Histórias de Consumo Consciente
Depoimento de André Palhano
Entrevistado por Lila Schneider
São Paulo, 28/09/2016
Realização Museu da Pessoa
PCSH_HV544_André Palhano
Transcrito por Mariana Wolff
MW Transcrições
P/1 – André, você podia começando a falar o seu nome todo, o ano que v...Continuar leitura
Histórias de Consumo Consciente
Depoimento de André Palhano
Entrevistado por Lila Schneider
São Paulo, 28/09/2016
Realização Museu da Pessoa
PCSH_HV544_André Palhano
Transcrito por Mariana Wolff
MW Transcrições
P/1 – André, você podia começando a falar o seu nome todo, o ano que você nasceu e local, por favor?
R – Sim, meu nome completo é André Martins Palhano, eu nasci em Piracicaba, interior de São Paulo, em 1976.
P/1 – E qual é o nome dos seus pais?
R – Meu pai se chama Marbio Antônio Lopes Palhano e minha mãe, Maria Dalva Martins Palhano.
P/1 – E eles faziam o quê?
R – Meus pais, os dois eram funcionários públicos, tanto meu pai quanto minha mãe são funcionários do Banco do Brasil, se conheceram no Banco do Brasil e enfim, eu sou um fruto do funcionalismo público (risos).
P/1 – E como é que você descreveria cada um deles?
R – Olha, é engraçado, que são pessoas que se separaram quando eu tinha 11 anos, mas são pessoas absolutamente diferentes, embora com a mesma profissão, né, minha mãe é uma intelectual ligada nas artes, na cultura, na filosofia e o meu pai é muito mais um cara boa vida, beber com os amigos, jogar futebol, então eram duas personalidades que, realmente, não tinham nada a ver e enfim, deram certo, né? Mas acho que em comum, são pessoas muito boas, pessoas muito sérias, nunca vi meus pais fazendo qualquer tipo de maldade ou tendo… são muito sérios, muito éticos, assim, né, na relação com as pessoas e com o mundo e muito bondosos, também, né, realmente eu tive essa sorte, sabe, de ter pai e mãe cujos valores, realmente, são… hoje em dia, eu admiro bastante. Até hoje, os dois estão vivos ainda.
P/1 – E quais eram os costumes da família?
R – Olha, o meu pai, quando eu era criança, a gente tá… eu nasci em Piracicaba, mas a família já morava em Campinas, né, eu fui só nascer em Piracicaba por conta do médico da minha mãe que acompanhava, então, todos os nascimentos da família iam nascer em Piracicaba, meu pai trabalhava no aeroporto de Viracopos, ele era o gerente da agência do banco do Brasil de Viracopos, que era o aeroporto internacional naquela época e tal. Então, engraçado, eu tenho muito essa imagem de criança de aeroporto, né, os amigos do meu pai sempre eram a turma das companhias aéreas, então tenho muito dessa imagem de entrar nos aviões, os churrascos no aeroporto, então teve muito essa relação. E onde eu morava que era no bairro do… era um bairro do lado do taquaral em Campinas, que na verdade, eu não me lembro o nome, era um birro que eu, com seis, sete anos de idade, eu já vivia na rua, pegava a bicicletinha e saía, ia andar na rua, tinha a turma de amigos ali do bairro, que a gente se encontrava, então era uma infância bastante livre, né, bastante livre mesmo, de muita brincadeira na rua, muita queda de bicicleta, muita molecagem. Isso é uma coisa bastante bacana, tenho uma ótima lembrança dessa fase.
P/1 – E a sua família veio da onde?
R – Minha mãe é de Piracicaba, ela nasceu em Piracicaba, é filha de italianos que foram fazer a vida naquela imigração italiana e o meu pai veio do oeste paulista, veio de Gália, que é do lado de garça, tem até hoje uma parte… tem um irmão que mora em Garça ali, então, ele veio daquela zona ali do oeste paulista.
P/1 – E os avós?
R – Meus avós por parte da minha mãe eram italianos, não conheci meu avô materno, ele morreu quando minha mãe era muito nova. Minha avó mais próxima era minha avó materna, né, vó Gina que morava em Piracicaba e sempre que minha mãe… minha mãe, ela fazia treinamentos para o banco do Brasil, então minha mãe sempre viajou muito e tal, então, minha avó sempre foi muito presente, ele ia para Campinas e ficava lá com a gente, tal. Era brava, era uma italiana bem brava, minha mãe também, daquelas pessoas extremamente dóceis, mas quando estoura, sai de baixo, né? E o meu avô materno era dentista, mas eu não cheguei a conhecer ele, ele morreu quando minha mãe tinha cinco anos, eu só vejo algumas imagens e lembranças dela, né? E os meus avós paternos, a vó Margarida que é portuguesa de trás dos Montes, ficou… foi a mais longeva da família, viveu até os 93 anos, é uma pessoa muito católica e tal, uma pessoa muito legal,. muito bacana e o meu avô que se chamava Vibio, né, ele apareceu quando eu tinha uns 12, 13 anos e ele tinha uma ascendência brasileira há muito tempo, inclusive, um lado índio da família que vem desse lado dele, um lado distante, lá do Mato Grosso, mas que vem… tem uma origem que ele fazia coisas com confrei, fazia umas formulas assim, sabe? Era um cara muito interessante, embora eu tenha curtido pouco ele.
P/1 – E você tem irmãos?
R – Tenho. Tenho três irmãos, uma irmã que já faleceu, infelizmente, minha irmã que eu gostava muito, que era quatro anos mais velha que eu. Tenho uma irmã um ano mais nova, que mora aqui em São Paulo, fez Publicidade e mora aqui em São Paulo, um irmão do primeiro casamento do meu pai, que é 12 anos mais velho do que eu, o Marcelo que mora em Garça, que atualmente mora lá, um cara bem diferente, um cara do interior, assim, ficou com sotaque, mas é um cara muito bacana, a gente se dá muito bem.
