Depois de crescer e entrar no maravilhoso campo do ensino, comecei a querer entender o que me motivou a me tornar professora. Além disso, o que me fez perceber quem eu sou hoje? O encontro com o espaço da Educação abriu uma possibilidade real para mim de olhar para uma viagem no passado e recons...Continuar leitura
Depois de crescer e entrar no maravilhoso campo do ensino, comecei a querer entender o que me motivou a me tornar professora. Além disso, o que me fez perceber quem eu sou hoje? O encontro com o espaço da Educação abriu uma possibilidade real para mim de olhar para uma viagem no passado e reconstruir minha trajetória para tentar dar sentido à minha formação. Não estava preparada para ser professora, mas algo dentro de mim me impulsionou a entrar nessa área e, assim que surgiu a oportunidade, aproveitei com força. No entanto, entendo que os fundamentos científicos e metodológicos da Pedagogia e da Educação eram lacunas para mim. Se me sentia uma pedagoga, o que me tornava assim?
Conhecendo melhor o campo da pesquisa educacional, me deparei com uma abordagem nova: o método autobiográfico. Nessa perspectiva, vejo a oportunidade de poder, a partir da minha experiência, compreender a minha formação e, melhor ainda, fazer com que outros reconheçam a sua história na minha história. Não estudei para ser professora, mas queria muito ser professora e hoje sou graduanda em Pedagogia. Quantas pessoas compartilhariam os mesmos sentimentos? Decidi escrever sobre meu histórico de formação e fazer uma hipótese sobre mim. “Eu instituí provisoriamente uma figura de mim e a submeti a avaliação da minha experiência” (DELORY-MOMBERGER, 2006).
Escrever minha experiência escolar e seu ambiente, referenciando as pessoas, grupos e eventos em minha trajetória, é o que me propus a fazer neste texto. Para isso, eu procurei traçar uma linha do tempo na história da minha vida, que tem seu eixo na formação escolar, da educação infantil ao ensino médio e, por fim, o ensino superior. No entanto, não posso construir uma história para mim com essas palavras sem ser capaz de mergulhar no contexto familiar e social que incorporei à minha história. Devo documentar, aqui, como a prática da autobiografia foi maravilhosa para mim e, ao mesmo tempo assustador, tantas emoções e seleções do que “EU” posso mostrar para outros.
Tentei trabalhar com um material narrativo feito de memórias que são consideradas experiências significativas durante minha educação e o legado que a escola me deixou. Quando opto por falar sobre o que considero ser experiências formativas durante minha vida de estudante, estou falando sobre mim mesma e sobre o mundo que vi. Somente identificando essas experiências, posso entender como a dinâmica de formação, conhecimento e aprendizagem fazem essa inter-relação entre meu passado, presente e futuro.
EU NO MUNDO
Nasci no dia 16 de outubro de 1996 na cidade de Rolim de Moura, estado de Rondônia, Brasil. No dia de meu nascimento, tive o primeiro contato com meus pais adotivos, Antônio H. Miranda e Irene Miranda, um casal que já havia criado quatro filhos, com o crescimento dos seus, Irene, minha mãe, se sentiu solitária e optou por adotar uma criança. Os dias foram se passando, e logo se tornaram meses, e eu, aquela menina com alguns problemas de saúde, foi crescendo, logo me tornei muito amada, até por quem não apoiava muito a adoção... Andei e falei com nove meses, aos cinco anos atravessava a cidade de bicicleta para comprar coisas no mercado para minha mãe. Morávamos no lugar mais lindo do mundo, minha casa, minha terra. Morávamos em uma chácara de 2 alqueires, tínhamos muitas arvores plantadas, muitas frutas, um rio que passava na fundiária da chácara, Rio Anta, algumas vacas, alguns bezerros, um em específico ao qual eu era muito agarrada, Cherin, um cachorro, Réx, e um gato, Michelin.
EU NA ESCOLA
Essa menina é diferente! Eles diziam. Ela será nossa “Menina de Ouro”.
Cresci ouvindo isso e, dentro de mim, aos poucos se desenvolveu um alto nível de cobrança!
Tenho que ser a melhor.
Tenho que ter as melhores notas e, se possível, ser a primeira da classe.
Eu falava isso constantemente para mim mesma.
