P/1 - Então tá, qual que é seu nome?
R - Ilma Maria Pereira.
P/1 - E qual é a data de nascimento?
R - Quinze do doze de mil novecentos e oitenta e um.
P/1 - Qual é o nome de seus pais, Ilma?
R - Meu pai é chamado Lindauro Alves Pereira e Rosa Maria Neta.
P/1 - Certo. Seus pais são naturais de Rubim?
R - De Itapiru. Meu pai de Itapiru e minha mãe de Santo Antônio do Jacinto.
P/1 - O que que eles fazem ou faziam?
R - Eles trabalhavam em fazenda, era vaqueiro meu pai e minha mãe trabalhava, morava com ele.
P/1 - E você nasceu onde?
R - No município de Santo Antônio do Jacinto.
P/1 - Certo. E você veio morar em Rubim com quantos anos?
R - 14 anos.
P/1 – Qual que foi a decisão, o que motivou a decisão de seus pais de virem morar aqui?
R - Porque a minha mãe tinha um pedacinho de terra de herança do meu avô, que deixou pra ela, aí ela vendeu o pedacinho de terra dela lá e comprou a casa aqui e aí eles vieram embora pra aqui. Só que eles ficam morando em fazendas vizinhas. Hoje eles moram em Rubim mesmo.
P/ 1 - Você tem filhos?
R - Tenho três filhos.
P/1 - Três filhos?
R - Isso.
P/1 - Todos homens?
R - Não, uma moça e dois rapazes.
P/1 - Certo. Qual que é a idade de seus filhos?
R - A minha menina tem 21 anos, o meu rapaz tem um que tem 18 e tem um que tem 16.
P/1 - Certo. E quando você veio morar aqui, você já estava em qual grau da escola?
R - Eu, por exemplo assim, eu quase não estudei, eu tenho só o quarto ano. Aí eu fiz aqui o segundo, o terceiro e o quarto ano. Eu só tenho até quarta série.
P/1 - Você estudou em qual escola?
R - R - No Melvino. E estudei também na Conceição.
P/1 - Você começou sua escolaridade na Conceição?
R - Não, estava lá em Santo Antônio do Jacinto, no município de lá. Zona rural.
P/1 - Era na zona rural?
R - Zona rural.
P/1 - Você tem alguma memória desse período? Você se lembra de alguma coisa na escola?
R - Lembro, lembro dos meus...
Continuar leituraP/1 - Então tá, qual que é seu nome?
R - Ilma Maria Pereira.
P/1 - E qual é a data de nascimento?
R - Quinze do doze de mil novecentos e oitenta e um.
P/1 - Qual é o nome de seus pais, Ilma?
R - Meu pai é chamado Lindauro Alves Pereira e Rosa Maria Neta.
P/1 - Certo. Seus pais são naturais de Rubim?
R - De Itapiru. Meu pai de Itapiru e minha mãe de Santo Antônio do Jacinto.
P/1 - O que que eles fazem ou faziam?
R - Eles trabalhavam em fazenda, era vaqueiro meu pai e minha mãe trabalhava, morava com ele.
P/1 - E você nasceu onde?
R - No município de Santo Antônio do Jacinto.
P/1 - Certo. E você veio morar em Rubim com quantos anos?
R - 14 anos.
P/1 – Qual que foi a decisão, o que motivou a decisão de seus pais de virem morar aqui?
R - Porque a minha mãe tinha um pedacinho de terra de herança do meu avô, que deixou pra ela, aí ela vendeu o pedacinho de terra dela lá e comprou a casa aqui e aí eles vieram embora pra aqui. Só que eles ficam morando em fazendas vizinhas. Hoje eles moram em Rubim mesmo.
P/ 1 - Você tem filhos?
R - Tenho três filhos.
P/1 - Três filhos?
R - Isso.
P/1 - Todos homens?
R - Não, uma moça e dois rapazes.
P/1 - Certo. Qual que é a idade de seus filhos?
R - A minha menina tem 21 anos, o meu rapaz tem um que tem 18 e tem um que tem 16.
P/1 - Certo. E quando você veio morar aqui, você já estava em qual grau da escola?
R - Eu, por exemplo assim, eu quase não estudei, eu tenho só o quarto ano. Aí eu fiz aqui o segundo, o terceiro e o quarto ano. Eu só tenho até quarta série.
P/1 - Você estudou em qual escola?
R - R - No Melvino. E estudei também na Conceição.
P/1 - Você começou sua escolaridade na Conceição?
R - Não, estava lá em Santo Antônio do Jacinto, no município de lá. Zona rural.
P/1 - Era na zona rural?
R - Zona rural.
P/1 - Você tem alguma memória desse período? Você se lembra de alguma coisa na escola?
R - Lembro, lembro dos meus professores, lembro da minha professora também. E que a gente andava muito, mais de 18 quilômetros a pé pra ir, porque a gente não tinha carro pra ir, não tinha cavalo, não tinha bicicleta, não tinha nada dessas coisas. Então a gente ia na perna mesmo. Aí a gente ia mais cedo, saía de casa às 11 horas da manhã e chegava em casa, na escola, no horário, uma hora da tarde que começavam as aulas, e a gente saía às quatro e meia da escola e voltava, retornava pra casa. Chegava por volta de seis e meia, sete horas da noite, em casa.
P/1 - Quantos anos você tinha nessa época?
R - Nessa época eu estava... Eu estava entre oito e nove anos de idade. Até os doze anos eu estudava lá. Só que eu tomava bomba, porque tinha trabalho rural, e quando era tempo de colheita e planta, a gente ajudava nossos pais. Então aí eu faltava de escola, tomava bomba por conta que eu faltava muito de escola, por causa de faltas. Porque aí eu tomava bomba.
P/1 - E por que você faltava na escola?
R - É porque eu ia ajudar meus pais, né? Aí tipo assim, a criação da gente, a gente quase não teve oportunidade de estudar. Então aí a gente tinha que faltar pra ajudar os pais mesmo.
P/1 - E qual que era a sua tarefa, hein? Em que você ajudava?
R - Eu ajudava em plantação, em limpa, tomar conta dos meus irmãos pequenos. Eu tomava conta, levava comida na roça pros camaradas, minha mãe fazia o almoço, a gente levava. E aí a gente tinha a colheita também de arroz, porque a gente tinha um brejo de arroz na terra da minha mãe. Aí a gente tinha que olhar os passarinhos pra não comer o arroz. E nem arrancar quando tava plantando. Pra não arrancar, a gente ficava olhando pra os passarinhos não comerem o arroz.
