IDENTIFICAÇÃO Sou Luis Gustavo Rodriguez, nascido em Campinas e tenho 25 anos. FAMÍLIA Meu pai é Guillermo Doroteo Rodriguez Perez e minha mãe é Maria Helena Pedroti Rodriguez. Meu pai é do Uruguai e minha mãe é gaúcha. Eu e meus irmãos nascemos no Brasil. Minha mãe trabalha com estética, beleza e meu pai sempre foi comerciante. Trabalhamos há anos com molduras para quadros, espelhos. Tenho poucas lembranças dos meus avós. Minha avó morava no Uruguai e eu era muito criança quando ia para lá. Tenho uma irmã e um irmão mais novos; meu irmão trabalha comigo e minha irmã trabalha no Banespa. Eu nasci aqui em Campinas. Sempre morei na Ponte Preta, ao lado do campo. INFÂNCIA Tive uma boa infância no bairro, jogando bets e andando de carrinho de rolimã, porque lá tem muita descida. Eu tinha muitos amigos. No bairro havia várias turmas: a da rua de cima, que era a turma do bets; a do meio, que era a turma do vôlei, que montava uma rede; e lá embaixo tinha um campinho em que jogávamos bola no final de semana. Minha infância foi bastante esportiva. Havia rixa entre essas turmas, mas eu era amigo das três, sempre conseguia andar com todos; conheço todo mundo até hoje. Estudei na escola do bairro, a Dom Barreto que é uma escola estadual. Na realidade, eu não escolhi a minha profissão; foi por necessidade que eu comecei a trabalhar e estou até hoje. Agora meu pai ficou doente, tive que assumir a loja e estamos levando, mas eu gostaria de trabalhar em outra área. Meu pai foi trabalhar com aquilo... Eu acho que quando você é criança, você sente vontade de ser igual ao pai, mas depois você vai vendo como é o mundo e vai mudando de idéia. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Comecei a trabalhar na loja do meu pai com uns 13, 14 anos. No início, eu não fazia praticamente nada, era muito moleque, mas ajudava meu pai lá na frente. Eu ficava na loja com ele. Quando fui pegando mais idade, fui para a oficina aprender...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Sou Luis Gustavo Rodriguez, nascido em Campinas e tenho 25 anos. FAMÍLIA Meu pai é Guillermo Doroteo Rodriguez Perez e minha mãe é Maria Helena Pedroti Rodriguez. Meu pai é do Uruguai e minha mãe é gaúcha. Eu e meus irmãos nascemos no Brasil. Minha mãe trabalha com estética, beleza e meu pai sempre foi comerciante. Trabalhamos há anos com molduras para quadros, espelhos. Tenho poucas lembranças dos meus avós. Minha avó morava no Uruguai e eu era muito criança quando ia para lá. Tenho uma irmã e um irmão mais novos; meu irmão trabalha comigo e minha irmã trabalha no Banespa. Eu nasci aqui em Campinas. Sempre morei na Ponte Preta, ao lado do campo. INFÂNCIA Tive uma boa infância no bairro, jogando bets e andando de carrinho de rolimã, porque lá tem muita descida. Eu tinha muitos amigos. No bairro havia várias turmas: a da rua de cima, que era a turma do bets; a do meio, que era a turma do vôlei, que montava uma rede; e lá embaixo tinha um campinho em que jogávamos bola no final de semana. Minha infância foi bastante esportiva. Havia rixa entre essas turmas, mas eu era amigo das três, sempre conseguia andar com todos; conheço todo mundo até hoje. Estudei na escola do bairro, a Dom Barreto que é uma escola estadual. Na realidade, eu não escolhi a minha profissão; foi por necessidade que eu comecei a trabalhar e estou até hoje. Agora meu pai ficou doente, tive que assumir a loja e estamos levando, mas eu gostaria de trabalhar em outra área. Meu pai foi trabalhar com aquilo... Eu acho que quando você é criança, você sente vontade de ser igual ao pai, mas depois você vai vendo como é o mundo e vai mudando de idéia. