P/1 – Boa tarde, seu Thrassyvoulos. Eu vou pedir para que o senhor fale o seu nome, local e data de nascimento.
R - Meu nome é Thrassyvoulos Georgios Petrakis.
P/1 - O senhor nasceu em que cidade, senhor Thrassyvoulos?
R- Na Turquia, na cidade de Esmirna.
P/1 - Por que o senhor nasceu lá? Os seus pais moravam lá?
R - Vivia lá até que fiz mais ou menos dois anos. Depois de dois anos nós passamos a morar numa ilha. O nome da ilha é Ios, no mar do Egeu. E lá eu fui crescer depois até os 20 anos. E permaneci depois, na Grécia, em outros lugares.
P/1 - E qual era o nome dos seus pais?
R - O meu pai chamava-se Georgios e a minha mãe (Aaliyah/Aglea?)
P/1 - E o que eles faziam?
R - Meu pai era agricultor e pescador. Ele tinha um barco porque ele precisava pescar na Turquia com um primo dele. Depois de tudo isso, esperava o pai entregar os peixes e fazia outra coisa. Eu ajudei o meu pai na agricultura, entendeu como é? E as coisas que ele me pedia para fazer, a pesca. Muitas vezes pescava os peixes e vendia. Depois, meu pai, no lugar que tinha mais serviço ele entregava os peixes para as pessoas, vendiam os peixes. Só isso eu posso dizer. Eu ajudava o meu pai na agricultura também. Eu não estudei muito porque a minha mãe morreu cedo. O velho tinha quatro crianças. Eu era o mais velho. Mais ou menos na idade de 10, 12 anos, eu abandonei a escola para ajudar o meu pai. E depois eu fui para outro lugar, trabalhei sozinho em um lugar que o meu pai tinha um conhecido. Ele me levou na loja dele e trabalhava em uma lanchonete. Ajudava o meu pai, até que fui soldado na Segunda Guerra Mundial e parei. Depois saímos e fomos para o centro da ilha. Mudamos porque lá era melhor para viver.
P/1 - Vamos voltar um pouquinho. O senhor chegou a conhecer os seus avós?
R - Conhecer os meus avós? Meus avós, eu vou dizer uma coisa. Conheci depois que cresci, depois da guerra, entendeu como é? Porque quando começou a guerra nós fomos, mais ou menos, depois da guerra eu morava na Ilha Ios, no centro. Depois da guerra, nós voltamos. Eu viajei, fui para o Egito e lá fiquei como enfermeiro, participei da guerra. Não podemos dizer que participei no ataque na guerra, um contra o outro, fiquei lá como enfermeiro.
P/1 - O senhor falou que saiu da Turquia. O seu pai saiu da Turquia e foi para Ilha Ios?
R - Meu pai saiu da Turquia e fomos para a Ilha de Ios. E eu estudei pouco para ajudar o meu pai e fiquei naquela ilha mais ou menos até que fui soldado.
P/1 - Mas me fala uma coisa, por que o seu pai saiu da Turquia e foi pra Ios?
R - Meu pai era agricultor, falei, e podemos dizer que era pescador. Ele tinha um primo e os dois pescavam juntos. Pescavam no mar turco.
P/1 - E ele saiu da Turquia para ir para Grécia por quê?
R - Meu pai? Meu pai entrava no mar turco e os turcos proibiram, mas meu pai sofreu um pouquinho. Os turcos pegaram, deixaram eles uns dois, três dias preso na Turquia, depois deixou livre. É, os turcos chegavam no mar grego, e nós fazíamos a mesma coisa com eles. Não existia aquela raiva, como da guerra. Não! Nós podíamos conversar e estava tudo bom entre eles. Eu não falava turco. Meu pai falava só um pouquinho, mas não falava direitinho. A minha mãe também.
P/1 - E o senhor lembra a casa que o senhor morava na Ilha Ios?
R - Lembro. A aldeia chamava-se (Efebiana?), de Ios. Lá eu estudei, lá ajudei o meu pai, até que aos 19, 20 anos, fui soldado. Depois que eu fui soldado nós fomos para a capital. Na capital de Ios. E depois, espera um pouquinho para dizer uma coisa... Onde fomos depois de lá? Fiquei lá, soldado, voltei, fiquei. Voltamos depois de terminar a guerra. Porque a guerra começou em 1939 até 42, mais ou menos. Vivia na Grécia mesmo.
P/1 - E o senhor foi ser soldado. O senhor fazia o que na guerra?
R - Na guerra eu era enfermeiro, não participei nos combates. Não participei. Só ficava no hospital, quando vinham os feridos.
P/1 - E o senhor ficou só na Grécia ou o senhor viajou também? O senhor foi para outros lugares?
R - Não, não, não. Não viajei, não. De jeito nenhum.
P/1 - O senhor falou para gente que tinha ido para o Egito. O senhor foi para o Egito?
R - De Ios ficamos no lugar chamado (Halandre?). Sai de lá, trabalhei naquele setor, em 1939. Fui soldado até em 43, quando terminou. E anos depois nós viemos para o Brasil. Depois.
P/1 - O senhor veio para o Brasil depois da guerra. E quem veio com o senhor?
R - No Brasil eu vim em 1961.
P/1 - E por que o senhor resolveu vir para cá?
R - Eu casei com uma mulher lá na Grécia, e ela tinha uma irmã no Brasil. Ela ficou sabendo, não sei onde, e reclamou para irmã dela por que ela não deu o convite para ela participar do casamento. A minha mulher falou para mim: "Olha, ela quer que nós viajemos para o Brasil. Vamos?" "Vamos! Por que não?" eu falei. Eu tinha uma casinha, vivia bem, tinha minha quitanda com o meu irmão Niko. E vivia bem! Mas eu decidi vir para conhecer a mulher. Viajamos para o Brasil em um navio que se chamava Frederico (Serra?). Um navio italiano. E fomos até Atenas, saímos do porto de Pireus e depois fomos... Não consigo lembrar agora.
