Plano Anual de Atividades 2013 – Pronac 128.976 Whirlpool
Depoimento de Carmelita Krause Rosa
Entrevistada por Marcia Trezza
Joinville, 10/05/2014
WHLP_HV029_Carmelita Krause Rosa
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Mariana Wolff
P/1 – Carmelita, nós vamos começar a entrevista, fala seu nome completo.
R – Carmelita Krause Rosa.
P/1 – Que lugar você nasceu?
R – Joinville, Santa Catarina.
P/1 – Em que data?
R – Em 1971.
P/1 – Que dia e mês?
R – Vinte e dois de dezembro.
P/1 – Qual o nome dos seus pais?
R – Antido Krause e Luana Otto Krause.
P/1 – A origem deles, eles são brasileiros?
R – Eles são brasileiros, né, mas a origem é alemã.
P/1 – Do pai e da mãe?
R – Dos dois, ambos.
P/1 – E que atividade tem o seu pai, ou tinha?
R – Ele era eletricista.
P/1 – Ele ainda é vivo?
R – Não, ele é falecido.
P/1 – Foi sempre eletricista?
R – Sempre eletricista.
P/1 – E a sua mãe?
R – A minha mãe, mais de nova, ela trabalhava na fábrica, né, de Nova, fábrica de confecção de roupas. E agora, faz uns 30 anos que ela também faz biscoitos caseiros.
P/1 – Ela continua fazendo?
R – Continua fazendo biscoitos caseiros. E assim, durante um bom tempo, depois que o meu pai se aposentou, ele também ajudava ela, né, então…
P/1 – E além da sua mãe, mais alguém da família fazia biscoitos?
R – Sim, uma irmã dela, né, que daí essa irmã que deu os primeiros passos, ensinou ela. Essa irmã dela.
P/1 – E essa irmã é com biscoitos de origem alemã, ou não?
R – Sim, sim, porque era biscoito de melado, pão de mel, né, então são os mais de origem, né, os tradicionais natalinos.
P/1 – E que lembranças você tem do seu pai?
R – Do meu pai? Paizão (risos), paizão! Ah, não queria falar…
P/1 – Você lembra dele e fica com saudades, né? E da sua mãe?
R – Desculpa…
P/1 – Imagina! Carmelita, a gente tava falando do parto do Lucas. Você chegou e se espantou que ia ser…
R – Me espantei, porque eu lá sabia o quê que era aquele liquido, daquela bolsa, tudo, né? Daí a médica chegou e disse: “Não, mãezinha, o Luquinha já vai nascer”. Eu queria parto normal, né, sempre quis parto normal. Daí ela foi, me examinou, ela disse: “Não vai dar para ser parto normal, vamos fazer uma cesárea, que o Luquinhas tá muito pra cima”, daí eu falei: “Ah não, mas cesárea, mesmo?” “Não, tranquilo, tranquilo”, aí porque assim, tava tudo tão tranquilo que eu fui para a sala de parto andando lá para fazer a cesárea, o Marcio acompanhou, tava junto, né? Aí eu lembro assim, que o anestesista mandou eu me virar e segurar bem a enfermeira que tava do lado assim, daí eu dei um apertão nela, mas um apertão e segurei, né? Aí, ele falou: “Legal, pode soltar”, eu falei: “É?”, ele falou: “É, já foi a anestesia”, não senti a anestesia, nada, já tava adormecendo tudo e eu não senti eles aplicarem a anestesia. Então, eu digo assim, pra mim, foi tudo muito tranquilo, sabe? A minha preocupação, tinha um relógio assim, na minha vista, que daí ficou a minha médica e a irmã dela, porque as duas, né, obstetras. Daí, as duas fizeram o meu parto, então, ficaram as duas ali me costurando depois que o Lucas nasceu e eu só pensando: ‘elas estão conversando tanto, que vai acabar a anestesia e elas não vão acabar de me costurar’, né? Mas que nada, a anestesia durou um tantão, até o outro dia, né? A gente não sabe, mas era preocupação.
P/1 – E ai, você chegou a ver o Lucas, logo que ele nasceu?
R – Sim, meu Deus, que emoção, né?
P/1 – Você sabia que ia ser menino?
R – Sabia.
P/1 – E ai, como foi quando você viu?