P/1 –
E você lembra da casa da sua infância? O quê que você lembra da sua infância?
R – Eu lembro muito da casa da minha infância, era uma casa muito gostosa, uma casa de bairro, uma casa térrea, muito gostosa e que quando a gente era pequenininho, ela tinha uma espécie de parquinho atrás, o quintal tinha uma caixona de areia com um escorregador, tinha um balanço, aqueles kits de brinquedo para criança. Eu lembro que eu adorava, a gente sempre teve gato em casa, então era uma festa, os gatos em casa, o cachorro, enfim… e aí, eu nunca me esqueço quando a gente tinha, sei lá, acho que uns oito, nove anos quando aquele parquinho começou a não ser tão interessante que eles decidiram fazer uma piscina em casa: “Oh, agora vai ter uma piscina” e aí, fizeram ali uma piscina, tiraram o parquinho e tal, aí, nossa, era uma festa, né, imagina uma casa com piscina, enfim, e foi uma época muito gostosa, a gente saiu de Campinas quando eu tinha 11 anos de idade, não sei se eu já entro nessa, mas a minha mãe teve uma promoção do banco para ir para Brasília, para ir para a sede do Banco e aí, meu pai já tava se aposentando e aí, foi a família inteira para Brasília, né, a gente fez uma mudança que foi assim, um pouco traumática, porque você tem seus amiguinhos todos, construídos em todos aqueles anos, de uma hora para outra, você vai morar a mil quilômetros dali, né? Mas daí a gente foi para Brasília, ficamos um tempo em Brasília e aí, meu pai não curtiu muito Brasília, aí se desentendeu, meus pais se separaram quando eu tinha 12 anos, ficaram um ano e meio, mais ou menos e aí, eu fui para o meu pai para Piracicaba, fui morar com o meu pai em Piracicaba, minha irmã mais velha já tava na época da faculdade, ela foi para a faculdade em Botucatu e a Kel, minha irmã mais nova ficou com a minha mãe em Brasília, então, eu tinha uma vida dupla eu ficava morando em Piracicaba com o meu pai, passando todas as férias escolares, mais feriados e tal em Brasília, né?
P/1 – Nesse vai e vem, né?
R – Confesso que era bem… bem… mas bacana, bacana, amigos diferentes, visões diferentes, foi bem interessante, até hoje são meus amigos.
P/1 – E como que era o bairro onde você morava? O quê que você se lembra, assim, da sua infância?
R – Olga, em campinas, eu lembro que era um bairro de casas, né, um bairro essencialmente de casas, eu me lembro que a gente subia muito em arvore, tinha muitas arvores no meio da rua que a gente subia, ficava brincando de Robson Crusoé, dessas coisas, né, e era um bairro tranquilo, não se ouvia falar de violência, era uma coisa bastante tranquila naquela época, eu não sei como tá hoje, mas era uma região bem gostosa, viu?
P/1 – Você se lembra se naquela época já brincavam com embalagens, coisas recicladas? Esse assunto já era…
R – Eu acho que não. Eu acho que não, eu não me lembro, assim, de ser… pelo menos ter esse nome, né, lógico que a gente, como moleque, fazia várias coisas com caixinha de pasta de dente, tal, me lembro que fazia trenzinho com besouro, amarrava uma caixinha no besouro para ele ir levando, enfim, coisas de interior, né? mas ainda acho que não existia, a gente não tinha essa consciência, acho que nem existia, na verdade, essa questão da reciclagem, como um tema relevante, mesmo lá dentro das escolas, né?
P/1 – Vocês reutilizavam embalagem?
R – Eu me lembro que a gente… engraçado isso, né, uma lembrança que eu tenho, a gente tinha muito embalagem reutilizável, né, a gente usava muito os potes de vidro. Eu me lembro que às vezes, a gente ia no Ceasa, né, e no Ceasa você ia justamente para enchera aqueles potes, aquelas latas que tinham em casa, né?
P/1 – Preencher com o quê?
R – Com, grãos, com… enfim, não eram embalagens descartáveis, né?
P/1 – E você tinha alguma noção do que você queria ser quando crescesse?
R – Eu acho que o básico de criança, né, bombeiro, né, enfim, acho que nada muito fora disso, aviador, eu quis ser muito tempo por conta dessa influência do aeroporto e tal, mas não durou muito, não (risos).
P/1 – E quais são as lembranças que você tem da escola?
R – Olha, eu tive muita sorte, eu estudei num colégio em Campinas que era uma escola comunitária, que lógico, eu só soube disso depois, ela era um colégio, um colégio acho que alemão e tal, que os pais assumiam, que entrou numa crise, não sei se financeira ou de gestão e os pais assumiram a direção do colégio e já assumiram com uma visão um pouco mais aberta, mais moderna de educação já naquela época, imagine, em 80 e tanto, né? Então, a
escola era uma escola que tinha muita aula de música, muita gente passava muito tempo… não era apenas no recreio, tinha muitas atividades em área externa, até hoje, né a escola comunitária é considerada inovadora. Então, foi muito bacana, viu, essa fase da escola, nossa, eu tinha ótimos amigos, tinha uma professora por quem eu era apaixonado, ia na casa dela, almoçava na casa dela, eu tive vários amigos, enfim, infelizmente, não tenho maias contato com nenhum deles dessa época, mas foi uma boa experiência.
P/1 – Tem algum fato, assim, mais marcante que você lembre da infância, da escola? Ou de algum professor? Fora essa paixão, né? (risos)
R – Eu acho que além dessa paixão, eu lembro muito da professora de música, a Thais, era o nome dela, Tia Thais que era uma diversão a aula de música, todo mundo se juntava ali, tal.
P/1 – O quê que vocês cantavam? Você lembra?