P/ 1 - Ele tinha plantação de arroz?
R - Tinha plantação de arroz e tinha plantação de milho, feijão, maniva, mandioca, tudo tinha.
P/1 - E você tem alguma memória de vocês olhando os passarinhos? Quantos vocês eram? Como é que vocês faziam pra poder impedir que os passarinhos chegassem?
R - A gente ficava andando na roça, no brejo, pra eles não assentarem no arroz, pra não comer. Aí a gente não usava tilin, essas coisas não. A gente ficava andando. Aí tinha eu e mais dois irmãos meus, que é o Rosenilto e o Rogel. Aí a gente, um ficava de uma parte, outro ficava na outra, ficava andando pra eles não assentarem no arroz.
P/1 - E enquanto vocês estavam ali cuidando, vocês faziam alguma coisa? Se lembra de...
R - Tinha assim, às vezes a gente limpava, né? Começava a nascer o mato e a gente ia limpando, envolvendo o tempo, assim, pra não ficar só sentado. Aí às vezes tinha um ranchinho lá, aí a gente pegava, ficava lá na sombra, tava chovendo, um calor, né? A gente ficava sentadinhos lá. Depois, quando os passarinhos voltavam, nós tornávamos a ficar andando de novo.
P/1 - Tinha alguma brincadeira que vocês faziam?
Tipo assim, a infância da gente não foi de ter brincadeira, não. Eu nunca tive boneca pra brincar. Meus irmãos nunca tiveram carrinho pra brincar de carrinho também, não. Mas a gente só começava a crescer já pra negócio trabalhar, né? Aí a gente ajudava os pais da gente. Só que, tipo assim, eu gosto muito, sabe? Eu gostei da minha infância. Pra mim, eu gostei muito da minha infância. Tipo assim, hoje eu sou alguém na vida que tem meus filhos, graças a Deus, meus filhos muito educados, assim, pra conversar com as pessoas, obediente, com os meninos bons na escola, então... Porque a geração que o meu pai ensinou pra mim, eu passo pra eles. Então, o menino de 18 anos, ele não envolver com droga, não envolver com bebida. O menino de 16 anos também, não envolver com droga, não com bebida. E minha filha também. Mesmo que toma uma cervejinha, mas não envolve, assim, com outras coisas erradas. Não envolve. Então, pra mim é um orgulho muito grande. Eu não ter estudo, mas eu ter educado eles, pra mim eu tenho um orgulho muito grande.
P1 - Você tinha amigos?
R - Tinha uns colegas de escola. Mas, assim, saindo das casas, meu pai não deixava, não. A gente fazia amizade só na escola. Aí, em casa, não tinha negócio de amizade, não.
P/1 - E quando você saía pra ir pra escola, você tinha companhia?
R - Tinha, meus três irmãos.
P/1 - Iam os três juntos?
R - É.
P/1 - E como era esse percurso?
R - Aí a gente já encontrava os colegas de escola na estrada, aí a gente ia conversando, e aí a gente ia prosseguindo.
P/1 - 18 quilômetros?
R - 18 quilômetros.
P/1 - E você não se cansava?
R - Ah, não. A gente era criança, né? O tempo ia passando, a gente ia conversando, a gente nem percebe que a gente tá andando muito. Aí, era muito legal.
P/1 - E você, quando começou a estudar, o que você mais gostou na escola?
R - Ah, eu gostava da matemática e o português. E gostava de minha professora também, porque ela era muito gente boa comigo.
P/1 - Você se lembra o nome dela?
R - Dona Mauide. Ela se chama Maiude. Até hoje. Aí, quando agora outro tempo que o meu tio faleceu, a gente foi lá. Aí, ela falou, menina, mas você era tão feinha, eu nem tô te conhecendo. Mas foi legal.
P/ 1 - Quais que eram, assim, os principais costumes? Você disse que não brincava muito, mas o que era o lazer da família de vocês na roça? Como que se divertiam as pessoas ali?
R - A gente se divertia só com os irmãos, né? Brincando, conversando ali com outros. A gente sentava lá, ficava conversando. Igual no brejo de arroz mesmo. A gente ficava conversando um com o outro e o tempo ía passando.
P/1 - Na sua casa, tinha alguma festa tradicional, alguma...?
R - Não, não tinha festa, mas era só em casa mesmo. Minha mãe fazia biscoito, fazia brevidade, bolo, essas coisas. A gente ia visitar só os tios da gente e os avós. Nas casas, no dia de São João. Natal a gente quase não comemorava, não. Lá, a tradição do meu pai muito era o São João. E eles tinham era um negócio de folião, que meu pai saia, com um negócio de folia. Mas aí só saiam eles e a gente ficava em casa.
P/1 - A folia de reis?
R - É, aí só saia meu pai, com a turma que saia, mas nós, os filhos ficavam em casa.
P/1 - Era só os homens?
R - Não, saiam mulheres também.
P/1 - E eles cantavam onde?
R - Aí saiam cantando nas casas, vizinhas. Andava bastante, nos comercinho que tinham nos arredores, assim, eles andavam.
P/1 - Sim, mas onde que eles cantavam? Para quem que eles cantavam?
R - Para os parentes da minha mãe, para os amigos de meu pai. Ali na Lava do Roco, naquele meio ali, eles andavam por ali. Em Itapiru também, eles saiam lá e em Catajás.
P/1 - E você se lembra qual era esse período que eles faziam isso?
R - A data, assim, eu não lembro não.
P/1 - Mas era por ocasião do Dia de Santos Reis, você sabe?
R - É por ocasião de “Ma São Sebastião”.
P/1 - Ah, de São Sebastião.
P/! - Sua mãe armava presépio em casa?
R - Não, armava não. Ele só cantavam e saia com bandeira, mas não cantava.
P/1 - Com bandeira?
R - É.
P/1 - E como é que era essa tradição da bandeira? Quem confeccionava bandeira?
R - Os parentes de meu pai que montavam a bandeira, colocavam imagens lá de São Sebastião, enfeitavam a bandeira bem bonita, jogavam perfume nela para ficar cheirosa, e aí saía com ela.
P/1 - E seu pai tocava o quê?
