Entrevista de Sandra Verbone
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P/1 - Qual é o seu nome completo? O dia que você nasceu? E aonde foi Sandra?
R - Meu nome é Sandra Martins Verbone. Eu nasci em Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro, no dia 9 de Janeiro de 74.
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P/1 - Sandra, você nasceu em qual hospital? Como foi o dia do seu nascimento? Como é que foi a gestação, alguém te contou essa história?
R - Eu nasci numa noite tempestuosa de Petrópolis, quem conhece a região. Foi de madrugada, acabou luz no hospital, uma chuva torrencial, a obstetra teve que sair para buscar um anestesista, porque as linhas de telefone tinham caído. Então assim, uma noite bem chuvosa, bem tempestuosa de Petrópolis. Mas assim, a gestação foi tranquila, na verdade eu não estava com muita pressa de nascer. Nasci em 74, naquele tempo não tinha tantos exames, como se tem hoje, então a médica achou que eu já estava fazendo uns 10 meses na barriga, muito confortável, quentinha. E aí decidiu que tinha que fazer a cesariana. Minha mãe foi para o hospital e tudo mais, tentaram induzir o parto, mas fui a primeira filha, então também aquela falta de conhecimento é obstetra, do tipo da gestação, de como seria minha mãe nesse quesito de parturiente. Mas enfim, chegou, não quis nascer, não adiantou induzir, aí decidiram uma cesariana, e a tempestade veio a luz acabou, o rio encheu. Um clima bem petropolitano, mas aí nasci, às 3:55 da manhã, do dia 9, bem de madrugadão mesmo. Mas eu nasci bem gordinha, já com 3 kg e tanto, já passando do tempo, já considerando pelo pessoal, já estava mais que na hora de acabar com a moleza.
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P/1 - Me conta um pouquinho sobre a sua mãe, qual que é o nome completo dela? E como que é a família da sua mãe, os seus avós? De onde eles vieram? O que eles faziam, fazem?
R - Eu mexo com as mãos, família de origem italiana. O nome da minha mãe é Luci Martins Verbone, ela hoje divorciada do meu pai, usa o nome de solteira, Luci Igrejas Martins. Mas vieram de uma família que é uma mistura, de francês, italiano, português, espanhol. Lado principalmente da minha avó é essa mistura bem quente, de espanhol com italiano. Então uma família barulhenta, bem animada. Meus bisavôs, todos vieram na Europa, em virtude de guerra, enfim, das crises da Europa. Todos eles se estabeleceram como comerciantes. A família do meu avô teve uma loja grande em Petrópolis, a Martins Filho, foi uma loja que durou muitos anos, como comerciante de móveis. E a família da minha avó, o meu bisavô, pai da minha vó, era joalheiro. Até estou aproveitando, fazendo umas homenagens de herança aí. Ele era joalheiro, então trabalhava com isso. Mas a mulherada da família da minha avó, ela não era fácil, então também tinha muito artista, então existiam músicos e atores. Um irmão da minha avó foi bailarino do municipal, do teatro municipal. Então tem esse lado artístico bem forte. E a mulherada toda de gênio bem duro, então a gente brinca que às vezes o artista não dava muito certo, mas a mulherada segurava ali, fazendo chapéu, enfim, fazendo coisas em casa para segurar a família.
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P/1 - E o lado do seu pai Sandra, qual que é o nome completo dele? Como que é a família dele?
R - Meu pai chama Jorge Luiz Ferreira Verbone. Já é uma família um pouco posta. Por isso o sobrenome Verbone, a origem dele é belga, meu bisavó era belga. Casou com uma inglesa, então uma família totalmente oposta dos Italianos, é uma família cheia de regras, tudo tem o seu horário, seu tempo, sem muito escândalo, pelo amor de Deus, todo mundo falando baixinho. Mas o meu avô, apesar de ser filho de Belga com Inglês, casou com uma mineira. A mãe do meu pai era mineira, de origem portuguesa, mas já muitos anos no Brasil, sem muita referência direta com Portugal, mas brasileira, mas ela se adaptou muito. Então ela também foi uma avó que captou muito essa rigidez, esse lado mais formal, dos europeus, mais secos, da ala seca da Europa. E meu avô trabalhava, quer dizer, o pai dele já tinha um Orquidário em Petrópolis, esse orquidário ainda existe, orquidário Binot. Meu tio hoje gerencia e eles trabalhavam com orquídeas. Então meu avô continuou esse trabalho, do pai, meu tio hoje continua também esse trabalho, que era do avô dele, veio trazendo. Essa é a mistura do lado do meu pai, é um pessoal mais quietinho, mais formal, um pouquinho diferente.
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P/1 - Os seus pais faziam viagens para Cabo Frio, né?
R - Como até hoje, em Petrópolis a gente fala que os petropolitanos saem de Petrópolis para se encontrar em Cabo Frio, nas férias. Era muito comum, e aí através de amigos, foram jogar vôlei, um na casa do outro. Você alugava casa para passar ali uns 15 dias, e acabaram se conhecendo.
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P/1 - E na época do seu nascimento, em 74 o que os seus pais faziam?
R - Meu pai já tinha ingressado em Furnas. Ele se formou, ele fez engenharia elétrica e ele começou a trabalhar em Furnas em 72. Então eles se casaram em agosto de 72. Então meu pai já trabalhava em Furnas. E minha mãe era dona de casa, ela tinha se formado em contabilidade, mas ainda criada naquela questão de tem que ser dona de casa, formar a família. Então ela ficava em casa e ele trabalhava no escritório central em Botafogo. Quando o escritório era lá em Botafogo.
9:02
P/1 - Sandra Você tem irmãos?
R - Eu sou a primeira. Eu tive mais dois irmãos, 1 com um ano e quatro meses, um ano e três meses, de diferença. Aí depois de mais dois anos do do meio, veio o caçulinha. Mas são dois meninos.
9:25
P/1 - Sandra você cresceu em Petrópolis? Você morou lá até que idade?
R - Olha, eu vou ser sincera, eu parei de contar as minhas mudanças quando chegou em 20 alguma coisa. A família não tem muito sossego. E eu não posso culpar a família, depois que eu também me tornei adulta, eu não paro muito quieta não. Mas enfim, eu nasci no Rio, eu nasci em Petrópolis, mas morando no Rio, o iníciozinho da minha vida morando no Rio. Quando meu irmão iria nascer, a gente se mudou para Petrópolis, para minha mãe ter mais apoio da família e tudo mais. Aí ficamos um tempo, meu pai foi transferido, foi chamado para fazer... ele sempre trabalhou com construção de linha de transmissão. Então a gente foi para Campinas, fomos morar em Campinas. Nesse inter, veio meu irmão caçula, a gente sempre se mudava para Petrópolis para os nascimentos. Minha mãe falava que de jeito nenhum ia ficar sozinha numa cidade sem família, sem apoio, para ter um filho. Então a gente voltava rapidamente para Petrópolis e voltava depois para cidade. Então ficamos em Campinas, ainda um tempo. Depois a gente foi transferido para Itapeva, interior de São Paulo. E aí em 82, se eu não me engano, a gente voltou para o Rio, voltou para morar no Rio de Janeiro. E aí ficamos também aqui no Rio, muitos anos. E aí quando foi em 90, se eu não me engano. Aí a gente voltou a morar em Petrópolis, a gente já adolescente, voltou para morar em Petrópolis. Nesse meio tempo, em 89, eu passei o ano inteiro na Alemanha, morando com a minha tia, fazendo intercâmbio, meio assim, familiar. Minha tia era casada com um alemão, então fui ficar na casa dela, fazer uma experiência de ficar um ano num país estrangeiro. Mas enfim, depois que a gente voltou para Petrópolis, em 90, a gente ficou até o período da faculdade. Depois também, nós, os filhos, saímos todos para estudar fora. E a partir daí, não voltamos mais morar todos juntos. Porque cada um foi seguindo o caminho, já foi construindo aí outras histórias, outros caminhos.
12:30
R - Como é que foi a sua infância nessa vida de tantas mudanças? Você conseguia ter alguns amigos mais próximos? Como é que foi esse período?
R - Olha Lucas, eu sou uma pessoa que não sou de fazer muitos amigos, até hoje, eu tenho muitos conhecidos. Esse um ano que eu passei na Alemanha, foi fundamental para eu aprender a falar, eu falo que eu era um bicho do mato de primeira, antigamente se falava aquele CDF, hoje é nerd, “uma nerd maravilhosa”. Mas socializar para mim, sempre foi meio complicado. E aí quem me conhece vai dizer, “magina, você fala com todo mundo, você ri e brinca com todo mundo”. E eu sempre falo isso, “gente, dentro do escritório, na minha vida pessoal, acho que são raros, acho que dá para contar as pessoas que eu trago para minha casa, para o meu núcleo”. Então eu sempre fui dessa forma, desse jeito. As mudanças para mim, não foram complicadas, porque na verdade eu mudava, sempre conhecia uma, duas pessoas, que eu acabava me tornando, fazendo uma amizade. Eu acho que de Campinas para Itapeva, eu era muito jovem, muito criança, isso não afetou tanto. De Itapeva eu tenho uma amiga que ficou até hoje. Até hoje a gente se fala, a gente acompanhou aí na adolescência, a gente ainda viajava, se via na adolescência. Apesar de morar bem longe, ela passava férias no Rio, eu ia passar férias em Bauru, para onde ela foi depois, a família é de lá. Mas para mim foi muito tranquilo, foi uma infância muito daquela que a gente brinca, raiz. Super tradicional, brincando na rua, fazendo guerra de mamona, tomando banho de chuva, banho de enxurrada, descer aquelas enxurradas. Depois correndo, andando de bicicleta, carrinho de rolimã. Enfim, uma infância bem solta, bem diferente do que a gente acaba tendo que criar os filhos hoje. A gente vivia na rua e as mães só ligavam para casa uma da outra, para mandar voltar para tomar banho e almoçar, jantar, enfim. Talvez até porque a gente morava no interior e numa cidade que tinha muita gente de Furnas, Itapeva foi meio que tomada pelo pessoal de Furnas, na época da construção da subestação de Itaberaba, das linhas que vem de Itaipu. Então como tinha muita gente de Furnas, até no bairro, o bairro acabou ficando. A gente acabou tendo essa liberdade de ficar bem solto.
16:03
P/1 - Me conta um pouco mais desse bairro que você cresceu em Itapeva? Era todo mundo filho de trabalhadores de Furnas, ou quase todo mundo?
R - Quase todo mundo. A gente tinha um grupo que era de Furnas, que eram filhos também de funcionários. Mas também tinha um grupo que veio da minha mãe. Minha mãe na época que a gente mora em Itapeva, ela abriu uma loja... Na verdade ela começou a fazer aula de pintura, na aula de pintura, ela conheceu algumas pessoas, aí fez amizade com essas pessoas, e eles moravam numa fazenda. O marido da tia Carmem, morava em fazenda, ele era administrador de fazenda. Então a gente começou a se relacionar com eles. Eles são os pais dessa minha amiga, que até hoje eu tenho contato com ela. Então a gente ficava entre um grupo de Furnas e um grupo que depois a gente foi conhecendo, um pessoal que era dono de escola. Então o grupo era meio assim eclético. Da cidade mesmo, eram poucas pessoas, porque era mais gente que tinha vindo de fora, que formava ali uma comunidade que a gente transitava mais. Mas era misturado, não era só pessoal de Furnas não.
17:44
P/1 - Você quando criança ouvia falar muito de Furnas? Como é que era Furnas na sua vida quando criança?
R - Então, o meu pai é muito caladão, ele vem mesmo dessa família bem fechada. Mas eu sabia que ele trabalhava em Furnas, eu sabia que Furnas existia. Também era um tempo que Furnas fazia festa, então tinha lá um Natal que reuniu os funcionários, tinha na época de Itapeva, festa no clube de golfe, eram festas que as famílias iam. Então assim, a gente tinha uma referência, de que Furnas era a empresa que o meu pai trabalhava, mas se você me perguntasse exatamente, na época, “o que o seu pai faz”? “ah, não sei não, sei que viaja, sei que tá e não tá, tá aqui, mas de repente está viajando”. Mas não tinha muito essa noção do que que a empresa fazia. A gente apesar de viver no meio, como as mulheres não eram de Furnas, e a gente misturava com outras crianças, a gente tinha uma noção de que a empresa estava lá, era a empresa que trazia o sustento, trazia aí o trabalho do pai, mas a gente não ficava no meio. Também naquele tempo, criança não ficava no meio mesmo, se adulto ia conversar, a gente ficava em casa dormindo com a babá. Festa de adulto era de adulto. A gente se reunia mais em eventos, aí ficava os homens para um lado e a criançada para o outro. Então a nossa referência, não era muito forte, pelo menos para mim, não era muito forte. Até porque meu pai, realmente, falava muito pouco do trabalho.
20:00
P/1 - O que você fazia na sua infância que se caracterizava como uma criança CDF? Lia muito, ficava muito na sua?
R – Sim! Eu sempre gostei de ler, desde cedo. Aqui atrás é só de romances, aqui embaixo tem os livros policiais, tem livros de estudo também. Mas eu sempre devorava livro, filmes, tudo bem que naquele tempo a gente não tinha canais de extreme, mas gostava já bastante de cinema. E eu não gostava de sair, eu gostava de ficar em casa. Eu falo que eu era CDF, porque assim, não era uma imposição da família, mas chegava época de prova... bom, primeiro que eu acho que se eu deixasse de fazer um dever de casa, eu já enfartava, nem ia na escola. Porque, tipo assim, era uma humilhação, como assim, chegar na escola sem dever de casa. Isso era meu, não era uma coisa que a família impunha. Claro que minha mãe tomava conta, acompanhava os nossos estudos. Mas assim, não era uma pressão muito grande. Mas eu me cobrava, eu cobrava nota, não ficava satisfeita se a média não tivesse lá em 8. Eu achava um absurdo, tinha alguma coisa errada. Então eu estudava para prova. Eu brinco, que eu tenho um irmão que nunca estudou, como é que chegou a se formar. Eu não, na época de prova, o estresse em pessoa, tem que estudar, tem que ler, tem que fazer exercício. Então acho assim, isso é uma característica que sempre foi minha, o tempo todo, até a faculdade, era esse estresse, tem prova, tem que sentar para estudar, e se alguém tiver atrapalhando, eu ficava, e fico muito irritada, se eu tenho que estudar e tem zueira em volta.
