IDENTIFICAÇÃO Sou Osvaldo Baldoni, nasci em Santa Cruz das Palmeiras, São Paulo, em 18 de maio de 1940. FAMÍLIA Meus pais são João Baldoni e Luiza Briaguês. Eles eram filhos de imigrantes italianos. Eu nasci numa fazenda. A minha mãe morava naquela fazenda com uma família de colonos. Se bem que, o meu avô por parte da minha mãe, não era agricultor, ele era seleiro, fazia selas, cordas, arreios. Era também capador de animais. O meu pai era da cidade próxima da fazenda, de Santa Cruz das Palmeiras. Naquela ocasião, ele trabalhava numa fábrica de tonéis, era tanoeiro. Ele foi morar na fazenda e começou a trabalhar de pedreiro lá. Logo em seguida, a minha família se mudou pra cidade. A minha primeira infância foi na cidade de Santa Cruz das Palmeiras. Era uma cidadezinha bucólica, década de 1940, tinha trenzinho Maria-Fumaça que chegava à cidade. Um ambiente muito bonito. Quando a gente chegava de trem, você avistava a cidadezinha, a torre da igreja. O trem dava uma volta em toda a cidade, depois a cidade subia. Parava na estação, que era na própria cidade. Tinha uma região de mata, onde ele fazia uma curva. E a cidade era aquilo, pracinha, a igreja, e a gente morava aí. Mas, eu morei só até os sete anos. Com sete anos de idade, minha família se mudou pra São Caetano do Sul, que é no ABC Paulista. Por causa de empregos. Tinham muitos filhos, precisavam trabalhar. Eu me criei em São Caetano do Sul. Morei também em São Bernardo do Campo, ali no ABC Paulista, até me casar. Aliás, até me aposentar eu morei por lá. INFÂNCIA Nesse período, até os sete anos, lembro dos amigos, dos quintais grandes, você brincava nos pomares. Eu gostava muito de ficar com meu pai. Meu pai era pedreiro e eu ficava junto com ele, brincando naqueles pedaços de tijolos. Construía castelos, coisas de criança. Eu me lembro bem dessa parte, que eu acompanhava meu pai. Quando ele saia pra fazer serviço nas fazendas, eu ia...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Sou Osvaldo Baldoni, nasci em Santa Cruz das Palmeiras, São Paulo, em 18 de maio de 1940. FAMÍLIA Meus pais são João Baldoni e Luiza Briaguês. Eles eram filhos de imigrantes italianos. Eu nasci numa fazenda. A minha mãe morava naquela fazenda com uma família de colonos. Se bem que, o meu avô por parte da minha mãe, não era agricultor, ele era seleiro, fazia selas, cordas, arreios. Era também capador de animais. O meu pai era da cidade próxima da fazenda, de Santa Cruz das Palmeiras. Naquela ocasião, ele trabalhava numa fábrica de tonéis, era tanoeiro. Ele foi morar na fazenda e começou a trabalhar de pedreiro lá. Logo em seguida, a minha família se mudou pra cidade. A minha primeira infância foi na cidade de Santa Cruz das Palmeiras. Era uma cidadezinha bucólica, década de 1940, tinha trenzinho Maria-Fumaça que chegava à cidade. Um ambiente muito bonito. Quando a gente chegava de trem, você avistava a cidadezinha, a torre da igreja. O trem dava uma volta em toda a cidade, depois a cidade subia. Parava na estação, que era na própria cidade. Tinha uma região de mata, onde ele fazia uma curva. E a cidade era aquilo, pracinha, a igreja, e a gente morava aí. Mas, eu morei só até os sete anos. Com sete anos de idade, minha família se mudou pra São Caetano do Sul, que é no ABC Paulista. Por causa de empregos. Tinham muitos filhos, precisavam trabalhar. Eu me criei em São Caetano do Sul. Morei também em São Bernardo do Campo, ali no ABC Paulista, até me casar. Aliás, até me aposentar eu morei por lá. INFÂNCIA Nesse período, até os sete anos, lembro dos amigos, dos quintais grandes, você brincava nos pomares. Eu gostava muito de ficar com meu pai. Meu pai era pedreiro e eu ficava junto com ele, brincando naqueles pedaços de tijolos. Construía castelos, coisas de criança. Eu me lembro bem dessa parte, que eu acompanhava meu pai. Quando ele saia pra fazer