Identificação
Meu nome é Armênio Mendes, eu nasci em Portugal, em Chão de Couce, conselho de Ansião, no distrito de Leiria, em dia 02 de agosto de 1944.
Família
Meu pai é Adriano Mendes e minha mãe Maria do Carmo Medeiros. O meu pai era um pequeno empresário da construção civil e a minha mãe era do lar, ela não tinha atividade em Portugal.
Infância e profissão exercida em Portugal
Eu vivi em Portugal até os 18 anos de idade. Eu passei a minha infância lá em uma aldeia, chamada Chão de Couce, lá no distrito de Leiria, fiz a escola lá e comecei minha atividade também até profissional. Eu aprendi uma profissão, que era marceneiro, em Portugal, foi minha atividade até vir aqui para o Brasil, com 18 anos.
Descrição da aldeia
Olha, eu me lembro muito bem, até porque eu hoje mantenho uma casa minha, que eu construí há quinze anos. Eu passo pelo menos um mês por ano lá na minha aldeia, eu estive lá agora, há dez dias atrás, passo um mês por ano lá. Embora a aldeia seja totalmente diferente, porque o desenvolvimento chegou lá nas aldeias também, hoje é bem diferente. Mas nós mantemos ainda a casa onde eu nasci, que é a casa da minha mãe, exatamente igual ao que era quando nós nascemos. Hoje nós temos, eu e meus irmãos fizemos uma casa, cada um a sua casa à volta da casa dela, mas aquilo ali é um museuzinho que a gente preserva até hoje e vai conservando. É claro que é diferente: antigamente, quando eu nasci, nós tínhamos uma cerca viva em toda a volta das propriedades que existiam ao lado das casas, hoje são muros. Antigamente, não havia estradas asfaltadas, hoje é tudo asfaltado. Não havia esgoto, hoje nas aldeias portuguesas, tem esgoto em todas as aldeias, em todas elas. Não havia água encanada na época, nem sequer luz elétrica existia, isso quando eu nasci, há 50 e tantos anos atrás. Hoje o desenvolvimento chegou lá e mudou-se completamente. O que não mudou foi a casa onde eu nasci e meus...
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Meu nome é Armênio Mendes, eu nasci em Portugal, em Chão de Couce, conselho de Ansião, no distrito de Leiria, em dia 02 de agosto de 1944.
Família
Meu pai é Adriano Mendes e minha mãe Maria do Carmo Medeiros. O meu pai era um pequeno empresário da construção civil e a minha mãe era do lar, ela não tinha atividade em Portugal.
Infância e profissão exercida em Portugal
Eu vivi em Portugal até os 18 anos de idade. Eu passei a minha infância lá em uma aldeia, chamada Chão de Couce, lá no distrito de Leiria, fiz a escola lá e comecei minha atividade também até profissional. Eu aprendi uma profissão, que era marceneiro, em Portugal, foi minha atividade até vir aqui para o Brasil, com 18 anos.
Descrição da aldeia
Olha, eu me lembro muito bem, até porque eu hoje mantenho uma casa minha, que eu construí há quinze anos. Eu passo pelo menos um mês por ano lá na minha aldeia, eu estive lá agora, há dez dias atrás, passo um mês por ano lá. Embora a aldeia seja totalmente diferente, porque o desenvolvimento chegou lá nas aldeias também, hoje é bem diferente. Mas nós mantemos ainda a casa onde eu nasci, que é a casa da minha mãe, exatamente igual ao que era quando nós nascemos. Hoje nós temos, eu e meus irmãos fizemos uma casa, cada um a sua casa à volta da casa dela, mas aquilo ali é um museuzinho que a gente preserva até hoje e vai conservando. É claro que é diferente: antigamente, quando eu nasci, nós tínhamos uma cerca viva em toda a volta das propriedades que existiam ao lado das casas, hoje são muros. Antigamente, não havia estradas asfaltadas, hoje é tudo asfaltado. Não havia esgoto, hoje nas aldeias portuguesas, tem esgoto em todas as aldeias, em todas elas. Não havia água encanada na época, nem sequer luz elétrica existia, isso quando eu nasci, há 50 e tantos anos atrás. Hoje o desenvolvimento chegou lá e mudou-se completamente. O que não mudou foi a casa onde eu nasci e meus irmãos, que se mantém até nas mesmas coisas como era antigamente.
Descrição da casa em Portugal
É uma casa pequena, feita ainda com parede de pedra, aquela parede de 50 centímetros de largura, e ela tem apenas quatro cômodos, ela tinha apenas, aliás, cinco cômodos. Ela tinha duas salas, uma salinha de jantar, uma sala também comum, uma sala de estar, dois quartos, um banheiro, esse sim, nós já construímos depois, porque não tinha nem banheiro, e uma cozinha, essa era a casa. E tem também um barracão nos fundos, onde a minha mãe mantinha o gado, ela criava coelhos, criava galinhas, ela fazia o próprio vinho que nós consumíamos, enfim, porque a gente vivia lá da agricultura.
Dia-a-dia da mãe em Portugal
Minha mãe é viva, tem 82 anos. Ela vive nessa casa, ela tem as nossas casas à volta, mas ela procura viver na casa dela ainda hoje. Ela hoje tem uma vida itinerante, a minha mãe vem ao Brasil duas vezes por ano, mas não fica aqui mais do que dois meses. Eu tenho um irmão que mora em Lisboa, ela fica um mês a dois com ele em Lisboa, também lá em Portugal, e ela fica o resto do tempo na casa dela. E ela ainda hoje cultiva as propriedades que nós temos lá em Portugal, ela cuida disso, é a vida dela, é o que mantém ela viva e bastante saudável com 82 anos de idade. Então ela ainda hoje cultiva as vinhas que nós temos, ela cultiva todas as propriedades que nós tínhamos na época e que procuramos preservá-las também. Isso nos dá prejuízo, você manter, cultivar essas propriedades, mas é um capricho nosso, é um gosto que nós temos em ver aquilo cultivado quando lá vamos. A minha mãe, veja, na época em que nós nascemos, há 50 anos atrás, que eu nasci - eu tenho 57 anos -, Portugal vivia a era da ditadura militar, era uma época muito difícil. As pessoas, não havia progresso, não havia nada, aquilo era um país que ficou estagnado ali quarenta anos. E naquela época as pessoas viviam da cultura, cada um tinha que cultivar a sua hortaliça, os seus legumes, o milho até para poder tratar, engordar o gado, principalmente de suínos. A minha mãe, ela semeava milho nas nossas propriedades, e o nosso pão, em casa, era um pão de milho, que ela mesma fazia, em casa, ela é que fazia o pão que nós comíamos. Por quê? Não havia dinheiro sequer, nem havia padarias que atendessem na época à comunidade, por falta até de haver, ela às vezes comprava, de 15 em 15 dias nós comprávamos um pão de trigo. Era o que se via naquele tempo. Eu não tenho nenhum problema em falar que a minha família, a minha origem é muito humilde. É uma família que precisava trabalhar, a origem da minha família, o meu pai era pedreiro, o meu avô era pedreiro, os meus irmãos e eu, eu saí um pouco disso e fui pra uma marcenaria, mas nós vínhamos dessa atividade. E a minha mãe cultivava isso, ela criava, por exemplo, dois porcos, dois suínos, dois porcos por ano, pra poder matar um no fim do ano, salgar essa carne, guardar na salgadeira e ir temperando, vamos lá, a comida durante o ano com isso.
Como fazer para conservar as comidas com sal
Uma salgadeira é um negócio interessante. Matávamos um a dois porcos por ano. Uma salgadeira é uma espécie de baú, uma arca, onde você depois, você mata o porco, você deixa o porco pendurado lá até a carne esfriar e escorrer todo aquele sangue da carne, depois você retalha todo o corpo, você coloca o toucinho de um lado, o lombo do outro, o presunto do outro, ele é todo retalhado, a cabeça do porco, enfim, os miúdos todos. E aquilo se coloca numa salgadeira, ou seja, aquilo fica tudo coberto com sal, porque o sal é que tempera isso e mantém temperado. Quer dizer, hoje o que mantém é o gelo, você mantém no congelador, mas naquela época não havia geladeira, não havia nada disso, então o que mantinha a carne e o que mantém o peixe, por exemplo, o que mantinha, nós comprávamos, na época boa da sardinha, você comprava uma caixa ou duas de sardinha e você salgava essa sardinha, ela se mantinha o ano inteiro, também. Então o que mantém as coisas hoje ou sempre manteve é o gelo ou o sal. A carne, para que pudéssemos usar o ano inteiro, nós matávamos o porco e salgávamos essa carne. E depois havia coisas que já tinham a sua lata destinada: a cabeça do porco, você comia num jantar que você fazia na época de Carnaval, e assim sucessivamente, cada peça tinha já uma época do ano que estava destinada pra fazer aquele, era o nosso banquete daquelas datas. Era interessante. E minha mãe, ela criava coelhos, ela criava galinhas, enfim, ela criava todos esses animais, e era isso que a gente comia, realmente, porque não havia, não havia açougue, nem havia dinheiro sequer pra gente se aproximar disso. Essa era a época. Hoje é diferente, hoje você tem lá açougue por todo lado, hoje o país está muito bem, hoje o poder aquisitivo está lá em cima, está muito alto. O povo português tem um nível de vida muito alto, até mesmo em relação ao nosso Brasil, e as coisas são diferentes. Não tem mais essa coisa de se salgar a carne. O que se salga? São os presuntos, por exemplo, esses presuntos que a gente hoje, até aqui mesmo no Brasil, come, aqueles presuntos de porco tipo italiano, essa carne é salgada, sim, para lhe dar o gosto de presunto realmente. Mas é só para, vamos lá, para tratar essa carne e poder lhe dar o sabor de presunto, essa carne precisa ser salgada. Então, minha mãe mantém a criação de coelhos, ela preparou um pouco mais sofisticado isso, com aquelas peças tipo aviário, lugar onde se alimenta. E quando nós vamos lá, ela faz questão de fazer um bom arroz de coelho pra nós, o coelho que ela mesmo criou, é vaidade dela. Ela faz questão de assar uns frangos lá na brasa, que ela mesma criou, e a gente então tem isso. E não podemos nunca dizer pra ela que queremos tomar um outro vinho em casa que não seja o vinho que ela produz, porque ela vai ficar muito nervosa, porque o dela é sempre melhor. E de fato é bom.