R – não me lembro, não tenho a menor ideia (risos).
P/1 – Mas lembra dessa coisa das pessoas se juntarem…
R – Exato! E eu lembro das atividades externas, era… todo mundo vestia uma camisetinha amarela, sabe, o uniforme era uma camisetinha amarela, sabe? Eu me lembro disso, eu me lembro uma história, uma lembrança que eu lembro que era da comunitária também, de… primeira vez, eu tenho várias cicatrizes como um bom ariano, né, eu tenho várias cicatrizes na cabeça, eu me lembro de uma dessas, correr para lá e para cá e pá, socar a cabeça, assim, sabe? Pôr a mão, estar cheia de sangue, as pessoas em torno. E é engraçado, que era uma rotina gostosa, que a gente acordava bem cedo, saía desse bairro, era próximo a escola, não era distante, a gente saía, pegava o carro e ia, e era uma festa, imagina, três irmãos fazendo maior fuzuê dentro do carro, mas é engraçado, essas lembranças, não me lembro dos detalhes, assim, engraçado, acho que faz muito tempo, né?
P/1 – E na adolescência?
R – Então,. a minha adolescência foi basicamente em Piracicaba, né, a gente teve essa mudança para Brasília e aí, eu fui para Piracicaba e aí, fiquei em Piracicaba até ir para a faculdade em São Paulo, então, eu fiquei ali, que eu passei toda adolescência, juventude, né? E é interessante que Piracicaba também é uma cidade muito livre nesse sentido de você sair na rua, eu me lembro com 14 anos, pegava o meu skate, meu, sete da noite: “Tchau”, ia para a rua para fazer street, enfim, era um época bem livre, né, bastante livre, mesmo, né? Fico imaginando se hoje ainda continua assim. Mas foi muito legal, porque foi a época também que eu abri minha cabeça, né, Piracicaba, apesar de ser uma cidade do interior, ela é uma cidade que tem muitas universidades, né, acho que tem seis ou sete universidades, tem uma USP, UNICAMP, enfim, e é interessante que você começa já com 14, 15 anos a conviver um pouco com esse: “Quero ir na festa da republica e tal”, é uma cidade muito festeira também, né, uma cidade que é fácil fazer festas, ir em festas em republicas o tempo inteiro, muito universitário, uma cidade que não tem, digamos, muitas opções culturais e tal, mesmo de outro tipo de atividades para oferecer, então, o pessoal faz festa, né? Que eu acho que aí sim, tem muito a ver com o que eu vir a fazer depois e tal, eu me lembro uma coisa que eu adorava fazer quando o meu pai viajava e eu ficava sozinho em casa e eu sempre fiquei sozinho desde os 14, 15 anos, cara, a gente fazia coisa que eu não teria coragem de fazer hoje, sabe, de juntar 50, 60 pessoas dentro do apartamento, fazia aquela bagunça… uma vez ou outra, meu pai voltava mais cedo de viagem, encontrava: “Como assim?”, enfim… então, mas foi bem gostoso, porque tinha já esses amigos que vinham de fora para fazer universidade e ao mesmo tempo, a turminha de Piracicaba, essa sim, é uma turma que eu tenho contato até hoje, são amigos muito queridos.
P/1 – Eu fazia também umas festas, adorava, quando meus pais viajavam, nossa, adorava! Pôr uma música, chamava os amigos…
R – Né? Tem coisa melhor?
P/1 – Bem nessa fase, né, que a gente já pode ficar só…
R – Exato! Que já se acha adulto, né?
P/1 – E daí para você entrar na faculdade como foi? Como foi a escolha do curso que você fez?
R – Então, quando eu tinha 16 anos que eu comecei a pensar, né, eu já estudava no Anglo, né, que já tinha uma visão voltada para o vestibular e tal, por influência do meu pai… meu pai, super protetor e tal, queria que eu fizesse Direito. Tinha que fazer Direito, aí ficou: “Se você fizer Direito, eu arrumo já um emprego para você, eu te dou um carro, não sei o que…”, aí, o quê que aconteceu? Comecei a fazer Direito em Piracicaba, na Metodista, fiz o terceiro colegial e fui fazer Direito na metodista de Piracicaba e aí, cara, em vez de ir para o colégio… imagina, você já vivia uma vida universitária de um monte de gente de outras cidades, do país inteiro que foi para um local e eu, em vez de ir para o colégio e voltar para a casa, eu ia para a faculdade e voltava para casa. Além do curso de Direito ser uma chatice, assim, eu falava: “Gente, isso aqui não é para mim, de forma alguma, né, isso aqui não tem nada a ver comigo”, e aí, eu não fiz nem um trimestre do curso de Direito, aí eu me rebelei, falei: “Não vou fazer esse curso, eu vou voltar a fazer cursinho, vou prestar uma outra coisa, isso aqui não é o que eu quero”, meu pai ficou muito puto, falou: “Então, você vai ter que pagar o seu cursinho e tal”, eu falei: “Tudo bem, meu, não tem…”, aí minha mãe foi a única que me apoiou lá de Brasília, falou: “Eu pago”, aí o meu pai ficou meio sem saída, assim, e desencanei totalmente dessa área e comecei a fazer cursinho. Aí, pensei: ‘vou fazer Psicologia, vou fazer publicidade, vou fazer…’ e aí, acabei fazendo jornalismo, acabei optando por jornalismo, né, já tinha uma pegada um pouco mais intelectual, né, de pensar as coisas, de fazer algo que tivesse algum tipo de impacto, sem ter essa consciência, né, mas de fazer uma coisa descolada e tal, e aí, vim fazer jornalismo, prestei em algumas faculdades, passei em Bauru também, mas passei na PUC aqui em São Paulo, em jornalismo, falei: “São Paulo é o lugar”, né, então mudei para cá, para essa terra maluca.
