficou em desespero e o levou nos braços, a pé, para um distante hospital.
Com oito anos de idade, nos mudamos para o bairro Primavera, numa casa localizada às margens do rio Poty, onde tivemos uma ligeira passagem. Apesar da mudança, continuei a estudar na mesma escola, que antes era ao lado de casa e agora andaria a pé, sozinho, por vários quilômetros. Como a casa era na beira do rio, bebíamos a água do próprio rio, sem as mínimas condições de higiene. Era uma casa de taipa, coberta de palha e o chão era terra batida. Mesmo assim, desfrutávamos de um certo conforto, em razão do quintal possuir mangueiras e podermos, a qualquer hora, tomar um banho refrescante no rio. Nesse período, conheci o trabalho nas olarias, e já fazia algum serviço, como riscar tijolos. Era um divertimento para mim, pois, “trabalhando”, poderia ter direito à merenda dos trabalhadores.
Mais tarde, esse ofício iria fazer parte de nossa família. Meus pais trabalhavam em olaria e me levavam para ajudar a carregar tijolos (na época era muito comum crianças participarem desses serviços). Após o trabalho, tomávamos banho nas lagoas para tirar o excesso de sujo e bebíamos das cacimbas. Isso aconteceu no bairro Nova Brasília, onde morei dos nove aos vinte e nove anos. Foi nesse bairro em que mais desfrutei das brincadeiras da infância. Gostava de jogar bola, uma vez que havia muitos campinhos devido à variedade de espaços abertos. Foi um período em que as coisas ocorriam suavemente, exceto pelos pequenos acidentes: o meu braço foi quebrado duas vezes, uma trave de ferro caiu sobre o meu pé e uma vez caí de bicicleta em cima de um arame farpado, tendo que me desvencilhar sozinho. Entretanto, procurei desfrutar o máximo das brincadeiras dessa fase, que se constitui um período de encanto na vida de toda criança e adolescente: seja jogando nos campinhos, diante das casas; seja banhando nas lagoas, que também havia bem na frente das casas. Outra diversão era adentrar as áreas de mato nos arredores para caçar ou simplesmente ouvir o canto da natureza. Tudo fazia parte de uma liberdade, que deveria ser aproveitada o máximo, nessa fase da vida.
Esse clima de harmonia, contudo, foi quebrado pelas fortes imagens do período em que meu pai entregava-se, compulsivamente, ao hábito de bebidas alcoólicas, a princípio nos finais de semana; mas, com o passar do tempo, durante toda a semana; comportamento que trazia transtorno para a família, ocasionando, algumas vezes, brigas e desentendimento familiar. Outra imagem que marcou aquele período foi ver minha mãe carregando tijolos na cabeça ou com “trouxas” de roupa, também na cabeça, visando complementar o orçamento do lar. Era movida pelo desejo de ver o bem-estar da família, que ficou evidenciado para mim, especialmente, quando, através destes sacrifícios, ela resolveu custear os meus estudos, a fim de evitar que eu ficasse sem estudar.
Eu sempre fora muito dedicado nos estudos. Destacava-me entre os irmãos e, por este motivo, meus pais me incentivavam e investiam em mim, na medida de suas posses. Nessa época, em meados da ditadura militar, as crianças não tinham direito a livros e, por muito tempo, também à merenda escolar. Dentre as disciplinas escolares em que mais me sobressaía, estavam matemática e inglês. Sendo que a última se tornou quase uma paixão à primeira vista. E, por causa disso, convencia minha mãe a comprar livros e dicionários, que na época eram caros para os nossos padrões; pois sentia-me fascinado pela língua inglesa. Gostava de ler qualquer tipo de leitura; sendo que uma das primeiras fora o livro de Peter Pan, que meu pai encontrara em algum lugar no seu serviço. Nesse período, meu pai também costumava sorrir das minhas leituras, que, geralmente, eram feitas à noite, à luz de lamparina. Nem meu pai nem minha mãe sabiam ler, mas incentivavam os filhos a lerem e a se empenharem na escola. Queriam proporcionar aos filhos aquilo que não tinham conseguido na vida.