Sistema educacional de Portugal
Em Portugal, naquela época existiam escolas regionais, mas eram escolas avançadas, eram escolas que no quarto ano primário equivalia ao liceu aqui. Então me recordo que nossa escola lá era próxima até da minha casa, então nós entrávamos na escola às 7 horas da manhã, ficávamos até as 11 horas, voltávamos a uma da tarde e ficávamos até as 6 da tarde. Isto desde o primeiro ano. E no final do ano nós prestávamos, íamos prestar o exame, não era professor, o professor que nos dava aula que nos passava de ano, não, com as notas que a gente fosse tirando ao longo do ano. Nós íamos prestar exame em Leiria, que era o nosso distrito, e lá tinha um corpo de professores que faziam o exame, nós tínhamos que fazer um exame, que nos davam notas, aprovavam ou reprovavam. E eu tinha uma professora, a quem agradeço muito, realmente era fantástica, que ela tinha a vaidade de nunca levar aluno e ele voltar reprovado. Quando ela via que algum aluno não estava bem, ela depois das 6 horas da tarde levava pra casa dela até as 8 e ficava dando aula, uma espécie de aula particular pra preparar os garotos pro exame, porque ela não admitia levar um aluno a exame que voltasse reprovado. Ela vivia obviamente para o ensino. E nós fazíamos lá até o liceu, ela dava até, a gente lá chamava, era até o quinto ano, nós chamávamos isso admissão, sei lá, um outro ano que não tem aqui. E foi lá que eu fiquei esse tempo todo. Depois, eu recordo que, eu tenho algumas passagens da minha vida na escola até interessantes. Eu tinha uma facilidade muito grande até em estudar, e eu sempre fui muito bom em Matemática. Eu me recordo que às vezes a minha professora me chamava ao quadro e ela me ditava alguns problemas para fazer na lousa. Ela chegava a me oferecer: "Olha, eu vou te dar tanto se você for capaz de fazer essa operação." Às vezes, o problema precisava de três equações para ser resolvido e eu nunca tive problema, sempre resolvi todos. Lamento que ela nunca me pagou algumas promessas que ela me fazia. Mas eu tenho essa lembrança. Eu me recordo que quando eu estava na escola, à parte daquilo, dessas horas todas de trabalho que nós fazíamos, à parte dessas horas toda de ensino que nós tínhamos, nós levávamos ainda um volume grande de serviço para fazer em casa, para apresentar no dia seguinte. Eu tinha a confiança dessa professora, era sempre o primeiro no dia seguinte a apresentar o serviço de casa e depois eu tinha a incumbência de ficar lá sentado para verificar o serviço de alguns alunos, ver se estava certo, tal. Então, sempre tive essa facilidade na escola. Ela deu muitas vezes conselhos à minha mãe para me colocar numa faculdade na época, mas não havia cursos, e eu acabei vindo com 18 anos pro Brasil. Aqui no Brasil eu continuei ainda, estudei um pouco e cheguei a fazer um ano de Direito, mas não tive condição de conciliar as coisas, acabei largando, porque a vida era meio complicada.
Brincadeiras
Olha, as brincadeiras são as brincadeiras daqui, eu acho, a brincadeira de pião, nós tínhamos aquele pião, brincávamos de pião, nós tínhamos brincadeiras daquelas bolas de vidro, como é que chama isso? Bolinha de gude. Eram as brincadeiras daqui. E futebol. No fundo, a garotada era futebol. Eu me recordo até que na época da escola a professora não admitia que levássemos piões pra escola, ela queria que as crianças saíssem preocupadas apenas com o estudo, não queria ver essa história de piões e algumas brincadeiras. E nós levávamos e guardávamos, e deixávamos escondido. E às vezes acontecia que um dos alunos, mais malandro, sabia onde estava guardado e acabava pedindo para ir ao banheiro no meio da aula e passava e roubava os piões dos outros, era brincadeira. Eu posso dizer que eu tive uma infância bem divertida, bem vivida, vamos lá. Eu passei lá até os 18 anos de idade.
Falecimento do pai
Eu tive um problema muito sério, porque o meu pai faleceu, eu tinha 12 anos. Eu quase não conheci meu pai. Meu pai se ausentou pra África quando eu tinha três anos, eu tenho uma vaga lembrança dele até hoje. E quando eu tinha 12 anos, que nós estávamos preparados, com tudo preparado para viajar pra África, ir pra lá, pra junto dele, ele faleceu. Houve um problema lá, ele foi assassinado, na época. Ele estava no Congo Belga, numa província ultramarina inglesa, ele estava lá. Ele tinha uma empresa de transportes na época, fazia transporte de bebidas do Congo para a África do Sul e, numa viagem dessas, ele acabou sendo assassinado. E nós, é claro, não fomos pra lá, foi um transtorno grande na vida da gente naquela época, isso eu tinha 12 anos. Na época, eu digo esse transtorno de festas, por perguntar em festas, e quando a gente, lá em Portugal, quando você perdia o pai, a mãe ou alguma pessoa mais íntima, você ficava com a faixa preta no paletó, como demonstração do luto, você tinha que viver com aquilo dois anos. Eu fiquei dos 13 até uns 14, até os 16 anos, sei lá, quase impedido de ir em festas. E não se ia em festa, havia um respeito muito grande, guardava-se aquele luto, as pessoas se vestiam de preto, enfiam, vivia-se aquilo, era a cultura que se vivia no momento era essa. E eu acabei praticamente sendo impedido de ir em festas, você não podia ir em festas, quer dizer, você está respeitando um prazo de dois anos que você tinha que manter aquela faixa de luto. Então estava impedido também de frequentar esse tipo de diversões. E depois acabei resolvendo vir pro Brasil, porque logo em seguida, eu passei, foi dos 14 aos 16 anos, depois você fica um pouco afastado disso, até se integrar novamente, e tal. E depois havia naquela época um problema muito sério com a juventude masculina portuguesa, porque Portugal viveu 12 anos uma guerrilha nas colônias ultramarinas, que era Angola, Guiné, Moçambique, Guiné-Bissau, e a juventude masculina toda ia servir o exército, e com certeza ia-se servir quatro anos defendendo essas tais colônias ultramarinas que depois se tornaram independentes. E havia muitas mortes, o meu amigo maior do colégio, ele se ausentou do país, mas ele morreu. Eu vim para o Brasil, eu resolvi pedir a autorização militar, e isto tinha que acontecer até os 18 anos de idade, se você não pedisse a autorização pra se ausentar do país o destino era se apresentar ao exército e fazer quatro anos defendendo as colônias ultramarinas. Então acabei vindo pra cá. Quer dizer, a minha juventude depois foi vivida mais aqui, em função, na escola muito bem, até os 12 ou 13 anos, depois esse espaço que fiquei respeitando o luto pela morte do meu pai, e em seguida vim pra cá.
Primeiro trabalho em cerâmica
Existem coisas interessantes, eu comecei a trabalhar com 11 anos de idade, quer dizer, com 11 anos não, com 13 anos de idade. Eu fiz a escola até os 13 anos, comecei com seis anos, ficou com seis anos de escola, e depois eu comecei a trabalhar com 13 anos de idade. Com 13 anos, eu fui trabalhar numa fábrica de fazer tijolo, telha, uma cerâmica. É curioso, eu trabalhei em duas cerâmicas, é curioso que o meu avô pediu emprego pra mim numa cerâmica, o meu avô tinha uma influência grande porque ele era empreiteiro de obras, mas eu não queria trabalhar com ele, os meus irmãos trabalhavam. Os meus irmãos trabalhavam com ele, eu não quis trabalhar com o meu avô materno. Porque ele queria que eu entrasse na profissão de pedreiro e eu não gostava. Então, ele falou: "Não, se não quer trabalhar comigo, você tem que trabalhar em algum lugar." Então fui trabalhar, nós tínhamos que ajudar, começar a trabalhar pra ajudar minha mãe. Eu fui trabalhar numa cerâmica, de fazer tijolo e telha. Ele me pediu um emprego, eu fui trabalhar lá e oito dias depois eu recebi um castigo por trabalhar lá. Eu trabalhava num setor onde fazíamos telha, uma telha comum, e a minha função era colocar pasta do lado do prenseiro, da pessoa que trabalhava com a prensa, fazia a telha. E depois tinha duas moças que tiravam a barba dessa telha, era tudo feito manual. Quer dizer, com uma prensa metálica, com uma máquina mesmo, o resto era manual. Como o meu serviço eu fazia rápido, eu ia ajudar as moças a fazer o serviço delas. E um dia o encarregado passou e meu deu suspensão de três dias por eu estar ajudando as moças a fazer o trabalho delas, e eu disse: "O meu está pronto aí, está empilhado, eu não fico parado, eu ajudo". Ele me deu a suspensão e eu aceitei a suspensão, mas nesse mesmo dia eu fui pedir emprego numa outra cerâmica que existia próximo. E acabei trabalhando no dia seguinte e nunca mais fui trabalhar nesta que o meu avô havia me solicitado o emprego. Depois o dono da fábrica foi ao meu avô e pediu desculpa, e foi então que meu avô soube que eu já não trabalhava lá. Eu fui trabalhar numa outra fábrica, eu tinha 13 anos de idade, e quando cheguei lá, fui trabalhar com a máquina que fabricava o tijolo, não a telha. Trabalhavam três pessoas naquela máquina e eu propus ao dono da empresa que ele deixasse a gente experimentar só com duas pessoas, uma eu achava que estava a mais. Ele falou: "Mas sempre foram três" Eu falei: "Faz a experiência com dois." Ele fez a experiência, nós aumentamos a produção com duas pessoas. E a partir daí, ele passou a alugar um prédio para que a gente fizesse uma empreitadazinha à noite, para que ganhássemos o equivalente ao salário que ele pagaria ao outro. E ali fiquei até os 15 anos, quando fui pra marcenaria. Na marcenaria, eu trabalhei depois até vir pro Brasil.
