Depoimento de Aparecido Dahab
Entrevistado por Claudia Leonor e Flavia Darre Barbosa
Araraquara, 18 de Setembro de 1999
P/1 – Pra começar a entrevista, qual o seu nome completo, o local e a data de nascimento?
R – É Aparecido Dahab. Local de nascimento é São Paulo, a data é 02 de novembro de 1930.
P/1 – O nome dos seus pais?
R – Meu pai chamava-se Tufik Dahab e a minha mãe chamava-se Bassma Dahab
P/1 – Quando eles nasceram e onde?
R – Os meus pais, mais ou menos, eles tinham a mesma idade... Mais ou menos, eles tinham a mesma idade. Como nessa época, em 1901, que foi, mais ou menos, a data do nascimento, não havia registro. Então, praticamente, eles acabaram determinando que o dia seria... É uma determinação, então determinou que seria 1º de maio de 1901, que os dois tinham a mesma idade.
P/1 - Primeiro de maio é pros dois?
R - Pros dois.
P/1 - É mesmo! Que interessante.
P/1 - Eles casaram-se lá no Líbano e vieram pro Brasil, e... só não me recordo agora a data que eles vieram ao Brasil. Só que sou filho único e nasci só depois de nove anos de casado. Então ficou só eu. Levo o meu nome de Aparecido não me pergunta porque que é Aparecido, porque na verdade todo mundo me conhece como Aparício e não Aparecido. Se me perguntar "Por que você é chamado de Aparício." Eu também não sei. Que todas as vezes, todo mundo me chamava de Aparício, com exceção da minha mãe que fazia absoluta questão que seria Aparecido. Na verdade, foi uma promessa. A minha mãe não tinha filhos, eles não tinham filhos, e a minha mãe fez uma promessa. Ela tinha absoluta certeza que seria mulher. Tanto é que ela tinha feito uma promessa à Nossa Senhora Aparecida, e dizia: "Bom, vai nascer e vai ser Aparecida." Como veio homem, ela simplesmente, só mudou o "a" pro "o". Então, essa é a razão toda. De lá pra cá, naturalmente, passei, ficamos em São Paulo, praticamente durante nove anos. Meu pai já era comerciante, como todo...
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Entrevistado por Claudia Leonor e Flavia Darre Barbosa
Araraquara, 18 de Setembro de 1999
P/1 – Pra começar a entrevista, qual o seu nome completo, o local e a data de nascimento?
R – É Aparecido Dahab. Local de nascimento é São Paulo, a data é 02 de novembro de 1930.
P/1 – O nome dos seus pais?
R – Meu pai chamava-se Tufik Dahab e a minha mãe chamava-se Bassma Dahab
P/1 – Quando eles nasceram e onde?
R – Os meus pais, mais ou menos, eles tinham a mesma idade... Mais ou menos, eles tinham a mesma idade. Como nessa época, em 1901, que foi, mais ou menos, a data do nascimento, não havia registro. Então, praticamente, eles acabaram determinando que o dia seria... É uma determinação, então determinou que seria 1º de maio de 1901, que os dois tinham a mesma idade.
P/1 - Primeiro de maio é pros dois?
R - Pros dois.
P/1 - É mesmo! Que interessante.
P/1 - Eles casaram-se lá no Líbano e vieram pro Brasil, e... só não me recordo agora a data que eles vieram ao Brasil. Só que sou filho único e nasci só depois de nove anos de casado. Então ficou só eu. Levo o meu nome de Aparecido não me pergunta porque que é Aparecido, porque na verdade todo mundo me conhece como Aparício e não Aparecido. Se me perguntar "Por que você é chamado de Aparício." Eu também não sei. Que todas as vezes, todo mundo me chamava de Aparício, com exceção da minha mãe que fazia absoluta questão que seria Aparecido. Na verdade, foi uma promessa. A minha mãe não tinha filhos, eles não tinham filhos, e a minha mãe fez uma promessa. Ela tinha absoluta certeza que seria mulher. Tanto é que ela tinha feito uma promessa à Nossa Senhora Aparecida, e dizia: "Bom, vai nascer e vai ser Aparecida." Como veio homem, ela simplesmente, só mudou o "a" pro "o". Então, essa é a razão toda. De lá pra cá, naturalmente, passei, ficamos em São Paulo, praticamente durante nove anos. Meu pai já era comerciante, como todo árabe que vem, né? Ele começou a negociar ou, vamos dizer, todo mundo mascateava , naquela época. Então, meu pai começou na realidade a mascatear, até que se instalou ali, na rua 25 de Março, que ali só tinha árabes, na verdade, naquela época. Ele trabalhou ali até o ano de 39, que foi justamente quando eu completava 9 anos, eles resolveram mudar pra Rio Preto. Porque havia um campo maior. Porque Rio Preto era uma espécie de sertão. Tudo ali próximo era uma abertura de comércio novo. Então, eles resolveram fazer uma tentativa pra lá. E assim, nós saímos de São Paulo em 39, nos instalamos em Rio Preto. Morando ali no centro da cidade de Rio Preto. Ficamos dois anos em Rio Preto. Como toda a família da minha mãe e a do meu pai também, morava aqui em Araraquara, então, em 41, nós mudamos pra Araraquara.
P/1 - Voltando um pouquinho. Sabe por que os seus pais vieram do Líbano?
R - Na época, na verdade, o Líbano é um pais muito pequeno, com poucas possibilidades de você ter um progresso. Então, o Brasil era visto assim como um país promissor. Pois você poderia enriquecer, que você poderia melhorar seu estado de vida. E com isso, eles resolveram e embarcaram pra cá. Vieram os dois tentar, né? Como, naquele época, imigrava muito. Geralmente, essa imigração é uma continuidade, porque você já tinha outros parentes aqui. "Não, você vem porque é bom. É muito melhor do que você ficar aí." E com isso então, eles acabaram mudando pra cá.
P/1 - Eles já estavam casados?
R - Já estavam casados.
P/1 - No Líbano, o que o seu pai fazia?
R - Na verdade, a cidade, pra dar mais ou menos, pra vocês poderem entender, a cidade onde eles moravam, era uma cidade pequena. Na verdade, era um vilarejo. Porque o Líbano tem 200 km de extensão, pra vocês terem uma idéia. Que o país inteiro tem 200 km de extensão, por 50 de largura. Quer dizer, é um país praticamente pequeno. Eles moravam próximos à capital. Porque se você pegar Beirute, que é a capital do Líbano, você tem ali 54 km. você saindo fora da parte litoral do Líbano, é só montanhas. Então, eles moravam em vilarejos, praticamente na montanha. O que eles faziam? Cultivavam. Esse era o trabalho, na época. Porque você no Líbano, naquela época, e ainda hoje, você tem seis meses de inverno. De inverno pesado, que você não sai nem de casa. Então, o que você faz. Nos outros seis meses, você produz, armazena, pra conseguir sobreviver os outros seis meses. Isso aí, tem um pouco ainda até hoje disso tudo. Porque, realmente, não é uma cidade é um vilarejo. Uma cidade pequena. Não sei nem quantos habitantes hoje tem a cidade de onde eles vieram. Mas, é uma cidade pequena. Onde todo mundo, praticamente eram parentes. Que era primo, era netos, então, cidade bem pequena. Ele fazia lavoura.
P/1 - Como se chama?
R - Chama Cobet Anafar. É difícil de pronunciar e não tem uma tradução pra dizer pra vocês é tal coisa. Diz que é uma cidade muito bonita, pequena, aliás. Ainda não fui, ainda.
P/1 - O senhor nasceu e cresceu em São Paulo?
R - Nasci em São Paulo, no Brás, no bairro. Moramos ali, alguns anos na rua Bresser, que era onde eu tinha nascido. Depois, nós mudamos então pra Rua 25, depois de alguns anos - isso não me recordo, não. Mudamos depois pra Rua 25 e depois, da 25, nós viemos então pra Rio Preto. Essa foi a minha parte de infância de São Paulo.
P/1 - São Paulo, o que lembra da cidade, nessa época?
R - Na verdade, pouca coisa, né? Você com nove anos, pouca coisa vai se lembrando. É lógico que você lembra da sua parte de infância, onde você brincava no local. Na verdade, nós morávamos numa espécie de vila. Que era muito comum em São Paulo. Era uma vila, onde moraram, tinham diversas casas e você morava ali na vila. Que eu tenha assim, lembrança, coisas que ficaram gravadas na minha cabeça sobre a minha infância, foi uma casa que tinha na Avenida . São João isto vocês não conhecem, não conheceram (risos) chamava-se Casa... Era uma casa de comida, mas só que chamavam de Automático. Porque, naquela época, veja bem há quantos anos isso faz, existia uma espécie de guichês, onde tinha divisórias, onde se colocava os sanduíches, entendeu? Tinha um visor de vidro, você introduzia 200 réis, naquela época, dentro do dispositivo e descia o sanduíche pra você comer. Então, isso me recordo bem. E era uma inovação muito grande na época, porque já era uma automação, que nós não tínhamos, né? Com certeza, 36, 37 não tinha essa automação. Foi um pessoal que vinha de fora, montaram; teve um grande sucesso na época, depois acabou fechando. Isso eu lembro. Lembro das ruas. Lembro da Avenida São João da época. A parte do Mercadão, que era uma coisa comum. Que você morava na 25, estava muito próximo, a gente circundava por ali. Então, são poucas assim as lembranças daquela idade.
P/1 - A Rua 25, onde vocês moravam exatamente? Como era?
R - É como está hoje. Era um sobrado e nós morávamos, na verdade, nós morávamos numa rua transversal e a casa de comércio é que ficava num sobrado; você tinha que subir escada, então tinha diversas lojas de atacado. Uma daquelas lojas era do meu pai.
P/1 - Seu pai comerciava o quê?
R - Armarinho. É o mascate. Era o armarinho, era a mercadoria que se vendia, naquela época. Porque o armarinho era uma coisa que tinha necessidade, então você se expandia nisso, né? Como hoje, se você conhece bem a 25, não perdeu muito não. Continua da mesma forma.