P/1 – E na faculdade, tem alguma história assim, algum fato marcante, alguma história que você lembre, assim?
R – Olha, tem… eu tive sorte… eu tive um azar e uma sorte, o azar é que na minha sala da PUC tinha eu e uma pessoa de fora, o resto eram todas pessoas de ao Paulo que já tinham suas rotinas e tal, então, não era aquela vida universitária dos sonhos, como era em Piracicaba, né, que você fica ali com tardes ociosas, aqui todo mundo já tinha os seus… e eu me lembro que engraçado, que eu fazia como eu fazia em Piracicaba, festassem casa e aí, iam três, quatro pessoas, falava: “Nossa gente, mas o quê que tá acontecendo?”, aí que eu descobri que São Paulo você não pode avisar no mesmo dia sobre a festa, tem que falar, pelo menos, um, dois dias antes para as pessoas se programarem e tal. Aí, começou a dar certo, né, mas eu tive… e a sorte que eu tive que eu tive um grupo de amigos na faculdade que era uma galera muito… uma cabeça muito aberta, assim, era um grupinho ali de seis, sete pessoas e os nossos trabalhos de faculdade eram todos quase performance, sabe? Algumas das pessoas, inclusive, tínhamos feito teatro amador no colégio, mas então, tinham uns trabalhos de Filosofia, a gente fazia peça de teatro, encenava, você deve se lembrar, ali no Pátio da Cruz, a
gente fez uma vez sobre o diluvio, um trabalho de Filosofia que falava do mito Guarani e tal, aí tinha o momento do diluvio que vinha uma… a gente… de cima do telhado, a gente girava um daqueles toneis de água enormes e aí, aquele diluvio, todo mundo correndo… então isso foi muito legal na faculdade, né, a gente conseguia sair da caixinha, assim, né, essa turminha da faculdade e que até hoje são amigos super próximos e super queridos, né?
P/1 – E hoje estão todos no jornalismo? Estão fazendo…
R – Acho que tem das mais diversas… tem alguns poucos que ficaram no jornalismo, né, até porque o jornalismo não tá nos seus melhores dias, mas teve gente que foi jogar golfe, teve um outro que foi fazer um curso em Nova York e virou um cara de novas tecnologias e inovação, mas alguns deles são jornalistas, hoje.
P/1 – E como que você começou sua vida profissional, qual foi o primeiro trabalho?
R – No segundo ano de faculdade, imagina, né, eu era cabeludo, alternativo e eu me via trabalhando sei lá, num caderno de cultura ou… e foi engraçado, no segundo ano, no primeiro dia de aula do segundo ano, eu tinha um professor chamado Anilton, lembra do Anilton? Que ele chegou para mim e falou: “André, o Luiz Nacif tem uma agencia lá, Dinheiro Vivo de jornalismo econômico, ele tá procurando um estagiário, eu gosto do seu trabalho, você não quer ir lá conversar com ele?”, eu falei: “Economia?”, né, mas fui. Era um estágio naquela época muito bem remunerado, pagava acho que 500 reais, ganhava 500 reais, nossa! E comecei, curiosamente, a fazer um estágio na área de economia, na agencia Dinheiro Vivo e me tornei um jornalista econômico, fiquei quatro ou cinco anos na Dinheiro Vivo, aliás, quatro ou cinco anos, não, uns três ou quatro anos, quando eu me formei, eu fui para a Jovem Pan, para a rádio Jovem Pan fazer comentários de economia, né, tanto de assuntos econômicos, quanto do sobe e desce de mercado do dia e tal, sai dali e fui para a Veja, fiquei um tempo na Veja trabalhando como jornalista, também na área de economia e foi muito interessante porque na Veja eu pude descobrir dentro do jornalismo tudo que eu não queria ser, porque tem um lado encantador de você… vai lá, almoça com o banqueiro, com o prefeito, inclusive, paga a conta, isso é muito legal da Veja, né, ela te coloca em pé de igualdade, você não fica se sentindo coitadinho e tal, mas ao mesmo tempo, é um péssimo jornalismo, né, infelizmente, espero que isso algum dia volte a mudar, porque já foi um bom jornalismo, né? Então, um super aprendizado, né, e fiquei na Veja, pedi demissão… pedi demissão desses três empregos e aí, eu fui para a Agencia estado, fui trabalhar na Broadcast que era o serviço em tempo real da Agencia Estado. Embora fosse um assunto super árido falar dos temas que interessam o mercado financeiro, era interessante porque tinha uma base técnica, né, muito legal te dar uma base, eu cheguei nesse meio tempo a fazer uma pós de jornalismo econômico, quando você começa a entender a economia… como é que se relaciona politica cambial, monetária, fiscal, muito interessante porque você vê mais ou menos que é o modo como a gente se organizou como sociedade, né, então é muito interessante e fiquei oito anos na Agencia Estado, fiquei como repórter especial da Broadcast fazendo essas… e era muito gostoso, porque apesar desse tema árido, a equipe era uma delicia, as pessoas… era leve, as pessoas se gostavam, a gente trabalhava pouco, trabalhava sete horas por dia, uma coisa super civilizada. Então, eu fiquei oito anos lá e aí, eu não sei se eu continuo até o fim…
P/1 – Pode continuar.