Éramos três irmãos até que, aos meus quinze anos, nasce a nossa quarta irmã, Renata. Nesse período, como ainda era uma época de dificuldades financeiras, foi preciso que, além da minha mãe, os filhos também ajudassem. O meu irmão Jorge, que sempre foi o mais desinibido para os negócios, arrumava alguma coisa para vender: papel de embrulho, galinhas, ou fazia algum serviço para alguém. Enquanto isso, eu me dedicava nos estudos em um turno e, em outro, trabalhava em olarias. Minha irmã Marisa também desde cedo começou a trabalhar, seja ajudando à mãe, seja fazendo alguma tarefa que alguém trazia para realizar em casa. A família segue esse curso da vida, em que os pais trabalhavam e os filhos ajudavam até que, com muito esforço, consigo terminar o antigo segundo grau, e os demais irmãos prosseguem nos estudos, apenas o Jorge não conseguiu acompanhar, sendo que um dos motivos era o desejo de trabalhar e ajudar a família.
INÍCIO DA JUVENTUDE
Tinha vontade de “subir” na vida e proporcionar uma melhor estrutura para a família. Entretanto, achava difícil prosseguir nos estudos, por não conseguir conciliar o trabalho- que consistia basicamente de serviços braçais, como calçamento e servente de construção civil- com os estudos; sendo o cansaço físico um dos principais motivos. Esses fatores levaram-me a permanecer por muito tempo longe da escola e sem a menor perspectiva de retomar os estudos. A escola em que passei mais tempo foi a Unidade Escolar Professor Edgar Tito, onde estudei o antigo ginásio e segundo grau. E, no longo período ausente da sala de aula, recordava o prazer que sempre usufruíra através da leitura e me imaginava um dia retornar para essa escola, como professor.
Esse longo período que passara afastado dos bancos escolares atravessou as décadas de 1980 e 1990, época marcada também por grandes acontecimentos na minha vida pessoal e na de minha família. Trabalhei em frentes de serviços que visavam combater os efeitos da seca que se alastrava no nordeste. No ano seguinte, houve uma enchente que destruiu a nossa casa de taipa e tivemos que morar em escola do município, ao mesmo tempo em que, com o mesmo material contaminado, reconstruíamos a casa. Nesse período havia uma inflação galopante e, por várias vezes, precisava me deslocar de bicicleta à cidade vizinha para comprar alimentos mais baratos, inclusive o gás de cozinha ou ficar em longas filas para receber o ticket do leite. Nesse período, a família tem uma grande alegria, pois nasce a nossa irmã mais nova, Fernanda. A chegada de minha irmã coincidiu com a minha saída da casa dos pais, pelo menos por um tempo; pois casara e agora, com a mudança dos familiares da minha esposa para o “sul”, iria passar uma temporada em São Paulo, na companhia deles, atrás de emprego.
Ao chegar a esta cidade, perdi todo o dinheiro que levara, tendo que depender exclusivamente de pessoas estranhas, visto que as pessoas que me acompanharam, por não haver se planejado, também ficaram sem teto. O barraco em que fiquei com a esposa possuía apenas um cômodo, no qual dormiam cerca de dez pessoas. Como não tínhamos condições de comprar uma cama, dormíamos no chão, sem agasalhos. Ali fiquei um mês desempregado, trabalhando de “bicos” para ir sobrevivendo. O trabalho que conseguira era apenas de um salário mínimo, que não cobria as despesas, muito menos o aluguel. Por esse motivo tive que retornar com minha esposa, com menos de um ano morando naquela cidade.
FORMAÇÃO DE UMA FAMÍLIA
Outro marco na minha vida foi a chegada do nosso primeiro filho, Lucas. Para recebê-lo foi necessário construir um quartinho no fundo do quintal da casa de meus pais, que se tornou a nossa nova casa. Mas eu, mais uma vez tive dificuldades de sustentar a família, em virtude de uma enfermidade e consequente cirurgia; vindo a depender exclusivamente dos meus pais. Outras pessoas também nos ajudavam, como o tio Regino, liberando um cômodo da sua casa, para dormirmos, enquanto o nosso quartinho era construído. Mais tarde, este mesmo tio iria me arranjar vaga de emprego no campo de aviação, cujo trabalho estava a cargo de sua empresa.
