P/1 – Senhor Luiz, primeiramente eu gostaria de agradecer a sua participação nesse projeto e para começar eu gostaria que o senhor me falasse o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento.
R – Luiz Cláudio Vieira, nasci em Regente Feijó em 26 de agosto de 1965.
P/1 – E qual o nome dos seus pais?
R – Orestes Vieira e Alice Silveira Vieira.
P/1 – E o que eles faziam, você pode descrever um pouquinho?
R – A gente veio pra cá em 75, teve um êxodo do interior pra São Paulo nessa época porque no interior era muito difícil conseguir as coisas e se dizia que São Paulo estava crescendo demais, tinha que melhorar muito, então a gente veio exatamente nessa época, onde se dizia que o Brasil tinha que ir pra frente né? Então a gente veio pra cá, depois não sei se foi muito pra frente, mas, por exemplo, ele era comerciante lá, meus avós tinham comércio, meu avô vinha pra São Paulo pra comprar como todo mundo né? Pegava o trem da Sorocabana, vinha, parava aqui, já trabalhava com eletrônica também e vinha pra cá comprar as coisas e vendia lá. Meu pai ele tinha uma granja na verdade e minha mãe era (corte no áudio) nessa época, em 75, quando a gente resolveu vir pra cá, meu pai vendeu tudo lá e veio montar uma fábrica em São Caetano, uma fábrica de brinquedos. Essa fábrica durou muito pouco tempo porque em 82, praticamente, quando o governo decidiu acabar com todo comércio praticamente porque teve um monte de problemas que, eu na época era muito pequeno (corte no áudio) tudo quebrava. Era greve do pessoal da construção civil, era greve dos metalúrgicos, ai que surgiu o Lula também, em 79, 80, porque realmente era muito difícil. O governo mudava muito, era uma política que mudava muito e muito rápido né? Eu lembro muito bem que em 80, em 79, nas greves dos metalúrgicos lá de São Bernardo meu pai já estava quebrando de verdade porque não tinha como segurar aquilo. Proibiram a importação, o governo mudava muito a política né? Então ai meu pai resolveu, parou com tudo, com a parte industrial e foi ser, vender na 25 de março. Como ele tinha os clientes e comprava da fábrica, ele compra de algumas fábricas e vendia e aí que eu comecei a trabalhar mesmo no comércio. Comecei com ele a comprar e vender e fazer o que era possível pra gente se sustentar na época. E aí minha mãe, que é interessante, acho que a mulher é mais importante na família de verdade, ela (pausa emotiva), a gente passava um sufoco danado. Ela montou o comércio dela, foi tocando as coisas dela e eu ajudando no que eu podia né? Aí foi continuando a escola, estudando tal, meu pai continuou com o negócio dele. Aí em 87, eu tinha 19 anos, não, 19 não, em 85, eu tinha 19 anos (corte no áudio) com o seguinte propósito: tinha que ter dinheiro pra montar alguma coisa pra mim e foi, 85, 86, aí eu consegui alguma coisa, montei, eu ia montar alguma coisa, mas ai não dava ainda, ou eu montava alguma coisa pra comércio, ou estudava. Só que naquela época não é igual hoje, que faculdade é fácil, se você não consegue numa estadual, você paga e entra numa zé mané das couve aí. Então era bem mais difícil, aí eu resolvi optar pela educação. Eu fiz acho que um ano e meio de cursinho e aí eu fiquei na dúvida de fazer, eu gostava muito de política, da parte de direito e tal, aí ou eu ia fazer direito ou ia fazer engenharia, que também era outra paixão. Direito não ia dar, eu ia ser preso, aí eu resolvi fazer engenharia. Prestei, eu passei em 26º lugar no Mackenzie sem ter condições nenhuma, não tinha condição nenhuma de me sustentar, mas passei, toquei, fiz a faculdade, de lá comecei a trabalhar na Santa Ifigênia. Isso foi muito rápido, você nem percebe o tempo como passa e foi uma das coisas que eu mais (corte no áudio) eu tinha um bom salário tudo, mas eu desisti de tudo, eu fiz meu caixa, trabalhei três anos, não gastava um centavo. Não saia, não passeava, guardava tudo, absolutamente tudo. Quando eu entrei na faculdade eu tinha dinheiro pra começar e terminar pagando todas as prestações. Eu vendi o carro que eu tinha, tudo (corte no áudio) me dedicar totalmente a isso. Aí quando eu me formei fiz bicos de manutenção, porque eu gostava muito dessa área (corte no áudio), na Santa Ifigênia já, isso em 89. Aí em 89 eu fui trabalhar nessa empresa e assim, ela faturava hoje o equivalente a oitenta mil dólares por mês. Eu entrei e em três meses ela começou a faturar 120 mil e eles fizeram uma grande besteira, eles me prometeram 20% do lucro de comissão. Em dois anos eu era dono da empresa. Aí eu não tive o que fazer, eles que propuseram, não fui eu. Um dia teve uma reunião, eles não sabiam o que fazer porque eu tinha mais pra receber do que a empresa valia (corte no áudio). Propuseram, falaram assim: “Você fica com a empresa e agente vai embora” aí eu falei: “Não! Vou pegar uma empresa...” no Brasil é muito complicado porque é muito fácil você abrir e é muito difícil você fechar. Aí eu falei: “Não. Eu quero o estoque só. Vocês ficam com a empresa, eu quero a parte do estoque, não preciso ter lucro mais nenhum, não quero dar prejuízo pra ninguém. Vocês mantenham a empresa, mas eu quero o estoque que tem”. Montei a minha empresa sozinho, sem sócio, sem nada e sem dívida, que foi outra grande sacada que eu tive durante... Que é a grande sacada de verdade, porque nesse país ou você paga imposto ou você tá perdido. Ai eu montei uma empresa limpa, sem ter problema nenhum e tô tocando há 21 anos sozinho. Porque sócio é muito bom pras férias só. Porque você pode até errar, mas quando você erra sozinho o erro é seu, quando você erra com um sócio a culpa é sua, então é muito difícil ter uma sociedade hoje no Brasil, porque você já tem um sócio, o maior de todos que é o Estado né? O Estado ele é, não é patriarcal, não. O Estado é carrasco, porque você tendo lucro ou prejuízo você tem que pagar, não interessando como. Até tem uma frase interessante que me contaram essa semana que foram perguntar pro Maluf qual era o político mais corrupto, mais bandido que ele conhecia. Ele pensou dois segundos e respondeu: “O que não faz”. E eu sou petista desde criancinha, de criação. E eu falei: “Como o que não faz?” É que o dinheiro no Estado entra todo dia. Todo dia entra dinheiro nele. O duro é o cara que entra o dinheiro e ele não faz nada. E ele tem razão! Porque o Estado é, todo mundo que é comerciante sabe, o Estado atrapalha o comércio, infelizmente. Ele é um repressor, ele pune, ele atrapalha de mais e não ajuda ninguém (corte no áudio) Prefeitura de São Paulo, que quer acabar com a região da Santa Ifigênia, que é um dos maiores arrecadadores de impostos do Estado e pra nada. Por pura vaidade porque a família Kassab, não sei se o pessoal sabe, ela vivia de comércio de imóveis né? Eles eram corretores. Então é isso que eu acho interessante, quando se vota num candidato, numa pessoa, tem que se pensar qual é o passado dela. Quando você vota num engenheiro ele vai construir, se você vota num médico, ele vai pensar em saúde, que é o que ele conhece. Ele quer vender imóveis. Então isso é muito complicado. Esse é um resumo básico da minha vida, assim rápido e prático, porque de quando eu montei a minha empresa até agora só foi trabalhar o tempo todo e pensar em crescer, comprar prédio próprio. Isso foi assim, passo a passo, cada ano é uma meta: “Vou comprar minha casa, vou comprar meu carro, vou comprar isso” e é interessante, às vezes o comerciante ele se esquece de uma coisa bem simples que é no começo da empresa né? Porque acho que ele deveria... Eu fiz um curso no Senac que foi interessante, Administração de Pequenas Empresas, quando eu fui montar a minha empresa. Você tem uma visão muito diferente do que é. E lá dizia o seguinte: “Pague seus impostos e trabalhe com esses custos”. E hoje eu sou vice presidente da Associação dos Comerciantes e tudo mais e eu conto, eu falo isso pra todo mundo: “Calcule seus custos com os impostos”, mas não! As pessoas falam: “Você repassa o desconto que você poderia dar, sonegando” Isso é besteira, você tá tirando, você tá criando um problema pra você pra passar pro cliente que tá te roubando na verdade. O bobo é o próprio comerciante. É muito complicado isso, às vezes tem algumas atitudes que a gente toma na vida que são, as pessoas falam: “Mas você é trouxa de fazer isso”, só que meu filho é um exemplo, (corte no áudio) o dia que muita gente for exemplo acho que o país vai começar a mudar né? Porque eu vejo a molecada hoje, há uns anos atrás pintaram a cara de verde e amarelo pra tira o Collor. O Collor é um imbecil, é um pau mandado. Mas hoje, pra você lutar contra a corrupção, você não pode ser corrupto e não pode promover a corrupção. Se você para numa blitz de trânsito, você tá bêbado, pô! Fala, vai pra cadeia e cumpre a sua pena, ou então não bebe. É mais fácil você fazer o correto né? É difícil, é complicado, mas se você começar a ter essa postura, as coisas começam a mudar nesse país, e essa é uma atitude que a gente tem que começar a pensar. Isso passou muitos anos, o pessoal me criticava, hoje é uma coisa interessante: as pessoas te criticam por você não fazer o errado, mas quando querem saber o certo perguntam pra você. Esquisito né? Eu tenho muito isso, o pessoal vem muito me perguntar, pedir informações, tal, eu falo: “Mas você devia saber o que é” “Mas eu não sei”. A pessoa não sabe fazer o certo, gozado isso. Não existe curso pra comerciante. Ninguém te obriga a fazer uma faculdade pra ter uma loja, ninguém te ensina a ter uma loja e te cobram né? Isso fazem. Isso é interessante: o Estado vem e te pune por não te ensinar. É isso que a gente tem que começar a pensar, são essas coisas que a gente tem que começar a mudar. Eu acho que antes de um fiscal ir na tua loja te prejudicar, porque ele vai pra te prejudicar ou pra criar dificuldades e pra te vender facilidades, seria: “Ó, você tá errado nesse ponto, corrija. Daqui a seis meses eu volto, se você continuar errado eu te fecho tua empresa”, mas não é assim. Deixa correr solto pra pegar o máximo que pode. Esses são acho que os problemas do comércio hoje.
P/1 – Agora vamos esmiuçar essa história toda, vamos voltar lá pra o Luiz pequeninho em Regente Feijó. Eu quero que você fale pra gente como era a sua casa na infância, você lembra?
R – Lembro, até mesmo eu tinha um quintal enorme, tinha mil e quinhentos metros quadrados. Então a casa era pequena, tinha dois quartos, era uma sala, mais um quarto, um banheiro, uma copa e uma cozinha e tinha um depósito no fundo. Continua a mesma coisa, minha mãe continua morando lá. E um quintal enorme, tinha um campo de futebol (corte no áudio). Acho que todo comerciante é meio palhaço né, eu era o palhaço do circo da turma, era um barato!
P/1 – Você tem irmãos?
R – Tenho mais dois irmãos. Um é gerente de uma pizzaria e o outro teve um problema que foi síndrome do pânico né? E até hoje tá meio, ainda tá com alguns problemas, mas tá levando numa boa.
P/1 – E como é que era você criança, do que você gostava de brincar?
R – Se eu te contar que eu gostava de ser comerciante é brincadeira. É verdade. A gente brincava muito de fazer loja. Eu sempre fazia, isso era palhaçada, eu tinha seis anos e meu pai tinha granja, tem ovo, ovo selecionado né? Então você tem vários tamanhos de ovos, e os pequenos ninguém queria, então sobrava. Aí tinha um menino, eu tinha seis pra sete anos isso na época, tinha um menino que cuidava da granja também e também não ganhava muito, a gente trabalhava a semana inteira e aí no domingo de manhã tinha feira, a gente colocava num carrinho e levava pra vender. E vendia viu, bicho? (risos) A gente vendia muito barato e vendia bastante, mas era muito dinheiro que dava porque a gente não pagava nada, ia jogar fora aquilo lá. Aí sobrava laranja na época, a gente pegava laranja e levava pra vender, aí tinha goiaba, a gente ia vendendo, fazendo isso. Eu cheguei a ter 47 cruzeiros guardados, era dinheiro pra caramba, dava pra comprar bicicleta, comprar coisa pra caramba. (risos) Aí quando meu pai veio pra São Paulo eu dei o dinheiro pra ele pra ele poder vir pra cá. Umas histórias legais...
P/1 – E você comentou que seu avô tinha uma loja também, era comerciante de materiais elétricos, você chegou a ter contato?
R – Tinha. Na verdade, assim, de cinco anos em diante eu trabalhava com eles lá, porque a partir de cinco anos você já começa a ter noção de alguma coisa. Primeiro eu ficava olhando o pessoal pra não roubar porque a loja era um pouco grande, aí fazia pacote e tal. De oito anos pra frente até ajudava a vender, isso é... Porque eu vim pra São Paulo com nove anos, então já vivia com eles lá. Minha família inteira é de comerciantes. A minha avó foi uma pessoa visionária. Ela era uma italiana que veio pra cá com o pai pra conhecer o Brasil, pra passear, que tinha uma tia aqui, a mãe dela tinha morrido na Itália e ela veio pra conhecer. Só que o pai era arquiteto, então ele era muito rico na Itália e veio pra cá, pegou malária e morreu. A tia, muito boazinha, ela tinha acho que nove anos, esperou ela fazer 12 e casou ela, aí foi pra Itália tomar conta da fortuna do pai e abandonou elas aqui. Então ela casou com um senhor bem mais velho, que devia ter uns 30 anos, ela tinha 12 pra 13 anos, que ficou cego e ela foi uma pessoa visionária de verdade. Ela não tinha condição de (corte no áudio) que era impossível nessa época, mas ela formou todos em alguma coisa técnica. Eu tenho um tio farmacêutico, tenho um tio que é mecânico, que é carpinteiro. Hoje são donos de rede de farmácia, de fazenda. Tinha um que foi pro Paraná, acho que na década de 50 pra 60 a companhia Cianorte ela montou no norte do Paraná, para desbravar o Paraná. Então ela dava terras e tal. O Brasil nessa época era muito assim. Eles foram pra lá por quê? Porque: “Se vão dar terra vão construir alguma coisa” ele montou uma loja de material de construção e de ferramentas. Ficou muito bem. Aí quando ele tinha uma certa idade dividiu tudo pros filhos e começou a fazer negocinho, ficou mais rico ainda. Então é, todos eles, até hoje, minha mãe estava contando ontem de um tio de Cianorte, Cianorte não, de Medianeira, divisa quase com o Paraguai. Foi pra lá e montou uma loja de sapato. Esse era, ele era farmacêutico, mas farmácia começou a ficar... Todo mundo que montava as redes começaram a quebrar os pequenos e ele montou uma loja de sapatos, tá melhor ainda. Então, assim, quando você tem o sangue de comércio não adianta muito, fala de mais também né?