R – Até o fim é ótimo (risos)…
P/1 – E tem um fim…
R – E aí foi muito engraçado, eu em 2005, eu fui para os estados Unidos com o meu pai e aí fui e aí, viajei lá, fui encontrar um outro amigo em Nova York, tal, depois voltei e tal, eu tive uma coisa que eu nunca tive isso, assim, acho que mudou minha vida para sempre que foi uma crise de pânico. Em determinado momento lá e tal, eu tava dirigindo ali perto de Key West, ali para baixo de Miami, estava naquelas pontes enormes e começou a me dar um calafrio e tal, aí me deu o tal do pânico. Aí, cara, fiquei desesperado, falei: “Nossa, o que tá acontecendo comigo?”, voltei para o Brasil e o medo de ter aquilo de novo gera a tal Síndrome do Pânico, né? E aí, eu tive a Síndrome do Pânico, sofri pra caramba ali uns quatro, cinco meses, fui atrás de psiquiatra, psicólogo e tal, mas foi muito interessante assim, porque era como se o meu corpo tivesse falando: “Olha, ok, você é um cara de sucesso nisso que você faz, mas você tá realmente feliz? realizado?”, e aí foi engraçado, porque eu fui procurar, eu morava aqui na Vila Madalena nessa época, eu fui procurar e nunca tinha dado importância porque era super cético e tal, alguns trabalhos mais holísticos, de espiritualidade, então fui desde fazer ioga, meditação, respiração holotrópica, isso abriu minha cabeça assim, de um tanto, sabe, realmente foi uma… nossa, como se eu tivesse conhecido outro mundo, eu vivia naquele mundinho do mercado, da gravata, do dinheiro e tal e de repente, sua visão se abre para um outro mundo numa magnitude impressionante. Aí, sai do Estadão, falei: “Isso aqui, realmente, não…”, comecei a fazer alguns freelas e entre esses freelas, a “Folha de São Paulo” me chamou para fazer uma coluna de sustentabilidade no caderno de Economia, que chamava Dinheiro, na época. Eu falei: “Nossa, vou falar de sustentabilidade no caderno Dinheiro, falar sobre o Mico Leão Dourado? Como?”, sabe quando você se sente, literalmente, um foca: “O quê que eu vou falar? O que tem a ver com Economia?”, e aí você descobre que sustentabilidade não é apenas questões ambientais, né, como biodiversidade, água, preservação de florestas, na verdade, é um conjunto muito mais amplo de temas, tem a erradicação da pobreza, redução de desigualdade, diversidade, cultura de paz e tantos outros e aí, você não tem como não se apaixonar por esse tema, você vira quase um ativista dessa causa, assim, porque você percebe que tem entre outras coisas, uma lógica absurda, inclusive, do ponto de vista econômico, né, então não é uma utopia, é um salto civilizatório do modo como a gente vive, né? E aí, me incomodava muito a mim e a um grupo de pessoas que eu estava próximo nessa época o fato da sustentabilidade estar associada apenas às questões ambientais, ou seja, ser percebida apenas parcialmente e quando percebida nessa esfera, de uma maneira muito pesada, carregada, aquela coisa do: “Faça a sua parte, seja isso”, as pessoas todas: “Lá vem o chato…”, né? Então ali começou a surgir uma semente de uma ideia de falar: “Por quê que a gente não faz um festival de sustentabilidade? Uma campanha de informação que tenha essa cara de festival, né?”. Em vez de alguém falando o que você deve fazer e tal, você mostra com teatro, com cinema, com atividades lúdicas o que é possível, né, o que são esses temas da sustentabilidade, então foi ali que surgiu a ideia do que eu faço até hoje que é a Virada Sustentável, você faz um grande… é uma campanha de educação, uma campanha de informação que a gente nunca vai usar esse nome, você dá a ela essa roupagem de festival cultural, sobretudo cultural, né, um grande agito na cidade e as pessoas vão participar daquilo ali, saem dali um pouco mais informadas, um pouco mais conscientes, então foi esse start da Folha que me trouxe para isso e enfim, é o que eu faço profissionalmente até hoje.
P/1 – De que forma você acha que as pessoas, passando pela Virada mudam um pouco essa consciência?
R – Eu acho por duas maneiras, uma é pelo fato da informação relacionada aos mais diferentes temas, seja reciclagem, seja a biodiversidade, seja a cultura de paz chegarem de uma maneira mais sedutora, você não tá vendo alguém ali falando o que você deve fazer ou o especialista, ou não é uma coisa teórica com os seus jargões, a pessoa vai lá e vivencia, ela experimenta uma prática, por exemplo, participando de uma feira de troca ou fazendo uma oficina de objetos reciclados para montar uma coisa linda, não que: “Eu vou montar uma coisa linda e isso vai virar…”, não, mas você percebe que o lixo pode não ser lixo se você enxerga ele de uma outra maneira, então, esse aspecto lúdico que a cultura, a arte, as atividades de caráter lúdico trazem essa informação para você pelo coração e não pela cabeça, no pelo racional, então eu acho que é uma maneira super interessante de você perceber novos valores e começar a introjetar um pouquinho isso dentro de você sem ser forcado a isso, sem ser empurrado a isso, entendeu? É isso que eu acho de repente, a coisa mais legal desse modelo, né, você… e aí, e bacana, porque você tem desde coisas nos céus, nas quebradas da cidade até eventos no Museu da Casa Brasileira, enfim, você tem para todos os públicos, também, você não fica restrito a um modelo: “Não, isso aí não é para mim, isso não tem a ver comigo”, né? Eu acho que essa que é a grande sacada, você não tá empurrando, forcando ninguém, você tá só fazendo ela se divertir, assistindo um cinema ao ar livre, participando de uma atividade, ela certamente vai sair dali um pouco mais consciente, às vezes, até sem se dar conta disso, né?