22:24
P/1 - E com relação a essas mídias, a livro, filme, TV, o que te marcou nessa época de infância? Uma leitura legal, um filme, ou programa de TV que te marcou?
R - Acho que nesse período de infância, impossível não lembrar da coleção Vagalume. Acho que para mim, o Escaravelho do Diabo, foi o livro que eu fiquei mais, que máximo. Acho que a coleção Vagalume, a gente tinha quase toda, ainda que não fosse obrigatório a leitura na escola, realmente eu tinha essa coisa. Depois teve uma época, foi ali perto, eu não vou conseguir me lembrar o nome, mas era uns livros que eram comum, de você escolher o final, quando você começava a ler, ficava lá: se você acha que o Fulano fez isso, vai para a página tal. Eu também tinha alguns nesse sentido. Depois eu comecei a descobrir Agatha Christie, comecei a ler Agatha Christie. Peguei alguns livros ali de Maurice Lebranc, eu fui passando pela área do mistério, fiquei um tempo ali. Em termos de televisão, acho Impossível, não lembrar dessa época dos Trapalhões, apesar de que não tinha nada de mistério, mas era assim, algo que eu acho que marcou muitas infâncias. Mas eu gostava também dos filmes de Indiana Jones, Star Wars, aquela versão, não essa coisa cinematográfica, aquela versão antiga, os primeiros filmes, eram coisas que eu gostava bastante. E até era um programa de família, filme era um programa mais de família, livro, mas eu e minha mãe. Os filmes a gente levava como uma coisa familiar.
24:42
P/1 - Sandra na sua casa, quem cozinhava, era sua mãe ou uma babá? Você lembra de alguma comida dessa época?
R - Quem cozinhava lá em casa era minha mãe, mesmo quando a gente passou a ter uma empregada. Porque daí já com três filhos pequenos, a gente tem diferença aí de 3 anos, do mais velho para o caçula, tudo muito junto, minha mãe teve logo uma fornada, e acabou, encerrou. A gente até passou a ter alguém que cozinhava, mas eu acho que comida que marcou esse período... depois eu voltei jovem, com 8 anos, para o Rio. A gente até trouxe a empregada, na época era mais tranquilo, esse tipo de coisa. Mas acho assim, que uma comida, não, acho que não tem nada que ficasse assim. Eu achava gostoso os momentos assim... a gente fazia, bem brasileiro, fazia alguns churrascos. Eu gostava mais dos momentos das reuniões em si, de quando a gente ia para fazenda, até porque reunia com núcleo próximo, eu não sou muito de muita gente, então quando fechava os nucleozinhos, e tinha essas reuniões. Os sabores que me remetem muito a infância, são sabores de festa junina, acho que se comemorava muita festa junina na época, coisas de festa junina, tipo canjica, pé de moleque, caseiro, não esse negócio industrializado que se compra não, o pessoal fazia em casa. Então assim, são sabores que ficaram, mas não tenho um prato, uma coisa específica, não.
27:01
P/1 - Como é que foi a trajetória nas escolas que você passou?
R – Foram algumas escolas, mas eu sempre muito quietinha. Na verdade, eu diria assim, eu acho que eu entrava e saía das escolas, a pessoa que era boa aluna, quietinha, não dava trabalho, nunca fui tagarela em sala de aula, sempre muito na minha. Não sei, eu trocava de escola, mas eu realmente, para mim, não era...eu acho que a coisa que mais marcou, nessas trocas de escola, que eram coisas que me incomodavam. Eu sempre fui muito alta, e perto do padrão brasileiro, eu sou muito alta, para faixa etária, principalmente. E eu ficava lá no fundo, e eu tinha horror, porque no fundo tinha a turma da bagunça e até eu conseguir ter coragem de começar a convencer os professores, de que na fila lateral, eu não atrapalhava, se eu ficasse lá na frente. Até eu conseguir verbalizar isso, e aí eu passei a ser uma pessoa mais em paz. Eu detestaria ficar no fundo de sala. Mas eles organizavam antigamente pela altura, então era inevitável ser a última da fila, e lá para trás. Nas escolas sempre o que tinha, era muito isso, a gente vê que hoje, nossa mudou demais. Mas naquele tempo, vamos lá, até para dançar quadrilha, era um drama, não existia nenhum menino da minha turma, que tinha minha altura. E aí como é que põe para dançar quadrilha com a criatura. Então tinha que buscar menino, de uma série, ou 2 para frente, para fazer par na quadrilha. Então até para fazer ensaio, era meio dramático. E eu gostava, quadrilha era uma coisa que eu gostava de participar na escola. Porque esporte eu sempre fui péssima, então pelo menos nisso eu ia. Então eram coisas assim, que ficavam um pouco estranhas. Porque eu treinava com a professora, para descobrir o par no ensaio geral, aí eu ia descobrir quem ia ser meu par na quadrilha. Por causa dos horários de ensaios, enfim. Mas assim, realmente eu não senti muito essas transferências de escola, como algo muito assustador, nem nada que marcasse, tão profundamente. Para mim sempre foi muito tranquilo, eu já era quieta, retraída, tanto fazia que escola ia ser quieta, retraída. Era só descobriu o esquemazinho alí, eu ficava na minha, fácil, comum.
30:20
P/1 - Tem algum professor ou professora que te marcou, que você lembra? Até antes de você ir para Alemanha, por exemplo?
R - Eu tive duas! Uma professora de matemática. Eu não tenho aptidão nenhuma para área de exatas, completo fracasso, na área de exatas. E essa Professora Tânia, hoje é o fundamental 2, mas antigamente era o ginásio. Ela me pegou, e puxou, e falou assim: para com isso... ela olhava as notas e dizia: não é possível, você ir tão bem, faz os exercícios em sala, o que acontece? Aí eu tive que explicar para ela, que eu era burra, eu não sabia matemática. Ela ficou tão indignada. Eu tive oportunidade de estudar em escola pública, até terminar o primário, até fechar a oitava série. E ela pegou essa segunda parte, do primário, e ela falava assim: como assim você é burra? Da onde você tirou isso? E eu falava para ela: eu não sei matemática, não entra na minha cabeça matemática. E era uma convicção. Claro que isso foi construído, ao longo, alguns professores, talvez não tão hábeis na forma de colocar. Mas ela foi me mostrando que não era aquilo tudo. Então assim, eu nunca fui brilhante em matemática, mas ela quebrou parte desse convencimento que não ia dar certo. E depois eu tive a professora de biologia, professora de ciências na escola. Eu achava ela o máximo, a gente lembra que na escola, ela vinha de família rica, então era o máximo... Vai, vocês são novos! Mas quem é do meu tempo lembra, logo que lançou aquele Escort XR3 conversível, ela tinha um vermelho. Gente, todo mundo morria por causa da professora. E ela chegava, muito despachada para dar aula. Ela era uma professora feliz, ela estava ali dando aula na escola pública, mas ela fazia e falava: vocês podem fazer o que vocês quiserem, eu amo estar aqui. E aí ela arrumava, ela levava para sala de aula, coração de boi, para gente olhar quando estudava o coração, as artérias saindo, as veias chegando. Então ela levava, trazia os bandejões, ela arrumava um jeito de trazer, a ciências para dentro da sala de aula. Coisa que em escola pública não se tem, de uma maneira geral. Então ela me encantou. Eu falava assim: gente, é possível você fazer escolhas diferentes. Venho de uma família que os homens são todos Engenheiros, meu pai e os meus tios. Aí de repente olhar isso, cara dá para ser muito diferente, e ser muito legal. É uma pessoa que mostrou quanto ela era feliz fazendo o que ela gostava. Essa professora de matemática também, ela dizia: para com isso, que professor ganha mal ou ganha... a gente tem que ser feliz fazendo. Então acho que essa alegria delas, essa positividade na profissão... E duas mulheres, isso ficou bem marcado .
34:35
P/1 - Antes de você ir para Alemanha você estava em Petrópolis, é isso?
R - Estava no Rio. A família estava no Rio, eu conclui a oitava série. A gente escolheu o período da troca, entre concluir o primário, para depois pular para o ginásio, para ensino médio. Então a gente escolheu fazer o hiato bem nesse corte de escolaridade. Então a gente morava no Rio. Aí eu fui, e quando eu voltei, a gente tinha mudado para Petrópolis. Na verdade a mudança da família para Petrópolis foi nessa minha ida aí, nesse período fora.
35:33
P/1 - Vocês passaram quantos anos no Rio de Janeiro, antes de você ir para a Alemanha?
R - Eu fui no final de 88, porque eu passei 89 todo lá. E a gente chegou em 82, então foram 6 anos. A família ainda ficou mais um, 7, 89. E aí em 90 a gente foi para Petrópolis.
36:02
P/1 - No Rio de Janeiro vocês moravam aonde nos anos 80?
R - Então, a gente morava exatamente no mesmo condomínio que eu voltei hoje. Eu comecei a pensar na história, foram vários momentos de volta. Eu moro hoje no Riviera Del Fioro, um condomínio aqui na Barra. Logo que a gente veio do interior, uma preocupação da minha mãe era, como eu pego três crianças, que brincavam na rua, e meus irmãos super ativos, principalmente o do meio, que gostava de bola futebol, descia ladeira desenfreado na bicicleta. Ela falou, como é que eu pego crianças, que estão acostumados a ter uma vida mais solta e coloco num apartamento dentro do Rio de Janeiro? Primeiro que eu vou ter que ensinar, como não pode pular, dentro de casa, não pode bater bola no chão. Então assim, ela acabou vindo e conhecendo, esse era um dos grandes condomínios que existia, na época, na Barra. Que tem quadra de esportes, piscina é todo cercado. Ela falou: se eu soltar, o segurança não vai deixar sair do condomínio. E aí começou o trabalho de conscientização, não pode sair do condomínio, não pode! Ela acabou optando por trazer a gente para cá. Meu pai foi transferido nessa época para o escritório de Jacarepaguá, de Furnas. Então apesar de ser um perto longe, mas era um local que tinha um condomínio. Jacarepaguá não tinha esses condomínios, na época. Ela falou assim: olha, as crianças vão enlouquecer, se elas tiverem que ficar trancadas num apartamento, a gente vai ser expulso do prédio. Então eles acabaram optando para vir para cá. Então a gente ficou o tempo todo nesse condomínio, apesar de ter morado em três apartamentos diferente. É o que eu falo, a falta de sossego, mora em um, depois não tava não sei o que, troca para o outro, e aí vai. Mas assim, a gente acabou ficando tempo todo nesse condomínio.
38:35
P/1 - Sandra, nesse período nos anos 80, foi chegando essa hora que você foi para Alemanha, me explica de onde partiu essa decisão? Como é que veio essa ideia? E o que você sentia na época com relação a ir para outro país?
R - Foi assim, a minha tia já estava casada com esse alemão. Eu já tinha uma priminha, era 10 anos mais nova do que eu. Essa minha tia, essa minha prima é a terceira filha, ela tinha tido dois meninos, bem compatíveis com a nossa idade, comigo e com os meus irmãos. E ela queria... os dois são filhos, também de pais diferentes. Então assim, ela estava no terceiro casamento, 3 filhos, um de cada pai. E ela estava num projeto, de tentar reunir, ou ficar pelo menos um ano, com todos os irmãos morando juntos. E aí ela começou a campanha com os pais dos meninos, para deixar os meninos irem juntos e ficar passando esse ano com ela. Enfim, ela começou a costurar, e no meio do caminho, o meu primo, o filho mais velho dela, ele é seis meses mas velho que eu. E ele ficava, “mas a gente vai sozinho, só vai ser a gente, como que é”? E aí ela me inseriu no projeto, “você não quer ir também”? Aí ajuda seus primos, você fica, você é uma pessoa que fala bem com os dois, ajuda a fazer esse meio de campo e não sei o quê, e aquela coisa, vamos, vai ser legal, morar na Europa 1 ano. E aí aquela coisa assim, você olha para o lado, ninguém falou que não, então vamos. E aí a gente foi construindo, em 88, o tempo todo essa saída. Então eu comecei a fazer curso de alemão, para pelo menos saber, oi, tchau. E aí foi construindo, estudando. E eles dizendo que iam, dizendo que iam, tudo certo, compra passagem. Então vamos, vai, vai dar tudo certo. Na última hora, o pai de um dos primos desistiu, falou que não deixava o filho dele sair do país, que não ia ficar, de jeito nenhum, longe do filho. E aí o meu primo mais velho roeu a corda, falou: mas espera aí, então ninguém vai, então eu não vou. E aí caiu na questão da pessoa CDF certinha, como é que eu ia dizer, naquela altura, com passagem comprada, que eu não ia. Eu fui naquela, tipo assim, ferrou, todo mundo roeu a corda, vou eu fazer o papel feio, e dizer que não vou. Quando me perguntaram, “não, está tudo ótimo, eu vou”! Fui morrendo de medo, morrendo de medo, porque essa minha tia, porque sempre foi muito solta, sempre foi uma pessoa muito diferente, ela foi considerada sempre aquela história da ovelha negra da família. Então assim, você vai morar com a louca, você tem certeza que você vai morar... a sua tia não bate bem, olha lá o que você vai fazer. E eu pensava, não, não pode ser tão ruim assim, né gente, ela não matou nenhum filho, tá aí, tá tudo vivo, vai dar certo! E aquela coisa, não volto atrás na minha palavra. Então, cabeça dura, eu fui! Não podia ter feito escolha melhor, acho até, que não ter os meus primos juntos, foi muito bom, porque me obrigou a sair daquela posição defensiva, que eu ficava meio que escondida. Certamente porque a minha tia não era uma pessoa de sair, de despachar. A minha mãe é aquela pessoa que se pões na frente de todo mundo, ela pula na frente, não só defende, se ela percebe... A gente brinca até hoje, que ela até hoje ela responde pela gente. Faz uma pergunta direcionada, ela vai lá e passa na resposta, esse é o perfil dela. Então assim, eu já tinha um temperamento mais fechado, tinha uma mãe que pulava para responder. Eu não precisava me comunicar, eu me comunicava quando era extremamente necessário. Olhava para o lado não tinha mãe, se eu dependesse do meu pai, que era tão quieto, o mais quieto que eu, eu estava perdida. Então eu não tinha muita necessidade de me expor, de me colocar à frente. E aí eu fui para casa da minha tia, que achava, “olha, você tá aqui, você se vira, você tem 15 anos, tá mais do que na hora de se virar”. Então ela dizia, “a escola é por ali, você pega aquela rua e chega na escola”. Chego na escola e faço o quê, procuro quem, como que vive? Eu acho que assim, o fato de eu não estar acompanhada dos meus primos, para me escudarem, de alguma forma, me obrigou a aprender falar, me obrigou aprender a pedir, a me comunicar, a me posicionar. Foi um ano assim, riquíssimo não só, claro a experiência. Eu fui morar numa cidade do interior também, onde todo mundo conhecia o meu tio e a família. Mas assim, teve uma questão de me obrigar a me abrir para o mundo, aprender a falar, e aprender ver, que dava para falar, que as pessoas ouviam. Foi uma ruptura bem forte, mas acho que muito importante, eu não teria conseguido, profissionalmente falando, ser bem sucedida, se eu tivesse ficado tão retraída, quanto eu era. Isso teria prejudicado bastante, soltou uma outra Sandra que estava lá quietinha, escondidinha e obrigou a se comunicar, a falar e para o mundo. Então foi assim, foi muito rica a experiência. Eu fui com medo, mas voltei muito satisfeita.