P/1 – Qual a sua primeira lembrança da escola?
R – Vixiii, a expulsão! Não foi fácil, não. Me colocaram num colégio de madre, bicho! Caramba, aquela foi demais! (risos) Me colocaram num colégio de madre e, assim, toda vez que você levava uma bronca, de castigo você ganhava um santinho né? Então você ficava na sala da diretora assim tem uns santinhos legais, Aí você levava o castigo, ficava lá, você recebia o perdão da madre superior e ganhava um santinho (corte no áudio). E a minha mãe super contente né: “Pô, meu filho é um santo”. Até um dia que chamaram ela que não aguentavam mais (risos) e me tiraram da escola. Aí eu fui pro SESI, porque era o melhor colégio que tinha na cidade, no primeiro dia de aula (corte no áudio) era demais! Era o capeta em forma de gente. Mas tinha muito amigo, isso que era legal. Aí até um dia que eu encontrei uma professora muito legal, que eu acho que assim, quando a criança é hiperativa você tem que entender a pessoa né? Dona Terezinha, ela era uma pessoa muito, muito legal mesmo, tanto que eu era o pior aluno de todos e passei em primeiro lugar da sala. E quando a pessoa entende o que a gente faz, o que a gente quer fazer, porque é duro você ser, às vezes, um pouco acima da média né? As pessoas te criticam, te isolam, então ela entendeu, foi muito bem, mas, nossa, demais! Eu repeti a segunda série porque a professora chegou pra mim e falou que era pra tomar vacina né? E eu tinha tomado porque o posto de saúde ficava em frente da minha casa, aí eu falei: “Eu já tomei” e ela falou “Não, você tá mentindo” “Eu faço de tudo menos mentir, já tomei” “Não” aí eu mostrei pra ela, aquela tríplice que marcava e ela falou: “Não, você vai tomar de novo” e eu falei: “Eu não vou tomar, eu já tomei”, ela pegou, me puxou pela orelha, naquela época o professor podia bater né? Eu falei: “Olha, se a senhora fizer isso eu vou meter a mão na sua cara”, ela falou: “Duvido”, eu falei “Ah, é?”, não teve jeito. Aí fui expulso, mas chamaram a minha mãe, tal, minha mãe brigou por minha causa porque realmente eu estava falando a verdade e me deixaram na sala. Adianta? ZERO! Eu podia acertar tudo, era zero! Aí repeti e minha mãe deixou pra eu aprender. Nossa! Ajoelhava no milho, cara como era difícil! Vocês fugiram de umas boas, hein, cara. Ajoelhar no milho atrás da porta era um saco, bicho! E a classe inteira dando risada porque sabia que eu ia sair de lá dando risada. O professor queria morrer com a gente, mas era bem legal, nossa! E gozado, o cara que devia punir a gente que era o senhor Sinclair que era um cara, gozado, foi pracinha na guerra e em homenagem foi ser guarda na escola. Coitado do velho! E ele adorava a gente! Mandava a gente ficar de castigo, chegava na sala, fechava a porta, gritava, gritava e a gente sentando e contando piada. Era uma figura, era bem legal! Interior é muito diferente né? Nossa, a gente fazia cada uma, fazia campo de futebol, tinha um terreno baldio, a gente carpia, fazia, ia buscar saco de palha de arroz, arrumava tudinho aí o dono chegava, estava tudo arrumado, tudo planinho né? Fazia uma casa, tirava a gente. Isso era comum lá no interior. Nossa, nadar, caçar passarinho. Era muito diferente. Tanto que quando, agora mesmo, quando meu filho fez nove anos, eu decidi sair de São Paulo e morar no Embu, numa chácara, pra ele ter pelo menos alguma noção do que era, assim, morar longe de São Paulo. E foi, acho, que a melhor coisa que eu fiz porque São Paulo é muito urbano demais, tem falta de sensibilidade às vezes, tem uma vida artificial demais. E lá ele fez de tudo, acampou, subiu em árvore, brincou, nadou no rio, fez de tudo. Até hoje faz, é diferente.
P/1 – E como é que foi essa vinda pra São Paulo, o que você achou, saindo de uma cidade do interior e chegando numa cidade tão grande?
R – Acabou minha vida. De verdade. Minha vida acabou totalmente. Imagina você pegar um passarinho e trancar na gaiola, só isso. Porque eu vim pra cá, não conhecia ninguém, não tinha vizinho. A gente veio morar numa casa na Vila Monumento, era muito legal, mas na frente da minha casa tinha um campo de futebol, só funcionava de sábado e domingo. Então não tinha vizinho na frente, do lado direito tinha uma velha que tinha uns 80 anos, do lado de lá tinha uma que tinha 90, então não tinha nem netos, coitada. Então eu era criado solto e vim pra cá e não podia sair porque nem tinha como sair. Então eu ia pra escola e voltava pra casa, ia pra escola e voltava pra casa. Realmente foi mais complicado. Ai dos nove aos 14 eu praticamente só fiquei em casa, estudava, ia pra escola, saia muito pouco, foi uma época bem difícil. Dos 14 em diante comecei a trabalhar, por isso que eu até gostava de trabalhar, porque aí comecei a conhecer, passear, andar, nossa! Aí eu conheci São Paulo inteiro, não teve mais jeito.
P/1 – E você trabalhava com o seu pai?
R – É. Nessa época em 82 ele fechou a empresa e não tinha ajudante, então eu ia ajudar ele. Pegava o carro de manhã, eu ia pra escola de manhã, à tarde eu ia trabalhar com ele. A gente rodava São Paulo inteiro, era legal. Aí eu conheci a 25 de março, comecei a trabalhar lá, que é um lugar fabuloso, é uma das coisas que eu mais me surpreendi na vida. Lá existe uma lei que é a lei do fio do bigode, sua palavra basta. Isso antigamente né? Porque eram os libaneses, os sírios, os armênios, e ele dava sua palavra, falava pra você: “Olha, tá fechado”, te dava um papel escrito o valor e mandava você vir buscar o dinheiro tal dia”. Só. Não tinha esse negócio de fazer duplicata, mandar. Não, era palavra. Se você chegasse lá com o papel e ele não estivesse lá e o filho ou a mulher estivessem lá, olhavam, não interessa, pagava. Era uma coisa que eu achei assim, foi uma das coisas que mais me surpreendeu quando eu sai da 25 e fui pra outros lugares, porque é uma burocracia, uma desonestidade, e lá não, era o fio do bigode mesmo, uma coisa impressionante, me surpreendi, porque era um respeito com todo mundo: “Deu a palavra? Acabou” Não tinha isso. E isso foi acabando né? Foram vindo os coreanos, os chineses e aí começou a complicar as coisas.
P/1 – E como é que era a época da faculdade, um pouco mais jovem, o que você gostava de fazer?
R – Beber! Ia fazer o que na faculdade? (risos) Todo mundo vai na faculdade pra beber, é mentira. Meu filho tá na dúvida se vai fazer, eu falei: “Pedro, vai que você vai beber pra caramba”. Eu tive muita sorte na faculdade, muita, muita, muita. Eu fiz Eletrônica. Na minha sala, não tô falando nada contra mulheres não, mas tinham duas só, então eram 98 homens duas mulheres. Não tinha briga, não tinha conversa, era só festa, chope, cerveja e o pessoal era muito unido, até hoje. A gente fez 21 anos de formado agora, fizemos uma festa do pessoal, a gente se reúne até hoje, foi muito legal. Até porque não tinha muita briga, porque não tinha esse negócio de namoro, nada disso, então foi um pessoal muito legal, nós entramos em cem, a gente se formou em 72, 73 pessoas e foi a turma inteirinha, sempre muito legal e foi uma época que (corte no áudio) mesmo. Eu fiz porque eu quis, porque eu queria, porque eu desejava, era o que mais queria. Eu queria fazer a faculdade porque eu não via possibilidade de crescer, de melhorar, mesmo sendo comerciante, sem ter cultura, sem ter educação, porque é o que eu posso te falar: você é o que você pode provar, infelizmente. Esse país tá cada vez pior com isso, porque você pode ser o maior gênio do mundo, se você não provar que sabe, não adianta nada. E isso é uma ignorância em certos momentos, mas também eu acho que é um pouco de verdade porque acrescenta né? Por mais que você seja inteligente, por mais que você saiba as coisas, você tem que provar pra você mesmo às vezes. Hoje tem uma facilidade enorme, você tem canais de Discovery, um monte de coisas que você pode sentar lá, assistir, um monte de... Existiu uma revolução que eu acho que vocês não entenderam ainda que foi a Internet. Ninguém imagina o que a Internet fez com o comércio, com a vida das pessoas. Foi um negócio, assim, absurdo! As informações hoje são de graça. Por exemplo, eu sempre fui atrás de informação, pesquisava, corria atrás, tentava descobrir algumas coisas. Hoje você dá um clique, você descobre. Então não existe mais aquele cara que descobriu alguma coisa de novo: se alguém viu no mundo, já estão sabendo. Então ficou mais difícil a concorrência, o mercado digital. É muito mais complicado, porque hoje a pessoa vai atrás de preço, não vê histórico do comerciante, não vê nada. O comércio talvez esteja um pouco mais difícil por causa disso. Hoje você entra num site que te promete que você vai comprar da China, receber aqui, não pagar impostos. E o meu sócio? Não vai fazer nada? Tá difícil e a gente tá começando a brigar, porque meu sócio quer pegar meu dinheiro, mas e o dinheiro do chinês, quem vai pegar? Então a Internet foi uma revolução muito grande, mas perigosa também. Você consegue fazer uma bomba. Hoje eu estava vendo uma reportagem que um cara em Nova Iorque estava montando uma bomba pra estourar uns carros. Aprendeu na internet! Tem curso (corte no áudio). Então a Internet é muito boa, fantástica. Hoje um político pode mentir, mas não pode mentir por muito tempo, porque aparece uma foto que circula e muda tudo. Mas também atrapalha um pouco, o comércio principalmente. Tem coisas que não tem muito sentido de acontecer, comércio eletrônico tem que ser, por exemplo, tem alguns sites, Mercado Livre, Ebay, que você compra coisas que são roubadas, e aí? O pessoal da faculdade comenta muito isso inclusive, porque a gente às vezes se encontra: “Pô, você viu?”, não tem como concorrer com algumas coisas, não tem como mudar, o comércio sofre muito por causa disso. Isso é um ponto meio, acho que tá na hora de tomar providências também, tem que ser justo pra todos os lados. Eu tenho site desde 98, quando começou a pintar a Internet eu já fui atrás, ver como é que era, como que funcionava. Tinha teletexto antigamente, o pessoal nem se tocava que já era Internet. Eu já estava correndo atrás de teletexto pra ver se era possível mandar mensagens pra muita gente (corte no áudio), então isso é interessante, o comércio muda muito rápido. É um negócio absurdo! Se você pensar que em mil novecentos e sessenta o pessoal vivia de sair do interior, pegar o trem, vir aqui comprar São Paulo, voltar pro interior e vender pelo dobro do preço, hoje você clica no Lojas Americanas e tá na sua casa. E coitado do mascate, cadê ele? Tá por aí.
P/1 – E daí quando você saiu da faculdade você já entrou direto nessa loja?
R – Já, foi na época da faculdade exatamente. Como eu te falei que eu estava querendo pagar a faculdade inteira, mesmo se eu não tivesse emprego eu estava garantido. Aí com seis meses na faculdade eu arrumei um emprego, já fui ser gerente de loja. Foi acontecendo muito rápido porque quando eu estava lá, os quatro anos que eu fiquei na loja e lá...
P/1 – Onde era a loja?
R – (corte no áudio) Eu fui pra lá em 88, em 90 eu já estava montando a minha. E foi, assim, muito rápido, porque na faculdade mesmo eu comecei a conhecer o pessoal, comecei ir pra Santa Ifigênia pra montar, fazer manutenção, o pessoal comprava peça. Aí eu ia numa loja comprar peça e o cara: “Ô, você quer trabalhar comigo?” “Não, com você não” aí fui, fui, até que me chamaram em uma que era uma loja de instrumentos de medição mesmo e os caras fabricavam. Quer dizer, o cara fabricava e vendia na Santa Ifigênia, mas isso é meio ignorante né? Porque ele vai fazer concorrência com os clientes dele. Ai eu expliquei pra ele, eu falei: “Ó, além de você perder seus clientes aqui, você vai perder os seus clientes finais também. Você tá sendo desonesto com todo mundo” “Ah, o quê você vai fazer?”. Aí eu tive uma idéia assim, eu falei: “Eu não quero emprego, porque eu não sei se eu posso, eu tenho que estudar, mas eu posso fazer uma proposta: o que eu vender você me dá uma comissão?” “Ah, 20% do lucro é seu”, dançou. Eu fui em todos os colégios técnicos de São Paulo, todos. Aí eu pegava um aparelho e dava de presente pra escola, em troca eu ensinava os alunos a usar e eles ficavam curiosos em comprar, fazer o quê? Aí iam comprar. Eu vendi pro consumidor final, pros estudantes, com ficha, tudo, o pessoal vinha e eu dizia que tinha desconto né? Aí o cara chegava, o preço da loja era tal, eu dava um baita de um desconto, porque preço de fábrica né? E o pessoal comprava muito, muito, muito. (corte no áudio) faturamento e o lucro também né? Aí praticamente 20% do lucro era 30% do preço, então o problema é deles.
