P/1 – Então, professor eu queria começar a entrevista pedindo seu nome completo, o local e a sua data de nascimento?
R – Eu me chamo José Hermógenes de Andrade Filho, moro na Praia de Botafogo 96 apartamento 1509.
P/1 – Mas onde o senhor nasceu?
R – Esse corpo? Nasceu em Natal.
P/1 – Quando?
R – Em 09 de março de 1921, são 88 anos vividos.
P/1 – Por que o senhor nasceu lá? Como era o nome dos seus pais? E por que eles estavam lá?
R – Meus pais são pessoas muito comuns, muito modestas, a minha mãe era Maria Isaura, meu pai era José Hermógenes.
P/1 – Como era o nome dela?
R – Maria Isaura, mas era chamada como Dona Maroca.
P/1 – E a família dela já estava lá? O senhor sabe um pouco a história da sua família?
R – Não, eu não sei.
P/1 – O que eles faziam?
R – Meu pai era um humilde funcionário público do Rio Grande do Norte e minha mãe era dona de casa, uma santa criatura.
P/1 – O senhor tinha muitos irmãos?
R – Viviam comigo três irmãos.
P/1 – E como é que era? O senhor lembra nessa época que o senhor nasceu, quais são as primeiras memórias da sua infância?
P/1 – Bom, eu posso dizer que a família era muito pobre, paupérrima, era, portanto, um desafio e ao mesmo tempo um estímulo pra mim, crescer nessa família que era marcada graças a Deus com muito amor.
P/1 – Qual é a sua primeira lembrança de infância?
R – No quintal da casa, do casarão da Rua Potengi que é uma pirambeira que vai dar no Rio Potengi estávamos todos fora de casa brincando com uma caixa de papelão vazia que eu tomei como um altar, tinha umas florzinhas pra parecer mais altar, porque foi um chamado muito grande pra vida espiritual.
P/1 – E isso assim o senhor está sozinho nesse lugar?
R – Sozinho.
P/1 – Quantos anos mais ou menos essa lembrança?
R – Não sei, talvez uns seis, sete anos, talvez cinco anos.
P/1 – E nessa época desse chamado espiritual o senhor tinha uma relação com a igreja católica? Como era a relação com a religião?
R – Naquela época eu pensei que existia uma religião, porque me foi ensinado assim, a religião católica minha única religião, a única que existia, a única que falava de Deus.
P/1 – Mas a sua família frequentava a igreja? Tinha uma vida religiosa?
R – Minha mãe frequentava, ela levava uma vida religiosa pelo bem que ela fazia aos outros, pelo amor que tinha a Deus, o meu pai também, meu pai era contínuo de uma repartição pública.
P/1 – E a família era muito pobre em que sentido, por exemplo?
R – No sentido da falta de dinheiro.
P/1 – Mas assim chegava faltar... A pobreza era assim... Não era miséria?
R – Não, não era miséria não.
P/1 – E o senhor lembra quando o senhor entrou na escola? Como é que foi essa sua entrada?
R – A primeira escola minha foi uma escola espírita na minha rua, gratuita, a segunda foi Dona Filhinha, era perto, que era muito bem administrada por dona Filhinha uma senhora gorda.
P/1 – E aí o senhor entrou nessa escola?
R – Entrei nessa escola.
P/1 – Lá o senhor aprendeu a ler e escrever?
R – Aprendi a ler e escrever.
P/1 – E depois como é que foi? O senhor saiu da escola e entrou em algum ginásio? Continuou a estudar?
R – Depois eu deixei a escola da Dona Filhinha e fui fazer parte de um grupo que me ensinou alguma coisa.
P/1 – Um pouquinho assim?
R – Muito pouco pra essa idade, a rua era uma pirambeira, a enxurrada descia lá feito uma cascata e meu irmão, que é meu herói, ele completou 90 anos, o meu irmão me amava muito, eu era mais menino que ele e ele providenciava, coitado, fabricar brinquedos, porque na época não havia plástico, não havia nada disso. Aí apareceu a moda do ioiô. O meu irmão sempre fazia ioiô pro irmão dele com o Cazuza, era o nome.
P/1 – Qual era o nome?
R – Cazuza.
P/1 – Cazuza? Por quê?
R – Sei lá, eles escolheram, ele fez um ioiô pra mim com muito amor, tudo isso me ensinou muito, era a minha escola verdadeira me ensinando sobre o amor, era um ioiô de rodinhas, mas ele não tinha como fazer a rodinha. Aquela chapa redonda, então o ioiô dele em vez de ser redondo era quadrado, mas valeu como ternura naquela época, como isso me fez bem. Morávamos perto do quartel da polícia no Rio Grande do Norte e eu brincava na calçada do quartel, então eu ouvia muitas histórias interessantes sobre o quartel e hoje tem até personalidades no quartel. O Rio Grande do Norte e Natal teve, eu acho que três dias de regime comunista. Eu sou um ex-comunista porque eu vivi em Natal nessa época e foi uma época muito interessante pra mim, minha mãe também fazia um carinho especial fazendo as comidas que os filhos gostavam e meu pai era mais ausente. Não está muito detalhado não?
P/1 – É assim mesmo.
R – É assim que você quer? Eu tô ganhando meu cachê?
P/1 – Eu queria recuperar um pouco como era a sua infância?
R – Era isso, nós tínhamos uma religiosidade orientada por dizeres como: para conquistar caminhos, confie em Deus, ela falava muito em Deus e eu fiquei muito enamorado em Deus como menino que tinha experiência em Deus, porque era só a igreja que salvava. Eu queria se salvo.
P/1 – Mas o senhor frequentava a igreja? Vocês iam lá?
R – Frequentava, no meu documentário é: “Deus me livre, isso é normal” é contado pelo meu irmão que eu desapareci de casa, e quando reapareci foi na época do Natal minha mãe muito aflita perguntou: “O que você estava fazendo”? “Eu estava na igreja” “Fazendo o quê?” “Na missa” “Por que você ficou tanto tempo”? “Porque o padre estava fazendo o sermão” ele fez o sermão dizendo: “Meus irmãos, fumem cigarro da fábrica Lafaiete” foi assim que eu assistia a missa quando criança. E finalmente eu fui muito amparado espiritualmente, porque vim de uma família pobre, séria, amorosa e dedicada.
P/1 – E aí o senhor conheceu os militares? A Polícia Militar ali?
R – Conheci umas figuras. Diziam que o médico falava para os soldados que se apresentavam para ele na visita médica: “Soldado, você tem febre ou pileque?” Desconhecendo o termômetro na época.
P/1 – Mas aí nesse momento o senhor ficou interessado em ir pra escola militar? Como é que foi?
R – Não, isso veio depois que eu consegui uma vaga no Atheneu Norte-Riograndense, eu tive companheiros que aparecem nos campos da política, da economia. Eu fiquei encolhido, apenas estudante e cada dia eu estava mais interessado em que esclarecessem dúvidas, questionamentos que eu tinha sobre a vida religiosa, sobre o que diziam na religião. Aí eu procurava as autoridades da igreja e cada uma que eu procurava, eu saía convencido de que ele tinha mais dúvida do que eu, eu sofri, mas isso faz parte da natureza.
Terminado o curso no Atheneu eu fiquei com problema, não havia uma instituição de terceiro grau, não havia faculdade em Natal naquela época, só tinha em Recife, Salvador, no Rio de Janeiro existia Escola Militar no bairro de Realengo. Eu fiz esse raciocínio: “Eu não posso pagar passagem para o Rio pra escola militar porque lá deve ser muita mais exigente do que eu tenho pra dar.” E lá eu poderia encontrar alguém que tivesse religião e respondesse os meus questionamentos, então o que eu podia fazer? Não podia fazer nada, eu passei a dar aula de Matemática para quem estava ruim e ganhei um dinheirinho, era dez mil reis a hora e assim eu fiquei dependendo de alguém pra financiar essa minha viagem, porque eu fiz o raciocínio: não ia gastar um tostão se eu entrasse pra escola militar, eu não ia gastar nenhum tostão, eu ia receber pelo trabalho, um salário miserável, mas recebia comida, alojamento e educação; e se terminasse, eu sairia aspirante do Exército, aí ganharia muito mais e era outra situação. E aí a probabilidade de encontrar alguém que me explicasse as coisas, isso mudou minha vida, eu não sabendo o que eu podia fazer pelo meu esforço levou meu irmão, que tinha conseguido um emprego no interior do Estado, ele fez um empréstimo, coitado pra financiar a minha viagem. A minha avó morava no Rio, eu vim para o Rio já tendo onde morar. Aí fiquei fazendo curso, fazendo curso não, eu me meti num curso preparatório para o exame da Escola Militar.