R – Meu Deus, muita emoção, assim, né, daí o Marcio ainda junto com ele, né, e eu só olhando, que esse local onde eles deram o banho no Lucas, assim, tinha o vidro, né, podia visualizar bem, né? Coisa que a gente vai na mente, que a gente pensa que é todo mundo junto que ia ser atendido, mas não, não é. Eu tava sozinha numa sala, né? Então eu sempre pensava assim: “Tem que ficar de olho, para eles não trocarem o meu filho com outro”, né (risos)? Mas não, nem tinha ninguém perto, nada. Mas muito, muito bom, a emoção assim, do filho… Ainda mais eu, que era tão medrosa, eu nunca imaginei que eu seria mãe. Eu lembro, assim, várias vezes, eu lavando roupa e vinha aquela imaginação: “Ai, acho que eu vou pensar em ser mãe. Não, não, deixa isso pra lá, esquece, esquece. É muito perigoso esse negócio”. Então pra mim foi um presente maravilhoso. Essa semana, ainda ontem, quando foi? Foi ontem, é, ontem. Eu fui na escola, né, tudo, e eu fiquei lá pensando, lembrei de todos esses momentos, o Lucas agora com 14 anos e muito educado, um filho obediente, sabe? Até pela idade, devia ser mais assim, mas não, sempre honra muito o pai e a mãe, obedece a gente. Ontem quando os professores vieram falar dele e tudo: “Ótimo aluno”, foi chamado pela coordenação para ser elogiado… Meu, aquilo te… né? Até na hora que a professora falou: “Ele vai ser chamado para ser elogiado”, eu falei: “Quem? O filho ou a mãe?” “Não, é o filho”, mas é muito gostoso assim, sabe? Soma muito mesmo, não posso reclamar nem do filho, nem do marido, os dois são tremendos!
P/1 – E você disse que trabalhava até o Lucas nascer, parou um pouco antes…
R – Uns dois anos.
P/1 – É, parei um pouco antes.
R – Isso. Ai, eu fiquei assim, acho que até uns três anos, a idade do Lucas, né, que eu fiquei sem trabalhar.
P/1 – E ai, você fazia alguma atividade?
R – Não, nada, eu fiquei vadia mesmo. Meu Deus, só mãe mesmo. Só mãe? É bastante (risos).
P/1 – Você tinha estudado?
R – Não, não. Eu parei, parei de vez.
P/1 – Você tinha estudado até o ensino?
R – Ensino Médio. Aí depois parei. Parei, fiquei esse tempo com o Lucas, e, assim, o Marcio tava muito bem no trabalho dele, tava tudo muito bem. Ele tinha empresa, tudo. Mas aí a gente foi à falência, né? Teve uns problemas, umas situações na época, e ficou desempregado. Assim, da noite pro dia, né, a gente ficou sem chão. Sem chão completamente!
P/1 – Ele tinha empresa do quê?
R – De transporte, trabalhava com transporte. E daí, então assim, a gente ficou desestruturado mesmo, assim, de repente. De um mês pro outro, a coisa mesmo desandou. Daí ele tentou. Tentou com turismo, mas a coisa não tava engatando, não tava funcionando, não ia.
P/1 – Era transporte de carga?
R – Isso. Transporte de carga. Daí, depois disso que eu pensei: “Vou ter que trabalhar, tenho que ajudar, né, tem que fazer alguma coisa”.
P/1 – Ele tava sem trabalho?
R – Tava. Tava fazendo esses bicos assim, né, correndo atrás. Acabou, não tinha mais a empresa, daí eu resolvi começar a trabalhar. Como a minha mãe já trabalhava, fazia os biscoitos e, assim, todo final de ano, que ela trabalha o ano todo, então todo final de ano sempre ficava mais apurado, todo final de ano. Então eu ajudava ela, né, depois que eu parei de trabalhar, eu sempre ajudava ela. Daí eu falei pra minha mãe: “Quer saber? Acho que eu vou começar a fazer biscoito”, só que ela não colocou muita fé em mim, não. Ela disse: “Não, fica aqui com a mãe, ajuda a mãe”, eu falei: “Não, não, não. Eu vou trabalhar esse final de ano aqui com a mãe, mas a partir de janeiro, eu vou começar a fazer sozinha”, daí ela ficou meio assim, ela ficou meio assim comigo, né, eu falei: “Vou”.