45:52
P/1 - Você estudou esse ano lá ou não? O que você fazia mais lá? O que você gostava de fazer o aprendeu a gostar?
R – Então, lá, o período letivo ele começa em Julho/Agosto, final de Julho, Agosto. Eu tinha que terminar oitava série aqui, a questão era a gente fechar o ciclo, não interromper. Eu parei de estudar um ano, mas eu não perdi um ano. Então assim, encerrei a oitava série, e fui. Então eu cheguei lá em dezembro de 88, cheguei para passar o Ano Novo. Passei o Natal aqui e o ano-novo de 88 lá. E aí estava nas férias escolares, para começar em Janeiro. Só que aí começava o segundo período, para eles, o segundo período letivo. Então, meu tio conseguiu, de eu ficar na escola local, no ginasial lá local, como ouvinte, eles permitiam o aluno ouvinte. Então assim, eu ia para escola, passei a me sentir inteligentíssima em matemática, eu olhava, dizia assim: nossa eles não sabem isso? Isso eu sei. Mas comecei assim, eu não tinha obrigação de fazer as provas, eu só tinha que frequentar a escola, não tinha obrigação nenhuma de prova. Mas tinha que frequentar, então ali eu comecei a aprender latim, pouquíssimo francês, porque o francês deles já estava muito adiantado, a turma que eu estava, estava no nível, que eu falei: gente, não dá para começar. E um pouco de inglês, eles tinham inglês na escola também, para mim o inglês estava ok. E aí acompanhava assim um pouquinho da aula, assisti todas as matérias. Mas o que eu conseguia entender muita coisa era mais na Biologia e na matemática, que eram os mais próximos em temos de nomenclatura. Alguma coisa da história, porque assim, o Alemão para mim, ainda era difícil. Então tudo que tinha uma fala muito rápida, o que exigia você acompanhar demais a língua, era mais complicado. Então acompanhei uma rotina diferente, eles tinham laboratórios. Coisa que aqui a gente não via, em escola pública, então as aulas de biologia era no laboratório de biologia, de química no laboratório de química, física também tinha um laboratório. Eles tinham as aulas de artes, arte, música, ginástica. Rapidamente descobriram que era melhor não me incentivar, coordenação nenhuma para esportes, se tiver bola quebra o dedo, se não tiver bola vou me machucar de qualquer jeito. Então assim, nenhum esporte era compatível, única coisa que eu era boa, em natação, mas essa escola especificamente não tinha natação, então zero esportes. E eu acompanhava a rotina deles de aula, de almoçar na escola e o intuito era tentar desenvolver o alemão. Rapidamente, virei a novidade da cidade, a pessoa que veio de fora. E uma cidade pequena, isso era uma grande coisa. Então todo mundo queria conhecer quem que era a brasileira que vinha de fora. Também na época, a gente acaba tendo que lidar com muito preconceito. Eu saí do Brasil no verão, gente, para brasileiro, eu sou branca azeda, por mais só que eu pegue, fica aquele ligeiro moreninho. O meu ligeiro moreninho, bem fraquinho, aquela marquinha, praticamente inexistente. Mas o meu ligeiro moreninho, quando eu cheguei lá, eles perguntaram se eu era mulata? E eu comecei a rir, eu ria demais, eu falava assim, eu sou o quê? Mulata onde, né gente? Branca! “Magina, você não é branca”. Me dá um tempo, vocês estão no inverno, me dá duas semanas, três semanas, vocês vão descobrir minha cor natural. Isso para mim acabou sendo engraçado, apesar de que claro, não tem nada de engraçado se você for tentar ver pelo lado do preconceito. Eu parava e ficava assim: gente, o que passa na cabeça dessas pessoas? Que eles não tem a menor noção, por ser uma cidade de interior, era só Alemãozão mesmo, não tinha ali ninguém diferente. Então o fato de eu chegar bronzeada, nossa, é um alien que caiu aqui. Talvez até por eu não ser, de fato negra, enfim, aquilo não bateu, eu achava tudo muito engraçado, eu achava que eles tinham problema. Eu falava assim: gente, esse pessoal não conhece o resto do mundo, eles não tem a menor noção, da diversidade, do que existe por aí. O Brasil tem essa característica, a gente desde cedo tem essa gama, essa variedade de pessoas. E eu olhava aquilo, eu achava que eles eram muito doidos. Bom, claro, rapidamente voltei a cor natural, e aí eu virei sem graça. “Você é sem graça, porque você é igual a gente, tem cabelo escuro, é branca, não tem o corpão brasileiro, não tem corpão de violão, não tem nada. A minha origem, genética todo Europeia, vai ter corpo de violão, vai ter corpo de violão aonde, tem toda essas mistura aí de vocês. Não era muito diferente, não tinha nenhuma grande novidade, a não ser que falava engraçado. E aí eles achavam... o Alemão é muito seco, na fala. E a gente fala meio cantando, eles dizem que falando português, parece que vocês estão cantando, vocês têm uma cadência no falar. E aí conseguiram descobrir, que na escola tinha uma portuguesa, que estava fazendo intercâmbio. Enquanto não me apresentaram para a portuguesa, eles não sossegaram, isso virou uma meta, no horário de intervalo fazer essa aproximação. E aí a diversão, era ver eu falando português do Brasil e ela falando português de Portugal. E eles diziam: vocês não podem estar se entendendo. E ela dizia: a gente fala a mesma língua. “Não falam”! Ir para escola, era até divertido, cada dia eles tinham uma novidade, do que eles iam propor, para a gente falar, fazer. Mais rápido entrou nessa rotina. Em casa eu tinha lá, as obrigações, de ajudar, lá não tem empregada, é muito caro. Minha tia é bem fechada, meu tio também era. Então a gente recebia visita mais de família, não tínhamos uma vida social na comunidade, ali forte. A não ser quando eu encasquetava que eu tinha que ir no circo. Ele dizia assim: mas esse é o circo mais chulé que existe. “Mas é o único que vem aqui, eu quero ir no circo.” Ele até hoje brinca, você me obrigou fazer coisas, que eu acho que eu nunca fiz na cidade. Porque era alguma diversão, era alguma coisa diferente numa cidadezinha, sem nada de diferente. Mas assim, teve um nucleozinho, eu ainda sai com pessoas, piscina pública. Enfim, passando por algumas experiências, que eu brinco, constrangedoras. Eu levei o maiô mais comportado que você podia imaginar da época, foi um escândalo, quando eu sai do vestiário. Porque era o maiô mais cavado que existia, acho que no país inteiro. Eu rapidamente cheguei em casa, falei para minha tia, eu nunca mais saio de casa com esse maiô. O maiô deles super diferente. Tive que trocar, gente, não dá, eu estava me sentindo muito mal, entra na piscina, fica com água até aqui, para não ter que passar por nenhum outro constrangimento. Aí acabei conhecendo essa portuguesa, ainda viajei com ela no intercâmbio. Ela estava fazendo intercâmbio, então a gente fez algumas viagens sozinhas, para visitar o pessoal que estava na Alemanha. Teve um encontro da empresa pela qual ela fazia intercâmbio. E aí os meus pais foram visitar a gente no meio do ano. E aí a minha tia conversou, falou assim: olha, a Sandra está falando um excelente português, com sotaque alemão, agora o alemão mesmo... Porque chega na escola, todo mundo quer se comunicar, eles falam inglês, ela fala inglês, ela começa a frase em alemão, quando não sabe a palavra pula para o inglês, ou vice-versa, me conheceu uma portuguesa, que no aperto faz a tradução para ela, de tudo. Olha, ela vai voltar do mesmo jeito que ela veio, alemão zero. Enfim, conversaram e decidiram que eu ia fazer um curso de alemão, para estrangeiros, em Hamburgo. Então Hamburgo ficava, a cerca de 90 minutos de trem, da cidade onde eu estava. E aí me deram o endereço, bem estilo a minha tia. Na escola meu tio ainda foi me apresentar, mas em Hamburgo, ele falou: olha, não dá, perde muito tempo. É o seguinte: você vai pegar o trem de tal hora, vai pegar o metrô número tal, e aí vai andar desse jeito. Gente, lembrando, não existe esse negócio de Google Maps, não existe absolutamente nada, a gente andava, a gente se orientava pelo mundo, com um papelzinho na mão. Então traçaram lá um mapa, o que eu tinha que fazer, eu tinha um mapinha na mão, com o nome das ruas. Enfim, da onde eu tinha que chegar, e fui. Fui, me matriculei, fiz o curso. E aí foi outra realidade, primeiro que eu era praticamente a caçulinha do Instituto. Eu fazia aula com médico, tinha um médico turco, tinha uma professora francesa, algumas mulheres que os maridos tinham vindo a trabalho, tinha chinesa, japonesa na sala, tinha uma peruana doidissima. Mas eu era caçulinha, então todo o pessoal na faixa dos 30 e eu lá com 15 anos. Tinha uma advogada italiana, brava, brigava até com professor. Porque era um curso só para estrangeiros, pegando um nível razoável, a gente fazia lá uma prova de nivelamento e ia. E aí eu fiz! Fiquei fazendo duas etapas, saí de lá com o alemão fantástico. Tive essa experiência de ida e volta, então eu ia e voltava todo dia, de trem. E aí comecei a andar um pouco por Hamburgo. Aí mudou o público, sai do grupo da escola, fui pegando pessoas com histórias, de estarem chegando, tinha gente que veio fugida, cada um com as suas dificuldades, se esforçando para aprender uma língua que não é fácil. E até isso, de certa forma incentivava, porque você falava: gente, eu estou aqui, se eu aprender, ou não aprender, não vai mudar nada na minha vida. Deixou de aprender! Mas olhando os profissionais, com a dificuldade de aprender, e uma necessidade de aprender, para poder começar a trabalhar, vindo de uma situação complicada. Então a gente começa a abrir. Foi uma experiência riquíssima. A escola não permitia, então por mais que a gente encontrasse espanhóis, peruanos e etc. Era proibido falar qualquer outra língua, que não fosse o alemão. Eles brigavam com a gente, pisou lá dentro, “lá fora vocês podem fazer a bagunça que vocês quiserem, aqui dentro, entrou é alemão o tempo todo”. E foi muito bom! Até assim, foi uma pena, que eu poderia ter saído formada, se eu tivesse entrado antes. O intuito era que eu aprendesse isso na escola, só que não foi possível. Foi muito gostoso, foi uma experiência, muito diferente, de conhecer uma cultura, de conhecer também a dificuldade de todo mundo que chega. A facilidade que eu tinha, por ter uma constituição, uma fisionomia, uma cara, um jeitão europeu. A dificuldade que as pessoas que eram um pouquinho diferente tinham. Eu falo, que depois dessa questão da escola, o único outro momento de preconceito que eu tive, foi conversando com duas senhoras no trem, e elas chegaram num momento e falaram para mim assim: você é francesa? A eu ainda ri, perguntei porque elas achavam que eu era francesa. “Pele muito branca, cabelo muito escuro, fala cantando, você fala alemão com um pouco de cantando”. Ai eu falei: não, não sou francesa, sou brasileira. Elas olharam uma para outra, começaram num dialeto impossível de eu entender. Eu ainda fiquei, nossa, mas que coisa horrível. Mas foi o máximo. Ali eu acho, que foi a primeira vez também... que hoje se discute muito essa questão de raça, gênero, dessa questão de equidade. Aquela ali, eu acho que foi a primeira vez na vida, que eu vi o que era as pessoas... o que era a história do preconceito, por mais que em mim tenha doído muito pouco, foi uma questão de momento, de eu parar e falar, nossa... Mas assim, isso não mudou, eu não sofria isso. E de repente ter contato com as pessoas na escola, pessoas que eram abordadas, esse turco, que era médico, o tempo todo sendo abordado, porque era turco. Tinha um árabe lá, o Mohamed, ele falava: não dá, toda hora eles me param. Às vezes o cara chegava atrasado, você viu que o cara já chegava estressado na aula, porque teve uma outra batida policial, ou porque alguém olhou para a cara dele na rua. Enfim, teve essa reação, na época não tinha toda essa questão dos refugiados. Eles eram muito poucos e os poucos que iam, eram tratados como se não tivessem qualificação, eles todos ali estavam sendo chamados. Eles estudaram, estamos falando de médico, engenheiro, não estamos falando de pessoas que foram fugidas. Eles tinham essa questão do preconceito. Então assim, eu não sentia, mas eu escutava isso, achava: poxa, o pessoal se diz tão civilizado, eles se acham tão melhores que o mundo, como é que me vem com uma questão dessa. Mas foi primeiro contato, vamos falar assim, com esse assunto, com esse tema. Então a experiência como um todo, ela foi muito rica. Foi o ano da queda do muro de Berlim, eu estava lá em 89. Eu estava muito longe de Berlim, bem tentei convencer o meu tio que a gente podia pegar um trem para ir para Berlim, e catar um pedacinho do muro, porque aquilo ia ser histórico. Ele só olhou, e falou: não vou nem comentar, você está proibida, se eu descobrir que você se quer chegou perto de Berlim, você está morta, você está aqui na minha conta, eu tenho que dar satisfação para os seus pais, como é que eu vou explicar? Foi caótico, para os alemães. Ele falou: você não tem noção do que está acontecendo lá nesse momento, você vai me aparecer com essa cara aí, de jeito nenhum, você não chega perto de lá, nem pensar. Mas enfim, também fiz amizade com a família dele, a família desse meu tio me levou para passear, conheci um pouquinho da Holanda com eles. Eles achavam que eu era muito engraçada, o jeito de falar, um jeito diferente deles. Eles vinham de um hábito lá, até cultural, esse meu tio, conheceu a minha tia, porque ele, apesar de ser farmacêutico, ele viveu um tempo como pianista clássico. Então ele foi fazer um concerto no Palácio de Cristal em Petrópolis, e a minha tia foi, e aí precisavam de um intérprete, e minha tia tinha um excelente inglês, e aí colocaram ela como intérprete, foi assim que eles se conheceram. Então eles só ouviam música clássica, piano. Ele também era filósofo. E aí chegou a brasileira que era engraçada, que detestava, não é que detestava a música clássica, mas conhecia assim, o básico. Eu falava assim: bom é livro de mistério, esses negócios malucos que vocês ficam falando aí, não tem nada a ver. Então eles achavam que eu era muito engraçada, porque eu saía muito do perfil deles. Meio que me adotaram, eu ainda fiz alguns passeios com eles. Enfim, tive essa oportunidade de interagir um pouco mais com os alemães.