P/1 – Era muito difícil o exame?
R – Era muito difícil, dificílimo.
P/1 – Tinham muitos candidatos?
R – Muitos candidatos, naquela época 2000 era muito, era 2000 candidatos para 20 vagas, 10%, era muito difícil e fui desencorajado por colegas meus que falavam: “Você, filho de um contínuo de uma repartição pobre do Rio Grande do Norte conseguir ser do Exército, desista” porque na época tinha aquela barreira que só entra quem tem pistolão. Então eu vim com esses desafios, com esses desânimos e fui morar no sertão de Madureira. O sertão de Madureira era uma roça que ficava lá ainda. Então eu descobri que o curso da escola pré-agronomia na Urca tinha um curso de preparação lá naquela torre e ensinava Português, Aritmética, Geometria e Álgebra que era o que eu precisava. Então eu me matriculei e naquela época não havia nenhum ônibus para a Urca, havia o bonde, eu andava primeiro do sertão de Madureira pra estação Estrada de ferro do trem elétrico, vinha até a Central do Brasil de trem elétrico, ali eu tomava um copo de leite, porque era uma campanha, era mais barato. Eu esperava chegar outro bonde que ia me levar pra Praia Vermelha, eram três horas de viagem pra chegar lá.
P/1 – Que horas o senhor acordava então?
R – Eu acordava bem cedo.
P/1 – Por que era de manhã o curso?
R – Não, era a tarde, mas eu tinha que andar muito fora das aulas, eu vivia estudando, estudando.
P/1 – Era muito difícil? Assim, foi um susto pro senhor?
R – Para o Hermógenes da época era... O Hermógenes de hoje não é tanto, então eu me preparava muito pra poder conseguir passar bem. E chegou o fim do ano, eu me inscrevi para o exame... Mas antes tem uma coisa interessante: faltavam poucos dias e me falaram de um curso com o Major Lopes na Rua da Carioca no Rio, e pra chegar lá tinha que pegar dois bondes e era bem próximo. Então eu soube desse curso e me disseram que ele era um homem caridoso. Eu não tive dúvida, me apresentei a ele, um pau de arara se apresentou antes, eu contei a minha história, contei a minha inspiração e pedia que ele me recebesse gratuitamente e ele o fez. Então eu tenho que contar essa história. O Paulo Lopes.
P/1 – Quer dizer aí o senhor ia nele e depois ia pra escola?
R – Voltava pra escola, não porque o curso substituía a Escola de Agronomia.
P/1 – Aí chegou o fim do ano e era o exame?
R – E aí em Álgebra eu me senti o dono, eu fiz tudo certinho, em Português também, em Geometria também, quando chegou em Aritmética aí deu uma complicação, porque era uma questão que tinha uma complicação técnica, não dá pra explicar aqui, porque é um absurdo quem tira nove em Álgebra não tira cinco ou seis em Aritmética e perdi o ano.
P/1 – Por que o senhor tirou quanto em Aritmética?
R – Eu tirei 2,7 com muito esforço, a minha vida é cheia de dificuldades, de desafios que eu aprendi a amar, hoje eu amo desafios, eu acho que é Deus que está me aquecendo quando me sinto amarrado; eu tento me desamarrar, chegando o carnaval ninguém convida você para ir a um ato religioso, se procura Deus quando se sente desprovida, ferida, machucada, presa, ansiosa e necessitada, não é verdade? E era o caso.
P/1 – E o que aconteceu? O senhor olhou e não passou...
R - Com as aulas de Paulo Lopes eu consegui passar, mas fui reprovado em Aritmética.
P/1 – Por quê? Ele gostou do senhor?
R – Ele me deu bolsa e daria. Porque chegar um baixinho lá pau de arara, pobre. E então vou voltar pra Natal, então eu falei: “Vou aceitar o desafio que me fizeram, que realmente não dá pra um filho de um contínuo, pobre, ignorante conseguir.” Aí fui pra Natal e novamente comecei a dar aula, mas estava já gostando, gostando não é o caso, triste por ter sido machucado, mas eu fiz amigos aqui no Rio quando eu estava lá no Paulo Lopes, eu fiz amigos; uma família do Meier, eles me receberam antes de eu ir pra Natal, não se conformaram e foram pedir por mim ao doutor Henrique Coutinho, que era o secretário do Ministro da Guerra. E resultou daí um telegrama me convocando pra me apresentar em Recife tal dia com passagem de avião, porque um caso semelhante ao meu aconteceu com o filho de um oficial superior, de uma autoridade e resolveram que nesse caso dariam a matrícula.
P/1 – Ah, nem era uma nova prova?
R – Não, eu já estava matriculado numa escola militar, que é o que ele ia, que é aqui no Rio, mas a escola preparatória de cadetes é em São Paulo. Então eu passei alguns meses em São Paulo frequentando a escola de Cadetes e uma surpresa muito agradável: eu estava matriculado, não na Escola Militar, mas na escola preparatória que, como o nome diz, é preparatória. É uma escola do Governo, do Exército, é uma outra escola de nível menor e um tempo depois saiu essa, que quem conseguisse nota seis na escola preparatória tinha matrícula direto na Escola Militar. Aí me chamaram, eu vim e me apresentei em São Paulo, frequentei, estranhei muito o frio de São Paulo e tirei proveito da convivência e etc. Então eu só estava dependendo agora do exame físico, do exame médico e do exame físico, eu tive a aprovação no intelectual, aí fiz o aspecto médico e enfim o físico, eu compareci a esses dois exames. Aliás, só um porque já no exame físico eu fui novamente desligado e tive que voltar pra Natal, porque meu olho direito era quase cego.
P/1 – No exame físico? E o senhor já sabia disso?
R – Não no exame médico, então no exame médico eu fui reprovado e voltei pra Natal, mas novamente o Coronel Coutinho do Ministério da Guerra conseguiu uma aprovação para o filho de um poderoso que estava na mesma condição que eu e já que deu pra ele, deu pra mim. Aí eu vim e comecei o curso na Escola Militar, pra você ver quantos atropelos, quantos obstáculos, quantos desafios... graças a Deus, eu sou um homem que fisicamente não sou forte, mas moralmente e espiritualmente eu sou.
P/1 – E os questionamentos?
R – Aí da escola oficial do Exército pude casar no Rio, a minha família era de Natal e eu vim me casar aqui no Rio, aqui eu constituí família e tive duas filhas, uma das filhas Ana Lúcia, é mãe do Thiago, meu neto, que vai ser meu continuador aqui na Academia, ele vai assumir tudo.
P/1 – Aqueles questionamentos, por que tudo começou? Por que o senhor estava em busca de umas questões?
R – É, mas você perguntou qual o meu curso superior, é isso? Eu tinha me matriculado na faculdade católica, inspirado pelo meu desejo de conhecer melhor meus... Conhecer melhor a minha religião. No dia da primeira aula eu soube que o professor de Teologia que eu ia ter, que a turma toda ia ter era um teólogo com curso em Roma e etc. eu festejei na minha alma, eu disse: “Graças a Deus vou ter quem me esclareça, quem me dê uma solução para minhas perguntas.” Então eu fiz um projeto “Se eu quero isso, o que eu devo fazer” aproveitar aquela pergunta comum “Alguma dúvida? Alguma pergunta”? Quando o infeliz do professor disse isso, eu levantei imediatamente, parecia uma mola, ele falou: “Qual é a sua dúvida, o seu questionamento”? Aí eu expliquei pra ele, fiz a minha pergunta e sabe qual foi a resposta dele? Aquele que iria me salvar, eu vivia naquela dúvida, eu tenho um amor muito grande pela religião, pelo Cristo e não aceitava muitas coisas que me foram ensinadas desde a infância. Quando eu fiz a pergunta, ele mostrou um pouco de decepção, de surpresa e disse: “A sua pergunta já é uma heresia” então eu sou um herege. Dei o fora da universidade e da religião, passei alguns anos trabalhando e aí comecei a estudar filósofos brasileiros e me enriqueci muito com a Literatura do Espiritismo com Literatura da Índia principalmente a Bhagavad Gita. Você sabe o que é? É uma conversa, uma catequese, a salvação, a catequese de Krishna para o homem, um príncipe que estava numa aflição muito grande, estava neurótico, estava doente mentalmente. Então essa aula da Bhagavad Gita ainda hoje eu consulto e sugiro que todo ser humano consulte mostrando por que existe Deus, pra onde devemos querer ir, trabalhar para ir finalmente uma visão verdadeiramente sábia da verdade, da verdade de Krishna.