P/1 – Por que será que ela ficou assim?
R – Acho que ela não botava muita fé que eu… Porque sempre ela era a protetora, então eu ajudava ela, mas assim, o grosso, a coisa, o puxar o negócio era ela, né? É porque era dela o negócio, eu ajudava nos acabamentos, mas meter a mão na massa, fazer a massa, nunca tinha feito. Ajudava ela a empacotar, pintar, a fazer as entregas para ela, mas meter a mão de fazer, fazer mesmo? Então ela não botou muita fé, né, ela ficou meio assim: “Não vai dar certo esse negócio”. Aí eu peguei o último dinheiro que a gente tinha, que era fim de ano mesmo, eu falei: “Não…”. Nessa época já fazia o quê? Quase uns oito meses que o Márcio já não tinha mais a empresa, então tudo vira uma bola de neve, porque a gente tinha um… Como é que eu vou te dizer? As nossas contas, né? E por ele ter perdido o serviço, essas contas não diminuíram, elas continuaram, então foram acumulando. Então a gente tava, assim, liso mesmo! Mas aí, o último dinheiro que eu tinha, eu falei: “Não, eu vou lá comprar o forno”, fui lá e comprei o forno à vistinha, para não me endividar muito. E eu comecei na pior de todas as épocas, porque você trabalhar, começar a fazer biscoito em pleno verão, depois que todo mundo se encheu de chocolate, Natal, aquela coisa. Foi a pior de todas as épocas para você querer começar esse tipo de negócio. E eu comecei em janeiro.
P/1 – Você sabia que ia ser assim?
R – Sabia! Sabia que janeiro era a época que tipo, a minha mãe pegava folga, porque não vendia mesmo, era época de descansar. Trabalhava o ano todo, e janeiro era a época de descansar. O grosso, forte era dezembro. Só que em dezembro, eu fiquei ajudando ela. “Mas eu vou começar em janeiro”, isso foi em 2004, que eu comecei. Aí, fui comprar. Comprei o forno e comecei a fazer. Menina, eu não conseguia nem ligar o forno. E eu ligava e apagava o fósforo e fugia gás para tudo quanto era lado, eu falei: “Ai, meu Deus do céu”, aí desligava, tá! Até que consegui ligar. Liguei na minha tia, né, que também fazia biscoito e falei pra ela assim: “Meu Deus, tia, eu não consigo ligar o forno! Não consigo ligar esse bicho!”, daí ela: “Dá umas batidinhas ali, porque tem uns caninhos embaixo, que de repente…”, mas era novo, “…de repente, alguma ferrugem, alguma coisa dentro e aí é por isso que não tá saindo direito”, aí fiz um monte de teste e consegui ligar o tal do bicho.
P/1 – E a massa?
R – E a massa, aí que é!
P/1 – Tinha feito?
R – Pois é, aí fiz a massa, tudo, aí começou a queimar, eu não conseguia acertar o ponto, queimava um biscoito atrás do outro. Falei: “Não, vamos parar com esse negócio”, daí, liguei pra mãe: “Mãe, vem pra cá”, aí veio a mãe e o pai me ajudar: “Vamos te ajudar”. Só que, assim, cada forno e fogão, você conhece o seu, o outro já é diferente, né? Então, ela veio, ela me ajudou a fazer a massa, fez a massa, tudo, funcionou, foi pro forno. Meu Deus do céu, queimou tudo! A mãe falou: “Ele é diferente do meu forno esse forno, tá queimando tudo”, aí foram pra casa. Com o tempo, aí foi a persistência, fui fazendo, até que a gente acertou. Eu e o meu marido, né, ele é muito calmo, tranquilo, é melhor assador do que eu, ele me ajuda a assar, às vezes, quando ele tá por ai, né? Então eu fui fazendo a massa, ele me ajudou a passar na máquina, daí ele assava, assava muito bem, e a coisa engrenou. Daí ele começou a sair, começou a vender. Depois, ele voltou a trabalhar, as coisas foram se encaixando e fui desenvolvendo e graças a Deus…
P/1 – Agora, me diz uma coisa, Carmelita, a massa não foi difícil você fazer?
R – Não, até que a massa, até que eu não me saí mal, não, até que a massa eu acertei, o ponto dela.
P/1 – E tem que passar o quê, que você falou que ele até ajudava a passar?