1:05:52
P/1 - Depois dessa viagem, você já tinha alguma profissão que você queria, já tinha alguma ideia? Ou antes de ir para Alemanha você já tinha alguma ideia e isso mudou?
R - Nenhuma ideia! Eu voltei do mesmo jeito que eu fui. A única coisa que eu sabia, quando eu voltei da Alemanha, que eu tinha certeza, que foi uma coisa que eu comecei apurrinhar a família, foi que para o Rio de Janeiro eu não queria voltar mais. Eu não gostava de cidade grande, eu vi que morar em cidade do interior, eu me sentia mais confortável. E aí comecei a dizer, não quero voltar para o Rio, quero morar em Petrópolis com a minha avó, com a minha madrinha, com alguém. Mas eu não quero mais cidade grande, nunca gostei de cidade grande, na verdade eu voltei por questões de trabalho. Mas continuo achando que interior é muito bom, é uma vida mais tranquila. Gente, óbvio, isso tudo por carta, porque ligação interurbana era uma fortuna, temos que lembrar, que não existe internet, não existe WhatsApp, nada disso. Então a comunicação, ou era via DDI, ligação de longa distância internacional, que era muito caro. Então eu falava com a minha mãe por telefone, uma vez por semana, e tipo ligação rapidinha, “oi minha filha, está tudo bem”? Aquela coisa de mãe, preciso ouvir a voz para saber se está tudo bem mesmo, quando responde que está tudo bem. E no resto, era carta. Eu escrevi a carta para os meus pais, para minha avó, para os meus irmãos. A gente se comunicavam dessa forma. E eu comecei a manifestar o desejo de não querer mais. Enfim, por diversas questões, meus pais conversaram, decidiram que a gente voltaria para Petrópolis. Então quando eu voltei, em dezembro de 89, que eu voltei para o Brasil, a gente já estava, já estava vendo essa questão da mudança. E aí em 90, eu já comecei o colegial, já comecei o ensino médio aí, em Petrópolis. Mas sem saber o que eu queria fazer. Aí nesse pedaço, nessa fase do colegial, a gente começou a ter uma biologia, não era mais ciências. Aí a gente tinha biologia, física e química, que era o que entrava de novidade. E aí eu me apaixonei por química, descobri que eu era muito boa em química. Então no colegial, quando a gente começou a ver essas outras matérias, de biologia, química e física, eu entendi que realmente eu era péssima e exatas, física realmente se mostrou, muito pior que matemática. Eu até comecei a achar matemática, quase que legal, perto do desespero que era física. Mas me apaixonei por química e biologia. E aí também, naquela época, começou a se falar muito de Engenharia Genética. A Engenharia Genética começou a ser colocada como uma grande questão. Mas eu ainda estava assim, meio indecisa, apesar de que, pelo currículo, era onde me despontava em química e biologia. E aí se começou a fazer teste vocacional. E em uma dessas questões de teste vocacional, eu até já estava muito inclinada, eu acho que Engenharia Genética é tudo, vai misturar um pouco de química, com a Biologia, eu acho que era tudo que eu gostaria, tudo mais. Mas estava na dúvida. Farmácia também era uma coisa que eu achava que podia ser interessante. E aí fui fazer aquele teste vocacional, realmente essa área, foi a área que despontou. Meus professores de química tentarão de tudo para me convencer ir para química, ou pelo menos para farmácia. Eu desisti disso tudo, por causa da física, eu traumatizei com física num nível, que eu peguei o currículo, eu olhava, e dizia assim: impossível, esse aqui tem muita física, muita física. Eu acabei fazendo uma eliminatória, biologia, a gente tem uma física só, que deve dar para passar, porque é física para biólogo, eles têm que entender que a gente ruim nisso. Pouquíssima matemática, era um cálculo, basiquinho. Eu falei: olha gente, não vai dar, eu vou fazer biologia, que tem a Engenharia Genética, eu vou para esse campo, infelizmente, não dá para mim, esse tanto de física, matemática. E aí escolhi fazer ciências biológicas. Fazer a graduação em ciências biológicas.
1:11:37
P/1 - Você prestou vestibular no período certinho, entrou, como é que foi?
R - Sim! Eu fiz vestibular no final do terceiro ano, do terceiro colegial. Convenci, aquela coisa de convencimento de pai, falei: olha pai, a gente mora em Petrópolis... Fazer faculdade no Rio, a condição era fazer faculdade pública. Eu falei: olha, eu até faço vestibular para o Rio, mas você não deixa eu tentar uns dois vestibulares fora do Rio, eu não gosto mesmo do Rio, posso tentar 2. Tadinho! Eu acho que eu enganei ele, porque ele falou assim: tá, mas você faz no rio? “Não, faço também! Mas deixa eu fazer fora”? “Deixo”! Eu acho que ele pensou, não vai passar, porque a FUVEST na época era muito diferente. Eu não sei como que é hoje, mas era assim, quem estudava no Estado do Rio, tinha um vestibular completamente diferente do Estado de São Paulo. E aí eu fiz aqui para o URFJ, fiz para o UniRio, fiz para Federal Rural, lá da Rural. E aí convenci o meu pai, fiz da Unicamp e fiz a FUVEST. Mas ao invés de marcar a FUVEST para ir para a USP. Eu não queria ir, imagina sair do Rio, para ir para São Paulo, trocar seis por meia dúzia. Eu fiz para São Carlos, que fazia parte desse vestibular. Então fiz minha primeira opção São Carlos, não sei o que. Marquei de fazer a prova em Bauru, que era onde morava essa minha amiga, essa família que a gente conheceu lá atrás em Itapeva. Falei: tudo certo, ela também está fazendo vestibular, vamos fazer as duas juntas. Quando eu cheguei lá para fazer a prova da FUVEST, fiquei desesperada, quando ela começou a dizer os livros, tinha lá os livros. Minha mãe leu vários para me passar resumo. De novo, não tinha os resumos na internet, para salvar a gente. Então a gente tinha que ler. Ela me mandava algumas coisas, mas era muito difícil, a gente ficar trocando coisas, a não ser por cartas, era a forma que a gente tinha de ficar mandando documento. Enfim, e fui fazer vestibular da Fuvest, falando assim: nossa, se der sorte eu passo. E aí eu passei. Passei para São Carlos, para Federal de São Carlos. Passei para a UFRJ, passei para Unirio. E aí na hora de fazer a matrícula, veio aquela coisa, “pai você falou que eu podia”. Aí foi chantagem num nível feio, foi aquela carinha, “mas você falou que eu eu podia, você agora vai dizer que eu não posso ir para São Carlos”? E aí para o UFRJ, tinha aquela coisa de primeiro semestre, segundo semestre. Eu passei para o segundo semestre. Ele falou: faz assim, vai para São Carlos, que começa logo no início do ano, mas faz matrícula na UFRJ para o segundo semestre, porque quem sabe, você não gosta e volta. E aí eu olhei para ele, falei: pai eu não vou fazer. E não fiz, não fiz matrícula para URFJ, não existe opção, não fiz para o UniRio, não fiz para nenhuma. Eu vou para São Carlos, eu vou fazer a matrícula e é lá que eu vou ficar. E aí foi lá que eu fiz a graduação, adorei, ter ficado de novo numa cidade mais tranquila, morando em república. Outra experiência, de controlar dinheiro, porque na primeira, na Alemanha, eu tinha que controlasse o meu dinheiro, estava morando na casa dos outros. Mas aí foi a primeira experiência, já fora de casa, ganhar mesada e tem que fazer o dinheiro dá. Tem que fazer o dinheiro chegar no final. E aí foi fazer biologia lá.
1:16:10
P/1 - Saindo da faculdade, como que era as oportunidades de trabalho nessa época? Para que lado que você foi? Você se especializou no quê?
R – Então, eu entrei para fazer engenharia genética. Eu era uma pessoa muito convicta de que essa ia ser o meu futuro. E aí, a genética era algo que a gente via mais para frente na Biologia, exigia aí, um mínimo de curso para a gente ter um mínimo de noções, mais avançadas, para poder fazer o curso de genética. Então a genética, chegava mais no meio da graduação. No início da graduação, eu conheci a bioquímica, e foi outra coisa que eu me apaixonei, eu adorava Biologia, adorava química, juntar os dois. E aí eu descobri, aflorou aí, um outro traço, pessoal, até uma questão que eu comecei a brigar com o professor. Porque o que a gente fazia no laboratório de bioquímica, era colocar substâncias na água. A gente criava peixinhos, são peixes usados como bioindicadores, de poluição, enfim. Então a gente tinha vários aquários com esses peixinhos, separava os aquários, e ficava colocando substância na água, até atingir a dose letal, que era matar 50% mais os peixinhos. E eu olhava para ele, eu dizia assim: mas já não sabe a dose letal dessa substância. Que dizer, a gente ficava repetindo coisas. “Tá, mas você nunca fez”! “Tudo bem, eu nunca fiz, mas a literatura diz, se eu colocar tantos microgramas, mls, enfim, dessa substância na água, os peixinhos vão morrer”. Ele: sim! Então eu não vou fazer, porque eu vou ficar matando peixe se a gente já sabe a resposta do peixe. E ele falou assim: mas você tem que entrar e passar por tudo. E aquilo para mim, foi tão difícil, foi tão complexo. E disse assim: para quê que eu vou ficar matando vários peixinhos, criar peixinho para matar peixinho, para chegar numa resposta que a gente já sabe. E aí eu falei para ele: para mim não dá! E aí eu fui convidada, gentilmente, a sair do laboratório. Porque todo mundo tinha que passar por aquele momento, e era meio, problema seu se você não dá conta de fazer. Sai! Falei: tudo bem, também não quero. Aí eu fiquei meio perdida e consegui, por ter sido muito boa em bioquímica. Consegui então, entrar um pouquinho antes no laboratório de genética. Bom, chegou na área. Genética, gente, a gente vai achar as curas para as doenças, vamos salvar o mundo. E aí chegou lá, de novo aquela coisa de repetição, de corre DNA em gel, depois... Era precário e arcaico, estamos falando aí da década de 90, de novo, os primeiros computadores chegando na faculdade, ainda DOS, sistema D O S, não era essa coisa maravilhosa. Saia como se fosse uma foto, era revelada lá, uma foto dos cromossomos. E a gente tinha que ficar recortando e formando par. “Eu estou fazendo isso para chegar aonde”? A pergunta minha, sempre foi essa. “Não, você esta fazendo isso, para fazer, para depois, um dia, você ver”. Mas não dava para fazer isso tudo, com uma coisa chegando em algum lugar, não dava para a gente botar aí um motivo, um negocio. E aí, mais uma vez, “não, primeiro você aprende isso”. E aí, eu me dei conta de que eu não conseguiria fazer nada na faculdade, que não tivesse um propósito, e que o propósito não fosse por a ciência, isso existe muito forte. E eu acho assim, não é desvalorizando e desmerecendo isso. A ciência, pela ciência, a gente precisa, senão a gente não avança numa série de coisas. É necessário que exista alguém, que fique forçando, testando e comparando e chegando no resultado. Mas naquele momento, eu cheguei a conclusão, que eu não era essa pessoa. Eu não conseguiria fazer nada por fazer, sem ter ali uma experiência. Na gradação eles entendem, entendiam pelo menos, que era isso que os alunos tinham que fazer. Você não era pesquisador, quem era você para querer ficar querendo ter propósito. Você tinha só que fazer, aprender a fazer aquilo. E aí eu me rebelei totalmente. E aí conheci uma professora, também super rebelde, a Geria, da botânica. Que também detestava essa coisa de fazer, por fazer. E aí nós juntamos, as duas, e aí eu fui começar a fazer na faculdade, não à botânica clássica, de identificação de espécie, mas a parte de recuperação de áreas degradadas. E ali eu achei aquilo fantástico, a gente fazer plantios. Então a gente ia lá para o meio de locais que tinham sido queimados, e levava as mudas, e plantava, e acompanhava o crescimento das mudas. E aí eu entendi, porque eu estava fazendo aquilo, via aquilo crescendo, via aquilo dando sentido. Não consegui concluir a minha monografia na época com isso, porque o local que era feito a experiência, São Carlos está numa área forte de cerrado, e tinha algumas fazendas de cana perto. E aí a gente, por dois anos consecutivos, perdeu tudo que estava sendo feito naquela área, eram vários experimentos, não eram só os nossos. Por fogo, colocaram fogo, o fogo pulou para dentro da área da faculdade, foram os incêndios florestais, assim. E aí eu chegando no final do curso, tem que formar e não ter mais experimento, acabou. Aí muito contragosto, eu fiz uma monografia na área de educação ambiental, que era outra coisa que estava conversando, outra coisa que estava descontando. Mas assim, a única coisa que eu conseguiria, era fazer uma trilha ecológica, de tudo que eu conheci na faculdade. Então eu fiz uma proposta de Trilha Ecológica para visita escolar, mas assim, meio frustrada de não ter conseguido fechar no experimento que eu queria. Bom, mas aí eu me formei, eu tinha que escolher. Continuar na área acadêmica, fazendo mestrado, ou começar a trabalhar. E aí para começar a trabalhar, apesar de eu ter saído também com licenciatura, dava para fazer na época as duas coisas juntas, então eu saí com bacharelado e licenciatura. A maior parte do universo, que a gente conhecia na época, era virar professora. Eu falava: eu não vou dar conta de ficar em sala de aula, naquela repetição, não dá para mim. Como é que eu vou fazer? E aí essa minha orientadora, falou: Sandra, não dá para você ficar aqui, essa área de recuperação de áreas degradadas, não é o forte da faculdade, a faculdade investe muito mais na área de limnologia. Se você continuar aqui, você vai ter um mestrado mais fraco, porque as matérias não vão puxar para esse lado. O Chico Esteves no Rio, tem uma pegada mais forte, tenta ir lá, você é do Rio, poxa, para você não vai ser difícil ficar na UFRJ, não vai ser um sacrifício familiar, você volta para perto da sua família e você de repente consegue essa vaga. E aí a gente se esbarra naquela questão, dos famosos, não tenho vaga, se você não tivesse recomendação nem adiantava fazer a prova do mestrado, e aí você vem de fora, veio de onde, de São Carlos, vamos ver. Ficou muito naquilo, falei: não gente, não é possível, eu não vou ficar de novo. Ai o gênio se manifestando, “eu não vou ficar aqui puxando o saco de professor, obrigação dele é receber”, já meio brava com isso. Que absurdo, eu praticamente ter que virar um puxa-saco do professor, ficar mendigando, eu nunca consegui falar com ele, toda vez que eu ia, marcava, era um aluno, cada vez um aluno de grau de assistência. Claro, que não queria ceder vaga, não queria ceder espaço. Que absurdo, eu vim de uma faculdade, isso faculdade do interior dá para gente... eu tive aula com todos os professores da cadeira, o dono da cadeira, os catedráticos, da cadeira, aqui no Rio, você não conseguia falar com nenhum deles. E eu dizia: que absurdo, a gente lá tinha liberdade de marcar hora e falar com cada professor que a gente quisesse, poxa trocar com o cara, que é o cara, que é o famoso, que é o dono da cadeira, professores. O Tundisi, o grande nome da limnologia, lá de São Carlos, a gente podia falar com essas pessoas. Como é que eu chego aqui, e eu não consigo falar com professor? Eu falo com aluno-estagiário. Aquilo me deixou muito desiludida, até triste, não é isso que eu quero. Comecei a distribuir currículo para dar aula, difícil começar primeiro como professora, não tinha me formado aqui no estado. E aí ficou naquela. Cheguei, imagina, não vou mais viver as custas do meu pai, não quero saber. Fiz prova para aquela empresa de táxi aéreo, não vou fazer propaganda da empresa. Mas assim, uma empresa de táxi aéreo, já estava nos últimos. Aí meu pai falou: não, não, chega, você não fez esse tempo todo de faculdade, para trabalhar numa empresa de táxi aéreo, pelo amor de Deus, vou dar um jeito. Na época Furnas tinha essa questão dos contratados. Ele falou: olha, eu não conheço ninguém, mas está crescendo essa área de Meio Ambiente aí, essa área está ficando mais forte. E eu pensando comigo mesmo, eu vou trabalhar em Furnas, gente, não tem nada a ver, nunca sonhei com isso na vida, era completamente fora. Se falasse assim, você quando pequena fez um cenário de quando crescer ia trabalhar em Furnas, não. Porque para mim, só Engenheiro trabalhava em Furnas, como Engenheiro eu não seria, de jeito nenhum. Isso era algo que estava bem sacramentado. Eu nunca nem vi essa perspectiva. E aí com essa questão dos contratados, eu consegui entrar, em 98 eu entrei em Furnas, como contratada, no departamento de Meio Ambiente. Eu achei aquilo assim, se alguém falasse, bola de cristal, chuta o teu futuro, jamais teria pensado em algo assim. Foi assim que eu acabei chegando em Furnas, chegando no departamento de Meio Ambiente para então começar aí a trajetória na empresa.