P/1 - Não tem problema.
R - Eu vou dizer, dá licença. Viajei no Frederico (Serra?), depois passamos na Itália, Portugal e direto para Santos, aqui. Quando chegamos em Santos eles estavam esperando. Nos levaram e fomos para a casa deles. Eles moravam no Jardim Tremembé. A minha cunhada tinha uma lojinha que vendia miudezas, material de escola também. O marido dela tinha uma adega que vendia diversos vinhos, bebidas. Eu ajudei eles, mas quando passou uns quatro, cinco anos, eu queria fazer um serviço para ganhar dinheiro, porque tinha a minha família. A família sabe quem era? Era minha filha, a minha mulher e eu, os três. Eu dizia: "vou fazer minha casa um dia". Então, fui ser garçom no Acrópolis que estou agora. Naquela época era o restaurante "Cantinho Grego". Participavam muitas pessoas israelitas, gregos, e brasileiros, como é lá hoje. Fiquei lá bastante tempo naquele setor, trabalhei. Durante todo o tempo, chegou a hora para a minha filha, o filho da minha cunhada, a minha cunhada, a minha mulher. Eles viajaram para ir para Santos, passar as férias da escola. Foram lá na Praia Grande, alugaram uma casa. Foram tudo bem lá. No fim do mês iam voltar e eles queriam limpar a casa. Quando limparam a casa, eles pegaram um pano e passaram no botijão de gás. Eles não perceberam nada e quando foram dormir à noite lá em Santos, na praia, eles não sentiram nada. Tinha vazamento. Logo de manhã o menino acordou e queria sair para ir à praia. A praia não era distante, mais ou menos 30 metros. Pertinho, pertinho. A casa era no começo da praia. Ele acendeu a luz, saiu uma faisquinha pequenininha e explodiu tudo. A gente viu tudo isso, tiraram eles e levaram na Santa Casa, em Santos. Naquele dia, se não me engano, eu estava no Mercado Municipal, fazendo as compras. Quando cheguei com o meu carro lá no restaurante, o cara falou para mim: "Thrasso, você tem telefonema para ir na Santa Casa". Eu falei: "O que foi?". Eu me assustei! "Santa Casa? Eles deviam estar aqui a essa hora! Alguma coisa aconteceu". Eu desci rápido na Santa Casa, entrei lá dentro, e falaram: "Senhor Petrakis, a sua família está lá". Fui lá, vi a minha mulher, a minha cunhada, a minha filha e o menino. Falei para minha mulher, ela não podia falar, ela tinha problema, bronquite, e não podia falar. A minha cunhada também não podia, estava muito... O menino, o Niko: "Está tudo bem? Como está filho?". Ele não tinha coragem de falar uma história dessas. A única que me chamou foi a minha filha: "Pai, vem, quero te falar" "O que foi, filha?" "Sabe o que foi? Eu não to bem, mas eu estou menos. Precisa levar a mamãe! Tira ela daqui porque ela está muito, muito...". Não adianta. O pessoal não me deixou levar. Só consegui levar a minha filha no Hospital das Clínicas. E depois, no dia seguinte, eu fiquei sabendo que tinham morrido a minha mulher, minha cunhada e o menino. A minha filha ficou 40 dias no Hospital das Clínicas. O que eu ia fazer agora? Eu trabalhava no restaurante como garçom. O que eu ia fazer aqui no Jardim Tremembé? Eu falei: "O que eu vou fazer agora?". Eu fiquei sem jeito, então... Dá licença um minutinho, o que foi naquela época lá? Sabe que eu me emocionei um pouquinho, está certo? Eu lembro dessas coisas e não adianta... Depois de tudo, a minha filha estava no hospital, o padre da igreja, quando foram levar os mortos para sepultura eu não fui permitido de ir porque eu tinha problema no coração. O padre falou: “Não pode ir”. Levaram a minha mulher, a cunhada, o menino. Ficou a minha filha. E vocês não vão acreditar no que eu fiz! Eu queria ir ao Hospital das Clínicas para ver a minha filha. Olha aqui, uma doutora que cuidava dela, que eu fui padrinho no casamento daquela mulher, o nome dela é Fátima, o marido dela era grego, por isso eu fui padrinho do casamento dela. Então, eu me vesti como enfermeiro e fui lá na UTI. Perguntei: "Onde está a UTI?". Não sei como me deixaram ir na UTI aquele dia, porque na primeira vez que eu queria ir falaram "Não! Não pode entrar". Eu entrei, não vi a minha filha, vi um aparelho comprido assim. Ela estava coberta, não a vi. Vi o aparelho que estava ligado. Ela respirava, estava viva ainda. Sabe o que eu fiz? Falei com ela: "(Aleia?), seu pai está aqui. Vim aqui e não posso fazer nada. Você falou para cuidar da sua mãe, mas infelizmente não tem ninguém. Todo mundo morreu. Só você está viva". Eu fui no local onde ela estava, não vi ela. Ela tava coberta. Eu saí e fui lá na minha casa no Bom Retiro e no dia seguinte eu fui trabalhar. Não me deixaram nem para vê-la! Eu trabalhava, trabalhava. No dia seguinte eu voltei e fui ver ela, a minha filha, chegou lá o marido da Fátima, da médica, e falou para mim: "Thrasso, sua filha morreu". Sabe o que eu falei? "Será que ela me escutou?". Esse drama. E depois, o que eu vou fazer, sozinho? Eu devia procurar uma pessoa. Encontrei uma mulher que tinha duas crianças, ela morava em Ibiúna. Combinei com ela: "Você quer ficar?" "Eu fico com o senhor, eu cuido do senhor". Essa mulher era desquitada do marido, é uma mulher, não posso dizer, tenho que falar coisa, mas não vou falar nada agora. Capaz que ela vai ver e eu não quero falar. Então, falei para ela: "Você pega suas filhas e vem na minha casa. Vou criar essas crianças". Chegaram as crianças, botei na melhor escola no Bom Retiro, como chama aquela? Santa Inês! Chamava-se Santa Inês. Por dez anos eu vivi com aquela mulher, duas lindas meninas. Ela conheceu. Depois aconteceu uma coisa, que a mãe delas queria tirar de mim as crianças. Eu não queria, mas ela: "Thrasso, você viu uma coisa incrível" "O que foi?". Não adianta. Sabe o que foi? Porque eu tinha uma filha com ela também. Porque quando chegava um dia no restaurante, uma criança passava mal na casa e eu falei para ela: "Vocês foram ver a criança?". E eu fui. Quando a mãe dela viu tudo isso, ela falou para mim: "Eu levo a criança e levo minha filha. Você, Thrasso, não dá! Você quer acordar e trabalhar, você tem restaurante para sustentar. Eu levo ela". A terceira vez, encontrei uma outra mulher depois, prima da moça que trabalhava comigo. Não é, filha? A mãe delas. E a outra está na Grécia com a mãe. E viajamos, ela viu elas, chamei, telefonei várias vezes para ir e ela fala: "Eu quero te ver, eu vou te ver. Um dia eu vou te ver. Não posso ir agora porque a Catarina", a minha outra filha, "ela estuda e não pode deixar o estudo". Minha vida depois foi normal, até hoje.
