Projeto Nestlé - Ouvir o Outro Compartilhando Valores – PRONAC 128976
Depoimento de Fernanda Keller
Entrevistada por Tereza Ruiz
São Paulo, 27/03/2014
Realização Museu da Pessoa
NCV_HV08_Fernanda Keller_Parte 1
Transcrito por Karina Medici Barrella
MW Transcrições
P/1 – Primeiro Fernanda, vou pedir pra você dizer pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Fernanda Keller. Nasci em Niterói no dia quatro de outubro de 1963.
P/1 – Agora, nome completo, data e local de nascimento dos seus pais, se você se lembrar.
R – Manuel de Sousa Nunes, nasceu em Macaé, no dia sete de fevereiro, não me lembro o ano. E a minha mãe, Terezinha Keller, nasceu dia 14 de maio, esqueci também o ano, em Macaé.
P/1 – E o que seus pais faziam?
R – O meu pai trabalhou a vida inteira no Sesi, administrador de empresas. A minha mãe é pedagoga, trabalhou na Universidade Federal Fluminense muitos anos, professora da universidade e do mobral também.
P/1 – Conta pra gente como eles eram, se você fosse descrever seus pais.
R – Meu pai faleceu em 2008, minha mãe ainda está viva. Meus pais são tudo pra mim.
PAUSA NO ÁUDIO
R – Os meus pais são uma grande referência pra mim, o tempo inteiro, desde criança, porque eram pessoas incríveis, excelentes como pais, carinhosos, modelo. Minha mãe superboa profissional, muito querida, minha casa sempre viveu cheia. Pelo fato dos meus pais terem saído de Macaé para morar em Niterói, eles foram os primeiros a saírem da cidade, que era uma cidade super pequena, de praia, naquela época, pra morar em Niterói. Minha casa era muito... Todos os irmãos, os parentes deles vinham se hospedar na nossa casa. Eram pessoas muito amáveis, queridas, e comigo nem se fala, né? Eu fui a primeira filha, a primeira neta e eles eram super apaixonados. Então, eu tenho certeza que eu fui muito querida, eu cheguei assim... Eu fui a filha que minha mãe sonhou e meu pai também. Eu cheguei com um...
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Depoimento de Fernanda Keller
Entrevistada por Tereza Ruiz
São Paulo, 27/03/2014
Realização Museu da Pessoa
NCV_HV08_Fernanda Keller_Parte 1
Transcrito por Karina Medici Barrella
MW Transcrições
P/1 – Primeiro Fernanda, vou pedir pra você dizer pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Fernanda Keller. Nasci em Niterói no dia quatro de outubro de 1963.
P/1 – Agora, nome completo, data e local de nascimento dos seus pais, se você se lembrar.
R – Manuel de Sousa Nunes, nasceu em Macaé, no dia sete de fevereiro, não me lembro o ano. E a minha mãe, Terezinha Keller, nasceu dia 14 de maio, esqueci também o ano, em Macaé.
P/1 – E o que seus pais faziam?
R – O meu pai trabalhou a vida inteira no Sesi, administrador de empresas. A minha mãe é pedagoga, trabalhou na Universidade Federal Fluminense muitos anos, professora da universidade e do mobral também.
P/1 – Conta pra gente como eles eram, se você fosse descrever seus pais.
R – Meu pai faleceu em 2008, minha mãe ainda está viva. Meus pais são tudo pra mim.
PAUSA NO ÁUDIO
R – Os meus pais são uma grande referência pra mim, o tempo inteiro, desde criança, porque eram pessoas incríveis, excelentes como pais, carinhosos, modelo. Minha mãe superboa profissional, muito querida, minha casa sempre viveu cheia. Pelo fato dos meus pais terem saído de Macaé para morar em Niterói, eles foram os primeiros a saírem da cidade, que era uma cidade super pequena, de praia, naquela época, pra morar em Niterói. Minha casa era muito... Todos os irmãos, os parentes deles vinham se hospedar na nossa casa. Eram pessoas muito amáveis, queridas, e comigo nem se fala, né? Eu fui a primeira filha, a primeira neta e eles eram super apaixonados. Então, eu tenho certeza que eu fui muito querida, eu cheguei assim... Eu fui a filha que minha mãe sonhou e meu pai também. Eu cheguei com um monte de gente me paparicando, acho que isso faz muita diferença quando você chega, você é bem recebido, as pessoas estão desejando muito. E isso interfere pra sua vida pra sempre.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Eu tenho um irmão, que é um dos meus melhores amigos, tem o mesmo nome do meu pai, só que filho. Manuel de Sousa Nunes Filho. Está sempre me acompanhando em todos os campeonatos que eu vou competir. Ele vai, ele é um dos grandes incentivadores meus, sempre parceiro.
P/1 – Com o que ele trabalha?
R – Meu irmão fez Educação Física, então ele trabalha... E tambem fez especialização em outra área que não tem nada a ver com Educação Física, ele fez Construção na escola técnica.
P/1 – Conta um pouco pra gente como era a casa que você passou a infância. Descreve mesmo a casa, o bairro.
R – Bom, a maior parte da minha infância eu passei numa casa na Boa Viagem. Uma casa muito legal porque era um bairro que na época não tinha muitos prédios. Hoje tem o Museu do Niemeyer, um ponto turístico da cidade, superperto da praia. Sempre amei praia, mar, brincar na praia, tal, e eu pude ter essa infância que eu vejo que hoje as pessoas não têm tanto essa chance. Não tinha tanta violência assim, brincar na rua, ter um campinho onde você desce e vai pra rua e tem aqueles jogos que você faz com a garotada. Eu sempre fui líder, sempre gostei de comandar os jogos: “Ah, vamos jogar agora isso”, polícia e ladrão, queimada. E era engraçado, porque a gente podia brincar, as brincadeiras não custavam nada, né? Um pedaço de giz que você riscava no chão uns negócios e brincava assim. Bicicleta era uma coisa supercara, era um brinquedo que todo mundo adorava, todo mundo tinha, mas a gente era muito criativo pra brincar, sabe? Não dependia de muita coisa. Era só ter molecada na rua, criança e já tava a festa pronta. Então, essa infância, nessa casa, foi o máximo. Tinha uma pequena piscina na minha casa, que mal cabia quatro ou cinco pessoas, mas era lotada dos meus primos que iam brincar comigo, então era muito divertido. Eu ganhei uma mesa de ping pong, então era uma festa também porque era o bairro todo indo jogar ping pong na minha casa. E sempre teve muitas festas na minha casa, muitas festas. Tinha uma varanda muito grande e a gente fazia almoço, aniversários, sempre foi alegre a casa assim, muito agitada.