serviço nas fazendas, eu ia com ele na charrete. Ele ia de charrete, eu ia junto. Lembro, às vezes, até do cheiro do cavalo, aquele cheiro da manhã, daqueles aromas, da comida que a gente levava, que era um caldeirãozinho de comida para o almoço dele. E aquele cheiro da comida com cheiro do campo. Isso me vem na memória FORMAÇÃO Em Santa Cruz das Palmeiras, comecei a freqüentar escola, mas foi interrompido o primeiro ano, por causa da mudança. Continuei em São Caetano do Sul, na escola primária, num grupo escolar. Quando eu terminei a escola, comecei ajudando meu pai, mas era serviço leve. Meu pai não queria aquele serviço para mim. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Comecei a trabalhar com 13 anos de idade, no comércio, numa loja de fogões. Naquele tempo, se obtinha do juiz uma autorização, se autorizava o trabalho pra menores de 13 anos. Depois até foi reduzido pra 12 anos. Agora parece que é só acima de 16 anos, mas naquele tempo, com 13 anos, eu já trabalhava com uma autorização do juiz. Trabalhei nessa loja durante um ano. Quando eu completei 14 anos, eu queria carteira de trabalho, queria trabalhar de maneira mais regular e eu fui trabalhar como auxiliar de escritório, office boy, naquele tempo. Isso em São Paulo, que era encostado a São Caetano, como se fosse um bairro de São Caetano. Eu trabalhava no Brás. Foi uma vivência muito rica Eu andava pela rua fazendo serviço de bancos, pegando bonde, vai pra lá, pra repartições, aquilo foi um aprendizado, uma escola fabulosa. Que pena que hoje em dia os jovens não têm isso, essa oportunidade. CIDADES / SÃO PAULO / SP Pra eu ir trabalhar no Brás, era de bonde. Quando subia o bonde, que a gente ia para o centro, era bem próximo do Parque Dom Pedro, mas bem próximo mesmo. Naquele tempo, o bonde era baratinho. O pessoal subia pra Praça Clóvis Beviláqua - que é onde hoje é a Praça da Sé, aquilo ficou uma praça só - subia de bonde. Era uma distância pequena. E tinha uma subida. O chique, ou coisa, assim, era o jovem descer do bonde andando (risos). Os malandros desciam andando. Era aquela coisa, bairro de italianos, aquela italianada, pessoal com aquele sotaque característico. FORMAÇÃO Minha mãe queria que eu me formasse em Contabilidade, porque o meu irmão mais velho era contador. Ela falava assim: “Você vai ser contador” Eu tinha vontade de ser artista, pintor, desenhista, eu tinha uma facilidade pra fazer desenho. Na escola, eu gostava de desenhar mapas, fazia uns mapas bonitos, o pessoal elogiava. E minha mãe falava: “Não senhor Você não vai ser isso aí, nada. Isso aí é só boêmio, esses caras tudo pinguço. Você vai ser contador, vai trabalhar igual ao seu irmão.” Então, eu tive uma dificuldade, inclusive, tive dificuldade escolar nessa fase que eu estava fazendo o ginásio. Depois do ginásio, passei por um curso básico - era um curso mais simples, tinha um ano a menos que o curso ginasial - e você podia fazer depois o curso de Contabilidade. Foi uma luta. Eu não queria estudar. Eu não aceitava, mas, minha mãe insistia: “Não, você tem que estudar”. Acabei deixando o curso de ginásio e comecei a fazer curso de desenho. Cheguei a fazer desenho artístico. Antigamente, em São Paulo tinha uma escola chamada Associação Paulista de Belas Artes. Era de uma associação, mantinha um curso lá. Eu fiz o começo do curso. Depois não continuei. Estudei também desenho mecânico. Com isso não fiz o colegial. Mais tarde, quando eu trabalhava na indústria e estava numa área comercial, eu precisava ter um diploma superior. Foi aí que, depois de casado, estudei à noite, conclui o curso colegial. Naquele tempo, tinha uns exames de Madureza, umas coisas assim. Prestei os exames, prestei um vestibular para o curso de Direito e consegui entrar pra uma faculdade boa de Direito que tinha em São Bernardo do Campo. Era uma autarquia municipal, de