P/1 - Vamos voltar um pouquinho.
R - (risos). Uma história, né?
P/1 - É, uma história bonita.
R - Muito emocionante, não?
P/1 - É, vamos voltar um pouquinho. O senhor falou que antes do senhor imigrar para o Brasil, na Grécia, o senhor tinha uma peixaria e uma quitanda, é isso?
R - Uma peixaria e uma quitanda.
P/1 - E o que o senhor vendia lá? Conta pra gente.
R - Peixe e diversas verduras.
P/1 - E quem fornecia os peixes e as verduras pro senhor?
R - O peixe? Meu pai!
P/1 - Ah, o seu pai pescava e fornecia.
R - Pescava e fornecia. Como sócio dele, eu vendia os peixes na mesma aldeia. Depois o meu pai viu como eram as coisas, encontrou uma outra pessoa e mandou para outro lugar para eles venderem. Vivemos muito bem, graças a Deus! A casa não era nossa, mas para nós o aluguel era tudo bem.
P/1 - E quantos irmãos o senhor tinha?
R - Eu tinha (Zoan, Nikos e eu, Thrassos. E uma mulher. O nome dela era Theodora, Dora?). Ela vive e está na Grécia. Meu irmão estava na África e voltou. Ele estava em Pidor, deixou o serviço para o filho dele, Iolos. Eu telefonei para minha irmã e ela falou que o meu irmão saiu de lá porque o filho dele não podia sozinho, precisava do pai. E estão pai e filho lá agora.
P/1 - O senhor chegou no Brasil e o senhor me falou que desceu em Santos. Como era Santos? O senhor lembra qual foi a impressão que o senhor teve de Santos?
R - Não, eu não conhecia. Quando eu cheguei no Brasil, por isso que eu falei, não procurei serviço porque tinha que ter contato com os brasileiros, para aprender a língua. Eu pensei: "sem aprender a língua brasileira eu não consigo trabalhar". Mas posso dizer uma coisa? Um amigo meu falou: "Mas tem grego lá" "Mas eu não posso falar só grego, lá no restaurante vai entrar judeu, grego, armeno, turco, húngaro. Lógico, preciso aprender português porque todo mundo fala, e o ambiente que tem no restaurante, é Brasil! Está no Brasil, é português". E aprendi rápido! Em dois anos mais ou menos eu falava. Quando eu falava, eu desci e peguei serviço no restaurante aqui, que você me viu. Eu tenho lá no restaurante quase 47 anos.
P/1 - Como era o nome do restaurante?
R - O restaurante não é meu, mas eu trabalhei lá. Comecei a trabalhar nele e estou até hoje.
P/1 - Como era o nome do restaurante?
R - Restaurante Cantinho Grego. Depois eu dei o nome Acrópoles porque é cultura, entendeu como é?
P/1 - E o senhor começou a trabalhar como garçom?
R - Sim.
P/1 - Qual era a comida que se servia lá?
R - A comida, podemos dizer que a comida que eu tenho hoje é a mesma comida de sempre. Todas as carnes, aves, peixes, frutos do mar, verduras diversas. Verduras diversas, pode fazer um charutinho de repolho, um charutinho com folha de uva, pode fazer com couve, mais soltinho. Eu faço que sai bastante. Está certo? Você pode ir lá e experimenta. É uma delícia!
P/1 - E o senhor tem algum prato típico grego? Qual é o prato típico?
R - Eu faço tudo o que eles fazem. Mas agora não faço nada. Faz, mais ou menos, quase 30 anos que não entro na cozinha.
P/1 - Mas que tipo de prato grego o senhor servia lá?
R - Mussaká, lasanha, carneiro assado, peixe ao forno, peixe frito, charuto de repolho, charuto de couve. Várias coisas! Feijão, arroz, sopa de feijão, grão de bico, tudo isso.
P/1 - O Mussaká é um prato grego?
R - Mussaká, essa palavra é turca, não é grega, tá certo? Mas nós vivemos na Turquia também.
P/1 - E como é esse prato?