P/1 – O senhor lembra qual foi a sua pergunta pro professor?
R – Eu prefiro não ofender... Não prejudicar a religião católica.
P/1 – Então tá. Então voltando a essa questão...
R – Particularmente eu digo a você, são coisas como os pecados e sei lá... Porque existe uma coisa tão maravilhosa, Cristo é maravilhoso, particularmente eu disse pra vocês, eu não dei detalhes, mas a ideia do pecado, a ideia da culpa.
P/1 – E aí?
R – Eu senti a Bhagavad Gita, Krishna me devolvendo o Cristo, isso aí você pode dizer, eu encontrei um Cristo muito amoroso.
P/1 – Nesse livro? Lendo esse livro?
R – Nesse livro, eu estudei muito esse livro e estudo ainda e comparo com o evangelho.
P/1 – E tem uma grande diferença?
R – Uma grande unidade, e doutrindade é a mesma coisa com outras palavras, porque foi uma mensagem dada no Oriente e o Evangelho no Ocidente. e eu tivesse aqui uma Bhagavad Gita eu ia ler um pedacinho pra vocês e vocês iam ver Cristo falando no Oriente. Bom, aí continuei minha vida de estudos, fui da Sociedade Teosófica, cheguei a vice-presidente, mas eu estudei tanto que de repente eu comecei a sentir nos fins das tardes um desânimo terrível, fraqueza. Eu fiz um tratamento médico convencional da época porque os remédios químicos tinham interferências mais dolorosas que o pneumotórax, e o que mais meu Deus? Eu tinha aprendido que a gente tem que viver afirmando a nossa saúde, a nossa paz, a nossa vitória e nunca o oposto que é o que mais a humanidade faz. Você encontra muito maior número de pessoas dizendo assim: “Eu sou um azarado, eu estou cansado, estou doente, minha vida é um inferno” se alguém disser: “Eu sou Deus” isso é história. Mas como eu estava com a Bhagavad Gita mais e mais e um dia numa livraria, a Livraria Leonardo da Vinci, aqui na Avenida Rio Branco, eu encontrei um exemplar de um livro fino, pequeno, o Hatha Yoga, meses depois outro também de Hatha Yoga de outro autor, aí eu formei a ideia do que era Hatha Yoga. Aí eu vi que o Hatha Yoga pode curar, pode melhorar, pode promover a felicidade humana. Eu tinha aprendido a fazer a prática da auto-sugestão positiva e o tratamento já dizia desse recorde de cura, mas tinha falado que tinha uma técnica que era aplicada no tratamento que era pneumotórax.
P/1 – Mas a doença era pneumonia?
R – Não, era tuberculose. Consistia em uma vez por semana, usando uma agulha desse tamanho e forte entre os intercostais para dar uma injeção de ar no pulmão, que ele iria paralisar. E por que paralisar um pulmão e deixar o outro funcionando? Pra nos manter vivos. E por que para o outro? Porque a cura depende de parar, uma ferida no joelho demora muito mais do que se for no meio da coxa, por quê? Porque o joelho tem muito movimento e o que movimenta muito é muito mais difícil de ser sanado.
P/1 – E a tuberculose é uma ferida na verdade, né?
R – É uma infecção, então o tratamento... o médico me tratava de uma maneira diferente, porque em plena consulta com ele me disse que tinha muita pena de dizer que eu estava tuberculoso, porque na ocasião era uma condenação a morte, ele disse: “Você está tuberculoso” e eu mostrando uma calma, uma tranquilidade que confundiu o médico, eu não mostrei nenhum pavor, nenhum gesto de medo em relação à morte, eu disse: “Vamos começar hoje mesmo o tratamento porque eu quero bater um recorde de cura.” Mas eu tinha muita confiança que Deus ia me curar rápido, mas passou o tempo, um ano, dois anos, eu não me lembro quanto durou isso...
P/1 – Quantos anos o senhor tinha nesse momento?
R – Talvez uns 35 anos, eu falei para o médico que... Dentro do tratamento tinha super alimentação e repouso completo, quer dizer é uma fórmula preparada para engordar a criatura. Então o médico ficou tocado, eu sei disso. Naquela promoção, como que chama? O Rock in Rio era uma promoção gigantesca no Rio, né? Vinha gente, vinha grupo de todos os lados e só se falava em Rock in Rio, eu fui convidado pra fazer parte do Rock in Rio, não é pra dançar e nem pra cantar, mas é porque era Rock in Rio e a paz, uma coisa dessas, então foram me apanhar. Eu escrevia artigos e já tinha livro escrito, espera aí primeiro começou a abertura é a abertura particular com as figuras universais lá do rock e eu fui convidado e me sentaram junto no palco com ele. Eu disse pra ele: “Eu precisava me encontrar com você, meu nome é Hermógenes” “Hermógenes, eu te conheço o médico que tratou de você era meu sogro” naquela época do Rock in Rio “Meu sogro ficou absolutamente admirado da sua tranquilidade, do seu bom humor” e foi assim que eu soube que o médico realmente teve um choque com a minha capacidade de assumir. Hoje muitas pessoas são ajudadas fazendo uma prática que eu ensino, diga sempre em toda situação, independente de chegar a determinado resultado, diga sempre: “Entrego, confio, aceito e agradeço”. Temos que nos preparar para receber as bordoadas da vida, isso pratico eu e espero que vocês pratiquem também. Pois bem, então esse médico que me tratou eu disse a ele um dia: “Estou admirado porque não vejo você marcar uma época de me libertar, de me curar, quando vai ser isso?” E ele disse: “Eu lamento dizer Hermógenes, mas a sua doença é muito séria, em vez de libertar, você vai ter que fazer uma cirurgia.” Quer dizer, é uma queda, tive que fazer uma cirurgia, absolutamente indispensável. “Demora pouco”, me disse. “Tá certo, então vamos fazer a cirurgia.” Na manhã da cirurgia o médico encontrou comigo, o cirurgião e me explicou uma coisa terrível: “Quero adiantar a você que você vai sentir todas as dores da cirurgia”
P/1 – O quê?
R – Vai sentir todas as dores da cirurgia.
P/1 – Por quê?
R – “Porque eu não vou aplicar anestésico, o anestésico é inflamável e eu vou trabalhar com dois cateteres, dois ramos: um termina com um bisturi pra cortar e o cauterizador para queimar. Eu vou fazer cortes e queimar e, perdoe, porque pra isso terminar bem você não pode fazer nenhum movimento de defesa e nem gritar.” Você não pode se contorcer,vai sentir todas as dores, é terrível.
P/1 – Que horror.
R – Certamente, mas eu levava isso em aceitar o que vem de Deus.
P/1 – Já nesse momento o senhor já tinha essa relação assim de perceber...
R – Já, já tinha publicado um livro... não, eu publiquei depois. E eu me vi na mesa de operação e ele me deu um até logo, anestesia nenhuma, aí furou, entrou com duas penetrações uma para cortar e queimar e a outra para ver onde cortar. “Depois de manhã você pode curtir em casa”, era carnaval no Rio, um calor infernal, eu cheguei na minha casa na Tijuca para começar a recuperação, porque como estava fazendo muito calor, eu pedi que colocassem uma esteira de palha que estava atrás da porta pra forrar a cama, mas eu não sabia que a esteira estava com uma super população de ácaros, que são aquelas poeirinhas. E deu como resultado muitos problemas, alguns problemas eu vi imediatamente, aliás, não foi imediatamente, passou um tempo eu passei diante de um espelho e me olhei, eu estava com uma inclinação, não estava na vertical, estava inclinado e não corrigia. Aí eu telefonei pra ele, pro médico e contei isso e ele disse: “É uma pleurisia.” Então me receitou um tratamento e eu fiz o tratamento e voltei... Ah sim outra coisa interessante teve uma hora que ele estava cortando e queimando, eu sabia que ia morrer de tanta dor...
P/1 – Doía muito?
R – Muito além de qualquer resistência, muito era cortar, queimar dentro do pulmão, aí eu me lembrei que tinha lido a Bhagavad Gita, Krishna explicando o destino depois da morte, que ele é determinado pelo pensamento que você tem na hora de morrer. Se você morrer dizendo: “Deus, Jesus Cristo, Krishna, Buda...” Você está se prevenindo pra se morrer ir pra onde eles estão. Olha que promessa hein? E eu, na hora que eu vi que ia falecendo, estava na hora de morrer, eu queria mesmo morrer por não aguentar tanto. Aí comecei a dizer o nome de Deus e ele fechou a incisão e eu fui pra casa.