graça, uma escola muito boa. Eu me formei em Direito, mas só que eu não tinha vocação pra Direito. Eu formei porque eu trabalhava numa empresa, numa indústria e precisava ter uma formação pra ter chance de promoção dentro da empresa. Foi assim que estudei Direito, mas nunca exerci. Cheguei até a me inscrever na Ordem [OAB]. Naquele tempo, prestei exame na Ordem, passei, recebi a carterinha de advogado. Depois daquilo continuei pagando as anuidades durante uns dois, três anos, mas nunca exerci. Acabei pedindo baixa, a mensalidade era meio alta. Hoje em dia, eu já esqueci tudo (risos). Mas, valeu muito o curso, maravilhoso. Eu acho que é muito importante pra formação da pessoa. Foi um curso que me ajudou muito. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu fui trabalhar numa usina de aço, na Aços Vilares. Trabalhei, inicialmente, na parte de almoxarifado, administração de materiais. Eu cuidava dos estoques. Em seguida, me passaram pra área de compras; me desenvolvi nessa área, cheguei a ser chefe de compras. Trabalhei 24 anos nessa empresa. Eu, que era de uma família humilde, graças a Deus, pude guardar umas economias. Eu tinha uma casa boa, paguei minha casa, tinha casa própria, uma casa relativamente valorizada, num bairro bom, e quando eu parei de trabalhar, veio a idéia de me dedicar à apicultura. A idéia era morar num sítio, viver no campo. Só que na hora do vamos ver, a família começa: “É, mas não sei o quê...” A mulher começa: “Ah, mas vai ficar longe da mamãe. Por que, não sei o que lá... Porque fica isolado.” Então, não deu certo. Nessa altura, eu morava em São Bernardo do Campo. Eu sai de São Bernardo do Campo, comprei um sítio em Itapira e passei a morar em Campinas, que era mais próximo de Itapira pra tocar o negocio de abelhas. Foi exatamente em 83 quando me transferi pra Campinas. Em 83, também, eu comprei o sítio. Comprei o sítio e uma casa. Porque eu vendi a casa que eu tinha em São Bernardo e com aquele dinheiro deu pra comprar uma casa em Campinas. Era uma casa que estava meio detonada (risos). E a minha mulher colaborou muito nessa fase, me deu todo o apoio. Graças a Deus. Entramos na casa, ficamos morando lá. Em paralelo, fazendo as reformas, as coisas necessárias que a casa precisava até ficar num ponto ideal. MIGRAÇÃO São 24 anos em Campinas. Teve muita transformação. Eu lembro. Parece que o pessoal andava na rua mais tranqüilo. Campinas era uma cidade mais pacata. As pessoas andavam na rua, parece que sorrindo, de bom humor, você tinha uma convivência, andando na rua, quando você ia ao comércio, fazer alguma coisa nos bancos. A gente freqüentava as praças, passava numa praça, sentava num banco, conversando, com a família e tal. Hoje em dia, já não se pode mais fazer isso. APICULTURA A minha idéia era produção. Eu estava visando mais a produção de mel. Você tem que começar na produção e, na medida em que vai produzindo, você vai vendendo para os seus conhecidos. Porque o mel é um produto que tem certo tabu: “Mas, esse mel é puro?” (risos) Você até hoje houve o cara: “Mas, esse mel é puro?” (risos) É uma coisa que, às vezes, é até meio ofensiva. Você fala: “Pô Esse cara está pondo em dúvida minha honestidade?” Mas, a gente até compreende, é uma prática comum. O pessoal que vende na rua é uma coisa que não é mel. Quem trabalha com apicultura está vendendo um produto de qualidade e ganha um cliente pra sempre. Aquele vai ser um cliente cativo, vai indicar outras pessoas. Porque além da pureza do mel - uma questão fundamental, o óbvio - tem também outra preocupação, dependendo da responsabilidade do profissional, da qualidade do produto que você tem que colher na época certa. O mel tem que estar maduro, tem que ser um mel de boa qualidade, de sabor. Porque tem mel com um sabor que não é tão agradável. Então, se você colhe o mel e esse mel é 100% puro, mas