P/1 – E que tipo de aparelhos você vendia?
R – Era reativador de tubos, gerador de barras, frequencímetro, uns multímetros também que a gente fabricava. Eram equipamentos pra quem consertava rádio e televisão, que na época oficina de TV era o que mais tinha né? Então era bem interessante. A gente vendia tudo pra oficina de rádio e televisão, então o cara estava fazendo aqueles cursos pra consertar a TV, que eu tenho até pena viu. O pessoal que vai fazer os cursos é muita enganação também. O pessoal acha que vai ficar rico e tem que ter o dom pra poder fazer isso. Mas muita gente se deu bem. Nossa, tem amigos meus que são técnicos hoje que tão muito bem e tem clientes meus de 22 anos que até hoje vão lá, a gente conversa, eu conheço o filho, conheço neto, é um barato. Uns tiveram câncer, se recuperaram, outros morreram aí a mulher veio vender a oficina inteira. Muitos, de 95 a 98 aconteceu muito isso, teve uma crise meio complicada, começou a importar muita coisa e tal o pessoal vinha, falava assim: “Ó, não agüento mais, vou vender a oficina” eu falava: “Tá bom, trás pra cá”. Aí trazia e eu enrolava o cara, enrolava, enrolava uns três meses e não vendia nada. Ele voltava, pegava tudo de volta e montava de novo, porque não tinha emprego melhor que esse. Eu já sabia. Nos primeiros eu até vendia, depois o cara voltava bravo, que queria comprar de novo, aí eu me lascava: “Se em três meses o cara não voltar eu vendo”. Todo mundo voltou, porque é uma profissão assim que você, quanto mais (corte no áudio) aí ele sai, vai trabalhar numa empresa, tem aquele saláriozinho fixo, aí vem um cara: “Ah, você conserta televisão”, ele faz um biquinho de final de semana e ganha mais do que ele ganha de salário. Aí ele faz a conta: em dois dias do final de semana ele ganha mais do que o salário inteiro. Em dois dias. Aí ele fala: “Então vou ficar os outros 20 e poucos dias trabalhando também” e continua. São crises né? Mas isso é comum de acontecer, e eu sempre, aconteceu muito, mas muito mesmo, o pessoal vinha desmontando a oficina e eu enrolava e o cara voltava, pegava tudo de volta e ainda: “Ó, ainda bem que você não vendeu nada”, mas era comum acontecer, porque também eram muitos amigos né?
P/1 – E aí como é que foi essa decisão de montar a sua própria loja, pegar esse estoque?
R – Então quando o pessoal resolveu... É que na época a gente começou a ganhar muito dinheiro (corte no áudio) e é interessante: você ganha dinheiro ou você perde dinheiro. Começaram a ganhar muito dinheiro e eles começaram a gastar de mais. Eu trabalhava, estudava, trabalhava e não tinha tempo de nada então eu não gastava e eu não tirava dinheiro. Aí chego no final do ano: “Ó, preciso comprar um carro” “Pô, mas você não tem dinheiro pra isso”, foram fazer a conta, eu tinha pra comprar uns três carros né? Aí ficaram meio sem graça, todos tinham comprado carro, casa na praia, mandado o filho pra Disney e eu quieto na minha, só estudando. Aí o outro compra um negócio aqui, ali, começaram a gastar mais do que devia e vai, vai: “Ah, não, tudo bem, então, deixa pro ano que vem” “Tá”. No outro ano eu falei: “Preciso comprar um carro”, aí tinha uns oito carros já. Ele falou: “Pô, como é que pode?”, eles faziam as contas, refaziam as contas: “Mas você não tá tirando dinheiro todo mês?” “Não”. Era interessante, eu tinha obrigação de pagar o aluguel da minha mãe, só. Então eu pegava o aluguel da minha mãe, o dinheiro da faculdade, o resto era pra pegar ônibus e tomar uma cerveja no final de semana, só. Então sobrava muito dinheiro e eu tinha essa idéia de montar alguma coisa. Quando a gente resolveu desfazer a sociedade porque... É isso que é interessante, o que eu fiquei chateado é que eu gerava o dinheiro, gerava os negócios e eles não reconheciam nunca. Já tinha (corte no áudio) onde eu ficava que era o quarto andar, aí o pessoal: “Ah, mas você tem que fazer isso, fazer aquilo” “Eu não tenho que fazer nada, aquela loja é de vocês, vocês pegaram o dinheiro daqui e colocaram lá, lá eu não tenho parte nenhuma” “Não, mas você também é sócio”, eu falei: “Não sou no papel então não vou pôr o meu dinheiro lá”. Então eles ganhavam dinheiro e colocavam numa outra loja, reformaram o prédio, fizeram um monte de coisa, transferiram a fábrica de Arujá pra Santa Ifigênia, gastaram pra caramba. Compraram um fábrica de fazer flyback, todo mundo parando de usar flyback, eles resolveram comprar isso aí e deu tudo errado. Olharam a conta, tal, até o momento que a gente teve uma briga, eu falei: “Ó, vocês me desculpem, vocês tão gastando o tempo de vocês lá e eu não tenho nada, eu faço tudo aqui, não é justo. Então vamos ver o que é certo aqui” eles falaram: “Não, tudo bem, você fica com a loja” eu falei: “Não, não quero ficar com a loja. Vê o que tem de estoque aqui, vocês me devem tanto, eu vou sair”. Pra eles... Eu ensinei tudo como que tinha que ser feito, eles tinham só que tocar o negócio! Eu não estava sendo desonesto e eu levantei da cadeira, da mesa, e falei: “Ó, to indo embora, vê se tem alguma coisa no meu bolso, não tem nada né? A chave tá aqui. Tchau”, não peguei lista de cliente, não peguei nada! Eu podia ter feito isso. Não peguei nada, aí fui pra casa, fiquei acho que uns três meses pensando o que eu ia fazer, na verdade nem isso. Eu sai de lá no dia primeiro de maio, dia do trabalho, aí fiquei maio, junho, julho, agosto, em agosto eu abri a minha outra. Aí não tinha muito o que fazer, fui pra loja de um amigo meu, o Moisés, que trabalhava com aparelho de surdez, e o cara era um gênio comercialmente. Um cara fantástico, uma pessoa inteligente, honesta pra caramba. Honesta assim, honesta com os amigos, mas vender aparelho de surdez é sacanagem, dá dó. Custa muito barato, o pessoal vende muito caro, é um negócio absurdo. Ver aquela família chegando assim desesperada que o velho tá surdo e o velho começa a escutar, eles ficam dando cheque. Achava aquilo um absurdo, tanto que não fiquei nisso aí. Aí ele me ajudou muito porque ele deixava eu usar o escritório dele enquanto isso, então fiquei três meses nessa passagem. O que eu fiz? Eu comprei o computador usado, na época era 256 né?
TROCA DE FITA
R – Dava aula né, explicava, tal e não falava nada de vender, nada, nada, nada. Os professores falavam: “O que esse cara vai ganhar com isso?”, cara, terminava a aula, eu saía com a turma, todo mundo vinha atrás: “Escuta, onde é que eu compro? Onde é que eu compro?”, aí tinha um monte de cartão. Fui na primeira, na segunda, nossa tinha muito colégio técnico em São Paulo. Hoje não tem mais, o Fernando Henrique acabou com quase todos, aquele imbecil!
P/1 – Você estava falando do período em que saiu da loja e abriu seu próprio negócio.
R – Então, nessa época eu comprei um fantástico 256, da Itautec inclusive. Aí o que eu fiz? Meu irmão, ele fazia curso técnico de informática, mas eu não podia atacar as escolas técnicas, seria desonestidade. Aí eu falei: “Tenho que ter uma outra idéia”. Eu peguei, passei num monte de loja, na época aquela G. Aronson e pegava aquela relação das assistências técnicas. O que eu fiz? Eu cadastrei todas as assistências técnicas do Brasil, todas as marcas. E na época inclusive o computador não fazia aquele negócio de comparar né? Então tinha repetido pra caramba. Aí comprei uma impressora, uma LX 300 que já existia na época, não, era (corte no áudio) comprei aquela matricial e comecei a imprimir as etiquetas. Aí as etiquetas você começava a comparar pra ir tirando. Nossa, deu um trabalho monstruoso! E então a gente começou, eu comecei a fazer uma mala direta, um jornalzinho e mandar pra todas as assistências técnicas do Brasil e aí foi que explodiu o negócio mais ainda, porque eu não precisava (corte no áudio). Eu aluguei uma sala na 295, segundo andar, sala 211. Eu fiquei lá acho que dois anos. Esses dois anos, assim, eu já tinha grana pra poder montar... Em dois anos eu fiz o seguinte, no primeiro ano eu aluguei a 211, 212, 213, fiquei com três salas: uma era oficina, que eu comecei a fazer manutenção, uma era estoque e a outra era escritório. E eu atendia por telefone, tanto que eu fiquei especialista em sotaque, viu! Aí o pessoal me ligava, eu falava, conversava, tal e vendia muito, muito, até pra revenda. Comecei a comprar, vender, comprar e eu fazia anúncio em revista, pra Cyber, Eletrônica, várias revistas que tinham na época e começou a vir muito pedido mesmo. Então, naquela época era o correio que a gente usava, saiam dez, 12 caixas por dia fácil e era bem rápido. Era já o começo do comércio eletrônico... Você não tinha como mandar um mailing desse tipo, aí eu já comecei a antecipar e isso tudo tentando fazer da maneira mais certa possível, tal e deu muito certo, durante uns quatro, cinco anos, foi muito bem. Depois começou a vir Internet, começou a vir importação, em 92 em diante a China começou a aparecer, de 89, 90, 91, 92, 93, estava muito fácil, tudo o que você tinha você vendia. Aí o comércio começou a cair um pouco, importação, o pessoal começou a... Ficou mais fácil comprar. Em 95 (corte no áudio) nada, porque a cabeça de político não tem jeito. Estava tudo liberado, de repente proibiu tudo. Aí lojas quebrando, empresas quebrando. Aí eu comprava de uma loja na Santa Ifigênia, que importava, e vendia e tinha uma margem muito pequena. Um cara me descobriu, eu vendi mais que a loja inteira lá em baixo e ele não conseguia entender, porque o cara importava pra mim praticamente. Chegou um dia o Cláudio chegou pra mim e disse: “Eu sei que você vende muito e queria te fazer uma proposta: eu trouxe uns equipamentos e não consegui vender nada, tá há três meses no meu estoque e eu não consegui vender uma peça. Você quer vender pra mim?”, eu falei: “Ah, pode ser”. Aí o pai dele veio me conhecer, um judeu, saiu da reunião. No dia seguinte estavam entregando cem aparelhos na minha loja, não tinha nem aonde por, aí que eu tive que alugar essa outra sala. Eu falei: “Mas eu não tenho como te pagar” “Não, você vai vendendo e pagando”. Em três meses eu vendi tudo. Ele ficou três meses pra não vender nenhuma, eu vendi tudo. Aí ele praticamente importava pra mim também e vendia muito, muito, muito. Porque era o jeito de vender, era saber vender, explicar pra pessoa. E tem uma coisa que eu faço desde que eu comecei: quando a pessoa entra na loja, ela vem com uma idéia do que ela precisa, eu pergunto o que ela vai fazer, porque como é equipamento técnico eu falo: “O que você vai fazer?” e tal “Você tá errado, você tem que fazer isso, isso, isso”, explico exatamente o que tem que ser feito, pra ele gastar até menos. Até podia vender mais caro pra ele, tudo. Aí o que acontece? Ele volta sempre. Está satisfeito. E é uma coisa interessante, isso me fez crescer, nem tanto em grana, mas em credibilidade, então as pessoas confiam muito no que a gente fala, no que a gente faz, e acho que é o que o comércio tem que se focar né? Responsabilidade. E isso me ajudou muito durante muitos anos, até hoje o pessoal me indica, é referência de um monte de coisa, então não tem muito o que perder. Você não perde com honestidade nunca. E esse Cláudio ficou meu sócio de um monte de coisa, até chocolate foi vender. Nossa, uma besteira que fiz na vida! (risos) Mas de novo mulher, né? Querida, desculpe, mas eu vou falar a verdade: minha mulher queria trabalhar de qualquer jeito. Nossa senhora, que saco! Aí esse Cláudio, deu certo o negócio de importação comigo ele quis montar outra coisa, loja de chocolate. Eu falei: “Tá bom”, ele me levou na Ofner, me levou num monte de loja: “Ó, como dá dinheiro” eu falei: “Cara, eu aprendi uma coisa no comércio que eu não desrespeito: eu só faço o que eu sei. Eu não sei fazer isso” “Não, que eu vou trazer e tal”. A gente trouxe uns ovos de páscoa, e uns chocolates da Arufat, da Argentina. Cara, fantástico. O chocolate é fantástico, o melhor chocolate que eu já comi na vida, mas é chocolate. Chocolate se come no inverno. Ele é judeu, mas não é muito, desculpa Claudinho, não é muito inteligente, não. (risos) Ele trouxe no verão e o chocolate tem validade. Cara, que prejuízo! Nossa! Eu não fiz, foi ele né? Mas daí o que eu fiz? Num verãozão, em dezembro, pra vender chocolate, eu tive mais uma idéia que salvou a pátria: eu comprava urso de pelúcia e colocava dez chocolates com o urso de pelúcia. Fazia uma cesta de natal. Vendeu pra caramba também. Aí se livrou dos chocolates, daí deu certo né? Alguém teve que ter uma idéia boa. Na páscoa outra besteira. Nossa. Aí eu cansei né, eu falei: “Cláudio, desculpa, mas eu to fora, não dá não”. Nós chegamos a ter cinco lojas, uma no Cambuci, uma na Zé Paulino, uma na Paulista, tinha uma na Lapa, tinha duas na Paulista. Cara, imagina você, mais uma vez mulher, trabalhar com homem é muito fácil, você xinga, fala palavrão, briga e tal, mas mulher você xinga, ela chora, aí não tinha jeito. Eu não sabia trabalhar com mulher. Eu levava chocolate pras meninas pra vender nas lojas e falava: “Tem que fazer isso, isso, isso” e a gente tinha degustação. O que elas faziam? Elas comiam! Chocolate e mulher, não tinha jeito. (risos) Eu chegava na loja: “Você não vendeu nada” “Ah, aqui não vende nada” e eu entrava na loja, vendia mil, mil e quinhentos reais por dia. Eu saía da loja, vendia 50, aí falei: “Cláudio, eu não posso ficar aqui e tocar minha loja. Não dá”. Aí a gente desfez. Minha esposa bateu o carro, nossa, foi um rolo, porque era muita coisa pra fazer então resolvemos desistir. Mas isso foi... Eu, na verdade, não perdi dinheiro nenhum, mas perdi muito tempo, que é pior que dinheiro. Mas o Claudião que me desculpe, mas ele fez uma cagada feia na época (risos).