Trabalho em marcenaria
A marcenaria fazia tudo quanto era caixilhos, móveis, fazia tudo. E eu tinha uma função interessante, a necessidade. Quando eu comecei a trabalhar na marcenaria, eu posso dizer que desde os 13 anos de idade, desde o momento em que eu comecei a trabalhar, eu nunca tive problemas financeiros na minha vida, graças a Deus, até mesmo quando criança. Porque na cerâmica eu acabei resolvendo essa questão, substituímos um, nós ganhávamos alguma coisa que era isto, que era pra mim, não era pra minha mãe, pra ela eu dava o salário, o resto a gente ficava. Depois, quando eu fui pra marcenaria, com o início da aprendizagem da profissão e tal, também, destinávamos uma parte pra minha mãe, mas eu montei na minha casa uma pequena marcenaria, um banquinho, alguma coisa, onde eu fazia todas as coisas que os vizinhos precisavam, você precisa de um banco, precisa de um bauzinho, precisa não sei do quê... Eu procurava fazer aquilo em casa e atendia todas, passava a ter uma encomenda dos vizinhos, passava, ajeitei a fazer isso, e era ali que eu fabricava meu dinheirinho até para minhas farras e minhas coisas. Recordo que um dia eu comprei uma primeira bicicleta, só tive uma lá, antes de vir pra cá, com o dinheiro ganho nessas coisinhas, porque a minha mãe não me podia comprar. Acho que é uma história interessante, porque é uma história de dificuldades, acho que hoje a gente relembra, já não penso nisso há muito tempo, é que você fez a pergunta agora e faz-me relembrar isso até com certo orgulho e certo prazer.
Vinda para o Brasil
Olha, na época eu tinha um tio que trabalhava aqui em Vicente de Carvalho, ele tinha um açougue. E eu, quando eu resolvi me ausentar, quando eu resolvi que não queria servir a vida militar em Portugal, pelo fato de ver gente voltando mutilada e outros mortos, eu resolvi: "Eu não vou enfrentar isso, eu não quero essa vida, eu vou embora." Então escrevi para meu tio, naquele tempo não havia ligações, o telefone era caro ou tinha poucos telefones também, eu escrevi para meu tio e disse a ele que queria me ausentar de Portugal, por esta razão, assim, assim. E ele me mandou duas cartas daqui, me desaconselhando completamente de vir pra cá, porque o Brasil estava muito mal, isso aqui estava na época da Revolução, foi no ano que antecedeu a Revolução de 64, greves todo dia, não sei o quê. Eu voltei a escrever, dizendo a ele que eu de qualquer maneira queria vir, fosse que situação fosse, eu não ia servir o exército e procurava ir para um país onde se falasse a língua portuguesa, seria mais fácil. E ele continuou me desaconselhando. Depois aconteceu que veio um casal, foram dois rapazes daqui a Portugal, de passeio, que viviam em São Paulo. E eles estavam lá, passeando, passando férias, e eu dirigi-me a eles um dia e pedi-lhes, se eles não me arrumavam uma forma de eu vir com eles pra cá, que eu já havia ligado para meu tio e meu tio me desaconselhava, achava que eu não devia ir porque o momento não era oportuno. E eles se prontificaram, assinaram lá um termo de responsabilidade na época, e eu acabei vindo com eles, no mesmo navio, na época não se viajava muito de avião, eu acabei vindo no navio Cabo São Vicente. Foram 11 dias de navio para chegar aqui. Mas quando chegamos aqui, eu resolvi ficar em Santos porque o meu tio morava aqui, ou mais precisamente em Vicente de Carvalho. Eu cheguei aqui, atravessei, peguei o barquinho, meu tio estava lá, me esperando aí no cais, fiquei em Vicente de Carvalho. Mas sempre com a colocação desses rapazes de São Paulo: "Olha, se você não se der bem aqui, você vai até São Paulo, nós estamos lá e estamos à tua disposição." São grandes amigos que eu tenho aqui, hoje, no Brasil, ainda.
Vicente de Carvalho
Olha, era muito diferente, acho que Santos era melhor naquela época do que hoje, pra mim era melhor. Mas eu fui morar em Vicente de Carvalho. Quando eu atravessei a barca lá, para o lado de Vicente de Carvalho, e quando cheguei lá e vi aquelas casas todas, fabricadas em madeira, sobre estacas e o mangue embaixo, aquela água embaixo, eu falei: "Meu Deus do céu, pra onde eu vim?" Porque eu vinha de uma aldeia humilde lá em Portugal, mas as pessoas têm todas uma casinha, feita de tijolo, parede de pedra, sei lá. Agora, de madeira, aquelas tábuas pregadas em volta, achei aquilo horrível, falei: "Meu Deus" Eu fiquei, falei: "Bom, estou aqui, vou ter que ficar, não tem jeito."
Primeiro em prego no Brasil, trabalho no estaleiro
O meu tio já tinha um emprego arrumado pra mim num estaleiro naval, como eu tinha a profissão de marceneiro, ele me arrumou emprego num estaleiro naval e eu vim acabar sendo o responsável pela fabricação de todos os caixilhos, portas, tal, porque eles fabricavam barcos de pesca e toda essa parte de caixilharia, de móveis e tal, eu passei a assumir quando eu cheguei. E fiquei, trabalhei 11 meses. E fiquei ali, trabalhando no estaleiro, às vezes tinha que pegar aqueles barquinhos pra sair do estaleiro e com um medo terrível de que aquilo ali virasse. Mas ali fiquei, fiquei e trabalhei 11 meses. Eu trabalhei 11 meses nessa empresa, porque eu sofri um acidente. Estávamos terminando um barco de pesca, ia ser jogado na água e a gente precisava acabar de fazer a calafetação do convés, e a calafetação é feita com piche fervendo, não sei se você sabe isso, é colocada uma estopa lá e depois a gente coloca o breu em cima, quer dizer, um fiozinho de piche fervendo pra tampar a junta pra não haver vazamento. E as carreiras, onde se colocam os barcos na água, aquilo estava tudo ensebado, é aquela madeira que você precisa escorregar pra jogar na água, e você passa por ali. Eu ia pro barco e tinha vindo preparar o piche, que era fervê-lo, transformá-lo em água para poder colocar nas juntas da madeira. E no trajeto, com a lata na mão, eu escorreguei e, ao escorregar, aquilo fervendo, eu dei sorte porque bateu no fundo da lata e pegou na minha mão, aquilo subiu como água, pegou minha mão. Eu fiquei com uma queimadura que fiquei um mês fazendo tratamento aqui na Beneficência Portuguesa, mas felizmente joguei a lata fora, não caiu em cima de mim, foi só na mão. Eu passei a mão na queimadura e quando passei já levou a pele, ainda fiquei com a marca, eu tenho a marca dos dois lados. Fiz um tratamento grande na época pra tirar a queimadura. Eu me recordo que quando isso aconteceu, o meu patrão era um sujeito muito dinâmico, muito agitado, e ele gritou comigo, dizendo que eu era bom pra vender banana na rua, usou uma expressão meio agressiva na época. E eu disse a ele o seguinte: "Olha, me prepara as fichas de seguro, que o que eu preciso é me tratar e depois você fala comigo como quiser. Agora não." Eu vim pra aqui, pra Beneficência Portuguesa, me tratei, e um mês depois eu estava bem, deram alta, eu voltei à empresa e pedi as contas. Ele ficou surpreso, porque ele gostava até do meu trabalho, e naquela época vivia-se um ano de greves e eu nunca fiz um dia de greve, sujeitando-me até a alguma coisa por parte dos grevistas. E ele ficou muito chateado quando eu disse a ele que ia seguir o conselho dele de vender banana na rua, talvez fosse melhor que trabalhar e ainda ser insultado. Saí e fui embora. Tirei a carta, minha carta de condução. Naquela época, fui pra auto-escola, tirei minha carta de condução e acabei com as minhas economias de 11 meses, porque nesses 11 meses, além de fazer o trabalho do estaleiro, eu procurava os prédios que estavam em construção, ia fora, nos finais de semana, ia aos domingos, vida difícil, nos finais de semana eu ia fazer o assentamento de portas, caixilhos e rodapés e tudo que fosse marcenaria nas casas em construção. Eu procurava pegar esse trabalho e fora do meu horário de serviço, principalmente no verão, que se saía às 5, 6 da tarde, você tinha até as 9 da noite para trabalhar, eu acabava fazendo um outro dia lá fora, trabalhando de empreitada, e sábado e domingo trabalhava nisso também. Então eu tinha algumas economias já, em 11 meses eu já tinha economias que me permitiam comprar um caminhão. Eu acabei tirando a minha carta de motorista e comprei um caminhão basculante, ano 52, isso em 64, o carro já tinha 12 anos. E naquela época estava se fazendo um aterro do bairro da Santa Rosa, do lado do Guarujá, eu não sei se vocês conhecem, mas depois da balsa, quando ele atravessa aqui a balsa pro outro lado, tudo ali se chama bairro da Santa Rosa no Guarujá. Naquela época, aquele loteamento não existia, estava sendo construído o loteamento, e aquilo levou, aquilo era mangue, aquilo levou um aterro de 1 metro, 80 centímetros, um aterro grande. Eu comprei esse caminhão, contratei dois funcionários e eu comecei, eu fazia 20 viagens ao aterro por dia. Quer dizer, a empresa loteadora, ela contratava as pessoas que tivessem caminhão e disposição para trabalhar com o aterro. E você vendia os carros de aterro pra lá. Fiquei ali quatro meses vendendo aterro pra eles até, e depois do expediente, vamos lá, e nos fins de semana, que eles não tinham apontador, que nós não podíamos levar o aterro pra lá quando o apontador não estava, eu deixava o meu carro estacionado, que era um carro basculante, lá em Vicente de Carvalho.