P/1 - Que linha de produto?
R - O armarinho, era linha em carretel, eu não me recordo se tinha roupa, tecido não era mais o armarinho, botão, viés... Deixa eu me recordar mais alguma coisa aqui. Renda. O que hoje ainda as lojas, que nós chamamos loja de armarinho, mantém. Onde você precisa comprar um retrós, você tem que comprar um carretel de linha de cor, então era isso que se vendia. Grampos, agulha.
P/1 - Chegou a ajudar seu pai na loja?
R - Com a idade de nove anos, não. Idade de nove anos Você atrapalhava só.
P/2 - Estudava em algum lugar lá?
R - Eu não me recordo da escola. Eu estudava numa escola, que a gente chamava de Grupo Escolar, na época, que era bem próximo à Estação da Luz. Tinha uma escola ali, e ali fiquei até a mudança. Fiz ali acho que até o 3º ano, que, naquela época, nós chamávamos de 3º ano primário.
P/1 - Como era essa escola, as aulas, as matérias que mais chamavam a atenção?
R - Não. Eu não me recordo. Eu me recordo bem da fachada, que era uma fachada grande. A escola era dessas escolas que eram montadas como Grupos Escolares, na época. Era de uma fachada grande, sala grande, espaço. Mas, na verdade, recordo muito pouco da minha infância nessa parte escolar.
P/1 - E os amigos?
R - Também não me recordo, daquela época, nada. Nenhuma lembrança. Aliás, realmente, não sou muito bom de memória. Essa é uma das coisas que invejo muito essas pessoas que conseguem manter, reter na sua memória as coisas. Não é fácil.
P/1 - Bom, mas vamos lá. Aí, vocês vieram pra São José do Rio Preto...
R - Na verdade, era Rio Preto. Depois é que se transformou em São José do Rio Preto.
P/1 - Por que?
R - Não sei. Você tinha aqui, naquela época, porque você tinha a Paulista, era a Estrada de Ferro Paulista que vinha até Araraquara e de Araraquara, então, você ia pra Rio Preto com outra linha, com outro trem. Nós fomos aí pra Rio Preto. Morando também no centro de Rio Preto, na Rua General Glicério, isso eu lembro. Na rua General Glicério, 555, que eram três números iguais. Essas coisas vocês retém. Tem hora que eu lembro de certas coisas e tem hora que não lembro. Se você me perguntar de amigos em Rio Preto, não me recordo. Não me recordo, mesmo. Mas, Rio Preto, ficamos pouco tempo, dois anos. A gente... Era um local que estava em desenvolvimento; realmente a cidade está aí mostrando que ela desenvolveu bem. Uma cidade que, praticamente, quando nós mudamos pra lá, hoje é onde é a Andaló, que é a avenida expressa de São José do Rio Preto, era um rio. Nós íamos jogar futebol lá em baixo. Então, você vê que era um início realmente São José do Rio Preto. Mesmo Araraquara não estava em grande desenvolvimento, não. Tanto é que nós saltamos Araraquara, porque a intenção do meu pai era desenvolver um trabalho com aquela venda de armarinhos, aquela coisa todo. Então: "Vamos pra Rio Preto, porque lá dá pra mascatear." Quanto maior era a dificuldade de locomoção pra São Paulo, mais chance você tinha de vender. Porque pra chegar a mercadoria, naquela época, não era só Rio Preto, você tinha Mirassol, você tinha cidades além, que eram vilarejos também, então, era uma forma de você carregar essa mercadoria de São Paulo pra Rio Preto e lá, distribuir. Era uma espécie de distribuição. Porque o mascate era, nada mais nada menos, que o próprio distribuidor, né? Só que ele ia batendo de porta em porta. A gente chamava que o árabe tinha o braço fixo, porque muita gente vendia gravata, então pendurava as gravatas e era chamado de braço fixo, pra chegar nas casas, bater e vender. A gravata na mão. E carregava aquelas malas enormes, então quando você tinha uma condução... Meu pai ainda em Rio Preto ainda tinha uma condução. Mas tem muito mascate, que até hoje ainda, carregam aquelas malas pesadíssimas e vão chegando nas casas, batendo. E todo mundo recebia. Hoje acho um pouco mais difícil. Mas antigamente, todo mundo recebia. Porque precisava da mercadoria, então queria saber quais eram as novidades, o que estava sendo feito, quais eram os lançamentos. Principalmente renda, essas coisas, que havia uma procura muito grande. Linhas diferentes, viés, que era uma coisa que às vezes você não encontrava no mercado. Então, era a função dele, era distribuir essa mercadoria em Rio Preto e adjacência, que não era só Rio Preto.
P/1 – Como que era essa mala? Abrindo, o que tinha? Como era organizada?
R - Na verdade, eram malas... Deixa ver se me recordo. Você faz uma pergunta que também, nunca, você se preocupa tanto com esses detalhes, né? Eram malas, eram as maiores que tinham naquela época, eram malas altas, porque pra poder transportar. Porque os retrozes, na verdade, eles vinham em caixinhas retangulares; então, eram empilhadas. As rendas vem todas, em alguns casos, que vendia por metro, você... eles faziam, cortavam o papelão com um formato, com cortes na ponta do papelão, pra que você pudesse enrolar a renda naquele posição e fixava com alfinete. E dali você, então, mostrava o tipo da renda. As rendas eram todas colocadas, agulhas, por exemplo. Vinha muita agulha, que eram todas importadas da Alemanha, naquela época, as agulhas, né? Agulhas pra máquina de costura, agulha pra costurar, agulha de tricô, agulha de crochê. Eram todas essas miudezas que compunham todas essa mala. Você tinha que ter de tudo, você tinha que levar consigo tudo. Porque você não podia fazer aquela viagem até a casa do cliente e dizer: "Bom, não tenho." O que fazia era o seguinte " Hoje, não tenho mais. Mas vou observar e te trago na semana que vem, quando chegar. “ E assim era feito. A composição dessas malas era só de armarinhos, era só essa mercadoria. E renda tinha muito, tinha muito tipo de renda. Renda, você tem renda , vocês que são mulheres conhecem, são rendas estreitas, que às vezes, pra processo de acabamento, tinha rendas largas, pra mesa, entendeu. Tinha rendas de linho. Eu já nem sei hoje mais se ainda existe isso. Mas, naquele tempo, vinha rendas da Suíça, umas rendas largas, de linho, muito bonito, muito bem feita. Eu tenho lembrança assim, toda ela composta assim. Não esquecendo que a gente tinha 10 anos, você queria era brincar, você não queria saber do que ele estava fazendo. Você queria saber, você não queria saber os problemas que ele tinha; se ele tinha ou não tinha problemas. Você estava é querendo... Mas se você estava com curiosidade, a composição toda era essa daí mesmo. Como não trabalhava com tecido, porque se trabalhasse com tecido você teria maior volume. Mas trabalhava só com a miudeza mesmo, só com essas coisas do dia - a - dia de casa. Não vendia... Perfumaria, tinha alguma coisa também, naquela época, é brilhantina... É porque eram vidrinhos pequenos, e não, não ocupava muito espaço. Mas era isso aí, a composição era essa.
P/1 - Ele ia com duas malas?
R - Com duas malas. Em Rio Preto... Porque, em São Paulo, não lembro muito da parte que ele mascateou, me lembro mais na hora em que ele já começou a trabalhar com a loja dentro da rua 25. Isso me lembro bem, a gente subia aquela escada. Subia aquela escada, então você lembra bem da subida da escada. Aquelas coisas que o pessoal fazia ali, naquele momento. Mas já, em Rio Preto, ele já tinha um Ford 36, então, ele fazia locomoção. Eles colocava as malas no carro e se locomovia com o carro pra poder fazer essa distribuição. Então, carregar mesmo, carregar, eu não me recordo.
P/1 – Disse que não lembra de nada dos amigos, das brincadeiras....
R - Não, não lembro. Lembro de alguma coisa no Grupo, que a gente, fiz ali, eu continuei meus estudos ali.
P/1 - Por onde vocês andavam em Rio Preto?
R - Nós morávamos no centro, não tinha muita opção. Porque quando você mora no centro, sua opção é centro. Tudo que existia era ali naquela área. Em frente, praticamente, ao local onde eu morava, tinha uma padaria grande, que se chamava Padaria União, naquela época. Que era atravessar a rua pra você comprar bala. Porque, criança, você queria comprar bala, comprar pão. Nós jogávamos futebol, como eu disse na Andaló, que era rio, ali era um campo vazio, então nós íamos jogar futebol. Na escola, não lembro nada que eu tenha gravado. Não tenho realmente muita coisa da escola, não.
P/2 - Como era a sua casa em Rio Preto?
R - Em Rio Preto era uma casa no centro da cidade. Porque, hoje, a General Glicério, como naquela época era rua comercial, então era uma casa que nós alugamos. Era uma casa grande, só que estava dividida. Tinham dois moradores na frente, nós morávamos numa das casas e o dono da casa morava nos fundos. Eles alugavam as duas da frente e nós morávamos numa dessas casas. Era uma casa humilde, simples, não tinha nada de anormal. Tipo de casa de fachada na frente bem paralela, não tinha recuo, não tinha nada. Aquelas coisas que se fazia antigamente se fazia, que dá pra montar, aproveita o máximo que você pode do terreno. É isso que nós tínhamos. Nós tínhamos até uma hortazinha, ainda dava, como havia o intervalo, as duas casas eram pra frente pra rua e eles moravam no fundo, o dono da casa, então, no meio dessas três casas você tinha uma horta, você criava galinha, né? Rio Preto é uma coisa que ainda me recordo, porque a gente transportava, isso é uma coisa muito interessante, água, a água potável ainda não existia, só existia água de poço. Nós tínhamos carrinho, carrinho feito de caixote, que tinha ir buscar onde tinha poço de água, nós íamos buscar água lá, pra poder tomar. Porque a água potável era muito ruim, naquela época. Aliás, nem tinha. Essa parte da feira, por exemplo, a gente fazia isso de manhã. Saía com a minha mãe, com o carrinho na mão, pra trazer, naquela época, a compra que ela efetuava, então vinha e trazia, depois voltava pra buscar a água. O que me recordo um pouco de Rio Preto, próximo à minha casa tinha um jornal da cidade, que agora não me recordo bem o nome do jornal. Ao lado, era um corredor pra você entrar, e era ao lado da feira. Então, ao lado da feira que fritava pastéis; era festa você ir pra feira, ir comer o pastel e pra trazer depois a carga que você comprava.