R - A turma dele que tocava bumba, viola, violão, essas coisas assim.
P/1 - E ele fazia o quê? Cantava?
R - Cantava mais eles. Mas, meu pai não era muito bom para cantar, não. Era mais para diversão, saía com a turma dele, mas a turma cantava bem.
P/1 - Certo. E depois você veio estudar aqui em Rubim, certo?
R - É, eu estudei na Conceição, mas depois que eu vim para Rubim estudar aqui.
P/1 - E aqui você estudou no...?
R - Só estudei um ano, só. Só o quarto ano.
P/1 - Onde você estudou?
R - No Melvino. Eu só estudei lá só um ano. Aí eu já comecei a namorar, casei e abandonei a escola.
P/1 - Ah, então você parou de estudar porque casou?
R - É, porque aí quando eu casei eu estava com 19 anos. Aí eu comecei a estudar. Até as professoras daqui lá no supletivo me deram muita oportunidade também para eu estudar à noite. Só que aí logo casei e engravidei. Aí me deram oportunidade também para me levar a minha bebezinha, que é a Jéssica, né? Até me ajudavam lá. Só que aí depois eu que cuidava de casa, cuidava de criança. E à noite para a escola, aí eu peguei e parei de estudar.
P/ 1 - Certo. E já pensou em voltar?
R - Ah, eu tenho vontade de voltar a estudar, só que eu não consigo porque eu trabalho com as merendas e eu sou cega de uma visão. Aí a minha visão é essa daqui. Essa daqui eu não enxergo e essa daqui eu enxergo. Aí eu forço muito com ela e eu sinto muita dor na visão e dor de cabeça. Aí eu já trabalho, eu tomo quentura de forno. Aí chegar e arrumar para ir para a escola. Aí fica puxado, muito cansativo para mim.
P/1 - Certo. E essa perda da visão foi algum acidente?
R - É, quando eu era criança, assim, eu tinha uns seis anos, eu dei hepatite. Aí deu uma sequela que eu perdi a visão.
P/1 - Você estava morando ainda na roça, né?
R - Morava na roça. Quando a gente adoecia esse negócio de gripe, catapora, essas coisinhas, né, papeira, não levava nem médico, fazia os remédios em casa, né? A gente cuidava em casa mesmo. Aí só que aí eu perdi a visão.
P/1 - E quando você ficou grávida da sua filha a primeira vez, você tinha 19 anos, né?
R - 19 anos.
P/1 - Como foi isso de casar-se, ter o primeiro filho? Como foi isso para você? Era um sonho? Era um desejo?
R - Ah, meu sonho era casar, né? Meu marido mesmo é o primeiro namorado e o primeiro marido. Eu nunca tive outro namorado. Aí foi meu primeiro namorado e meu primeiro esposo. Aí eu casei logo. A gente não sabia se cuidar pra não engravidar. A mãe da gente, naquele tempo, não conversava com a gente, as coisas assim, né? Que a gente tinha que evitar pra não arrumar filho logo. Mas também não arrependo que arrumei logo não, porque já arrumei aí, já tá tudo grande, né? E eu ainda tô nova ainda. Mas a minha gestação com ela foi muito bem, graças a Deus. No começo a gente teve uns enjoos, mas foi tranquilo. Passou logo o enjoo e ficou tudo bem.
P/1 - Então desde 14 anos você mora em Rubim, nunca saiu daqui?
R - Fui pra Belo Horizonte em 2012, morei lá quase 3 anos e voltei em 2016 e tô aqui até agora.
P/1 - E o que motivou essa mudança de vocês pra Belo Horizonte?
R - É porque aqui meu esposo trabalhava de vaqueiro. Só que depois o quê é que acontece? A gente trabalhava para os outros, eu trabalhava de dona de casa lá na fazenda. Os patrões muito maravilhosos. Nossa, eles eram muito bacanas. Só que tipo assim, a gente queria sair pra conhecer outras coisas e aprender outra profissão, igual meu esposo mesmo. Se ele tivesse ficado trabalhando de vaqueiro, hoje em dia nem tinha construído essa casa. Aí foi lá em Belo Horizonte que a gente teve a oportunidade dele trabalhar de pedreiro. Aí ele foi trabalhar de pedreiro lá e aí ganhamos a profissão dele, ele trabalhou em Vitória do Espírito Santo, trabalhou lá em Belo Horizonte, em vários bairros lá. Aí depois nós construímos a casa nossa lá. Aí depois só que a gente queria... Por que que a gente voltou? Porque nós com três filhos de menor. E lá a gente morava em favela. Os meninos lá eram muito gente boa. Mas imagina aí, se eu tivesse continuado em favela, meus filhos seriam bandidos? Ou então até ser morto. Os meninos que moravam lá na biqueira mesmo, todos já morreram praticamente. Tudo menor, os meninos de 14, 16 anos. E aí imagina aí, eu com três filhos. Aí eu falei com o meu esposo. Aí ele estava em Vitória, eu falei assim: ‘vamos vender essa casa?” Eu falava que eu não voltava tão cedo pra cá. Aí ele falou assim, ué mas... E qual foi o motivo de você querer vender essa casa agora e nós ir embora? Eu falei assim, eu estou no serviço, mas eu vou pedir conta. E aí meu patrão lá mandou eu ir embora com todos os meus direitos. Comprei as coisas pra mim voltar pra cá. Eu, fale: “eu dou prioridade aos meus três filhos”.
Porque eu estivesse lá, imagina que eu perder um filho. Aí minha consciência, como eu ia ficar? Falar, não, perdi meus filhos para o mundo das drogas. Perdi meu filho por uma bala perdida? Então vamos voltar pra nossa terra de novo. Então, aí, a gente voltamos pra cá de novo. Aí eu vim e com o meu acerto, compramos algumas coisinhas de casa. Compramos material também, a gente trouxe material de construção de lá também. E aí a gente voltou pra cá.
Aí vamos ir nas merendas agora, né? Aí o meu dinheiro acabou. Acabou e eu falei assim: “e agora como que eu vou trabalhar?”. Eu não vou trabalhar pros outros, em casa de família eu não vou. Aí eu comecei a vender biscoito frito. Aí não dava. Porque tipo assim, eu gosto das minhas coisas de qualidade. Igual o seu dinheiro, é um dinheiro valorizado. Meu produto também tem que ter um valor e eu tenho que ter qualidade. Aí eu comecei a vender biscoito frito. Só que todo dia eu tenho que trocar gordura. Como que eu vou fazer biscoito frito de ontem vou vender, usar gordura de ontem e hoje vou usar no biscoito frito? Não tem como não, você tem que fazer... A de ontem não presta pra hoje mais não. Aí eu falei, não dá pra mim não.