P/1 – Tinha uma brincadeira favorita? Você citou várias, mas tinha uma preferidda?
R – Não, eu gostava de brincar. De criança, se pudesse correr na rua, ficar à vontade, bolinha de gude, todos os jogos eu gostava, gostava de todos. E de muita praia. Acho que, pra mim, não ir à praia era tristeza. Quando a minha mãe falava: “Hoje ninguém vai à praia”. Cara, pior castigo assim. A melhor coisa era brincar na praia, poder ir à praia.
P/1 – Você citou a varanda que vocês faziam almoço. Como eram as refeições na sua casa?
R – Ah, meus pais sempre fizeram muita questão de todo mundo ter refeição junto, tipo almoço, jantar. Às vezes, de manhã cedo não dava muito bem porque o café da manhã é meio corrido pra ir pra escola. E final de semana sempre tinha muita gente na minha casa pra, ou almoçar, tal, sempre cheio. E eu acho isso superimportante, acho que isso não deveria nunca se perder nas famílias, que é um momento de você perceber se alguém não tá muito bem, né? Hoje tem televisão no quarto de todo mundo, as pessoas não brigam por causa de canal, isso é muito chato. Elas não se falam. Porque essa briga é saudável, com irmão: “Eu quero ver isso, eu quero ver aquilo”. Hoje: “Então tá, fica aí, cada um come no seu quarto”. Eu acho isso muito ruim. Acho bacana essa confraternização diária, isso é o sentido da família. Se não é uma família solidão. Eu acho que, às vezes, a pessoa quanto mais recurso tem, mais ela oferece bens materiais, mas eu acho que isso não é felicidade. Felicidade é carinho, amor, é você poder ficar perto das pessoas. A pessoa saber que você está triste, porque você se aborreceu com alguma coisa, se preocupar com você, gostar de você.
P/1 – É, a hora da refeição já foi muito o momento de reunir a família, né? Acho que é uma coisa que hoje em dia...
R – Se perdeu muito, né? E faz muita falta.
P/1 – Quem que cozinhava na sua casa?
R – Bom, sempre tinha umas secretárias que trabalhavam na minha casa, que vinham de Macaé, que passavam até a ser membros da família. No Brasil a gente tem essa cultura, né, de ter pessoas na sua casa, que cozinham. Então, tinha sempre alguém na minha casa que cozinhava. E o meu irmão se tornou um grande chefe de talento nato, ninguém nunca ensinou isso pra ele, mas ele é o melhor de todos, tudo o que ele faz é maravilhoso. Todas as vezes que a gente viaja pra fora do Brasil e eu alugo apartamento, todos os meus amigos gringos querem ir na minha casa comer lá, porque sabem que ele cozinha superbem. E ele gosta de fazer isso, ele tem prazer em fazer isso. Ele fica olhando pra você pra ver o que você vai achar, se ficou bom ou não. Ele só espera a reação das pessoas. E é muito legal. Mas a gente tinha esse hábito, as pessoas cozinharam. Eu só fazia bolo e doce, é a minha especialidade.
P/1 – E nessa fase de infância você lembra qual era a base, o que vocês comiam, ou um prato preferido?
R – Na minha casa sempre foi uma comida brasileira, saudável. Arroz e feijão como base, como todo bom brasileiro. Sempre teve muita fruta, porque tinha feira na rua que eu morava, então toda semana meus pais sempre tinham o hábito de ir à feira, trazia muito legume, verdura, fruta. Meu pai tinha o hábito de sentar e descascar laranja e dar um monte de laranja pra gente. Até hoje eu sinto falta de alguém descascar laranja pra mim, sabe? De você sentar e alguém ficar te dando a laranja. Também manga que vinha de Macaé, sacolas, de você sentar no terraço da minha casa, no sol e ficar comendo muita manga. Então, tinha sempre muita fruta. Eu com 16 anos desisti de comer carne, nunca fui muito chegada, mas sempre preferi comer muito peixe, frutos do mar, frango. E nunca gostei muito de fritura, desde 15 anos, fiz uma opção por uma alimentação mais saudável. Mas eu acho que a alimentação nossa, antiga, digamos assim, era bem mais saudável porque as coisas mais industrializadas não tinha tanta disponibilidade de coisas assim e era muito mais caro e tal. Infelizmente, essa indústria do fast food veio anos depois, não era a minha geração, quando eu era criança.
P/1 – E dessa fase de infância que a gente tá falando tem alguma história que seja marcante, uma história que você sempre se lembre, que conte pra outras pessoas até hoje? Uma história marcante dessa fase mesmo, uma coisa que você tenha vivido e tenha ficado.
R – Em que sentido?
P/1 – Qualquer sentido. Uma lembrança mesmo, uma memória que você tem forte dessa fase da vida.
R – Ah, infância pra mim, de lembrança são férias na casa dos meus avós em Macaé. Era assim, muito bom, quando juntava a família, todo mundo se hospedava no Natal na casa dos meus avós. Então, eram oito irmãos, aquela coisa que todos os netos tinham que dividir quarto, todo mundo junto, isso era muito legal também. Esperar a criançada toda pra abrir presente de Natal na árvore, era divertidíssimo. Aniversários. A minha avó sempre vinha de Macaé pra confeitar o bolo do meu aniversário. Hoje eu vejo que os aniversários são tudo em casa de festa, tudo pronto. Nos meus aniversários tudo era feito na minha casa, então, é difícil dizer o que era mais divertido, a preparação da festa, enrolar os doces, raspar a panela, ver a minha avó confeitar o bolo e a festa em si. Tudo junto. Era uma grande celebração desde o início até o final. E eu acho que isso é muito legal também, né? E não é comprável. É uma coisa assim: “Ah, é mais prático porque não suja a casa”. Mas essa bagunça, acho que é tão humana você ter essa coisa de receber. Não precisa ser uma festa pra 500 pessoas, mas se tem dez crianças, 20 crianças, o aniversário é muito animado já, já dá uma boa bagunça assim. Eu acho que isso é uma boa lembrança da minha infância.