P/1 – E você comentou da sua esposa, como é que vocês se conheceram?
R – Gozado, porque nós somos da mesma cidade. Ela morava aqui em São Paulo e eu no interior. É estranho, vocês são de São Paulo? Então, quando você é do interior, você sempre tenta voltar, pra ver os amigos e tal, rever a infância. E eu todo o feriado que dava eu saia pra lá. Um dos feriados que eu sai daqui na época da faculdade, eu fui pra lá pra ver a minha avó que estava doente na época. No ônibus eu encontrei com a minha esposa. Aí eu olhei e falei: “Olhou, deu risada, tá querendo beijo” (corte no áudio) e vai, e à noite a gente se encontrou. Eu já conhecia, assim, a família dela tal, mas como (corte no áudio), quando você tem 20 anos e ela tem 15, você nem olha né? Já na época eu tinha 24, ela tinha 19, começamos a conversar e tal e ela pegou e começou a conversar no ônibus. Ela pegou, me chamou: “Você vai sair hoje à noite?”. A gente se encontrou num bar que era do tio dela, que eu não sabia. Aí não teve jeito, a gente começou a namorar. De lá a gente veio pra cá pra São Paulo. Isso sempre, porque a gente saiu daqui junto, ela foi num ônibus e fui no outro, nós voltamos no mesmo ônibus, na mesma cadeira na verdade. Chegamos aqui em São Paulo e começamos a namorar. E na época foi, eu quase nem saia muito pra namorar mesmo porque eu não tinha tempo, só trabalhava de mais. Ela me enrolou, aí aproveitou de mim, abusou de mim, ai a gente começou a namorar e casamos. Eu casei com 26 anos. Aí teve o Pedro, o Pedro tá com 19, eu to com 21 anos de casado. Adotei duas meninas agora, que é um outro passo importante. Mas não é fácil, a vida reserva umas surpresas estranhas né? Porque você morar, você nascer numa cidade, vir pra São Paulo, na mesma situação, na mesma época que eles vieram também, ela veio pequenininha, com dois anos, e eu vim com oito, nove, e a gente voltou na mesma época. Então é bom que os passeios de família são pra mesma cidade. Se bem que agora no Embu, minha mãe tem que vir pra cá, porque eu não vou mais pra lá, dificilmente, me adaptei bem aqui.
P/1 – Queria que você descrevesse pra gente a sua loja, como é que ela é hoje em dia?
R – Eu trabalho com material usado, basicamente. O que eu faço? Eu compro da indústria, compro de fábricas que tão desmontando, fechando. A gente revisa os equipamentos e vende. Por que eu optei por usado? A margem de lucro é muito maior e depois que houve a invasão do mercado chinês principalmente, a qualidade caiu muito e a gente precisa de mais tecnologia. Pra você comprar um equipamento novo de alta tecnologia é muito caro. Eu não fiz administração de empresas, graças a Deus, administração é uma coisa muito complicada, ela trabalha muito com números. Então uma indústria hoje compra, monta uma linha de produção, ela começa a produzir, saiu de linha aquele produto, ela vende tudo aquilo, não interessa se é novo, se tá ruim, se tá quebrado. Ela vende tudo e descarta pra sucata, o que é um crime na verdade, porque você tem coisas lá que valem uma grana e como são multinacionais, são empresas que têm os administradores de empresa. A gente compra esse material, revisa esse material e vende, às vezes até pra mesma empresa. É estranho, mas já aconteceu algumas vezes. Então, assim, a grande, ela se desfaz de uma linha que não interessa mais pra ela, mas a pequena que tá começando é a linha que ela precisa, então a gente alimenta essa cadeia de produção. Eu faço isso já há uns 12, 15 anos, desde 95, 97 quando começou a vir a crise de importação, valia mais a pena isso. Então minha loja basicamente, assim, a gente trabalha muito com reciclado, tem um estoque muito grande e aí o grande problema é que pra manter esse mercado em circulação, o que acontece muito comigo? Quando tem crise eu compro, gozado isso. As empresas tão quebrando, eu to comprando. E quando a coisa tá muito boa eu também não consigo vender, então tem que tá no meio termo. Se tá muito bom a pessoa não compra usado, ela compra novo, então é um mercado estranho, mas como mercado grande que gira muito e o Brasil tá crescendo muito, então nunca tem crise.
P/1 – E como é que é fisicamente a loja, como é que estão dispostos os produtos?
R – Olha, como é material técnico, a gente sempre tem uma bancada pra teste, que é o mais importante. Eu não tenho um balcão pra atender, eu tenho uma bancada que a gente testa, tem os cabos, os equipamentos, tal. Basicamente é isso. Pra pessoa comprar alguma coisa, ninguém compra e leva como se fosse um sabonete, nada disso. Você tem que ligar, testar, mostrar, ensinar a pessoa a usar, tal. Então eu tenho assim, na parte da frente é uma loja que meu filho praticamente toma conta, que vende som, equipamento, TV, esse tipo de coisa, porque eu tive que montar uma loja disso que sobrou. Você entrando na loja, equipamentos que a gente trabalha mesmo, de telecomunicação, de TV, que são a parte que me interessa, aí tem a parte do escritório. Quase no final tem a oficina. Então na loja tem tudo praticamente. Por que eu também mantenho a oficina? Porque quem tem precisa consertar e se ela vem pra consertar e não tem conserto ela pode comprar um novo. E como eu preciso consertar o que eu vendo também, o que acontece? Eu tenho que ter esse pessoal técnico, que estão comigo. Eu devo ser um patrão muito ruim, porque tem um que tá comigo há 19 anos, um há 18, outro há 16 e assim vai. Entra lá e fica. É basicamente isso, então a gente tenta montar a loja de uma maneira assim: na frente pra atrair o cliente que tá passando na rua, que é pra não perder a loja de rua, mas dentro já é uma parte bem técnica mesmo. Eu trabalho com acessórios, com cabos, com filtros, com coisas muito da parte de vídeo e pra manter isso funcionando você tem que ter uma estrutura legal, você tem que ter a parte administrativa boa, porque eu praticamente não vendo nada à vista, é tudo parcelado porque são coisas caras e assistência técnica (corte no áudio). Uma coisa que sempre fiz, desde o primeiro dia, mesmo o material novo ou usado, tudo sai de lá super testado, a pessoa leva consciente que vai tá funcionando, despreocupada. Se acontecer de der um problema, para tudo, resolve o problema do cliente, entrega pra ele, se não resolveu, eu pego outro equipamento e dou pra ele pra ele poder usar, quando ficar pronto eu troco. Isso eu faço há muitos anos. Eu tenho a loja há 21 anos, eu não tenho um Procon, nunca tive. (corte no áudio) quando o cara chega assim, estava mentindo, dançou, porque daí quem cobra paga duas vezes.
P/1 – Você comentou que os estoques são grandes, como é que funciona o controle desses estoques?
R – São. Hoje tá tudo informatizado, é o que eu to te falando, você tem que pensar em tecnologia se não você dança mesmo. Hoje é muito complicado. Porque eu tenho peças lá que custam dois mil reais e dá pra caber no bolso, então não posso bobear. O que eu faço hoje? O mais difícil é implantar o sistema, mas hoje, assim, tudo o que entra, entrou, eu faço nota fiscal de entrada, então é o que eu to te falando, às vezes ser honesto vale a pena. Quando eu faço nota de entrada, tem que tá no meu estoque, pra sair, a hora que eu bato o código de barras tem que aparecer lá, e se de repente eu procuro alguma coisa que não tá e tá no estoque, alguém me roubou. Então tem os dois lados da moeda: você tá sendo honesto, as pessoas têm que ser honestas com você também né?
P/1 – E tem um produto que você considera o mais vendido?
R – Ah, tem muita coisa. É que na verdade é o seguinte: como eu trabalho com tecnologia, tecnologia muda muito rápido. Eu jamais trabalharia com informática. Informática é uma coisa que é absurda, porque o que é novo hoje é obsoleto daqui a três meses, é um negócio absurdo, é igual celular. Eu não sei pra que a pessoa quer tanto celular diferente porque só serve pra falar, mas a pessoa passa a entrar no Twitter, entra no MSN e faz um monte de coisa. Então hoje o celular não é pra falar, é um computador portátil, então pra que ter um computador? Nós vamos chegar a um ponto, e vai ser, assim, em no máximo dois anos, que computador é besteira, você vai precisar só de uma tela. E eu vi telas flexíveis hoje lá fora que você tira do bolso, abre e estica, pronto. Então você vai ter o celular, você põe a tela aqui e pronto, não vai ter mais o que fazer. E quando você quiser falar com uma pessoa, ao invés de você falar com ela e ouvir a voz, você clicar e ver a pessoa e falar. Então o computador em si vai ser um negócio bem obsoleto, esse computador que a gente conhece, grandão, de colocar no chão, de ligar um monte de cabo. Eu estava até brincando com ele o negócio do microfone, porque realmente o fio é mais caro que o transmissor. Hoje a matéria prima tá muito cara, então é basicamente assim, as novidades tão chegando muito rápido. De 92 pra cá teve uma revolução absurda que as pessoas não entenderam ainda. Tudo isso que a gente vê hoje já existia, mas era inalcançável pra classe média, mesmo pra classe alta. O que a China fez foi popularizar a tecnologia, ela conseguiu transformar uma coisa que era muito cara numa coisa muito barata e hoje todo mundo compra e se quebrar, dane-se, compra outro. Eu lembro das câmeras de vídeo, por exemplo, que eram aqueles monstrão da RCA cheio de válvula, que custava um absurdo. Hoje qualquer um tem uma câmera no celular. Então a tecnologia ajuda muito (corte no áudio) cuidado com ela também, porque a gente tá virando um consumista absurdo né? É um consumo que ninguém dá valor a nada. Mudou o modelo do Iphone pra 4S. Todo mundo faz fila pra comprar. Cara, não faz diferença nenhuma. Eu hoje estava discutindo, eu tenho um tablet que eu importei, era 2.0, preciso mudar pra 2.2, fui ver a diferença, era uma atualização na conexão, uma coisa besta, mas o cara só compra se for 2.2, ele nem sabe o que é. Tem agora os viciados em tecnologia né? Na Santa Ifigênia tá cheio. Lança alguma coisa os caras vão lá correndo ver se já tem. Já tem há muito tempo. Isso que é estranho, eu fui pra China, eu fui duas vezes e as duas vezes eu fiquei assustado, porque eu achei que ia ser um negócio, assim, uma coisa de outro mundo. Que nada, cara! É igualzinho aqui, lá não tem Santa Ifigênia, não tem. Me falaram que tinha, eu fui lá em Xangai, não tem, fui em Shenzhen não tinha. É diferente, mas igual Santa Ifigênia não tem. Lá o povo é diferente, a cultura é diferente, e a gente tem uma visão, assim, acha que lá fora é muito melhor. Não é, não. Aqui é bom demais, cara, putz! Mas só que lá o comércio também é diferente, eles vendem tanto que eles não se preocupam em tratar você bem e se você é um comerciante daqui, com o espírito que a gente tem aqui de comércio, mascate, de correr atrás, coitados dos chineses! Eles vão passar fome porque a gente vai roubar o mercado deles lá. Porque eles são muito ruins pra atender o pessoal, muito ruim mesmo, é estranho porque na verdade é o seguinte: eles sempre foram fornecedores né? Os ingleses foram lá, exploraram eles, os portugueses foram lá, exploraram eles. O português era comerciante, o inglês era comerciante, não eles. Você vê em Hong Kong, por exemplo, é outro mundo, eles dizem que não são chineses né? Brigam entre eles lá, porque eles são comerciantes, lá é diferente. No interior da China tem nada pra fazer, não tem uma loja aberta, não tem nada, já em Hong Kong a noite começa às 10 da noite e vai a madrugada inteira, as lojas tão abertas. Aqui no Brasil também é assim. Hoje, por exemplo, os shoppings atrapalharam muito o comércio de rua e o comércio de rua se remodelou né? Então hoje você tem nichos de mercado, a Zé Paulino, o Brás, a 25 de março, a Santa Ifigênia, que são shoppings a céu aberto e agora os shoppings tão sendo assaltados, as lojas na rua não, então a segurança que a pessoa tinha no shopping já não tem mais, tá preferindo loja de rua e aí vai. Comércio é uma loucura.
P/1 – E quem são seus fornecedores? São essas empresas?