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Comecei a trabalhar na loja do meu pai com uns 13, 14 anos. No início, eu não fazia praticamente nada, era muito moleque, mas ajudava meu pai lá na frente. Eu ficava na loja com ele. Quando fui pegando mais idade, fui para a oficina aprender a confeccionar quadros e tal. No final, eu voltei lá pra frente, pra administração. O nome da loja é Casa Nacional. Na realidade, não foi fundada pelo meu pai, foi fundada pelo meu tio-avô que também é uruguaio. A loja foi fundada há 57 anos, em 1952. Ele veio do Uruguai tentar a vida aqui e se deu muito bem. Naquela época, esse tipo de ramo dava bastante dinheiro porque não tinha ninguém que trabalhava com isso. Meu pai, no inicio, não trabalhou na loja. Ele quando veio para o Brasil começou a trabalhar como vendedor. Ele vendia embalagem pra marmita em restaurante, tinha uma representação. Depois de um tempo, ele passou a ser sócio do tio dele, que é meu tio-avô, e ficou até hoje. Eu trabalho na loja há uns 13 anos. COMÉRCIO DE CAMPINAS Havia a Farmácia João Mers; farmácia escrito com “ph”, ainda. Deve ser uma farmácia muito antiga. A casa dele era em cima e embaixo a farmácia. Eles me contam que bastante gente ia lá beber água ali porque havia uma fonte, uma pia, a bica do Largo do Pará; uma praça que tem ali perto. Só que o Condepacc [Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas], a instituição que cuida do patrimônio histórico de Campinas, pegou essa pia pra fazer uma reforma e nunca mais trouxe de volta. Nós parávamos na loja pra tomar água. Em Campinas, basicamente, é o comércio que dá renda pra população, eu acho. E Campinas tem um dos maiores PIBs [Produto interno Bruto] do Brasil, gera muito dinheiro. O comércio do centro da cidade é bastante importante para o povo de Campinas. CIDADES / CAMPINAS/ SP Campinas, na época da minha infância, era bem mais sossegada. À noite era bem mais sossegada. Havia mais dinheiro também; eu lembro que na minha infância tínhamos mais condições, pra mim era bem melhor. COMÉRCIO DE CAMPINAS O ramo de venda de molduras caiu bastante, o mercado fiou saturado, tem muita coisa. Eu estou tentando implantar uma vidraçaria junto à casa de molduras, que é praticamente o mesmo ramo. Mas é meio difícil, a mão de obra é ruim nessa área, é difícil achar mão de obra qualificada. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL No inicio, o trabalho era curtição. No início era pegar o martelo e querer fazer coisas em madeira. Depois acabei tendo que trabalhar. Fui ficando maior e o meu pai foi me colocando na linha. Mas meu pai não era duro comigo. Teve uma época que eu queria fazer violão clássico. Violão clássico você tem que estar o tempo inteiro tocando pra conseguir tirar uma música. Sentava em frente da loja e começava a tocar onde atendia os clientes. Chegava o cliente, parava de tocar. Às vezes, o cliente falava: “Não para, continua que está legal.” Agora eu parei; tive que trabalhar e deixar o violão de lado. Mas meu pai nunca foi rígido, sempre foi liberal, não me fazia trabalhar o dia inteiro, ele achava que eu tinha que ter uma parte do dia pra mim, pra eu brincar, sair, curtir. Eu andei muito de patins, bicicleta. Ele liberava pra fazer esses negócios, dava corda pra mim (risos). A relação com meu pai dentro e fora da loja sempre foi tranqüila. Nós jogamos muita bola. Eu nunca gostei de futebol, mas sempre o acompanhei. Ele jogava no Taquaral e todo dia ele curtia jogar bola. Acordava de madrugada pra jogar bola. Eu sempre o acompanhava e curtia. Depois de crescido perdi um pouco a vontade. Lembro que até os 18 anos eu ia sempre ao futebol com ele. Nunca gostei de futebol e não gosto até hoje. Sou corintiano porque você tem que torcer por um time... MODERNIZAÇÃO Antigamente, se fazia muito estoque de moldura. Hoje não se trabalha com estoque. Como há muitos modelos, os clientes escolhem e nós compramos só o que precisamos. Na época do meu tio-avô, as molduras vinham prontas. Inclusive temos uma serra que ele importou da Alemanha, mas era pra fazer pequenos cortes; uma serra pra cortar moldura. Mas, antigamente, as molduras vinham prontas. Havia alguns tamanhos padrões. Agora acabou. Se você chegasse lá com um pedaço de papel que você desenhou, não tinha como emoldurar, tinha que fazer uma gambiarrazinha, não dava pra diminuir a moldura, eram de tamanhos padrão. Hoje já se faz de qualquer tamanho e formato. FAMÍLIA Sempre tive aquelas rixas com os irmãos mais novos. Eu sou o mais velho e meus dois irmãos ficavam juntos. Eu