Aí minha colega foi e falou: ‘olha a sua a vizinha” - a dona Rita que ela merece, com certeza ela merece, que Deus dá um bom lugar pra ela - foi lá e o filho dela, eu estava vendendo duas galinhas pra fazer o dinheiro que tinha acabado.
Aí ela pegou e falou assim: “ô minha filha, eu não compro as galinhas da sua mão, não. Mas vai lá com o meu filho, às vezes ele compra”, seu Dilson. Aí eu fui lá e falei, mas ele falou que não comprava não. Mas, que me emprestava 50 reais. Aí eu comecei minhas merendas com 50 reais. Aí eu fui lá e comprei dois quilos de trigo, comprei os ovos, o fermento, o leite, as coisas que fazem as merendas, a rosca. E comecei a fazer com dois quilos de trigo. Aí ele me emprestou o dinheiro pra pagar com uma semana com ele. Com dois dias eu paguei os 50 reais. Ele falou, não, mas você paga com uma semana. Eu falei, não. Mas graças a Deus, Deus já me prosperou pra eu pagar o Senhor, então não adianta eu ficar segurando o dinheiro do Senhor. Eu vou passar o dinheiro, devolver o dinheiro do Senhor. E agradeci ele e comecei. Aí hoje eu já mexo com uma quantidade maior de merenda. Não faço mais porque eu não dou conta. E eu trabalho com meu filho. Meu filho trabalha comigo, o Pablo. Mas eu não dou conta de sair com mais merenda pra rua. Então eu trabalho com uma quantidade boa. Mas aí, estamos aí na luta. E eu estou ajudando meu esposo a construir aqui. Com o dinheiro das minhas merendas. Primeiramente agradeço a Deus. E todos os meus clientes. Que me deu a oportunidade de eu conseguir chegar até aqui com o dinheiro das minhas merendas. E eles me prosperando com o dinheiro que eles me pagam.
P/1 - Essa experiência em Belo Horizonte, vocês saíram... Queria que você contasse um pouquinho como é que foi essa chegada lá, quem recebeu vocês, como é que vocês escolheram o lugar pra morar?
R - Lá a gente foi assim: a gente saiu daqui praticamente sem nada, eu levei o botijão, levei algumas panelinhas, aí a gente arrumou, aí eu cheguei lá e nós ia ficar na casa da minha cunhada. Só que eu falei, eu com três filhos, ia ficar na casa da minha cunhada, eu falei não. Aí a gente pegou, alugou uma casinha, um barracãozinho com três cômodos, um banheiro, uma salinha e um quarto. Aí a gente chegou lá, eu dormia com dois edredonzinhos no chão e meus três filhos que eram pequenos, eles dormiam numa caminha de solteiro. Aí depois eu falei assim, aí meu esposo começou a trabalhar fazendo os bicos lá e eu ficava em casa cuidando deles, até eu procurar um serviço. Aí depois, nós ficou nessa casa lá. Começou a chover e aí a chuva invadiu, a água ,todinha a casa. E aí as minhas roupinhas na caixa de papelão lá, a roupa dos meus filhos na caixa de papelão e essas roupas molhou tudo minha filha de Deus. Aí eu falei, ah não, ô Júlio, vamos sair dessa casa aqui que, aí eu observei, as coisas tudo molhado, vamos sair. Aí eu saí procurando lá e consegui uma senhorinha lá, tinha um barracãozinho, aí nós alugamos. Aí eu falei assim, ô Dona Maria, eu tô aqui, minha filha graças a Deus, ela arrumou esse barracãozinho pra nós, mas eu precisava de um serviço pra ajudar meu esposo. Ela falou assim: ‘a minha filha trabalha lá no Eldorado, na DMA”. Aí eu falei assim: “ô mas será que ela não consegue um serviço lá pra mim?” Ela falou assim: “ô moça, vai lá, leva o currículo e conversa lá, com o que você tá precisando, que você é do interior e você veio pra cá, quem sabe que eles arrumam um serviço pra você?”. Aí eu fui. Aí cheguei lá, levei o currículo. Aí, pensou que não, eles me ligou me chamando. Rapidinho, eu fiquei lá parada sem arrumar serviço, 35 dias a 38 dias. Aí eu consegui o serviço e fui trabalhar. Fui trabalhar de faxineira, no supermercado. Aí eu trabalhei de faxineira, aí tinha outra colega lá, tinha peixaria lá também, açougue, essas coisas assim, tinha padaria, tudo no shopping lá, tinha essas coisas, no mesmo setor. Aí eu tô lá e depois, só que tipo assim, eu nunca fui de escolher serviço, não. E eu, graças a Deus, gosto de fazer muita amizade com as pessoas. Aí eu cheguei lá e comecei a fazer amizade, o gerente muito bom, a subgerente também, muito gente boa, os encarregados também, a encarregada também, que hoje ela é gerente, muita gente boa. Aí ela falou assim, eu tô lá, ela falou assim, tem uma funcionária que vai sair da peixaria. Você não quer fazer uma experiência, não? Você quer mexer com peixe? É mexer com peixe, mas se você querer fazer uma experiência. Falei: “ué, o que tocar pra mim, minha filha”. Ela falou assim: “o dinheirinho lá vai ser mais do que faxineira”. Eu falei: então tá bom! Aí eu fui pra lá, trabalhar de auxiliar de peixaria. Aí fui pegando confiança, tudo que eles mandavam fazer eu fazia. Aí eu deixava a peixaria muito bonitinha, eu tenho até umas fotos da peixaria, eu tenho. Aí ela foi, eu fui pra lá, trabalhando de auxiliar de peixaria, aí quando foi com 45 dias, eu fui promovida pra ser peixeira. Aí eu já, eu que fazia pedido, eu que fazia quebra dos peixes que estragava, tudo pra resolver dentro da peixaria, quem resolvia era eu. Aí o meu gerente me chamou lá na gerência e falou comigo se eu queria ser encarregada da turma de uma peixaria. Que nós era quatro funcionários. Eu falei, não, tudo que vocês pedirem pra eu fazer, eu já faço, eu não quero mandar os outros não, eu quero ser mandada também, igual todo mundo, pra mim não faz diferença, não, o que vocês já pedem, vocês já fazem, tá bom. “Mas se você quiser, a oportunidade é pra você”. Eu falei, não, mas tá bom, do jeito que tá, tá bom. Aí eu fiquei trabalhando de peixeira até eu sair. Aí quando eu pedi pra vir embora, que eu queria voltar pra minha terra, aí eles falaram comigo que não queria mandar eu embora não. Que eu era uma menina muito boa, e eu era obediente, e eles não iam mandar embora não. Eu falei, ôh gente, pelo amor de Deus, eu tô com saudade da minha mãe, tô com saudade da minha terra, mandem eu embora, aí eles, não. Aí eu tô lá na peixaria, e já tinha mais de dois anos que eu tava na peixaria. Eu tô lá, e minha gerente chegou lá no vestiário e falou assim, que ela me chama de pupila: "Ô pupila, deixa eu falar uma coisa aqui, ó, cê sobe lá em cima, que sua carta de alforria tá pronta pra você ir embora". Eu falei, o quê? Mentira? Ela falou: "sério". Comecei a chorar. Falei, meu Deus, mandou embora mesmo. Aí ela falou assim, ó, até você vai sair com todos os seus direitos, e seu aviso prévio você vai cumprir em casa também. Eu falei: “ô beleza, então tá bom demais”. Aí ela falou assim: tal dia assim, você leva a papelada lá, pra dar baixa na sua carteira e resolver as coisas lá, e cê não faz parte da nossa empresa mais não. Eu falei, então tá bom, então. Aí peguei vim e foi que eu ajeitei as coisas e nós viemos embora pra cá.