Montagem de oficina de bicicletas e trabalho com aterro
Aí comecei a vislumbrar naquela época que o grande negócio em Vicente de Carvalho era montar uma oficina de bicicletas, porque naquela época Santos estava muito bem. Nós tínhamos um cais que fazia três turnos, nós tínhamos uma refinaria de Cubatão com três turnos e nós tínhamos a Cosipa, a siderúrgica da Cosipa com três turnos. Todo esse povo, ou a maioria deles, vivia do outro lado que a vida era mais barata, vivia em Vicente de Carvalho. E todos eles tinham que pegar a barca pra atravessarem pra Santos e aqui em Santos pegar condução que os levasse até Cubatão ou então eles já ficavam dentro do cais, atravessavam na barca e já ficavam dentro do cais. Bom, eu, observando aquilo, era solteiro, tinha 19 anos naquela época, observando aquilo, uma força tremenda de vencer, o objetivo era esse, eu não tinha ninguém. Eu cheguei aqui sem ter dinheiro pra comer três dias, você tem que produzir alguma coisa pra você se alimentar. Então fiquei vendo aquilo e falei: "Acho que o grande negócio aqui é a oficina de bicicletas", que era a condução do momento. Eu fui então procurar ver o que é que existia, existia já uma dúzia de oficinas de bicicletas por ali, mas elas trabalhavam errado na minha observação, porque elas trabalhavam todas no horário comercial, e havia três turnos que eram feitos, dois turnos estavam descobertos, não tinham quem atendesse. Eu observava aquilo, fiquei ali umas noites na estação das barcas de Vicente de Carvalho, vendo o pessoal do turno segundo e do terceiro turno retornarem e reclamarem às vezes com algumas coisas que precisavam fazer. Então montei uma oficina de bicicletas 24 horas naquele tempo, ela abria 24 horas. Só que 24 horas que não sacrificava a mim, porque a oficina, quando eu abri a oficina de bicicletas eu não sabia fazer nada, só tinha tido uma bicicleta na minha vida, acho que nem arrumar um pneu eu nunca arrumei. Eu contratei dois mecânicos pra trabalhar, depois fui aumentando, fui contratando mais, porque no segundo mês em diante eu tinha mais serviço do que as 12 oficinas juntas. Por quê? Porque os meus funcionários trabalhavam das 8 da manhã às 6 da tarde, naquele tempo, sei lá, cobriam o horário comercial. Mas eu abria a porta às 5 da manhã, quando começava a passar o pessoal pro primeiro turno, que começava às 6. E eu ficava até as duas horas da manhã, fechava ali três horas da noite, que não havia movimento, eu ficava ali atendendo, esperava o último passageiro da última barca e não deixava ninguém a pé, todo mundo que vinha de manhã. Eu ficava na frente da oficina anotando o que eles queriam que fizesse e ficava à noite esperando pra entregar o serviço que já estava feito. O horário de trabalho era o comercial, mas o horário para receber a bicicleta pra arrumar e pra entregá-la arrumada, esse estendia-se até a hora que o primeiro e o terceiro turno pudessem ser atendidos. Eu passei, depois eu verifiquei que ali também tinha a necessidade de guardar a bicicleta desse pessoal, porque deixavam tudo aquilo jogado e de vez em quando roubavam bicicletas também, era mais difícil que agora, mas roubavam. Então, acabei montando um estacionamento de bicicletas, acho que o primeiro estacionamento de bicicletas do Brasil, talvez até do mundo, sei lá, mas do Brasil foi eu que montei, lá em Vicente de Carvalho.
Construção civil
Eu fiquei ali três anos naquilo, depois. Nesses três anos, no segundo ano, eu construí um prédio lá, já com recursos próprios, ganhos na própria oficina, de sete lojas e quatro apartamentos, lá mesmo na frente da oficina, na Avenida Thiago Ferreira. Tive a infelicidade de dois anos depois haver a ampliação do cais, passar uma linha férrea lá e a Codesp desapropriou e demoliu. Mas eu acabei vendendo os quatro apartamentos e alugando as sete lojas. Três anos depois eu tinha sete lojas já alugadas, tinha lá um açougue, uma quitanda, tinha não sei o quê, tinha algumas coisas lá, fruto desse trabalho que desenvolvi ali. Eu fiquei dois anos sem pôr um sapato no pé porque eu só dormia três horas por noite. Fiz um quarto no fundo da oficina, eu acordava ali, trabalhava ali, quando estava cansado ia descansar um pouco. Foram dois anos tristes, foi o início da minha vida. Aí vendi o caminhão. Caminhão é um negócio muito triste, é um negócio bom, talvez, se o caminhão for novo, mas quando se tem um caminhão com 12 anos já, você trabalha uma semana e ganha muito dinheiro porque você faz 20 reais por dia, então aquilo vai acumular. Mas chega no final de semana quebra uma peça e você perde tudo o que você ganhou, você gasta tudo o que você ganhou. Acabei vendo que era um negócio meio de louco, esse negócio de caminhão, acabei vendendo depois, fiquei só na oficina e na construção. Mas como eu vendi naquela época a construção, aqueles quatro apartamentos, fiquei apenas com as lojas, e a venda dos quatro apartamentos me pagou o prédio todo e ainda deu resultado, eu falei: "Eu estou perdendo meu tempo aqui nas bicicletas. Foi bom até agora, nesses dois anos, mas a construção é melhor, porque nós estávamos vivendo um momento...” Então acabei alugando naquela época oficina de bicicletas pra alguém tocar e vim embora pra Santos, eu me transferi de Vicente de Carvalho pra Santos e fui fazer o primeiro prédio de nove apartamentos.
Mudança para Santos
Eu vim morar em Santos. Eu vim morar aqui na Rua Barão de Paranapiacaba. Fica aqui, próximo da Avenida Ana Costa. Eu vim morar na casa de uma senhora que era portuguesa, viúva, e aluguei um quarto e morava lá na casa dela. Só dormia. E eu comecei, fazia minha vida. E vim fazer um prédio de nove apartamentos na Rua Ricardo Pinto, foi meu primeiro prédio em Santos, na Rua Ricardo Pinto, 178. Foi um ano difícil, não se vendia, cheguei a me arrepender de ter saído de Vicente de Carvalho, da própria oficina de bicicletas e alugado e vir pra cá, porque eu trabalhei o ano inteiro, nós terminamos o prédio, eu tinha um sócio naquele tempo pra fazer o prédio, eu cheguei a ver que não valia a pena, estava difícil. Depois, foi naquela época, isso foi em 67, e foi inaugurado o Banco Nacional de Habitação, com recursos criados pelo Fundo de Garantia, que foi gerado naquela época e tal. E eles começaram a fazer financiamento. Então, na hora que eles abriram o financiamento, eu acabei vendendo o prédio em 30 dias e vendi à vista. Naquela época, vendia-se, os apartamentos vendiam-se no financiamento do próprio construtor em 48 meses, em 60 meses, quatro, cinco anos, era o prazo que os construtores davam pra eles pagarem os imóveis que faziam. Mas com a abertura do crédito imobiliário, com a Caixa Econômica e o Ipesp financiando, outros órgãos aí financiavam, os bancos todos entraram nisso, acabou saindo, foi aquele boom de venda da construção. Eu sei que eu vendi tudo em 30 dias recebemos o montante à vista. Quer dizer, a partir daí, você fica com dinheiro na mão pra dar uma expansão maior à construtora, e começamos a andar a partir daí.
Santos
Olha, naquela época, é por isso que eu digo que Santos, voltando atrás, voltando à sua pergunta há pouco, Santos era melhor ou pior? Eu falei que estava melhor. Por que é que eu vi que estava melhor? Porque naquela época a cidade era uma cidade com vida. Você vinha da ponta da praia de José Menino e você via bons restaurantes na praia porque você tinha turista que ocupava isso, você tinha o povo todo empregado, você não via uma pessoa desempregada naquela época. Você tinha o cais funcionando, que absorvia muita gente, e tinha todas essas indústrias de Cubatão. E tinha o turismo na cidade, você tinha os hotéis cheios, você tinha os restaurantes cheios, muitos restaurantes. Então tudo isso empregava e o emprego é que gera riqueza na cidade. Então, naquela época, eu me recordo que eu vendia muito apartamento pra doqueiro, pra estivador, pra consertador do cais. Essas pessoas naquela época tinham poder aquisitivo pra comprar apartamento, e hoje não têm. Eu via que o nível de vida das pessoas daquela época era superior, mas muito superior ao nível de vida hoje. Qual é o doqueiro hoje que tem condição de comprar um apartamento hoje, com o salário que ele recebe lá? Há exemplos melhores, naquela época, eu me recordo, que as pessoas trabalhavam, por exemplo, nas indústrias automobilísticas de São Paulo, elas davam-se ao luxo de ter lavabo, empregada, e o sujeito era empregado numa fábrica de automóveis, mas podia manter isso. O nosso nível de vida era superior ao nível de vida dos países do Primeiro Mundo. Depois de 1971, então, eu passei a viajar todo ano para Portugal, eu tinha um cunhado que morava na França, que era funcionário de uma indústria automobilística, que era a Renault, ele era chefe de montagem. Eu chegava lá, eu via que ele era chefe de montagem, mas a mulher dele fazia serviços de doméstica. Ela atendia três famílias lá, onde ela fazia serviço de doméstica para complementar o salário da família num país de Primeiro Mundo. Eu dizia: "Mas no Brasil a pessoa que faz o teu serviço tem duas empregadas em casa, diferente da tua vida aqui na França, num país de Primeiro Mundo." Acho que naquela época vivia-se muito melhor, as pessoas tinham mais condições, muito mais do que têm hoje. E a cidade, a gente não via, o centro da cidade era um centro rico, você não via uma porta vazia, fechada, sem comércio lá dentro e com comprador, porque havia poder aquisitivo.