R - Para fazer esse prato é fritar batata, cortar fatiada. Não muito fina, senão não dá. Um pouquinho grossa, a batata assim. Frita, põe no escorredor e deixa escorrer o óleo para fazer o mussaká. Junto com a batata você vai preparar carne moída, está certo? Prepara a carne moída. Depois de fazer tudo isso, você vai pegar berinjela e vai fritar berinjela também. Agora, espinafre, vai cozinhar espinafre para fazer mussaká de espinafre. Que tem gente que gosta mais do de espinafre e menos da mussaká de carne. Você vai fazer batata, berinjela e vai jogar em cima da carne moída e logo depois batata, berinjela e carne moída denovo. E vai fazer um creme. Creme feito com leite. Deixa ferver, pega manteiga, joga algumas colheres de farinha, ferve o leite, joga tudo isso, mexe, mexe e faz o creme. Esse creme vai jogar em cima da bandeja e põe no forno. Acabou!
P/1 - O senhor disse que começou a trabalhar nesse restaurante como garçom ali, né? Quem fazia as compras para esse restaurante?
R - Eu
P/1 - O senhor mesmo?
R - Eu, com o cozinheiro que eu encontrei lá e que me deu o serviço. Ele faleceu de câncer, coitado.
P/1 - Como era o nome dele?
R - Constantino
P/1 - E onde vocês iam comprar os ingredientes para o restaurante?
R - No Mercado Municipal, o supermercado Carrefour, Makro, Sam's Club que está pertinho lá e vários outros.
P/1 - O senhor fazia as compras todos os dias?
R - Depende. Só quinta que eu fico e não vou, porque o carro não sai na quinta. Podia ir, pegava o táxi e trazia, mas eu compro duas vezes mais porque o carro não sai na quinta-feira. Durante a semana eu vou lá. De vez em quando, se falta alguma coisa, sábado e domingo tem feira. Dou um pulinho na feira e compro.
P/1 - Quando é que o nome mudou do restaurante de Cantinho Grego para Acrópoles? O senhor lembra mais ou menos em que época que mudou o nome do restaurante?
R - O nome Acrópoles como deu? O nome Acrópoles foi Péricles que deu, no ano 364 antes do Cristo.
P/1 - Mas o senhor deu o nome do restaurante por quê?
R - Acrópoles significa uma coisa: Acro significa ponta da cidade, polis significa cidade. Acrópoles. Como foi construída Acrópoles? Foi naquela época. Sabe o que eles faziam? Eles tinham uma talhadeira e um martelo e fizeram a melhor obra. O mármore grego é o melhor mármore que tem, entendeu como é? As colunas e tudo isso que você vê. Então, como ela foi construída na ponta da cidade, acro de polis, acrópoles. Deu o nome porque está mesmo na ponta da cidade. Você viu a Acrópoles, não viu? Mas não viu a legítima Acrópoles. Quando vocês forem lá eu vou mostrar. Porque aquela que está numa parede lá, no fundo, em cima... A cultura grega foi destruída na 1ª Guerra. Foi destruída na guerra. Agora quando você for lá eu vou te mostrar como está feita, sem mexer nada com isso.
P/1 - O senhor trabalhou sempre como garçom ou o senhor teve outra função no restaurante?
R - Não. A minha função no restaurante é atender o cliente. Porque eu sei que precisa conquistar o cliente. Se você não consegue conquistar o cliente, você não precisa fazer nada, entendeu como é? Todos nós que vivemos aqui, cada um tem um comportamento diferente do outro. O outro está menos nervoso, mais nervoso, diz alguma coisa. Pede desculpa, não fica nervoso, atende bem o cliente. Você faz uma salada para ele, mas precisa, olha aqui, mexer com a salada, dar paladar na salada! Para ele comer e dizer para você na primeira vez. Eu falo: “A próxima vez que vocês vierem, eu faço uma salada para vocês”. Sabe o que fala para mim? “Só você sabe fazer salada”. Mexer. Não faça economia de azeite, não faça economia! Evita sal! O resto é limão, azeite, orégano, pode jogar em cima mesmo! Porque eles fazem assim: Chega salada na mesa, e tatata. Não senhor! Não é assim! Precisa mexer mais ou menos dois minutos a salada, misturar o caldo das ervas com limão e azeite. É lógico! A boca sente o paladar.
P/1 - O senhor comprou o restaurante ou não?
R - Não, não. Eu queria comprar, mas a mulher dele não queria vender. O judeu só compra, não vende (risos).
P/1 - E o senhor trabalhou lá durante toda sua vida, nesse mesmo restaurante?
R - Direto, direto, direto. Não saio de lá! É meu serviço. Meu trabalho. O trabalho é o que me deixa mais alegre! Conversar com o cliente, oferecer alguma coisa para o cliente.
P/1 - O senhor chegava que horas para trabalhar?
R - De manhã acordo às seis e meia saio. Quinze para sete vou no restaurante, tomo um cafezinho. O carro está lá na porta do restaurante, eu pego o motorista e vamos embora para as compras direto.
P/1 - E o senhor vai às compras todos os dias?
R - Todos os dias. Só quinta que não vou. Um dia não vou! Mas se falta alguma coisa, tem sempre feira. Vou na feira e compro. E armazena aqui no restaurante, muito pertinho. Vou lá, pego um pouquinho de alface, agrião, essas coisas daqui. Dois quilos de tomate.
P/1 - E como era a forma de pagamento antigamente? As pessoas pagavam com dinheiro, com cheque?
R - Antigamente? Dinheiro. Cruzeiro. Saiu o cruzeiro, chegou o real...
P/1 - Mas antigamente as pessoas marcavam no restaurante, tinha uma caderneta pra eles anotarem?
R - Tem marcado na contabilidade. Ele marca tudo direitinho: as férias, as folhas que ele tem. Está marcado tudo.
P/1 - Mas por exemplo. Antigamente as pessoas iam lá, almoçavam e deixavam fiado para pagar depois ou não?