o sabor não é tão agradável, você não pode vender como se fosse um mel normal, a pessoa não vai ficar satisfeita. A pessoa que começa a produzir tem que pensar no longo prazo. Você: “Não. Não, vou vender esse produto que não vai satisfazer.” Aquele produto, você segura, deixa pra alimentar abelhas. É um detalhe que pouca gente sabe: o apicultor alimenta a abelha pra fortalecer os enxames; tem uma época do ano, de inverno, uma época que chove muito, faltam flores e a abelha não tem néctar pra fazer mel. Essa fase começa a diminuir a população. O apicultor que faz apicultura racional tem que socorrer as abelhas com alimento artificial. Pode dar até água com açúcar. Se ele tem um mel de qualidade inferior que está guardado, ele dá aquele mel pra complementar a alimentação dela, pra não diminuir a população de abelhas. Só que nessa fase, logicamente, ele não vai produzir mel pra vender. Aliás, ele nem pode porque o enxame está fraco e não tem a parte de cima que é a belgueira. Você tira o mel excedente da abelha numa sobrecaixa que coloca na colméia quando o enxame está forte. A gente só faz isso na hora da florada, na hora que tem a florada intensiva. Aí, você põe a belgueira vazia, leva a abelha ou a florada que está no local. A abelha vai visitar o local que tem aquelas flores, vai trazer o néctar e vai produzir o mel de qualidade. Porque se você dá um alimento pra abelha também, e ela faz um mel daquele alimento artificial, o mel fica sem sabor de mel. É um detalhe que, às vezes, as pessoas, não sabem. Elas ficam sabendo que o apicultor dá uma alimentação e falam: “Pô, ele está falsificando” E, não é. A pessoa trabalhando com critério. Porque a questão de conhecer o mel é pelo sabor. A pessoa que está acostumada a consumir pelo sabor, ela já sabe. Os que compram mel na rua é porque nunca compraram um mel de qualidade. O dia em que ele comer o mel de qualidade... Se ele está habituado a comer, ele fala: “Não.” A hora que ele vê, ele fala: “Isso aqui tem um gosto de caramelo Uma coisa meio esquisita.” Então, ele rejeita. COMÉRCIO A gente trabalhava no apiário e eu comecei a vender para os meus amigos, ex-colegas de trabalho. Quando eu tinha mel, colocava num Opalão que eu tinha, ia pra São Caetano do Sul visitar os parentes, passava na empresa que eu trabalhei: “Oh, fulano...” E um mel aqui e outro lá. Vendia assim. Em paralelo, fui aumentando a produção. Eu consegui, em Campinas, uma autorização da prefeitura pra vender. Tinha, às vezes, umas promoções em frente à prefeitura, umas barraquinhas de mel. Depois também, numa feira de artesanato. A gente começou vendendo assim. A Casa do Apicultor surgiu só em 93. Em 93, já tinha crescido. Quando eu vendia mel na prefeitura ou nas feirinhas aqui dentro de Campinas, o meu mel era autorizado pela vigilância sanitária municipal. O pessoal fazia umas análises dentro da prefeitura e eu tinha autorização. Quando tive que abrir a loja, eu precisei de um registro do produto, pra poder vender no Estado de São Paulo inteiro, fora de Campinas. Era do serviço de inspeção do Estado de São Paulo. A gente instalou no nosso sítio uma Casa do Mel, ou seja, um estabelecimento, tinha lá os equipamentos de extrair com um acompanhamento, fiscalização da vigilância sanitária estadual que, naquela época, funcionava em Mogi Mirim. Eles faziam a nossa fiscalização lá em Itapira. Foi assim que começou. CASA DO APICULTOR Quando iniciei o negócio éramos eu e minha mulher vinha me ajudar. Começamos nós dois e meu filho. Meu filho sempre esteve junto comigo, o Luis Fernando. Meu negócio sempre foi junto da família. Meus filhos me ajudavam, até faziam as caixas iscas. Eram adolescentes, um tinha 16 anos e o outro tinha 13 anos. As caixas iscas, você faz uma caixa provisória que tem que ser em quantidade grande pra você colocar em lugares estratégicos pra pegar