1:28:47
P/1 - Como era a Furnas que você encontrou? Você ia trabalhar aonde, no escritório central? Como que era a divisão? Como que era o pessoal que você encontrou lá? Conta um pouquinho sobre isso.
R - Então Lucas, eu entrei 98, na área de Meio Ambiente. Meio Ambiente ficava só no escritório central, então eu trabalhava em Botafogo. Naquela época já era departamento, o meio ambiente começou como uma assessoria, mas já tinha se tornado departamento, e era um departamento com duas divisões. Então a gente tinha a área do meio físico biótico e tinha área do meio sócio-econômico cultural. A minha gerente era Norma Vilela, também era bióloga, foi uma outra referência, eu falei, nossa, biólogo pode virar chefe de departamento, numa empresa de engenharia. Mas assim, o meio ambiente ainda não tinha dentro da empresa, ele começou a crescer por uma obrigação da legislação ambiental. Mas digamos assim, não tinham aceitação, era uma coisa assim, chegaram chatos, chegou o pessoal que vai dar não para gente, tudo não pode, cuidado com a plantinha, olha o bichinho. A minha gerente direta era a Vera Paiva, engenheira. Mas que migrou para essa área, logo no início do departamento. Se abriu um novo panorama, a empresa trouxe essa questão da objetividade, que eu precisava, eu precisava desse por que. Por que eu estou fazendo isso? Então isso era sempre muito claro, questão dos empreendimentos. Eu cheguei para trabalhar com linha de transmissão, que era o que ninguém gostava. Então o cara novo que chega, “dá para ele o que ninguém gosta de fazer”. O que ninguém gosta de fazer? Trabalhar com linha de transmissão, o pessoal gostava muito de usina hidrelétrica, era o grande forte, o grande boom para área ambiental. E eu gostei muito, eu brinco, estava no sangue, meu pai passou a vida construindo linhas de transmissão, subestação. E aí eu fui trabalhar também nessa área. Eu gostava, porque os projetos eram mais rápidos, mais objetivos. Você planejava, executava e concluía. Usina ficava aquela coisa de 10 anos, eu falava: gente, esse negócio não vai terminar nunca? Levava muito tempo e muita coisa. Eu sempre gostei das coisas um pouco mais rápidas, mais objetivas. Eu entrei, tudo era novidade, tudo era legal. E aí de repente eu fiz o meu primeiro relatório, para pegar uma autorização de supressão vegetação. E aí eu me vi lá na sala, de novo, tecnologia era algo assim... eu cheguei em Furnas, eu dividia o computador com outra pessoa, não existia o seu computador, era o computador que você ficava dividindo com mais um. Tudo em papel. E aí me deram um mapa, que era feito das Folhas do IBGE, você tirava xerox das Folhas do IBGE, montava lá um mosaico, pessoal dava para a gente, desenhavam ali em cima, a gente já plotava ali em cima. O órgão ambiental tinha pedido, para a gente pegar na faixa de Servidão, e marcar qual era o uso, era a função de estagiário recém-contratado, estagiária, a mesma coisa. Então eu tinha que ficar desenhando com lápis de cor, medindo com a régua daqui até aqui. O engenheiro florestal falava lá o que era, de onde até onde. E eu estava naquela função estagiária, fazendo. De repente eu olhei para aquilo tudo e entrei em crise. E aí eu me lembro, do Sebastião entrar na sala, e ele falava assim: que foi que você está com essa cara? Você não está chorando né? E aí eu falei para ele: não foi para isso que eu estudei! Você tem noção de que eu estou fazendo um mapa, e a gente está fazendo um relatório, para mandar cortar árvores. Sebastião, a gente jurou que ia proteger o meio ambiente. O que a gente está fazendo? Não, não vou fazer, eu vou pedir demissão, eu não vou ficar aqui. Isso aqui é coisa de maluco, como assim, a gente estudou para fazer isso? Tá tudo errado. E aí ele olhou muito sério para mim, falou: menina, presta atenção! Se você não tiver aqui, se eu não estiver aqui, outras pessoas estarão. Primeira coisa, bota uma coisa na sua cabeça, isso vai acontecer. Você está tendo a chance, de brigar como a gente tem brigado, com o pessoal da construção, como a gente tem sido chato de falar, a gente tem a chance de tentar mudar e fazer com que isso ocorra com o menor impacto possível, a gente está começando com os projetos de recuperação de áreas degradadas. Então pensa o seguinte, isso vai ser feito, ele pode ser feito de uma maneira mais destrutiva e pode ser feito de uma maneira mais protetiva, dentro daquilo que vai acontecer, porque assim, a gente precisa de energia, a gente precisa colocar esses empreendimentos, isso não é uma opção. A sua função aqui, que foi que você estudou tanto, é justamente para você ajudar a empresa a fazer da melhor forma possível. Eu parei, olhei para a cara dele, “a gente não tem esse poder”. “A gente vai ter esse poder. Olha, você está aqui, você acabou de chegar, a gente está conquistando espaço, é fato. É fato que quando a gente entra, metade da sala geme, ninguém quer falar com a gente. Bota isso na cabeça, você está aqui e pode fazer a diferença.” E aquela fala dele, me tocou, eu vou dizer que o primeiro relatório eu fiz com o coração assim... até para assinar foi difícil. Eu falei, caraca, tô botando embaixo para assinar, cortar não sei quantos hectares de Mata Atlântica, meu Deus do céu. Mas ele junto com a Vera, que era gerente da divisão, eles entenderam aquilo que estava batendo. Eu encontrei, claro, ali. Nossa divisão tinha outros biólogos, todo mundo colocando essa questão, todos voltavam com a mesma questão, “Sandra, bota na sua cabeça, antigamente fazia e fazia como era. A gente está aqui para tentar fazer diferente, a gente está aqui para tentar reduzir impacto, a gente tá aqui para fazer um trabalho que tenha um efeito positivo, no meio ambiente, no sentido da gente minimizar, reduzir e evitar o máximo que a gente puder”. Mas alguma coisa a gente tem que ceder. E isso me trouxe um acalento, eu consegui entender. A gente conseguiu nesse período, eu fiquei no meio ambiente direto, aqui no Rio, por 12 anos, acho que foi isso, 12 anos. E aí dentro desse tempo, a gente conseguiu, rever especificações de construção, brigando com as empreiteiras, colocando questões ambientais, fazendo especificação técnica. Para ter essa redução, esse cuidado. Como eu entrei com muita disponibilidade, para viajar, era solteira, não tinha filho, tinha essa facilidade. Eu viajei muito, eu fazia muita inspeção de campo. Eu brinco, que no começo era até meio estranho, a gente andava em bando, a gente não conseguia andar com meia dúzia de pessoas, como a gente faz hoje. Eu me lembro de fazer vistoria, eram 20 pessoas, 19 homens e eu, a menina do meio ambiente. E a gente fazia inspeção de carro, de novo, não tinha muito como ver, traçado de linha, o pessoal da construção, traçava isso nas cartas do IBGE, iam para 50 mil, depois a gente tinha que ir para o campo, analisar, ia toda área técnica, o projeto, a construção, o pessoal do fundiário e o pessoal do meio ambiente para gente tentar combinar traçados. Olha, tira daqui, aqui tem uma mata perto, transfere para cá. Aí o pessoal do projeto via se era viável, se não era viável, como é que fazia. E a gente fazia o traçado no campo, fazia a proposta do traçado em campo. Eu participei de alguns projetos, naquela época também era mais fácil e começaram a ter alguns projetos com sobrevoo. Então falava assim, o traçado da linha a gente vai olhar, mas a linha é muito comprida, não dá tempo da gente fazer de carro. Então, é o seguinte, vai ter um sobrevoo, vai no helicóptero 1 do meio ambiente, 1 do fundiário, 1 da construção e 1 do projeto. E aí agente sobrevoava a área. Eu adorava, eu descobri que adorava andar de helicóptero, achava aquilo assim... tinha um pessoal que tinha pavor, “deixa que a Sandra vai, ela vai, e ela faz as inspeções, depois se precisar a gente refine em campo”. Então eu fiquei participando durante muito tempo, nessa questão de ajudar a definição do traçado. E depois fazenda a parte do projeto de área de recuperação das áreas degradadas. Eu até ajudava na questão da atualização de supressão, mas eu não tinha assim, necessariamente um conhecimento botânico para fazer identificação de espécie. Então quando precisava chegar nesse nível, ia o engenheiro florestal e eu ficava mais na parte... Muita facilidade para fazer redação de relatório. O pessoal também não gostava, então era a menina que fazia vistoria e fazia o relatório, porque ninguém queria fazer, e eu achava isso muito bom, muito tranquilo. E aí fui ficando nessa área, a Vera identificou, com o tempo, “eu acho que você tem o perfil de coordenação, você consegue ler rápido, comentar rápido, tem entendimento, escreve, consegue interagir com diversos setores”. Porque era muito setorizadoainho, era o pessoal da vegetação, falava mais ou menos que o pessoal de fauna, que praticamente a gente não se falava com o pessoal da sócio economia. Que a gente, “ah não, o pessoal doido da socioeconomia”. Imagina, eu passei a faculdade sendo do pessoal doido da biologia, mas aí chegou em Furnas, tinha o pessoal doido da sócio economia. Ela falou assim: olha, o coordenador precisa falar com as diferentes dificuldades, eu acho que você dá conta. E ela foi começando a me treinar, nisso. Aí por conta disso, eu comecei a participar um pouco mais ativamente das reuniões. Sai um pouquinho da parte que fazia inspeções, mas participava mais de reunião. Cheguei a participar, até estava conversando com meu pai, até por conta dessa entrevista. Pai, mas quando mesmo que você entrou? Fiz umas recapituladas da vida dele. E a gente foi morar em Itapeva, para construir o circuito 1 de Itaipu, e de repente estava lá em 98/99, eu participando do licenciamento para construir o 3º circuito, vindo também lá de Itaipu. Meu pai nessa época ainda estava em Furna, mas já aqui na área Rio, ele era da construção, mas a área Rio. Então eu cheguei a fazer bastante inspeção, inspeção aérea também, com o pessoal dos órgãos ambientais. Comecei me dar bastante com órgão ambiental, fazer essas vistorias, essas inspeções, para defender os projetos. Então começando aí a reunião, enfim, participando das questões um pouco mais, até burocráticas, mas mais de interação. E aí comecei, comecei, meio que ser treinada, para fazer essas coordenações de empreendimentos, que meio ambiente sempre teve, de ter um responsável por olhar tudo e acompanhar as licenças ambientais. E fiquei nessa de linhas de transmissão de 98 até 2006. Aí em 2006, veio o Simplício, para gente, acho que foi em 2006, final de 2005/2006 a gente estava no projeto de licenciamento do Simplício. E linha já era uma coisa que eu tinha facilidade, linha e subestação já estava meio que no sangue. E a Vera que ainda era gerente da divisão, falou comigo, “olha, eu tenho um desafio para você, tem a usina de Simplício, o pessoal acostumado com usina, não está conseguindo ter a visão do projeto. Porque é uma usina meio linha de transmissão, são 30 km de obra, nenhuma usina tem essa característica, de ter um barramento, corre todo no paralelo, os reservatórios e gera lá embaixo, 30 km a jusante do primeiro barramento, tá confuso, os reservatórios intermediários, eu queria que você começasse com usina, nada melhor com uma usina meio esquisita, meio fora do padrão, para você estrear, você vai tirar de letra.” Foi um baita desafio, foi assim, uma coisa, totalmente diferente, envolvia muito mais gente. Linha é um grupinho, que era praticamente o mesmo grupinho, trocava só quem estava da construção. Mas a gente falava basicamente com as mesmas pessoas, era um núcleo que atendia a empresa toda. E de repente usina foi um outro mundo, entender uma nova linguagem, entender uma nova forma. Nossa, eu adorei! Eu acho que Simplício foi um mega desafio. Você fica coordenando lá, 38 programas ambientais, tá certo, que tinha hora que eu já não sabia mais... A gente fica assim, nossa, e agora, o que está acontecendo? Foi também uma outra experiência super desafiadora, saiu bem da zona de conforto. E aí eu fiquei com Simplício, até o final de 2009. No final de 2009 já tinha surgido a proposta de eu ir para Minas, a estação de piscicultura, que antes ficava cooperação, tinha vindo para meio ambiente. Eu apesar de estar no Rio, estava com filha pequena, para mim a vida estava puxada. De novo, aquela saudade de morar uma coisa mais interior. Ninguém queria ir! Aí de novo, “Sandra, ninguém quer ir morar no interior, agora é muito fim de mundo ainda, você não vai?” A condição para eu ir... Eu já tinha passado para Furnas, nesse meio tempo teve o concurso de 2004, eu tinha feito e entrado em Furnas em 2008. Então fiquei dez anos, de 98 a 2008 como contratada, então já estava ali, final de 2009. “Você já é efetiva, eu vou colocar você como substituta do chefe da divisão, da estação de piscicultura, porque ele deve se aposentar daqui a pouco, e lá não tem mais nenhum efetivo, eu