Vocês já imaginaram, dentro do peito da gente, um corte de lâmina, cortar e queimar, cortar e queimar sem poder mexer, não podia dizer “ai” tinha que ser parado, completamente parado. Eu cheguei a um ponto que a dor era tanta, o meu sofrimento chegou quase ao extremo, aí eu disse: “É melhor morrer.” Nessa hora eu em entreguei à morte, ou melhor, a Deus. Aí eu comecei a dizer o nome de Jesus Cristo, não demorou muito, ele disse: “Pronto, terminou”. Aí ele me tirou da operação e eu fui pra casa com a bandagem. Era verão no Rio de Janeiro, mês de fevereiro, um calor tremendo, um calor terrível e me deram uma espreguiçadeira para me deitar, uma caminha. Eu vi uma esteira atrás de uma porta, eu pedi a esteira pra forrar e refrescar, eu deitei na esteira, eu acho que umas duas horas depois eu estava espirrando violentamente. Aí eu telefonei pra ele, ele me tratou, me receitava por telefone pra sair da gripe e curou-me da gripe. Passei diante de um espelho e vi a imagem inteira e eu estava adernado feito um navio que estava afundando inclinado.
P/1 – Em pé assim, inclinado?
R – Inclinado, porque eu queria ficar na vertical e não conseguia, eu telefonei pra ele meio assustado, ele disse: “Então...” Vocês nem perguntaram se eu encontrei Deus do outro lado, né? Também eu não passei pro outro lado.
P/1 - Se a gente não perguntou o quê? Se o senhor encontrou Deus?
R – Também não passei pro outro lado ainda, acredite. Ele me tratou daquela pleurisia, me tratou durante... Não sei, talvez uma semana ou duas ou três, eu voltei para continuar o trabalho com ele, que era a técnica mais avançada da Medicina naquela época. Pneumotórax, que consistia em paralisar o pulmão para que ele paralisado se curasse, viabilizasse a cura.
P/1 – Sem anestesia sem nada também?
R - Sem anestesia sem nada, era uma agulha grande assim com esses pregos mais fortes que era introduzido, era uma injeção de ar, porque a pressão de ar, ele falava forma um pneu, enchendo um pneu que era o pulmão. E deu certo, eu optei para o pneumotórax. Agora, como que deu certo? Ah, tem uma coisa que eu precisaria dizer isso aqui antes. Deitei-me na cama pra fazer o primeiro pneumotórax, ele enfiou aquela agulha, demorou um dia só, aí mostrou uma surpresa, ficou espantado, sacudia... Isso não dá pra entender “e o senhor me der licença eu vou fazer outro”, fez o segundo não deu certo, não pegou eu digo: “Pronto, é capaz de ter acontecido o pior.” Aí ele tentou tantas vezes que eu virei um paliteiro, todo cheio de buraquinhos e no final disso ele falou: “Você sabe por que eu fiz tantas tentativas? Porque não era tempo de você estar curado e você está curado” e depois ele mesmo encontrou uma possível explicação: é que o líquido do pulmão doente tinha curado o pulmão. É, o líquido que fez o papel do ar que não precisava mais entrar.
Agora eu passei tudo isso confiando em Deus, como é que eu passei por tudo isso e já estava agora vitorioso novamente, como? Como? Essa foi a primeira lição que eu recebi. Eu não sei se no futuro será uma técnica, não sei o que será, é que quem se entrega a Deus tem resposta, você pode pedir uma cura, você tem que dar uma piorada muito grande pra passar pra essa cura. Então primeiro vem a dor, depois vem a solução e foi exatamente o processo que se passou comigo: quando eu vi, já estava na minha vida, entrou na minha vida. Eu não vi seu esplendor nem nada, mas os fatos me mostram que foi a inteligência suprema e o poder supremo que fizeram isso. Eu chamo isso de pilogoterapia, terapia da palavra e também teoterapia, eu não sei como chama, mas é a terapia mais poderosa, mais surpreendente, o resultado de entregar-me a Deus. Ás vezes ele dá uma resposta que cura direto e a pessoa alcança o objetivo pelo qual se entregou, outras vezes ele dá um grande susto, então se você algum dia tiver um problema muito grande, se entregar a Deus e esperar uma cura, uma resposta e uma solução perfeita, rápida, pois muito bem, mas não fique desanimado se vier o contraio.
P/1 – Se você piorar, por exemplo, é isso?
R – Se você piorar, porque piorando a gente não se cuida, aí você pergunta: “Mas por que isso?” Primeiro, você se entregou bem, mas você tinha as dores do passado, as dores que você forjou para o futuro. Nós todos hoje temos um passado, todos nós temos o nosso tesouro particular com dores ou prazeres de sofrimentos ou vitórias, alegrias ou tristezas, todos nós temos e é por isso que as pessoas morrem em horas que parecem absurdas e não são. Eu tenho hoje uma convicção sobre a fé, eu tenho fé que Deus me cure e ele me piora, é uma surpresa desagradável, mas continue a ter fé na cura mesmo que você tenha adoecido. Ela vem, pode vir e quando? Eu não sei, ninguém sabe quando, Deus dá a resposta e essa resposta pode sorridente ou lacrimosa, aguarde, ele não falha. Outra coisa eu estou preocupado que seja mais a minha biografia, eu estou fazendo teorias aqui.
P/1 – Mas é uma conclusão desse momento da sua vida, né?
R – É pra compreender...
P/1 – Voltando a sua biografia, assim saindo desse momento, percebendo essa cura e a entrega a Deus, quais foram seus próximos passos? Como o senhor levou isso adiante?
R – Deixa comigo, vou te contar. A minha cura levou uns anos e ao longo disso aí eu cheguei a essa conclusão, primeiro fortaleci a minha fé, escapei de uma condição, de uma doença que poucos médicos conseguiam ou conseguem entender, uma doença que eu descobri... Eu sou metido a besta, viu? Eu descobri essa doença também da experiência de vida, a minha experiência, a doença chama-se normose é a doença de ser normal. Você ri porque sentiu que isso é verdade, né? É por isso que a gente bebe certos refrigerantes, é por isso que a gente usa o que a moda indica e é por isso que a gente pensa como os outros pensam e é por isso que a gente se torna massacrado pela normalidade que é conduzida pelos espertos. A minha transformação foi tão grande, foi tão profunda, tão convincente, tão festiva que até hoje eu festejo. O primeiro passo nesses festejos foi eu chegar aos que sofrem de alguma forma para suavizar a sua dor, pra livrar do sofrimento, para reduzir esse sofrimento. Eu sei que isso é uma maneira de expressar a minha gratidão e foi aí que eu fui fazendo meus estudos e danei a estudar, porque eu concluí que me tornando um escritor eu poderia chegar ao lar de uma pessoa que está lá na Amazônia ou na Coréia, sei lá, tanto aqui no português, em livro, naquela época não havia internet, não havia nada disso, era o livro. Aí eu danei a escrever livros para propor uma ciência nova que se chamaria yogaterapia, e fui estudando com os casos vindos na minha mão, porque me pediam muito pra fundar uma academia onde eu pudesse ensinar as coisas. Porque aí entra uma parte técnica, pra ser ensinado quase que pessoalmente. E eu tive que vencer essa dificuldade para que as minhas expressões funcionassem como remédio.
P/1 – Mas quer dizer nesse momento da sua cura o senhor já praticava yoga todos os dias?
R – Foi na última fase da cura.
P/1 – Então como foi exatamente essa... O senhor aprendeu yoga com alguém? Como é que foi?
R – Eu não conhecia ninguém no Brasil e yoga ninguém conhecia.
P/1 – E aí de onde veio?
R – No dia da Livraria Leonardo da Vinci no Rio, na Avenida Rio Branco no Rio de Janeiro, eu encontrei numa amostra de livros um livro publicado sobre yoga na Suíça. Era um livro de uma pessoa talvez bem intencionada e me tocou muito, me convenceu do poder que o yoga tem para mudar a vida da gente. Depois eu gostaria de dizer o que é yoga que não é somente contorcionismo, malabarismo, né? Eu estou fazendo teoria e não conto nada.
P/1 – Pode falar, fala o que é yoga?