P/1 – E escola, Fernanda? Qual que é a primeira recordação que você tem da escola?
R – Ah, escola. Eu sempre adorei escola. Minha mãe era professora, então quando eu entrei na escola eu pulei o jardim de infância, que hoje eu não sei que nome é, e fui direto pra aprender a ler e escrever, fiquei só meio ano porque eu fui sempre tão fã da minha mãe, eu achava ela sempre tão máxima referência pra mim, eu achava ela a mais linda, a mais bonita e ela era professora. E daí eu queria que ela tivesse orgulho de mim. E comecei a aprender a ler e a escrever antes, porque ela dava aula pras crianças e ensinava as crianças a ler e a escrever. Então, com ciúmes das crianças que ela dava aula, que eu sou super ciumenta, eu aprendi a ler e a escrever muito rápido, porque eu queria mostrar pra ela que eu sabia fazer aqueles deveres. Eu pintava em casa os deveres das outras crianças e eu passei rápido pra aprender a ler e escrever. E sempre gostei de ser boa na escola, primeiro que ela ia brigar comigo se eu tivesse nota baixa, sempre foram rígidos, e porque eu gostava de ser exibida: “Ah não, eu tirei nota boa”. Mas fui muito bagunceira. Sempre estudei em colégio de freiras. Primeiro foi um colégio chamado Das Mercês, depois Colégio São Vicente de Paula, que eram divertidos, eu aprendi a tocar piano no colégio. Eu gostava de tudo, eu gostava de Educação Física, de Artes, de Teatro, piano, todas as atividades eu topava fazer.
P/1 – Teve um professor marcante, você se lembra?
R – Ah, tinha muita freira, né, que eram nossas professoras. Eu acho que a da alfabetização, talvez, Irmã Maria das Graças, sempre fica, quem ensina a ler e a escrever. A Lia que era também dessa época de ensinar a ler e a escrever. Por acaso eu lembrei agora. E na faculdade, que eu fiz Educação Física, marcante foi o Paulo Figueiredo, que foi meu professor de Atletismo e se tornou meu primeiro técnico, que me ensinou tudo do esporte, de como é treinar, ser atleta. Essas pessoas são memoráveis pra mim.
P/1 – E nessa fase de infância, começo de adolescência, você lembra o que você queria ser quando crescesse? Você tinha isso?
R – Ah, eu quis ser tanta coisa até porque o que eu me tornei nunca era uma profissão, ninguém nunca ia imaginar que você quando criança, alguém te perguntar: “O que você vai ser quando crescer?” “Eu vou ser triatleta, vou nadar, vou pedalar, vou correr”. Então, eu inventei praticamente a minha profissão, inventei o esporte que na minha geração nem existia, eu sou uma das pioneiras do meu esporte no Brasil. Eu me tornei profissional de um esporte. Então, assim, quando criança nunca imaginaria que existiria triathlon, até porque triathlon, toda criança nasce triatleta, toda criança ama nadar, ama correr, andar de bicicleta, então no fundo eu já nasci triatleta, como todas as crianças nascem. Eu pensava em ser bailarina, professora, gostava de teatro, de fazer peças de teatro. Já sonhei em ser arquiteta, porque eu gostava de desenhar plantas de casas. Eu fiz na escola Arquitetura como profissionalizante. Enfim, um monte de coisas.
P/1 – E nessa fase de juventude você fez o que era primário, ginásio, entrando um pouco na adolescência, queria saber o que você fazia pra se divertir.
R – Em que fase? Adolescente?
P/1 – É, adolescente, na juventude. Com quem você saía, pra onde você saía... Quais eram os programas.
R – Bom, meus programas favoritos eram ir à praia, o principal, pegar onda, pegar jacaré. Andar de bicicleta em Macaé nas férias, ficar andando pela cidade inteira. Encontrar com os amigos, com as amigas, pra conversar, pra se divertir.
P/1 – Sair pra dançar você saía? Tinha isso?
R – Eu gostava muito de dançar, eu fazia dança, adorava dançar. Na minha época era discoteca, tinha o final de semana uma vez. Tive a curiosidade da noite, mas nunca fui... Assim, a curiosidade normal de saber o que era a noite, o que era sair, mas nunca foi meu programa favorito a noite, foi mais pela curiosidade. E sempre amei carnaval. Amo carnaval. Assim, carnaval do interior que era os clubes, as fantasias, sempre fizemos fantasias lindíssimas. Minhas mães, eu falo mães porque eu tenho duas tias que são irmãs coladas da minha mãe, Alice, Luiza e Terezinha. E as minhas primas, a gente fazia fantasia igual, então sempre foi muito animado, até depois eu vir a desfilar mesmo em escolas de samba na minha cidade, em Niterói e tal. Então, sempre gostei muito de carnaval, e esse também era um programa legal que eu gostava.
P/1 – Você está falando do carnaval na juventude, conta um pouco como eram as músicas, quais eram essas fantasias, pra gente visualizar mesmo. Descreve um pouco como é que era o carnaval.
R – Bom, o carnaval do clube era um carnaval de cidade do interior. Era um carnaval muuuito legal, era uma banda e tinha muita marcha divertida, que até hoje não fazem marchas como faziam. As pessoas cantam até hoje aquelas marchinhas antigas, né?
P/1 – Você lembra de alguma?
R – Eu sou péssima pra cantar, mas quando acabava o baile era (cantando): “Cidade Maravilhosa”, isso era sinal que estava acabando. Outra (cantando): “Olha a cabeleira do Zezé”, essas músicas clássicas de carnaval. E depois até umas músicas de samba mesmo, de samba enredo, são as músicas dessa época dos anos 80. Eram sambas que até hoje eles estão refazendo revival desses sambas, reeditando as escolas de tão bons que eles eram. A gente ia pro baile, dançava até não poder mais e era isso o carnaval, ficava rodando lá, dançando.
P/1 – E das fantasias, você se lembra assim?
R – Eu já saí de índia, odalisca, bruxa. Mas não é bruxa feia, é toda linda, tipo o chapéu bordado, estilizado assim, bem legal.
P/1 – Tem alguma história assim, de baile de carnaval, que seja memorável?