P/1 –Dos costumes da família, ficou alguma coisa do Líbano?
R - Não. Minha mãe sempre foi uma mulher que sempre gostou de cozinha e o árabe, a mulher árabe principalmente, era uma mulher muito dedicada ao homem. Ela aprendeu, é uma educação que vem vindo. Ela, na realidade, faz tudo o que for possível. em benefício da família e, principalmente ao marido. Hoje, não sei, mudou um pouquinho, mas não quero contar do momento pra num prejudicar o seu raciocínio. Estou dizendo, porque a minha senhora teve agora no Líbano, ela voltou agora, fazem alguns dias. Mas, a rigidez de educação, continua do mesmo jeito. Eles eram muito... principalmente os homens, né? É uma condição que acho que vem vindo de muitos anos atrás. Então, o domínio, o machismo masculino é muito grande e continua, o pior é isso. Então, a minha mãe era uma mulher muito devotada, era uma mulher que não tinha nenhuma ambição. Ambição que eu digo, é lógico de melhorar de vida sim, mas nunca teve a vaidade, sempre se... A vida dela era dedicar à mim, principalmente que era o único filho, que ela achava que eu seria o primeiro depois do marido. A minha mãe, na verdade, ela me idolatrava. Essa é a verdade. Ao ponto, isso não teve formas, enquanto ela teve vida, ela sempre mostrou que a preferência era sempre minha, em qualquer condição. Tudo que era feito, primeiro era pra mim, depois era pros outros. Ela tinha uma coisa muito curiosa, isso aconteceu mais aqui em Araraquara, a minha mãe sempre se preocupava com essa questão de saúde. Então, pra ir à escola, naturalmente, dentro daquela condição que nós tínhamos financeiramente, você tinha que... Ela já ligava cedo a chapa, que era mais ou menos elétrica, naquela época, ou no fogão de lenha, e fazia logo cedo, a primeira coisa que ela fazia, ela fazia os bifes, chapeava os bifes, punha no meio do pão: " Você não vai embora sem comer." Isso ficou muitos e muitos anos.
P/1 - Logo cedo?
R - Isso ficou muitos anos assim. Muitos anos. Isso ela se preocupava. Tinha que ser cedo sim, antes de ir pra escola você tinha que comer. Era uma coisa muito curiosa. Ela tinha uma devoção, muita devoção. Era uma preocupação, minha mãe era assim. Os costumes eram esses. Comida em casa era toda comida árabe, que ela fazia, né? Em casa nunca teve comida repetida, por exemplo. Minha mãe não fazia, por exemplo, como hoje o arroz e o feijão. Tem pessoas que se não tiver o arroz e o feijão, não come. Lá em casa nunca teve o arroz e o feijão dois dias. Fazia uma vez por semana, o resto tinha que fazer outras comidas, que eram comidas substanciais também. Apesar que o arroz e o feijão eram excelentes, um excelente alimento.
P/1 - Ela fazia mais comida brasileira?
R - Não. Mais comida árabe. O árabe tem comidas... você pode observar que é diferente de toda a alimentação. você vai pra uma mesa, os paladares de comida são diferentes uma da outra, sabe. você vai comer, por exemplo, quibe cru. Você tem o quê na parte de frios? Você tem o tabule. É totalmente diferente. Um homus, que é um grão de bico, por exemplo. São comidas diferentes. Você vai pra comida daqui, você tem uma série de comida. Principalmente que o árabe usa muito o trigo. O trigo grosso, que noa é o que faz o quibe, é um trigo mais grosso. Eles fazem muita comida com o trigo grosso. O arroz também não é muito usado, é mais o trigo. Árabe usa demais...
P/1 – Retomando, estava falando da mãe, da dedicação da mulher. Quais as comidas que ela fazia?
R - Charuto de folha de uvo, charuto de repolho, frango. O árabe, faz muito um frango recheado com arroz, usando um miúdo do frango. Então, pegava todo o miúdo picava, refogava, quer dizer, misturava com arroz, abria por de trás o frango e recheava com aquele arroz e depois levava ao forno. Esses era um dos pratos, que quase todo domingo, era o prato que tinha na mesa. Não era só comida árabe, também fazia um pouco da comida italiana. Porque minha mãe gostava muito de fazer o macarrão, entendeu. Principalmente o macarrão de forno. Então, até hoje, eu tenho lembranças da minha mãe, todos da minha casa hoje, que conviveram com ela, não esquece da comida, não. Ela cozinhava muito bem, muito bem. Fazia charuto, frango, trigo grosso com carne, trigo com frango. O árabe tem uma séria de comidas que vocês não conhecem; como quiche, que é uma salada, é uma sopa de coalhada. Usa muito a coalhada pra tudo, né? O árabe usa no lugar da manteiga, usa coalhada. Passam no pão, por exemplo, torra, tosta. É diário. Até hoje a gente só com isso de manha. Até meus netos, hoje, comem exatamente, chegam, faz seu pão, coloca coalhada, põe um pouco de azeite, põe no forninho, deixa torrar e quilo é o café da manhã. Que realmente é muito bom pra saúde por causa da coalhada. Tudo isso ficou, até hoje existe a lembrança de todos da comida que a minha mãe fazia. Realmente ela cozinhava bem. Com isso, depois quando me casei, a minha senhora também praticamente aprendeu tudo com ela. Tanto é que ela hoje, a minha mulher é uma excelente cozinheira. Mas continua aquela mesma dedicação que eu disse no início. Isso é grande.
P/1 - Ela é de que origem?
R - Ela é libanesa.
P/1 - Como ela se chama?
R - Isabele.
P/1 - Aí, em 40, vocês vieram...
R - 41. Não, 41 pra Araraquara. Nós chegamos em 41 aqui em Araraquara, eu tinha um tio, irmão da minha mãe, que tinha uma loja de tecido, vendia tecido no varejo, exatamente no centro da cidade também, na 9 de Julho. Era uma casa muito grande, nós viemos ficamos hospedados junto, que a minha avó ainda era viva, a mãe da minha mãe, e morava junto com esse meu tio. Nós ficamos hospedados lá, até em que o meu pai se estabeleceu com uma loja de meias. Voltando um pouquinho, eu estava me referindo na questão da miudeza, vendia-se muita meia, naquela época. Então, também eles vendiam. E, quando ele veio pra Araraquara, ele resolveu montar uma casa que se chamava Feira das Meias. Aí, é que ele se instalou nessa loja, que também ficava no centro, que hoje ainda tenho a lanchonete. Ele se instalou com essa casa, que vendia só meia, no começo. Depois começou com calçado e camisas, foi mesclando mais de acordo com a necessidade do mercado. Mas, nós nos instalamos lá em 41, mesmo. Não me recordo bem o mês. Mas, nós alugamos essa casa, que era uma casa muito grande e tinha um salão na frente, e passamos a residir no fundo da loja. Se adaptando. Ficamos muitos anos ali, muitos anos nós ficamos ali. Agora, em Araraquara a gente lembra um pouquinho mais das coisas, porque aí já estava com 11 anos, vai se recordando de mais, de muita coisa, né? Dando continuidade, ele se instalou com a loja. Em frente à loja tinha um clube, que hoje já não existe mais, quer dizer, o clube existe, mas naquela época ele estava bem enfrente, que o Clube 27 de Outubro, que ficava ali. Todo o centro, todo o comércio era em redor ali, era bem o miolo da cidade. Araraquara também tinha um, como Rio Preto, nós encontramos só centralizada como estava, Araraquara também tinha, poucas ruas, calçadas na verdade. É que vocês não conhecem, mas praticamente quando nós viemos morar aqui, a Rua 9 de julho, que é a rua principal, ia até aonde hoje está o Sé. Quer dizer, pra cima tinha casas, mas não tinha calçamento, aquela coisa. Pra você ter uma idéia que você ficava ali, ficava concentrado no centro da cidade. Ali passei, praticamente, esse resto de infância. Freqüentando ali, o clube o tempo todo, porque o clube estava em frente. Tudo quase em Araraquara acabou originando naquele pedaço, quase. Araraquara tinha, hoje tem a casa, mas lá não é a mesma coisa. Naquela época, isso me recordo bem, tinha duas casas dentro do Interior do Estado de São Paulo, que era departamentais. Uma delas era a Casa Bueno em Rio Preto, que essa me recordo bem também, que não mencionamos. A outra era a Casa Barbieri aqui. Eram duas lojas departamentais, que isso era coisa difícil de você encontrar. Chegamos aqui, a Casa Barbieri predominava, ocupava uma área muito grande. Ocupava, praticamente meia quadra, com lojas de tudo, desde calçado, ela tinha móveis, louças, então tinha de tudo. Era uma loja completa e que atraía muita gente. Eles tinham, criança não esquece essas coisas, então, chegava no mês de dezembro, você tinha que ver a montagem do presépio que eram feita nas vitrines. Eram vitrines enormes, então aqueles trenzinhos andando, que aquilo atraía. Eles tinham muito movimento e atraíam muita gente, naquela época... Vou lembrando devagar.
P/1 - Ótimo. Onde estudou, quando veio pra cá? Logo que mudou o senhor foi pra escola?
R - Já fui pra escola. Isso não tem outra forma, você vai pra escola. Aí passei a estudar lá no Florestano Libuti. E ali é que fiz a parte do primário. Depois, tinha que trabalhar. Eu comecei a trabalhar na casa do meu tio. Eu tinha um outro tio, que não é esse que nós abordamos. Eu tinha um tio que tinha uma loja de armarinho. Então, agora nós vamos voltar pro armarinho de novo. Meu pai ficou com a loja...