R – O livro... Um outro livro comprado na livraria, esse ensinava as técnicas que eu tratei de aplicar em mim escondido do médico e escondido da família, eu praticava num lugar solitário e silencioso pra mim, que era o banheiro da casa é o lugar mais impróprio pra se pratica yoga,
me desculpe, mas a coisa funcionou assim e eu fui aos poucos...
P/1 – Só pra eu entender concretamente assim, o senhor pegava o livro abria e falava: “exercício tal” sentava no banheiro... Como é que funcionava isso?
R – No banheiro, com aquele livro eu fui avançando nas técnicas, eu estava meio engordecido, porque tinha que comer muito e fazer nada durante o tratamento médico. As minhas articulações estavam comprometidas, eu estava enfraquecido, claro, mas eu fui me esforçando, eu queria juntar as mãos aos pés, não dava, e vamos repetir, vamos repetir até que cheguei a ser um bom executante, eu tenho umas fotografias que mostram que eu realmente já fui mais bonito. Então eu ganhei o que passar pros outros, me preocupei porque eu ia atender pessoas desconhecidas e isso seria a alegria da minha vida e tudo isso aconteceu, está acontecendo ainda. Eu tenho 31 livros escritos sobre isso, então uma quantidade imensa de cartas, de gravações; naquela época a gente tinha um gravadorzinho, eu gravava depoimentos que me comoviam e que me convenciam. Eu estava dento de um projeto muito grande que é a inteligência superior, de um ser divino, até hoje audaciosamente eu penso nisso, mas não penso com arrogância, porque pra sentir bem tudo isso é preciso uma prática que eu descobri muito útil e treinei, aprendi e ensino e ouso ensinar, que é humildação. Eu compreendi que as nossas dificuldades de vida, nossos sofrimentos, as barreias que nos apresentam, as doenças, as dores são criadas por um fator muito arrogante, muito esperto, que é a nossa mente iludida. Então já comecei a ver que a transformação vinha de um lugar muito especial transcendente. Ao mesmo tempo em que é transcendente, ele é imanente, sabe? Estava dentro de mim, num projeto supremo do qual eu faço parte. Eu digo isso pra não perder a minha maior riqueza, como eu sou orgulhoso do Hermógenes que as pessoas admiram, mas é uma idolatria tremenda, de vez em quando eu digo: “Hermógenes deixa de ser besta.” Nessa nossa conversa você percebeu isso, né? Eu digo umas coisas dessas querendo consertar, eu sou cuidadoso pra não chegar de praticar uma coisa boa que é a humildação.
P/1 – Humildação é humildade e ação? É isso?
R – É uma ação que vai me humildar, ainda não explicou? Mas Karen você sabe onde está sua maior inimiga? É a Karen. Às vezes você discute orgulhosa, ambiciosa, amedrontada, ciumenta, não sei... Ou eu estou errado?
P/1 – Não.
R – Então você já está se curando da normose, não sei se você percebe, entendeu? Então quando eu vejo políticos ou empresários vitoriosos, milionários falando com arrogância e lutando por mais pra aumentar posses, eu fico com pena deles, são muito sujeitos a infelicidade. Mas quando eu lancei o meu primeiro livro que agora está lançando a sua quinquagésima edição, e quais foram os livros brasileiros que tiveram 50 edições? Raros, não estou dizendo isso também com arrogância, eu cheguei à conclusão que a minha hipótese virou tese, a minha obra com 31 títulos está aí no comércio. Há dois livros meus que tem muito consumo: Autoperfeição com Hatha Yoga que é a 50 edição e Yoga para Nervosos, que já está com 46 edições, daqui a pouco 50. Esses são muito consumidos; tem os outros menos, mas também consumidos, mais conhecidos: A Yogaterapia e Saúde na Terceira Idade. Agora vou voltar pra minha história, né? Ou está boa a entrevista?
P/1 – Ta bom, mas vamos voltar... É bom a gente permear uma coisa com a outra assim, as conclusões, as reflexões e depois o que aconteceu, porque a gente vai traçando essa narrativa dessa maneira e fica bom. Aí nesse momento o senhor começou a academia?
R – A academia quando... A parte ética do yoga é muito sábia, desiste de qualquer hipocrisia, nós temos que nos vigiar, isso Jesus Cristo que é o grande mestre disse: “Orai e vigiai” tem que estar vigilante. Então eu não tenho medo da polícia, porque tenho medo do Hermógenes antes. Eu quero que ele se coloque numa posição de servidor, é difícil. Um dos preceitos da Yoga é o desapego, porque o mal é o apego. Então o seu “eu” Karen tende a ser apegado às coisas, é o sentimento de posse acompanhando o crescimento do ego e a gente vai acumulando coisas pra conquistar... Machuca os outros ou se machuca para possuir, vamos dizer a verdade, possuir nada, o que você possui? Possui nada, você é dono de quê? Do carro, ele acaba, o carro acaba, as mulheres, as modelos qual a riqueza que têm, beleza física acaba, eu não sei se vocês já descobriam que acaba, eu olho pro espelho e vejo que acaba. Então eu não queria vender yoga e passei por experiências, porque aí eu passei por muitas experiências, tenho 50 anos dessa vida, não é 50 anos de vida são 50 anos de prática.
P/1 – E aí o fato do senhor não querer vender yoga isso mudou o jeito...
R – Eu não queria vender yoga quando perguntavam: “Onde você dá aula?” Eu falava: “Eu não tenho lugar” “Por que o senhor não aluga uma sala?” Eu sempre fui pobre, graças a Deus, eu queria continuar pobre, mas de cabeça erguida, sem dívidas e sem medo de perder a fortuna, porque não possuímos nada, a fortuna é uma ilusão. A riqueza maior que nós temos é o amor e não custa dinheiro porque se custar dinheiro não é amor; eu queria passar para quem sofre uma proposta, aliviar seu sofrimento. Então tem que seguir os preceitos éticos do yoga de mais nada, e um deles é o desapego. Então: “Você paga essa aula com o que você ganhar” eu não sei se quando eu ganhar vai começar a luta, vou sofrer se não ganhar.
P/1 – E aí o senhor fez o quê?
R – Fechei a questão, mas deixa eu te contar um fato de desapego, eu me lembro depois que foi lançado o livro, eu vim fazer conferências a convite da Folha de São Paulo, nessa ocasião eu já conhecia a professora Celeste, ela fez até parte de demonstração com os alunos dela. No último dia de conferência já me esperava na entrada da sala um senhor elegante, muito bem vestido, rico, mas que gostaria de ter uma entrevista comigo, eu disse pra ele: “Vou viajar à tarde, de manhã estou na Vila Mariana” dei o endereço. Ele foi, ele era um homem rico, tinha uma família muito rica, mas que tinha horror à família, porque a família era uma família sem objetivo de vida, sem valores a não ser os monetários, que construíam os mausoléus mais bonitos que vocês têm aí. Aquelas utilidades pra que serve aquilo depois da morte? E ele queria se desprender do que era seu, se desapegar. Vou explicar porque ele me procurou. Aí ele foi mais franco, me chamou de irmão José, querendo me transformar num místico, “Eu tenho uma propriedade que é quase dentro de São Paulo”, eu quero dizer que essa conversa se passou há quase 50 anos atrás, que dizer, hoje o pedaço de terra que ele tem, a propriedade que tinha quase dentro de São Paulo deve ser uma fortuna imensa. Sequóias do Canadá, lagos gramados, isso, isso e aquilo, ele disse pra mim: “Eu quero lhe fazer um pedido, aceite essa propriedade como doação minha.” Eu vi o risco da proposta, eu disse: “Muito obrigado” “Mas eu quero dizer que aceito depois que você aceitar fazer o que eu vou pedir” ele disse: “Peça” eu disse: “Eu quero que nunca mais acredite numa pessoa como você acreditou, em mim com tanta facilidade”. “Me desculpe, não posso aceitar” é renúncia e por ele, outras renuncias foram feitas, inclusive sexuais. O desapego é uma terapia, use as coisas, mas não se apegue a elas, não faça sua felicidade... Diz um filósofo grego, não faça sua felicidade depender daquilo que não depende de você.
P/1 – E acabou tendo a academia?