Construção civil
Na construção civil, trabalho até hoje. Trabalho até hoje. A nossa atividade principal é construção civil, a razão de nossa existência como empresários é construção civil. Nós começamos com nove apartamentos nessa época, em 67, mas nós temos em torno de 5 mil apartamentos construídos em Santos. Nós, que eu digo, a minha empresa. Ela tem em torno de 5 mil apartamentos. E lá, no meio do caminho, há 13 anos atrás, nós acabamos comprando um terreno que é este onde estão construindo o Shopping Miramar e resolvemos dar um outro destino ao terreno que não fosse construção de apartamentos pra venda. Acabamos comprando o terreno e desenvolvemos um projeto pra shopping, e pra aproveitar o terreno acabamos construindo também dois hotéis. Foi aí nosso início de diversificação de atividade. Vínhamos da construção civil, construímos o complexo Miramar, mas ao mesmo tempo partimos para a atividade de shopping, no caso as lojas, e partimos para a atividade de hotelaria porque contratamos pessoas e pusemos em funcionamento os dois hotéis. Depois compramos o Parque Balneário, restauramos o Parque Balneário, que é um outro hotel, depois construímos o Shopping Praia Mar, que é um outro shopping, também na linha, um produto que nós tínhamos. E hoje a nossa atividade é bastante diversificada. Minhas construções são em Santos e São Vicente. Eu não saí daqui. Olha, porque eu acho o seguinte: quando nós começamos a construir, quando começamos a resolver criar, expandirmos mais um bocadinho, nós chegamos a construir seis prédios de uma vez só. Esses seis prédios, nós construímos com recursos do sistema financeiro de habitação, em parte. E chegou uma hora que eu fiquei avaliando o custo de cada uma dessas construções com recursos do banco por haver um volume de obras dispersas, de forma que você não administra tão bem. E o custo dessas construções passou a ficar muito maior, eu comecei a verificar que era melhor fazer duas obras do que fazer quatro, você ganha mais em duas, bem geridas, do que em quatro dispersas e mal geridas, você passa a não ter tempo pra isso. Então eu resolvi ficar em Santos e São Vicente, que é o raio que eu entendia que eu tinha condições de acompanhar
Shopping center
Acho que nós sempre fomos um pouco arrojados, fizemos um pouco diferente dos outros naquilo que fizemos, eu quero deixar a modéstia um pouco de lado agora e falar isso, porque é verdade. Eu me recordo quando nós começamos, quando nós desenvolvemos o projeto do Shopping Miramar, nós fomos muito criticados, acho que as pessoas que vivem na cidade recordam-se disso. Nós éramos criticados porque a cidade não comportava esse shopping, de jeito nenhum, não comportava porque não comportava. Nós estávamos vivendo naquela época a época do plano do Real, Funaro era nosso Ministro da Fazenda, tal, estávamos vivendo a época do Plano Real. E nós partimos pra construção do shopping naquela época, há 15 anos atrás, eu estava acabando de fazer 500 apartamentos. Um prédio com 325 na praia, terminamos o prédio sem um centavo de dívida naquela época, e um prédio de 80 e tantos em São Vicente, na Pero Correia, isso também naquela época, e mais dois ou três prediozinhos à volta. Nós não tínhamos dívidas e tínhamos quase 500 apartamentos prontos para vender. E nós falamos: "Bom, nós vamos desenvolver um projeto aqui e vamos imobilizar o recurso que nós temos em alguma coisa que alavanque a região." Desenvolvemos esse projeto arrojado de dois hotéis, do shopping e do centro empresarial, que tem 64 mil metros quadrados de construção. Naquela época foi um arrojo, porque nós fizemos aquilo com intenção de não vender nada. Nós desenvolvemos os hotéis, fazíamos a locação do centro empresarial e do shopping, e nós mesmos tocamos os dois hotéis, sem experiência também, não tinha nenhuma experiência nisso. Mas foi uma experiência, passou a ser uma experiência interessante, porque no decorrer da obra fracassou o Plano Real, as coisas passaram a custar o dobro do preço, foi difícil. Eu me recordo que um dia chegou lá a Cônsul, pra me entregar 200 frigobares que tinha me vendido a dez reais, hipoteticamente, não me lembro agora o valor, e ele queria receber a 20, senão ele não descarregava, e precisava visar o cheque pra pegar. Nós vivíamos uma época muito difícil naquela época. Bom, tudo se passou e no decorrer do projeto, enquanto o pessoal achava que era loucura fazer um shopping com dois andares, eu resolvi ampliá-lo e coloquei três. A resposta às loucuras que me atribuíram, eu aumentei a loucura, falei: "Já que é loucura, vou fazê-la completa, porque se não fizer agora, acho que nunca mais posso fazer, amanhã vai faltar espaço e eu acredito nisso." O shopping foi um sucesso, o Miramar foi um sucesso, nesses 15 anos, até agora. E agora nós resolvemos entrar noutra loucura que é o Shopping Praiamar, não sei se vocês conhecem o Shopping Praiamar . Mas o Shopping Praiamar também, as pessoas não acreditavam, acho que eu era a única pessoa que acreditava no shopping, porque a localização, porque não sei o quê. E a gente acreditava, por quê? Porque eu acredito em tudo o que for bem planejado e que ofereça conforto, só de oferecer isso as pessoas vão seja onde for. Elas vão. Não é preciso você estar localizado no coração de uma cidade pra você ter sucesso, é preciso você oferecer qualidade, é preciso você se preocupar com a qualidade, você se preocupar com aquilo que você está oferecendo. E a gente sabia que o que a gente estava fazendo, sabia a qualidade que estávamos criando pra cidade e sabíamos que o sucesso viria atrás dessa preocupação de qualidade. Hoje o Praiamar é um sucesso, é talvez dos shoppings do Brasil que foram inaugurados na época dele, é o único que não tem mais loja pra alugar, está tudo alugado, tem duas lojas pra abrir, mas estão alugadas, estão fazendo a montagem. Isso com um ano de vida, 14 meses de vida. Então, foi um sucesso e é um sucesso. Quer dizer, passamos a ter, você fica envolvido em uma série de coisas na cidade, você passa a ter os hotéis na cidade e ver a cidade em dificuldade, a cidade está minguando a cada dia, você não vê o poder público fazer a sua parte, eu tenho cobrado muito isto e vou me permitir cobrar mais daqui pra frente. Eu tenho falado, eu tenho amizade com todos os prefeitos da região, mas eu quero colocar de lado, acho que a amizade é uma coisa e você tem que olhar a região de uma forma bem clara e sem, com bastante imparcialidade e cobrar o que tem que ser cobrado, as autoridades têm que atender à reivindicação daqueles que têm mostrado que alguma coisa fazem pela região. Hoje eu vejo que a nossa região está bem atendida de shoppings, ela não está atendida de hotéis, e agora nós resolvemos criar aí uma outra obra, o Mendes Convention Center que é o centro de convenções que foi inaugurado esta semana. Esse centro de convenções vai ser um sucesso também, tenho certeza absoluta disto, por quê? Porque não tem no Brasil um centro de convenções igual a esse. Talvez tenha pouco no mundo. Eu vi agora, eu fiquei agora 40 dias na Europa. Eu fui visitar um centro de convenções que está sendo construído em Cascais, em Portugal, do lado do cassino do Estoril. Esse centro de convenções não chega aos pés deste e está sendo construído pelo poder público, está lá, em construção há dois anos pelo poder público. Então, o que nós temos aqui? Nós temos um centro de convenções e exposições, que não é grande demais.
Centro de Convenções
Veja, nós temos o centro de exposições que tem um salão com 10 mil metros quadrados, 10 mil metros quadrados você pode colocar lá, sei lá, 20, 30 mil, 40 mil pessoas numa feira. Depende da forma como for distribuída a feira, mas você coloca lá 180 stands dentro. Este centro de exposições está ancorado com uma praça de alimentação que você não tem em nenhum centro de convenções do Brasil, no mundo não sei se tem algum, naqueles que eu fui até hoje, até mesmo em Miami, não tem. Nós temos uma praça de alimentação do lado do salão de exposições, onde se você for, você vai entrar em uma praça de alimentação pra se alimentar igual à praça de alimentação de um shopping, com nove lojas, produtos diferentes, e a arquitetura e tudo é uma praça de alimentação. O que é feito nos outros centros de convenções, o que é feito no Anhembi? Nesses dias de feiras, montam-se os stands com uma cobertura de pano, improvisados, e ali são atendidas as pessoas, nessa praça de alimentação. Acho que é anti-higiênico, você não tem câmaras frigoríficas, você não tem refrigerador, você não tem nada, você não tem nenhuma higiene, você não tem nada azulejado, você improvisa. Hoje se improvisa no Anhembi, se improvisa no Center Norte, se improvisa em todos os centros de convenções que existem no Brasil. Nós não, nós temos um centro de exposições com essa infra-estrutura. Além disso, você tem capacidade de garagem para 900 automóveis. Depois, nós temos o centro de convenções. O centro de convenções, nós temos um salão com capacidade para 4.300 pessoas sentadas em auditório. O centro de convenções, ele tem capacidade para 4.300 pessoas sentadas, em auditório e ele é modular, quer dizer, você vai diminuindo ele ao tamanho que você quiser, dependendo do evento que você tiver pra acontecer. Esse centro de convenções também, ele está ancorado com mais seis salas embaixo, no andar inferior, e mais do que isto, nós temos hoje uma casa noturna dentro do próprio centro de convenções, que tem uma área de quase 2 mil metros quadrados, pra quê? Apenas pra trabalhar como casa noturna? Não. Pra que quando você tenha um evento lá de 3 mil, 4 mil pessoas, você possa oferecer alimentação que não seja apenas na praça de alimentação. Se você quiser montar um self-service dentro desse espaço da casa noturna, que será a grande âncora em alimentação para grandes eventos nacionais e internacionais que a gente pretende realizar aqui, então você tem esse espaço reservado pra isso e que foi dado múltiplo uso exatamente pra que a gente viabilize o espaço. Então, não tem nada, não tem nada. E além disso nós temos uma choperia ainda, voltada pra frente. Por que essa choperia? Apenas para termos um espaço onde, se amanhã nós tivermos lá um evento e o realizador do evento resolver montar um restaurante de classe internacional, você traz o cozinheiro, nós temos esses cozinheiros do hotel, você passa a ter um restaurante vip para atender os convidados, o que o grupo organizador quiser convidar pra servir que não seja dentro do self-service e que não seja na praça de alimentação. Nós temos realmente um centro de convenções muito bem ancorado. Independente disso, nós temos um heliporto, um heliporto com capacidade pra sete aeronaves. Se nós precisarmos receber o presidente da República, o governador do estado e algumas outras autoridades, você pode ter aqui sete aeronaves instaladas, estacionadas e as pessoas participando de uma palestra. Há toda uma ancoragem que foi dada e uma preocupação que foi dada a você viabilizar todos os espaços e não se ver impossibilitado de receber uma autoridade porque você não tem espaço a recebê-la por via aérea, porque às vezes por via terrestre é difícil, que é a desculpa principal pra não comparecer.