P/1 - Com a Feira das Meias...
R - Com a Feira das Meias, e fui trabalhar com meu tio. Meu tio chamava-se Demétrio. No Líbano, ele era um professor, tinha uma certa cultura. Não sei se ele veio antes do meu pai ou não, mas, só vim encontrá-los aqui em Araraquara, na verdade. E era um homem de uma dedicação, de uma cultura, orientador, um professor, né? É aquele que orientava a família inteira. Eu fui trabalhar nessa loja que chamava-se Casa Nenê. E vendia muitos produtos infantis, mas na verdade ele vendia era renda. Sabe, meadas de linha e então... E pra mim, ele foi uma escola. Ele foi uma escola, ele era um homem realmente bom orientador, sempre procurou... Severo com os filhos, mas era muito delicado, muito bom. Pra mim, foi uma das escolas que tive na minha vida, foi ele. Na parte econômica, na minha parte de incentivo ao estudo, ele era realmente um bom orientador. Aí fui trabalhar, eu tinha 13 anos. Pra vocês terem uma idéia da cultura desse meu tio que, naquela época você não era obrigado a registrar ninguém, existia o registro de empregado, mas ele fez absoluta questão de me registrar. Tanto é que o meu primeiro registro de trabalho aos 13 anos de idade. Com isso, a minha aposentadoria veio mais cedo, que eu atingi rapidamente 30 anos de trabalho. Passei um bom tempo dentro dessa loja, aprendendo de tudo. Porque ele era muito econômico, ele fazia você acreditar que você só podia ficar bem na sua vida através da própria economia. ele dizia: "Não adianta você ficar imaginando que você vai ganhar coisas absurdas. Você só vai ganhar com a sua própria economia." É uma história que, geralmente, eu conto dele e é muito interessante pra todos entenderem. Como se vendia muita miudeza, quando você pegava, o cliente pedia, por exemplo, agulha pra você. Então vinham umas cartelinhas pequenas de agulhas, todas enfiadas assim, 10 ou 12 agulhas enfiadinhas, e você ia mostrando. Aquilo era tão fino, que então, às vezes, escapava da sua mão, caia no chão, sabe. Essas coisas que ocorrem, depois você não acha mais. A bobina de papel ficava em cima do balcão, então, por exemplo, o cliente vinha pedia: "Quero um novelo de linha." Você pegava e vendia a meada de linha. A meada de linha era fininha, quer dizer, você dobrava ela no meio, ela ficava, o papel tinha 30 cm de largura, você ia perder o papel;. Então, você destacava o papel, cortava um pedaço, porque se não ficava muito papel, desagradável até no embrulho, você embrulhava o papel e servia o cliente. O outro papel ficava pendurado. O próximo cliente comprava, por exemplo, dois novelos, então aquele pedaço não servia. Então, você arrancava aquele pedaço, jogava fora. E aquilo ia ser a continuidade de negócio. Quando chegava à tarde ele dizia: " Varre a loja." Você ia varrer a loja, antes de fechar, mais ou menos. Você varria, varria, na hora de recolher o lixo, ele dizia: "Péra um pouquinho, vamos examinar o lixo." Ia lá no lixo, era pedaço de papel, agulha no chão, alfinete, sabe. Ele separava tudo aquilo lá, deixava de lado, não dizia nada. No dia seguinte, ele dizia assim: "O primeiro freguês que entrar, eu vou servir." Tudo bem. Aí entrava um cliente comprava, sei lá, vamos dizer assim, uma meada, um carretel, um retrós, não importa. Vamos supor que, naquela época, fosse um valor, vamos dar um valor como temos hoje, era 70 centavos; então, tinha que dar um troco de 30. E a agulha custava, mais ou menos, 30 centavos. Ele dizia pro cliente: "Olha, não tenho troco, se o senhor não faz questão... Porque quem compra linha precisa da agulha. O senhor não faz questão de levar de troco uma agulha?" O valor naquela época era tão irrisório da agulha. "Ah, não, não tem importância." Então, ele chamava e dizia: "Venha cá." Pegava aquela agulha que ele pegou do lixo, pegava o papelzinho pequeno, introduzia, fechava o pacotinho, e dizia: "Olha, aqui está o seu troco." "Isso tudo é dinheiro," ele dizia. Entendeu? Então, eram esses exemplos que eram significativos pra quem vinha numa adolescência, aprendendo o que era a vida. Fora outros, né? Ele tinha uma capacidade fantástica de memória, ele tinha uma capacidade de cálculo. Ele calculava rapidamente. Tinha uma série de virtudes, foi uma escola. Então, fiquei alguns anos com ele. Posterior a isto, precisei estudar à noite. Eu não podia mais estudar durante o dia que eu precisava trabalhar. Que o negócio do meu pai dava, mas não dava o suficiente. Você tem que trabalhar, vamos trabalhar. Fui estudar na escola à noite, que era escola de Comércio, e durante o dia entrei no banco. Chamava-se Banco Paulista do Comércio, que já não existe mais. Entrei como contínuo, que era a função primeira, que você tinha que entrar num banco, né? Ali me dediquei muito pra conhecer um pouco. Trabalhei alguns anos, até atingir... Antigamente, eram cargos assim, você tinha o contínuo, que era o office-boy, hoje, praticamente, você tinha depois o escriturário, que era aquele que escriturava as coisas. Porque, naquela época, usava-se, na verdade o uso de máquina era pouco e a maioria era tudo manuscrito, à mão, ainda na época da tintinha de pena. Depois de ajudante de escriturário, pro escriturário, depois você vinha pra ser o vice - contador, o contador -que era essas funções que existiam antigamente, depois o gerente. Não me recordo mais quantos anos fiquei. Eu sei que fiquei alguns anos, até atingir, ia ser o sub-contador, quando resolvi não continuar mais no banco. Eu tinha alguns clientes, porque você mantém muito contato com o cliente e o cliente... Ah, eu tinha um contador, que aliás ainda até hoje ainda está vivo, chama-se Rubens de Barros,, que ficou muito amigo meu, ele era o contador da agência, a gente tinha muita amizade. E pra ajudar, às vezes, auxiliar no seu salário, fazíamos alguns serviços extras em casas comercias, pra ajudar a contabilidade. Aí me convidaram pra trabalhar numa loja, pra fazer a parte administrativa da loja. Era uma loja de móveis, chamava-se Móveis Castelan, não existe mais também. Eu trabalhei também algum tempo, alguns anos ali. Foi lançamento, praticamente no Brasil todo, do colchão de mola. Que antigamente só tínhamos colchão de algodão, de capim, colchão, né?
P/1 - Colchão de capim?
R - É frio. Capim que eu quero dizer, não, era uma palha, né? Eram palhas. Até hoje você encontra de palha. A gente chamava de capim, era palha, né? Então, a introdução, o Castelan era representante da Probel, então tinha que começar a intensificar a venda do colchão de mola. Nós fazíamos até venda de porta em porta. Eu acompanhava. Íamos lá, mostrávamos o colchão, ficava... Até que realmente se introduziu o colchão de mola. Foi batido realmente essa venda de colchão. Naquela época, vendeu-se bem. Aí começaram a aparecer outras marcas de colchão. Do Castelan, eu vim, tinha uma tia minha....
P/1 - Quantos anos tinha quando começou a trabalhar no Castelan?
R - Quando vim trabalhar no Castelan, devia ter uns 18 anos, aproximadamente, 18, 19 anos. Aí, tinha um tio meu que morava em São Carlos, tinha uma casa. Chamava-se Casa das Noivas. Ele vendia tudo que era pra noiva e vendia também alguma coisa de miudeza. Naquela época, era só miudeza. Mas era o forte dela, Casa das Noivas, ele tinha uma casa muito boa. Ele estava bem em São Carlos até. Eles resolveram, naquela época, não continuar mais com a loja. Resolveram mudar, toda a família estava aqui, então, resolveu mudar-se também aqui pra Araraquara. E a minha tia era uma boa comerciante. Ela era irmã da minha mãe. "Vamos montar uma loja de artigos infantis." Eu achei interessante. Eu já estava no mercado. Aí, acabamos montando uma loja que chamou-se A Infantil. Nessa loja, além, no começo, no início, foi todo com roupa infantil, recém - nascido. Que era uma coisa que também, os cueiros ainda, era época de cueiros Não tinha fralda descartável. Na época também foi a 1primeira loja, praticamente, estava no início da roupa feita. Campinas tinha montado até uma loja, agora se não me engano o nome era Ibis, que era fabricante de roupas pra senhoras, roupas feitas. Na época, você mandava fazer a roupa sob medida. Nós então passamos também a vender essas roupas. Então ficou da infantil acabou misturando pra adulto. Por você tinha que ir mesclando. Primeiro que a loja não ficava no centro, ela ficava um pouco mais afastada do centro, então você tinha que mesclar. Foi muito bem. Essa loja foi durante alguns anos, sobreviveu alguns anos, quando resolvi voltar trabalhar com o meu pai. Quer dizer, voltar não. Eu vim, porque o meu pai tinha ficado praticamente com a loja da mesma maneira que estava. Então resolvi, não gostava muito de trabalhar, porque aí, nessa altura meu pai estava, o forte maior dele não era mais a meia, mas era o calçado... Pode falar.
P/1 - Era uma coisa que tinha pra perguntar. Quando o senhor foi trabalhar com o seu tio, por que foi trabalhar com o tio e não com o seu pai do senhor? E qual o nome desse tio?