Quando eu tinha 5 anos, entrei na minha primeira escola (Pré I). Não me lembro muito daquela Primeira Escola, a não ser dos uniformes azuis e do caminho íngreme que escalávamos para chegar lá. Estudava no turno matutino, lembro-me muito bem, porque todos os dias acordava cedo, banhava, escovava os dentes e, antes que meu pai saísse para trabalhar, vendendo pasteis, garapa e sucos, ele me dava uma coxinha e um enroladinho, que, na época, eram meus pasteis preferidos! Até hoje não encontrei “PASTEL” mais gostoso que o de meu pai.
Aos 6 anos me mudei de escola, a nova escola se chamava: Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Maria do Carmo de Oliveira Rabelo, estudei lá do 1º ao 4º ano, sem muitos detalhes, recordo-me de uma sala da qual eu fazia parte, eu era muito falante, e sempre queria responder as perguntas e fazê-las. Brincar era muito bom. Eu me divertia muito, apesar dos poucos amigos, nessa época eu vivia chegando chateada em casa, os colegas “Jogavam na minha cara, que eu não era filha de sangue dos meus pais”, era sempre um bafafá, uma revolta.
Na época, eu estava aprendendo a escrever, e me lembro especialmente de uma conquista da qual me orgulho muito: consegui escrever semelhante às letras cursivas dos livros de caligrafia que eu tanto fazia! Eu estava em casa e a primeira pessoa que mostrei foi para a minha mãe. Ela ficou muito animada. Mas sempre tinha a seguinte fala: Vamos melhorar essa letra?
Sem muitos detalhes recordo-me de como foi aprender a ler, foi um tanto difícil, eu tinha uma dificuldade enorme com as letras P e B, eu sempre trocava elas, Irene, minha mãe, apesar de ter estudado só até a quarta série, tinha o prazer de me ensinar a ler todos os dias depois da aula, em casa, todo dia de manhã eu estudava na escola, e todos os dias na parte da tarde com minha mãe, lembro-me até do método que ela utilizava, P com A, PA, T com O, TO, o que está escrito Aline? Ela perguntava.
Meu pai sempre dizia: “Não quero que você tenha o mesmo futuro que eu”, “estude pra não encarar um trabalho braçal”. Mesmo com toda dificuldade, foram os melhores anos da minha vida, nossa geladeira era farta, meu pai nunca deixou faltar, lembro do carinho e empenho em sempre me deixar muito arrumada, lembro do amor que minha mãe tinha em preparar minha lancheira; outra memoria muito rica, é a moto de meu pai, ele tinha uma CG, seu escapamento fazia um barulho que dava para escutar a quilômetros.
Meu pai era muito criativo, ele conseguiu fazer uma espécie de adaptação em sua moto, de alguma maneira ele arranjou um caixote na parte de trás da moto, para que, assim, ele colocasse as caixas térmicas com os salgados e sucos em cima da moto. Lembro-me, com um largo sorriso, das muitas vezes em que ele me carregou dentro desse caixote, quando pequena eu amava a aventura, mas confesso que, do 3º ao 5º ano, pedia pra ele me deixar uma esquina antes da escola, pois todo mundo me chamava de: “a menina do caixote”, e meu pai, muito amoroso, me deixava em frente à escola, nunca uma rua antes, lembro do sermão cheio de sabedoria, hoje sou o que sou por conta desses momentos e da educação que tive desde berço.
Na terceira série, eu tive uma professora de quem me recordo muito bem, Bia, foi uma das piores professoras que já tive, escrevíamos textos, muitos textos, textos estes que eram transcritos do livro para o caderno. Em um determinado dia mostrei minha escrita para ela, foi horrível, ela fez um X enorme e vermelho no meu caderno, disse que minha letra era pior do que a de medico, não me lembro muito bem o motivo, mas sei que cheguei em casa com a orelha ardendo, ela havia torcido. Minha mãe no outro dia, foi me defender, eu agradeço muito por essa experiência não ter acabado com o meu gosto pela escrita.
Aos 9 anos, meus pais decidiram vender a chácara em que morávamos e o pouco de vacas que ali tínhamos, e nos mudamos para a cidade de Ariquemes, passei a estudar na EEEFM Francisco Alves Mendes Filho, cursei do 5º ao 8º nessa escola.
Aos 10 anos, lembro-me especialmente de uma conquista da qual me orgulho muito: fui Aluna Nota 10, na cidade de Ariquemes, no meio daquele ano. Guardo até hoje o certificado “Aluno Nota 10” que recebi por ter me classificado como primeira colocada da classe, e segunda colocada da escola toda. Essa honra fez minha mãe muito orgulhosa, pois ela comentava com todos. Até a quinta série, minha mãe me acompanhou com frequência à escola, participava de todas as reuniões, sempre buscava os Boletins, eu amava, pois sempre era muito elogiada.