nunca fiquei muito em casa. Eu sempre fiquei na rua, sempre estava fazendo alguma coisa, nunca fui de ficar muito parado em casa. Agora estou mais velho, mais sossegado, fico mais um pouco. Antigamente, a casa era um hotel: comia, dormia e saía. Minha mãe até reclamava disso e reclama até hoje. CASA NACIONAL O meu pai começou a trabalhar com meu tio-avô. Acho que ele se aposentou e acabou passando pra ele a sociedade. Fizeram uma sociedade... Não sei como, isso não me contaram, mas ele meio que se aposentou; o Seu Perez se aposentou e meu pai assumiu a loja. Já vinha há bastante tempo trabalhando com ele lá. O que mais se emoldura hoje são certificados. Os jovens encomendam bastante dos cursos de cabeleireiro, de faculdade. Fotos também. Temos porta-retratos em promoção e as pessoas compram bastante. Já as pessoas mais maduras levam pinturas, cópias de pinturas famosa e tal. Idoso põe mais foto de netinho, foto dos filhos, eles partem mais pra esse lado. Há uns anos atrás existia um tipo de quadro que o pessoal mandava emoldurar que era uma composição de fotos. Era assim: a criança rindo, a criança meio tristinha, a criança no meio olhando para o outro lado. Isso é bem antigo, não é da minha época. Os idosos fazem mais quadros que remetem à memória. Eu acho que eles sentem mais necessidade de guardar as pessoas que eles amam na memória, ainda que seja em fotos. FUNCIONÁRIOS Quando a loja começou, meu tio-avô tinha só um funcionário. Com o passar dos anos, seis moldureiros chegaram a trabalhar na oficina. Hoje eu tenho um moldureiro contratado e meu irmão trabalha na oficina também. Eu fico na frente da loja. O negócio depende do seu fluxo. Depende de quantos quadros são encomendados, mas dois funcionários dão conta de muitos quadros. RESTAURO Meu irmão restaura fotos antigas, deterioradas pelo tempo, no computador. A pessoa leva um disco pra ele, ele arruma e imprime em papel bom. Ele entende bem disso. Ele faz o quadro, faz tudo. Estamos tentando partir pra esse ramo também, de restauração. É muito difícil de achar aqui em Campinas quem restaure. Quem restaura cobra muito caro. O meu irmão gostou e achou uma facilidade enorme. Ele gostou do Photoshop. TECNOLOGIA Tem alguma tecnologia pra fazer molduras hoje. É uma mesma serra só que você não precisa mais ficar serrando, ela corta no ângulo certinho, dá um acabamento melhor. Isso mudou um pouco. Há também a grampeadeira, o equipamento que grampeia moldura, que não havia antes. Antigamente, era no preguinho. A pessoa tinha que saber bastante pra pregar certinho. Eu peguei essa época, consegui aprender, mas agora nem me lembro mais porque faz muito tempo. Agora, você põe a moldura dentro do negócio, aperta e o canto sai pronto. Nesse caso, a tecnologia ajudou bastante. FATO MARCANTE Uma vez, uma cliente levou uma foto de um filho dela que havia falecido num acidente, no Natal. E um outro parente dela fez uma montagem com fotos e tal. Quando ela foi buscar, ela viu na moldura e ficou muito emocionada. Até chorou. VIDRAÇARIA A vidraçaria faz um serviço mais doméstico, janela de casa, tampo de mesa, espelho. A mão de obra especializada é difícil porque quem faz isso, faz porque precisa e faz sem vontade. A moldura precisa ter muito acabamento. Com vidro é preciso trabalhar com muita atenção porque é muito perigoso e tem a perda. Perde-se muito vidro. Se for um cara que não sabe mexer, ele perde muito dinheiro. MOLDURAS Eu acho que no futuro as molduras vão acabar sendo prontas, uma coisa mais padrão. Vai voltar a ser padrão. Tem bastantes lojas que fazem isso, um tamanho padrão. Fazem um monte de molduras iguais e vendem assim. É uma fábrica. Acho que artesanal artesanal, igual ao nosso, vai ficar escasso. Hoje só tem duas lojas de moldura na cidade. TRADIÇÃO O pessoal vem aqui pela tradição do lugar. Muita gente vem de longe e gosta de fazer moldura conosco. Acho que é pela qualidade também. COMÉRCIO DE CAMPINAS Eu acho que o comércio de Campinas cresceu bastante. O centro de Campinas cresceu, foi expandindo da Rua Treze de Maio lá pra cima. O ramo comercial que mais cresceu