P/1 - E seus filhos, enquanto você estava trabalhando na peixaria, o quê que eles ficavam fazendo lá onde moravam?
R - É, eles trabalhavam na escola, tinha dois que trabalhavam... um ficava quase o dia todo na escola, e a outra ficava só meio período. Aí eu pagava a pessoa, uma mulher lá que se chama Raimunda, eu pagava a Raimunda pra olhar eles. Cuidadora, que ela cuidava de mais crianças, até o horário deles ir pra escola.
P/1 - E como é que era a convivência lá, cê disse que era uma favela, como é que era a convivência lá nessa comunidade?
R - Não, é, tipo assim, lá, tipo assim, igual os meninos lá, eles são meninos assim: eles não mexiam com a gente. Igual eles falam assim, os meninos da biqueira lá, eles falam... É que chamavam nós os baianos. “Ô baianos, os baianinhos, aí ó, ninguém mexe com vocês não. O que tiver com vocês aí, vocês podem falar com nós, ninguém mexe não”. Aí só que tipo assim, eles não mexiam com nós não, e também tudo que eles precisavam de mim, às vezes, que esse povo que mexe com essas coisas assim, eles quase não come, não bebe, nem nada assim, comida, né? Fica envolvido naquelas coisas lá. Aí eu, tipo assim, eu ficava com dó, eu fazia comida, ou eu mexia com merenda lá, fazia merenda pra nós, bolo, essas coisas assim, biscoito frito, aí eu pegava e tirava pra eles, dava água gelada pra eles, aí eu fazia vasilha de comida, assim, uma farofa, ou então a comida, mexia pra eles e ia lá levar pra eles. Eu falava assim, ó meninos, eu só não aceito vocês dentro da minha casa, mas aí onde você está, é problema seus. E eu não quero que vocês envolvam meus filhos nessas coisas, eu não quero que vocês envolvam meus filhos não e oferece pra eles não. Porque eu tenho muita preocupação assim com meus filhos, e foi meu Deus que me deu meus três filhos, eu não quero ver eles numa vida dessa não. Aí eles: "não, a gente não vai mexer com eles não, e a gente nem oferece essas coisas pra eles não". Aí, nós passava e eles não mexiam com nós não.
P/1 - Era uma convivência tranquila entre eles lá e a comunidade?
R - É lá, assim, no bairro, a comunidade, mas não mexia com nada não, só mexia com as coisas deles pra lá, mas não mexia com a gente não. E não mexia com os outros vizinhos também, assim, eles não mexiam também não, eles eram tranquilos, só mexia com as coisas deles pra lá.
P/1 - Certo. E aí, vocês decidiram vir pra cá. O que mais te determinou, além disso, você disse que queria proteger a vida dos seus filhos, mas o que mais te atraiu pra voltar pra Rubim? O que mais você achou que valia a pena voltar pra Rubim?
R - Ah, o que mais vale a pena foi meus filhos, né, pra mim cuidar deles aqui, e eles não ir fazer, praticar coisa errada.
P/1 - Certo. E como é que foi o impacto de chegar aqui? Você foi bem recebida, como foi?
R - Ah, tipo assim, porque tipo assim... aí quando a gente já veio, a gente já veio pra aqui, né, nós já tínhamos essa casa aqui, só que não era desse jeito, era uma casinha, e aí nós ficamos aqui, nós não quis alugar a casa não, aí meu esposo queria alugar a casa, eu falei, não, mas o dinheiro que a gente vai pagar no aluguel, já é o dinheiro da gente investir aqui. Aí, minha filha, era só a casa aqui embaixo, daqui pra lá, dessa porta pra lá. E aqui aquela cozinha ali, o barracãozinho velho lá, não tinha não, era só daí pra lá, aí não tinha a parte de cima não. Aí nós aí dentro, aí ele cortou essas paredes, ia cortando dois pilar ou três pilar e enchia de concreto, e deixava enxugar, aí depois ele cortava no outro, aí pra gente depois montar a laje. E aí, quando a gente foi montar a laje, foi engraçado demais, porque quando 'negoçava', ia descendo a calda do cimento, né, com o concreto, e aí eu arrastava os trem pra cá, arrastava os trem pra acolá. E aí, só ia na luta, e eu falei assim, daqui eu não arredo o pé não, eu não vou alugar a casa, daqui eu não arredo o pé não, vamos ficar por aqui mesmo, aí nós só lutando, lutando, até nós cobrimos aqui, batemos a laje. Não tinha plano de aumentar aqui, e nem fazer a parte de cima, só que como tava chovendo bastante, a água tava infiltrando muito na laje, a gente passava coisa na laje, mas não parava de infiltrar a água, molhar, dar vazamento. Aí eu fui comprando 50 tijolos, 100 tijolos, e foi de pouco a pouco até que nós cobrimos lá em cima também, e aí terminamos a parte de cima, nós terminamos.