R – Na máquina, porque assim, é tudo bem artesanal. Não sei se você conhece aquelas máquinas de moer carne? Então, os biscoitos, uma parte deles é feita nessa máquina, os redondinhos, né?
P/1 – O quê que você passa nessa máquina?
R – De biscoitos? É aquele de coco, que a gente faz o biscoito de coco, os biscoitos salgados, os biscoitos de laranja, os dedinhos sujos, os de pontinha de chocolate também são nessa máquina. E algumas massas são de esticar, né?
P/1 – E ele passava na máquina?
R – Aí ele virava a máquina e eu ia enchendo a máquina e cortando os biscoitos. Ele virava a máquina pra mim.
P/1 – Não é igual, é tipo a de moer carne?
R – É a mesma máquina, só que tem um adaptador que você coloca na frente e é próprio para biscoito, mas a máquina é a de moer carne.
P/1 – Até hoje, é a mesma?
R – A mesma máquina. Até hoje, é a mesma.
P/1 – E depois, pra esticar é na mão?
R – Esticar é na mão.
P/1 – Até hoje?
R – Até hoje. Eu não consegui, já falaram pra mim, eu já fui experimentar em alguns lugares de usar aquele que é o cilindro, mas não dá certo, porque a massa, ela pede trigo, pede essas coisas, na hora que você tá esticando. E no cilindro dá uma lambanceira, então pra mim é no rolo, vai. Eu com os muquezinhos (risos)! Precisa de academia pra isso? Olha só, falando sério, tudo firminho.
P/1 – E ai você disse que ele voltou a trabalhar e você continuou?
R – Eu continuei. Assim, ele que abriu a minha clientela, né? Ele foi, vendeu, daí como já tudo mais formada a clientela, era mais fácil, né? Aí continuei.
P/1 – Onde que ele vendia?
R – Tudo direto com o pessoal. Então, era em loja que ele vendia, pros amigos, pros familiares, mas como a minha mãe sempre falava pra mim: “Se você for depender de vizinho e de família, você vai morrer de fome. Você tem que buscar fora”, e é verdade, né?
P/1 – E ele oferecia para as lojas que ele nem conhecia?
R – Nem conhecia, ia lá, plantava, deixava experimentar, tudo. Aquela coisa, trabalho formiguinha e depois, um indica para o outro, né? Aí a pessoa: “Gostei”, indicou, vai, liga…
P/1 – E para fazer o preço?
R – Até hoje eu continuo trabalhando dessa mesma forma, mas eu peguei a mesma forma que a minha mãe fazia, a mesma fórmula dela, eu passei pra mim essa mesma fórmula. Quando eu comecei lá no Consulado, a gente teve os cursos ensinando tudo, até eu conversei com o pessoal lá e por fim, toda aquela forma deu para encaixar com o jeito que eu tava fazendo, tava certinho, então, aprovado, deu para continuar, mas assim, bem tranquilo.
P/1 – Como é que você conheceu o Consulado?
R – Consulado foi uma cliente minha, que eu já tava fazendo biscoito há mais ou menos, uns três anos antes de eu conhecer o Consulado. Tem uma cliente minha que ela era voluntária no Consulado, ela pintava, né? Ela falou assim: “Você não quer conhecer o pessoal do Consulado?”, aí eu fui, conheci o Dalfovo, o pessoal lá, que é muito maravilhosa, o Dalfovo, mesmo me recebeu muito bem. Então assim, conheci o pessoal.
P/1 – Ela que te levou?
R – Ela que me levou. Ai, cheguei lá, me apresentei, tudo. Daí, na época, até eles estavam precisando alguém pra ser voluntaria lá para estar levando o pessoal, ensinando receitas, coisa e tal na cozinha. Também na área lá administrativa, dentro da Whirlpool, eles estavam precisando de mais alguém na área de vendas, para vender lá dentro, né? Aí, eu fui, fiz a entrevista, tudo com eles, as meninas também me aceitaram, legal…
P/1 – No Espaço Solidário?
R – No Espaço Solidário, isso, lá no um, lá em cima, né? Espaço Um, lá, então elas estavam há pouco tempo lá, as meninas, né, mas teve um desfalque, parece, lá na equipe, daí tava faltando alguém. Aí, foi onde que eu entrei.
P/1 – Em que ano que foi isso, mais ou menos?