R - Não. Ultimamente eu abri um restaurante para as minhas filhas. Essa menina estava junto com elas. A outra viu o dinheiro, pensava que todo dia ia ter aquele dinheiro. Porque suponha, no sábado, domingo e feriado o serviço está cinco vezes maior. Agora, dia de semana, segunda e terça, infelizmente não dá lucro para mim. Sábado, domingo e feriado que dá lucro e ganha uma coisinha, entendeu como é? É assim. Ela cuidou, trabalhava com ela, mas ela tá comigo agora. Está uma beleza! É uma santinha a moça, a última da família. Não, a irmã dela também é muito boa. A mãe dela ficou na Grécia porque queria que eu abrisse um restaurante na Grécia. Eu falei: “Ora filhinha, não posso passar aquele restaurante! Aquele restaurante tem tradição! Agora eu tô famoso aqui dentro! Tive na Assembléia e a moça: "olha, você é famoso!". (risos). Deixa pra lá.
P/1 - O senhor falou que antigamente as pessoas pagavam em dinheiro. E hoje eles pagam com o quê?
R - Pagam com cheque, dinheiro. Depende.
P/1 - O senhor usa muito cartão de crédito lá ou não?
R – Lógico! Tem, tem. Dez dias. Depende que compra, pelo valor da mercadoria, entendeu? Eles deixam. Graças a Deus, eu posso falar uma coisa? Suponha hoje, caso aconteça alguma coisa que o restaurante não é mais meu, eu posso abrir. Tenho cara! Tem pessoas que falam para mim: "Dois ou três meses você não paga, depois paga e a gente desconta um pouquinho e pouquinho".
P/1 - Quem frequentava o restaurante antigamente?
R - No começo? Gregos e israelitas. Grego e judeu.
P/1 - E agora, como é que está?
R - Agora está bem, graças a Deus! As mesmas pessoas.
P/1 - Os judeus...
R - Tem israelita que tem 50 anos no Bom Retiro, entendeu como é? A maior clientela que eu tive era mais judeu do que grego. Eu vivi em Israel. Meu olhos abriram para eles. Um comércio que está nas mãos deles, como comerciante, como família, não posso dizer nada. Excelentes pessoas! Pessoas do comércio. Tem muitas pessoas que falam alguma coisa, eu não falo nada porque eu vivi com eles, em Tel Aviv, __ __________, Beitar Illit, as cidades que eu conheci na época que eu vivi. Era uma beleza lá. O judeu é uma pessoa, um comerciante, muito famosa, muito bom! Sabe do que eu não gosto? Não gosto de preguiçoso! (risos). Quer agradecer? Agradece! Tudo bem. E tem um prédio que muitos pobres vão lá, dão um real compram comida e vão embora. Eu vi o israelita, vi o judeu, com as pessoas que dormem na rua, trazer um cobertor e jogar em cima deles. Brasileiro é outra coisa. Brasileiro não falo nada. Imigrante que vem aqui e aprende a falar português, e abandona esse país, melhor que não vinha! Tô falando sério! Brasil dá tudo para o imigrante! Tudo, tudo, tudo para progredir e ir pra frente. Esse país não se encontra, não se encontra! Minha mulher está na Grécia e eu estou no Brasil.
P/1 - Deixa eu perguntar uma coisa para o senhor.
R - Não, tô falando sério. Eu tive muito apoio e muito carinho aqui. Gente importante, quando eu abri o restaurante, falou para mim: "Olha, qualquer coisa estamos aqui, não se preocupe".
P/1 - Deixa eu perguntar uma coisa para o senhor. Quando o senhor chegou no Bom Retiro, como é que era o Bom Retiro? O que tinha?
R - O Bom Retiro, eu escutei que, falaram para mim, lá atrás, 60, 80 anos era tudo mato. Tudo aquilo lá! Entraram os primeiros imigrantes, compraram terrenos e construíram palacetes. Três colônias ficam no Bom Retiro. Agora chegou os coreanos. Temos que pedir palmas para eles. E sabe o que parece? A colônia coreana parece uma família! Todos os coreanos. Porque tenho clientes no restaurante e eles estão estabelecidos. Eles têm a loja, um ajuda o outro. Pela primeira vez eu vi na José Paulino uma loja separada em dois porque chegou outro coreano, não sei se era parente, o que era, e ele ofereceu para o outro trabalhar. Muito, muito, muito cuidado um com o outro! Uma colônia muito unida. A família coreana é uma digna família, muito bom! Gente que, ó! No Brás a mesma coisa. Os coreanos salvaram o Bom Retiro. O Bom Retiro estava numa situação muito ruim, o comércio tinha caído bastante. Acredita que veio coreano, que alugou... Estou falando muito sério. Uma colônia muito boa!
P/1 - E o que aconteceu com a colônia grega que ficava no Bom Retiro? Para onde ela foi?
R - A colônia grega, muitas pessoas foram embora. Não sei por que foram. Porque eu viajei para a Grécia, participei de um aniversário, uma casa com eles lá e eles falaram para mim: "Você é muito esperto. Era pra você voltar para a Grécia, sua mulher está lá. Por que você não foi?". Não fui porque eu gostei daqui, meu serviço é aqui! Eu não posso acabar com o restaurante para abrir outro restaurante. Aqui tá tudo bem pra mim. Eu gostei mais do Brasil, “esqueci que sou grego”, eu falo. Estou falando sério. Aqui me dei muito bem, para que eu vou para a Grécia? Os que foram para Grécia, eles querem voltar, mas não tem agora. Não é assim.