Hotelaria
Olha, a hotelaria, eu entrei na hotelaria, eu costumo dizer, por acidente. Na hora que nós resolvemos construir o Shopping Miramar, pra aproveitar o espaço, resolvemos construir dois hotéis. Na época, não era promissora, essa atividade de hotelaria não era promissora, nós não tivemos a quem alugar esses hotéis, resolvemos nós mesmos tocar os hotéis. E realmente é uma atividade que não é nada promissora, absolutamente nada, tem sido problemático. Tanto tem sido problemático que no meio do caminho, lá na frente, nós acabamos comprando o Parque Balneário, que é um hotel de 100 anos e que estava todo destruído, todo danificado porque não tinha faturamento que desse pra restaurá-lo e pra mantê-lo em ordem. Nós acabamos comprando também. Foi uma experiência um pouco dolorosa, porque você fica aí dez anos trabalhando, trabalhando e você não vê o resultado no final do mês. Eu tive oportunidade uma vez até de falar isso a um político que estava fazendo a sua campanha, a gente acaba estudando todos os políticos que fazem campanha, e estudamos aí uns políticos, um político estava fazendo campanha pra presidência da República, e eu tive oportunidade de dizer isso pra ele naquela ocasião, dizer pra ele que às vezes, eu vou até citar exatamente o momento. Eu participei de uma reunião onde o Lula fez sua campanha pra presidência da República, eu tenho uma certa amizade até com ele, pelo fato de ele vir à cidade e ficar nos hotéis e tal. E nessa época, faz uns oito anos, o PT era um pouco radical, acho que não é mais, tenho até uma admiração pelo próprio Lula, acho que é uma pessoa muito mais aberta, mas naquela época eu percebi isso, eles me solicitaram que permitisse fazerem uma reunião dentro dos hotéis, onde pra essa reunião convidássemos os empresários da região. Eu cedi as instalações e participei, e ao participar dessa reunião, eles me sentaram na mesa principal. Você tem a plateia lá, todo o pessoal, todos os empresários da cidade, e você tem na mesa principal os políticos, principalmente do PT, e eu estou lá, sentado também, não sei por que, me convidaram, eu sentei. E no final da reunião, quando todos haviam discursado já, eles, por uma questão de gentileza, me passaram a palavra pra que eu falasse alguma coisa e encerrasse a reunião. Eu falei: "Meu Deus, e agora, o que é que eu vou fazer? Eu não concordo nada com o discurso deles até agora. Se eu disser que concordo, os meus colegas lá da frente vão dizer que eu sou demagogo. Se eu discordar, vou ser antipático pra eles." Uma situação meio complicada. Eu respirei fundo, levantei e falei: "Vou ter que ser sincero comigo." Eu falei: "Olha, eu quero dizer aos senhores, antes de entrar nessa questão político, eu quero dizer aos senhores o seguinte: não sou eu que estou patrocinando esta reunião aqui. Quem está patrocinando é uma empresa que vive em dificuldade há seis anos, há sete anos, ela tem X anos de vida, que é a Mendes Hotéis, ela tem X anos de vida e ela hoje, é ela que está patrocinando, não eu, já que está acontecendo no espaço dela. Mas eu quero dizer que essa empresa passa, atravessa dificuldades desde a sua fundação até hoje, e às vezes eu me queixo das dificuldades que a gente vem enfrentando, financeiras, na empresa, nessa empresa de hotelaria que não é nada promissora. E quantos de vocês que estão aqui à frente já me falaram por que não encerrar as atividades, fechar as portas, já que ela não é lucrativa? Quantas vezes eu saí pra casa com o propósito de, no dia seguinte, chegar à empresa e começar a preparar tudo para encerrar as portas? Mas depois o travesseiro durante a noite me mostra que são 300 funcionários que trabalham, são 300 famílias que vivem daquilo e tal, e a gente tem tido a possibilidade de subsidiá-la em outras empresas que são lucrativas e até hoje se mantém abertos os hotéis. Bom, eu fiz esse preâmbulo pra lhes dizer o seguinte: eu não concordo com a colocação que os senhores me fizeram. Porque na vossa colocação eu ouvi a palavra divisão o tempo todo, e nunca ouvi a palavra produção. Eu pergunto aos senhores: quem vai produzir aquilo que os senhores estão se propondo dividir? Já estamos todos miseráveis hoje, o país está pobre, vai ficar miserável, dividir nada é nada a cada um. Vamos criar um clima de produção, o país precisa produção. Acho que este tem que ser o discurso. Depois que houver essa grande produção, vamos começar essa grande divisão, mas vamos criar uma divisão pra ficarmos todos bem, pra não ficarmos todos miseráveis. Desculpe, mas era essa a observação que eu tinha a fazer." E encerrei a reunião assim. Isso é a propósito de dizer que a hotelaria, a nossa experiência de hotelaria é terrível. Nós, é a única atividade que nós temos que a gente não considera nenhum resultado no nosso fluxo de caixa. Veja: eu sei quanto eu tenho de receita livre dos shoppings no final do mês, eu sei quanto me dá a rádio, eu tenho uma rádio, que é a Jovem Pan, eu sei mais ou menos o que ela dá de resultado no final do mês, eu sei quanto me dá os bingos no final do mês, eu sei quanto me dá a garagem no final do mês, eu sei quanto me dá mais ou menos todas as atividades que eu tenho. Os hotéis, eles ficam sempre de lado, porque eu não sei se eles vão gerar prejuízo ou lucro, eu não quero contar com isso, essa atividade. Essa foi a razão maior da gente, eu falei, bom, ou a gente cria uma âncora para os hotéis, já que o município não criou, porque você tem três hotéis e um apart hotel, então você tem quatro. Faz de conta que o investimento no centro de convenções é uma reforma que você está dando nos quatro hotéis, para ancorá-los. Foi assim que nós pensamos para decidir investir no centro de convenções.
Centro de Convenções
Eu acredito que o centro de convenções, na medida em que ele é hoje o melhor do Brasil, e nós convidamos, fizemos uma festa de inauguração agora, onde tivemos a oportunidade de convidar todas as pessoas que fazem eventos no Brasil e até alguns eventos internacionais. Eles foram unânimes, têm sido unânimes em dizer que é o melhor equipamento que existe no Brasil hoje. O que que nós vislumbramos a partir de agora? É que, e isso já está começando a acontecer, é que nós passemos a ter eventos aqui, bastantes eventos a partir do segundo semestre do ano que vem. Por que segundo semestre? Porque eventos grandes, eles se agendam um ano, dois anos de antecedência. Eu já tenho aqui um evento agendado para 2006, eu tenho alguns eventos agendados para 2003. Já estão agendados. Eu tenho uma série de eventos agendados para 2002, mas do segundo semestre em diante, porque esses eventos grandes são agendados a médio e longo prazo. Eu acho que à medida que começarem a acontecer esses eventos, o centro de convenções passa a gerar um fluxo grande de movimento pra cidade. Não quer dizer que até esses próximos seis meses nós não teremos nenhum, já fizemos alguns eventos, temos dois ainda pra fazer esse ano, e até lá nós teremos que ir alimentando isso com alguns shows, com alguma coisa pra ocupar o espaço e pagar a conta, empatar. Mas eu acredito muito no volume de turismo que vai ser trazido pelo centro de convenções a partir do segundo semestre em diante. Isso vai fazer o quê? Isso vai melhorar o comércio da cidade, porque vai trazer fluxo de turismo pra cidade. Isso talvez vá trazer de volta a gastronomia da cidade, que já foi muito farta e muito boa. Não adianta você ter bons restaurantes se você não tem frequentadores. Mas à medida que você tiver esse público frequentando a cidade, você precisa oferecer esse tipo de serviço e com qualidade. Eu vejo isso, que aí, sim, começa a gerar empregos. Você precisa trazer talvez novos hotéis pra cidade, porque o centro de convenções, ele pode trazer uma demanda de turismo três vezes maior do que a capacidade hoteleira que nós temos na cidade. A própria construção civil passa a se desenvolver com a construção desses hotéis, talvez apart hotéis. Enfim, eu acho que a movimentação na cidade passa a ser geral, passa a ser em todas as áreas. O próprio comércio começa a absorver mais mão-de-obra, porque vende mais e portanto a ter mais movimento. E a partir daí até o próprio poder aquisitivo da cidade, na medida em que há menos desemprego, passa a desenvolver a região. Eu sei que estão agendados aí alguns eventos, até internacionais, mas eu não sei nenhum nome desses eventos, não. Eu não tenho tempo.
Agência de turismo
A ideia nossa da agência de turismo era mesmo ser uma agência receptiva. A razão nossa de criar uma agência de turismo não foi pra ficar vendendo o turismo daqui pra fora, foi pra apoiar o turismo que vem pra cidade. Na verdade, nós tivemos que mudar o roteiro disso, por quê? Se não tem turismo vindo pra cidade, você monta uma agência pra ser uma agência receptiva, você precisa ter o turista, senão você fecha a porta, como algumas que pensaram em fazer isso fecharam. Hoje nós fazemos as duas coisas, nós temos a nossa clientela na agência, e graças a Deus vai bem, com venda de turismo pra fora, e nós estamos incrementando o turismo regional, o turismo receptivo, regional, e vamos incrementar mais tão logo a gente comece a ter movimento no centro de convenções. Nós passamos a ter uma unidade da própria agência dentro do centro de convenções até pra tratar dessas coisas. Mas ainda não é o momento, ainda não comporta isso. Acho que isso é coisa que deve acontecer a partir do segundo semestre que vem em diante. Até lá, a gente faz alguma coisa nos hotéis, a gente procura, de certa forma, através dos hotéis fazer alguma coisa, mas pouco. A gente procura proporcionar, criar ao turista que vem à cidade passar o final de semana, alguma diversão pra ele.
