*Nota de Solidariedade*
Nos solidarizamos com os devidos acontecimentos das últimas semanas no Estado, com as condições climáticas tão severas e a devastação acontecida.
Reconhecemos o quão difícil tem sido lidar com o medo, contabilizar as perdas e pensar no recomeço.
Da autora, que vos escreve, conhecendo as regiões, de Norte a Sul, Leste e Oeste, deste nosso Rio Grande do Sul, tendo nascido em Guaíba, vivido uma parte nela, mas também em Eldorado do Sul, Santa Maria, Santa Rosa e outras cidades, havendo retornado a Porto Alegre, tendo familiares e amigos nesses lugares completamente atingidos pelas enchentes, meu coração está desolado.
A preocupação com as cidades de Pelotas, São José do Norte e RIO GRANDE, com a tarefa de receber esse volume de água, tão grande e enviar ao Oceano.
Fica aqui, nesta nota, nosso profundo respeito a todos os afetados, a tristeza pelas mais de 345 cidades acometidas e as vidas levadas.
Mas também, junto com o povo gaúcho, a esperança da reconstrução.
Neste momento, somos todos \"Pescadores\", fazendo parte deste Rio Grande imenso, com tantas \"Histórias\" para registrar.
Rio Grande, 17 de Maio de 2024.
Abrigo Atípico Fábrica De Cordas/ Fábrica De Sonhos
Proprietários: Zéh Catalunha e Rafael Albernaz Lopes
Coordenadora Cibele Rocha - Coordenadoria Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência e Altas Habilidades.
22h as luzes se apagaram. A agitação foi perdendo força até o silêncio tomar conta do ambiente.
A escala da ronda noturna nos foi passada, intercalando de 2h em 2h, com a mudança de posição dos trios.
O grupo dessa madrugada foi recebido por um dos Coordenadores, Gabriel, que apesar de não dormir por 2 dias, continuava serelepe, e nos deu todas as instruções. Enquanto conversava conosco, ia se despedindo de outros voluntários, como um jovem Bombeiro, que estava feliz por seu macacão estar seco e ele não ter tido a necessidade de entrar na água e...
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*Nota de Solidariedade*
Nos solidarizamos com os devidos acontecimentos das últimas semanas no Estado, com as condições climáticas tão severas e a devastação acontecida.
Reconhecemos o quão difícil tem sido lidar com o medo, contabilizar as perdas e pensar no recomeço.
Da autora, que vos escreve, conhecendo as regiões, de Norte a Sul, Leste e Oeste, deste nosso Rio Grande do Sul, tendo nascido em Guaíba, vivido uma parte nela, mas também em Eldorado do Sul, Santa Maria, Santa Rosa e outras cidades, havendo retornado a Porto Alegre, tendo familiares e amigos nesses lugares completamente atingidos pelas enchentes, meu coração está desolado.
A preocupação com as cidades de Pelotas, São José do Norte e RIO GRANDE, com a tarefa de receber esse volume de água, tão grande e enviar ao Oceano.
Fica aqui, nesta nota, nosso profundo respeito a todos os afetados, a tristeza pelas mais de 345 cidades acometidas e as vidas levadas.
Mas também, junto com o povo gaúcho, a esperança da reconstrução.
Neste momento, somos todos \"Pescadores\", fazendo parte deste Rio Grande imenso, com tantas \"Histórias\" para registrar.
Rio Grande, 17 de Maio de 2024.
Abrigo Atípico Fábrica De Cordas/ Fábrica De Sonhos
Proprietários: Zéh Catalunha e Rafael Albernaz Lopes
Coordenadora Cibele Rocha - Coordenadoria Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência e Altas Habilidades.
22h as luzes se apagaram. A agitação foi perdendo força até o silêncio tomar conta do ambiente.
A escala da ronda noturna nos foi passada, intercalando de 2h em 2h, com a mudança de posição dos trios.
O grupo dessa madrugada foi recebido por um dos Coordenadores, Gabriel, que apesar de não dormir por 2 dias, continuava serelepe, e nos deu todas as instruções. Enquanto conversava conosco, ia se despedindo de outros voluntários, como um jovem Bombeiro, que estava feliz por seu macacão estar seco e ele não ter tido a necessidade de entrar na água e resgatar ninguém naquele dia.
Foi nos dito que havia mantas e cobertores para nos aquecer, caso precisássemos.