TROCA DE FITA
R - Agora, ultimamente, toda a Europa está em crise. Chega gente de lá e fala para mim. "Como tá?". Eu telefonei para minha irmã na Grécia: "Como está Theodora?" "Existe crise? Aumentou as coisas? O custo de vida, como tá?". Ela falou para mim: "Eu vivo como vivia, não vejo diferença". Há pessoas que falam que tá melhor ou pior, a Grécia é uma beleza. Chegou um da Grécia, a minha filha viu ele hoje. Três meses na Grécia, sabe o que ela falou? "Existe um pouquinho de crise, mas não é tanta. Todo mundo vive". O clima é bom. Vocês não conhecem a Grécia?
P/1 - Eu conheço.
R - Já foi? Os três?
P/1 - Deixa eu perguntar uma coisa para o senhor. O senhor falou que a colônia grega hoje diminuiu muito no Bom Retiro. E a colônia judaica? Também é a mesma que o senhor conheceu lá atrás ou mudou também? Diminuiu a colônia judaica lá?
R - Eu acho que está igual. As três colônias são muito boas, o Bom Retiro ficou muito bonito. Não tinha tanta vitrine como tem hoje, não tinha tanto movimento como tem hoje. Melhorou bastante.
P/1 - O que mudou no comércio? É o mesmo tipo de comércio que tem?
R - É o mesmo tipo de comércio que tinha antigamente: roupas, máquinas de costura e várias coisas.
P/1 - O restaurante que o senhor trabalha, ele fazia algum tipo de propaganda para chamar os clientes antigamente?
R - Se não fossem as entrevistas que eu dou direto, não tinha tanto serviço. Não era tão conhecido como estou hoje. Essa aqui é uma propaganda enorme, alma do negócio! Ninguém quer dinheiro. Vem comer, beber. Vamos sentar! Eu falo: "Vamos sentar, ninguém vai embora. Vamos comer e beber". A Mônica Bergamo, pelo amor de Deus, não falo nada! Ela fez uma propaganda enorme para mim. Ela falou para mim, quando você for lá eu mostro o quadro que está escrito lá: "Você esqueceu que tem um restaurante aqui no Bom Retiro que, se fosse nos Jardins, era um dos melhores? O preço é muito bom, a comida é fantástica!".
P/1 - E que outros tipos de restaurante tem no Bom Retiro? Tem outros tipos de restaurantes lá ou não?
R - Tem coreano, grego, turco, italiano, francês. Tem todo tipo de restaurante no Bom Retiro. Chinês (risos).
P/1 - E me fala uma coisa, como é o seu dia a dia hoje? Como é que o senhor trabalha hoje?
R - O meu serviço é acordar de manhã, fazer as compras, voltar no restaurante e depois que começou o serviço, atender o cliente, conversar com o cliente, perguntar como ele é, se gostou ou não da comida. Todo mundo fala: "É uma delícia, delícia. Melhor estraga!", falaram para mim. "Parabéns, você tem uma cozinha que quem entra aqui volta". Falando sério.
P/1 - E o senhor fica até que horas lá, mais ou menos?
R - Até onze horas. De vez em quando fico até meia-noite, mas é difícil.
P/1 - E é servido almoço e jantar no restaurante.
R - Almoço e jantar.
P/1 - Quem é o cozinheiro lá hoje?
R - Tem quatro cozinheiros lá hoje.
P/1 - E são descendentes de grego também?
R - Não, mas eles estudaram bastante. Os quatro que estão agora: o Mario, o Jairo, o Jair e o Cido. Se eles forem à Grécia, abrirem um restaurante e não falarem que são todos brasileiros, não falarem nada, ninguém vai perceber que eles são estrangeiros. Todo mundo vai falar que a comida é grega! Tem gente que fala para mim, eu não sei porque eles falam isso, porque na Grécia tem restaurante de categoria: “Eu comi na Grécia e posso falar, eu comi um prato melhor aqui! Experimentei um prato melhor que lá! Muito bom!” eles falam.
P/1 - E o senhor já voltou para Grécia quantas vezes?
R - Umas cinco, seis vezes. Não dá mais para ir. Eu vou porque tenho terreno na Grécia, da minha mulher que faleceu. E a casa que eu tenho lá, a mãe delas mora lá. A casa é deles. Se eles quiserem vender amanhã e voltar para o Brasil eu falo para ela: "Você aluga e vem para o Brasil". Porque eu gostei do Recife. Fui ao Recife e adorei! Porto de Galinhas é uma praia maravilhosa para viver lá e passear. É uma delícia! Não abandono o Brasil, de jeito nenhum.
P/1 - Hoje o senhor continua comprando no Mercado Central ou não? O senhor compra mercadoria para o restaurante no Mercado Central?
R - Eu compro mercadoria para gastar. Só ela. Eu sei o que vou gastar. Segunda, terça, quarta, quinta é uma coisa. Agora, feriado, sábado e domingo, outra coisa. Para ter sempre fresquinha. Eu gasto tudo para levar amanhã fresquinho. Suponha: alface, agrião, cebolinha verde, tudo isso. Repolho, couve, tudo isso deve ser fresquinho. Termina? Amanhã tem outra! Se vai sobrar não dá mais. Agora, eu faço charutinho com folha de uva, com couve, com repolho. Agora eu digo, o mussaká de espinafre que eu tenho lá, aquele muita gente fala para mim: "Eu gosto muito do mussaká com espinafre". Uma delícia! Sai bastante. Você vai lá, eu vou atender!
P/1 - Hoje o senhor vive com quem? Mora com quem?
R - Ah, eu moro com a minha filha. Só com ela.
P/1 - E como é o nome dela?
R - Nick (risos).
P/1 - E a Nick faz o quê?
R - A Nick sai de vez em quando, faz um passeio e volta. A Nick, eu falo para ela: "Nick, chegou a hora de casar para eu poder descansar” (risos).
P/1 - Ela trabalha com o senhor?