R - O meu tio chamava-se Afif Jabur e a minha tia chama-se Uadia Jabur. A questão é que ela me convidou, ela me fez o convite, e eu estava no Castelan na época, não perdão, não estava no Castelan na época, e achei que seria a forma de também desenvolver um mercado novo. Mas vi que o meu pai também estava parado e eu estava com a minha tia numa loja fora do centro. Eu tinha a loja no centro, onde deveria realmente desenvolver. Aí eu vim, porque nós tínhamos uma loja que tinha uns 6, 7 metros de frente e essa casa, na verdade ela tinha no início duas lojas, era uma casa só. Nós ocupávamos uma parte e a outra parte nós morávamos no fundo e ocupávamos praticamente como depósito. Aí, quando foi que nós resolvemos ampliar a loja com as duas partes juntas, aí vim trabalhar com o meu pai. Nós desenvolvemos realmente. Eu resolvi abrir aquilo, começamos a desenvolver. Talvez tivemos o maior movimento de calçados que tinha naquela época na cidade. Nós tínhamos um movimento muito grande. Que, até hoje, encontro com as pessoas, que são os meninos, que eram antigamente: "Poxa vida, quanto calçado comprei." Então vem aquela lembrança, né? Aliás, você fizeram entrevista com o Ivo, o Ivo é um dos elementos que até hoje ele lembra que o pai comprava todo calçado comigo, a mãe que acompanhava mais. Até hoje, todo mundo que comprava calcados comigo, que nós vendíamos à prazo, pagava quando queria, aquelas coisas todas que acontecia na época. Foram até 1961, aí a coisa começou a ficar... Sempre, mesmo durante a época do calçado, a situação financeira da empresa era muito difícil. Por que? Porque a gente trabalhava muito, naquela época o calçado ainda era carimbado. Vinha carimbado. Vinha um carimbo assim: "Até 100 reais." Sendo cruzeiros, né? Você não podia vender acima daquele valor. Não tinha muita inflação, mas você tinha o problema do crediário, demorava muito. E você não podia aumentar um centavo daquele valor que estava no calçado. Isso sacrificava todo o seu lucro. Você tem que desenvolver, você tem que vender fiado. O comerciante em si, ele tem uma ganância de vender, ele esquece que ele precisa do dinheiro, depois. Então, meu pai facilitava muito nessa questão. Você ia observar as anotações, você não acreditava, né? Você lia a notação, ele escrevia em árabe, era pior ainda, porque não sabia ler. "O que é que é isso aqui? Quem é esse cliente?" " Esse cliente aqui é o seguinte, aquela moça que tem aquela trança assim, assado, aquela manca quando anda." Então, era essa as observações que se faziam dos clientes. Porque ele, ou de vergonha de perguntar o nome ou de qualquer, então aí ele ia anotando aquelas observações. E assim, em 61, o meu crediário era quase quatro vezes maior do que o estoque que tinha de mercadoria. Aí falei: "Eu preciso dar uma guinada. Isso aqui não pode ficar desse jeito." Você não conseguia receber, porque era difícil. Quando o cliente devia pra você 100, 200, 500 cruzeiros, ele chegava na sua casa pagava metade e levava o dobro. Então, a sua tendência era de girar realmente um volume muito alto. Havia carência, naquela época, de ter uma casa de alimentação. Ninguém, não tinha nenhuma casa de alimentação na Rua 9 de Julho. Tinha alguma na Rua São Bento, que era por causa do cinema, que funcionava o cinema. Então, o cinema, naturalmente acabava a seção, naquela época, todo mundo ia ao cinema, não tinha televisão. Todo mundo ia pro cinema, do cinema, que era o local onde as moças colocavam a roupa do domingo, pra se apresentarem; era o footing lá fora. Então, todo o movimento de alimentação ficava na São Bento. Aí, resolvi montar então a lanchonete.
P/2 - O senhor que teve a idéia?
R - Sim. E aí, começaram a me chamar de louco, né? "Você é um louco" E acabei montando. Deixei a loja funcionando de um lado e do outro lado montei a lanchonete. Enquanto isso, eu ia liquidando com um e continuando o outro, até que encerrei as atividades. Que inaugurei a lanchonete em dezembro de 61, e acho que logo em 62 eu encerrei as atividades da Feira das Meias.
P/1 - Continuou com esse nome até fechar?
R - Continuou com esse nome até fechar, até o encerramento. Ela contou que era um nome fantasia. Aí, montei no começo a Quibelândia, porque tinha, em São Paulo apareceu a primeira casa árabe. Não, não é a primeira, porque existiam casas mais antigas árabes ali na 25 de março.
P/1 - Quais eram essas da 25?
R - Da 25 de março? Tinha Casa da Vitória, era a dona, ela chamava-se Vitória. Aliás, ela é até hoje famosa. Ela não está mais lá, mas ela até hoje tem, ela já faleceu. Tinham algumas outras casas, mas que estavam ali sabe, situado, porque ali era o núcleo do árabes. Então, toda a comida era feita ali na 25. Tinham muitos restaurantes pequenos, que não me recordo de nome não. A Casa Vitória eu lembro, porque a Vitória ficou famosa. Todo mundo ia a São Paulo, tinha que comer na Vitória. Quando resolvi montar a lanchonete, montava em São Paulo, um grupo montou na Av. São João a Kibelândia. E achei interessante, não montei por causa deles, a minha intenção era montar realmente. E eu falei: "É bonito." Kibelândia, Kibelanche e não Kibelândia. E ficou até hoje. A Kibelândia de São Paulo acabou, mas nós continuamos.(risos)
P/1 - Posso voltar um pouquinho antes do senhor continuar falando da Kibelanche? E os amigos na sua juventude, onde ia quando tinha seus 18, 19 anos? Como era?
R - Eu tive muitos amigos. Eu até não gostaria de numerar, porque sou capaz, a minha memória, às vezes, me trai nessa hora, sabe. Às vezes, não gostaria, porque ia deixar... Porque eu tinha muitos amigos. A gente freqüentava muito ali os clubes, então tinha muitos amigos, muitos amigos realmente. Eu participei muito de todas as atividades. Principalmente aqui em Araraquara, tinha um clube de basquete que levava o nome de Nosso Clube. A gente participou muito. Então era muita gente, que era muito amigo. Jogávamos basquete juntos. E são inúmeros, na verdade, se for enumerar, tenho muito e vou esquecer de alguém e alguém vai ficar constrangido, e vai dizer, "Poxa vida, fui amigo dele e ele não se lembrou de mim." Mas, por causa dessa minha memória, sabe. Não é porque é nada não, mais por causa da minha memória. Tenho certeza que vou esquecer, talvez até de pessoa muito ligada à mim. tenho muita, eu tenho na verdade muita amizade, muitas amizades. Gosto de todos. Eu dificilmente posso considerar que eu tenha uma pessoa que não me dê, que não, não tenho. Procuro até não passar por isso. Eu acho que eu, gostaria, tenho muitos. Eu participei em basquete, futebol de salão. Praticamente em Araraquara teve a primeira Associação de Futebol de Salão e participei. Basquete, que era uma rivalidade tremenda, naquela época, a gente participou muito.
P/1 - O senhor jogava futebol de salão?
R - Não. Futebol joguei pouco, basquete sim, basquete sempre jogou. Treinei equipes, naquela época, também. Mais essa parte... Toda vez que fui chamado pra ajudar na parte esportiva, sempre estava presente. Eu sempre gostei, sempre participei. A gente sempre participou de tudo, de todas as atividades. Não, só a parte o futebol profissional, esse esporte eu nunca quis participar.
P/1 - A hora em que a gente parou pra beber uma água, o senhor falou que freqüentou o cassino.
R - Em 45.
P/1 - 45.
R - Não é que freqüentei cassino. Na verdade, eu tinha 15 anos. Só que tinha bigode, com 15 anos tinha bigode, tinha a aparência. E você sabe como que é essa adolescência, então você queria ser sempre o homem. Hoje você quer ser criança, mas antes você queria ser homem. Meu tio, esse tio, que quando nós mudamos de Rio Preto, chamava Adib, quando ele fechou a loja dele, que ele vendeu a loja dele aqui em Araraquara, ele tinha o irmão dele, que era meu tio também, o Salim, e eles fizeram uma sociedade pra montar uma indústria de vinho, em Poços de Caldas. Aquela época o vinho estava, sabe. Você via aquele vinho de Poços de Caldas. E eles então, resolveram montar. Na época em que eu estava no banco, o gerente do banco ele tinha uma linha de ônibus que fazia Araraquara-Poços de Caldas. Então, meu tio mudou-se pra Poços, pra tocar essa indústria com ele. Em 45, alguns meses antes dos fechamentos dos Cassinos, fui a Poços de Caldas, na época do Carnaval. Acho que uma semana, duas semanas antes do Carnaval. Depois, meu tio era casado com uma senhora, que, hoje, ela está ainda, ela continua em Poços de Caldas, chamava-se Maria. E o irmão dela queria ir pra Poços, mas eu fui na frente. Eu fui pra passar o Carnaval na verdade. A í foram os irmãos e tal. E foi numa época, nós estávamos em fim de guerra, 45 foi fim de guerra, aí fui conhecer os Cassinos, né? Freqüentei a Urca, freqüentei o Palace Hotel, freqüentei o Quitandinha, o Quississana, que não era o Quitandinha, que era um outro. Você tinha, o Cassino tinha tanto no Quississana, como na Urca, como no Palace. Acho que Poços de Caldas tinha seis ou sete cassinos. Eu conheci, porque freqüentei, participei, joguei. Embora não tivesse idade, havia uma proibição, mas a gente sempre acabava infiltrando e acabava realizando. Realmente, era um desespero às vezes, porque você via perder fortunas. Eu cheguei a assistir, presenciar, uma família chegar num dia e no dia seguinte ir embora, porque tinha perdido tudo. Isso ocorria sempre. Porque se você não tinha... Só como fato pitoresco do cassino, é que tinha um senhor, já faleceu, aqui de Araraquara, que era muito amigo do meu tio, ele foi também. Aliás ele foi pra Poços de Caldas, não pra passar o carnaval, mas sim pra jogar no casino. E me recordo bem que quando chegou, meu tio disse assim: " Quanto você trouxe de dinheiro." " Uns 500 cruzeiros, deve ser mais ou menos isso, 500 mil, não sei. Ele falou assim, meu tio falou pra ele assim: "Daqui o dinheiro pra mim." "Não, não." "Daqui o dinheiro pra mim." "Não, não vou." "Me dá aquilo dinheiro, vou dirigir o seu dinheiro. Que conheço isso aqui, já sei o que vai acontecer." Aí falou pra ele assim: "Você leva 50 hoje, só. Você vai lá e joga. Acabou, acabou! Amanhã você tem mais dinheiro, se não você vai acabar torrando tudo." Eu me recordo que isso deve ter sido no carnaval, começava no sábado, isso deve ter sido quinta-feira. Quinta-feira perdeu os 50. No dia seguinte ele estava bravo: "Você me deixou sem dinheiro. Onde já se viu?!! Daqui meu dinheiro!" "Não vou dar. Eu vou te dar mais 50 hoje." E deu os 50 e perdeu os 50. Quando foi no sábado, nós fomos naturalmente ao salão. Ele desceu pra jogar, porque o cassino ficava no mesmo lugar. O baile era feito no mesmo lugar onde tinha o cassino. Ele deu uma maré de sorte, que a partir de sábado. Sábado, domingo e segunda ele ganhou uma fortuna. Então, chegaram, naquela época o uísque que existia no mercado importado era o Cavalo Branco, que era um uísque conhecido, ele tomou um banho no meio do salão com uísque Cavalo Branco. Pra vocês terem uma idéia do que ele tinha ganho. Olha, tinham pessoas muito ricas, o cassino era freqüentado... Mas a nossa mesa, eles traziam o confete a serpentina. Vinha saco de confete e caixas de serpentina e uísque em cima rolando à vontade. Isso foi as quatro noites. Vê como é que são as coisas. Eu estou passando só pra você ver como é que é o cassino, pode dar e pode não dar, né? Eu vi um japonês saindo, fiquei muito triste, com a família inteira ele carregou e foi embora. Esse é o cassino. cassino é bom, mas só como... Porque, na verdade, tem pessoas que não tem controle em jogo, sabe. Eu, por exemplo, tenho um autocontrole fantástico em jogo. Ninguém me faz eu jogar dinheiro, em jogo não. Eu acho que é muito perigoso, muito perigoso. Se você não tiver controle, você perde muito dinheiro. Você queria saber cassino, taí. O que você quer lembrar mais? Vamos fazer um retro... Você terão que me lembrar, porque é muita coisa realmente no passado.