R – Não tem, não tem. Essa é a minha dificuldade. Eu não tenho um fornecedor, dois, eu tenho um monte de fornecedores. Pra você ter uma idéia, eu dependo às vezes de indicação. Eu tenho um problema sério que é assim: o pessoal joga no lixo um negócio que vale uma fortuna. Joga no lixo mesmo, porque tem uns macetes de importação, que é uma outra burrice do Estado, que você pode importar com (corte no áudio), fica cinco anos aí tudo bem, você pode fazer o que você quiser. Já o administrador de empresas que fez aquela faculdade maravilhosa diz que aquele material com cinco anos é um ativo fiscal que tá te dando prejuízo, então eles tem que descartar. E o que ele faz? Ele não pode vender porque não deu entrada, então ele joga no lixo. (corte no áudio) porque a Embratel, as grandes, os próprios técnicos faziam aquilo. Esses técnicos foram tudo pra rua. Técnico na rua usa o cérebro e aí começaram a montar pequenas empresas, prestar serviços pra essas empresas maiores e essas empresas maiores que tinham os administradores de empresas descobriram que era melhor contratar o cara quando tinha serviço e não manter um corpo fixo. Então surgiram um monte de pequenas empresas que compram o material mais barato e isso fermentando o mercado, fermentando o mercado e eu fui crescendo com isso, porque a gente tinha que crescer conforme o que vai acontecendo né? Hoje, por exemplo, a rede de telefonia tá praticamente toda implantada (corte no áudio), você entrou um quilômetro fora da estrada não funciona mais e na legislação diz que tem que tá funcionando, então tem muita coisa pra implantar ainda. É que as implantações estão mais baratas e o pessoal tá pagando cada vez menos. Agora, por exemplo, a febre é fibra ótica. Todo mundo quer fibra ótica porque todo mundo tá usando a Internet e sem fibra ótica não dá Internet, cabo de fibra metálica estraga (corte no áudio). Então a tecnologia vai avançando muito e muda muito rápido. Hoje você compra um negócio e já não serve, é muito, é demais, e a gente tem que acompanhar. Por exemplo, eu vou viajar, eu vejo o que tem lá fora pra trazer pra cá, mas já não tem muita novidade. Você vai pra lá, você vai nas feiras, você fala: “Meu, não tem nada de novidade”. Estranho, a Santa Ifigênia o pessoal critica, fala. Lá, além de ser seguro, que eu nunca vi assalto, nunca vi nada, qualquer novidade que você procurar no mundo já tem lá, qualquer coisa, coisas absurdas. Estão lançando uma placa que faz... Já tem lá. Se você procurar tem lojas especializadas, escritórios lá que são especializados nesse tipo de coisa. Tem uma loja de lâmpada, que eu estava te comentando, ela tem (corte no áudio), já tá, acho, que na quarta geração, era do bisavô, passou pro avô, passou pro pai e agora tá com o neto. E lá eles trabalham com lâmpadas especiais, se você precisar da lâmpada que vai na bunda do helicóptero que fica piscando eles tem. Isso o pessoal não se toca né? Então a gente tem um mercado que é carente de tecnologia, mas tem aqui, tem tudo. (corte no áudio) safado e tão esperto. Sabe aqueles projetores que você usa em casa, projetor de vídeo? Aquela lâmpada é muito cara, se você comprar a lâmpada inteira, o pessoal da Santa Ifigênia descobriu que dava pra quebrar aquela porcelana, trocar só a lampadazinha, aproveitar o bulbo, então eles fazem isso: recuperam e vende igualzinho e bem mais barato. Esse é o jeitinho brasileiro que lá fora eles não têm. (risos)
P/1 – Quais são os seus clientes, existe um tipo específico de cliente?
R – Não, esse que é o problema. Meu mercado é totalmente diferente, por isso que isso que eu tenho que ser um camaleão. Por exemplo, eu montei uma loja de televisão, é um cliente extremamente chato, sem vergonha, desonesto, eu desisti. O cara que vai comprar uma TV, ele vai nas Casas Bahia, ou então numa rede grande e paga em 60 vezes, 30 vezes, faz aqueles carnês monstruosos. Porque, assim, ele não vê quanto custa a TV no final, eu não estava acostumado com esse tipo de cliente, a TV custa dois mil reais, ele não vê o custo final da televisão, ele vê a parcela que ele pode pagar. Então eles colocam lá, sei lá, X vezes de 50 reais, o cara vai lá e compra. Ele não vê que é 90 vezes de 50 reais, que ele vai pagar lá oito anos. Ele não vê isso. Então eu estava acostumado com um cliente que vinha e: “Quanto que custa? Vou precisar, fatura pra mim”, então é diferente. Montei a loja, gastei um dinheirão, fiz um loja legal, tal e o cliente, além de caloteiro, ele é um cara muito chato. Por exemplo, se eu vendo um equipamento pro cara e tem um defeito ele especifica: “Ó, o defeito é esse”. O cara compra a televisão na minha loja, leva pra casa dele, ai tá lá, feliz da vida, tá dois meses com a televisão, ele pagou dois mil reais na televisão, uma de 40 polegadas com tudo que tem direito. Aí vem uma Casas Bahia e fala assim: “TV de 40 polegadas por mil e oitocentos reais” e ele: “Caramba, 200 reais a menos, vou devolver a TV” e ele vai na tua loja e fala que tá com defeito, que a lei do consumidor diz que ele tem direito a devolver, eu falo: “Não, você tem direito a devolver (corte no áudio)” “Não, mas” “Olha, querido, qual o defeito da televisão?” “Ah, tá desligando” “Quando você aperta o botão né” “Não, não sei o que” “Tudo bem, eu vou abrir uma ordem de serviço, vou mandar pra fábrica” “Ah, não, mas eu quero minha TV, eu quero meu dinheiro de volta” e começa a fazer baixaria. A primeira vez eu até cai, na segunda, meu amigo, vamos pra delegacia, porque ô povinho sem vergonha! Pobre não é honesto, não, bicho! Pobre é cara de pau! Como é que o cara pode fazer um negócio desse? E faz! E não é um só. E normalmente quem não compra a prazo é porque não tem crédito. Mais uma que eu aprendi depois de sofrer muito (corte no áudio) crédito, então ele tenta te aplicar o golpe também. Pior, agora na época de natal, o cara quer mostrar que ele tá bem pra família que vem lá do norte: ele compra a TV e bota na sala. E não paga. Daqui a três meses vem o oficial de justiça e leva, mas até ai todo mundo viu que ele tinha uma TV de 50 polegadas na sala. Você acredita nisso? Foi uma experiência que eu não quero ter, não perdi dinheiro também. Ganhei, porque deu pra vender bem, peguei a época da Copa, foi um bom negócio. Mas é um mercado que não compensa. Os grandes, eles negociam com as empresas, que é uma coisa que a gente tem que aprender a fazer, tanto que a gente tá montando uma cooperativa agora, que é o seguinte: o grande chega, ele quer 120 dias pra pagar inicialmente e compra um caminhão. Só que ele tem 120 dias pra pagar a primeira parcela. Então ele vende pra você à vista, em até 200 vezes, só que ele só vai pagar daqui a seis meses a primeira parcela então, pra ele, ele ganhou nessa negociação. Hoje o comércio é mais um balcão financeiro, e você tem que aprender com isso também, o comerciante tem que calcular juros, tem que aprender quanto é que custa o dinheiro e se você não for... Por isso que eu falo, eu fiz a opção certa desde o momento que eu comecei, porque eu resolvi estudar, resolvi me especializar em alguma coisa, porque se não... O cara hoje que monta um negócio e acha que vai continuar com esse negócio pro resto da vida, ele tá morto. Hoje uma fábrica de chapéu, fabricar chapéu pra quem? Se ele não for muito esperto e criar um negócio diferente, ele quebra. Eu vi que há um ano atrás, ou dois anos atrás, fechou a empresa mais antiga do mundo. Ela fabricava templo budista. Fazer o que? É isso. Se o cara tivesse pensado em melhorar, infelizmente... Essa loja que trabalha com lâmpadas especiais, há cem anos atrás ele vendia lâmpada. Que uma lâmpada é um negócio absurdo: quem tinha lâmpada há cem anos atrás? Em 1911, era o começo das lâmpadas e tudo mais, então ele já começou com uma novidade, hoje ele vende lâmpada pra tudo quanto é tipo que você pode imaginar. Aí dizem: “Vai acabar a lâmpada e entrar o LED”. Vai, com certeza, tenho certeza que vai entrar, só que o LED tem um monte de problemas. Então você tem acompanhar as tecnologias, tal. Eu importei agora lâmpada de LED pra testar, só que é tão complicado pra importar, porque como é você pode importar pra testar se “Se você não tem o teste você não pode importar”. É um paisinho burocrático né? Vocês não viviam, mas teve um ministro chamado Hélio Beltrão, o ministro da desburocratização, na época do governo, como é que é o nome dele lá? O que andava a cavalo. Vocês não têm idéia como é que esse país era, era o mundo do cartório. O documento precisava ter dez carimbos, teve um ministro pra desburocratizar, imagina! Hoje tá fichinha.
P/1 – Vamos falar um pouquinho sobre o bairro, como é que era a Santa Ifigênia na época que você foi pra lá a primeira vez, começou a trabalhar?
R – Santa Ifigênia não existia estacionamento de duas vagas, tipo assim, fila dupla. Era fila tripla, porque, assim, não existia importação. Ou era contrabando ou era roubo, a verdade é essa. E a Santa Ifigênia (corte no áudio) então era, qualquer coisa que você tinha pra vender você vendia, não tinha problema, porque não tinha essa briga com chinês, não existia isso. Se você quisesse comprar alguma coisa você tinha que ir lá. Tinha shopping, mas o preço bom era lá, as novidades eram lá, os lançamentos eram lá, então tudo que tinha, o pessoal vinha do interior, não existia outro pólo de eletrônica. Hoje Santo Amaro tem, Guarulhos tem, interior de São Paulo tem, é o que eu estava te explicando: o pessoal vinha de trem pra parar lá e comprar as coisas. Tanto que o forte do comércio em São Paulo, Santa Ifigênia, Zé Paulino, Brás, 25 de março, tão próximos à linha do trem, ou trem ou rodoviária antiga né? Então o pessoal vinha pra comprar desse jeito. Quando eu fui pra lá, já estava em 89, 90, estava acabando o governo do Sarney que foi a abertura, diziam né? Que era a abertura das importações, antes era impossível importar qualquer coisa. Então o computador tinha que comprar nacional (corte no áudio) os caras inventavam as fábricas, contrabandeavam umas placas e montavam. Você tinha Apple, MSX, uns negócios antiguíssimos. Tudo você tinha que correr lá. Pra gravar um programa se usava fita K7, era um negócio absurdo. Essa época eu não peguei não, não sou tão velho assim, não. Mas é um negócio diferente, disquete, aquele disquete desse tamanho, Winchester pesava 20 quilos, um negócio bem estranho. Então a Santa Ifigênia abastecia todas as indústrias, abastecia todo o comércio de eletrônico, todas as oficinas, então era um negócio, vendia muito, fila e tal. Aí dispersou. Material elétrico dispersou. Hoje tem facilidade, tem a Leroy Merlin, você compra em outros locais, mas antes era tudo lá, as grandes lojas eram lá. E a Santa Ifigênia foi se especializando. Na verdade, pra você ter uma idéia, a gente tem um levantamento na Associação Comercial, tem 14 mil empresas na região, tem escritório de advocacia, tal,mas o forte da Santa Ifigênia não é o comércio na rua em si, nem nas galerias, são nos andares, os atacados, as distribuidoras, importadoras, tem coisas, assim, que o pessoal não tem noção. Quando um vereador teve lá, a gente queria mostrar como era a Santa Ifigênia de verdade e ele falou: “Eu conheço, venho aqui desde criança” eu falei “Você não conhece” “Não, conheço sim” “Então tá, vamos entrar nesse prédio aqui”. Cem empresas dentro do prédio, porque são cem salas todas ocupadas e cada uma vendendo por telefone, mandando pra fora, correio saindo. Ele falou: “Não imaginava” eu falei: “Vamos pro prédio da frente” ai subia, tem 200 salas, todas ocupadas. Ai veio um prefeito, que é o Kassab, diz que lá tem baixo índice populacional. Quem mora hoje no próprio emprego? Ninguém! Então os apartamentos residenciais da região, eles acabaram, viraram todos escritórios, então é escritório ou estoque de loja. Lá você não aluga (corte no áudio), então é bem diferente. Quando a gente chegou lá, acho que a sala era menor que essa aqui, eu aluguei uma, duas três, na quarta sala eu falei: “Acho que vai ficar caro de mais” fui pra outro lugar. Tanto que eu demorei 12 anos pra comprar meu prédio, aí comprei um prédio pra mim. Mas a Santa Ifigênia em si ela é...
TROCA DE FITA
R – Umas das maiores revendas da Pirelli. O pessoal não tem idéia: a loja da Santa Ifigênia vende mais que a loja que eles têm na Marginal. É assim, ela morreu. Tem box, box não gera nada, é uma palhaçada aquele negócio, mas aumentou o número de empresas.
P/1 – O senhor estava falando que pegou as lojas, decidiu comprar seu próprio prédio.
R – Pra comprar um prédio na Santa Ifigênia é impossível, primeiro que ninguém vende. Lá tem as baronesas do café ainda né? É verdade! Elas, desculpe Dona Sueli, elas são pessoas que herdaram imóveis. A Santa Ifigênia em 1940, 50, era loja de roupa, roupa pra damas, pra senhoras, e ela foi mudando com a tecnologia, foi chegando, o pessoal foi se especializando. Lá se vendia até a década de 60, 70, 80, kits pra você montar a televisão, porque a TV não vinha pronta, você comprava chassis, carcaça e tal e montava o interior. Isso que meu avô fazia, ele comprava os chassis, a caixa ia lá e montava como você queria. Aí tinha aquelas marcas esquisitas, Continental, Empire, tinha um monte de marcas.
P/1 – E o seu avô comprava na Santa Ifigênia?
R – Na Santa Ifigênia. Então lá tinha fábrica da rádio Montreal, você comprava caixa da Montreal e montava o circuito dentro, colocava. Era diferente, você montava praticamente. Aí o que acontecia? A Santa Ifigênia, ela mudou radicalmente. Na década de 80 ela foi pra componentes eletrônicos, porque as fábricas começaram a fabricar no Brasil, quando foi a proibição da importação no Brasil. Aí, ao invés de importar se fazia de outro jeito. Manaus, a indústria nacional começou a melhorar, o grande problema era que na década de 90, quando os chineses começaram a entrar, quando eu entrei na Santa Ifigênia, aí mudou de vez. Até 95 o que você tivesse vendia, não era problema, ai dispersou mesmo. Os andares em cima é que mantém a Santa Ifigênia, são os atacados, as pequenas lojas e a Santa Ifigênia em si hoje não tem lojas grandes, ela só tem galerias. Essas galerias são familiares, normalmente quando você entra na galeria é o pai, a mãe e o filho trabalhando. Então quando vê aqueles dados do governo, que gera pouco emprego, o pai não vai registrar ele, a mulher e o filho, então não tem emprego mesmo, mas é uma família inteira que vive ali. Uma briga que a gente tem muito com o governo porque diz que lá não, lá gera muito emprego, gera muito imposto, muita coisa, só que hoje mudou o perfil. Os pequenos comerciantes hoje, são aqueles que eram empregados há pouco tempo atrás. Foi o meu caso, entrei como empregado, comprei e melhorei. Eles também, perderam emprego porque as lojas fecharam e foram, montaram galerias, shoppingzinhos, lojas pequenas, mas é um comércio que tem no mundo inteiro, não tem jeito. A prefeitura diz que não pode ter camelô, é um pequeno camelô estabelecido, mas tem que respeitar, gera um dinheiro, gera emprego, gera impostos, vendem muito, é isso.