Avaliação do potencial da região
Mas eu defendo, eu defendo, é aí que eu digo, eu coloquei no início, que a gente hoje precisa ser cobrador do poder político. Se a gente não for cobrador do poder político, a gente não vai ver nunca a nossa região desenvolvida. Eu hoje cobro do poder político um projeto único, eu cobro unidade na política da região metropolitana. Acho que se você não tiver unidade, se os nove prefeitos não tiverem uma visão única e um projeto único pra defender, você nunca vai ver essa região desenvolvida, essa é minha opinião. Por quê? Porque você vive hoje um momento de fusões, os bancos pequenos fundindo-se aos bancos grandes pra poderem sobreviver. Grandes empresas, elas se unificaram, como a Antártica e a Brahma e outras aí, para sobreviver. Supermercados se fundiram quase todos pra quê? Pra sobreviver. Regiões pequenas, elas ou se fundem ou desaparecem. Por que essa necessidade de fusão? Não é transformar numa única cidade, não. Mas já que você é uma região metropolitana, já que nós ganhamos aí esse título de metropolização, esta fusão, vamos lá, entre as cidades, embora cada uma tenha a sua gestão independente, nós somos uma região única e metropolitana, e tem um conselho formado aí, que cuida disso. Ora, o que nós precisamos fazer? É criar um projeto único, haver unidade entre os prefeitos, e esse projeto único tenha prioridades definidas, onde não haja rivalidades de onde é que vamos construir o primeiro projeto. Esse projeto tem que definir onde vai ser o aeroporto da região. Não tem sentido o Guarujá estar defendendo, a Praia Grande defendendo. Está se averiguando três aeroportos e nós não temos nenhum. Por que não temos nenhum? Porque não há um projeto definido, defendido por nove prefeitos, onde esse projeto tenha essas prioridades. Qual é a prioridade primeira? É o aeroporto. Onde vai ficar? No Guarujá, Praia Grande, sei lá onde for. Qual é a segunda prioridade? É a travessia Santos e Guarujá. Qual é a terceira prioridade? É o VLT. que está aí sobre os trilhos, o governo recebeu um dinheiro de 32 milhões da minha mão pra implantar o VLT., até hoje não implantou e não vi nenhum político cobrar isso. VLT. Veículo Leve sobre Trilhos. Seria o nosso metrô de superfície que ligaria todas as cidades da região, em cima desses trilhos que estão aí desativados. Eu comprei esta área onde está hoje instalado o centro de convenções da CPTM - a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos. A CPTM., ao vender essa área, vendeu com o Governador do Estado alegando que ia usar esses recursos na própria região instalando o VLT. É o que existe em São Paulo, ali na marginal do Tietê. Não existe aquela espécie de metrô. É uma espécie de metrozinho, na superfície. Seria o nosso metrô da Baixada aqui, de superfície. Acho que esse equipamento é altamente necessário pra que a gente veja desenvolvida a região, a ponte que ligue o Guarujá a Santos, ou um túnel, sei lá o que, é altamente necessário. O aeroporto é altamente necessário, e tem outros equipamentos. Ora, o que é que precisamos? É o projeto único, defendido por nove prefeitos. Se nove prefeitos saírem daqui pra Brasília, com um projeto debaixo do braço e a primeira prioridade for o aeroporto, dizer: "Presidente, esta é a prioridade que existe no estado de São Paulo, na região metropolitana da Baixada Santista. Nós estamos em nove prefeitos aqui, estamos defendendo isso, precisamos de recursos pra isso." O presidente da República vai pensar três vezes pra não atender nove prefeitos, está certo? Se os nove prefeitos saírem daqui ao governador do estado, também conseguem reivindicar verba pra isso. Agora, eu quero ver é o prefeito individual de cada cidade ir lá, reivindicar alguma coisa pra sua cidade. Não consegue nunca nada, porque não tem um peso. Ele não tem peso político que dê força a ele conseguir atender, ver atendida sua reivindicação. Eu defendo que tem que haver unidade dos políticos da região, tem que haver um projeto regional defendido por todos e com prioridades definidas que todos tenham de ver e de defender. A partir daí, nós passaremos a ter o início do desenvolvimento regional. Se isso não acontecer, nós iremos sempre ter uma cidade-dormitório pra aqueles que enriquecem, portanto trabalham na cidade vizinha.
Balanço das realizações profissionais
Eu acho que o grande segredo nosso de sucesso exatamente foi a nossa participação efetiva naquilo, sempre naquilo que fizemos. Eu hoje posso lhe responder de todas nossas atividades, como elas funcionam, porque eu participo de todas elas. Eu posso não saber o nome do cliente, mas eu sei o que está agendado, não está agendado e tal, e a operação interna eu sei como ela é feita. Na construção eu sempre fiz isso. Eu passava os meus fins de semana no meu plantão de vendas ouvindo aquilo que o cliente reivindicava ao meu corretor ou meu plantonista de vendas. E a gente sempre procurava fazer as coisas dentro da linha de exigência, dentro das exigências que os clientes nos faziam. A gente entendia o seguinte: quem compra um apartamento é a mulher, o homem só paga. Você tem que criar um apartamento, um projeto naquilo que mais agrada a mulher. O que agrada à mulher? O que agrada à mulher é a cozinha grande e a área de serviço grande, infelizmente a gente via que era isso que mais agradava. Os quartos, ninguém se preocupava se um quarto era mais pequeno, maior, ninguém reclamava disso. O apartamento tem que ter uma boa sala, uma boa cozinha e uma área de serviço onde você possa colocar lá as máquinas. Antigamente se fazia uma área de serviço que você não colocaria máquina nenhuma, e a mulher hoje não lava mais roupa, ela põe na máquina. Você tem que ter uma área de serviço onde as máquinas possam ficar dentro da área de serviço, ter uma boa cozinha e ter uma boa sala, e fazer um acabamento. Acho que o cartão de visitas de um prédio é sempre a entrada principal. A pessoa, se ela tiver uma boa impressão quando ela entra no prédio, aquilo é 50% da venda. A gente sempre se preocupou muito com isso. E ouvimos muito as pessoas que vêm nos plantões de venda, ainda hoje faço isso.
Construção civil
O meu primeiro prédio, lá em Vicente de Carvalho, eu vendi com financiamento de 48 meses. Depois, eu quando comecei já foi na era do sistema financeiro de habitação, que financiava em 20 anos, mas que nós vendemos à vista. Dessa época pra cá, mudou pouco. Hoje, a gente chega a vender em 36 meses, alguma coisa até 50 meses já se vende hoje, porque há uma dificuldade muito grande de financiamento. Daí a razão porque o país vai mal, porque acho que a única atividade que ela banca a economia de um país chama-se construção civil. Porque a construção civil ela mexe com todas as indústrias, ela mexe com a siderurgia, mexe com a indústria de tintas, com a indústria de tudo, madeira, de tudo. Não é a construção do prédio em si, é a fabricação de todos esses materiais à volta. Enquanto nós não tivermos financiamento nesse país novamente para a construção civil, eu não vejo o país com possibilidade de crescimento. E esse financiamento no Brasil é muito difícil. Por que é muito difícil? Porque você vive um governo aí que não tem noção, não sabe fazer contas. Você não pode cobrar do mutuário 12% de juros ao ano, ou 18%, sei lá, é correção e mais não sei o que, vai entre 12 e 18%, quando você reajusta o salário em 6%. Esse assalariado, do terceiro ano em diante, é caloteiro, mas é caloteiro por força das circunstâncias. Estão fazendo as pessoas sérias serem caloteiras, então isso não existe. A gente vai para os países da Europa, eu tenho algumas construções em Portugal, faço alguma coisa lá, construí lá em torno de 1000 apartamentos nesses últimos dez anos, e a gente lá não tem dificuldade nisso, por quê? Porque você lá tem o juro pra construção de 3% ao ano, mas você tem um reajuste salarial de 3%, 4% ao ano. Normalmente é um ponto acima do juro que é pago. Lá ninguém se torna inadimplente, a não ser que seja mau caráter ou caloteiro mesmo. Ou perca o emprego, mas se perder o emprego tem o fundo desemprego que apoia e não vai ter problemas de pagar o financiamento. Lá, o que que acontece? Eu estava vendo agora, nesta minha última viagem pra Portugal, uma campanha do Banco Santander, que tem lá diversos bancos Santander em Portugal e tem um que se chama Banco Totta & Açores. E o Banco Totta & Açores estava com uma campanha na rua dizendo: "Financie o seu apartamento e ganhe um automóvel de presente ou um cheque no valor tanto." Quer dizer, os bancos, eles andam atrás do mutuário pra pegar financiamento porque querem emprestar dinheiro a 3%, com a garantia do próprio imóvel. Por quê? Porque há estabilidade financeira, porque há estabilidade econômica, porque não se prevê a desvalorização e porque os juros são baixos e as pessoas podem pagar, e o dinheiro precisa estar aplicado. Aqui não temos isso, aqui nós temos um juro extorsivo, que chega à casa dos 10%, para aqueles que deixam a conta estourada, chega à casa dos 15% pra quem usa o cartão de crédito, absurdo, ao mês. Quer dizer, é extorsão. E quando, na melhor das hipóteses você paga 3% ao mês, e talvez na melhor da melhor das hipóteses você pague 1%, que é aquele 1,5 que é oferecido no financiamento da casa própria. Quer dizer, que é incompatível com o reajuste salarial.
Situação político-econômica do país
Quer dizer, o país hoje vai mal, todo o país vai mal. Vai mal por quê? Porque você está vivendo uma recessão sem limites, você está vivendo o desemprego. Talvez a cidade de Santos vá pior porque é das cidades que têm o maior índice de desemprego do país. Você está com um volume aqui de 27 a 28% de desempregados, é complicada a situação. E isso com certeza gera pobreza, gera miséria, as coisas ficam, as coisas acontecem dessa forma. Mas é uma situação geral do país, eu não vejo, eu vejo Santos um pouquinho pior, vamos lá, eu vejo pior porque a gente vive aqui e vê que está ruim. E a gente vê que em outras cidades, você veja, eu me queixei há pouco até da situação, me veio mais ou menos na minha visão a forma de desenvolvimento da região, por quê? Porque eu estou acompanhando hoje o que está acontecendo no Ceará, o que está acontecendo em Natal, o que está acontecendo em Recife. Eu tenho me deslocado aqui e tenho tido contato com os políticos de lá, políticos que eu digo da esfera de Cruz das Flores, por exemplo o secretário Viana, que é o secretário do Jereissati, eu estive com ele outro dia, eles me puseram helicóptero à disposição pra sobrevoar todo o Ceará e procurar até fazer alguns investimentos lá. Natal, a mesma coisa. Eu viajei agora para os Estados Unidos com um grupo de Natal e da Bahia, a convite da própria Gol pra vermos algumas coisas lá e tentar pensar no desenvolvimento do país. Mas a gente vê que o governo federal não investe. O Nordeste tem bons aeroportos, o próprio Jereissati está com uma política fantástica de desenvolvimento no Ceará, que ele pega, ele registra todos os turistas que chegam no aeroporto do Ceará, ele registra, procura saber a região de onde eles vêm, se é da Itália, de que região é, e ele destina 12 dólares per capita pra gastarem em promoção de onde vêm esses turistas, pra motivar outras pessoas a virem. Então, algumas campanhas que são feitas assim. A gente defende isso aqui, defende a necessidade de um aeroporto, a necessidade de duas obras de impacto, duas ou três obras de impacto, elas vão transformar a região, e com pouco dinheiro, não é muito dinheiro. Quer dizer, pouco dinheiro para os volumes de dinheiro que a gente ouve a esfera federal e estadual pronunciar.