R – Então, nessa de bruxa, era uma fantasia cheia de fitas coloridas, era uma roupa colada, eu devia ter uns dez aninhos, nove, por aí e o chapéu tinha um monte de estrela, preto. E tinha umas coisas penduradas, estrelinhas caídas. Carnaval de meninas, a gente dava as mãos, as meninas, e ficava rodando o salão em círculos. E tinha uns meninos que ficavam puxando toda hora que eu passava o meu chapéu de bruxa. E as meninas estavam querendo chorar. Eu falei: “Não, espera, vamos dar mais uma volta”. E quando a gente deu mais uma volta, eles fizeram de novo isso, só que eu era meio Mônica da turma. Aí eu peguei a camisa de um, peguei a camisa do outro garoto, PUM, bati um com a cabeça no outro e aí eles começaram a chorar e foram chamar o pai. Aí daí o pai veio e falou assim: “O que houve? Quem bateu em vocês?”, aí eles apontaram pra mim. Aí, eles pagaram dois micos, um porque eles apanharam de mim e o outro porque o pai falou assim: “Não acredito que uma menina pequena de dez anos bateu em vocês”, e eles ficaram com mais raiva ainda, né? Foi superdivertido, coisa de criança.
P/1 – Você era brava?
R – Não, mas eu defendia todo mundo. Sei lá, acho que meu signo tem aquela coisa de justiça. Se alguém fizesse alguma coisa com a minha prima, com meu primo, ou com meu irmão, então, eu ia tomar as dores. Eu nunca comecei uma briga, mas sempre defendi e se eu comprasse a briga eu não ia sair até eu resolver. Aí, eu ficava brava (risos).
P/1 – Você descreve a sua infância e juventude muita coisa física, né, dança, o surf, tudo isso. E fora essa parte de entretenimento mesmo, que era natural da sua parte do cotidiano, você mencionou que você fazia dança. Você fazia algum outro esporte? Não treinava?
R – Não, eu aprendi a nadar normal, em escolinha de natação, mas nunca fui treinada desde criança, era uma coisa, na escola eu praticava handebol, joguei handebol, mas atividades escolares. Eu só fui realmente me tornar uma atleta na universidade. Eu comecei a despertar pro lado de ser atleta e tal com 17, 18 anos, por aí.
P/1 – E você se lembra quando você decidiu fazer Educação Física? Por que você decidiu fazer?
R – Cara, eu entrei na faculdade com 16 anos, então, na realidade foi uma loteria. Com 16 anos você não tem muita certeza do que você quer. Eu tinha achado que tava entrando no clube porque eu estudei na UFRJ, então tinha aula de vôlei, basquete, handebol, natação. Era muito bacana, mas eu não tinha essa consciência, “eu sou uma universitária, eu estou estudando pra ser uma profissional”. Muito nova, não tinha essa maturidade. E na sequência eu comecei a ter essa maturidade na universidade, comecei a ser professora na universidade, começava a dar aula porque eu achava divertido. Com 18 anos eu já organizava colônia de férias, depois eu comecei a dar aula em escolas, fazer estágio. Na própria universidade eu dei aula de dança. Depois eu comecei a fazer triathlon, foi o segundo triathlon, primeiro, segundo que aconteceu no Brasil, eu fiz como um desafio: “Ah, eu quero fazer porque eu ouvi falar que é legal e tal. E foi na época que eu estudava Fisiologia e Atletismo com o Paulo Figueiredo. Logo na sequência eu tive a honra e a sorte de começar tendo ajuda de um fisiologista, então, eu comecei superbem. Ele me orientou, não pro triathlon só, porque ninguém sabia o que era triathlon, era novo, mas pro treinamento, porque o treinamento esportivo, independente do esporte, a questão de fisiologia é a mesma. Então, foi aí que eu comecei a me tornar um atleta. E aí eu não sabia o que era ser atleta, gostei de ser atleta, fiz a prova e achei bacana pra caramba. Consegui terminar, era o meu objetivo, aí eu falei: “Nossa, se eu consegui terminar, bacana. Agora eu vou treinar mais”. Eu comecei a treinar, aí o meu objetivo de terminar se transformou em melhorar meu tempo. Em três anos eu tava já ganhando as provas, sendo campeã brasileira. Aí eu comecei, em consequência disso, eu virei profissional do esporte. Mas não foi assim: “Eu vou ser profissional”, aconteceu de ganhar e as pessoas me procurarem e me oferecerem patrocínio e tal. Eu falei: “Quem não quer patrocínio, vão me pagar pra fazer isso? Nossa, que bom, eu amo fazer isso, vai ser ótimo”. Aí eu comecei a entender o que era ser uma atleta profissional. Mas eu consegui, na realidade, unir o útil ao agradável. Ser profissional no que eu mais gosto de fazer.
P/1 – Eu queria que você falasse pra gente como é que foi essa fase de faculdade. Como é que foi vivenciar a faculdade, o que você fazia, como eram as relações, amigos, tudo isso. Como é que foi a faculdade pra você?
R – Bom, faculdade pra mim foi um período muito conturbado, muito rápido. Eu fiz a faculdade em três anos e meio e foi o momento que eu me formei e comecei a ser atleta. Então, ao mesmo tempo no final da faculdade, eu já tava treinando, já tava viajando, eu já tava ganhando os campeonatos, então foi um momento muito de transição na minha vida. Eu não tenho muitas recordações da faculdade, dos amigos da faculdade, porque foi um momento que eu tava cortando tudo e me entregando a uma outra coisa 100%, eu tava virando 100% atleta. Não era aquela coisa assim: “Ah, eu vou me dedicando à faculdade”. Como eu descobri isso na época da faculdade, isso passou a ser prioridade pra mim, eu acabei me tornando muito mais atleta do que qualquer coisa assim. Então, às vezes, o foco foi totalmente mudado. Tem muitas pessoas: “Ah, você não lembra de mim da faculdade?”. Eu não criei uma coisa afetiva. Assim, com meu técnico, que é o Paulo Figueiredo, com as pessoas que participaram desse processo da atleta, aí sim. Mas o outro lado eu acabei passando muito por ali, né?
P/1 – Como você descobriu o triathlon?