P/1 – E você chegou a pegar a época do cinema na Santa Ifigênia?
R – Então, na Triunfo. A Triunfo era a rua do cinema, quando eu fui pra lá em 93, estava acabando, acabando de vez, porque as distribuidoras de filmes que ficavam na Triunfo ainda, saíram e foram pra Alphaville, dizendo que lá era mais seguro e tal. O que acabou com o cinema mesmo foi a falta de política pública né? Porque a Rua do Triunfo, onde eu tô mesmo, era o bar Soberano, que era um bar onde o pessoal se reunia pra fazer os filmes, fazer as produções. O bar Soberano, diz o ex-dono que você entrava com o roteiro, saia com o filme pronto. Você encontrava tudo, desde o câmera man, o diretor, as meninas de programa que faziam a pornô chanchada. Tem uma foto que estava no bar um tempo atrás, o cara vestido de índio, tomando cerveja, aí um de cowboy. Faziam a pornô chanchada na rua mesmo, mas não tinha problema, tinha um apartamentozinho que eles alugavam pra fazer os filmes lá em cima e tudo bem. E era bem interessante. E a Rua do Triunfo tinha pessoas que consertavam as máquinas de projeção, tinha o pessoal, tudo, as produtoras, a Massaini, ela continua lá ainda, tinha a Paris Filmes, todo mundo estava lá. O problema é que, com o fim da rodoviária, a Santa Ifigênia se renovou, ela foi pra componentes tal e melhorou, o resto que sobrou ali eram pensões, pensões e hotéis e restaurantes. Quem que vai lá pro centro pra se hospedar? Pra quê? A rodoviária foi lá pro Tietê, a 25 de março era um pouco longe, não tinha mais rodoviária ali, então morreu, morreu, acabou. Aí as pensões viraram puteiro, ou viraram coisa pro pessoal dormir mesmo, pensão, foi acabando, acabando, virou pensão de mendigo e foi caindo muito. Em 2000 mais ou menos, em 99, 2000, a gente começou a comprar os prédios pra trás, porque não tinha mais prédio na Santa Ifigênia, precisava de espaço, tal. O pessoal foi comprando e melhorando. A Rua dos Andradas melhorou muito, hoje é tão boa quanto a Santa Ifigênia, a Vitória, a Aurora, tá descendo o comércio, a Triunfo já tá muito boa, mas ela tá boa porque a gente resolveu melhorar, se juntou, brigou, colocou os drogados pra fora, contratou segurança, por quê? Não é nossa culpa eles estarem lá, a culpa é da própria Prefeitura e do Estado que o pessoal que é mais antigo vai saber: existiam os meninos da Sé, que cheiravam cola. Aí isso foi um escândalo, apareceu no Fantástico e tal que o governo não fazia nada. Resolveram fazer alguma coisa, pegaram os meninos que cheiravam cola da Sé e jogaram lá na Protestantes, porque era uma rua que não tinha nada, que ficava perto da Estação da Luz que não tinha mais movimento nenhum. Pegavam o moleque de lá e jogavam pra lá. O moleque voltava pra Sé, eles jogavam pra lá. Aí eles começaram a ver que lá dava pra comer, dava pra roubar, dava pra fazer as coisas, ficaram por ali mesmo e se criou a verdadeira Cracolândia que é hoje. Começou cheirando cola, usando cocaína, aí maconha e foi (corte no áudio) que defende esse tipo de coisa, que é um absurdo. E eles, infelizmente, implantaram naquela região uma zona livre, então o que acontece é o seguinte: o cara era mendigo, usava droga. Pra usar e pra polícia não mexer com ele, ficava ali, então a própria mídia começou a divulgar que ali era uma zona livre, que a polícia não interferia. Começou a aumentar, aumentar, aumentar até o momento que nós tivemos que falar assim: “Chega, a gente não vai mais agüentar isso”. Aí os comerciantes começaram a tentar melhorar, colocamos segurança na rua pra não deixar eles virem pras lojas, isolamos eles lá e eles aceitaram numa boa porque tinham as pensões que estavam abandonadas e eles começaram a usar as pensões pra usar droga até o momento que a prefeitura resolveu fechar as pensões, botar eles pra rua. Então é uma política pública fantástica: enfia eles numa pensão pra esconder o drogado, aí tira ele da pensão, fecha a pensão que não pode ter drogado lá dentro e bota na rua. Eles começaram a se espalhar e aí o crack é uma coisa meio absurda, porque ele é muito barato e a dependência é muito rápida. Antigamente a pessoa com crack, três anos morria. Hoje não, isso é balela. Eu conheço drogado de crack lá que tá há oito anos, dez anos, vai na loja lá pedir pra trabalhar e é comum isso acontecer, ele não morre mais. Acho que o traficante descobriu que se ele morrer ele perde um cliente né, virou comerciante. Mas é muito difícil você tentar passar isso pra política pública, pra eles é muito fácil. Nós tivemos uma reunião na prefeitura há uns seis meses atrás, tentamos explicar que o grande problema da Cracolândia em si era a falta de possibilidade deles saírem desse mundo, a pessoa chega num momento que ela tá no fundo do poço e ela quer sair e nesse momento, nesses 15 minutos de lucidez deles tem que agarrar a mão deles e levar pra algum lugar. Fomos perguntar o que estava sendo feito, eles fazem o cadastro do drogado, dão camisinha, dão seringa e dão cachimbo. Então fazem uma ficha, pegam o nome da pessoa, tal, maravilha. E aí? Só. Eles cadastraram alguns milhares de pessoas, só que quantas pessoas eles tiraram de lá e levaram pro hospital? Nenhuma. Quantas vagas têm num hospital público pra tratamento de drogados no estado de São Paulo? Quatorze. Como é que você pode combater drogas com quatorze vagas no serviço público? E a culpa é da Santa Ifigênia, da Cracolândia. Você vai me desculpar! Quando você bate boca com um político, porque: “Políticos, vocês são nossos empregados”. Nós elegemos esses bandidos pra trabalharem quatro anos. Se forem bonzinhos, trabalham mais quatro. Se não, rua. Mas agente pode tirar eles, isso a gente aprendeu também com algumas briguinhas feias aí. Nós descobrimos que, infelizmente, a classe política tem raríssimas exceções, raríssimas, mas existem exceções e que a gente pode mobilizar a população e mudar muita coisa. Se a gente tivesse ficado quieto, há seis anos atrás a Santa Ifigênia já tinha acabado. Pra você ter uma idéia, como é que chama aquele governador do Paraná? Jaime Lerner. Um excelente arquiteto, nossa. Mas acho que ele nunca trabalhou na vida né? Deve ser pai rico vai virar neto miserável. Ele fez um projeto pra região da Santa Ifigênia, ele ia passar o trator em tudo, ia fazer uma grande praça e uma ópera de arame. Eu acho que eu vi isso em algum lugar. Cara, é uma imaginação de arquiteto incrível né? Essa é a idéia dele. E fazer um boulevard em frente à Estação da Luz. Ele nem conhece São Paulo, aí descobriu que tinha gente que morava lá, tinha um comércio e tal. Desistiram desse primeiro projeto e fizeram incentivo fiscal. Não deu certo. Então descobriram que ia ter a Copa do Mundo, que ia ter as Olimpíadas e que ia ter um trem bala que ia ligar São Paulo ao Rio, que ia parar por ali, que talvez tivesse hotel, um lugar legal, o pessoal ia gastar dinheiro ali e que os terrenos iam valorizar pra caramba. Só que os tontos que tão lá há 50 anos, cem anos, não vão ganhar nada. Então eles resolveram tirar a gente de lá, fizeram um decreto e tal. Só que aí eles esqueceram que tem gente que pensa nesse país né? E a gente começou a brigar com eles. Primeiro uma briga meio que desproporcional, a gente não tinha idéia do poder que o povo tem, até o momento que a gente fez uma manifestação no fim de janeiro. Nós colocamos cinco mil pessoas dentro da Sala Elis Regina e eles não conseguiram fazer uma audiência (corte no áudio). Antes, marcaram uma audiência pra Fatec, que cabia 300 pessoas, colocamos mil e tantas, eles não conseguiram fazer. E então eles perceberam que colocar cinco mil pessoas numa manifestação, fechar a Santa Ifigênia e ir pra lá, dava um pouco de imprensa, a imprensa queria saber porque estava acontecendo aquilo. Eles começaram: “Peraí, com eles a gente não pode bater tão forte”, vieram conversar e perderam o papo né? Porque nós estamos em novembro, o projeto tá travado até agora. Eles dão prosseguimento um pouquinho a gente vai lá bate um pouco, então praticamente agora pra esse governo esquece. Então se não serve pra esse governo pra ele aparecer na foto no final do ano pra se eleger, não tem mais tanta vontade. Então, assim, povo tem que aprender a se organizar e tem que bater de um jeito diferente, não é só dar porrada, não. Tem que chamar as pessoas, a sociedade, e o que mais me surpreendeu nesses últimos nove meses que a gente tá, 11 meses, batendo mais forte é que tem muita sociedade organizada, muita. É que elas não conversam entre si por umas simples vaidade. É uma vaidade inacreditável, mas no dia que essas pessoas entenderem que se descer um degrau pra baixo, pisar no chão de verdade, e resolverem trabalhar juntas, coitado do governo! Ele vai ter que trabalhar. Como diz Maluf, que eu estava te falando no começo, dinheiro entra todo dia pro governo, é só destinar a coisa certa pro lugar certo. Infelizmente a gente é governado por um bando de pilantras, que desviam esse dinheiro que é nosso, que eu paguei esse imposto. Eu tenho um exemplo típico: minha esposa tinha um problema na época do parto do meu filho e disseram que eu ia ter que gastar um Santana zero pra ele nascer e eu bati boca com o médico, fui no hospital público e falei assim: “Eu exijo, exijo que eu seja tratada porque eu pago impostos, tá aqui ó”, mostrei a guia do Confins: “Eu pago meus impostos, o dinheiro que tá aqui nessa porcaria desse hospital é meu, então eu exijo que ela seja tratada”. Aí uma médica veio assim: “Vou te ajudar” a doutora, não lembro o nome dela, mas ela era fantástica, diretora do Vila Nova Cachoeirinha. Meu filho nasceu, não teve um problema. Nada, nada, nada. Os melhores hospitais são os públicos, porque é onde o dinheiro tem que ser gasto, os outros são hotéis. Einstein, lá, desculpa, mas quem vai pro Einstein ou é judeu ou é louco, porque não é possível, é um hotel, porque médico de verdade é o que tá no Hospital das Clínicas, esse sim. É o que a gente cansa de ver, político, tem muito político safado, mas tem muito cara bom, que se dedica, tal. Sindicato, tem muito sindicato safado. Eu lembro do Dieese, nossa. Na época um negócio fantástico, depois foi morrendo, morrendo, morrendo. A CUT, quando se tem o problema se cresce depois vai minguando, vai esquecendo, não tem mais a mesma expressão. O que falta é isso, falta o problema às vezes e a gente tem que começar a não ter o problema, pra não ter que ter político. Meu, político deveria ser um administrador, pago, que você renova o contrato com ele, é isso. E a gente não, a gente acha que é um Deus. Coitado, é um bando de infeliz. Se fosse competente era comerciante, meu amigo.
P/1 – (risos) Existe uma participação forte de imigrantes nesse comércio da Santa Ifigênia, como é que é?
R – Eu não tinha idéia, assim, to lá há 20 anos, não tinha idéia de como é que era. A Santa Ifigênia é feita de armênios, libaneses, sírios, judeus, nordestinos, basicamente são esses. Paulistas do interior de São Paulo. Mas a maioria, a maioria, isso assim, esmagadora dos grandes empresários da região são sírios, libaneses, armênios e judeus. E que comem na mesma mesa, conversam na mesma língua, são amigos e é o que eu quero te falar, às vezes vem uns lá sem dedo, sem orelha que vieram lá da guerra, revoltado, querendo fazer bomba e tal, conheceu a primeira mulata, meu amigo, esquece. Ai já virou brasileiro, já come com judeu, não tem discriminação, não tem nada, nada, nada. Ao contrário, na associação mesmo tinham algumas coisinhas ainda que o pessoal não se dava muito bem, mas na hora do problema todo mundo senta, conversa, nada, nada. E é um povo muito legal, eu não imaginava que tinha tantos libaneses, porque você vê a cara da pessoa, fala: “Não é”, aí quando começa a falar “sharmuta” e pronto! Já descobre que é libanês, e é muita gente, muita gente mesmo. E é um comércio que, interessante, lá não tem muito chinês, fez-se um acordo pra não deixar entrar, porque se eles entram vem a pirataria, vem o contrabando, vem um monte de coisa e ai acaba com o comércio que na Santa Ifigênia não tem como você fazer de outro jeito, só trabalha com indústria, vou vender sem nota como, não tem como. Então o comércio em si vive da honestidade na Santa Ifigênia. Aí vem o Fantástico, dá aquelas reportagens que comprou um CD do CNPJ das pessoas, do CPF das pessoas, declaração do imposto de renda. Eles não deviam tá perguntando quem que tá vendendo, mas quem que forneceu! Agora, dizer que foi comprado lá? Meu, onde mais se vende CD pirata é na feira livre, não é na Santa Ifigênia, na 25 de março. Nas feiras livres que vende fruta, tem um cara que vende CD, no posto de gasolina também tem. Mas ninguém tá nem aí. Eles querem colocar uma região como culpada, a 25 de março é uma brincadeira: é tanta perseguição contra CD e mídia que outro dia eu precisei comprar uma mídia pra gravar pra mandar uns manuais pra um cliente, eu não achei. Tive que comprar na papelaria, na Santa Ifigênia não tem mais pra vender, porque a polícia caiu em cima, a Federal caiu em cima, como se vender uma mídia desgravada fosse crime. Era tanta perseguição que pararam com isso, não dava lucro. Então, assim, a gente é muito perseguido. É isso que eu falo: é aquele falso sócio, o sócio vem só pra pegar o dinheiro no final do mês. Agora, pra ajudar, incentivar? Nada. Agora inclusive eu tive uma plenária ontem, sábado, com o Chico Macena e com o Haddad. Eles estavam comentando justamente sobre isso: foi aprovada agora uma lei na cidade de São Paulo sobre o alvará de funcionamento. O alvará de funcionamento hoje você entra e a prefeitura tem 60 dias pra dizer sim ou não, se ela não disser você tá licenciado, porque 90% do comércio em São Paulo é ilegal. A Câmara Municipal não tem um alvará de funcionamento, porque é impossível você conseguir um alvará. Cria a dificuldade pra vender a facilidade. Então hoje você entra na Internet, faz o cadastro e tem 60 dias pra dizer sim ou não, se não disser você tá liberado, pronto. Por que eu tenho que ser o bandido se eles tão pegando o meu dinheiro? Então, são atitudes assim que tem que começar a mudar esse país, não pode mais ficar essa porcaria que é, de desrespeito a nós que somos os patrões. É isso: nós somos os patrões, esse bando de políticos são empregados nossos. Está na hora deles se conscientizarem disso, se depender de mim vão levar muita porrada, você vai ver só.
