Morávamos em uma chácara em São Bernardo do Campo, na qual os costumes ainda eram rudimentares: fogão a lenha, água de poço com carretilha e uma enorme plantação de verduras e frutas. Os padeiros entregavam os pães com carroças, eram as “bengalas” ou o “filão” de pão. Estes deixavam os pães sobre os batentes das janelas, logo ao amanhecer.
Logo que acordávamos, combinava com meus irmãos menores de observar os pássaros que pousavam ali e alimentavam-se do miolo do pão. Crianças com ideias na cabeça a fazer peraltices como, em vez dos pássaros, porque não vamos comer os miolos dos pães? Lembro-me de que nos dias da semana seguinte, levantávamos cedo e, antes dos pássaros, íamos comer todos os miolos dos pães da casa vizinha. Só havia uma cerca de madeira como obstáculo. Observamos a mulher brava, quando se levantava lá pelas nove ou dez horas da manhã, muito brava com os pássaros e nós, escondidos, ríamos muito. Criamos uma história muito interessante sobre nossos medos e as lendas que aprendíamos sobre sacis, mula-sem-cabeça, etc.
Foi mais ou menos assim: havia bananeiras no terreno do fundo da casa, eu e meus irmãos costumávamos brincar lá. Meu irmão fez o desenho do saci na bananeira, colocou um pano preto, furou os dois olhos na bananeira e colocou dois pedaços de pano branco no olho. Ficamos muito assustados e, à medida que anoitecia, o brinquedo foi ficando cada vez mais pavoroso, quando foi colocada à noitinha a toca vermelha na figura. Lá pelas oito horas da noite, ficamos com tanto medo na escuridão diante daquela figura, meu irmão cutucava o outro para desfazê-la, mas o medo e o temor eram tão grandes que mal conseguíamos retirar a toca para amenizar tamanho pavor. Susto maior quando minha mãe nos chamou, nos dando a impressão de vir de longe ou daquela figura horrenda. Foi muito divertido, infância que fazíamos colares de flores e comíamos os melhores pêssegos.