A rotina e a frequência ao ambiente escolar me cravaram algumas memórias. Eu quase não faltava às aulas. Fecho os olhos e quase que escuto o barulho que fazíamos ao sermos liberados para o recreio ou na saída. Essas recordações me emocionaram muito e me trouxeram uma memória olfativa e gráfica dos lugares em que tantas vezes estive: a cantina, a quadra de esportes, as salas de aula, os corredores, o banheiro, a fila. Ah, a fila... Ali acontecia todo o ritual antes de adentrarmos a sala, ao qual obedecíamos.
Orávamos antes de entrar na sala de aula todos os dias o Pai Nosso, e cantávamos o Hino Nacional. A coordenadora "puxava" as orações por meio de um microfone. As filas eram classificadas por turmas, "menores na frente e maiores atrás", na frente de cada fila tínhamos o professor de cada turma. Quando terminei o ensino fundamental, meu pai começou a adoecer, então nos mudamos para Rio Branco-AC, meus irmãos já moravam há anos aqui, e tinham uma pequena empresa na época, empresa que foi construída com a venda da chácara em que morávamos em Rolim de Moura. Como o amor de pai e mãe são puros, são capazes de vender tudo o que tem para investir nos sonhos dos filhos! A empresa cresceu, meus irmãos trabalham muito bem e logo ficaram conhecidos, hoje meus pais têm casa própria, e todo domingo a casa está cheia, filhos, noras e netos, para um almoço em família.
[...] Aos 16 anos terminei o Ensino Médio e, com a conclusão do Ensino Médio, me vieram muitas responsabilidades e sonhos, sonho de me tornar autorrealizada em todos os aspectos da vida.
A ESCOLA EM MIM
Por N motivos não ingressei na faculdade assim que sai do Ensino Médio, fiz alguns cursos profissionalizantes, técnicos e me desdobrei para cuidar de meu pai. Descobrimos que ele tinha Mal de Parkinson... Um dia, ao atravessar a rua, meu pai sofreu um acidente! Quebrou a clavícula, teve uma lesão no cérebro e na coluna, mais uma vez tive que parar um curso que estava em andamento (Técnico em Segurança do Trabalho), para cuidar dele no Pronto Socorro de Rio Branco e em casa, infelizmente não consegui retornar o curso.
Passou-se um tempo e ingressei na UNINORTE, me graduei na faculdade de CST Redes de Computadores, amo de paixão essa área, consegui fazer uso de meus conhecimentos durante um tempo, porém, percebi que a tecnologia era uma paixão, um hobbie, não consegui me completar, então, prestei ENEM e passei para o curso de Licenciatura Plena em Pedagogia na Universidade Federal do Acre. Nem todos da minha família receberam bem a notícia de que havia me inscrito para o Curso de Pedagogia. Por causa disso, eu me cobrei muito naquele dia. A primeira semana, no Curso de Pedagogia, foi determinante para as minhas possíveis escolhas posteriormente. Participei de técnicas de dinâmica de grupo com a professora Aline Nicoly, conhecemo-nos na turma e os professores também.
[...] Os trabalhos acadêmicos, casa, e cuidados com o meu pai, começaram a me consumir muito tempo, mais do que eu imaginava, fiquei sobrecarregada. A experiência de estar em uma universidade, cujo conteúdo me parecia familiar, embora eu não o dominasse, evidentemente me fez ver que, no ensino básico, eu não tive o alicerce necessário para aderir ao que estava sendo ensinado, com isso, passei a estudar mais, pois eu queria ter uma clara compreensão dos textos acadêmicos.
Quando adentramos o universo acadêmico vemos o quanto somos um aluno esforçado, nos esforçamos muito para não sermos um aluno medíocre.
PORQUE PEDAGOGIA?
Quando alguém pergunta:
- Por que escolheu a Pedagogia?
A primeira resposta que esperam ouvir é:
- Ahhhhhhh! Porque adoro crianças!
Depois, claro, um comportamento meigo e um sorriso largo…
Não, não escolhi a Pedagogia porque adoro crianças, apesar de que adoro, ensinar nem sempre é um sonho, o meu sonho! Admito que não foi até recentemente, sempre tive "medo" de crianças, sabe !? Imagine todas essas crianças gritando, chutando e mordendo a criança ao lado. Não é uma cena muito confortável.