P/1 – E como é que veio essa participação na associação e que associação é essa?
R – Desde que eu me conheço por gente eu queria montar uma associação lá de comerciantes, mas o pessoal era muito desunido porque não existia um problema pra se criar uma associação. Então existia lá a CDL, que era o Clube dos Lojistas. Foi feito o seguinte: eles criaram um clube pra quê? Pra defender os interesses, pra chamar os políticos pra conversar, uma mesa de sinuca, um negócio pra jogar um baralho e sempre foi muito assim. Há uns seis anos atrás, quando entrou o Serra, nós percebemos que ele não sabia o que fazer com o dinheiro que a Marta tinha deixado pra melhoria da região e ia fazer alguma coisa errada, porque ele chamou a gente dizendo que ia desapropriar alguns imóveis pra melhoria da região. Nós ficamos com a orelha em pé, então chamamos o pessoal, falamos: “Olha você acredita em político?” “Não” “E Papai Noel?” “Não” “Saci?” “Não” “Então em Serra também não dá pra acreditar”. Então o que nós fizemos? Montamos a associação, isso assim: a gente se juntou num galpão, juntamos 15 pessoas, eu tinha uns contatos políticos, perguntei como é que tinha que ser feito pra montar uma associação de comerciantes. Aí a CDL se transformou na CDL de verdade que era uma coisa mais nacional, e ficou lá dormindo, quietinha, porque era dos grandes comerciantes, eram 50 pessoas no máximo. Nós começamos a fazer o trabalho de formiguinha, conscientização, politização, mostrar o que estava acontecendo e tal. Quando a gente começou a perceber que as coisas estavam destorcendo, o que hoje é secretário do cultura, que não tem cultura nenhuma, que é o Matarazzo, Andrea Matarazzo, ele teve uma reunião com a gente dizendo que ia desapropriar alguns imóveis e que ia pagar o valor venal e mais um pouco e não sei o que, não sei o que, e os imóveis estavam abandonados, que não tinham função social. Uma conversinha estranha. Aí na reunião tinha uma apresentação e tal e começaram a vender a idéia de vender a Santa Ifigênia, o bairro. Foi quando apresentou o projeto do Jaime Lerner (corte no áudio) e nós começamos a bater já. O Serra era prefeito, de repente apareceu 200 notificações pra apresentação do alvará de funcionamento na região que interessava pra eles. Não tem o que fazer? Não, vamos juntar gente e fazer uma manifestação. Colocamos 200 pessoas em frente à Câmara Municipal. Eles: “Peraí, não é assim” chamaram a gente pra conversar e cancelaram as notificações. Até o, não lembro agora o nome, foi tão cara de pau que ele falou que aquilo tinha sido um grande erro, que ele não sabia quem tinha autorizado aquilo, chamou o chefe da fiscalização e o cara falou: “Foi o senhor” e mostrou pra ele o email assinado. O cara não sabia onde enfiar a cara, imbecil! Mas, tudo bem. Passou isso aí o Serra descobriu que a região precisava de incentivo fiscal e pra atrair as grandes empresas o que acontece? Não se pagaria ISS, reduziria a alíquota pra 2% e tal para as empresas que quisessem ir pra lá. Aí quase ninguém se cadastrou, deram 30 dias pra se cadastrar, pouquíssimas empresas já acertadas se cadastraram. IBM, Microsoft, as grandes que precisavam fazer call center, esse tipo de coisa, que iriam pra região, se cadastraram e tal. Então mudou a lei, eles resolveram mudar a lei e a gente acompanhando: “Esses caras tão achando que a gente é trouxa né?” e foram mudando a lei, mudando e tal, até o momento que o Serra saiu, que assumiu o Kassab, que aí mudou radicalmente a lei. Ele queria desapropriar a região inteira. Criou a PL quatorze, oitocentos e pouco, essa lei dizia o seguinte: que a prefeitura colocava toda aquela área como área de interesse social, que passaria pra iniciativa privada a desapropriação e administração dos imóveis. Aí não teve jeito né? Foi pau, pau, pau. Isso começou 2006, 2007, 2008, 2009, 2010. No final de 2010, na véspera de natal, eles assinaram a lei e no primeiro de janeiro, quando a gente voltou de férias, já estava tudo acertado, já estavam começando a destrinchar a Santa Ifigênia, as empresas já começando a negociar e tal. Aí nós acordamos né? Nós não, o pessoal da Santa Ifigênia de verdade, da Rua Santa Ifigênia, acordou. Então a CDL se juntou com a gente, que a gente era da ACSI, Associação dos Comerciantes da Região da Santa Ifigênia. Começamos a conversar, foi quando eles já estavam marcando pro dia 14 de janeiro acho, já pra tocar o projeto, foi quando (corte no áudio). Que tem que ter o trâmite. É inacreditável! Pra que serve uma audiência pública se ninguém escuta e se ninguém é respeitado? Mas tem que ter, vamos lá. Aí fizeram na Fatec: cabiam 300 pessoas, nós colocamos mais de mil lá e tiveram que cancelar porque o bombeiro disse que não podia garantir a segurança. Fizeram um mês depois, menos que isso, na Elis Regina, cabiam duas mil pessoas, três mil pessoas. Nós enchemos também, só que lá não tinha jeito porque controlaram a entrada, tinha polícia pra caramba, foi um rolo danado, mas mesmo assim conseguimos através de liminar na justiça. Cancelou. Aí eles quiseram conversar, foram fazendo, fazendo, só que o que deveria demorar até abril, já estamos em novembro e não fizeram ainda. Agora a gente entra com ação por ecologia, um monte de coisa. A gente aprendeu a trabalhar com eles, ninguém mandou ensinar. Agora a gente tá craque. E eles tão cada vez mais desesperados porque não conseguem tocar o projeto, por quê? Você compraria uma casa vazia, sem cachorro, sem gato e sem criança, certo? Uma casa baratinha. Mas e tendo uma criança remelenta lá, com a mãe doente, o pai com câncer, que pode entrar na justiça e ficar lá uns 15, 20 anos? Então eles descobriram que eles não tem como tirar a gente de lá. A gente tá brigando, brigando, a briga, a grande briga nossa é que eles não conseguem entender porque que a gente não desiste. Meu, eu to lá há 22 anos, tem gente lá há cem anos, todo mundo que entrou lá entrou peão e virou patrão, a verdade é essa. Todo mundo que entrou lá tá ganhando seu dinheiro honestamente, tá vivendo com a sua família dignamente. Vai largar tudo isso pra quê? Por quê alguém resolveu tirar a gente de lá? Desculpa, mas nós somos os patrões. Isso foi o mais difícil das pessoas entenderem também: que a gente é que manda, eles são nossos funcionários, tem data de validade. O Kassab vai sair, não pode voltar e não vai voltar nunca mais se Deus quiser porque, assim, a gente dá um mandato pra esses caras de quatro anos, se a gente for bonzinho a gente agüenta os quatro anos, se não a gente tira. Mas se a gente reeleger somos uns idiotas. E reelegeram ele pra, gozado, ele teve dois anos antes, o que ele conseguiu fazer em dois anos ele fez porque foi dois anos, o que era ruim ele não teve tempo o suficiente pra fazer, então ele se elegeu fácil. Agora a política é diferente, tem outras possibilidades e a gente já aprendeu a negociar, então hoje a gente já se reúne com políticos (corte no áudio) um acordo, vamos fazer isso antes. E o grande negócio que aconteceu lá foi assim: eram os libaneses ali, o pessoal mais novo aqui, o dono de shopping não falava com o inquilino, o dono do imóvel não falava com o inquilino. Hoje todo mundo fala a mesma língua, a gente se juntou, a gente se uniu, a gente conseguiu uma coisa que era meu sonho de muitos anos, que era transformar aquela região toda num bloco só. Hoje quando a gente levanta a voz todo mundo levanta junto, não interessa se o cara tá ali há dois meses ou tá ali há 20 anos e a política em si foi uma lição pra gente. Tanto que no sábado eu fiquei meio emocionado porque ver aquele monte de gente indo te falar alguma coisa porque a gente tá ali ensinando a lutar contra a política perversa, eu falo assim: “Caramba! A gente brigou tanto pra chegar num ponto tão simples de chegar”, mas as pessoas se esquecem que, meu, eles são os empregados, cara, pô! É a mesma coisa, você vai hoje num hospital, o cara não te atender, você chama a polícia e manda prender o cara! É um direito seu! E se a polícia não quiser prender, prende a polícia também. Pô, chega disso, meu! A USP lá, tudo bem, tem seus negócios, beleza, só que tem cara que é ignorante também. Estão matando gente lá, liberdade bem, libertinagem não. Tem direitos e deveres, a vida vai cobrar isso das pessoas, se ele acha que levantando a voz e invadindo o prédio ele vai... Não! Mas se ele juntar um bando de gente, colocar lá na frente e fizer uma plenária lá na frente e for aprovada e respeitar o que todo mundo fez, beleza. Já aconteceu comigo, não foi uma vez, não, foram várias vezes, eu defender uma situação, falar que a gente devia fazer uma coisa, as pessoas dizerem: “Não”. A partir daquele momento eu digo não, mesmo estando ciente, consciente que tô fazendo a coisa errada, mas eu vou dizer não porque as pessoas decidiram. Isso é democracia. E você, como representante da democracia, tem que saber que os seus direitos terminam quando começa o do outro e as pessoas às vezes se esquecem disso e o povo reclama porque não sabe ser democrata. Isso é uma coisa que as pessoas têm que começar a aprender: a democracia começa quando termina os seus direitos. Eu tenho um monte de direito, mas quando termina o meu direito, começa o do outro, eu paro, eu to invadindo o direito de outra pessoa e o político tem que entender isso. É muito legal você ver um político com cinco dias de mandato, ele te abraça, te beija. Quinze dias depois, meu amigo, ele sentiu o gosto do sangue, o gosto do poder, igual vampiro. Não te respeita mais. E isso é uma coisa que acontece em todos os níveis do mais baixo até o mais alto. Tem uma coisa chamada vaidade que é uma coisa impressionante, que é o mal da humanidade. Tem situações que você fala: “O cara podia ter resolvido de maneira tão fácil, ele quis levantar a voz agora tá com um problema mais sério”. No comércio tem uma coisa, que diz o seguinte: mais vale um minuto de conversa que dez minutos de briga. Só isso. Se você conversar e resolver, acabou ali. Eu nunca fui no Procon, nunca! Tem amigo meu que toda a semana tá com advogado lá, mas por quê? Ou ele não sabe conversar ou tá fazendo coisa errada. É tão fácil você saber negociar com as pessoas, falar a verdade do começo ao fim. Fácil. Por que político não aprendeu isso ainda? Porque não tem Procon pra político.
P/1 – (risos) Qual o horário de funcionamento da sua loja?
R – Das nove às 18.
P/1 – E o que você faz quando você não tá trabalhando? O que você gosta de fazer nos momentos de lazer?
R – Trabalhar (risos). O pior que é verdade. Eu estava conversando outro dia, eu não tenho hobby, praticamente não tenho. Eu gosto de assistir filme, eu gosto de, por exemplo, eu gosto muito de canais da Discovery, esse tipo de coisa, de canais de História. Meu pai foi professor de História também e a História é cíclica né? Ela volta de outra maneira, mas volta. Então se você souber o passado, você vai saber o futuro. Por exemplo, o império americano tá acabando, tá entrando no império chinês. E o chinês foi sempre mandado por todos os povos, foi invadido, foi torturado, foi humilhado e eu tenho um pouco de medo deles terem um pouco de raiva da gente, ainda bem que os descendentes de portugueses adoram um brasileiro lá. Tá bom de mais (risos). Mas é um negócio meio assim: você tem que entender a História. O americano ele vive da colonização inglesa que foi um bando de ladrão, sem vergonha, são os piratas do mundo que não tiveram competência de produzir nada e roubaram. O que os portugueses roubavam do Brasil eles roubavam dos portugueses e dos espanhóis, então é um povo ladrão. Então pra negociar com povo ladrão, tá na cultura não tem jeito. O chinês já não, o chinês é produção e eles aprenderam um pouco de comércio com o inglês e o português, que é Macau e Hong Kong. É muito interessante você ver isso. Então a História, por isso que eu gosto de, às vezes, ler e tal, porque se você entende toda essa História que tá acontecendo, talvez você possa negociar de outra maneira com eles. Que é o que acontece comigo: eu tenho um pouco de facilidade de negociar com o pessoal lá fora, mesmo não falando tão bem inglês, mas, meu, não tem outra maneira de você negociar se não for com a honestidade e lá também ainda tem honestidade. Eles são muito inocentes na negociação e também se você pisar na bola nunca mais. Então é isso, às vezes o meu hobby, o que eu gosto de fazer, é realmente ler e entender algumas coisas pra poder (corte no áudio). Mas também tá chegando um pouco no limite, viu. Porque não tem mais muita novidade, não tem mais o que você aprender, já tá chegando numa coisa assim... Com a Internet hoje é muito fácil, hoje tá um pouco mais difícil o comércio.