os enxames; os enxames da natureza que procuram lugar pra se alojar. Quando entra um enxame numa caixa, a gente passava depois pra uma caixa padrão. Essa caixa padrão, eu comprava de um fabricante. Até eu nunca quis fabricar as caixas porque eu tinha medo, sou meio desastrado pra trabalhar com ferramenta elétrica. Eu também tinha medo que acontecesse algum acidente com meus filhos. Então, as únicas caixinhas que fazíamos eram as caixas iscas, que eram de madeirinha mole. Naquele tempo, havia caixas de maçã que eram descartadas, umas caixas importadas da Argentina. Eram um tipo de pinus molinho, branquinho, fácil de cortar. A gente com um serrotinho cortava na medida e fazia umas caixas iscas. Cabiam quatro quadros, quadros normais do tamanho do quadro padrão da caixa de criação racional. Então, quando aquele enxame entrava na caixa, aqueles quatro quadros ficavam com abelha, a gente passava pra uma caixa padrão e começava. Meus filhos começaram me ajudando. Dei a eles essa atribuição: “Cada caixinha, vocês ganham tanto.” Era a mesada deles, um cruzeiro, um cruzado... Eu não lembro o que era... Eles me ajudavam. Quando eu comecei a ir para o campo, eu ia na fazenda colher mel e eles iam junto. Antes de vir pra Campinas, eu tinha começado a fazer apicultura num sítio de um amigo em Bragança Paulista. Ele cedeu a casa pra gente. Comecei a colocar as caixas iscas, umas abelhas lá. Um dia, nós voltamos - a gente morava em São Bernardo do Campo e era meio distante, demorava um pouquinho para voltar – e quando voltamos, tinha sido após uma florada intensiva, aquela caixa estava cheia de mel e um favo bonito, branquinho, aquele favo grosso, mel todo madurinho. Na hora que eu abri a caixa, percebi que o enxame estava forte, aqueles favos bonitos e meu filho ficou maravilhado. Naquela hora, tomou uma decisão na vida dele: “Pai, eu quero trabalhar com abelha.” Foi na hora em que ele viu aquele favo. Então, até hoje, os dois estão envolvidos com a nossa atividade. Eu tenho um que é meu sócio, que trabalha diretamente, cuida do apiário e de um entreposto que a gente tem. Eu continuo lá na loja, cuidando da Casa do Apicultor. Decidi trabalhar com apicultura depois de ler um livro que eu adquiri ou ganhei. Acho que foi até de graça, que a Secretaria de Agricultura distribuiu, em 1961. Aliás, o livro é editado em 1960. Eu tenho até hoje esse livro, eu mandei encadernar. Em 61, mais ou menos, eu adquiri esse livro e fiquei maravilhado com as coisas que eu comecei a conhecer sobre apicultura. Comecei a alimentar essa idéia. A minha mãe dizia que tinha um parente nosso de Santa Cruz da Palmeiras – por coincidência, era parente, não tinha o mesmo sobrenome, mas era um sobrenome parecido, era Bordoni, o meu é Baldoni e o dele, Bordoni – mas, era um primo da minha mãe que trabalhava com abelha, tinha aprendido com uma outra pessoa que passou pela cidade, um alemão. Eu só fui conhecê-lo mais tarde, quando já tinha me iniciado na apicultura. DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO A gente vendia mel na loja e as pessoas vinham, perguntavam: “Você não tem aveia?” E eu pensava: ”Poxa vida Precisaria ter esses produtos.” Em casa, a gente usava alimentação natural. Nós sempre tivemos essa busca pela qualidade de alimentação, qualidade de vida, sempre teve uma preocupação nossa. Só que não tinha espaço na loja, era muito pequena. Aí, então, veio a idéia de montar na frente, uma casa de produtos naturais. A minha mulher até concordou em ajudar, ela ficaria nessa loja de produtos naturais. A gente acabou montando outra loja chamada Alma Zen, que hoje cresceu bastante. A minha mulher continua tocando aquela loja. A Casa do Apicultor ficou com mel e produtos da abelha, cera de abelha, própolis, pólen, geléia real. LIÇÕES DO COMÉRCIO Crises estão sempre aí (risos). Nossa experiência é que crise