preciso de alguém que possa”. E aí eu pensei, gente, eu não entendo nada de peixe, eu fugi, literalmente, de todas as aulas na faculdade, que tinha que abrir algum animal, eu ficava revoltada, para quê? A gente já conhece, tem um livro aqui ilustrado, melhor do que presencial. Eu achava aquilo horrível. A Faculdade Federal me deu a chance de escapar disso tudo, porque não tinha um animal para cada, então eu ficava mais do que feliz, de ter o estojinho lá, para o pessoal dissecar, e eu ficar só de lado, copiando a distância, não gostava. Falei: eu não sei o que eu vou fazer, mas também é uma chance de ver uma coisa diferente, ficar um pouquinho no interior, também dá para minha filha, já estava ali fazendo 6 anos, dá uma oportunidade dela também morar aí, numa vida mais tranquila. Falei: ah, vamos embora! Aí em 2010 mudei lá para usina de Furnas, aonde tem a estação de piscicultura. E aí começou, algo completamente diferente, de novo. Acostumar com uma outra forma de vida. O escritório central, por tradição, a gente tem horário bem... que era até um horário diferenciado, você tinha um horário bem puxado, todo mundo começava também, de certa forma mais tarde, porque todo mundo tem que sair, se deslocar, pegava metrô, ainda tinha que andar do metrô até o escritório. Então assim, a rotina no escritório central, era uma rotina de muita reunião, muita carta, muito relatório. Eventuais viagens, para acompanhar os empreendimentos, acompanhar o órgão ambiental, fazer reunião na sede do Ibama, em Brasília. A gente tinha essa rotina mais puxada, levava trabalha para casa, de vez em quando falava: gente, não vai dar, então tinha que adiantar alguma coisa em casa. Era um ritmo super puxado. E aí, de repente, eu fui parar num ambiente que vivia num outro planeta, para mim. A gente começava 7:30 da manhã, eu falava: gente, o que que uma pessoa faz às 7:30 da manhã? E as 4:30 da tarde tinha acabado o expediente. O que eu faço com a minha vida a partir das 4:30? Eu saia às 6 horas do escritório, chegava em casa 7 horas da noite. Alguém pode me explicar o que a gente faz quando chega em casa às 4:30 da tarde? Dia claro, sol. Então ali, eu acabei optando por morar no que era a antiga vila, ficar numa casa. Num primeiro momento eu tinha ido conhecer a cidade de Passos e não tinha gostado do estilo das casas, achei a Vila mais aberta, era um clima mais do que estava procurando. Então assim, mudou o horário, mudou que eu não almoçava em casa. Nunca almocei em casa na vida, nem na faculdade, imagina trabalhando. Pude estar perto da minha filha, claro, acompanhei muito mais, levava ela na escola e buscava na escola. Outro cenário, totalmente diferente. Eu também já tinha me separado na época. Então assim, era outra vida, era uma vida totalmente, para mim, estranha. E aí foi aquele horário, que era dia, mas o que a gente faz com esse dia? Que eu não tinha dia, só tinha de noite. Então assim, para eu ir para lá, eu conversei com a minha mãe. Meus pais também já eram separados, há muitos anos. Nossa mãe, eu não tenho como ir sozinha, como que vou eu e uma criança? Eu tinha conversado com o gerente da época, ele falou: olha, você vai ter algumas viagens para fazer. Falei: gente, como é que eu chego numa cidade, não conheço ninguém, como é que eu viajo? Com quem eu deixo a minha filha? Até porque, mesmo no rio, quando eu viajava, era minha mãe que ficava para mim. Minha mãe morava em Petrópolis, ela tinha ido para lá, meu avô teve Alzheimer, ela ficou perto da minha avó, para ajudar naquela fase complicada, da doença. Mas quando eu precisava dela, meu avô tinha lá os enfermeiros. Ela vinha, dormia, para cobrir as minhas viagens. Eu falei: mãe, como é que eu vou para uma cidade longe, você não chega assim. Chegar lá em Furnas, até hoje é um odisseia. Como que eu faço? Você não vai comigo? E aí ela ainda falou, “Sandra, eu vou, com a condição da sua vó ir também. Sua avó está viúva, eu não vou largar minha mãe para trás, porque a minha irmã é daquele jeito que você sabe, uma hora sua tia toma conta, outra hora não quer tomar conta de ninguém, e eu não vou deixar minha mãe sozinha. E aí a gente ficou, minha vó não vai aceitar. Enquanto a minha família, mudou 200 mil vezes, dentro inclusive, da mesma cidade, uma falta de sossego nos locais. A minha avó morava 61 anos no mesmo apartamento, até quase sem reforma, é 61 anos no mesmo lugar, do mesmo jeito. Falei: ela não vai! ela não vai! Não vai dar para ir, porque como que eu tiro uma pessoa desse local com quase 80 anos. Nossa, já perdi! Ela já tinha feito 80 anos. Perdi isso, não vai dar jeito. Mas ela falou: chega, seu avô já faleceu, eu não tenho mais o que me prenda aqui, vocês são as pessoas que vem, que me visitam, que estão sempre aqui, eu vou embora. A gente ficou meio temeroso, mas ela falou vou, eu vou. Então todo mundo, vamos. E aí fomos morar as quatro juntas, ficamos famosas pela casa das quatro mulheres, as quatro gerações morando juntas. Também outra experiência de vida, totalmente diferente, compatibilizar aí, minha avó para minha filha, 80 anos de diferença. Compatibiliza isso. Então a minha vó já tinha feito 80 anos a bastante tempo. A minha avó já estava aí, com seus 85, 86. E aí, vamos embora. E aí foi uma nova Furnas. O pessoal brinca que tem várias Furnas, dentro de Furnas, e tem mesmo. Saí daquele ritmo do escritório central, para pegar o ritmo de área regional, com outra filosofia, que a gente não tinha reunião. Eu ficava até sem saber o que eu tinha para fazer, porque era assim, não tinha reunião, não tinha viagem com órgão ambiental, não tinha relatório para fazer, carta para fazer, minhas especialidades, muita carta, muito relatório, muita reunião. E eu ficava olhando assim: eu estou aqui sentada, o que eu vou fazer da vida? Enfim, e aí participei de algumas viagens, para entender como que eram as viagens, o que o pessoal fazia. O pessoal era responsável pelas viagens de encanamento da qualidade da água e monitoramento da eco fauna, do reservatórios do Rio Grande, os 5 de Rio Grande e da usina de Funil. E tinha lá um laboratório de química, laboratório que fazia análise da água, e tinha laboratório de reprodução de peixe. E eu falava: gente, não estou podendo ir nem para um lado, nem para o outro. Laboratório de química, só entrava químico. O que eu podia entrar como bióloga, de reprodução de peixe, eu olhava aquilo, jamais vocês vão me pegar e me botar aqui dentro. E aí fiquei um tempo tentando entender o que eu podia fazer ali, exatamente qual era a contribuição que eu podia fazer. E aí a primeira coisa que veio, para me salvar, no final ali de 2010. Eu mudei para lá em 2010, no final de 2010, meados de 2010, na verdade. Veio uma legislação, que as estações de piscicultura precisavam ser licenciadas. Eles nunca tinham ouvido falar de licenciamento ambiental. E eu falei: eu sei! E aí foi aquela tabua de salvação. Eu sei o que eu vim fazer aqui, eu vou fazer o licenciamento dessa estação. E aí na época a gerência do departamento queria contratar, eu falei: gente, por tudo que é mais sagrado, não contrata não, deixa eu escrever esse relatório, que eu não sei mais o que eu vou fazer aqui, vocês não estão entendendo que a pessoa mais perdida aqui dentro sou. Eu não consigo achar a minha função aqui, eu sei que vocês me colocaram aqui para eu aprender, mas de fato, eu não estou contribuindo com nada. Eu preciso entender como isso daqui funciona. Então deixa eu escrever, porque vai ter que descrever as atividades, vai ter que descrever tudo, quem sabe desse jeito eu consigo me integrar. E foi ótimo! Aí eu consegui conversar com as pessoas, eu consegui entender como tudo era feito. Porque assim, é difícil, você chega do Rio, é a pessoa diferente, muito no conceito, é a pessoa que veio para roubar o meu lugar. Então não tinha um conforto do gerente da divisão, uma figura super emblemática em Furnas, várias pessoas conheceram Dirceu Mazullo, ele era assim... altas histórias que o povo tem. Mas é um cara que brigou para construir a estação, literalmente brigou. Tem história dele roubando escavadeira para fazer os tanques, era assim, quando o cara acordava, ele já tinha mandado roubar a escavadeira e estava lá dentro fazendo um tanque. Era uma história de vida dele ali, de repente, chega uma menina, uma pessoa nova para ele, “vim aqui para ser sua substituta”. Como assim? Vocês estão de brincadeira, essa pessoa não vota nem a mão em peixe. O que vocês estão fazendo? O que a empresa está fazendo? E aí eu consegui achar um lugar, era uma forma de levar aquela equipe para um passo à frente, até de valorizar mais o trabalho que era feito, da gente conseguir também dá mais profissionalismo, no sentido de olha, temos uma licença, agora nós temos que trabalhar com regras, com normas, não é muito mais como eu quero que seja feito, mas é como precisa ser feito. E também fui conhecendo estilo. E pouco tempo depois que eu estava lá, a gente foi transferido de novo, saiu da engenharia, saiu do meio ambiente e voltou para operação. E aí foi mergulhar naquele mundo dos Engenheiros de operação, de novo, voltei, a única menina no meio de um monte de gente homem. E era literalmente, mais jovem, do que todo mundo lá. E o Dirceu, o gerente e eu como substituta. Mas ele detestava as reuniões, então cada vez que tinha reunião, “Sandra vai lá, você gosta desse negócio, faz lá o resumo da reunião”. E aí eu comecei a interagir bastante com operação, também aprender um pouco. Eu diria assim, que esse tempo na operação, foi um tempo... essa Furnas de regional, foi uma Furnas que resgatou muita questão família. Eu acho que família não é um tema no escritório central, no escritório central a gente tá ali muito mais empresa e menos pessoa. Você está muito mais corporativo. E aí você vem para regional, não é que empresa não importe. Mas assim, a sua família importa mais, entendeu? Então você tá fazendo isso e a relação com a família é muito importante. E aí trouxe um pouco daquela questão de olhar. Enfim, olhar para os seus, valorizar a questão familiar, que eu acho que é algo que no Central sempre passou meio batido. E falo assim: dos gerentes que eu tive, era muito mais fácil eu dizer para os meus gerente da Regional, que eu achava muito mais antiquado. Mas era muito mais fácil dizer para ele, “olha, minha filha não está bem, preciso levar ela no médico. E ele: claro, é a sua filha, você tem que levar. Do que eu dizer isso para o meu gerente do Central, “olha, minha filha não tá legal”. E ele: hã, e não tem ninguém para levar sua filha no médico? Era isso! Os gerentes homens que eu tive no Rio, comparado com os da Regional, tinha esse perfil, aqui você está pela empresa, você vai sair de novo para ir em reunião de escola. Lá eu tomei uma chamada, quando descobriram que minha mãe levou minha avó no médico e eu não fui junto. Falei: gente, mas a minha mãe foi. “Mas você é a pessoa que é jovem, você tinha que ter levado o carro, você deixou a sua mãe na estrada com a sua avó”. Então assim, foi um novo olhar, realmente uma Furnas completamente diferente, Muito mais machista, em vários aspectos, sem dúvida nenhuma. Mas uma preocupação com a família, o que facilitou muito para eu estar ali com elas, sendo realmente até suporte, em caso de necessidades, enfim, a gente estava ali para um apoio muito grande, para essa situação familiar. A gente foi na frente, mas logo que a minha avó chegou, em setembro de 2010, a gente descobriu uma pneumonia. E lá criança não entrava no hospital, a não ser se ela fosse paciente. E eu precisando ajudar a minha mãe a internar a minha avó, tive que ir em casa buscar roupa. Ela foi para uma consulta e a médica internou. Aquela coisa, tem que voltar, tem que ir, tem que pegar roupa. Passos, fica uns 30 km de onde a gente morava, da usina de Furnas. Onde tinha toda a estrutura, onde tem na verdade toda estrutura médica, até hoje. E aí eu tinha que ficar indo e vindo, fui leva para a consulta, ai tive que voltar, pegar roupa, levar para internação, documento. E eu tinha minha filha, horário de escola. Impressionante como os vizinhos que conheciam muito pouca a gente. Também a notícia corre rápido, todo mundo ficou sabendo da situação, acho que mais rápido que a gente. A vizinha se prontificou, pegou minha filha na escola, levou na aula de balé. Enfim, quando eu cheguei em casa, depois de ter resolvido família, minha filha já tinha ido para o balé, já tinha tomado lanche, estava ali brincando, super confortável, super protegida dessa situação de sair todo mundo correndo de casa. Isso é algo que a gente nem podia contar, no escritório central, é uma realidade diferente, as pessoas moram longe, as pessoas às vezes nem conhecem as famílias uma das outras, a gente se conhece muito do escritório. Então a área Regional trouxe toda esse Novo Universo, vamos falar assim.