R – A academia. O Sr. Noia é o nome dele, um judeu, ele foi meu colega no Atheneu Norte Riograndense era meu colega, muito amável se tornou um grande pioneiro. Pioneiro não, um empresário de construção civil, ele fez vários edifícios. Ele se tornou um homem rico, ele me perguntou um dia por quê. Eu expliquei, “Porque eu não quero vender yoga. E, outra coisa, eu tenho medo de não poder pagar o aluguel no fim do mês, eu não quero ficar devendo a ninguém.” Um dia, ele me telefonou, ele me chamava de Zé “Oh, Zé vamos nos encontrar, você tem tempo?” ele queria encontrar comigo na Rua Uruguaiana, 118 numa terça feira, segundo eu me lembro, tal dia e tal hora. Eu concordei com ele, ele chegou, subiu de elevador e lá no alto estava a cobertura vazia, ele mostrou a cobertura enorme e disse: “isso aqui vai ser a sua academia” eu digo: “Mas de onde eu vou tirar dinheiro?” Ele disse: “Pode deixar.” Ele botou os operários dele pra fazer uma limpeza, uma arrumação mais artística, mais estética e disse: “Faça a sua academia e não se preocupe quanto ao pagamento, porque se faltar dinheiro, eu cubro.”
Aí logo apareceram pessoas em número suficiente, e ainda hoje eu estou no número 118, na cobertura do 118 na Rua Uruguaiana no Rio de Janeiro. Ainda hoje pago aluguel, há quase 50 anos, eu sou um comerciante, eu não posso dirigir nada. Não encontrei dificuldades por parte dos médicos, que era um receio meu. Ao contrário, os médicos que leram meu livro ficaram admirados da proposta, recebi convites pra participar de reuniões médicas de estudos, médicos se tornaram meus alunos; um dos caras que eu distingo mais nesse ponto, o médico da enfermaria 32, doutor Osmar Cerqueira, da enfermaria de doenças do tórax, foi meu aluno. O encontro com ele foi muito bom. A academia começou o trabalho e estava um senhor esperando por mim, ele disse que gostaria de ser meu aluno, fazer umas perguntas e fez aula, adorou, pediu pra eu me tornar assistente dele na Santa Casa, entendeu? Um hospital de maior tradição no Rio de Janeiro e quase do Brasil e eu sem ser médico, vou participar, vou trabalhar com médico. E prestei serviço lá e chegando cartas, contando as transformações pessoais das pessoas e até hoje a academia funciona ali.
P/1 – E durante esse período, o senhor tinha um trabalho ,da carreira militar? Como é que era isso?
R – Um colega meu me substituiu em silêncio, ninguém sabia nada, mas ele foi dar as aulas por mim e parecia que eu estava trabalhando, mas eu não estava, eu fui ajudado por colegas militares. Hoje eu sou coronel de pijama, né?
P/1 – Mas isso durante a sua doença? Mas depois o senhor voltou pra academia? O senhor trabalhou assim com a carreira militar? Como é que foi?
R - Depois eu passei por pouco tempo, faltava pouco tempo pra eu me aposentar.
P/1 – Nesse período mesmo?
R - Nesse período mesmo, eu frequentei as minhas obrigações no colégio militar do Rio de Janeiro, porque eu era professor.
P/1 – Quer dizer a sua careia militar foi ser professor, é isso? No colégio militar do Rio?
R – Exatamente.
P/1 – Por quanto tempo o senhor fez isso?
R – 24 anos.
P/1 – E aí quando o senhor ficou doente, já tinha 24 anos que o senhor dava aula no colégio era isso?
R – Bom, 24 anos foi até a minha passagem pra reserva, hoje eu encontro generais aposentados envelhecidos que nem eu que foram meus alunos lá no colégio.
P/1 – Teve alguma coisa dessa sua vivência com as escolas de militares, com colégio, com os colegas, que foi importante na sua vida?
R – As minhas promoções. Eu tentei fazer uma coisa. Tentei lançar essas ideias de maneia diferente com outra didática, em livros didáticos e escrevi livros importantes. Era época do Estado Novo, não dos militares, do governo militar, não consegui que o Ministério da Educação aprovasse um livro meu, eram estranhos.
P/1 – E nessa época do governo militar o senhor teve algum tipo de problema por estar falando de coisas estranhas? Aconteceu alguma coisa?
R – Milagrosamente não. Deus tem me ajudado muito, ele me ajuda às vezes quando ele cria dificuldades, porque é na dificuldade que você se lembra de Deus, se torna mais intimo com ele. Se você está dançando no carnaval ou na boate você não se lembra de Deus.
P/1 – Vamos falar agora um pouquinho da sua vida de família. Em que momento o senhor casou?
R – Eu sou muito cauteloso quanto a isso porque eu tenho cinco bisnetos, eu tenho uma família grande e as minhas histórias podem agradar uns e desagradar outros, mas eu amo todos.
P/1 – Mas me conta como o senhor casou?
R – Como?
P/1 – Ou quando encontrou sua companheira?
R – A minha primeira mulher que eu tive, eu comecei a me tratar por ela quando ela era uma estudante se preparando para ser professora, eu fiquei gamado. Meu casamento durou 30 anos, eu acho que é isso, depois ela morreu e aí tive outro casamento, casamento não, outro namoro demorado com uma mulher lindíssima, impressionável... Eu fico com dificuldades... não quero mentir e nem ferir.
P/1 – Tá.
P/1 – Professor, a gente falou um pouquinho de Jesus, a presença de Jesus, mas...
P/1 – Jesus sempre foi meu mestre.
P/1 – E o Sai Baba, lá da Índia, como é que foi a sua descoberta? Como é que a gente chegou nesses mestres?
R – Legal. Primeiro de Jesus, né? Eu era pixotinho, garoto com talvez quatro ou cinco anos, sei lá, pegava uma caixa de sapato vazia, botava um santinho, botava umas florzinhas e ia rezar uma missa. Então você vê a minha preocupação, o meu interesse por Deus, o meu amor por Deus se expressava desde a minha infância, mas o tempo foi passando e o Deus que a catequista me ensinou não era o Deus que eu esperava encontrar, tem grandes diferenças. Aí eu fiquei distante de Jesus, veio a tuberculose, eu fiquei decepcionado, fiquei muito triste por muito tempo. Nessa fase eu aproveitei e fiz uma leitura sincera, profunda, ansiosa pela verdade nas figuras mais representativas da literatura espiritualista, li alguns livros do Kardec, Pietro Balde e outros mais. Nessa fase de leitura caiu nas minhas mãos a Bhagavad Gita. Eu fiquei encantado, falei: “Meu Deus, Jesus disse isso, mas de maneia diferente, Jesus já tinha dito isso.” Encontrei o caminho e quanto mais eu me aprofundava em Krishna mais Jesus aparecia, eu disse: “Eu fui aceito pelos cristãos também, pelos católicos, né?” Quando comecei a apresentar o recurso sobre meditação aos irmãos maristas do Brasil inteiro, aceitaram bem, viam que quando a gente se aprofunda da verdade, a gente vai encontrar o mesmo pensamento essencial nas diversas religiões. E quanto mais eu aprofundava no Bhagavad Gita mais me aprofundava no evangelho, eu ia vendo que é uma coisa só, uma porção única, essencial os conceitos sobre religião. Eu disse que o livro Krishna me devolveu o Cristo.
P/1 – Isso foi Krishna, mas aí o senhor identificou um mestre na Índia, não foi?
R – Ah sim, eu mesmo me senti liberto da religião no seu conceito horizontal, no seu conceito popular, mas cada vez mais profundamente religioso, o yoga que quanto mais se aprofunda, mais se descobre a oralidade das religiões, das propostas religiosas. E li Hama Krishna. Sai Baba foi minha ultima conquista, eu passei muitos anos sem ouvi falar em Sai Baba e já conhecendo Bagavaguita. Mas um dia me falaram mais profundamente, mais detalhadamente e eu conheci aos poucos, eu fui a Índia em 1975 pela primeira vez, então me falaram de Sai Baba. Eu era então nessa ocasião vice-presidente da sociedade Teosófica no Brasil, era aniversário da sociedade Teosófica, voltei apaixonado, desejoso de voltar à Índia novamente menos turista e mais estudioso, mas não tinha dinheiro. Eu acho que passei cinco anos sem poder ir e quando eu consegui organizar uma turma pra ir, aí eu ganhei passagem de graça. Então eu levei várias pessoas à Índia e aí minha mulher quis conhecer Sai Baba, falou com essa guia de turismo, ele se negou, se negou, disse apenas: “Por que você vai querer ir para um mistificador? Ele não é um místico, é um mistificador, só quer saber de gente rica e procurou dizer uma verdade destrutiva, uma versão destrutiva”. Mas aí numa outra viagem nós estávamos em Bangalore e no café da manhã, a guia de turismo pegou o telefone e disse: “Olha, conversei, Sai Baba está na cidade e pode receber o grupo brasileiro às 18:00 horas” foi um golpe dela, porque não existe isso “Sai Baba está esperando fulano, o convidado fulano” fomos ver Sai Baba, eu, portanto fiquei feliz com a experiência.