R – Eu ouvi dizer que ia ter uma prova que nadava, pedalava, corria, eu falei: “Nossa, que incrível”. Eu achei que seria uma oportunidade enorme pra mim de conhecer uma coisa diferente, praticar um esporte que não existia, mas não tinha dimensão o que ia ser, foi um papo de corredor, de universidade, assim que eu descobri.
P/1 – E como foi a sua primeira prova, quais são suas recordações?
R – A prova era no Rio, tinha que nadar, pedalar, correr nos lugares mais incríveis no Rio que era a Orla Marítima. O Rio é superbonito, nadava em Guaratiba, pedalava pela Barra e corria até Copacabana. Então, assim, foi uma experiência desafiadora porque a prova era longa, eu saía de uma extremidade. Meus pais falavam: “Tomara que ela pare, entre no carro, é muito longe”. Eles estavam preocupados que eu tinha inventado um esporte tão difícil, não tinha essa proporção. Nem existia, né? Eu inventei um negócio supercomplicado. Mas no final eu tinha essa resistência, sabe, é uma coisa minha, física, de gostar e tal. E aí foi uma descoberta desse talento, do dom pra fazer uma prova que durava tanto tempo.
P/1 – Quanto tempo a prova?
R – Ah, naquela época não lembro quanto tempo eu levei pra fazer minha primeira prova, mas eu vim fazer provas que duravam mais de quatro horas, cinco horas, né? Pra quem tá começando então.
P/1 – E pros seus pais? Você se lembra como foi a reação da sua família, quando você, de fato, começou a se dedicar a isso.
R – É, perguntavam pro meu pai: “Coitada da tua filha, você não dá dinheiro pra passagem, ela vai correndo pra praia, é tão longe”. Aí minha mãe ficava: “Ai, tadinha da minha filha, ela vai fazer uma maratona, demora tanto”. Ela rezava para eu desistir e voltar no meio. Depois que eles começaram a entender. Eu comecei a ganhar, ganhar troféus, eles falavam assim: “Ah, minha filha é triatleta” “Triatleta, o que é triatleta?” “Ela vai fazer uma peça de teatro, onde é?” “Não, ela é triatleta: nada, pedala e corre” “Ah tá” “E ela é campeã, ela ganhou”, aí eles começaram a ter orgulho, sabe? Mas no início eles achavam uma coisa meio extraterrestre, ninguém era triatleta, só eu.
P/1 – Você se lembra da primeira prova que você ganhou?
R – A mais importante, ganhei várias, mas a que marcou mais foi em 86, foi um campeonato internacional no Rio de Janeiro. Era uma Copa superimportante, era um campeonato internacional, vinha pessoas de fora, alemão, americano e eu era uma das favoritas, mas eu nunca era mencionada pela imprensa, o brasileiro gostava de valorizar mais quem vinha de fora. E meu pai ficava bravo e falava assim: “Nossa, mas você ganha tudo aqui e tal”. Aí, o meu maior orgulho, eu ganhei. E foi bacana porque assim, não só ganhar, pra mim, uma confirmação que eu tinha um talento e tal, mas ganhar sendo brasileira no Brasil. Você passa não só a ganhar a prova, mas a ganhar a torcida. A partir desse momento as pessoas falavam: “Nossa, é a Fernandinha do Brasil, a triatleta brasileira, ela vai ganhar, ela ganhou das gringas que vieram competir”. O brasileiro adora ganhar, né? Então, ele torce num esporte quando ele tem chance de ganhar. E aí eu tinha essa responsabilidade de ganhar pelo Brasil. Eu passei a adorar essa responsabilidade, por isso que eu ganhei tanto assim, porque não era só por mim, porque eu adorava passar nas ruas e ouvir as pessoas: “Vai Fernanda! Vai Brasil! Vamos lá, força!”. Você corre mais rápido, não é uma coisa só sua de ego. Você representa um monte de gente, entendeu? É uma responsabilidade tão grande, mas é uma coisa tão maior, tem uma dimensão tão bacana assim, sabe? Aí eu passei a ser a Fernanda, não só a Fernanda de Macaé, que os macaenses queriam que eu fosse de Macaé, passei a ser Fernanda de Niterói, que realmente é o que eu sou, e Fernanda do Brasil, que represento o Brasil no mundo inteiro, no Havaí quando eu vou correr, quando eu vou pro mundial e tal. Você passa a inspirar outras pessoas a quererem ser atletas. Porque quando você faz um negócio que nunca ganha um brasileiro, ninguém quer ser, mas quando o brasileiro ganha, todo mundo quer ser. E hoje tem milhares de pessoas sendo triatletas.
P/1 – E você lembra de alguma situação que tenha sido marcante também com algum torcedor?
R – Ah, tem engraçadas assim. Marcante eu acho que é a sua família que tá lá te esperando, é meu pai que sempre ficava um pouco antes da chegada. Na realidade o meu torcedor número um é meu pai, minha mãe e meu irmão. E agora meu marido. Acho que a família é seu torcedor principal. Meus primos, meus tios. E depois vem todo mundo, seus amigos, as pessoas e depois vêm as pessoas que você não conhece, mas que passam a te adotar também, né? Então, meu pai ficava um pouco antes da chegada. Ele ficava nervoso demais. Ele deixava até eu nervosa, não podia ficar muito comigo antes da prova, a minha mãe falava: “Manuel, vamos dar uma volta e tal”. Ele ficava antes, quando chegava 200 metros antes, aí ele tava lá com a mão: “Pô, valeu, valeu, mais uma!”. Isso é, nossa, eu vivo de novo isso cada vez que eu fecho os olhos assim, eu me emociono de novo, eu vejo isso. Não tem preço. Quando você se entrega a uma profissão, você tem a honra de ser abençoado com isso, eu acho que se eu ficar com 80, 90 anos eu vou conseguir viver isso de novo. Porque a coisa do campeão, não existe ex-campeão, porque não existe o ex-ano de 2000. Eu sou uma campeã e vou ser eternamente, porque se eu fechar os olhos eu vivo isso tudo de novo, eu vejo meu pai, eu vejo a mão dele. Eu cruzo aquela linha, entendeu? De novo, com a mesma emoção. É difícil até de falar sem se emocionar porque é uma sorte assim, num país que não tem esporte, as crianças não são incentivadas na rua a serem atletas, é tão difícil isso, num país que não tem esporte você ser campeão. Não só campeão regional, mas ser... Eu fiquei 14 vezes entre as dez melhores atletas do mundo, cinco vezes campeã do Ironman Brasil, então, milhares de títulos. Seis vezes entre as três melhores atletas do mundo. E aqui a gente vê que todo mundo me pergunta assim: “Ai, como é que eu faço pra conseguir patrocínio?”. É triste porque não tem nem como falar, é difícil, é quase uma Mega Sena você ter patrocínio, você conseguir viver do esporte no Brasil. E eu consegui. Então, eu me considero, não que eu ganhei na Mega Sena, que tem que trabalhar muito, mas imagina, eu tenho 50 anos, eu vivi 30 anos do esporte, não sou milionária, não consegui, não posso parar de trabalhar, preciso continuar a trabalhar, mas eu consegui viver do esporte, isso é uma Mega Sena. No meu país é. É um honra, um privilégio.