2:03:38
P/1 - Você está até hoje na gerência lá em Furnas? Ou você teve outro capítulo depois disso?
R - Outro capítulo né! Uma pessoa que muda tanto, tem outro capítulo na história. Mudei para Furnas em 2010, lá para usina de Furnas em 2010. E em 2013, a empresa teve uma outra restruturação, de várias que se seguiram daí, mas teve uma outra grande restruturação. Eu fui para lá em 2010, no meio ambiente, eu não me recordo se for em 2011/12, a gente mudou para o operação e ficamos na operação. E quando foi em 2013, a empresa passou por outra reestruturação. E aí a área da estação de piscicultura, ia a ser devolvida para o meio ambiente, ia voltar para o meio ambiente. Mas naquele momento, entenderam que por questões de organograma, e tudo mais, a área de meio ambiente, não teria como manter essa área regional, vamos falar assim. Essa área regional não tinha previsão no organograma, enfim, entenderam que não era para fazer isso e uniram o meio ambiente da regional com o fundiário. Então em 2013, foram criadas três divisões, chamava divisão regional, fundiária e ambiental. A minha era centro, mas tinha ainda uma outra em Mogi das Cruzes e outra em Goiânia. Quem tinha mesmo a parte ambiental, vamos colocar assim, era a nossa divisão, em Minas, porque a gente tinha estação de piscicultura atrelada. As outras divisões, elas foram compostas 100% do pessoal do fundiário, em que tinham ali alguns agrônomos, biólogos perdidos no meio da situação, que ficaram como apoio ambiental. Então essas divisões davam apoio, numa vistoria, numa inspeção, quando não precisava se deslocar o pessoal do central, se era algo perto, nós ficamos sendo os olhos do meio ambiente nas regionais, a não ser que acontecesse algo maior. Então a gente ficava dando esse apoio ambiental na regional. E aí eu fui chamada para ser gerente da divisão, e eu falava assim: gente, tem alguma coisa errada, eu não entendo absolutamente nada de fundiário. Eu fiz biologia, olha, existe um certo conforto com a estação de piscicultura, eu já entendi o que a gente faz, meio-ambiente ok, foi da onde eu vim. Mas fundiário? Vocês estão de brincadeira, eu não entendo absolutamente nada, tudo que eu conheço do fundiário é de quando eu trabalhava com licenciamento ambiental, como coordenadora dos empreendimentos, seja de geração e transmissão, que como coordenação eu via os programas do fundiário. Mas via assim, o cara entregava o relatório, você passava o olho, dizia atende a licença, e era o máximo de interação que eu tinha, era ler o relatório e saber o que eles faziam. Mas ler relatório, ler relatório é o ótimo, é fácil, participar de reunião também, o cara fala, você pega ali no ar falei. Eu falei: eu não entendo nada. A divisão é praticamente toda meio ambiente, porque era todo o pessoal da piscicultura. Falei: gente, eu não tenho ninguém de fundiário, como assim vou receber essa demanda? Eles tinham acabado de fechar também as divisões do Rio, enfim o fundiário, acho que na época, eles já tinha saído de sete para cinco divisões, e fecharam e ia ficar 3. Então tinha divisão fechando, eles falaram: não, a gente vai mandar um pessoal para você e tudo mais. E veio aquele famoso tapinha nas costas, “você tira de letra, vai ser fácil”. Eu já falei que eu nunca mais caio nessa, toda vez que disserem que vai ser fácil, vai ser uma complicação danada na minha vida. Eu falei: olha, com todas as ressalvas, que fique claro, que eu não entendo absolutamente nada disso. Tudo bem, se isso tá claro para todo mundo, tudo bem. E aí foi outro perrengue, eu vou até refazer as minha falas, não é que eu mudo muito de casa, eu mudo muito de vida, eu saio assim, completamente das situações. E aí lá fui eu aprender o que era fundiário, o que a gente fazia, como a gente fazia, de que jeito fazia. Entrar aí num mundo completamente diferente, um mundo também dominado, um corpo técnico bem masculinos. O meio ambiente sempre misturou bastante, mas voltou a ser um corpo técnico bem forte, masculino, basicamente de Engenheiros. O fundiário é composto basicamente da engenharia de avaliações, então você tem engenheiro civil, agrônomo e similares. Tem a parte dos cartógrafos, dos engenheiros cartógrafos, pessoal que passa por esse perfil e a parte de advogados, é o que você precisa para fazer análise fundiária. Gente, sai do meu universo. Aí outro grande aprendizado, entrar nesse mundo, era de novo a pessoa de fora. E tentando entender como funcionava, enfim, entender do assunto, aprender olhar uma matrícula, aprender a falar os termos técnicos. Começar de novo essa situação. Essa situação, essa estrutura, ela ficou dessa forma até 2020. Eu fiquei lá na regional até também esse período. Mas quando foi em fevereiro de 2020, eu tive um convite para voltar para o Rio, para ser gerente do departamento de gestão fundiária. E eu sempre pensando, gente, eu fiz biologia, aonde eu vim parar? Se alguém me perguntasse quando eu era pequena, nunca em Furnas, jamais no fundiário, não conseguiria nem com bola de cristal fazer essa interpretação. E aí eu falei, tudo bem! Mas já sabendo que a gente ia ter uma restruturação em maio, já estava em excursão uma grande reestruturação em Maio de 2020. E aí eu falei: não, beleza! Vou, mas já sabendo que não era uma coisa definitiva. Achei que era hora de voltar, porque a questão fundiária, ela mexe muito com a vida das pessoas. E a gente começou a trabalhar no fundiário também com a parte de gestão de invasão, então a gente assinava muita notificação, pedindo para que a pessoa retire alguma coisa que está na área da empresa. Ali na região da usina de Furnas, todo mundo se conhece, todo mundo sabe quem é quem. E eu comecei a receber ligação no meu celular particular, a ser cobrada no supermercado. Você está no supermercado fazendo compras, relaxada, final de semana, de repente para alguém e começa a querer discutir, porque você assinou, porque mandou. Isso já estava gerando para minha vida pessoal um certo desconforto. A minha mãe já tinha sido abordada, “olha, fala lá com a sua filha, não pode ficar fazendo isso, a gente sempre teve rancho, sempre foi assim...” Então eu já estava pensando em sair dali, de alguma forma. Eu já tinha morado um tempo em Passos, não tinha me adaptado muito, já tinha voltado ali para usina de Furnas, para Vila, para o bairro de São José da Barra. Mas eu já estava pensando, no que eu poderia fazer, porque isso já estava gerando assim, um certo stress. Aquela coisa, enquanto não mexe com um filho nosso, tá tudo bem. Se um dia alguém fizer alguma gracinha para minha filha, na frente da minha filha, vou acabar... já sou meio topetuda, isso vai acabar não dando muito bom. Então assim, quando veio a oferta de voltar para o Rio, ainda que de fato eu não goste de cidade grande, mas eu entendi que era a chance que eu tinha pedido, de me afastar daquela situação, que é muito pessoa com pessoa. Era ponto das pessoas ligarem no celular da minha mãe para falar comigo, e de querer criar com isso alguma influência. Então assim, apesar de que eu sempre mantive esse distanciamento, do que é pessoal, do que é profissional. Mas havia uma pressão para isso não ser dessa forma. Aí isso começa a ficar desagradável. Eu continuava morando sozinha, com a minha filha, eu não casei de novo. E aí era aquela coisa, todo mundo sabia que estava só nós duas, nesse meio tempo meu irmão foi morar perto, mas não morava com a gente. Foi criando um clima, que eu comecei a achar que eu não estava mais me sentindo muito segura, Apesar de que ok, nunca ninguém tinha feito nada, mas as conversas vinham ficando mais... Cara, daqui a pouco alguém dá o meu endereço para alguém enfurecido, aí eu estou perdida. E aí eu falei, bom, tenho que ir embora e surgiu essa oportunidade de voltar para o Rio. Então eu acho que, pedi, veio essa oportunidade, vou voltar. Em fevereiro de 20, eu vim para o departamento. E aí em março começou a pandemia. E aí a família não tinha vindo, porque aquela história, vai na frente. Também foi tudo decidido assim, em janeiro eu estava de férias, no final das minha férias eu fui chamada no escritório central, conversei com a superintendente, conversei com o diretor, para começar em fevereiro. Até pedi, “gente, uma semana para eu fazer as malas, deixa eu chegar de férias, desfazer uma mala, fazer outra e me apresentar aqui no rio. E ai ficou, você tem que arrumar a casa, a pandemia veio. Então ainda fiquei em 2020, até fazer a restruturação em maio, eu no Rio, a família lá em Furnas. Mas ai parei de procurar apartamento, parei de procurar tudo, porque foi tudo fechando, fechando. Aí em maio teve a reestruturação. E na reestruturação, a área fundiária saiu da diretoria de engenharia. E foi na época para a DA, Diretoria de Administração. E aí a gente se fundiu com a área de patrimônio. A área de patrimônio imobiliário, gestão do patrimônio, dos imóveis de Furnas não era feito pela área fundiária, era feito por uma área dentro da diretoria de administração. E ai a gente unificou as equipes. Aí foi outro big desafio, porque a gente estava saindo de uma situação em que existia a gerência de gestão fundiária no Rio, essa gerencia tinha 3 divisões, uma em Minas, uma em Mogi, uma em Aparecida de Goiânia. E existia a gestão de divisão patrimonial que ficava no Rio. Então eram 5 estruturas, que viraram uma única divisão, fez aquela, junta tudo. E aí a doida aqui, aceitou o desafio de novo. Falei: não, vamos em bora, já estamos aqui, vamos ver o que dá isso ai. E fazer essa união, significou na época, juntar praticamente 50 funcionários sob a minha gestão direta. Então saíram os gerentes intermediários que tinham ai. Eu fiquei com 50 funcionários na minha carga, com processo de gestão patrimonial, que eu não fazia ideia do que esse povo fazia. Ai fui descobri que a gente tinha que pagar todos os IPTUS, ITRS da empresa, que a gente tinha que fazer todos os processos de aluguel dos imóveis de Furnas, os termos de autorização de uso. E ai, outro universo, o povo que tinha comprado casa, que terminou de pagar, transfere casa, outra grande complicação, outro grande processo complicado. E ai, quando unificou, meados de maio, isso já certo. Ai eu voltei, como não estava abrindo, as perspectivas de 2020 muito ruins. Eu voltei e fiquei até o final de 2020 lá em Furnas, na região da usina de Furnas, porque não fazia muito sentido ficar no Rio, sozinha, minha filha ficou lá, todo mundo em casa, ninguém com possibilidade de buscar nada. E aí a empresa começou a falar em retomada, vamos retomar, vamos retomar, vamos botar o pessoal no escritório. Aqui no Rio eu tinha ficado na casa do meu pai, meu pai tem um apartamento em Copacabana, eu estava ficando na casa dele. Bom, vai falar de retomada, eu não tenho como fazer retomada com a família em peso dentro do apartamento dele. Bom, fui pensando em várias possibilidades, inclusive de voltar para Petrópolis. Mas ai veio a questão, de que apesar do teletrabalho, estavam preferindo que gerentes ficassem mais presencial possível, até para poder acolher todo mundo que chegasse, aquela coisa, vamos volta, como é que vai ser essa nova vida. E eu acabei falando: não, então eu volto para o Rio. E ai, eu acho assim, quando tem que ser é. O universo fala assim, você tem que resolver uma coisa, quando você está indo no caminho certo os anjos dizem amém, e o universo abre as portas. E eu acabei, sem querer, eu não ia procurar esse condomínio que eu já havia morado, não, lá vai ser caro de mais, não vai dar não. Eu quando morei no Rio antes, eu morava na Tijuca, quando eu fiquei por conta própria, eu fiquei na Tijuca. Mas os preços de apartamento na Tijuca muito alto, gente, como é que vai ser, como é que isso vai ficar. E ai a minha filha falou: minha vó fala tanto da Barro, você sempre falou. Nossa, mas ai tinha que achar um condomínio que tivesse um ônibus para o centro, ou pelo amor de Deus, metrô, como é que vai ficar esse negocio. Ai o meu pai falou, “procura lá na Riviera”. “Pai, eu não tenho nível para morar lá não, os apartamentos vão estar caríssimos”. E ele falou, “procura, não custa absolutamente nada”. E ai eu comprei esse meu apartamento pela internet, eu fiz um visita online, eu estava lá, falei: não da tempo. O casal estava desesperado para vender o apartamento, que eles tinham comprado outro, estavam com dois financiamento, estava naquela situação que não dava. E ai eu falei: gente, não pode estar muito ruim, o preço está muito bom, é o seguinte, eu vou confiar, a corretora falou que está tudo certo. A gente fez um inspeção virtual, não tem como está tão ruim assim, por isso preço e tá tá tá. E fiz uma oferta, gente, eu comprei o meu primeiro apartamento online. Comprei um apartamento e me mudei para cá em janeiro desse ano, assinei escritura, tudo a distância, manda pelo correio. Peguei a chave aqui no Rio, diferente lá do interior, onde todo mundo se conhece, aqui eu só podia pegar as chaves no final. E em janeiro vim para o Rio, fiz a mudança física e em maio a gente passou por uma outra reestruturação, a gente virou DG. Mas ai a gente já não mexeu muito em termos de atividades. Mas eu comecei a entender que eu precisa me preparar mais, para esse mundo que veio e ficou, esse mundo fundiário, patrimonial, foi uma coisa que veio e ficou. Sempre pensando que eu precisava dar um jeito, eu não tenho uma formação que seja compatível, ainda que eu tenha feito um MBA, Furnas andou patrocinando essa pós para todo mundo na área de gestão de empresas do setor elétrico, uma gestão voltada para isso. Eu falava, olha, eu precisava de algo mais. E aí decidi, comecei agora a fazer faculdade de administração, online. Eu falei, eu preciso compatibiliza o mínimo que seja de currículo, até aprender outras questões, para alavancar. E agora aguardando o que vem pela frente, porque do jeito que o meu ritmo de vida é. Fez um ano dessa divisão, daqui a pouco essa grande unificação faz mais uma ano. E é nessa média, daqui a pouco outra novidade virá, com certeza. Então está pronta para os novos desafios.