é uma constante. Você não tem que se impressionar, tem que acreditar, trabalhar e não gastar tudo que ganha. Tem que guardar uma parte do que ganha. Eu aprendi na minha família. Éramos em muitos irmãos e tínhamos dificuldade, naquele tempo. Problemas, sempre houve, mas a gente foi - graças a Deus - sempre superando. Trabalhando dá pra levar a vida. Apesar das dificuldades, da burocracia, parece que aumenta cada vez mais. Parece que cada vez eles estão criando mais dificuldades (risos). Mas, dá pra levar. Essas dificuldades são permanentes. DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO Antigamente, o comércio era bem mais tranqüilo. Apesar de não fazer tanto tempo assim... Naquele tempo, podia estacionar os carros, era permitido. Os carros estacionavam no lado esquerdo, paravam na frente. Tinha os vizinhos, o barzinho da esquina. A gente convivia. Era uma convivência fraterna. Aliás, isso a gente tem até hoje. Parece que o pessoal antigo ainda continua. O pessoal novo. Sempre tem coisa nova. A gente sente um ambiente familiar, por isso gosta do que faz e desfruta de relações saudáveis. A única coisa que mudou - agora você não pode mais parar – foi o trânsito, muito intenso. A gente tem que ter convênio com o estacionamento. Você gasta uma nota com estacionamento. IMPORTÂNCIA DO COMÉRCIO Eu acho que é uma atividade necessária, uma coisa natural em qualquer comunidade. É uma necessidade da sociedade, ter pessoas que se especializam naquilo. Eu não pensei em comércio, eu tinha pensado em produção. Mas é impossível Se você está cuidando da produção, você não tem condições de poder oferecer um produto na hora que a pessoa quer, no local que seja cômodo pra ela. Então, o comércio é necessário também, além das outras atividades de produção. Enfim, das outras atividades da cadeia até chegar ao comércio. APICULTURA Modéstia à parte, a gente considera a Casa do Apicultor importante no âmbito nacional. Porque outra casa especializada igual a Casa do Apicultor, talvez não tenha no Brasil. Em São Paulo, que é uma grande cidade, temos lá uma Associação de Apicultores, uma associação que eu fiz o curso, que eu participo até hoje, que é a Apacame. Eles fazem uma parte de comercialização de produtos dentro da associação e dão cursos. Mas, fora da Apacame, em São Paulo, tem outros comércios em Belo Horizonte. No Rio de Janeiro, não conheço. Em Juiz de Fora parece que tem uma empresa. Em Curitiba tem alguns, mas é uma coisa concentrada. Tudo isso, comércio de produtos e cursos. E uma outra vantagem da Casa do Apicultor é que a nossa equipe - nós somos três pessoas, eu e mais dois funcionários – e um deles é o Gerson – que já era apicultor – e eu conheci como cliente da loja. Depois ele começou a trabalhar pra gente, não deu certo tocar o negócio no campo e ele começou a trabalhar com a gente. Hoje ele dá os nossos cursos de apicultura. Além de atender na loja, de fazer serviço, ele dá a parte teórica do curso de apicultura. E outro rapaz que trabalha pra gente, o Hilton. Esse aí começou jovem a trabalhar, mas fez cursos de especialização de apicultura, já trabalhou nas atividades com abelhas junto com a gente pra aprender. Qualquer pessoa que vai na Casa do Apicultor tomar informações sobre apicultura, alguma dúvida, como fazer, como resolver um problema, qualquer um dos três têm condições de dar uma orientação. Nós fazemos isso com todo o prazer. Não temos restrição, quanto mais gente trabalhar nessa atividade, melhora pra todo mundo e vai melhorar pra nós. Toda hora tem gente nos visitando. Pessoas que vem buscar as coisas. Eu despacho mercadorias pra outras cidades. A minha atividade é especifica, não é em qualquer lugar que tem uma loja especializada em apicultura. Eu sou do tempo antigo. Sou mais chegado nas coisas antigas. No meu tempo de jovem existia um modernismo, o rock and