P/1 – Falando dessa questão de ganhar e de se manter, você se lembra do seu primeiro emprego, o que você fez com o seu primeiro salário? Ou primeiro ganho como atleta?
R – Hum... Cara, meu primeiro dinheiro eu não lembro. Eu lembro que foi na universidade. Não sei se eu fui... É comprar coisas pra mim, porque eu sou supervaidosa, eu sempre tive tudo, nunca vivi luxo nenhum, sempre tive o básico, graças a Deus. Minha mãe sempre foi assim: “Isso eu posso, isso não posso”, não podia, às vezes, comprar uma roupa de uma loja, mas a minha tia fazia uma roupa tão bonita quanto a da loja. As pessoas perguntavam até onde eu tinha comprado a roupa. Eu acho que elegância eu aprendi muito com a minha mãe, que não precisa ser uma roupa de grife, é muito mais um comportamento, saber se vestir bem, se colocar bem, ter educação. Mas eu sempre gostei assim, tipo, a minha mãe falava: “Ah, isso eu não posso comprar porque é muito caro”, aí eu fui comprar essas coisas, um sapato que ela não podia comprar, um perfume, sei lá, não sei o que eu comprei.
P/1 – Coisas que você desejava.
R – É, besteira assim. Porque não faltava tanta coisa na minha casa, entendeu?
P/1 – E o seu marido, como é que você conheceu?
R – Bom, meu marido, eu não conheci ele no esporte, porque eu sempre gostei de conhecer pessoas de vários segmentos e quando eu... Uma época que eu estava solteira eu gostava muito de sair pra me divertir, tinha um amigo em comum. O meu marido trabalhou a vida inteira com moda, ele morou 15 anos fora do Brasil, em Paris, ele foi um dos modelos mais bem sucedidos na época dele, o nome dele é Sérgio Mello. Fez campanhas internacionais pra Yves Saint Laurent, filmes. E eu achava ele lindo, maravilhoso, coisas básicas de garota na idade, e esse amigo em comum me apresentou a ele. Na época ele tava também se tornando fotógrafo e cinegrafista, eu sabia que ele trabalhava, tinha uns projetos pra televisão francesa. E nessa minha conquista eu acabei convidando ele pra fazer uma cobertura de um evento nas ilhas Fiji que eu ia competir. Eu, muito mal intencionada, nas ilhas Fiji, que não é nem um pouco feio, paraíso. Aí, eu não só ganhei a prova como ganhei o marido, então eu não voltei casada, mas voltei namorando e a gente nunca mais se separou desde então. A gente casou no ano 2000, mas a gente está junto há quase 20 anos, há 17, 18 anos. Engraçado, dizem que não pode misturar trabalho com amor, não combina. Nessa prova, eu não gostei porque eu não ganhei o prêmio, o cara não pagou o prêmio, mas eu acho que foi um pouco sorte porque o meu maior prêmio naquele evento foi o Sérgio. Não pagaram a premiação, isso foi um calote.
P/1 – E como é que foi o casamento de vocês?
R – Bom, eu sempre tive o sonho... Eu sou católica, do meu jeito. Eu acho que a religião tá muito dentro da gente, do que a gente faz, de como a gente trata as pessoas. Eu acho que tem muito do discernimento de você analisar, estudar e pensar o que é bom. A base da minha religião é não fazer pra ninguém o que eu não gostaria que fizessem comigo. Então, eu acho que respeitar as pessoas, amar as pessoas, acho que é uma coisa que acabaria com guerra, com tudo. E ser um pouco solidário, as pessoas estão deixando de ser humanas, sabe? Não é que você tem que dar esmola pras pessoas, se você dá atenção pras pessoas, às vezes vale muito mais do que uma esmola. Então, eu vejo uma religião muito mais na prática do dia a dia. Eu acho que não combina você rezar 200 Pai Nosso, ver uma pessoa caída e fingir que não é nada, sabe? Hoje as pessoas tirando fotos do lado de uma pessoa que morreu e finge que não morreu. Sei lá, muita frieza assim. Então, eu tive o sonho de casar na igreja, porque eu queria a benção. E o padre Navarro, da igreja onde eu morava, eu sou super fã dele, ele faz uma missa democrática. Até porque ele não se coloca como um ser superior, ele fala que ele é um dos maiores pecadores, ele também exercita pra ser uma pessoa melhor, então eu acho que isso aproxima as pessoas da igreja dele. Eu falo isso muito pra ele, eu falo assim, eu acho que a forma de você, a mensagem, cada um vê de um jeito, mas a mensagem mais bonita do Cristo é que ele virou humano, assim. Porque o cara, se você acredita nele ou não, mas a mensagem daquela história ali foi um cara que era filho do Deus, digamos assim, e foi preso, todo furado, sofreu, então era pra ser mais humanizada a coisa. Então, eu fiz questão de casar pra ter essa benção da igreja.
P/1 – Qual igreja?
R – Católica, Santo Cristo dos Milagres, no Alto da Boa Vista. Foi bacana. No dia do meu casamento eu treinei, porque eu tava indo pra Austrália competir no Ironman, eu fiz 20 tiros de mil metros, corri pra caramba. O Sérgio não fazia questão, ele chegou na igreja, ele nem sabia o que ia acontecer direito. Mas foi uma festa muito linda, teve todos os meus são convidados, meus amigos. Tinha um amigo que produziu tudo pra mim. Eu entrei com um vestido bacana, fiz tudo assim como um sonho de princesa, assim?