R - A Nick fala para mim: "Pai, eu sei! Não se preocupe com nada" "Filha, você sabe que eu tenho 95 anos, que eu não tenho neto ainda. Casei três vezes! O que é isso, filha? Seis crianças passaram na minha vida, tudo bem. A primeira vez que eu casei, uma. A segunda que casei eu criei duas e fiz uma com ela. A terceira, fiz duas meninas. Eu não sou avô ainda, não tenho neto!(risos). Ela fala: "Eu vou te dar um netinho, não se preocupe" (risos).
P/1 - Você vê a sua filha do segundo casamento sempre ou não?
R - O segundo casamento, eu vou dizer uma coisa. Foi a Célia, eu tive uma filha com ela. E criei duas delas. Vivi com aquela mulher por dez anos. Era uma dona de casa maravilhosa. Quando ela começou a beber, pelo amor de Deus, você fica calado e não fala nada (risos).
P/1 - Mas o senhor vê as suas filhas ou não?
R – Sim. Está tudo bem lá. Um dia chegou o pai delas. O pai delas, um senhor muito forte, bonito, falou para mim: "O senhor vive com a Célia?", eu falei: "Vivo" "Está tudo bem com ela?" "Tá bem". Ele falou: "Olha aqui, vou pedir um grande favor: posso ver minhas filhas?". Ele ficou na porta. "O senhor pode tomar cafezinho?". Ele falou: "Traz minhas filhas para eu ver?". "Célia, dá as duas meninas para mim. O pai delas quer ver as crianças. Põe um vestidinho." "Não, ele vai me levar!" "Leva nada. Eu conversei com a pessoa. Muito boa. Eu logo percebo. Você que é maluca! Dá pra mim". Ela deu a criança, eu levei lá na porta do restaurante. Ele abraçou, chorou, levantou e falou para mim: "Isso o que você fez, duvido que brasileiro fazia". “Tem gente boa. Não só eu que fiz. Tem gente boa" "Eu nunca vi minhas filhas tão bonitas como hoje!". E sabe o que a filha dele falou? Lia e Dita. E a Lia, a mais velha, falou: "Ô pai, pai é aquele que cria, não aquele que faz". E eu: "Cala a boca, não fala assim com seu pai. Seu pai é muito bom, filhinha. Sua mãe que está um pouquinho... (risos). Ela tem um jeitinho diferente de nós”. Acabou (risos).
P/1 - Hoje o senhor fica no restaurante todos os dias?
R - Direto, direto. Eu fico.
P/1 - Quais foram as lições que o senhor tirou ao longo do trabalho no comércio, no restaurante. O que o senhor aprendeu?
R - Aprendi como fazer o serviço sem erro. Atender ao cliente e não ficar apavorado, porque que ele vai sair. Lógico que ele vai sair! Ele sabe o que está escrito lá: até às onze. E vai embora. Tenha paciência! Lá na cozinha eles se preparam e eu: "Calma filha, ainda não é hora. Deixa sair os últimos clientes, depois nós vamos embora”. Dez minutos depois está tudo bem". Isso que eu faço.
P/1 - A comida que o senhor prepara para o almoço, depois o senhor prepara um outro tipo de comida? Um outro cardápio para à noite ou é o mesmo cardápio?
R - Eles preparam alguma coisa para eles comerem. Supunha, eles fazem alguma coisinha. Come aquela linguiça e aquela saladinha que eles fazem, é diferente. É nortista, gosta de fazer aquela salada que ele gosta, batata com linguiça, come com arroz, com purê de batata. E come sempre bem.
P/1 - O cardápio que o senhor serve na hora do almoço é diferente do cardápio que você serve à noite ou não?
R - É diferente, é diferente. Mas hoje podemos dizer, eu posso fazer um bacalhau ao forno com batata, amanhã eu faço um bacalhau frito com batata e purê com alho. E faço bacalhau com molho branco, e bacalhau com molho vermelho de tomate. Agora faço peixe frito, peixe ao forno e peixe grelhado.
P/1 - Qual é o prato que as pessoas mais gostam lá?
R - Eu gosto de peixe! Eu cresci com peixe. Quando era menino, na minha casa, carne entrava duas vezes por mês. Peixe quase todo dia. Porque o peixe que meu pai trazia, não falo nada. Peixe, peixe, peixe, peixe direto! Frito, ao forno, maravilha. Para comer peixe, tem que comer peixe que sai hoje! Se deixou dois, três dias depois já não pode comer mais aquele peixe.
P/1 - Se o senhor pudesse mudar alguma coisa no comércio de alimentos, no restaurante, o que o senhor mudaria?
R - Eu podia mudar.
P/1 - O que o senhor mudaria?
R - Podia fazer roupa, podia fazer sapataria, podia fazer várias coisas. Agora não sei, podia fazer qualquer tipo. Podia fazer uma quitanda e vender só fruta, verdura. Aos 14 anos eu tinha armazém, e tinha um lugar aqui, tinha uma escada, subia e depois tinha uma parte. Comecei com feijão, arroz, azeite, vendia açúcar, vendia várias coisas. Vendia peixe do meu pai. Meu pai falou para mim: "Mas você é demais, Thrasso." "O que foi?" "Você vendeu mais caro que o homem que deu o peixe" "Pai, ele quer comprar o peixe. Você traz aí, ainda tá vivo. To falando sério! Aquele peixe, olha aqui, é um peixe assim, paga um ou dois reais a mais, eles pagam! Acabou”. Peixinho fresquinho. Tem o peixe enguia, conhece ele? Parece cobra. Sabe o que foi? Aquele peixe faz uma sopa incrível. Meu pai cortava assim, a guia, sangue. Eu pegava assim na enguia, fazia assim. E puxava, puxava, puxava, foi! Todo o osso que ela tem sai no rabo, depois corta o rabo e joga fora. Pode comer o peixe depois, como se come um figo! Tô falando sério.