roll. Eu não era desse negócio, não. Até eu falava: “Eu não sou playboy. Eu sou é malandro.” Malandro, no bom sentido. Namoradinhas, aquela coisa, nesse sentido. Eu sempre fui uma pessoa mais conservadora. Ainda hoje, eu sou um cara que não mexo com computador. Dependo de outras pessoas. Lógico, a gente tem que trabalhar com informática. Tem lá as pessoas que colaboram com a gente, que ajudam, mas eu tenho essa dificuldade. Com isso, talvez a gente não se torne um grande empresário. Conhece um assunto, no caso o mel, a apicultura, desde o inicio, da produção até a comercialização. E, em paralelo, esses produtos naturais que a gente vende também na Casa do Apicultor e na Alma Zen. Muita coisa vem do nosso sítio. A gente faz em paralelo com a apicultura, alguma coisa de plantas medicinais. Só que não temos aqui possibilidade de fazer plantio, mas das plantas nativas a gente faz coleta de folhas pra preparo de chás. A gente conhece bastante dessa coisa de ervas medicinais. Eu acho que também é importante para o conhecimento das pessoas, e até, pras outras pessoas, para o mundo. E pena que isso está se perdendo. Hoje em dia o pessoal não valoriza mais. Hoje nem tem mais a área verde, a tendência é ter tudo com asfalto e cimento. No nosso sítio, a gente tem diversidade. O nosso pomar é mesclado com plantas nativas, é misturado. Dá aquele equilíbrio necessário para também ter menos pragas. Nós não usamos nenhum tipo de agrotóxico, nada. E, não temos galinheiro, de ter galinha presa lá. Nossas galinhas são soltas. Mais galinhas da Angola, que ajudam a limpar os pastos. A gente percebe que preservando coisas naturais, você tem melhor qualidade. Por exemplo, a nossa abelha africanizada, é uma abelha que você não induz a purificação, a uma especialização da raça. A gente tem abelha produtiva. Mas, a gente não está indo fazer enxertia mecânica de abelha, através de aparelho para você procurar semens, aqueles zangões mais produtivos, raças... Aqueles que só visam produção. Você deixa ela mais natural, uma abelha mais saudável. Nessa parte dá menos preocupação, a gente acha. Por exemplo, há dificuldade em achar um pasto de mata nativa, pastagem diversificada para aquele mel silvestre. O máximo que você vai achar é um lugar para pôr eucaliptos, laranjeiras. Essas áreas estão acabando. O pessoal começa a plantar muita cana. Cana está começando a tomar conta. Tem muito desmatamento para plantio de cana. O que salva a gente é que a nossa região é montanhosa, não é própria para agricultura mecanizada. Então, lá se preserva ainda a pastagem apícula, de plantas silvestres, para mel silvestre. A espécie que a gente trabalha para produção é a abelha Europa – abelha africanizada, hoje abelha Apis Melliferas, essa é a abelha Europa. O grosso do mel que a gente comercializa é dessa abelha. A gente está fazendo um trabalho de introdução de algumas espécies de abelha que estavam em extinção: abelha mandaguari, abelha mandaçaia, agora, abelha uruçú que estamos trazendo do Norte e ela está se adaptando bem aqui. Esse aí é um esforço mais para preservar as espécies porque nós não descobrimos ainda – existe uma dificuldade em descobrir – lugares que essas abelhas produzam bem a ponto de sustentar uma produção comercial de mel. Hoje nós temos alguns amigos que tem alguns lugares propícios para produção de mel de abelha jataí. Esses locais que já são conhecidos há muito tempo, são locais em que a abelha jataí se dá bem. Regiões de mata nativa, um clima que é adequado para ela. Esses lugares não são muito conhecidos, porque a pessoa até nem divulga muito. O cara fala: “Lá é bom para abelha jataí. Um monte de gente vai querer colocar mel em volta.” Então, para abelha jataí tem alguns lugares que tem produção comercial, ainda que dê para sustentar alguns criadores. Se bem que, essas pessoas, geralmente, tem essa