P/1 – Se você quiser dar mais um exemplo, sei lá, uma peça que aconteceu, ou o tema da peça…
R – Tem duas coisas que eu acho muito emblemáticas, por exemplo, de dois temas, um por exemplo é o consumo consciente. A questão de consumo consciente tem a ver, entre outras várias questões, com o resíduo que você gera ao consumir. Uma das coisas mais legais que aconteceram na Virada acho que de 2013 era um circuito de várias instalações e em um deles era uma instalação do Bijari de 30 metros de comprimento por três de altura que era a palavra consumo montada com fardos de lixo, uma bela instalação, então aquilo ali, entendeu, você olha aquilo, consumo, imagina, 30 metros, uma super palavra escrita, montada com fardos de lixo, e então ali… isso que é interessante, não precisa ficar ali explicando que se você consumir muito, ou de uma maneira exacerbada, você vai gerar resíduos, enfim, ali já é na porrada. E tem uma outra coisa que eu me lembro também ligada à sensibilidade e a inclusão que é um trabalho da Fernanda Bianchini aqui em São Paulo que é um ballet de cegos, um corpo de bailarinas cegas. Então, você vê, e elas se apresentam, né, pessoal fica na coxia com barulhos assim, para elas se localizarem pelo barulho, e que assim, aquilo vale mais do que, sem excluir ou desmerecer obviamente, do que três horas com o maior especialista de acessibilidade e inclusão para pessoas com deficiências, porque ali você vê aquilo, você se encanta de tal maneira que você muda a sua visão em relação, no caso específico, as pessoas com consciência. Então, acho que são só dois exemplos, eu poderia passar horas aqui de tantos exemplos legais que já existem, o que a gente faz é só juntar essa turma e apresentar para o público.
P/1 – Eu li no blog que você escreveu que a sua sustentabilidade é verde, achei muito bacana…
R – Não é verde.
P/1 – Não é verde, se você puder falar um pouco disso, achei muito bacana a forma…
R – Sim, hoje é até um exercício interessante para se fazer, né, você dá um busca de sustentabilidade na internet, busca de imagens, impressionante como todos os elementos que vão vir são verdes, a cidade é pintada de verde, a mãozinha protegendo o planeta, né, e não que obviamente não exista e não seja a base dessa ideia maravilhosa as questões, de novo, de biodiversidade, recursos naturais, água, mudanças climáticas, são questões que estão associadas, mas é tão maior do que isso, né, é tão interessante quando você consegue ampliar, por exemplo, você chega até num grau de falar de felicidade, né, as pessoas que consomem muito, elas são as mais felizes? Não são, né, necessariamente. Então, existem outras esferas que não são verdes que também fazem parte desse guarda-chuva da sustentabilidade, só que é impressionante como as pessoas ainda associam a sustentabilidade apenas às questões ambientais, né? Por isso que a Virada tem tantas atividades ligadas a direitos humanos, à diversidade, à cidadania, à cultura de paz, tem até uma parte zen da Virada que é super forte com atividades de meditação, ioga, o que isso tem a ver com sustentabilidade? Com qualidade de vida, com saúde que também são temas ligados à sustentabilidade, né, eu acho que hoje a melhor tradução que existe disso são os objetivos de desenvolvimento sustentável, né, porque ali são sete temas dos quais, sei lá, quatro ou cinco são apenas verde, né, você tem um conjunto muito maior de temas, é claro que esses temas estão todos, de alguma maneira, inter-relacionados, então, essa beleza, essa complexidade que torna esse tema tão fascinante, né?
P/1 – E como que a Virada se inter-relaciona com esses 17 temas?
R – Então, os ODSs vão fazer um ano gora, em setembro de 2016, quando eles surgiram, já quando a ONU aprovou lá cento e não sei tantos países aprovaram essa agenda, a gente passou a adotar os ODS como eixos norteadores da própria virada, é tão representativa essa agenda que na própria inscrição de projetos via edital que antes você escrevia água, biodiversidade, cidadania, hoje não, hoje você escreve o seu projeto em um dos ODS, né, então esse ano foi bem interessante, a gente fez ODS em toda comunicação da Virada, fizemos exposições sobre os ODSs, foi uma coisa bem bacana, viu? E vamos seguir até essa agenda, porque para mim, realmente é o que melhor representa esse conjunto de temas que a gente tá falando que você pode chamar de sustentabilidade.
P/1 – Você acha que as pessoas refletem mais depois que elas passam pela Virada? Você acha que mexe com a cabeça?
R – Eu acho que tem diferentes níveis, né, você tem a mesma pessoa… duas pessoas diferentes participando de uma mesma atividade, por exemplo, num CEU duas crianças participando de uma atividade de reciclagem num CEU, elas podem ter… uma sair dali, dali surgir uma semente que esse cara vai ser um baita especialista, ambientalista, ativista, outro podse, simplesmente, passar batido, né? O que a gente sente, de verdade, é que faz uma diferença, né, lógico, entre isso e nada faz uma diferença, principalmente pelo modo como chega nas pessoas, o modo mais gostoso, mais de vivencia e experiência menos conceitual e sim, mais de trazer para a realidade, né, de cada um e uma coisa que a gente percebeu mais recentemente é o quanto você consegue das pessoas que estão participando, né, se reconhecerem, né? Então, tem muita gente que vai numa coisa dessa e fala: “Gente, nossa, eu pensava isso ou eu já fazia alguma coisa parecida, não sabia que tinha esse grupo, esse coletivo, esse projeto e tal”, então você acaba reforçando conexões de pessoas, de projetos que já estão fazendo a diferença na cidade e é claro que isso dá mais força, você imagina o que já teve de projetos filhotes de pessoas, grupos que se conheceram na Virada: “Vamos fazer tal coisa?”
“Vamos e tal”, então virou um hub, lógico, é uma vez por ano, apenas quatro dias, mas essas redes que se tecem ali, elas são mais perenes.
P/1 – As pessoas se identificam, né?
R – Exatamente. “Nossa, tem um monte de gente acreditando nisso, né, que legal!”.
P/1 – Você acha que tem algum movimento hoje que se assemelha a Virada?