No momento da escolha do curso, lembrei-me de algo, lembrei que era muito boa em ensinar, sempre aprendi muito fácil, ainda quando criança brinquei de muitas coisas e, dentre essas brincadeiras, eu brincava de estudar e de dar aula para os meus sobrinhos e bonecas, eu sempre fui uma verdadeira amante do estudo, e, claro, a experiência de ter dado aulas na Escola Bíblica Dominical para crianças, na igreja da qual eu fazia parte, me ajudaram na escolha de fazer Pedagogia.
[...]Atualmente, estou no 5º período, e recentemente tive a oportunidade de estagiar em uma escola particular, um Centro de Educação Infantil, e adivinha? As crianças são do jeito que eu falei, elas acabam gritando, brigando, chutando, mas quer saber, elas são uns amorzinhos! Eu vejo a importância do professor na vida das crianças, a maneira como ele ensina, a maneira como se preocupa, a maneira como ele trata e a confiança que você constrói com eles é muito gratificante!
odas as experiências que tive ao longo do curso, foram de extrema importância, elas me fizeram amar ainda mais a escolha que fiz! Temos professores maravilhosos, temos oportunidades únicas dentro da Universidade, PIBID, PIBIC, MONITORIA e vários outros programas. Desses três que foram citados, tive a oportunidade de participar de dois, e ambos me fizeram querer mais e mais, além dos projetos que participei, me atento a falar dos professores, sempre tem aquele que é um espelho, um exemplo a ser seguido, tive e tenho professores maravilhosos, professores de uma humanidade esplêndida, houve momentos em que desanimei, momentos em que fiquei muito sobrecarregada, mas a compreensão e o carinho de alguns, me impulsionaram a continuar.
A professora Eva, no momento mais difícil, me viu chorar e esteve ao meu lado, lembro-me de ter saído da sala chorando, e quando retorno, um lindo livro na minha bolsa com uma dedicatória! Professor Pelegrino, quantas vezes me ouviu, professor João, que me deu conselhos de um pai, como ele mesmo disse: “O lado pai brotou”, professora Giane, pagou uma consulta para o meu pai, e os demais professores sempre muito compreensivos com a minha situação, não lembro de ter sido prejudicada em nenhum momento, mesmo quando faltei mais de 15 dias seguidos, pai acamado e mãe que havia acabado de sair de uma mesa de cirurgia, aqui deixo o meu agradecimento a todos vocês.
Me atentei a falar sobre a humanidade dos que me marcaram nessa caminhada, mas quero falar sobre a competência de todos, professores maravilhosos e com um vasto conhecimento para nos guiar no caminho da educação, João, Tatiane, Igo, Lurdinha, Marcelo Murilo, Alcicleia, Franciana, Grace e vários outros professores, extremamente competentes, conseguem abrir a nossa mente e nos tirar da caverna, referência ao Mito da Caverna de Platão, alegoria que estudei com a professora Eva. E as poucas amizades que fiz? Espero levá-las para a vida.
Foi nesse jardim de flores e paredes que me tornei parte do mundo, deixei a escola fazer parte do que fui, do que eu sou e do que eu serei. Como resultado, é assim que me vejo: Eu no mundo e a Escola em Mim, Eu no mundo e a Educação em Mim.
Por que escolhi a Pedagogia?
Porque adoro educação! Uma educação que transforma, cria oportunidades, faz admirar e dá voz às pessoas!
Educação não transforma o mundo.
Educação muda as pessoas. As pessoas transformam o mundo.
Paulo Freire.
DELORY-MOMBERGER, Christine. Formação e socialização: os ateliês biográficos de projetos. Educação e pesquisa. V. 32, n. 2, São Paulo: FEUSP. 2006. p. 359-372. JOSSO, Marie Christine. Experiências de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004.
SILVA, Daniele Cristina Agostinho. O QUE É UMA AUTOBIOGRAFIA. Mestra em Literatura e Crítica Literária (PUC-SP, 2012). Graduada em Letras (PUC-SP, 2008).
FERREIRA, Geraldo da Aparecida. Entre memória e autobiografia: narrativas de Cyro dos Anjos e Darcy Ribeiro, 2013, 187f. UFMG. Tese (Doutorado em Estudos Literários). Belo Horizonte, 2013.Recolher