P/1 – Como é que era? Conta um pouco como era seu vestido, a música, você lembra, que tava tocando?
R – A música, Tosca, uma música do Pavarotti, acho que sim, clássica.
P/1 – Você lembra como a igreja tava enfeitada?
R – Tinha flores e tropical, porque o Havaí é algo que é muito importante pra mim, é onde eu consegui meus melhores títulos de campeonatos, então, era tudo palmeira, tudo tropical, tinha guirlanda de flores. Eu entrei na igreja sozinha com um monte de dama. Eu queria que meu pai entrasse com a minha mãe e me aguardasse lá, foi assim, foi bonito assim, minha família, meus amigos, foi bem legal.
P/1 – E teve uma festa depois?
R – Teve festa, convidaram a jantar, aproveitei bastante assim. É porque eu sempre falo assim, o dia da noiva, por mais que você seja cético, que todo mundo fala: “Ah, isso é caretice”, mas não é. O dia da noiva é incrível, você tem que aproveitar. Acho que as mulheres que falam assim: “Ah, isso é besteira, é sonho de Cinderela”, tá perdendo, é muito bom.
P/1 – Vocês tiveram uma lua de mel, assim, ou você tava indo pra uma competição logo depois?
R – A lua de mel foi uma loucura, porque não tive lua de mel, eu competi e ele fez um, a gente tinha um programa de tv na época, ele fez a cobertura como cinegrafista (risos), na Austrália, ainda viajamos horrores, do outro lado do mundo. E eu fiquei em terceiro lugar nessa competição. Não tive uma lua de mel assim. Eu não acredito muito nisso, acho que lua de mel tem que ser todo dia, sabe assim? Acho muito forçado lua de mel, parece que é um momento que você tem que ficar no quarto, eu não gosto de ficar presa, assim. Eu sou muito romântica, mas não sou muito assim de... Pra mim a lua de mel estava ótima porque eu fui competir, fui viajar, namorava, depois competia, não ficava preocupada que tinha que ficar uma semana só namorando, acho que ia ser muito chato.
P/1 – Conta pra gente um pouco como é que surgiu o instituto?
R – Bom, o Instituto Fernanda Keller tem 15 anos. Eu sempre pensei muito no que fazer com tanto troféu, com tanta medalha. Eu sei que pra mim é importante, pro meu país, o que eu conquistei, profissionalmente isso me dá uma credibilidade muito grande. Mas fica uma coisa meio egotrip, né? Eu acho que a forma mais bacana que eu encontrei de dar sentido aquela quantidade enorme de troféu foi compartilhar aquilo. Ver que o que eu ganhei poderia servir pra inspirar jovens e crianças a seguirem a trilha do esporte. Porque eu sei que ser campeão não é pra todo mundo, mas ser campeão na vida é pra todo mundo. Você ter os seus objetivos e vencer esses objetivos é pra todo mundo. E o esporte tem que ser pra todo mundo. O esporte é fundamental na formação de uma pessoa, ele é essencial na saúde de uma pessoa. Ele é fundamental pra socialização. Não existe evento mais importante do que os jogos mundiais, as Olimpíadas, Copa do Mundo. Às vezes, países que estão em guerra, eles brincam juntos, eles jogam juntos, eles disputam juntos. Então, o esporte é mágico, ele é uma linguagem universal. E a minha forma de compartilhar foi levar isso pra criançada. Infelizmente no nosso país o esporte não é pra todos. As escolas não estão mais valorizando o esporte. A Educação Física não é levada a sério, ela não tá nem sendo considerada como uma disciplina mais como ela deveria ser, é uma tristeza ver isso. E o esporte ajuda tanto a criança a aprender. Esporte não é separado de Português, da Matemática, da Ciência, é junto, entendeu? Corpo são, mente são, todo mundo trabalhando junto. A obesidade não é uma questão de estética, eu não me incomodo, ninguém é pra ter um corpo magro e um biotipo longilíneo, cada um tem o seu biotipo e eu respeito isso. Mas não dá pra você respeitar as crianças não terem saúde. Porque a obesidade, ela não é saudável. Você ser uma pessoa endomorfa, ser mais cheinha é uma coisa, é até bonitinho, não é feio. Você ser magro não é feio, mas tem um limite, sabe? Tem um percentual de gordura que é saudável dentro do padrão da saúde. Tem outros que levam a doenças. E não é admissível uma criança, entendeu? Eu acho que, eu falei: “Cara, as crianças têm que fazer esporte”.
P/1 – Você se lembra assim, um momento que você identifica como sendo, como a ideia surgiu ou um...
R – Eu fui convidada pela prefeitura da minha cidade, Niterói, a criar um projeto, como ícone da cidade, como referência do esporte. O prefeito achou que seria bacana a gente, eu espelhar outros jovens e aí surgiu essa ideia.
FINAL DA ENTREVISTA
Plano Anual de Atividades 2013 - Projeto Nestlé Ouvir o Outro, Compartilhando Valores – PRONAC 128976
Depoimento de Fernanda Keller
Entrevistada por Teresa Ruiz
Rio de Janeiro, 13 de maio de 2014
Realização Museu da Pessoa
NCV_HV08_Fernanda Keller_Parte 2
Transcrito por Karina Medici Barrella
MW Transcrições
P/1 – Fernanda, pra gente retomar o ponto que a gente parou na última entrevista, você estava começando a contar pra gente como é que surgiu a ideia do Instituto. E aí, explicar um pouco o que é o instituto, como ele foi estabelecido e qual o trabalho que vocês fazem.