No ano seguinte, nasce o nosso segundo filho, Josué. As condições físicas e financeiras são as mesmas, mas, mesmo assim, o meu pai compra um terreno para eu, minha esposa e os filhos iniciarmos a nossa vida. Era um barraco na beira do rio, localizado em área de risco. Nesse local não havia infraestrutura; não tínhamos energia elétrica, a água era de chafariz, a beira do rio servia como depósito de lixo e dejetos humanos; a casa era de taipa, com chão batido. Contudo, apesar dessas condições, sentíamos uma gratidão por estarmos em nossa própria casa. Só tivemos que deixá-la porque uma enchente a destruiu, forçando-nos a sermos transportados para escolas. Sendo que após a cheia dos rios ganhamos uma nova moradia. Desta vez nos enviaram para o Parque Wall Ferraz, região da Santa Maria da Codipi.
Com a nova residência, veio também o nosso filho Jônatas, representando o início de uma nova fase, talvez de maturidade emocional e espiritual: uma aproximação com Deus, através de uma fé renovada, a leitura de livros de edificação espiritual e, principalmente, da Bíblia Sagrada. Também o conhecimento de várias pessoas que partilhavam da mesma fé e, ao mesmo tempo, o contato com diferentes pessoas nos diversos ambientes de trabalho por onde passava. Por muito tempo, esses locais de trabalho eram apenas o que se costuma chamar de “bicos”; porque efetivamente eu estava desempregado, ainda recebendo um valioso suporte financeiro de pais e irmãos; algumas vezes até pessoas voluntárias se ofereciam para nos ajudar.
Foram vários tipos de trabalhos e alguns empregos pelos quais passei para ir mantendo a família, dentre os quais: faxineiro, zelador no campo de aviação do aeroporto de Teresina, auxiliar de pedreiro, coletor de mangas, lavador de roupas em indústria de confecções e vários biscates. Essa situação de constante inconsistência financeira inspira-me a desejar sair dessa condição de vida, e, a partir daí, me disponho a retornar, catorze anos depois, aos estudos, tentando fazer uma carreira profissional. Entretanto, após um ano, tenho mais uma pausa; mas, mesmo assim, meus conhecimentos me renderam uma aprovação em teste seletivo para Agente de Endemias, na Fundação Municipal de Saúde, onde permaneci por doze anos.
O trabalho como Agente de Endemias proporcionou-me oportunidades de capacitação profissional e o contato com pessoas de várias formações acadêmicas. Foi nesse contexto que, vinte anos após ter terminado o ensino médio, que decido efetivamente retornar aos estudos e realizar um curso superior que sonhara fazer, mas sempre me via limitado. Os desafios não deixaram de existir, mas desta vez sentia-me mais motivado a superá-los. Os filhos eram todos pequenos, inclusive já tendo aumentado a família com a chegada da nossa filha Emanuele. Eu teria que passar o dia trabalhando e à noite estudar, contando com o suporte da esposa, pois ficaria muito sobrecarregada. Entretanto, o desejo de ver a família em melhores condições prevalecia e esforçava-me o máximo para superar esses obstáculos. Por isso, aproveitei os momentos vagos possibilitados pelo serviço- algumas vezes teríamos que trabalhar em lugares abandonados ou terrenos baldios- para estudar para o vestibular. Também aproveitei as oportunidades nesses lugares por onde passava para recolher material de estudo, que estava abandonado, dentre eles literatura em língua inglesa, cujo domínio e aprendizado era a minha meta e uma das principais motivações de estudo; outras vezes chegava a pedir mesmo às pessoas qualquer material, quando percebia que iria para o lixo.