2:22:44
P/1 – Você conversa com o seu pai ainda hoje com relação a empresa? Como que a empresa era no tempo dele, como que é hoje? Como é que é essa conversa entre vocês?
R – Então, isso foi outra coisa bem interessante. Me pai é muito caladão, e apesar de eu ser mais despachada que ele, a gente nunca teve muito assunto, não tem muito ponto de interesse. E quando eu comecei a trabalhar em Furnas, a gente começou a criar um laço diferente, um laço Furnas, a gente começou a se aproximar por conta do assunto Furnas. E ai conforme eu fui desenvolvendo as atividades, eu precisava até trocar ideia com ele, apesar claro, de ele estar em outro patamar, já estava mais na questão gerencial, estava em outros caminhos. Mas alguma coisa a gente sempre vinha discutindo. Eu como acabava comprando muitas brigas, de vez em quando ele ainda falava: o pessoal falou que hoje você bateu na reunião. Eles brincavam, “a gente vai dar queixa de você para o seu pai”. Mas assim, nunca houve nenhum tipo de intervenção. Meu pai nesse ponto também é muito tranquilo. Mas a gente conversava, quais eram os pontos que estavam conflitando. Ele até trazia a visão dele, eu colocava um pouco da minha forma de ver, sempre conversando muito, “mas era assim a forma que a gente fazia, olha as mudanças que vocês estão obrigando a gente a fazer, como é que isso fica”. Então assim, a gente foi se aproximando. Ele se aposentou em 2002, se desligou da empresa, mas conforme as coisas iam caminhando, até esse distanciamento, a aposentadoria, até hoje a gente conversa muito. Ele fala, eu sai da área na hora certa, na hora que a tecnologia começou a entrar mais forte. Eu falei que no inicio a gente tinha que dividir computador, de repente a gente já estava cada um com o seu micro, começou a diminuir muito lentamente, o que imprime, o que não imprime, mas troca de e-mails. O que é troca e-mail? A gente fazia carta, então assim, a empresa foi ganhando um ritmo tecnológico, foi mudando algumas posturas, posicionamentos, até de missão e divisão, de valores da empresa. A questão ambiental entrando forte, a questão do em estar social, e bem estar das pessoas. E ele fala sempre muito nisso, a empresa que ele entrou, não é mais a empresa que Furnas é, fato. Quando eu comentei com ele, que ia fazer essa entrevista, “imagina, quando, em tempo algum alguém faria alguma coisa desse sentido”. Ai ele falou assim: a empresa mudou tanto, os cuidados que se tem hoje com as pessoas, o respeito pelas diversidades. Ele falou: olha, era uma empresa de homem, era uma empresa de engenheiros, a gente era bruto, não tinha esse cuidado com a fale, é assim, mandando...blá, blá...era soco no mesa, era assim que se entendia, isso não era considerado nada fora da caixinha, era assim que era. E isso foi entrando, primeiro a diversidade, entrando mais mulheres na empresa. Ele fala, as primeiras reuniões que eles foram, que tinha uma gerente mulher, para eles era constrangedor, eles não sabiam, como você lida com isso, como você lida com aquela pessoa que esta sentada ali, de batom, vestindo cor-de-rosa. As mulheres eram as secretárias, o pessoal da copa, pessoal da limpeza, não era um menosprezo. Eu acho que o bonito da gente enxergar, é que o mundo vai mudando e as empresas vão acompanhando isso. Não existia um caráter de menosprezo, só que não era comum, não era uma coisa que você esperasse. E ai as primeiras engenheiras entrando, e as primeiras gerentes, isso tudo foi uma novidade. Ele pegou, claro, bastante coisa dessa época, já começando os cuidados, não pode mais fazer reunião falando palavrão e socando a mesa, agora a gente tem que fazer reunião com um pouco mais de cuidado na fala. Mas ele coloca muito, que quando ele vê, ainda o outro salto que a gente vem dando, nessa questão do assedio, assedio moral principalmente, não vou nem entrar aqui na questão do assedio sexual, mas o assedio moral, de você tomar cuidado na sua fala, para você não agredir um funcionário, ainda que sem querer. Essa questão gerencial, ela traz para a gente a necessidade de mudar, eu sempre fui muito dura nas minhas falas. Mas dura assim, muito seca, nunca pensei muito, assim, se a pessoas vai ficar ferida. Se eu tinha que falar alguma coisa eu falava, pum. E a de repente eu entrei para essa questão gerencial, e as pessoas, “olha lá como você está falando, as pessoas ficam magoadas”. Gente, magoado com o que? Eu só falei que era para fazer assim, e começou a quere enrolar e eu falei: gente é para fazer assim. Onde está errado? E a gente precisar também ir percebendo que as pessoas escutam diferente do que você fala, existem pessoas que tem tempo diferente de absorção. Eu sou muito rápida, eu falo, despejo e já parti do principio que, “porra, não entendeu, como não entendeu? Eu vou ter que repetir de novo?” E a gente ir se conhecendo e ajustando, para também poder trazer o melhor para as pessoas, também o melhor para a empresa, porque uma pessoa que está engajada, o pessoa que esta sentindo pertencente, uma pessoa que esta se sentindo entendida e entendeu o que tem que fazer, ele entrega melhor. E ai eu conversando essas coisas com ele, ele fala: eu não podia estar mesmo, primeiro porque esse mundo do teletrabalho esquece, eu mal vejo qualquer coisa no celular, é whatsapp básico. “Mas assim, essa diversidade, essa forma que vocês tem que lhe dar, é muito diferente da Furnas que eu entrei, que eu não tinha essa preocupação, isso não era levado em consideração, a gente tinha que botar a empresa para crescer, tinha que construir, tinha prazo de entrega, tinha que brigar por isso e não tinha um olhar, nem para as questões ambientais, não tinha um olhar para as pessoas, quando indivíduos, enquanto necessidades individuais. Ele até coloca uma coisa, “a gente até sempre apoiou as famílias”, essa questão de Furnas de regional. A gente morou em duas cidades, duas regionais, quando criança. A empresa sempre se preocupou de dar conforto para os funcionários com as famílias, então se existisse uma emergência, a empresa mandava carro, mandava não sei o que, ia buscar, ia resolver. Ela dava um suporte para as famílias, mas não necessariamente para os funcionários enquanto pessoas, não tinha aquele abito da escuta, de que o cara pode ser diferente, poder ter um ritmo diferente, uma necessidade diferente de comunicação, ou da forma de lidar. Então assim, a gente conversa, fica muito evidente, quais foram as grandes mudanças na empresa. Eu acho que Furnas hoje é muito diferente, mas também tem crescido, tem evoluído muito, essa pandemia, acho que trouxe uma evolução. A gente conversa com os gerentes, eu acho que os gerentes nunca puderam participar tanto das reuniões, tá mais ativo, porque cada vez que você saia para uma reunião na central, durava não sei quantas 1000 horas. Agora a gente faz reunião de 1 hora, já resolveu tanta coisa, qualquer reunião, depois de uma hora, já está enrolando. A não ser que seja muito um problemão, que exija muita definição. As pessoas estão se falando mais, muita coisa a gente está resolvendo, mas eu chão que assim, o que veio sendo criado, essa interação da empresa entre diversos setores, essa ligação da empresa ouvindo as diversas áreas. Ela se estreitou ainda mias na pandemia, com estreitamento do corpo gerencial. Eu falo que tem gente que quase eu não conversava, de repente a gente foi ai quebrando barreiras, foi quebrando a barreira da hierarquia. É um problema, não importa se o cara é gerente de departamento ou não, ele me liga. Ah mas você é gerente de divisão, tudo bem, se aconteceu alguma coisa eu não preciso ir na minha gerente de departamento para falar, a gente tem uma comunicação hoje, muito mias próxima. E essa é uma outra grande mudança. Meu pai vem de uma estrutura bem hierárquica, ninguém falava com ninguém fora do seu nível, não existia isso, era inadmissível. E de repente, a gente numa emergência, tem um diretor que liga para a gente, tem um superintendente que liga para a gente e pede apoio. E isso não é mais considerado algo... A gente claro, depois da ciência para os outros níveis, mas não é uma coisa assim mais, que absurdo, isso não pode ser feito. Então evolui muito, digamos de 72, quando meu pai entrou, até hoje, é uma empresa completamente diferente, ela tem outras características aí.
2:34:45
P/1 – Eu queria que você me falasse como foi contar a sua história hoje para a gente? E como é que foi contar um pouquinho da história da empresa?
R – Quando eu recebi o convite, quando eu vi lá o e-mail da Daniela perguntando. Eu falei assim: o que eu vou falar? A gente começa sempre a pensar assim, o que vão perguntar e o que eu vou falar. E ai no primeiro momento você fica... começa a notar algumas coisas, ai você fica pensando no que você fez. Aí eu parei, e me dei conta, nossa, não sosseguei um minuto. Tu bem, até fiquei 12 anos na área ambiental, nossa, mas já se passaram mais 11 anos. Então assim, em 23 anos de Furnas, eu entrei fazendo uma coisa e mudei completamente. Não necessariamente é assim com todo mundo, e ai eu parei, e falei: meu deus, que história. Porque a pessoa não tem uma trajetória continua, a pessoa tem degraus. Mas eu fiquei muito feliz, eu acho assim, a gente perde, enquanto pessoas, a gente perde muita oportunidade. Eu acho que todo mundo quer ter um lugar, quer poder fazer a diferença. E a gente sempre imagina, pelo menos a grande maioria das pessoas imagina, que fazer a diferença e fazer a diferença ali, aonde você está fazendo a mesma coisa que você faz, tendo aquele mesmo ritmo, aquela vida. Você olha uma coisa linear. Eu percebi que eu consegui, em cada área que eu estive, consegui deixar ali uma impressão, uma forma, um jeito Sandra de ser, de encarar aí a situações, trazendo aí experiências diversas. E sem linearidade nenhuma. Então na verdade eu comecei gerente de divisão, eu continuo gerente de divisão. Comecei até com umas questões de coordenação, mas assim, eu sai da área de vegetação, fui para um área de recuperação de áreas degradadas, passa por coordenação, que de repente vê um todo, vê um outro cenário. Já estou lá vendo como faz monitoramento da área, da água, monitoramento de peixes, de repente estou na área fundiária, fazendo liberação, construindo uma linha a 1000 km de distancia. A gente construiu lá a linha no Espirito Santo. E a de repente já mistura a área patrimonial junto, a gente já está fazendo outra coisa. E eu acho que se a gente perceber, as oportunidades elas chegam, e ainda que de uma maneira completamente diferente do que a gente tinha imaginado, a gente consegue fazer o que a gente quer, fazer a diferença, fazer a empresa crescer, mas também fazendo a diferença nos locais onde a gente é colocado, e que isso é possível, se a gente se permitir ousar. Quando que uma Bióloga, poderia um dia imaginar, estar fazendo o que eu faço hoje. É pela Biologia? Não, não é pela biologia, foram por outras características minhas. Eu acho que também o respeito por quem a gente é. Eu nunca me permiti fazer nada que o meu intimo não tivesse satisfeito, que aquilo não afetasse a minha ética, a minha moral. Então assim, eu não vou matar peixe, porque todo mundo mata, porque isso que você faz como iniciando, porque eu acho isso um absurdo. Então esse ímpeto que apareceu na graduação, ele continua, eu não vou fazer nada que eu não concorde. Já dei não, já disse que não faria coisas. Mas claro, a gente tem que dar um não, buscando uma solução, a gente tem que ter justificativa. Mas assim, é possível a gente crescer, deixar a nossa marca, é possível a gente fazer parte de uma história de uma empresa, que de verdade, faz parte da minha vida, desde que eu nasci. Ela possibilitou que meu pai cuidasse da família, está me possibilitando cuidar da minha família. Mas assim, é possível a gente fazer a diferença dentro da empresa e dentro da vida mesmo, se a gente se permitir, simplesmente receber o que a vida está trazendo. Eu acho que essa luta, que a gente tem de resistência, de mudança, é uma resistência tão forte, seu eu tivesse resistido lá atrás, eu fico pensando que hoje eu estaria no mesmo lugar. Contar essa história me fez ver o quanto que eu tive que crescer, quanto que eu tive que estudar, quando que eu tive que aprender, quanto que eu tive que lhe dar com pessoas diferentes, com histórias diferentes, com culturas diferentes. E eu acho que o maior favorecido aqui, sou eu. A gente cresce, a gente muda. E ao mesmo tempo, voltando lá, lembrando a Furnas que meu pai entrou, a empresa também mudou, também está pedindo isso da gente. E ela vem pedindo isso fortemente da gente, a gente tem que mudar. Então assim, não só contar essa história foi muito bom, foi muito gostoso, mas é uma oportunidade também de colocar isso. A gente não tem que fechar o nosso futuro. Se você me perguntar, onde você imagina estar daqui a 2 anos, eu não sei, eu não faço a menor ideia. Qual é o próximo convite que possa vir. Eu não faço a menor ideia do que possa acontecer. Sei que eu estou aqui, não pela minha formação básica, mas por competências, características, uma disposição de aceitar esses desafios. São fáceis? Não, da dor de cabeça, a gente tem que estudar muito, a gente ficar tenso, mas quando a gente vê que está dando certo e muito recompensador. Então assim, é muito. Eu gostei de mais, e gosto para onde Furnas está indo, que a empresa está se tornando, uma empresa que está se desenraizando daquela burocracia extrema. E a gente está conseguindo levar essa empresa para um outro patamar. E vamos ver até onde a gente vai, com essa grandeza de Furnas.
2:42:22
P/1 – Sandra, obrigada pelo seu tempo, pela sua fala, pela sua narrativa, a gente que agradece bastante. Foi ótimo te ouvir. A empresa com certeza agradece.
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