Sobre a possibilidade de continuar ou ir embora do Brasil
Ficar eternamente lá, você não vai voltar? Então você desiste de um propósito teu e criar um pouco de condição e voltar, melhorar um pouco, mas voltar pra sua terra. Meus primeiros seis anos aqui, eu não queria nem conhecer mulher, pra não me apaixonar. Porque eu tinha um propósito de ficar aqui dez anos e voltar. Eu dizia: "Se eu me casar aqui, eu não volto, eu não posso constituir família aqui, isso não pode passar na minha cabeça." Eu sempre planejei a minha vida. Então fiquei aqui seis anos, nos meus primeiros seis anos, de 63 até 69. Em 1969, seis anos depois, eu fui a Portugal, já estava fazendo três prédios, mas ainda estava com o propósito de ficar aqui mais três ou quatro anos e ir embora. Então eu conheci minha mulher, nesse passeio que eu fiz, conheci a minha mulher. Eu fiquei me correspondendo com ela, não telefonando porque não tinha dinheiro pra gastar em telefone, nem havia essa facilidade, eu fiquei me correspondendo com minha mulher, por carta, e em 71 eu voltei em Portugal, namorei mais 30 dias, me casei e vim casado.
A esposa
Ela mora aqui. Ah, ela adora o Brasil, não tem jeito, não tem jeito. Hoje eu tenho meus filhos brasileiros, tenho minhas noras brasileiras, está chegando o primeiro neto aí, daqui a pouco. E hoje se me disserem: "Você vai ter que ir pra Portugal", eu não vou mais. Mas isto você vai criando ao longo do tempo, não adianta se disserem: "Você vai pra Brasília" ou "Vai para os Estados Unidos e fica lá o resto da vida", você não vai aceitar hoje porque as tuas raízes são daqui. As minhas raízes eram portuguesas. Felizmente.
Atividade dos filhos
Eu tenho três filhos. Eu tenho um filho formado em Economia, tenho outro formado em Administração de Empresas e tenho uma filha, que fez o primeiro ano de Direito, depois não gostou e foi pra Portugal, está fazendo hotelaria lá, numa universidade portuguesa, mora em Lisboa. O meu filho mais velho, ele toma conta de uma atividade que é deles, que é um hotel. Eles têm um hotel que eu construí pra eles, estão com a construção de um outro em Campinas agora, e ele toma conta disso. O mais novo, ele está comigo e é ele que administra os hotéis e o centro de convenções. Não é que estejam voltados pra isso, eu até acho que eles estão errados. Eu tenho dito isso até a eles, acho que eles estão errados. Eu acho que tem coisas, por exemplo, o shopping, a construção, acho que ela tem muito mais condição de lhes dar outro rendimento que não têm os hotéis nunca. Mas eles gostam disso, paciência.
Poder aquisitivo do país
Eu acho que o que mais mudou nesse país foi o poder aquisitivo. Hoje você tem dificuldade, você vê o comércio fechando a cada dia, exatamente por quê? Porque você não tem comprador, você não tem poder aquisitivo. O poder aquisitivo que eu digo, é que tipo de poder aquisitivo? Eu acho que antigamente nós tínhamos um poder aquisitivo maior e tínhamos menos coisas pra comprar. Hoje você tem uma TV a cabo pra você pagar por prestação, hoje você tem um telefone celular pra você pagar, hoje você tem uma série de coisas que te impõem garganta abaixo, que você pra estar atualizado tem que pagar e que corrói o teu orçamento. Isso corrói o teu orçamento. Então, o que te sobra é tão pouco que você não tem como hoje movimentar o comércio. E eu sinto que nós vamos passar momentos, talvez até mais difíceis ainda, em relação a isso. A gente não vê as coisas, não vê o poder aquisitivo aumentar e vês o teu orçamento ser corroído com aumentos. Depois que se implantou a democracia no Brasil, vamos lá, e que você passa a ter o teu salário estagnado, que não tem aumento, você tem aumentada tua energia elétrica, que ontem anunciaram em 6%, você tem o teu telefone aumentado, que aumentam e a tragédia é isso, você tem a TV a cabo. Então tudo isso vai corroendo o poder aquisitivo do consumidor que está solapando o comércio. Isto é muito sério e se não houver uma mudança nisso, a gente pode ver as coisas mais... E isso começa a fazer o quê? A gerar desemprego, porque tudo isso que eu lhe falei suga a tua economia, mas não gera nenhum emprego. O que isto gera de empregos? Quer dizer, TV a cabo o cara liga na tua casa, está lá, está sendo produzida, foi produzida um pouco nos Estados Unidos, um pouco no Japão, um pouco não sei onde e é te enviado via fio lá pra casa, e você não tem grandes empregos gerados nisso, mas a tua economia está sendo gerada, está sendo sugada. O próprio telefone, a mesma coisa, a própria energia elétrica, a mesma coisa. Não se geram empregos e se suga a economia das pessoas, se tira dinheiro do mercado. Tira-se o dinheiro do mercado, e isto é muito ruim. E essa globalização também, que eu acho que antigamente, não sei, eu não concordo com a globalização atual, que a gente fala em globalização, porque você centraliza muito todas as economias, você desvia muito dinheiro das cidades. Hoje eu vejo o seguinte: você tem uma rede de supermercados ou duas redes de supermercados que abastecem a região. Elas abastecem a região, mas elas não geram mais nada de investimento, e isso é ruim, é tudo desviado. Antigamente, você tinha a rede Peralta, que era de supermercados da região e que reinvestia o seu resultado aqui. Você tinha os pequenos empórios, os pequenos açougues, as pequenas padarias. Você tinha isso tudo ganhando e investindo regionalmente. Hoje é tudo desviado. Então, a empresa, as cidades que não têm vida própria e que vão sendo sugadas pela globalização de que se fala, eu acho que aí vai ser muito difícil. Eu acho talvez que seja até a razão desses tumultos internacionais que a gente vê hoje.
Lições de vida
Eu aprendi muito ao longo da minha vida, especialmente que a gente tem que ter paciência com as coisas e precisa ser até, sabe? Quando você começa tua vida com 18 anos de idade como eu comecei, e que a gente brigava por tudo e queria as coisas. Às vezes, você errava em coisas simples, eu hoje me divirto com meu passado e eu hoje discuto isso até com meus filhos às vezes. Discuto não, brinco com eles, nesse sentido, porque eles às vezes vêm com visões que eu já tive há 20 anos atrás e que eu achava que estava certo, mas não estava, e que é tão fácil a gente verificar hoje que o caminho é aquele, não o outro. Mas naquela época a gente vivia aquele. E até em decisões que a gente toma hoje, que são tão simples, que até meus filhos às vezes vêm: "Pai, o que é que tem que ser feito?" E você rapidamente diz, "Pô, eu não pensei nisso" Não pensou porque não teve essa vivência da vida ainda que lhe desse esse ensinamento. Então, acho que você, o grande ensinamento, quando você chega aos 57 anos como eu tenho, acho que você chega com uma lição de vida tão grande que você não tem mais o direito nem de errar. Acho que a grande lição de vida, que eu sempre tive nas minhas coisas, é que eu admito o erro uma vez, eu nunca admiti pra mim mais do que uma vez. Eu acho que as pessoas devem fazer, se querem crescer têm que fazer isso. Eu hoje tenho os meus superintendentes dos shoppings, os meus gerentes dos hotéis, todo esse pessoal eu digo pra eles o seguinte: "Decidam. Errem, mas decidam. Mas não errem duas vezes." Eu não admito. Eu não quero que eles me esperem pra eu tomar uma decisão quando eu não estou, não. Eu quero que eles decidam. E se eles errarem, eu não vou chamar-lhes a atenção pelo erro, eu vou pedir que não errem a segunda vez. Você tem que ser rápido em decisões, você não pode ter medo de errar e pra isso você não toma uma decisão. E você tem que se aplicar o máximo possível nas coisas que você faz. Eu acho que como lição de vida, eu costumo dizer, eu faço às vezes uma reunião com meus funcionários, pelo menos uma vez por ano eu falo com eles, e eu costumo dizer o seguinte: "Se você não está fazendo aquilo que você gosta, peça demissão. Ou então peça pra ser transferido para aquilo que você gosta de fazer. Porque se você não faz o que você gosta, você não vai produzir, você não vai atender bem. Você está se prejudicando, a você e a todos que estão à sua volta. A empresa é a tua principal família, você vive mais horas dentro da empresa do que vive com a tua família. Você tem que estar bem, satisfeito, gostando do que você faz pra poder produzir. Até o ambiente em que você está, se não tiver as cores que você gosta, digam-me quais as cores que vocês gostam porque, ou vocês vivem felizes, ou vocês não produzem." Eu acho que a maior lição de vida que você pode dar às pessoas é dar liberdade de elas se exprimirem, pra que elas possam dizer o que as incomoda. Eu só quero dizer que a minha vida foi assim, esses 30 e poucos anos, 38 que eu vivo no Brasil, e que eu realmente tenho, eu hoje considero que a minha felicidade maior foi ter vindo pra esta terra, porque eu gosto muito deste país, e que a gente hoje apenas vive aí com a esperança de que este país ainda se encontre, na direção que é necessária pra que ele possa ser aquele país que nós todos sonhamos.
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