atividade em paralelo com uma outra atividade principal. Geralmente, um agricultor, ou, às vezes, até um profissional de outra área urbana mesmo, que ele faz aquilo no campo; ele tem mais aquelas caixas e ele tira uma produção. Porque o grande problema é o seguinte: as abelhas indígenas brasileiras, aqui no nosso continente, estão fadadas à extinção ou então não dá muita produção, porque a abelha africanizada, a abelha européia é uma abelha condicionada pela origem dela, do clima frio, a ela fazer bastante reserva de alimento. Então, ela é uma abelha muito ativa, muito produtiva. As nossas abelhas são acomodadas porque é verão o ano todo. Ela não precisa fazer muita reserva de alimento. Ela sai para trabalhar mais tarde, para coletar néctar mais tarde. Nessa altura, a abelha européia e a abelha africanizada - que é também muito ativa - já passou antes e recolheu tudo. A outra tem uma dificuldade de produção nesses meios. Então, eu não sei até que ponto vamos desenvolver e se essas abelhas vão se adaptar a competir com as abelhas européias, para poder viabilizar uma produção numa escala comercial. Apesar de a gente estar, hoje, criando matrizes dessas abelhas, fornecendo pras outras pessoas tudo que existe, até esse objetivo, até em termos de governo, tudo de preservar. Mas, nós não sabemos se isso vai compensar a produção dessas abelhas mandaçaia e mandaguari que, teoricamente, são mais produtivas que a jataí. Mas, hoje, na prática, a abelha jataí é que está produzindo mais em escala comercial. Existem várias raças de abelhas. Na Europa, em outros países, o pessoal cria as abelhas e, mais ou menos, elas não se misturam, elas se preservam. Apesar de estarem na natureza, soltas, elas se mantém; aquelas raças com pequenas variações; como sub-raças, subespécies. A espécie principal é a mesma, tudo Apis Mellíferas. Tem uma pequena diferença das abelhas que se cria na Europa: tem abelha carnica, abelha italiana, abelha alemã. Umas espécies se mantêm diferentes. Essas abelhas foram trazidas para o Brasil. Quando se introduziu uma outra espécie desta mesma raça vinda da África, não sei por que ela se misturou toda. Misturaram-se todas. Ficaram todas africanizadas. Essa abelha tem um comportamento diferente. O nosso clima favorece esse cruzamento com a abelha africanizada, que é uma abelha que cruza bem no nosso clima. Na parte sul da Argentina, a abelha africanizada não chega. Lá as abelhas se mantêm, aquelas raças originais não se misturaram com a africana. Esses méis são todos iguais. É mais a florada que vai dar diferença de sabor, e o cuidado que o apicultor tem na colheita. Ele tem que colher o mel no momento certo, deixar o mel chegar no ponto, amadurecer. E também, o manejo, como se usa fumaça para controlar as abelhas, não pode usar fumaça em excesso para não contaminar o mel, tem que usar a fumaça de forma adequada, nunca direcionada para dentro do favo. São esses cuidados que a gente procura divulgar nos cursos de apicultura. MEMÓRIAS DO COMÉRCIO DE CAMPINAS Eu acho que é uma coisa muito importante. Eu nem sabia que existia esse trabalho. Isso faz parte da história, da cultura. Pra gente entender o presente precisa conhecer o passado. E lógico temos que estar abertos para o futuro. Conhecer o passado, eu acho, que é importante, é fundamental. Valorizar as raízes. Acho que esse trabalho é de suma importância. Eu achei muito interessante. Não conhecia esse trabalho do Sesc. Achei uma coisa muito interessante. Muito bacana. Gostaria de conhecer das outras áreas do comércio aí. Eu vou procurar ter acesso agora. Saber como se obtém acesso. Deve ser pela internet. Vou ter que recorrer aos amigos pra imprimirem as coisas, me mostrar, colocarem na tela pra eu ver. Vai ser muito bacana. Parabéns ao Sesc e parabéns à equipe pelo trabalho.
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