R – Olha, eu acho que a Virada, ela é muito mais um reflexo de um movimento incrível que hoje é visível, especialmente, nas grandes capitais, né, de grupos coletivos, projetos que estão super botando a mão na massa para fazer a diferença, é impressionante, eu chamo essa geração dos 25 para baixo de geração protótipo, né, porque eles vão lá e fazem as coisas acontecerem, né, e fazem não daquela maneira clássica: “Vou buscar recursos, fazer um projeto…”, não, eles vão, se juntam com os amigos, têm uma visão tão horizontal de recursos, de Crowdsourcing que é fascinante: “O pai do meu amigo é engenheiro, ele pode ajudar”, enfim, vão lá e fazem as coisas. E a Virada, talvez, até por uma sorte, o que a gente faz é apenas botar essa galera junta, né, a gente só dá visibilidade para tanta gente, então a Virada é só um pedaço de um movimento que é muito maior do que a Virada, muito maior do que outros festivais que reúnem essa turma, né?
P/1 – E foi difícil concretizar essa ideia, assim, de quando você começou para começar a fazer?
R – Foi bastante difícil, né, empreender por si só já não é fácil, né,. imagina, fazer eventos! Não tinha conhecimento nenhum de eventos, é incrível que em seis anos, você olha para trás e fala: “Incrível, como eu era amador”, as apresentações de Power Point da Virada até a tecnologia de fazer, né, então é bem difícil, foi bem difícil porque é isso, né, você tem uma ideia, como é que você vai tirar essa ideia do papel? Mas curiosamente, justamente por ser tão difícil e por não ser um projeto mega comercial e tal, a Virada já teve, desde a sua origem, essa característica colaborativa, né, o que a gente faz é a tecnologia do piquenique ou da festa de amigos, tem muito a ver com as festas da juventude, que você vai lá, curte umas bebidas, uma coisinha para comer e fala: “Amigos, eu vou botar o som, eu vou ceder a casa, comprei aqui umas bebidas e comidas, mas tragam coisas também”, e a gente faz isso com a cidade, né, é muito simples, na verdade, né? Então você chama uma quantidade grande de atores, dos mais diferentes de todos os setores, claro, tem já alinhados com o seu propósito e valor e faz uma grande festa na cidade juntando essa turma toda, então, na verdade, a gente não produz um mega evento, a gente produz uma mega articulação que junto, vira um mega evento na cidade.
P/1 – E você, André, assim, você… o quê que você faz… você tem uma vida sustentável? O quê que você faz, assim?
R – Eu tenho uma vida sustentável, eu não tenho esses exageros radicais assim, de tomar banho de… eu assim, eu gostava de falar isso, até para polemizar em alguns momentos: “Eu tomo banho de meia-hora”, isso antes da crise hídrica, tá? Mas eu tomo banho de meia-hora uma vez por mês, um dia que eu esteja precisando de um banho de meia-hora, entendeu? Eu acho que é um pouco dessa visão, de que para ser uma pessoa sustentável, para ser uma pessoa legal você precisa não ter carro, não comer carne, não consumir… não é disso que a gente tá falando. Claro que vão ter pessoas que vão ser felizes tendo uma vida quase… um eremita, tudo bem, não tem problema nenhum, mas o que é legal é a gente perceber que tem muito mais a ver com respeito, com consciência, então por exemplo, eu jamais tomaria banho de meia-hora numa crise hídrica com a que a gente viveu recentemente que deixou marcas, aí, que a gente ainda vai sentir. Eu acho que é só uma questão de bom senso, né, por exemplo, hoje eu e a minha esposa, a gente usa um carro. Fica aqui, eu vou de metro para cima e para baixo, agora tem o Uber, eu uso ônibus e acho isso um tesão, eu poderia ter… não é porque eu q quero ser sustentável, é porque é mais fácil, é uma delicia você andar a pé, como a gente estava conversando, você andar a pé na cidade e descobre que andar cinco minutos, além de te fazer super bem, muda sua relação coma
cidade, você descobre um novo restaurante, descobre um equipamentinho cultural que tava ali perdido, entendeu? É muito interessante isso, como você pode ser um cara sustentável sem esses estereótipos de pessoa sustentável que só usa camiseta de algodão x e tal. O que a gente tem que ter é bom senso e consciência.
P/1 – A Virada tá acontecendo em outras cidades? Como que começou? As pessoas vieram te procurar?
R – Há uns três anos quando a Virada aqui já estava na segunda ou terceira edição, a gente começou a ter pessoas de outras cidades: “Nossa, quero fazer Virada aqui também, como é que faz e tal?”, e a gente, imagina, nunca tinha pensado nisso, né? Tem algumas pessoas que quiseram fazer Virada que a gente não seguiu em frente, porque a gente sentiu que realmente não estavam alinhadas a essa proposta de fazer um evento de transformação, um evento de Educação, mirava muito mais a grana, é claro que você vai empreender, você tem que pensar, lógico, em ganhar com isso, em viver disso, mas quando é só isso, não vale a pena, entendeu? E aí, a gente ia dando corda, aqui e ali e curiosamente, a gente achou que fosse em salvador, até Recife, a gente chegou em Recife a tirar foto com o prefeito de Recife e tal, mas que por motivos “n” não andaram e em 2000 e… há dois anos atrás, em 2014, a gente teve a primeira Virada, em 2015. É, meu calendário tá meio…
P/1 – Ano passado?
R – Ano passado, a gente teve a primeira Virada, de fato, a primeira edição que foi em Manaus, foi uma Virada junto com a turma da Fundação Amazonas Sustentável lá em Manaus e eles agitaram, incrível, porque Manaus tem muita coisa de projetos e tal nas florestas, no entorno, mas em Manaus não tinha quase nada e aí se juntou lá o pessoal do Impact Hub, os Global Shapers, a turma do Cicloativismo, pessoas de Manaus se juntaram e fizeram ali sob coordenação da FASE, nossa mentoring, nossa consultoria de como fazer algumas coisas fizeram a primeira em Manaus, isso foi em 2014, na verdade. Aí fizeram… não, foi 2015. Aí esse ano teve em Porto Alegre também, em abril desse ano teve em Porto Alegre uma Virada e agora, tá começando a espalhar, vai ter uma em Salvador agora em novembro, ano que vem vai ter Rio de Janeiro também, e a gente criou o quê? Uma tecnologia social, um modo de fazer, né, tem conselho criativo, necessariamente do local, uma curadoria que envolva essas pessoas, especialmente local, com tema local, linguagem local e que tá, curiosamente, espalhando, a gente tá super curioso, né, para ver o que vai acontecer é muito feliz de ver que uma coisa que você criou pode ser replicada e juntar tanta gente legal em outras cidades, né?