R – Ixi, agora você me perguntou…
P/1 – Mas quanto tempo faz, assim?
R – Olha, foi uns três anos depois que eu comecei, 2004? Foi acho que 2008, 2009, não quero errar o ano, sabe?
P/1 – Mais ou menos esse período?
R – Mais ou menos, é.
P/1 – Mas você também passou a ensinar?
R – Sim, eu era voluntária lá dentro da casa, daí a gente fazia os cursos, uma coisa que me realizou bastante. Porque querendo ou não, tem coisas que às vezes é para te motivar, e acaba te desmotivando, você se sente a menor de todas, né: “Poxa, eu nunca precisei trabalhar desse jeito, dessa forma”. Eu não tinha esse peito, essa coisa de sair pra vender, eu achava que era uma coisa inferior, das demais pessoas, que eu tava sendo inferior. E dentro do Consulado, eu vi que não era nada disso. Essa parte foi muito trabalhada comigo dentro do Consulado, sabe? Essa parte: “Não, você não é isso, o produto é bom”, então, aprendi muito ali com eles, ensinando as meninas, né, e vendo o quanto as pessoas precisavam também. Fui em algumas casas, né, porque algumas não iam lá, fazer o curso lá, então fui na casa, entrar na casa delas, mostrar como elas podiam ali, na casa delas, na realidade delas, fazer alguma coisa para elas, né? Foi muito bom, pra mim foi maravilhoso essa parte do Consulado, foi muito bom mesmo!
P/1 – E além disso, Carmelita, você disse que teve mais umas orientações lá, que até você viu: ”Ah, isso eu fazia certo, isso…”, que tipo de informação você teve, lá?
R – Meu Deus de tudo, né? Até teve o pessoal do Sebrae, que a gente fez um curso com o pessoal do Sebrae, que era “Alimentação Segura”. Então foi muito bom também, porque tem aquela coisa, tu olha: “Mas o local, o teu trabalho tá certo, tá correto”. Até mesmo quando o Sebrae veio aqui, né, a pessoa que tava acompanhando a gente, porque primeiro a gente fez uns dias dentro do Consulado, né, como é o trabalho, como é que você faz, higienização de tudo, tudo.
P/1 – O Sebrae foi no…
R – No Consulado. Eles tinham um convênio, né, com o Consulado, então eles foram e fizeram aquele curso uma semana, mais ou menos, com a gente ali, direto e depois, eles iam na casa para ver. Então, assim, quando eles marcaram para vir aqui, aí eu pensei: “E agora, né?”, mas eles me elogiaram bastante, eles falaram que é isso mesmo, que em comparação… “Meu, se você for ver os restaurantes em Florianópolis!”, ela falou: “Muito bonito lá na frente, mas lá trás, a gente fecha tudo”, porque eles são fiscais. Então, assim: “Não, Carmelita, é isso mesmo. Esse é o caminho”. Isso tudo foi agregando mais valor pra mim, principalmente no lado da motivação. Eu me senti melhor naquilo que eu tava fazendo. E depois, outra coisa também, pra mim, dentro do Consulado, que somou bastante foi a parte da gente trabalhar de uma forma mais cooperativa entre as meninas, né? Porque na época lá, até hoje ainda tem, tem os espaços de vendas. Então, assim, não é meu o espaço, né? É nosso espaço, é tudo junto! Então, não é meu produto, é o produto de todas juntas. Então essa parte de trabalhar, de se acertar, de funcionamento de tudo isso. Somou muito, assim.
P/1 – O que vocês aprenderam sobre funcionamento de tudo isso?
R – Então, a forma de se organizar, como que teria que ser organizado, o visual do local, como organizar tudo isso; a quantidade de mercadoria, para não ficar aquela disputa: “Tem que colocar mais o meu, não o teu”, aquela coisa de organizar todo mundo igual; a parte financeira, aquela coisa, porque daí, você não tá mexendo só com o teu dinheiro, a responsabilidade é com todos que estão ali, então a prestação de contas; receber essas mercadorias, o controle para receber; e depois, quando acaba as feiras, aquele período, o fechamento daquilo tudo, como fazer a prestação de contas com o pessoal. Então, muito assim, né, muito legal.
P/1 – E quando você faz tudo isso que você falou, vocês, cada empreendedor recebe o dinheiro de quem tá comprando o seu produto?