em Campinas acho que foi a lojinha de Um e 99. Até nós tentamos, porque tem moldura lá em porta retrato, e vende a um e 99. Eu estou tentando fazer isso, mas estou tentando com as sobras, o que eu não vou mais usar. Esse comércio cresceu bastante e chegou a atrapalhar. Camelô também. O que mais cresceu em Campinas foi isso. IMIGRAÇÃO Eu acho que algum amigo do meu tio-avô falou que esta cidade era boa pra comércio. Acho que desde aquela época, ela era boa para o comércio. E ele veio já pronto pra montar uma loja mesmo. Ele não começou devagar não. Ele veio e já tinha alguma coisa por lá, já tinha uns 30 anos de idade. Meu pai começou a trabalhar com ele quando tinha uns 27, 30 anos, logo quando ele veio para o Brasil. O meu tio-avô nunca foi dono só dessa loja. Ele sempre teve várias representações, vendia vinho... Até hoje ele vende vinho, perfume, tem várias representações, não ficava só num ramo. Ele diz que tem que ter vários ramos, porque se um está ruim, vai pelo outro. Eu acho que é verdade. CLIENTES O carro-chefe da loja é a moldura. A vidraçaria ajuda bem, a margem de lucro é maior. Tem bastante cliente que compra só conosco. Meu tio, irmão do meu pai, também tem uma loja dessas. É mais nova, deve ter uns 13 anos. Ele também é uruguaio. Eu já fui entregar moldura praticamente na frente da loja dele, na Rua Barreto Leme, perto do Botafogo, da rodoviária, praticamente na frente. O cliente morava lá em frente e compra conosco. É uma senhora que compra há muitos anos. Mulher compra mais moldura do que homem. Mulher gasta mais também. Quer sempre aquela moldura, um espelho maior. Nem precisa de tanto espelho, mas quer aquele enorme. Mulher com certeza Acho que é mais vaidosa, quer colocar muito quadro na parede. As mulheres que compram mais são as mais maduras e não casadas. Elas viajam bastante, levam fotos de todo lugar do mundo, por onde elas passaram, viagem que elas fizeram com as amigas. Eu vejo isso há tempos. Tem homem que também que faz isso, mas mulher gasta mais. FORMAS DE PAGAMENTO Nós dividimos, não tem um crediário, mas ajuda. O cliente, às vezes, vai gastar muito dinheiro e nós dividimos em duas vezes, três vezes. Á vista damos um descontinho bom. MODERNIZAÇÃO A administração da loja é bem conservadora. Agora que eu e meu irmão entramos – faz um ano que estamos tocando – estamos tentando mudar, tentando aumentar. Queremos por computador. Mas meu pai não queria por nada. Era tudo papelzinho. Ele tinha uma resistência. O tio dele também é bem conservador, como as pessoas mais antigas. CASA NACIONAL O meu pai nunca foi atrás de saber o que os outros estavam fazendo. Sempre manteve o preço dele, a qualidade. Ele fala para não abaixar o preço porque perde, a pessoa fala: “Por que está baixando o preço? Então ele podia vender mais barato que o outro?” Para não perder esse negócio da loja. Então sempre mantivemos o nosso preço, o mesmo tipo de serviço. Nosso diferencial é entregar o material para o cliente sem cobrar nada, outros não fazem isso. Entregar e instalar, por exemplo, na parede. Tentamos nos diferenciar nesse ponto para poder continuar. Temos muita demanda de instalação de espelho. Tudo o que vendemos, instalamos porque essa é a nossa propaganda. Dividimos em três vezes, entregamos e instalamos. Agora estamos fazendo promoção de espelho. Porque sobra muito espelho, retalho, vidro. Fizemos um monte de porta retrato, de dez por quinze, a um e 99, pra tentar bater a casa de um e 99. E espelhinho também barato pra vender. Esse ramo tem muita sobra. Todo mês sobra muita coisa, muito pedaço de moldura que não usa e até aparecer um quadro que vai usar aquela moldura demora. Aí os retalhos vão para a promoção, pra fazer foto pequena, dez por 15. Nem colocamos placa ainda avisando que tem esse tipo de moldura. Espelho já acabou. Inclusive tem que esperar fazer mais retalho para fazer mais espelho. Porta retrato sai bastante também, está saindo bem. Vendemos sem placa, nem nada, sem anunciar; é só de a pessoa entrar e ver. Meu irmão e eu estamos fazendo uma revolução. Estamos jogando tudo que é velho