P/1 - Tem um jeito especial para limpar os peixes? Cada tipo de peixe tem um jeito especial de limpar ou não?
R- Tem, tem diferença. O peixe que eu conheço, eu ponho a minha mão assim, e abro na orelha do peixe. Peixe eu conheço de longe! “Aquele peixe pode me dar”, “Aquele não quero nem de graça”. Um dia eu entrei no Sam's Club, estava olhando o peixe, tinha mais ou menos, posso falar? Três, quatro metros de peixe lá em cima. Mais ou menos 300, 400 quilos de peixe. Eu olhava e uma pessoa falou para mim: "Como está o peixe?", e falou: "Sardinha" "Que sardinha? Tem garoupa, tem tudo aqui. Sabe de uma coisa? O senhor o que é?” “Eu sou o gerente dessa parte aqui”. Eu falei: "Você não tem vergonha de vender esse peixe?", falei para ele. "Esse peixe para vender? Se estivesse na minha terra esse peixe e se passasse a alimentação pública e eu não soubesse o que fazer, jogava querosene e ia embora!". E era obrigado a jogar o peixe. Esse peixe não dá nada! Estou falando sério, tira esse peixe daqui". Filha, depois de uma semana, esses dois rapazes chegaram no restaurante grego. Chegaram aqui para comer e um falou: "O senhor falou para mim que o senhor..." "O que vai comer? Pode deixar que eu vou trazer dois bacalhaus fresquinhos, fresquinhos para comer". Sabe o que ele falou? "Você tem razão, esse peixe eu compro". Tem gente que não sabe comprar, vai comer aquele peixe e você vai ficar doente. Tô falando sério, precisa saber comprar peixe! Do lado do restaurante tem: uma loja de sapato, o lugar que eu alugo. E do outro lado tem, para fazer, uma lojinha, qualquer coisa. Chegou no Acrópoles e queria fazer uma lanchonete. Um dia eu vi uma, esqueci o nome delas porque eu não compro nunca, esqueci o quê, peixe. E falou: "Vem cá, o que é aquele lá? O peixe grande? Você sabe comprar peixe? Tira aquele peixe, vai enfestar sua loja! Tira! Se passa uma pessoa que conhece peixe, não entra mais aqui". Tirou. E falei: "Sabe de uma coisa, você não tá indo bem" "Por quê?" "Você não está trabalhando aqui", em três meses fechou. Eu sabia.
P/1 - Para finalizar, eu queria que o senhor falasse para mim qual é o seu sonho hoje?
R - Sonho? Meu sonho. Vou falar uma coisa agora, ninguém vive sozinho. Essa menina, eu quero que ela viva, porque viver é a melhor coisa que tem. E tem uma idade, 24 anos. Encontrar uma pessoa, casar, levar o restaurante junto com ele e, se quiser mudar, pode vender o restaurante e com o valor poder abrir uma loja qualquer, para ela poder viver. E eu também preciso de uma pessoa para descansar, porque quando a minha filha casar eu não vou ficar junto com eles. Deixo que eles tenham a liberdade dentro da casa deles, de fazer o que querem, como querem. Uma visita eu posso fazer, mas ficar na casa direto eu não quero. O amor que eu tenho vai ter amor PR\a duas pessoas, o marido dela e ela. Estou falando sério.
P/1 - E o que o senhor achou de ter participado dessa entrevista para falar da sua experiência como comerciante?
R - Comerciante? Sempre falo para atender bem, não fazer coisa que deixa o cliente decepcionado e, se reclamar, tudo bem. Saber como atender o cliente, oferecer uma cadeira para ele sentar, procurar saber se o cliente tem na mesa tudo o que ele vai utilizar, tudo isso. E se o cliente reclama de qualquer coisa, se diz: "Opa, alguma coisa caiu", troca o prato dele. Precisa saber que o pior cliente para mim, sabe o que é? Precisa de mais, mais e mais cuidado. Precisa prestar mais atenção! Isso que eu falei para eles.
P/1 - Tem alguma coisa que eu não perguntei e o senhor gostaria de contar para gente?
R - Vou ver se vou lembrar de alguma coisa. Lá na Grécia? Não. Na Guerra? Não. No serviço? Nada. Sempre vivo alegre, entendeu como é? Sempre tenho paciência. Estou falando sério, tenho muita paciência. Mesmo que não me entendem eu não respondo, entendeu como é? Mas você não fala nada? Eu sei que não entendi. O meu silêncio é a minha resposta eu falo para ele (risos). Ter muita paciência.
P/1 - Eu queria agradecer a sua participação. Muito obrigado pelo senhor ter participado e ter dado essa entrevista.
R - Eu vou lá: “Psit. Filha, não esquece!” Ela pegou um líquido, me colocou na orelha toda noite. Ontem não me colocou, esqueceu. Três dias depois, cheguei no Samaritano e falei: "Quero fazer uma lavagem". Ela falou para mim: "Pega um aparelho, pai". “Deixa eu fazer a lavagem! Se com a lavagem estiver indo bem, eu não preciso do aparelho. Se a lavagem não der certo, é capaz que eu coloque um aparelho.” Tô falando sério. Porque estou falando com a senhora aqui e eu falo com muitos clientes. Eu mesmo que eu vou falar! O cliente fica sozinho, eu vou lá e pergunto: "Como está o senhor? Está tudo bem? Gostou da comida?" "Tudo bem!". Saber se precisa de alguma coisa.
P/1 - Eu queria agradecer pelo senhor ter participado da entrevista e pelo senhor ter vindo até aqui. Muito obrigada.
R - Nada, nada. Qualquer coisa eu tô presente (risos).
P/1 - Então está bom, obrigada.
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