P/1 – E uma curiosidade, quando a Virada acaba, o quê que é feito com isso?
R – A Virada, por si, ela não gera muito lixo, porque são centenas de eventos ultra distribuídos na cidade, né, imagina, esse ano foram 884 atrações em atividades em mais de 140 locais de São Paulo, então não há nenhuma concentração como a Virada Cultural e tal, mas é obvio que a gente tem… nuns locais onde a gente produz, é obvio que tem uma super gestão dos resíduos gerados. Esse ano, por exemplo,
a gente fez com o pessoal da Wellgreen que é um pessoal muito legal, eles trabalham com as cooperativas, é uma empresa social e aí, tem os relatórios para onde foi destinado, quanto foi coletado, mas curiosamente, a Virada, ela não gera uma quantidade grande de resíduos porque são eventos de menor escala, né?
P/1 – Antes de você entrar na Virada não se pensava muito em sustentabilidade, em consumo consciente, você percebe uma mudança na consciência das pessoas de forma geral, assim, não só em relação…?
R – Sim, sim. Eu acho que tem uma questão aí que tem uma geração nova que já na própria escola, já teve alguns inputs, né, algumas informações ligadas a esse tema, então, eles já vêm com uma cabeça diferente, por exemplo, eu quando tinha 15, 16 anos era super comum jogar coisa na rua, era uma coisa ultra comum. Hoje, você vê alguém jogando uma latinha na rua, você fica meio… então assim, é lógico que sim, eu acho que mudou muito. O que a gente ainda precisa mudar bastante e eu tenho muita esperança nessas gerações que estão vindo, porque eu acho que a cada geração, a gente vai evoluindo nesse tema, né, é a consciência de que a gente vive junto, né, não importa se você more numa mansão no Morumbi ou numa favela ali ao lado, em Paraisópolis, a cidade é a mesma para as pessoas, a gente mora junto, a gente não pode achar que vai ter uma cidade boa com você se trancando num condomínio ou andando de helicóptero e achando que isso vai ser uma vida saudável, não vai. Ou seja, a gente tem que reduzir a desigualdade, tem que erradicar a pobreza, tem que dar oportunidade para todo mundo. Então, eu acho que é esse o passo que falta, as pessoas pensarem um pouquinho menos em si mesmas e passarem a abrir um pouco esse leque e aceitar a diversidade, a conhecer lugares diferentes, a ir para Paraisópolis, para Brasilândia, para Heliópolis, para a quebrada da zona sul e terem um olhas apreciativo, porque tem muita coisa legal quando você anda nesses loivais, tem muita gente legal, agitando coisas nesses locais, né, e essa mocada tem uma facilidade para isso muito mais fácil. Aquele modelo de que: “Olha, o modelo de sucesso é o modelo de sucesso financeiro, apenas”, eu acho que tá realmente ficando para trás, viu, isso não tem a menor dúvida.
P/1 – E para frente? O que fica para frente?
R – Eu acho que o que fica para frente são pessoas que têm amigos, pessoas bem resolvidas na sua sexualidade, na sua espiritualidade, pessoas que conseguem ter tempo para curtir seus filhos, seus amigos, para fazer esporte, para fazer algo saudável. Eu acho que esses valores estão mudando bastante, não tenho a menor dúvida que em dez, 20 anos, o tempo vai ser uma moeda incrível, assim, a pessoa desempregada vai ser um milionário, porque ela vai ter muita coisa para fazer. Claro, e uma brincadeira, mas vai mudar esse modelo de você S.A., né?
P/1 – E quais são as coisas mais importantes para você hoje?
R – Olha, eu acho que a coisa mais importante é meu filho, né, eu acho que quando você tem filho, talvez, porque ele tenha quatro anos, talvez quando cresça, deixe de ser tão importante, mas realmente, quando eles são crianças, não tem como não será
coisa mais importante para você. Eu acho que a paz, você conseguir ter uma vida de bem estar, de paz e principalmente, do que você faz ser uma coisa que tem propósito, que entrega não só para você, que entrega para o mundo, também, isso sem dúvida, é a coisa mais importante para mim. Eu me lembro, Lila, depois da primeira edição da Virada, eu vi algumas cenas, assim, eu choro pra caramba na Virada, fico super emotivo de ver algumas coisas, eu falei: “Eu já posso morrer, já entreguei para o mundo muito mais do que eu poderia tirar dele”, é uma sensação muito boa essa, você fica mais leve e a ente tem que viver feliz, né, não adianta a gente… seja mudando o mundo ou seja sendo um bandido cruel, adianta a gente viver estressado e viver…? Não adianta, a gente tem que viver feliz, tem que viver em paz.
P/1 – Acho que é isso.
R – Nossa, realmente, parece uma sessão de terapia.
P/1 – Você tem vontade de falar alguma coisa que a gente não falou aqui?
R – Acho que não. Foi ótimo, me senti à vontade, foi super gostoso. parece uma terapia mesmo (risos), me lembrou a fase da terapia, que é muito bom, né, todo mundo deveria fazer uma vez, né?
P/1 – Um olhar para sim, né, nossa, tem história, né? Quanta história! Bacana. Obrigada.
R – Foi um prazer.
FINAL DA ENTREVISTARecolher