P/1 – E você gosta de fazer compras?
R – Adoro, adoro.
P/1 – O que você compra, aonde?
R – Adoro supermercado. Pra você ter uma idéia, em casa eu gosto muito de mercado tipo Sam´s Clube, esse tipo de coisa que você vai que tem novidades. Por que também? Pra você ver o que tá mudando, qual é a tendência e tudo mais e gosto mesmo. Às vezes roupa eu gosto de ir, eu gosto de ir em loja de fábrica, eu procuro de bastante coisa.
P/1 – E você comentou do seu filho, você gostaria que ele fosse comerciante?
R – Na verdade é o seguinte: o filho, na verdade, ele tenta tomar outro caminho sempre, mas você deve ter percebido já muitas vezes que quando ele chega num momento ele fala assim: “Pô, tentei fazer isso, tentei fazer aquilo, pô, mas meu pai sempre se deu bem nisso então vou fazer o que ele faz”. Isso é comum, eu tenho um exemplo típico de um primo que estava na 25 desde que eu conheço ele, há uns 30 anos, e o filho fez Direito e ou outro fez Medicina, se especializou em cirurgia plástica, que é difícil. Só que daí a hora que ele tá todo pronto, consultório pronto, tal, descobriu que ele não ganha nem um quinto do que o pai ganha, então ele descobriu que talvez trabalhar com o pai seja melhor. Então de manhã ele atende os clientes, à tarde ele vai pra loja trabalhar também e tá mais feliz na loja porque é mais fácil, aquela cirurgia que fica uma cicatrizinha a mais... Não tem reclamação, entendeu? Então é um pouco diferente, o comércio é muito bom, só que a gente é escravo. Eu não tenho férias, eu não tenho feriado, não tem muito o que fazer. Você é escravo realmente do seu trabalho. Isso que é o comércio, infelizmente. E principalmente eu, que não tenho sócio, não tem o que fazer. Meu filho tá trabalhando comigo, ele gosta, ele se diverte, porque é divertido. Você sai, você conversa, você vai tomar um café, volta, é diferente. Às vezes o pessoal pensa que comércio é aquele cara atrás do balcão atendendo, aquilo é atendente, é vendedor, comércio é outra coisa! Você negociar, você ir atrás da mercadoria, conhecer um fornecedor, conversar um pouco, às vezes você ganha um desconto num café que você toma, então é também um pouco de jogo de cintura, é a política. Eu canso de falar pra todos os meus amigos: “Crie o seu filho como comerciante”. Você, por exemplo, tá na sua área, se você não souber vender o que você quer, o que você sabe fazer, ninguém vai comprar. Você pode ser o melhor médico do mundo, se você não vender o que você sabe, ninguém te chama. A gente tem que saber vender o nosso sonho e, não sei quem foi que disse isso, mas o sonho na verdade só se torna realidade quando duas pessoas pensam, então se duas pessoas acreditam naquele seu sonho, já é verdade. Então vamos tocar o barco. Eu, quando comecei, o pessoal: “Você é louco, essa área não existe, ninguém trabalha com isso”. (corte no áudio) concorrente meu. Porque ninguém tem a paciência que eu tenho, o trabalho que eu tenho, o estoque que eu tenho. Eu tenho mercadoria que eu comprei há quinze anos atrás e que tá lá ainda. Mas o resto todo que eu comprei já vendi, já fiz dinheiro, já ganhei. Sobrou? Sobrou, deixa lá. Um dia vem alguém, se não desmonta. Então tem que ter essa paciência, esse jogo de cintura, não tem muito o que fazer.
P/1 – Seu Luiz, pra terminar, agora eu gostaria que o senhor me dissesse qual foi a maior lição que o senhor tirou da atividade comercial em todos esses anos.
R – A maior de todas? Quando você perde, esquece! Não vai atrás, porque se você ficar procurando o que você perdeu você não vai achar nunca mais. Isso foi o que eu mais sofri, não deu certo, você perdeu dinheiro, você fica tentando recuperar e tal. Esquece! Esquece porque o tempo que você gasta pra tentar recuperar o que você já perdeu, você perdeu duas vezes. Então isso às vezes é o grande segredo. Um negócio mal feito, deixa pra lá, você ganhou, você aprendeu, então toca o barco, corre atrás de outras coisas, tenta se reciclar, tenta melhorar porque quem vive do passado é museu.
P/1 – Qual o seu maior sonho pro futuro?
R – Meu maior sonho? Sinceramente, a única coisa que eu gostaria, que esse país mudasse um pouquinho mais. Só. Porque pra mim eu tentei fazer tudo o que eu quis na vida e fiz, graças a Deus. Tenho minha casa, meu carro, não tinha nada disso. Eu nasci pelado como eu digo pra todo mundo. (risos) Ninguém nasce com corrente de ouro no pescoço, então a gente tem que sonhar pro coletivo. O que eu queria é que esse país mudasse um pouquinho só. Desse novas oportunidades pras pessoas mais, que tem vontade mesmo de trabalhar. Tem tanta gente boa nesse mundo, tanta gente esperta, tanta gente inteligente e que não tem chance de crescer porque o Estado é carrasco. Acho que tá na hora das pessoas começarem a pensar um pouco mais não em si só, no coletivo. Nós provamos isso agora com a associação, a união das pessoas. Eu tive tanta gente inteligente que veio pro nosso lado, tanta gente de bom coração que veio pro nosso lado que eu fiquei assustado. As pessoas têm que aprender que não é aquele negócio: “Ah, a união faz a força, jamais seremos vencidos”, não. A união de verdade, o trabalho em conjunto, o coletivo é que vai transformar esse país aqui e que infelizmente... Eu espero agora que o governo Dilma que, como ela não vai se candidatar à reeleição, não sei quem vai ser, mas ela não vai se candidatar, eu acho que é um mandato de limpeza. Eu acredito muito nisso, se ela tiver a coragem de fazer o que ela tá fazendo, de peitar uns caciques idiotas que tem na política brasileira, a gente vai mudar esse país em tudo, em educação, em saúde, em tudo. Infelizmente as pessoas não têm memória nesse país. Há vinte anos atrás jamais se poderia imaginar que um negro ia entrar numa faculdade que não fosse de História, de Geografia, que fosse fazer Engenharia na FEI, na Poli, esse tipo de coisa. Na minha turma a gente entrou em cem, tinha um negro. Ele desistiu no primeiro semestre, não porque tinha racismo, eu não acredito nisso, mas porque acho que os sonhos dele chegaram no limite, foi de entrar na faculdade e hoje, não. Negro, branco, azul, amarelo, não interessa, todos são iguais, mulheres, homens, hoje as mulheres tem mais facilidade de estudar que a gente, que homem. Tá faltando isso: seriedade, começar a focar as coisas (corte no áudio) acabar com essa corrupção desgraçada, com esse desmando do Estado, com essa polícia corrupta que existe nesse país, pra gente começar a trabalhar em paz e dar chance pras pessoas. Cara, é insuportável você ter uma família que tem que mudar de uma cidade pra outra porque a empresa teve que mudar de cidade porque um prefeito não quis dar uma isenção fiscal. Se mudar a situação de vida de um monte de gente porque um cretino de um prefeito quer mudar, quer transformar o que é uma região comercial num grande hotel. Sabe, parar com esse negócio de querer mudar a vida das pessoas por imposição. O meu grande sonho é respeito. Só isso. Que as pessoas comecem a respeitar o ser humano de verdade. Nossa, eu sou espírita, sou petista, sou tudo o que o pessoal é contra, é incrível! Eu acho mais incrível isso. Você vai nos negócios que vê lá, todo mundo é espírita, ou espiritualista, mas você vai ver tem 2% da população que é crente, que caramba é esse? As pessoas têm medo de falar a verdade, tem medo de se expor. Medo do quê? Vão me dar um tiro? Se eu morrer eu volto, eu sou espírita, acabou a história. Começar a parar com esse negócio de ter medo do poder. O poder somos nós! O povo! Tá na hora de começar a ter consciência disso e quando as pessoas começaram a entender isso, isso foi o mais bonito, de toda essa história, de tudo o que aconteceu. As pessoas começaram a entender que o poder emana do povo e é pra ele que o governo tem que trabalhar. Esse acho que é o meu grande e único sonho. Porque eu tinha um limite já, já passei desse limite: eu queria ter minha casa, meu carro, viver a minha vida. Se eu quiser parar de trabalhar hoje eu paro, graças a Deus! Porque eu trabalhei 40 anos sem parar, aí a hora que eu falei assim: “Chega, não vou mais trabalhar”. Quando eu fiz 40 anos eu fiz a minha primeira viagem, fui viajar pro nordeste, fui fazer não sei o que, que eu falei: “Agora chega, já tenho que viver o resto da minha vida”. Aí que você começa a ver que você pode fazer outras coisas, melhorar, e você ganha mais dinheiro ainda, você ganha mais coisas, mais credibilidade. Eu acho que é isso, é fazer com que as pessoas tenham esse direito de poder estudar, trabalhar, saúde, não é um... Putz. Chega a ser absurdo um negócio desse, a pessoa chegar num posto de saúde não ter um médico. Por quê? Porque esse safado desse médico fez Medicina porque foi de graça ou então porque o papai pagou. Isso é que tá errado. Eu espero que essa nova geração, que tenha feito uma faculdade de Medicina porque gostava, que vai assumir um posto de saúde, tenha responsabilidade de saber que aquelas pessoas tão lá tão precisando de um médico, não de um cara que tem um diploma, que quer ganhar sete, oito pau pra não fazer nada. É isso que tá precisando mudar, a corrupção vem daí, do próprio pai que ensina como eu vi hoje numa pizzaria, eu sentado esperando minha pizza ficar pronta, o cara falou assim: “Pô, filho, entra na Polícia Civil, você tá feito! Aí você faz Direito, presta pra não sei o que, vai ser delegado”. Péra um pouquinho! Se vai fazer Direito, vai trabalhar, vai ser advogado, mas ninguém passa na OAB por quê? Aí que tá a corrupção, aí que começa as coisas erradas. O pai ensinar pro filho a ser malaco, tá na hora de parar com isso. Meu, não tem coisa mais bonita que você ver uma pessoa honesta. É fim de carreira o desonesto, e isso tudo vai ter que mudar um dia, não é possível. A gente briga tanto pra mudar esse país e a base não muda, sabe: “Ah, o que você quer ser quando crescer?” “Jogador de futebol”. Cara, pra quê isso? Vai ser carpinteiro, vai ser mecânico, sabe, faça o que você gosta na vida. Acho que meu sonho é esse, que as pessoas comecem a pensar um pouco diferente, parar de assistir televisão, parar de ver novela das oito que eu nunca vi na minha vida. Uma coisa tão absurda que é uma pessoa, todo mundo na novela das oito é pobre e fica rico sem trabalhar? E milionário que não trabalha, desculpa, mas tem que trabalhar. Eu não conheço uma pessoa rica que não trabalhe, não existe, é um estúpido. Família Matarazzo que me perdoe, tai ó, sobrou esse lixo que sobrou. Tá vivendo da política, é isso. Ciccillo Matarazzo foi um gênio, só que errou numa coisa, criou um monte de príncipe: pai rico, filho nobre, neto miserável.
P/1 – Eu gostaria de saber o que você achou de ter participado dessa entrevista, do projeto.
R – Eu acho assim, como eu te falei, quem não tem história não tem futuro e, sei lá, se de repente o mundo acaba e algum ET assiste vai ver que tinha uma pessoa que pensava diferente nesse país, porque não tem jeito, tem tanta gente igual, é tudo tão igual, é tanto esperto, malaco, sem vergonha, que tá na hora de mudar isso. Acho que as pessoas têm que começar a entender que dinheiro é bom pra caramba... Ah uma coisa que eu aprendi, uma frase, que isso você guarda pra sua vida. Pra que serve o dinheiro, o que o dinheiro traz? Só liberdade, só. Se você não tá livre, se você tem o rabo preso, você não tem liberdade, não adianta ter dinheiro. O grande negócio do dinheiro, o grande sentido do dinheiro é ter liberdade, você poder comprar uma calça que você gostou, você entrar num restaurante, poder pagar a conta, você poder parar num posto de gasolina abastecer seu carro e ir pra sua casa, poder comprar um presente pro seu filho, essa é a liberdade. Mas se você não tem a liberdade de tá livre, pra que serve o dinheiro? Pra que serve ser um político, cheio de dinheiro que não pode circular na rua? Pra que serve ser um artista que sofre tanto pra ter dinheiro se na hora ele não pode sair na rua, não pode ser livre. Então o grande sentido do dinheiro é liberdade. Todo mundo quer um monte de coisa. Burrice. Dinheiro tem limite pra gastar também. Desculpem os judeus, mas fui num velório num cemitério judaico e é normal, as pessoas choram, as pessoas contam piada, uns falam uma coisa, outros falam outras, o caixão é super simples, a pessoa é enterrada e morre, não tem outra coisa. Só que todo o dinheiro que ele deixou aqui ficou pros filhos, não tinha um carro forte levando dinheiro pra dentro do cemitério. Então pra quê ter tanto, pra quê querer tanto, se você não pode levar pra lugar nenhum? Se a espiritualidade vai te cobrar outras coisas? É isso. É tão fácil ser feliz nessa vida, as pessoas confundem tanto as coisas, é tão estúpido a pessoa querer coisas que ela não vai poder levar pra lugar nenhum. Agora eu sou um cara milionário, tenho quatro amigos. Quatro. Só isso, pra quê mais?
P/1 – Tá certo, Seu Luiz, então em nome do Sesc e do Museu da Pessoa eu agradeço muito a sua participação.
R – Obrigado.
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