R – O seu produto.
P/1 – Ou não? É tudo junto, como que funciona?
R – Não, não, não. É assim: se eu levar cem reais de produto, eu vou ganhar em cima dos meus cem reais que eu levei. Mas na hora de vender, tipo que nem lá que tem a lojinha lá embaixo, né, bazar. Então, eram cinco dias ali naquele bazar, mas eu não ficava ali os cinco dias vendendo, nem posso, né? Nenhuma de nós, que a gente precisava produzir, a gente produz também. Então, a gente faz uma escala de pessoal, de meninas. Então assim, cada dia ficava uma. Mas no dia que eu não estava lá, alguém estava vendendo o meu produto. Então por isso que eu digo, tinha todo um controle, uma coisa assim para saber quanto foi vendido meu. Então, quando fechava, acabava a feira, era feito o levantamento de estoque: quanto que teve da sua entrada, vamos supor, foi cem? No final do estoque, ficou quanto? Ficou cinquenta. Então, cinquenta reais é o seu, né? Então, tem que ser tudo muito bem organizado, porque depois tem que ter o dinheiro de todo mundo ali, né, não dá para depois: “Faltou?”, tem que ser muito organizado, senão não funciona mesmo. É muita cabeça, muita gente, né?
P/1 – E o seu empreendimento tem um nome agora?
R – Doces Sonhos Biscoitos Caseiros.
P/1 – Como é que você achou esse nome?
R – Sabe que eu nem sei te dizer (risos) porque que me veio esse Doces Sonhos? Não sei te dizer mesmo.
P/1 – Mas você decidiu, assim, sozinha, com mais alguém?
R – Não, sozinha. Eu sou muito, assim: dá ideia na minha cabeça, eu já trago ela vendida, já, não fico perguntando. Esse é o meu problema, eu já trago ela pronta e já querendo que as pessoas aprovem. Então o nome, eu mesma que tirei nem sei da onde, esse “Doces Sonhos”. Daí levei para o pessoal do Consulado, que eles na época estavam fazendo esse acompanhamento pra ver o desenho, como ia ser. Eu procurei também um amigo meu, que ele faz cartões, faz uns desenhos, aí ele fez um desenho lá, trouxe, mandou um pra mim, tinha lá os biscoitos sendo banhados. Eu falei: “Não, Daniel, isso não é a minha cara ainda. Não é isso que eu quero”. Depois, foi até que ele bolou esse último, aí levei para o pessoal do Consulado pra eles darem uma olhada, o designer lá do Consulado. Eles olharam e falaram: “É isso mesmo, manda ver”, aí fechou, é isso aí.
P/1 – E você faz parte de alguma associação?
R – Não, não, não, eu não faço parte de nenhuma associação.
P/1 – Mas quando tem as feiras, como é que vocês conseguem participar dessas feiras?
R – Então, quem está ligado ao Consulado, eles organizam e levam o pessoal para as feiras. Hoje, nesse lado, eu já estou desvinculada, porque fazem dois anos que eu tou tocando o meu empreendimento, digamos assim, sozinha, né? Claro, de vez em quando a gente dá uma ligadinha apara o Consulado, eles dão um toquezinho nisso, naquilo, mas assim, desmamei. Eu acho que tem que ter um tempo, né, pra mim, você tem que crescer, né? Então, sempre ficar só ali, só ali, esperando que o Consulado providencie o seu cliente, que o Consulado faça isso pra você. Não! Você tem que ter uma hora que você vai crescer, você tem que tocar. Eles vão te dar ali, vão te ensinar a pescar, mas eles não vão ficar dando o peixe direto pra você, você tem que correr atrás. Você vai ter que ir atrás do negócio! Então fazem dois anos mais ou menos, que eu tou tocando o negócio, assim, desvinculada do Consulado.
P/1 – Quanto tempo você ficou com o Consulado?
R – Acho que uns cinco anos, mais ou menos. Eu tenho saudades, essa é uma equipe maravilhosa, sabe?
P/1 – Do quê que você tem saudades?
R – Da equipe, das motivações, porque todo mês tinha reunião, e essas reuniões são muito de motivação, né?
P/1 – E mesmo desvinculando, não pode continuar indo nas reuniões?