RETOMADA DOS ESTUDOS
Visto que desfrutava um grande prazer daquilo que descobria sozinho no estudo da língua inglesa e pretendia utilizar os meus conhecimentos, profissionalmente, decidi realmente lutar para me qualificar. Como desde pequeno estudava por conta própria, sem precisar alguém mandar, não tive dificuldades em me esforçar para estudar, mesmo nas condições adversas: havia apenas uns seis meses para me preparar e não possuía os meios para pagar preparatório para o vestibular; por isso arranjei material de estudo, alguns até mesmo ultrapassados, como um livro de história, literalmente se deteriorando, que meu avô gostava de ler e livros de meus filhos, já que havia uns vinte anos que concluíra o segundo grau e, portanto, estava com os conhecimentos ultrapassados; pedi emprestado também material a outras pessoas que já haviam feito cursinho. Outro desafio era a falta de espaço para estudar, pois a casa pequena não tinha comodidade. Desta forma, estudava ali mesmo com os quatro filhos, bem próximos.
Agradeço a Deus porque todo aquele esforço foi recompensado, pois, quando saiu o resultado do vestibular, estava entre os sete primeiros no meu curso, que era Letras Português. Este foi o curso que realizei, porque não estava disponível Letras Inglês, que era a minha primeira opção. No princípio tive uma certa dificuldade de adaptação, visto ser um dos mais velhos da turma e um dos poucos que já eram pai de família. Mesmo assim, procurei dar o máximo de mim e aplicar-me intensamente aos estudos. Também havia a questão do deslocamento, porque morava distante da parada de ônibus e o retorno da UESPI, à noite era muito perigoso, devido à distância das paradas de ônibus e o fato de que eu morava em uma área isolada. Todavia, o longo período sem estudar deu-me uma sede de conhecimento, e um intenso desejo de aprofundamento nas matérias, extraindo dos conteúdos disciplinares tudo o que estava ao meu alcance.
Assim prosseguia até que, em meados do curso, fui acometido de enfermidade (problemas no ouvido e garganta), que permaneceu até o final do curso. Aquela condição diminuía a minha capacidade de concentração e, no mesmo período, ocorreu um acidente com um dos filhos, exigindo que nós o acompanhássemos vinte e quatro horas. Essas condições afetaram o meu rendimento acadêmico e acarretaram constantes ausências em sala de aula. Desta forma, afastei-me por um determinado tempo, já pensando mesmo em desistir do curso. Felizmente, sentindo a minha falta, um dos professores mandou me comunicar que poderia retornar e recuperar as notas através da realização de tarefas.
Como intencionava me aprimorar nos estudos, ao mesmo tempo que seguia a graduação, empregava todos os esforços possíveis para chegar ao domínio da língua inglesa. Aprender essa língua era o meu sonho de criança, mas meus pais não tinham recursos para pagar um curso. Agora, mesmo trabalhando, ainda não possuía condições para arcar com as despesas de um curso de línguas; por isso me apliquei intensamente: desde ler romances, contos e gramáticas na biblioteca da universidade ou pedir emprestado literatura estrangeira por onde passava, principalmente, no meu trabalho; também adquiri o hábito de assistir a filmes em DVD, à noite ao chegar das aulas. Todo esse esforço valeu a pena, pois, no final do curso, consegui escrever o abstract da monografia, uma vez que estabelecera esta façanha como meta até finalizar o curso.
Após a conclusão do curso, não demorou haver concurso para minha área. Mais uma vez pedi emprestado, a colegas, material de estudo atualizado; visto não estar em condições de pagar preparatório. Estudando nas horas vagas que o trabalho permitia, realizo a prova e consigo aprovação. Agora estava iniciando um novo trabalho, que era professor de língua portuguesa, da rede municipal da educação, onde permaneço até hoje. Sinto-me realizado porque gosto de trabalhar com a educação. Mesmo não tendo sido o meu alvo na graduação- porque intencionava ser tradutor e intérprete para trabalhar com a língua inglesa. Contudo, tinha que aceitar que optara pelo magistério e, por isso, me esforçaria para ser um bom profissional.