fora. Meu pai e meu tio-avô não gostavam de jogar nada fora, guardavam muita coisa. Móveis antigos, uns negócios que estavam ocupando espaço. Estamos tentando inovar. Eu acho que o jeito do comércio deles era para ser aquilo e não passar daquilo. Faz 57 anos e está no mesmo espaço, inclusive. Nunca saiu daquele lugar. A casa é grande, mas esse meu tio-avô é envolvido com Lions Club, Rotary, esse tipo de coisa, e lá em cima eles faziam as reuniões deles, por isso que ele alugava aquilo lá. Mas a loja sempre foi aquele espacinho ali; nunca saiu daquilo, nunca mudou, nunca teve uma variação. Meu tio-avô até vendia bastante coisa quando abriu a loja; vendia uns badulaquezinhos e bibelôs e tem uns negócios guardados, umas estátuas. Ele vendia bastante coisa antigamente. Eu não peguei essa época. Meu pai é que deixou a loja mais monocultura, vamos dizer assim. Acho que foi por isso que caiu um pouco o movimento. Acho que deu uma mudada. FAMÍLIA Hoje está tudo muito diferente. Quem era cuidado passou a cuidar. Não é só a loja, mas meu pai também necessita de cuidados, ele tem uma doença bem grave; fica o dia inteiro na cama. E temos que conciliar, está muito difícil. Tem que dar um jeito da loja dar dinheiro. Porque ele tem que ter os remédios e nós temos que comer, também. Temos de viver, não podemos parar. Como todo mundo, tem uma hora que você tem que assumir essas responsabilidades e vencer. Meu pai sempre me ajudou bastante e me apoiou muito em tudo que eu quis fazer. Sou meio indeciso no que eu faço. Fiz muitos de cursos, parti pra um ramo, fui para outro. Sempre trabalhando com ele e ele sempre me financiando. Como fazer violão clássico. Já fiz violão, curti rock, fiz curso de mecânica de moto, comecei a fazer rappel, ecoturismo, fui mudando muito. Agora que não tem mais como mudar, vou viver assim, tendo que trabalhar mais. Nessa época do violão clássico, meu pai nunca falou nada; ele até gostava porque eu ficava ali na frente atendendo a loja e quando chegava cliente, parava de tocar e ajudava. Ele ficava curtindo também, porque violão clássico é gostoso. Não tocava tão bem, mas tocava alguma coisinha. Acho que servia de atrativo para a loja. Os idosos eram os que mais gostavam. Passavam, olhavam e falavam: “O que você está tocando?” Aí entravam, ouviam e curtiam um pouco. A cultura do meu pai me influenciou, com certeza. Curto muito som latino. “Hablo español”, um pouquinho também (risos). Já fui algumas vezes para o Uruguai. Agora não estamos tendo mais condição, mas nossa, curto muito. URUGUAI A cultura do povo lá é maior, as pessoas são mais cabeça aberta, culturalmente. Financeiramente é um país que está passando por bastante dificuldade, mas a cultura do povo lá é bacana, as pessoas são muito generosas. O meu pai está aqui há uns trinta, 35 anos. Deve ter sido difícil pra ele chegar aqui. Ele tinha o tio, que deu uma força, mas como todo estrangeiro acho que ele teve uma grande dificuldade.. DESAFIOS A responsabilidade da loja, o que acontece lá dentro, pegar um produto, transformar em outro e ter que agradar o cliente. Tudo isso é difícil. Tem de ser um negócio perfeito pra ser o que o cliente quer. Acho que isso é uma grande dificuldade, essa responsabilidade de ter que estar à frente da loja e responder por todos os problemas que acontecem. Porque não é todo mundo que é gente boa e fala: “Não é nada, isso aqui nem dá para ver.” Tem gente que é mais perfeccionista. Lógico, está pagando, tem o direito. O pessoal quer um negócio perfeito, às vezes, pelo apego a uma foto, ou um sapatinho que ela quer colocar no quadro, sapatinho de bebê que põe numa moldura e o sapatinho fica lá dentro. Ou uma flor, que vai desmanchar em pouco tempo, ela põe em um quadrinho. É bem louco mexer com a emoção das pessoas, mas não dá pra saber a reação. Porque ali ela tenta não esboçar reação, acho, por estar na frente de pessoas que não conhece. Na casa dela deve ser outra coisa. Aparece também camisa de futebol, um monte de coisas, lembranças da Bahia, essas coisas maiores. Colocar roupinha dentro do quadro é difícil. Por exemplo, a