P/1 - Tem quanto tempo que vocês estão morando aqui de volta?
R - Sete anos.
P/1 - E vocês pensam em mudar daqui?
R - Ah!! Eu tenho vontade, só que o meu esposo não quer não. Meus meninos também querem. Agora minha menina mesmo, em nome de Jesus, ela tá vendendo o bolãozinho dela aí, mas ela quer sair também depois, mais na frente, o que for, ano que vem, por aí, não tem prazo determinado pra ela, mas ela quer sair também pra trabalhar. Igual, eu converso com ela assim, "ó minha filha, eu tipo assim, depois de 19 anos eu não tenho estudo, depois de 19 anos, depois que eu casei, pra gente conseguir as coisas, mas você é nova, você vai esperar você fazer 30 anos, 35 anos, você correr atrás de alguma coisa melhor pra você?". Então tipo assim, é agora que é a hora de você correr atrás, de você conseguir algo melhor na sua vida, porque isso aqui tudo é pra vocês, pra esses três, mas só que tipo assim, o que adianta ter uma casa pra eles ficarem, não ter um serviço, não ter uma coisa melhor pra eles? Então eu falo assim, isso aqui, nós estamos lutando aqui, organizando, isso aqui é seus, isso aqui é pra vocês.
Meu menino também, o Jefferson mesmo, é porque eu sou uma mãe assim, ó, chata mesmo, sou chata e pego no pé mesmo, falei não, eu não tenho estudo, mas o que eu dei pra uma, eu vou dar pros três, no nome de Jesus. Deus me dá vida e saúde, eu vou deixar vocês formados, aí depois que eu formar vocês, se Deus querer me tirar desse mundo aqui pra me levar pra outro mundo, eu não tenho problema, por outro lugar, que Deus, seja feito a vontade de Deus, mas eu quero dar um estudo pra vocês, pra vocês ter que, às vezes, arrumar um serviçinho, trabalhar mais tranquilo, não precisar ficar... Meu menino mesmo trabalhava com o pai dele, ajudante de pedreiro e agora ele está naquele negocio lá do Pólo lá embaixo, perto do mercado, aquela quadra lá, e ele tá mexendo lá. E meu esposo tá aqui, na pracinha aqui, fazendo aquela praça lá.
P/1 - Os três filhos estão estudando?
R - Não, é só dois, porque a Jéssica já é formada, já.
P/1 - Ela formou em que?
R - É, fez o terceiro ano.
P/1 - E tem perspectiva pra continuar?
R - Tem perspectiva, mas só que de vez em quando eu falo assim, a gente não tem condição de pagar uma faculdade pra eles, né? Então é aí, se eles querem arrumar um serviço pra eles poderem prosseguir, beleza, mas eu falo assim: "no momento eu não tenho condição de pagar uma faculdade pra você". Meu sonho era ter né? Dar uma ajuda pra eles, melhor, um bem-estar melhor pra eles, mas o que eu posso dar a eles é uma cama pra dormir, é uma comida, ter uma água pra tomar um banho, e o básico que a gente tem pra oferecer pra eles é uma casinha pra eles ficarem debaixo.
P/1 - Certo. Você tem algum sonho, Ilma?
R - O meu sonho é fazer uma cirurgia do meu olho pra... Eu não vou enxergar dele, mas eu tirar o estrabismo dele. Meu sonho é esse. Porque eu sou zarolha de um olho. Aí eu já sou cega dele, né, aí meu sonho é fazer uma cirurgia pra, mesmo que eu não volte a enxergar dele, mas eu ficar normal igual o outro, entendeu? Assim, ter a visão normal pra poder...
P/1 - Você sente dor?
R - Sente muita dor, dor de cabeça, às vezes, e dor no ouvido assim, essa parte assim, né, tem hora que inflama assim, ó. Porque dói muito assim, porque eu foco só de uma visão. Aí dói muito.
P/1 - E já, você já chegou a fazer um exame pra, o caso de usar óculos?
R - Ah, já fiz, mas só que tive assim, aí eu não comprei os óculos, né. Já fiz, de vez em quando eu faço exame, né. Ó, tem vezes que meu pai me ajuda pagar a consulta, minha mãe também me ajuda, aí eu vou e faço a consulta, aí o médico passa o óculos, aí quando eu vou lá, vai apreçar o óculos, o óculos é quase mil reais, aí eu falo, ah, então deixa, quieto.
P/1 - Entendi. Mas essa dor é em razão do olho?
R - Do olho.
P/1 - Do olho mesmo, né? E fazendo a cirurgia resolve, né?
R - Não, é tipo assim, igual eu tô falando, não vai, eu não vou enxergar dele, mas aí eu quero, pra tirar o estrabismo, entendeu?
P/1 - Mas resolve a dor também?
R - O médico não falou como é que resolve a dor.
P/1 - Sei. Quando você trabalha fazendo as merendas, né? Esse foi um trabalho que você sonhou desde criança, ou você aprendeu com alguém? Como é que é esse trabalho de fazer as merendas?
R - Tipo assim, porque aí eu vim pra cá, como eu não queria trabalhar com os outros, né, e foi assim, não, eu vou dedicar uma coisa, eu vou dedicar uma coisa pra mim, entendeu? Assim, eu trabalhar pra mim. E fazer novas amizades, não, eu gosto muito de trabalhar com minhas merendas, sair, bater de porta em porta, conversar com o pessoal, entendeu? É tipo assim, aí é uma coisa boa que eu gosto de fazer. Eu tô aqui agora, se você falar comigo assim, ó, eu quero uma merenda daqui pra 6 horas da noite. Pode ser que a rosca, que não vai dar tempo, eu te entregar 6 horas da noite, mas se você querer um bolo, um biscoito enrolado salgado e doce, um biscoito de coco, um biscoito de queijo, eu vou providenciar pra você.
P/1 - Tem muitos clientes?
R - Tem, graças a Deus.
P/1 - Consegue fazer uma boa renda por mês?