P/1 - Voltando lá pro Kibelanche, todo mundo achou uma loucura, tudo. Onde montou?
R - No mesmo local, onde eu tinha. Eu falei, nós tínhamos dois salões, que nós usávamos como depósito, mudamos a loja pra lá e na outra então, nós reformamos e fizemos a lanchonete. Fechamos, abrimos, abrimos uma parede no meio. E assim ela começou.
P/1 - Como que era o visual?
R - Naquela época, o tipo de lanchonete, era tipo ferradura, que estava em moda. Você colocar os banquinhos, não tinha cadeira e mesa, você só tinha cadeirote, onde o pessoal ficava sentado e comia de frente pro balcão. Aquela época era coqueluche.
P/1 - Como era o balcão?
R - Balcão tudo em fórmica. Já estava na fase da fórmica, ainda né? Fórmica, um pouco de aço. Ai nós fizemos, tudo também foi mais ou menos improvisado, porque noa tinha capital. Nós, no fundo, fizemos... nesse período que montei, ainda nós morávamos lá no fundo, então tivemos que adaptar, adaptar a cozinha. E a minha mãe ainda , ela que fritava, ela que fazia as esfihas e ali. Meu pai ficava mais na frente, no caixa. Nessa altura, já estava em 61. É, já estava casado. Isso me recordo, porque o meu neto, o meu filho mais velho, ficava com o meu pai no caixa. Ficava com o meu pai no caixa. Ali começou e nós tocamos aí. Tinha muito movimento, porque o 27, o Clube era na frente e nós ficávamos, o dia que tinha baile, não se fechavam as portas. Você ficava até as 6 horas da manha e já no dia seguinte você tinha estar aberto já por causa do comércio. Então, foi uma vida bem sacrificada.
P/1 - Qual o horário de funcionamento em dias normais?
R - Dias normais, abria. Meu pai abria 6:30 da manhã e fechamento era meia noite, não antes. Era uma época que tinha muito movimento, né? Porque o Clube sempre movimentava muito o Clube. O Clube era muito aberto e tinha sempre jogos de ping- pong, havia muita freqüência. Era um Clube da classe média, então havia uma freqüência muito grande. E é talvez um dos clubes que às vezes eu comento que, nos clubes de hoje, às vezes faço esse comentário, tem clubes aqui em Araraquara, que na verdade você só pode entrar como sócio na hora que a atividade está aberta. Tem uma atividade, hoje, um baile, tem lá um conjunto tocando, então você pode entrar. Se for durante o dia no clube você não entra, está tudo fechado. E o 27 não. Como o 27 estava numa rua comercial, todo mundo entrava e saía sócio e não-sócio. Tinha ping-pong lá dentro, fazia um ponto ali, porque era tudo comercial, então tudo valia. Podia parar paralelo à rua, a porta era porta de entrada, você já estava dentro do Clube, então, era uma freqüência fantástica. E com isso, foi um movimento razoavelmente bom pra nós. Deu um salto na minha vida, porque na verdade a gente faturou naquela época, valia a pena, o sacrifício era grande, mas valeu a pena. A ponto a tal que nós tivemos que mudar, nós não podíamos mais ficar lá porque eu não tinha mais como criar meus filhos. Porque era tudo junto, era tudo misturado. Aí nós tivemos que mudar e ampliar depois. E fomos ampliando, o mercado cresceu, nós crescemos junto com o mercado e continuamos. Nós já estamos com a casa desde 61, são 38 anos. Ela vai fazer 38 anos agora em dezembro.
P/1 – Senhor Aparecido, não sei se tem a ver, mas as receitas da sua mãe foram utilizadas?
R – Tudo. Tudo, tudo.
P/1 – Como fez?
R – Eu acompanhava. Fazia tudo com eles. Fazíamos tudo com ela, ela praticamente deixou, ensinou tudo a minha senhora. E a minha senhora tem uma facilidade. Ninguém aprende se não tiver, naturalmente aptidão para aquilo. E a minha senhora tem essa aptidão. E é a única que consegue atingir a mesma qualidade que a minha mãe atingia, ela consegue realmente atingir. Aprendeu fácil, acompanhou, nós estávamos junto. Deixa eu contar uma passagem que talvez vocês nem vão me perguntar porque não sabem. Na verdade, a minha senhora é minha prima, prima irmã. A mãe dela é irmã do meu pai. Acontece que eles estavam no Líbano, a mãe dela aproximadamente, acho que com 30 e poucos anos, ela veio a falecer. Então, eles tinham três filhas, meu sogro tinha três filhas. Naquela época, meu pai, com o falecimento da irmã, vai deixar as filhas lá, vai ter problema. O meu sogro, moço ainda, naturalmente ele vai querer casar, como isso realmente ocorreu. Então: “Ah, vamos fazer e tal.” E eu tinha a minha avó, a mãe do meu pai ainda viva no Líbano. Não vai trazer a terceira, porque a terceira, praticamente ele queria acompanhar. Aquela história do árabe, de sempre estar preocupado e quem determina é o homem. “É, mas então, a terceira não vem porque tem que cuidar da velha.” Aí, vieram as duas mais velhas e ficou a mais nova. A minha senhora é a do meio, tem uma irmã dela mais velha, e vieram as duas pra cá. Ela passou a morar conosco em casa. Então os hábitos da minha mãe, a maneira da minha mãe conduzir, ela aprendeu tudo. Quer dizer, ela simplesmente trouxe com ela todos os conhecimentos da minha mãe. Até a forma de educar, educar filhos. Porque praticamente, com essa abertura da Kibelanche os meus filhos , praticamente foram criados pela minha mãe.
P/1 – Quando começou a namorar?
R – Namorei dentro de casa. É uma simpatia que veio natural, natural.
P/1 – O senhor era novo?
R – Eu casei com 25 anos. Quer dizer, a gente ficou namorando, havia interesse dos pais também. Apesar, que não foi isso não. Nós queríamos realmente nos casar. Com isso, nós realizamos o casamento, eu tinha 25 anos. Desse casamento nós tivemos quatro filhos, três homens, uma mulher. A luta foi com todo mundo junto. Quando nós entramos na luta da lanchonete, entrou todo mundo. Aí, um pouco, por um período, essa outra irmã dela mais velha, ficou um pouco, isso quando ela ainda era solteira. Porque , quando a irmã dela mais velha veio a casar com um primo meu que morava em São Paulo, que já não são primos irmãos. Ele morava em São Paulo e acabamos fazendo o casamento no mesmo dia. Os dois casamentos foram realizados no mesmo dia. Tem uma coisa muito pitoresca, porque casamento duplo, né? Fomos pro mesmo lugar, lua-de-mel foi feita nos mesmos lugares, nós viajamos juntos e voltamos juntos. Foi uma festa, a minha mãe pela idolatria toda que eu estava contando pra você, ela também achou que deveríamos naturalmente fazer uma festa enorme. Não sei vocês sabem disso, mas o árabe por muitos anos, quando não existia a máquina de moer carne, então a carne era moída num pilão. Colocava, tem um pilão de pedra, sabe qual é o pilão? Tem um vácuo enorme no meio, é todo de pedra, coloca a carne lá dentro e começa a bater a carne. O quibe cru, então era feito dessa maneira. Ela fez absoluta questão de fazer o meu casamento com quibe feito no pilão. Era uma apadrinhação tremenda, né? Nossa Senhora! Fantástico! Então, foi...
P/1 – O casamento foi aqui em Araraquara?
R – Foi aqui em Araraquara. Foi. Ela fez uma festa, realmente naquela época. Pode falar.
P/1 – Como se chama a sua esposa?
R – Isabelle.
P/1 – Isabelle. Ela só falava árabe, no começo?