Eram mulheres de um lado, homens de outro, pouca gente porque isso é num passado mais distante. Na minha frente dois ocidentais ajoelharam quando viram Sai Baba, Sai Baba trazendo cartas na mão, passou pelo lado das mulheres, passou pelo lado dos homens e parou diante desses dois senhores, não sei de que país ocidental e eles fizeram esse gesto de juntar as mãos unidas formando uma concha pra receber alguma coisa. A mão de Sai Baba sobrevoou a mão deles e foi saindo uma cinza, eles então trouxeram a cinza, trouxeram a mão pra mais peto do peito, eu estava atrás e eu disse: “May I?”, quer dizer, “Dá licença.”, eu não sei se ele não sabe inglês ou se fui eu que falei errado e já fui direto na mão deles e provei. Eu fiquei com um ar de observador e quando voltamos para o hotel no ônibus, eu pedi cada um à vontade de falar sobre sua experiência na visita a Sai Baba. Eu comecei então da a minha opinião, por falta de habilidade, talvez arrogância, eu disse a eles: “Produzir cinza, essas coisas todas apodrecem, porque não modificam a minha forma de vencer as dificuldades do mundo.” Nós temos médiuns fantásticos no Brasil, mas eu não vejo relação entre produzir milagres com os efeitos paranormais e santidade, havia alguma coisa parecida com fanatismo, eu não gostei. Minha primeira opinião sobre Sai Baba diante de um fenômeno que eu tinha visto, eu não via Sai Baba como aventureiros fazem, eu comecei a criar uma distância.
Bom, numa outra viagem futura, segunda vez que fui a Sai baba e eu voltei com um presente... Eu recebi a visita de um médico uruguaio que era devoto de Sai Baba, ele falou muito sobre Sai Baba e eu fiquei então com vontade de conhecê-lo e Maria já tinha essa vontade maior. Aí conseguimos um grupo e foi o primeiro grupo brasileiro já de devotos de Sai Baba, porque eu tinha criado o primeiro centro, o núcleo de estudiosos de Sai Baba, de devotos de Sai Baba e tinha feito já... Espera aí como é que foi? É, fui com um grupo desejoso de conhecer Sai Baba, o primeiro grupo brasileiro, vamos dizer assim, de devotos de Sai Baba. E ele recebeu o grupo no dia seguinte, foi a primeira entrevista que Sai Baba deu para um grupo brasileiro, em 84... eu não me lembro. Eu era o líder do grupo, fiquei na porta fazendo o grupo entrar e Sai Baba veio e ficou na minha, tinha entrado na sala, mas parou na minha frente. A minha mulher tinha feito um traje sei lá, um paramento lá da cabeça dela, a Maria e tinha um veuzinho com uma esfinge com o rosto de Sai Baba. Sai Baba, quando ia passar por mim, parou e apontou. Isso aí me encantou muito mais do que produzir qualquer coisa, fazer qualquer milagre. Ele olhou com uma expressão de criança feliz. Um homem com um poder paranormal ilimitado aparece aqui agora com uma demonstração tão bonita da infância, ele sentou, pegou um lenço dele e eu disse: “O que é isto?” Ele mesmo respondeu: “É feito de quê?” “De fibras” então ele disse: “Assim é a mente humana, a mente é como um lenço, a matéria é como um lenço, o lenço é a mente, se eu tirar uma fibra depois da outra e jogar fora e no final que peguei a última, o que fica? O lenço desapareceu.” Então a forma do lenço não é o essencial, é o mais superficial, e ele disse: “Assim é a mente, assim você constrói a mente, só os seus desejos diversos, desapegue-se de cada desejo, quando você chegar ao último, a mente sumiu e você está diante da realidade, que é Deus.” Nessa hora ele produziu Vibhutis também, principalmente para o grupo das mulheres.
P/1 – Vibhuti é...
R – Vibhuti é a cinza.
P/1 – E ele produzia com o dedo?
R – Com o dedo, ele materializa, o Sai Baba... Os devotos antigos que estão lá são anéis, braceletes isso e aquilo, presente de Sai Baba e algumas mulheres riquíssimas com diamante, ouro e etc.
P/1 – Ele produz...
R – Ele produz tudo isso, ele restitui a vida de quem morreu pra alcançar a ressurreição. Se eu for contar a história de Sai baba... Quer que eu conte?
P/1 – Não, não precisa. Eu queria a sua história com ele?
R – A minha história é essa, mas ainda não acabou até hoje.
R – Ele produziu isso e deu pras mulheres nesse momento?
R – Deu só pras mulheres. Umas mulheres pegaram botaram na testa, outras lamberam não sei. Voltamos outros anos e ele nos recebia com muita amabilidade, ele gostava de mim. Passaram-se os anos. Um dia ele produziu um japamala, japamala é aquele colar que os indus usam, né? Ele fez um com matéria branca ou transparente, se levantou e botou no pescoço de minha mulher. Ah, nessa primeira viagem também a Gisa, uma moça que era nossa companheira de viagem, que viajou conosco primeiro em algumas cidades da Índia e depois fomos para o Acheron, que é a residência de Sai Baba com seus devotos, seus discípulos. Na nossa reunião, ele olhou pra Gisa e falou: “Você está sofrendo muito da vista, está vendo muito pouco, vamos dar um jeito nisso” mais ou menos assim. Fez o gesto a mão, aí nos trouxe pra mostrar uma pedra de formato ovóide e deu pra Gisa, e disse: “Toda noite põe dentro de um copo e no dia seguinte beba o copo d’água.” Está quase curada. Uma vista estava cega. A outra está curada e a cega melhorou.
Tem uma história muito interessante numa reunião... Nós íamos fazer uma viagem e iria conosco uma senhora de São Paulo, era uma família rica, eles eram comerciantes e ela muito solícita, muito boa senhora, disposta a ajudar em tudo, mas ela é do tipo que gosta de se arrumar, de se produzir, uma senhora de 70 anos. Quando apareceu no aeroporto com um grupo, ela vinha com um sapato muito bonito, uma boina, parecia uma mulher francesa nas ruas de Paris há alguns séculos, eu dizia: “Como é que uma criatura... Que interesse pode ter em Sai Baba?” Eu não disse nada a ela. Mas como eu comentei comentários desagradáveis. Que Deus me perdoe que eu nunca mais farei. E comecei a minha mente, aliás, a mente de todo mundo pensava o que seria da Geni. Na viagem ela brigou com outra pessoa do grupo umas quatro vezes. E toda vez que Sai Baba chegava perto da Geni, olhava assim pensava e continuava adiante e ela insistindo, insistindo. Teve até um indiano que sentou perto dela, algumas vezes que até chorou com pena dela, no dia que ele recebeu nossa linha de entrevista, eu disse pra ela: “Cadê a sua carta?” no primeiro contato “Cadê a sua carta”? Ela fez um movimento e começou a cair o japamala, era uma mala linda de cristal e tombando assim, eu saltei dessa altura e foi lá e colocou. Quer dizer, aquela criatura que foi vitima dos meus comentários desagradáveis, estava sendo atendida por ele e isso ele nos ensina que nunca, nunca perca tempo procurando conhecer os defeitos das pessoas, mas conheça as partes melhores das pessoas. Dessa maneira você pode ajudar o mundo a se formar, olhe o que há de melhor, fale o que há de melhor, faça desejo o que há de melhor, ame tudo, amar é tudo.
Nesse ano de, vamos dizer 91, a minha mulher passou a ter um comportamento um pouco estranho em relação ao comportamento anterior, o que me fez padecer. Era um padecimento que eu devia enfrentar, eu disse pra ela: “Maria, nunca mais eu volto à Índia, porque Sai Baba, já numa vez anterior, ele virava as costas pra mim quando me via.” Porque eu não tinha o que fazer lá, trabalhar com Sai Baba lá, aqui não, não quero mais voltar e ela insistiu e eu voltei. No dia que nós chegamos a Bangalore, ela virou pra mim e disse: “Hermógenes, vamos ver Daniel, acompanhar o Daniel, que vai fazer uma visita, eu acho que pra ver se Sai Baba está aí, pra fazer o programa de amanhã lá.” Eu disse: “Maria, nós chegamos cansados da viagem e já vamos fazer essa coisa a mais, fique tranquila, suas malas estão fechadas.” Ela insistiu, insistiu e fomos, Bangalore tinha um lugar que chama Ashram, que estava fechado, porque Sai Baba não estava lá.