roupa da primeira comunhão da menininha, um vestidinho, se tem um botão mais alto quebra o vidro. Mas se dá um jeito, tem que fazer do jeito que o cliente quer. VIDRO O ramo do vidro eu não conhecia antigamente. Acho que continua bem parecido. Com quem eu converso, com outras pessoas que trabalham com isso, é praticamente a mesma coisa. Hoje há janelas mais modernas, de alumínio. É diferente a maneira de trocar o vidro, mas, basicamente, em casa, essas janelas de ferro são a mesma coisa há muitos anos. SEGREDOS DO COMÉRCIO Agradar o cliente. Fazer o máximo para o cliente sair de lá sempre feliz. Acho que é o jeito que eu aprendi com meu pai e ele deve ter aprendido com o tio dele. Acho que isso acaba acarretando a fidelidade do cliente. E trabalhar em família acho que é legal, aumenta o relacionamento. FAMÍLIA Discuto com o meu irmão, às vezes. Meu pai sempre foi sossegado, sempre conversei muito com ele. Nos víamos na loja e em casa. CIDADES / CAMPINAS / SP Hoje tem que tomar cuidado aonde você vai, com quem que você se mete porque a violência está muito banal. Tem que ficar meio esperto nesse sentido. Está perigoso. Há benefícios também. Campinas tem bastante faculdades, é também o maior PIB nacional, cresceram o comércio e as facilidades. É uma cidade grande com um projeto de cidade pequena. Uma cidade meio bagunçada, meio sem projeto. Trânsito tenho bastante a reclamar. SHOPPING CENTER Pra nós não tem muito problema. As casas de moldura que foram montadas no shopping não agüentaram muito. É difícil manter. No shopping é 16 mil reais o aluguel. Pra pagar isso numa loja de moldura o cara tem que ser moldureiro mesmo, tem que dominar o negócio. A moldura não dá tanto dinheiro assim. Sustenta o básico da nossa família. Não somos pessoas que conseguem guardar dinheiro, por exemplo. Eu tenho vontade de ir para o shopping, acho que conseguiria evoluir, mas teria que ser uma excelência no mercado. Ser único, reconhecido por vender bastante. Tem que vender muita coisa, ter um fluxo grande. Eu tenho vontade, se eu continuar nesse ramo. Mas loja está passando por um momento de dificuldade, ela está quase acabando porque o sócio, que é o meu tio-avô, está bem velhinho, ele está com mais de 80 anos e meu pai está ruim. Não estamos conseguindo negociar essa parte dele pra poder ter a loja nossa. A parte do meu pai tudo bem, é nossa, mas a parte dele tem a família, a filha. RECONHECIMENTO O cidadão de Campinas reconhece a loja. De vez em quando conhecemos alguém que pergunta: “Onde você trabalha?” “Ah, eu tenho uma loja...” “Pôxa, sua loja? Aquela? Oh meu, vou comprar lá. Minha mãe fez uma foto lá, meu tio comprou não sei o quê.” Eu escuto bastante isso. Falam: “Aquela loja de moldura perto do Correio, eu conheço.” Todo mundo conhece e reconhece. Também, está há muito tempo ali. LIÇÕES DO COMÉRCIO Uma lição de vida é que não importa a sua situação você tem que ir atrás de trampo, não atrás de roubar, essas coisas. Tive bastante amigo que fez isso. Principalmente, no bairro tinha bastante. Fui amigo, mas nunca fiz. Pra mim o cara tem que ser honesto em qualquer coisa que for fazer na vida. Se tiver honestidade é mais fácil. PRODUTOS Moldura praticamente vem toda de Santa Catarina. Vidro tem bastante coisa importada. A China está entrando com muita coisa. Você tem que ficar meio esperto na hora de comprar. E se eu não me engano, vidro é também de Santa Catarina. Moldura nós pegamos um distribuidor montado aqui. Está tendo dificuldade de ter barra grande por causa do controle da madeira. Loja de moldura está tendo esse problema também. Trabalhamos com alumínio também. O alumínio é usado mais para espelho de banheiro. Para certificado usa também, o pessoal gosta de fazer “sanduíche de vidro”, com dois vidros e fica uma margem transparente em volta. MEMÓRIAS DO COMÉRCIO DE CAMPINAS Acho muito bom o Sesc investir num projeto de memória. O Sesc sempre esteve ajudando o comércio. Quem é comerciante tem vários benefícios aqui com eles. Acho que mesmo o que já passou é bom guardar.
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