R – Olha, acho que não. Eu acho que atrapalha um pouquinho o trabalho deles, também, né? Acredito que não somaria, e aí ficaria sempre indo, querendo eles como mãezona (risos). A gente precisa crescer.
P/1 – Mas tem algum tipo de encontro? Eu sei que tem as feiras, algum tipo de encontro de quem já desmamou?
R – Não, não, não. Que eles façam, que eles tenham, não, não.
P/1 – Não, mas vocês? De vocês se organizarem.
R – Eu com elas?
P/1 – Não o Consulado.
R – As empreendedoras?
P/1 – É.
R – Não, não. Sabe que não? Até eu tenho uma amiga minha que mora aqui perto, ela está no Consulado, a gente conversa mais, troca ideias, tudo, né? Mas, assim, não, a gente não… Até porque é bem corrido, barbaridade! Para todas, né?
P/1 – Vocês não sentem essa necessidade ainda?
R – É, acho que não. Mas seria legal, gostei da ideia. Muito bom, né, rever as amigas, a ideia é muito boa.
P/1 – Pela própria resposta que você deu, né, da motivação, das reuniões…
R – Nas reuniões. É muito bom, acho que principalmente para a mulher que ela se sente desvalorizada, o Consulado trabalha esse lado muito, muito, muito, demais! Esse lado, assim, motiva. Faz a mulher enxergar o futuro, as coisas de uma forma diferente, eles fazem isso, tem essa capacidade mesmo.
P/1 – O que você enxergou de diferente no seu futuro, participando do Consulado?
R – Que eu posso fazer, né? Que eu posso fazer, que as coisas são valorizadas. Que eu me sentia assim, menosprezada, sabe, diante das situações, de você tem que chegar num lugar e oferecer um produto, aquela coisa toda, né, parece que é só você. Só você que tá passando por aquela situação, ninguém mais passou, que ninguém vai dar valor. Até, inclusive, dentro do Consulado tem uma pessoa, que eu crescia muito com essa pessoa que é uma das empreendedoras lá, que foi a Marcia. Ela é uma pessoa formada, e às vezes, eu olhava pra mim: “Uma mulher formada, tudo”, e ela também fazia biscoitos, falava: “Como é que você faz biscoito?”, e ela fazia com tanto carinho, com tanto amor e ela gostava daquilo. Aprendi muito com a Marcia, ela é uma pessoa também assim… Tem aquelas que você olha, assim: “Quero ser igual” (risos). E a Marcia foi uma pessoa que me fez também crescer bastante e era uma das empreendedoras que eram apoiadas pelo Consulado também. Uma pessoa muito especial, também.
P/1 – Me conta um pouco dos seus biscoitos, que tipo de biscoito você faz?
R – Então, a gente faz o sequilho, os pães de mel, os amanteigadinhos, casadinhos, salgados, as de melado, que hoje é o forte os de melado com cobertura de chocolate. Tudo ruim, tudo muito ruim (risos). Eu agradeço muito a Deus, mesmo, porque eu tenho muitos clientes. Não é uma vaidade, sei lá, mas nunca recebi reclamação: “Isso aqui não ficou bom”, nunca, nunca, nunca. Até porque se viesse, é uma crítica que a gente tem que construir, melhorar. Mas eu nunca tive nada assim, sabe, do cliente falar: “Não, não gostei disso ou aquilo”, não. Sempre foi muito bem aceito. Isso que realiza a gente, né?
P/1 – Só mais uma pergunta, Carmelita. No começo, quando você desmamou, como você mesma disse, do Consulado, quais foram os desafios ou dificuldades? Ou não teve?
R – A dificuldade foi me desvincular do Consulado, pelo apego que eu tinha com eles, né? Mas, assim, é que não tava mais tendo espaço pra tudo, porque a gente tem as reuniões e você tem que estar presente nessas reuniões pra organizar feiras, pra tudo, que são várias reuniões, né? E eu não tava conseguindo conciliar tudo, a produção, as minhas vendas, daí eu já tava com bastante clientela fora, então, assim, alguém eu ia acabar deixando sempre na mão. Então eu tive que me desvincular mesmo do Consulado. É difícil, é difícil, eu ainda sou meio chorona, lá no dia.
P/1 – Você que tomou a decisão ou foi uma decisão conjunta?