Estava numa estrada andando a pé, ela na minha frente, fomos almoçar e ela não almoçou nada, tinha muita pimenta, eu comi alguma coisa e ela ficou sem almoço. Então eu vi que do outro lado da estrada tinha uma tendinha vendendo bananas, eu digo: “Vou comprar almoço pra ela”. Então fui andando pra lá pra atravessar o asfalto, quando eu cheguei perto dele, as pessoas que estavam perto fizeram um gesto um espanto, mas não era comigo, era com as pessoas que estava passando atrás de mim. De repente eu olhei e também fiquei interessado de ver um corpo feminino deitado no asfalto. Aí eu pensei: “Será uma companheira de viagem, uma brasileira, coitada” fui ver quem era. Quando fui terminar a travessia, voltando, ouvi um grito: “Professor, é Maria” era minha esposa, naqueles poucos segundos que eu quis atravessar, ela foi apanhada por um caminhão, foi atirada pra cima e caiu de cabeça no asfalto. Resumindo, foram 18 dias no hospital foi uma experiência riquíssima, eu enviei o pensamento em Deus sem pedir, hoje a fórmula que eu tenho passado e tem feito muito bem as pessoas é: “Entrego o problema ou eu mesmo me entrego, confio, aceito e agradeço”. Tá resumido aí como eu esperei 18 dias no hospital onde duas pessoas falavam... Uma pessoa ou outra estava fora de si, que era ela, quem falava português era somente eu, mas que hospital bem organizado, que atendimento amoroso. Viajamos ao Brasil, ela ainda grogue. E quando eu cheguei ao Rio parecia que era um cadáver empurrando um carro de doente, eu estava bem arrasado.
P/1 – E ela estava...
R – Apagada, mas foram dez anos, depois caiu no Alzheimer, dez anos sem se comunicar corretamente, era Alzheimer.
P/1 – Professor, eu não entendi, o acidente levou ao Alzheimer ou ela estava se comportando já...
R – O Alzheimer deve ter se manifestado quem sabe antes, mas não era tão acentuado ao ponto da gente perceber, e com o acidente deu pra perceber, mas ela adquiriu Alzheimer.
P/1 – Mas em termos de movimento, ela...
R – Depois disso, ela se movimentou pouquinho, mas a resposta, o pensamento lógico, ela não enviava, morreu no hospital, no Hospital Central do Exército e se libertou e eu lá pedindo cura, pedindo a Deus que tomasse conta. A relação com Deus é muito importante, é indispensável. Você está aqui pra isso, eu estou existindo pra isso, vou aproveitar o privilégio de ter o corpo físico como instrumento, trabalhar para conservá-lo bem e utilizar pessoalmente de maneira positiva, Sai Baba diz que a mente é como uma chave na fechadura: para o lado fecha, para o outro abre.
P/1 – E daí, nessa volta, ela ficou aqui e o senhor continuou o seu trabalho? Como é que foi que o senhor continuou a vida?
R - A minha vida é essa, eu cheguei à conclusão que aos 88 anos que é o que eu tenho, não me cabe mais produzir livros, quem sabe? Eu não sei, mas me parece que eu já cumpri essa missão da proposta dos livros e me parece que eu tenho que usar o meu tempo para fazer o que eu estou fazendo agora. E agradeço a vocês, divulgar isso para o público, porque qual a pessoa com as pernas esmagadas por um ônibus lê um livro chamado Canção Universal, uma professora aqui de São Paulo me escreveu que isso aconteceu com ela, ela hoje é professora de yoga, prestando serviço.
P/1 – Eu estou feliz. Mais alguma coisa?
R – Você quer que eu conte a história do livro, né?
P/1 – Quero. Desse último livro, esse foi seu último livro, O Presente, é uma história bonita?
R – A história dele, eu acho bonita, o Hermógenes acha, vamos dizer assim. Outubro, talvez ou setembro, a televisão cheia de anúncios para o Natal, aparece um cidadão para o anúncio e fala: “Natal sem peru Sadia não é Natal” eu fiquei escandalizado, eu digo: “Quanta ignorância em relação aquele quase adolescente da Palestina que sofreu tanto por nós” e comparar com peru Sadia? Eu fiquei engasgado, eu falei: “Não, eu vou escrever um livro numa tentativa de falar de Cristo aos que se dizem cristãos.” E comecei a escrever, comecei a escrever perguntando por que a festa de 25 de dezembro? É uma festa natalina, é uma festa de criança ou não é? O aniversário de uma criança, para um aniversário de uma criança o que eu preciso dar de presente? E a minha resposta é egoísta: eu mesmo, eu tenho que me dar como presente. Mas para dar um presente tem que ser bem embrulhado, e como é que eu vou embrulhar esse presente que sou eu, aí veio uma resposta: cumpra com as recomendações evangélicas para as quais ele veio. Ame a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, dê a outra face, ih, essa é dificílima, perdoe quem falou mal de você, quem botou você na justiça, perdoe. Perdoar... mas Jesus tem cada uma. Aí comecei a me desanimar, eu digo: “Eu estou muito em falta, eu estou sendo um hipócrita ensinando o que deve ser feito sem ter feito, ensinando o que a pessoa deve acreditar” e eu ainda às vezes não acredito, eu sou um hipócrita, podia ser um ignorante, a culpa do ignorante é pequena, mas eu sou um estudioso. É uma culpa grande. Aí parei de escrever, eu digo: “Eu não quero ser hipócrita” deixei pra lá, eu acho que passou um mês ou dois, eu abandonei o livro, pra mim ele morreu, eu não vou escrever repetindo erros da hipocrisia da qual Jesus tanto condena. E tratei de fazer outras coisas. Um dia me veio outra intuição: o homem que perdeu a ovelha, que a ovelha ficou perdida no deserto, ele saiu pra procurar e deixou 99, veja bem o que faz o Sai Baba, tirando a ideia de culpa, nos preparando para produzir, mas perdoando quando a gente busca compreensão, busca a graça de ser compreendido. Eu digo: “Também, se não continuar esse livro, eu estou em falta” porque eu fiquei irritado de ver aquela propaganda, me comprometer em fazer alguma coisa e não faço? Então isso em mim gerou um conflito, parar e continuar, parado ou avançar, sabendo que seria perdoado. E aí eu disse: “Mas a minha dificuldade é não compreender o Evangelho”, aí eu não sei como aconteceu, quando aconteceu, com quem aconteceu, eu sei que eu me vi diante de uma autoridade conhecedora da verdade khristica, eu me senti com coragem de perguntar, tiras as minhas velhas dúvidas desde a infância, o lado de quem lê o Evangelho com inteligência, quem lê o Evangelho com interesse de aplicar o que está sendo dito ali em proveito próprio. Então foi um diálogo entre eu ignorante, com problemas e quem sabe a própria verdade, quem sabe Sai Baba respondeu, quem sabe foi Cristo que respondeu, quem sabe foi um trans Hermógenes que respondeu alguma coisa, porque todos nós somos essencialmente divinos. Aí produzi o livro O Que é o Presente. A história não é interessante?
P/1 – É linda.
R – Me emociona. Dê um passo para mim que eu dou 100 na sua direção, diz Sai Baba pra mostrar a predisposição de Deus para nos perdoar, para nos receber.
P/1 – Eu quero uma última pergunta, posso?
R – Pode.
P/1 – O que o senhor acha que foram as coisas mais importantes que o senhor está tirando de tudo isso? Dessa trajetória?
R – O mais importante?
P/1 – Ou o que está tirando, eu nem sei se é o mais importante, mas tem uma forma de olhar toda essa vida e dizer: “ta, eu aprendi, ou como eu conto isso pro outro”?
R – Eu aprendi que já fui mais bonito que sou tanto quanto sou mais idoso do que era. Tenho aprendido valores da liberdade, amar a liberdade, tenho aprendido, tenho praticado e aprendido a humildação, tenho aprendido viver num tipo de oração que eu acho que é a mais válida. Quanto à oração, eu parei de certas orações, não quero falar das outras que fazem normalmente pra não desanimar ninguém, eu só digo: “Peça menos a Deus e faça mais” procure tornar Deus mais feliz com você, não procure tanto a sua felicidade, procure a felicidade de Deus e que você se reservou pra isso. Não importa a religião que você frequente e sim aquela que você vive, e por aí vai.
P/1 – Ta bom. Obrigada, muito obrigada.
R – Eu que agradeço.
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