Dou sequência ao meu trabalho, e os estudos relacionados à qualificação profissional foram deixados de lado por um longo tempo. Sentia que havia uma lacuna nos conhecimentos relacionados à minha formação, como professor de língua portuguesa. Continuava a dar enfoque e a aperfeiçoar os meus conhecimentos em línguas estrangeiras, pois iniciara também os estudos do espanhol e do francês. Além dos estudos gramaticais nessas línguas, também dedicava-me a aprofundar os conhecimentos teológicos, uma vez que ensinava na igreja, aos domingos. Também não fizera nenhum curso de pós-graduação, ao longo desse tempo. E, assim, sentindo a necessidade de aperfeiçoamento na minha profissão, treze anos depois da conclusão da graduação, resolvi fazer um curso de mestrado.
REALIZAÇÃO DO MESTRADO
Todo o processo que envolve a realização desse curso constitui-se em um dos grandes desafios da minha vida. As restrições sanitárias, por conta da pandemia, impediam o contato presencial com alguma pessoa que fornecesse orientação sobre como elaborar um projeto de pesquisa; uma vez que eu não tinha experiência em pesquisa científica. Mesmo assim dediquei-me intensamente a fim de passar, mas infelizmente, embora tenha passado na prova objetiva em primeiro lugar, fora eliminado no critério de desempate, após a divulgação da nota dissertativa. Senti-me um pouco frustrado por ter esforçado-me tanto e, no final, ficar de fora. Para mim, essa tentativa de passar no curso era a única em minha vida; imaginava que não haveria outra. Na verdade, seria mesmo difícil, pois, nesse período, ocorreu o início da pandemia do coronavírus, em março de 2021, acarretando profundas mudanças no sistema de educação, inclusive outra forma de acesso ao mestrado. Como o resultado final foi adiado por quase um ano, fiquei muito ansioso na esperança de alguém desistir e eu conseguir a vaga. No final não deu certo, mas surgiram vagas ociosas em várias partes do Brasil, e eu me candidatei a uma vaga na UFAL, em Maceió. Felizmente a única vaga que havia foi minha.
O problema em cursar nessa universidade era que o curso se destinava à modalidade semipresencial. Eu teria que comparecer ao estabelecimento em algumas ocasiões para assistir aulas. Foi difícil a decisão de matricular-me na instituição, pois, a partir de Teresina, era praticamente inviável estudar lá. Como estávamos no período de isolamento social, com a educação funcionando de forma remota, resolvi arriscar a iniciar o curso. Outro desafio a ser superado era a minha falta de “bagagem” de conhecimentos, pois sentia-me como se treze anos depois da graduação “pulara “ no mestrado, sem o preparo adequado. Acrescentando a isso o fato de ser on-line, exigindo um certo conhecimento de informática, área que eu não dominava. Por isso, sempre estava solicitando aos filhos ou a colegas da turma algum tipo de ajuda nos recursos digitais. Quando chegou a fase de orientação, também houve dificuldade porque o orientador passava-me as instruções, mas eu sentia a necessidade de um acompanhamento mais de perto.
Assim transcorreu, até que chegou o dia da apresentação final. Estava apreensivo neste dia. O meu orientador (professor-doutor Aldir) tentou passar o máximo de segurança possível para eu confiar que daria certo. Os professores que me avaliaram fizeram várias críticas e uma série de restrições, mas, no encerramento chegaram a um consenso sobre a minha aprovação! Foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida! A realização de um grande sonho estava se consumando.
Uma das etapas mais desafiantes da minha vida estava sendo vencida! Hoje agradeço àqueles que torceram por mim, durante todas as etapas de minha vida, como meus tios Emiliano (in memoriam), Regino (in memoriam), Gilberto, Antônio (in memoriam), Francisco e, principalmente meu pai (in memoriam); minhas tias Darcy, Ivanildes e Marlene. Minha mãe e irmãos mencionados e minha esposa Remédios e aos meus quatro filhos já citados. Continuo a escrever minha história. Este trecho é apenas um recorte de um longo percurso, cujo fim ainda não chegou.
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