Precisamos. Eu mesma, 2. Andando por todos os lados, enrolada, até o nariz, mas com os olhos arregalados.
4:21 AM, ouvíamos em silêncio o vento uivar do lado de fora do ginásio congelante, lotado com as famílias atípicas que foram recebidas no abrigo montado na Fábrica de Cordas.
As águas das enchentes continuam passando por Rio Grande. Às vezes sobe, às vezes desce, mas continuam.
Já faz muitos dias. Muitas famílias tiveram que deixar suas casas, até que toda a água passe e os locais que estão sendo afetados na cidade, se tornem seguros novamente.
Enquanto isso, abrigos recebem mais e mais pessoas.
O Zéh andava para cima e para baixo. Olhos cansados, mas atentos, passava e recebia instruções pelo rádio.
O abrigo contava com 67 famílias resgatadas, até esse dia.
Passamos a noite vendo-os dormirem e auxiliando em suas necessidades, caso acordassem.
Pessoas com cuidados especiais, no momento, sem lar, sem chão.
É muito ruim não ter ideia de quando o retorno para casa será possível.
Vimos uma das abrigadas, surda, receber a informação, antes de ir dormir, de uma voluntária, em LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) que as águas estavam baixando. Ela sorriu, agradeceu e foi para cama.
A noite foi fria, longa e dura.
Tínhamos chá, café, chimarrão ao nosso dispor, se quiséssemos.
\"Vocês vão ver o que é friaca na virada das 6h para 7h da manhã\". Eu dizia.
Dito e feito, foi o pior momento. Subiu um gelo total. Neste momento, pés e mãos congelados.
Acabou nosso turno. Na cozinha, um chocolate quente nos aguardava.
Cada gole, quase um colo de mãe.
A receptividade dos cozinheiros (voluntários), nos animou. Bolo de chocolate, de cenoura, uma variedade de coisas gostosas e quentinhas.
Esperamos a próxima rodada de voluntários chegar. Nos despedimos e voltamos para casa, tentando nos aquecer.
Até que vimos um \"Pedido de Socorro\" do Zéh , no grupo, para render os voluntários que estavam muito cansados.
\"30 minutos do seu tempo\". Ele dizia.
Não contente, voltamos no final da tarde, e à noite para ver como as coisas estavam e sermos voluntários novamente.
Foi quando conhecemos as pessoas de verdade. Ouvimos suas histórias e servimos da melhor maneira possível.
Acompanhamos o cansaço dos voluntários que estão lá desde o dia 08 de maio.
E eu pensava: \"Como aguentam?\"
Pessoas educadas, dispostas, resilientes.
Policiais, Enfermeiros, Assistentes Sociais, Bombeiros, Professores, Estudantes, todos os tipos de voluntários (incluindo os próprios abrigados) e muito engajados.
100% voluntário, assim é o cuidado deles.
Terminamos nosso turno, não antes de tomarmos uma Sopa quente.
No refeitório, vi os olhos de uma Enfermeira encher d\'água, quando ao provar a sopa, disse: \"Igual ao tempero do meu Avô\".
Meus amigos que me acompanharam nessa empreitada de voluntariado nesses dias no abrigo, continuarão participando da rotina de lá.
Eu, ao me despedir dos outros voluntários com um abraço amigo, por ter que pegar a estrada, me fez encher os olhos d\'água e sentir privilegiada por compartilhar e receber tanto carinho.
Nesse momento de fragilidade, que o Estado inteiro tem passado, todo tipo de consolo, conforto é bem vindo.
Vemos muitas notícias, posts bonitos, com dizeres: \"O povo pelo povo\".
Acho que agora entendo isso.
Ainda não acabou. Dormimos e acordamos com dias incertos.
Às vezes acordamos no susto, desejando que o pesadelo tenha acabado.
Como eu, hoje pela manhã, quando ouvi a voz do Humberto Gessinger cantando na minha cabeça :
\"Se tudo passa, talvez você passe por aqui
E me faça esquecer tudo que vi...
Deve haver alguma coisa que ainda te emocione...
E te faça esquecer...\"
Eu tenho essa dica: Rua Domingos de Almeida, 660. Bairro Cidade Nova.
Estão todos lá, te esperando, para te ajudar a esquecer tudo que temos visto de ruim e também te emocionar.
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