R - Dá pra fazer uma renda boa, dá pra fazer. Às vezes, tipo assim, eu também tomo muito prejuízo, né, assim, nas vendas, porque tipo assim, às vezes você confia no cliente, aí o cliente vai lá e te dá cano, entendeu? Não paga, entendeu? Aí, só que eu não importo não. Eu vou lá brigar e fazer confusão? Vai pagar não. Ou, não vai pagar não? Beleza, tá bom. Não vou brigar não.
P/1 - Tá certo. É ... Agora eu queria que você contasse assim, talvez uma memória mesmo, assim, de quando você começou a namorar, como é que foi essa decisão, como é que você conheceu o seu esposo, como é que foi isso?
R - Eu comecei a namorar com 19 anos, namorei 11 meses, aí eu comecei a conhecer meu esposo assim, porque nós morávamos lá no interior, perto de Santo Antônio, aí a minha cunhada, que hoje é minha cunhada, ela trabalhava, porque ela era mulher de meu... (latidos, estranha todo mundo). Aí meu primo, ele era casado com minha cunhada, era casado com minha cunhada, hoje é separado. Aí ela falava muito do Júlio pra mim, aí eu falava assim, meu Deus do céu, não moça." Óh, moça ele é um moreninho”, (ruídos de latido de cachorro) mas ele é, ele é moreninho, mas ele é trabalhador, entendeu?” É uma pessoa trabalhador. Eu falava: ah, não, eu não quero não. Aí beleza, aí pra lá eu esqueci de namorar. Aí eu não tinha conhecido ele ainda não. (Tá passando aí? Ele é um cachorro, tá gravando o cachorro?).
P/1 - Tá não, pode seguir.
R - Aí ele ficou. Aí eu vim embora de Tabocal, vim do município de Santo Antônio pra cá, aí ficou morando aqui um tempo, aí nós fomos morar lá na Sombra da Tarde, perto da Conceição, lá na fazenda do meu padrinho, Nicolau Botelho. Aí nós fomos trabalhar lá, aí depois minha cunhada ia pra lá também, tornava a ficar falando dele. Aí depois meu primo, que é o ex-marido dela, arrumou serviço pra ele lá pra ele conhecer meu pai, e conhecer ele. Nós sem namorar ainda. Aí aí ele chegou lá e falou com minha cunhada, que ia lá me conhecer. Aí ele ficou com vergonha, não quis falar nada com meu pai não. Aí ele me chamou na casa da minha cunhada pra gente conversar. Aí eu falei assim, ele me pediu em namoro, eu falei: “não, pra mim namorar com você é só você pedir meu pai, se meu pai aceitar, beleza, mas se meu pai não aceitar, não tem como fazer não”. Ele falou: “não, pois eu vou pedir seu pai”. Aí foi lá, ajeitou, e conversou com meu pai lá no padrinho Nicolau, e meu pai falou que não tava na hora de eu casar, que eu tava muito nova. Pra eu me casar só com 25 anos, não sei o quê, aquela coisa toda. Aí eu falei não, mas se o senhor querer arrumar um serviço aí, que eu sou trabalhador e tal. Aí meu pai falou assim, pois é, então eu vou arrumar um serviço pra você. Você vai cortar cana, aí ele cortava um quadro de cana no dia, pra mostrar o serviço, disse que era pra mostrar o serviço pro sogro (risos). Aí cortava um quadro de cana por dia, aí depois, tava lá depois, e nós conversamos, aí meu pai falou: "então, pois é, então você pode namorar com ela, mas você fica lá na sua casa e ela aqui em casa. Só vai namorar quando eu tiver perto, e vai lá, conversou um pouquinho e boas". Aí tá bom! Aí quando ele ia lá me visitar, e que ele me chamava lá na sala pra nós conversar, meu pai pegava e botava eu pra ir pra cozinha, Que não era pra ficar não, pode voltar pra cozinha, aí eu botava quietinha assim, ia lá pra cozinha e ficava lá. Pensava que não, ele ficava desconfiado também, voltava lá, porque tinha os barracos lá que ele trabalhava, voltava lá pro barraco e ia dormir. (risos). Ah, mas não é brinquedo não moça! Mas tá bom né, os ensinamentos dos pais da gente foi esse, e esse que a gente tem que seguir. Igual eu mesmo, se ele tivesse me criado solta? Igual, tem muitas menininhas novas aí hoje que nem sabe cuidar da criança, já tá grávida. Aí assim, se os pais fossem mais rígidos um pouquinho, talvez, talvez elas estudavam, focavam em estudar e ser alguém melhor, depois que estudasse, pensava em ter um relacionamento, ter filhos, porque filhos é muito bom, filhos é maravilhoso, eu tenho meus três, e não arrependo. Mas eu falo assim, que hoje, principalmente hoje, pra educar um filho tá difícil demais, tá muito difícil pra gente educar o filho. Então hoje a menina, ela tem que bem saber assim, em qual família que ela vai entrar, e tipo assim, pra ela se cuidar, pra ela não engravidar tão rápido assim, sem ela ter um pouco de experiência.
P/1 - Certo. Quantos anos você tem hoje?
R - Eu tenho 41. Em dezembro eu faço 42.
P/1 - Certo. Você já pensou em ampliar esse seu negócio? Você já... esse mesmo negócio que você faz, em torná-lo...?
R - Meu esposo fala muito que eu podia montar um negócio pra mim. Só que eu não tenho a condição de adaptar todas as coisas. Aqui mesmo tá faltando muita coisa pra mim organizar, tem que ter uma bancada maior pra mim colocar os tabuleiros, que eu coloco os tabuleiros aqui em cima dessa bancada.
Mas o espaço dá pra mim colocar aí ainda. Mas assim um lugar mais organizado pra eu poder fazer as coisas mais tranquilo. Então é um pouquinho e vai lá. Pra mim montar um negócio eu não tenho condição de juntar o dinheiro. O dinheiro que eu ganho, eu pago, ajuda em casa e vou lá e compro as coisas das merendas pra mim trabalhar a semana toda. Eu trabalho quatro dias na semana. Eu trabalho de terça à sexta. Aí se tiver encomendas de bolos, bolos de fubá e bolos de aipim, eu deixo pra mim fazer no sábado, que eles demoram mais assar, tem que assar com mais pouco fogo pra eles não ficarem cru no meio, nem queimar por cima e nem queimar no fundo. Então aí eu já compro as coisas e já organizo pra trabalhar os quatro dias da semana. Aí o dinheirinho que eu vou arrecadando, eu já torno pra comprar no sábado pra na semana seguinte prosseguir o trabalho de novo.