R – Quando ela veio, só árabe. Mas, ela estava aí, ela aprendeu. Hoje se você conversar com ela, ela não tem nenhum sotaque. Por que? Porque o comércio, porque ela veio, nós tínhamos a loja de calçados, e ela trabalhou na loja de calçados. Ela ajudou na loja de calçados, ela fazia as vendas. Então, aquele contato diário com o cliente obrigava. Tanto é que a outra irmã dela, mais velha, que não ficou comigo, não ficou muito tempo no balcão, que não gostava um pouco do balcão, ela já, por exemplo já tem um pouco de dificuldade de até em às vezes certas expressões. Por causa, justamente, a falta. Porque a melhor escola é o dia a dia. É aquele dia que você conversa com pessoas diferentes e não adianta, você tem que achar o recurso pra conversar. Você não pode apelar não, você tem que achar o recurso pra você se expressar e pra entender o que os outros estão dizendo. E boa vontade, né? Quando você quer atingir o seu objetivo, você consegue, basta que você queira.
P/1 – Como é uma cerimônia de casamento árabe?
R – Uma cerimônia que foi igual as outras. Não houve diferença, porque foi na igreja católica também, nós somos católicos. Igual, casamento normal. Não houve nenhuma diferença. O árabe, posso dizer pra vocês, que quando nós morávamos em Rio Preto, vou voltar um pouco. Em Rio Preto tem uma igreja que é árabe. Eu lá fui coroinha da igreja. Vou lembrar essas coisas um pouco tarde.
P/1 – Uma igreja, ela é árabe...
R – É árabe. É feita pelos padres ortodoxos. Tem uma linha um pouco diferente só na maneira de conduzir a missa. Eu era coroinha e meu pai, porque lá ela é contada, mas é individual a missa, então, meu pai fazia parte dos elementos que cantavam durante a missa. Só como parte pitoresca da parte de Rio Preto. O casamento aqui, só que foi normal, não teve nenhuma diferença dos casamentos normais. Pode perguntar outra., você tem duas aí. (risos)
P/1 – A família é cristã?
R- Família cristã. Eu hoje mudei um pouco, sou cristão também da mesma forma, porque cristão todos nós somos. Hoje, sou um pouco mais espírita, porque passei a praticar. Porque passei a ter uma participação muito grande de uma espírita que trabalhou, nós trabalhamos muito tempo juntos. Então a gente vê a coisa de uma maneira um pouco diferente hoje. Antes aquela história, você é católico, você é católico, você tem que participar na missa da igreja e aquela coisa. Depois você faz as suas análises, naturalmente parte pra aquilo que você acha que está certo. Eu dentro do espiritismo, realmente me sinto bem. Embora hoje, depois perdi essa senhora que trabalhava comigo, ela faleceu e aí estou um pouco fora agora. Porque é difícil, você tem que achar a pessoas certa , senão fica difícil pra trabalhar.
P/1 – E sua esposa acompanha o senhor?
R – Me acompanha. Hoje ela acredita muito. Antes ela criava N problemas pra mim.
P/1 – Sobre a manipuladora de alimentos?
R – A manipuladora de alimentos foi criada, porque nós tínhamos a lanchonete com um movimento muito grande. E toda vez que você tem um estabelecimento comercial de alimento, principalmente de alimento, você não tem um controle, você não consegue fazer um controle absoluto daquilo que você vende com aquilo que você produz, porque tá junto, ele tá unificado. Quando você produz, vamos supor, precisava produzir, precisava mandar esfiha pra frente. E então aquilo é preparado na hora: você faz, assa, já manda pra frente. Então, você não tem controle se aquilo é rentável, se não é, quando aquilo custa, quanto tem de mão de obra. Em razão disto, achei que deveria criar uma manipuladora de alimentos, porque iria produzir na manipuladora de alimentos, então teria um controle absoluto na remessa da mercadoria. Hoje, ele funciona assim, tenho uma manipuladora, tenho dois gerentes na lanchonete, então a mercadoria é transportada, eles conferem, como se aquela lanchonete não fosse minha. Eles terão que conferir a mercadoria, vão efetuar as vendas. As vendas, faço um controle todo através das comandas. Se faltar alguma coisa, eles passam a responsabilidade. Você tinha um controle mais absoluto. Por isso é que foi criado a manipuladora. Daria maior condições de dar um controle.
P/1 – Onde fica a manipuladora?
R – Aqui na rua Armando Sales de Oliveira, hoje, 275. Onde a Flávia me visitou.
P/1 – Como manda pra lanchonete?
R – Nós mandamos através da caminhonete nossa. Nós temos uma caminhonete de transporte, é acomodado nas caixas de aço e são remetidos lá pra baixo. Lá, a lanchonete só executa a fritura, o aquecimento. Quer dizer, lá na lanchonete não se produz nada. O sanduíche, por exemplo que é montado, ele já vai o presunto pronto, já embalado o presunto, embalado o queijo. Lá só faz a montagem, não se produz nada lá embaixo. Tudo é produzido aqui na manipuladora.
P/1 – O senhor fornece pra alguns lugares?
R – Fornecemos sim. Muito pouco. Nós fornecemos sim. Fornecemos pra algumas escolas, algumas lanchonetes que tem, que querem ter o produto. A preocupação de nunca desenvolver esse trabalho é porque o produto, não sei como é que o produto vai sair na hora da venda. Eu sei com ela sai da minha casa, na qualidade da minha casa, só que não sei como é que vai ser o tratamento na hora da fritura. Se na própria lanchonete minha, às vezes, tenho dificuldade, nós estamos fiscalizando sempre. Então, na casa de terceiros é muito mais difícil, é onde você não tem domínio. Você tem um produto bom, às vezes, a pessoa diz: “Ah...” Mas você não está fazendo mais aquele produto. Porque observa bem uma coisa: se você fizer um retrospecto, isso é muito importante para um raciocínio, fazer 39 anos quibe e não cair padrão, é muito difícil. Você pode estar certa disso. Você pode procurar aí, que é agulha em palheiro. Quem consegue fazer o mesmo produto durante 39 anos. E é um material perecível. Não é um material que você vai dizer, “Não, nós já tentamos de tudo.” Nós já tentamos congelar em nitrogênio, fazer o lançamento de produtos em nitrogênio, pra facilitar pro cliente. Não, infelizmente. Tem uma coisa na vida que aprendi, continuo ainda fazendo às vezes, insistindo. Todo o pioneirismo seu é muito difícil de deslanchar sozinho. Vamos dizer, vou voltar pra época do calçado. Na época do calçado, eu com uma loja de calçado, resolvi montar um indústria de calçado junto, uma pequena indústria, por que? Trouxe dois profissionais, falei: “Eu vou pra São Paulo.” Como ia toda semana pra São Paulo, ia na Sútoris, por exemplo w vocês devem conhecer, que é uma das lojas mais requintadas de calçados, via um lançamento de um sapato novo, comprava o sapato, trazia pra cá, fazia o oficial fazer igual. Não tinha dificuldade nenhuma. Lançava também, só que demorava muito pra pegar. Aí você pergunta: “Por que demorava pra pegar?” Porque, infelizmente hoje, você usa uma roupa, você vê o lançamento da roupa, você fala: “Não gostei.” Mas, daí a pouco você vê 10, 20 pessoas na rua com aquela roupa... Calça jeans, por exemplo, quando foi lançado, achei aquilo... não uso até hoje. Mas, depois que todo mundo passou a usar, que você começou a ver, você começa usar, entendeu. Então, quando o sapato pegava, já estava cansado de fabricar o sapato, então não tinha interesse mais, entendeu. Na alimentação, nós tentamos fazer uma introdução no mercado. Todo mundo dizia assim: “Poxa vida, você não deu expansão ao produto. Você tem um bom produto eu não sei porque que você não vende.” O pessoal de fora não acredita. É muito complicado, mercadoria que é perecível é muito complicado. Eu tive a idéia de montar no mercado uma comida individualizada, como que é essa comida individualizada? Por exemplo, eu queria criar bife a parmegiana. Eu criaria um prato do bife a parmegiana individualmente, criaria strogonof individual. Quer dizer, um prato diferente, mas pra uma pessoa. Pra mim poder manter isso numa qualidade excepcional, precisava do nitrogênio. Eu não sei se você sabe, o nitrogênio é uma forma de congelar o produto em alta velocidade. Eu colocava a mercadoria pronta, ela acabava de ser preparada, embalava, levava pro gabinete, a temperatura vinha à 196 º negativos. Quer dizer, em segundos tinha aquele produto congelado com 40º negativo. Eu tinha um produto de alta qualidade, conservado, pra na hora do descongelamento você ter um produto na sua mão, perfeito. Qual é que seria a sua vantagem? É que você chegaria num local e diria: “Hoje, qual é o cardápio que tem aí?” “Tenho 40, 50 pratos, aí.” “Porque gosto, gosto disso, gosto disso, gosto disso, separa 5, 6 pratos, leva pra casa, põe no freezer. Você chega às 9 horas da noite, você não vai cozinhar. “Deixa ver o que quero comer hoje?” Sei lá um strogonof. “Um strogonof.” Você vai lá pega o strogonof, colocar o strofonof no microondas, 8 minutos exatamente, ele está perfeito. Quer dizer, não tem prato pra limpar. Era de um custo muito barato. Isso nós fizemos uma tentativa pra ver se nós conseguiríamos introduzir no mercado.
P/1 – E aí?
R – Não entra.
P/1 – Por que?
R – Por causa do pioneirismo. Você começa a perceber hoje, que a Sadia começou a fazer. Só que já não é prato individual, já é mais coletivo. Outros vão começar até pegar, daqui a pouco... É que você não tem como dar uma continuidade. Você tem uma série de problemas, sério, sério, também de investimentos. Porque os investimentos são muito altos. Nós gastávamos de nitrogênio 3000 reais/mês, pra você congelar. Ou você vende ou você toma prejuízo. E tem outras experiências mais curiosas. Eu não sei se isso é interessante.
P/1 – É sim. O senhor se recorda?