R – Sim. Não, eu procurei, na época, a pessoa responsável lá no Consulado, conversei, troquei umas ideias, ela ficou meio assim: “Mas tem certeza?”, aí já comecei a chorar já. Mas tinha que ser, tinha que ser!
P/1 – E aí foi?
R – Eu comecei, me afastei, mas vira e mexe a gente tá em contato. Quando eles precisam de alguma coisa, eu vou e faço para ele o que eles precisam, né? Ou vice-versa também, quando eu preciso de alguma coisa, tem essa liberdade.
P/1 – E você se desvinculou, mas já tava bem tranquila?
R – Sim, sim, daí para tocar o negócio, você diz? Isso não, tranquilo, isso aí já bem fortalecida pra isso, já bem tranquila. Tava forte já (risos), já era outra mulher.
P/1 – Então, para sintetizar, Carmelita: você já fazia biscoito, já vendia, você já disse muitas coisas que contribuíram pra você, né, que o Consulado contribuiu. O que foi fundamental para você depois se tornar independente no seu negócio?
R – No que o Consulado foi fundamental para mim?
P/1 – É, porque você disse que contribuiu muito, algumas coisas, você já falou. Mas para ter realmente, se sentir independente, forte?
R – Assim, o que marcou pra mim do Consulado, foi essa parte deles fazer eu me sentir mesmo mulher guerreira mesmo, forte. Não ter medo de enfrentar e não me sentir menosprezada. Isso foi o principal pra mim no Consulado, sabe? Me senti importante naquilo que eu tava fazendo. Saber que o que eu faço tem valor, isso que somou, com certeza, isso não tem nem outra coisa. Assim, muitas coisas agregaram, mas isso pra mim, foi o principal, alguém que diga: “Você é empreendedora, pode meter as caras, é isso mesmo, tem valor o que você faz”.
P/1 – E o rendimento, tem um rendimento?
R – Tem, tem, graças a Deus, dá pra gente tocar. Às vezes, eu falo para o meu marido: “Tá tão puxado, né, tudo corrido, não tenho tempo pra mais nada, só trabalho”. Mas às vezes, já pensei assim: “Ah, vou tirar uns dias de folga, vou ficar uma semana sem trabalhar”, aí se eu fico aquela semana, já começa a me dar uma agonia, sabe? Daí já tem cliente pra cá, já tem que fazer alguma coisa. Eu acho que já tá no sangue, já foi, já tá viciada nesse negócio, vou passar mal, se não fizer, vai passar mal.
P/1 – E qual o seu maior sonho, hoje, Carmelita?
R – Então, assim, o que eu não consegui fazer, né? Até mesmo através do Consulado, a gente não conseguiu, que eu gostaria de legalizar o negócio, mas são muitos tramites legais, é muita burocracia, eu não consegui vencer tudo isso. Então eu gostaria de legalizar o negócio mesmo. Eu não tenho essa pretensão de botar o meu produto dentro dos mercados, porque eu quero atender direto para o cliente mesmo, eu gosto disso. Meus clientes, alguns até dizem: “Vou comprar bastante, para ter mais em casa” “Não faz isso, eu não gosto disso. Gosto que você sempre pegue ele fresquinho, pegue pouco, mas pegue mais vezes”, mas sempre tem fresquinho. E é isso que eu quero que o meu cliente tenha: qualidade. Sempre bem fresquinho o produto na casa dele, qualquer coisa, me liga, eu levo, não tem problema, mas pega pouco, vai pegando de pouquinho em pouquinho. Mas só que eu gostaria é de legalizar, ter essa coisa legalizada. É um dos meus sonhos, o maior dos meus sonhos é esse.
P/1 – E a gente já tá encerrando, você quer falar mais alguma coisa sobre o empreendimento, sobre a sua vida, que você ainda não registou aqui com a gente?
R – Não, acho que falei demais (risos). Só quero agradecer, tanto o pessoal do Consulado pela oportunidade, sempre trazendo coisas novas, né, quando eu menos penso, eles me aparecem com uma diferente. Não adianta, eu vou sempre acompanhando, né?
P/1 – O que você achou de contar a sua história aqui?
R – Ah, muita emocionante, eu tenho que me segurar. Você viu isso, então não deu para pegar muitas… Mas obrigada mesmo, vocês são demais!
P/1 – Pra nós também foi muito bom, obrigada.
FINAL DA ENTREVISTA
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