P/1 - Qual que é a sua receita preferida? Qual que você gosta mais de fazer?
R - Ah, eu gosto de fazer as roscas. É a de frango, que o pessoal gosta muito, e a de Romeu e Julieta, queijo com goiabada.
P/1 - Você pode passar uma receita dessas pra gente?
R - Pode.
P/1 - Pode contar como é que faz?
R - Pode.
P/1 - Então conta como é que faz essa de..., essa rosca.
R - A de recheio?
P/1 - A que você gosta mais de fazer.
R - A de frango, o que que acontece? Eu pego, a massa tá pronta, eu deixo a massa dar ponto, aí quando ela tá pronta, descansada, aí eu vou lá, abro a massa, as quantidades assim, e abre, vou lá e o peito de frango já tá pronto, com milho verde, pimenta de cheiro, orégano, aí já tá tudo prontinho, aí eu vou lá e coloco nas massas e ajunto ela e arrumo bonitinha, e faço o formato que eu quero pra colocar no tabuleiro pra esperar crescer. E a de goiabada, eu faço a mesma coisa, abro a massa também, só que a de goiabada, eu vou cortar a goiabada picadinha, pequenininha, ralo o queijo floco, e aí eu coloco por dentro, o recheio, a goiabada e o queijo. Aí eu junto também, fecho e coloco o formato que eu quero. Aí depois que ela assa, que ela cresce lá, que ela descansa, que ela assa, eu vou lá e ralo o queijo floco de novo, e jogo por cima e coloco no forno pra derreter. Aí ela derrete por cima, aí depois que ela esfria, eu vou e embalo ela bonitinha e coloco. Eu coloco ela toda embaladinha na sacolinha, eu não jogo ela na vasilha assim, eu coloco assim na vasilha, aberta pra você chegar e meter a mão e pegar o próprio produto, não. Eu vou lá e pego a sacolinha, embalo ela toda em sacolinha bonitinha, grampeio ela toda grampeadinha, e aí ela fica toda embaladinha e aí eu saio pra rua pra vender.
P/1 - Muito bom!
R - E a de calabresa também, eu pico a calabresa, picadinha também, e frito ela, coloco pimenta de cheiro, orégano também, cebolinha e pimenta de cheiro, pimentão. Aí eu faço a mesma coisa, coloco dentro e depois faço o formato que eu quero, e eu coloco pra descansar e depois que ela descansa eu asso elas também.
P/1 - Você optou por morar aqui em Rubim, mas falou que tem vontade de sair. O que você acha que Rubim, a cidade de Rubim, poderia proporcionar e que talvez fizesse você permanecer aqui? O que você acha que seria importante ter aqui em Rubim?
R - Pra eu ter aqui em Rubim? Eu ter a oportunidade de ter o meu cantinho, pra mim poder trabalhar lá, o lugar pra mim trabalhar lá, com meus equipamentos, entendeu? Com meus equipamentos, porque lá eu ia ter um ponto melhor, o ponto que tinha mais trânsito de pessoas, que passava mais gente, movimento de gente, pra poder... Eu ter um pontinho lá pra fazer lá mesmo, e lá mesmo já vender. Só que eu gosto também de sair pra rua, né? Porque na rua, às vezes você mora lá no centro, às vezes você não vai ver ninguém pra comprar um pacotinho de biscoito ou um pacotinho de rosca. E eu passo lá na sua porta e você vai comprar. Pra sair lá também é bom (som de calopsita ao fundo)
P/1 - Eu acho que... tem alguma coisa que eu não perguntei, que você acha que é importante, que você gostaria de falar?
P/2 - Como você é conhecida?
P/1 - Ah, sim. Como é que você é conhecida aqui pelas pessoas, quando as pessoas vão te encomendar, né? Se eu chegar em algum lugar e falar assim, eu quero saber quem aqui faz uma boa rosca ou não sei o que. Como que as pessoas te indicam?
É... Coração. Eu chamo eles de Coração e eles me chamam de Coração.
P/1 - Então, seu nome aqui...
R - É coração. Eu chego aqui... Se você perguntar assim, quem é que faz rosca aqui? Onde que Coração mora? Quem é Coração? Ah, é a menina que faz rosca, que ela vende na rua pra gente. Aí é coração, que eles me chamam.
P/1 - E os seus produtos têm um nome?
R - Eu não coloquei o selinho ainda não.
P/ 1 - E o selo vai ser qual?
R - O selo vai ser Ilma Quitudes.
P/1 - Ilma Quitudes?
R - Só que com um simbolozinho de um coração, né?
P/1 - Ilma Coração.
P/1 - Tem alguma coisa que eu não perguntei e uma que você acha que é importante você contar pra gente, que você gostaria de falar?
R - Eu gosto, tipo assim, graças a Deus que eu tenho a oportunidade de receber vocês aqui em casa. Isso pra mim é um privilégio muito grande, que já é a segunda vez que eu tô falando com vocês. E pra mim é um privilégio muito grande receber vocês aqui e vocês terem conhecimento dos meus produtos.
P/1 - Muito bom. Você autoriza a gente publicar essa sua entrevista?
R - Pode, fica à vontade.
P/1 - Então você diz, eu autorizo.
R - Eu autorizo.
P/ 1 - Fala o seu nome.
R - Ilma Maria Pereira.
P/1 - É isso? Tem alguma coisa? Acho que é isso.
P/2 - Pronto?
R - Pronto.
P/ 1 - Então, muito obrigada.
P/1 - Como é que foi pra você nos conceder essa entrevista?
R - Pra mim, pra conceder, que você, foi você, foi? Ele me procurou, né, e queria fazer a entrevista comigo e eu aceitei. E pra mim é um privilégio receber vocês aqui e eu ser convidada, né, pra mim fazer a entrevista com vocês.
P/1 - Muito bom. É isso. Muito obrigada, querida.
R - Eu que agradeço e uma boa tarde pra nós.
P/1 - Muito obrigada.
P/ 1 - Que foi, gente? Mas vocês estão muito nervosos. Que povo nervoso. Que povo nervoso!
R - Imagina, vocês não gostam de visita, não? Ave Maria! Deita lá. Sossega. Que vocês fez feio.
P/1 - Que calor. Socorro.
R - Tá calor. Tá calor.
Recolher