R – Nós tínhamos, por exemplo, salgados. Salgados é uma coisa que vende no Brasil principalmente, vende muito. Já é um hábito, você dizer “Há faz um salgadinho”. É um hábito. Você vai na Europa você não tem esse hábito. Então, vamos desenvolver. Tem um japonês lá no Japão, que ele era padeiro e ele resolveu desenvolver uma máquina pra fazer o bolinho de arroz deles. E é um bolinho demorado, difícil de fazer. Então ele resolveu e gastou tudo que ele tinha pra construir essa máquina. E ele conseguiu, depois de muita briga, ele conseguiu criar essa máquina. Quando ela chegou no Brasil, essa máquina, que servia também... porque é uma máquina que recheia, ele queria criar aquilo que tinha a possibilidade de ter uma massa e rechear. Então, dava pra aquilo que ele queria ela resolveu. Só que ela chegou no Brasil e ela foi adaptada “Pô vai dar certo fazer uma coxinha, fazer uma empada, fazer um quibe, né”, “Ô, mas isso é excelente”. Uma máquina caríssima, por um preço exorbitante. Mas vamos analisar. Ela produz 3500 salgados/hora. Então você começa a multiplicar que 3500 salgados hora, vamos dizer que seja 8 horas, você tem 27000 salgados /dia. Você multiplica isso por 20 dias que seja, você tem 540.000 salgados. Aí você fica imaginando... Eu teria que congelar no nitrogênio. Pra congelar isso no nitrogênio, eu preciso ter uma esteira com nitrogênio, porque não serve mais o balcão. Então você tem um esteira. Depois você tem que ter uma máquina que pulveriza a farinha na preparação da coxinha, e depois você tem um batalhão de gente pra embalar, aí vem o grande problema, aonde você vai armazenar? Você precisa ter uma câmara que esteja a 20 graus negativos pra você poder armazenar. E aí você precisa ter caminhões frigoríficos, pra distribuir. Então o investimento fica tão grande que é uma incógnita, você dizer assim “vamos tentar”, mas e se não der certo? Aí não dá certo. Então você tem um monte. Quando você começa a querer criar alguma coisa dentro da alimentação é problemático. Então você vê aí Sadia, porque todo alimento hoje, Sadia e algumas outras mais que você encontra por aí são todas congeladas no nitrogênio, viu? Então essa foi mais uma experiência mas nós não chegamos à usa-la não. Nós tentamos mas não chegamos à usá-la.
P/1 - O senhor fazia propaganda, publicidade?
R – Quase nada. Eu tenho um produto, e já tá há muitos anos e todo mundo conhece. Você vai perguntar e “Não é bem assim” e realmente acredito muito na publicidade, quando você faz a publicidade, isso sempre aprendi assim, que a publicidade só é válida quando você começa a fazer pra uma criança de oito anos, de nove anos, e quando ela tiver 80 ela tá ouvindo de novo, continua a ouvir e a sentir e a ler essa propaganda, porque é o caso de produtos “N” que nós temos no mercado, se não quisermos mencionar, mas você pega uma Coca Cola ela começa, você tá com 5 e tá ouvindo Coca Cola, tá com 80 e tá ouvindo Coca Cola. Então acredito nesse sistema de publicidade. Toda publicidade que é esporádica, onde você faz pra aquele momento, ela só vende durante aquele período só. Eu não acredito que ela venda depois. E isso já observei muitas vezes que nós fizemos propaganda. O produto cresce durante aquela época e a hora que você pára a propaganda, ela declina totalmente. Então a propaganda tem que ser mantida. E a propaganda mantida você tem que ter produção pra suportar qual é o custo dessa propaganda. Porque não adianta você fazer uma propaganda que atinge 200 pessoas, não resolve. Ela tem que atingir toda a população e isso vem pra mídia escrita, falada, televisionada então é muito caro, depende do produto que você tem. Se você tem um salgado hoje que tem um custo, um salgado por exemplo que custa um real. Você precisa vender muito salgado pra você poder manter uma publicidade cara. E aí você não sabe se o custo /benefício é importante. É difícil.
P/1 – Tá jóia. A gente tá se encaminhando já para o nosso final de entrevista, né?
R – Tudo bem.
P/1 – Dessa época toda de vida ligada ao comércio, que lição o senhor acha importante passar pra nós.
R – Bom. Dentro do comércio de Araraquara já fiz um pouco de cada coisa. Eu já fui presidente da Associação Comercial, já pertenci ao Comércio Varejista, como diretor do Comércio Varejista, hoje sou presidente já são 12 anos, sou presidente do Sindicato dos Hotéis, Restaurantes e Bares, praticamente fundador também, faço parte da Federação. Então acho que o comércio, ele inova você o tempo todo. Porque você se preocupa, você levanta de manhã pensando nele, imaginando aquilo que você tem que preparar durante o dia, porque você enfrente “N” problemas. Então, acho que isso ativa o seu cérebro, ativa sua vida, e não sei o que seria de mim se não tivesse o comércio. Eu acho que é uma escola fantástica, sabe? Toda a minha experiência durante todo esse período de vida pra mim foi excelente, sabe? É nos exemplo para os meus filhos, nos exemplos para os meus netos, tudo me serviu e aprendi tudo isso com o comércio. Eu hoje não sou bitolado a nada por causa do próprio comércio. Entendeu? Eu aceito tudo hoje, não crio objeção pra nada. Todas as inovações. Nós tivemos em Araraquara o primeiro bureau de informática, fui eu que montei, o primeiro bureau de informática de Araraquara. Nós conseguimos importar duas máquinas que ainda era de perfurar cartão, da Holanda. Só erramos, aquela coisa, toda vez que você monta qualquer coisa em que você não tem grandes conhecimentos, você vai errar, sem dúvida. Então, nós compramos um equipamento que era grande para as pequenas empresas e era pequeno para as grandes empresas. Mas, de qualquer maneira foi uma inovação. Nós lançamos esse bureau, conseguimos trabalhar um tempo, meu filho naquela época tinha 15 anos aproximadamente, e hoje ele é doutor em informática porque se baseou naquilo. Hoje ele ocupa uma posição dentro da Unicamp, em razão disso. Então acho que o comércio, desde que você faça um trabalho honesto, você enfrente os seus concorrentes com toda a honestidade, com toda a lisura, acho que só traz benefícios pra você. As dificuldades, elas vão sempre existir. Eu não acredito em nada que você consiga ganhar sem você ter muito trabalho, dentro da honestidade. Agora o que daria de conselho na parte comercial, nunca entre num ramo comercial que você não conheça profundamente. Porque com certeza você vai ter algum prejuízo em algum lugar. Eu acho que isso vai acontecer com qualquer um. Você pode observar, naturalmente todas as pessoas vão fazer um retrospecto de sua vida e vão perceber que toda vez que entrar em uma coisa que não tem, que realmente não conhece profundamente, deve estar sofrendo ou sendo penalizado de uma forma ou de outra nisso aí. É isso que considero parte comercial. Tem mais alguma coisa?
P/1 – Só se quiser colocar mais alguma coisa que a gente ainda não perguntou e que gostaria de falar...
R – Não, não sei . É que na verdade não sabia qual era o teor da entrevista, estou desenvolvendo naturalmente aquilo tudo que aconteceu comigo e que gostaria de lembrar, porque comercialmente já enfrentei muitas situações, então posso responder qualquer coisa ,na verdade. Eu posso não ter agora no momento é a lembrança, mas a gente vai lembrando do bureau, participamos de uma agência de viagem, existe até hoje aí, que é a Prodaplan. Na verdade foi criada por mim que era Pro, de processamento, Dados, dados de planejamento, né, porque na verdade ela foi montada pra montar o bureau, então a Prodaplan foi montada pra montar o bureau. E aí depois, tenho um primo meu que é filho desse Demétrio, e ele gostava muito de turismo, então ele montou uma agência de turismo nesse mesmo prédio que nós tínhamos. Ele desenvolveu e desenvolveu com o nome de Prodaplan, nós fechamos o bureau e ele continuou com o turismo e o nome ficou, porque ele já estava, já era conhecido na época. Então essas coisas são importantes. Bom, no meu ramo, já trabalhei com quase todos os ramos. Isso é importante. Eu já disse pra vocês que já fui bancário, já disse pra vocês que na área do comércio já trabalhei com calçados, fui o criador, talvez, na época do calçado, da corrente de calçados. Que foi uma loucura total...
P/1 – O que é isso?
R – É a mesma coisa que a pirâmide. É quase mais ou menos parecido. Você vendia por correspondência e ele pagava um determinado valor que era mais baixo, mas ele tinha que mandar mais duas ou três pessoas comprar, naquela época então foi uma evolução muito grande. Trabalhei com roupas, trabalhei com armarinho. Tive um indústria de flâmulas, que na época estava no apogeu da criação do silk-screen pra montagem, lembra das flâmulas? Então também tive uma indústria desse tipo e onde nós éramos os pioneiros naquela época, parecia um descoberta, sabe quando você consegue fazer a primeira tela de silk-screen e passa o rodo pra ver se saiu o desenho, aquilo foi uma descoberta, naquela época. Hoje também sou Juiz Classista, quer dizer, exerço essa função também. Preciso lembrar mais...
P/1 – Mas o senhor já ajudou muito, queria encerrar a entrevista ,agradecendo muitíssimo a sua presença, de ter atendido o nosso pedido, ter deixado essa história de vida, a sua experiência em relação ao comércio, agradecemos em nome do Museu e do SESC.
R – Obrigado, eu é que tenho que agradecer. Acho que essa oportunidade não é todo dia que você tem também, né? Eu acho que deixar alguma coisa, algum exemplo, acho que vale a pena meditar, né? Às vezes, essa experiência mexe com a gente. A história da agulhinha mexe coma gente. Então, costumo muitas vezes repetir porque é tão interessante, que na hora você tem que aprender. É aí que você aprende. Principalmente com os filhos, né? Mas estou aqui, e agradeço a vocês também, tá bom?
P/1 – Obrigado .
P/2 – Obrigado.
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