R – O Instituto Fernanda Keller pra mim, é um sonho realizado. São 15 anos consecutivos de ação fazendo acontecer, compartilhando, levando pra milhares e milhares de crianças e jovens um pouco da minha história, da minha experiência como atleta. Essa essência é a minha essência com esse trabalho, né? Tudo o que eu consegui na minha vida, que eu conquistei foi através do esporte. Eu acredito no esporte demais como transformador, ele transforma pra melhor, ele disciplina, ele dá coragem, determinação, perseverança, e eu acho que isso falta muito nos jovens de hoje em dia, as pessoas se desanimam logo no primeiro obstáculo. E a vida hoje é difícil, são muitos obstáculos a transpor. Então, o esporte dá aquela garra que as crianças precisam. E é divertido, você passa essa mensagem, não como uma doutrina pesada, assim, com palavras pesadas, por mais que aqui eu falando parece uma coisa muito séria, mas na prática é contagiante, porque o meu esporte é o triathlon, então, o Instituto Fernanda Keller vem do triathlon, da minha vida. E triathlon, toda criança nasce nadando, pedalando e correndo. A gente nasce, adora brincar de água, de bicicleta, de correr; aos poucos, quando a gente vai ficando adulto que a gente deixa de ser triatleta, mas se você quiser deixar, né, você pode praticar esporte a vida inteira. Então, é um esporte democrático, que deve ser praticado por todas as pessoas, quem não pode treinar sistematicamente, mas usar final de semana pra andar de bicicleta, pra correr, pedalar, eu acho que são esportes aeróbicos. Então, é todo esse conjunto, né, da formação do indivíduo, que a nossa preocupação de cidadania é a formação do jovem, da responsabilidade, a parte da educação que o esporte é totalmente integrado. As crianças precisam estar estudando, a gente tá acompanhando pra ver se elas estão indo na escola, a gente tem parceria com as escolas municipais, estaduais, tá sempre interagindo com as diretoras, secretaria municipal. E ouvindo feedback deles, o que é muito bacana, porque a gente já ouviu muitas coisas assim: “Olha, quando a gente fala que vai proibir o esporte eles melhoram na escola”. Então, é uma ferramenta aliada pro professor de Matemática, de Física, de Ciências. A gente tá sempre trabalhando em conjunto e forma o ser, uma pessoa completa, não só intelectualmente, mas também fisicamente; a criança precisa de se mexer, ela precisa praticar os exercícios e tal. E pras famílias, que a maioria vive em comunidade de risco, não tem muita estrutura, o tráfico domina as áreas. Agora a gente vive uma situação, no Rio de Janeiro, de guerra, né, todos os lugares as crianças correm risco de vida nesses lugares. Então, ter um lugar desse é um oásis pra elas, sabe, é meio como se ela estivesse pegando oxigênio, saindo de um mundo que é muito difícil, uma realidade que é muito complicada. E pros pais também é bacana. Então, hoje, depois de 15 anos trabalhando assim, encontro na rua jovens, adultos, pessoas que passaram por mim. A gente tem um projeto, com a Nestlé a gente tem um projeto focado na Nutrição, na parte de crianças obesas, desnutridas, orientação, por que estão assim, chegar a uma orientação, transformar a vida delas pra melhor, fazer uma reeducação com a família, com a escola, com as crianças. É todo um processo que deu muito certo. Com a Universidade Estácio de Sá são bolsas de estudo. Então, eu tenho alunos que chegaram comigo com sete anos de idade, hoje já estão com 20 e tal, depois de 15 anos, são formados. Têm uns que já dão aula de Educação Física, já têm o próprio projeto deles, um grupo de treino deles. É super bacana de ver, você passou isso adiante, você semeou, a semente pegou, cresceu e virou uma árvore e também já está dando frutos. É muito bacana você passar essa responsabilidade, você deu todas as ferramentas, a pessoa compreendeu, assumiu a responsabilidade que ela tinha que ter assumido e se transformou numa pessoa universitária, uma pessoa que tem trabalho, que não vive naquela marginalidade, que não tinha esperança e tem esperança. Ela passa a ser um referencial pra própria comunidade dela, pra outras crianças. Porque eu não moro na comunidade, então, às vezes as pessoas falam: “Mas ela não mora lá, queria ver se morasse”. Tem sempre um comentário. Mas eu me preocupo como se eu morasse, sabe? Porque eu acho que o jeito que as pessoas vivem hoje em dia é muito bizarro, é condomínio fechado, cheio de grade, eu acho isso muito triste. Eu fui criada na rua, brincando com todo tipo de criança, não tinha essa violência. Então, eu me preocupo porque eu acho que as pessoas têm que ter essa oportunidade de interagir mais, né, a melhor escola deveria ser a escola pública, os melhores professores deveriam ser os professores do ensino público, que ia atender as crianças sem cobrar nada, recebendo do Governo para formar os brasileiros, né, independente se ele é rico, se é pobre, azul, verde, amarelo. A preocupação é com a pessoa, isso é o mais importante. Eu sou muito fã do Nelson Mandela e tem uma frase que ele diz assim: “O dia que as pessoas pararem de se preocupar com a cor da pele azul, verde e amarela, e se preocuparem com as pessoas, independente da cor, a gente começa, realmente, a transformar”. E a mesma coisa, eu acho, que é pro nosso país. Então, 90% das pessoas vivem em lugares complicados, de difícil acesso, é um pequeno percentual da população vive que num condomínio mais estrututurado. Então, todo mundo tem que ter acesso. A minha preocupação é que, infelizmente, nem todas as escolas no Brasil oferecem esporte. Por incrível que pareça. O que tem de gente sedentária, criança sedentária, então, foi uma forma que eu consegui realizar de contribuir da minha parte como atleta, é fazer valer a pena todos aqueles troféus daquela prateleira, sabe? Todas as vezes que eu ganhei cinco vezes campeonato Ironman Brasil, que é a prova mais importante, valer a pena, que eu fiquei recorde mundial de 14 vezes entre as dez melhores atletas do mundo no Ironman do Havaí que é a prova mais importante. Minhas seis medalhas de bronze, fiquei seis anos entre as três melhores atletas no mundo, também no Havaí. Então assim, isso como carreira pra mim é o máximo, uma carreira consagrada. Mas mais ainda é fazer com que tudo isso se transforme em referência e eu possa deixar um legado de pessoas, que o meu legado seja passar adiante essa mensagem, não fique só pra mim, sabe? Hoje eu tenho muito orgulho das crianças, porque elas me realizaram como pessoa, como atleta. Quando eu vou lá e vejo aquela garotada treinando, correndo, se esforçando. Eu fui no Forte Rio Branco um dia desses e tinha um rapaz sorrindo pra mim, era uma visita, inclusive, da equipe da Nestlé, e de repente esse jovem falou: “Olha, você tá lembrado de mim? Eu fui da primeira turma”. Ele já devia ter uns 20 e poucos anos. “Queria te agradecer porque na comunidade é superimportante”. Ele deu um depoimento que pra mim, a gente às vezes, vai fazendo, vai fazendo, vai fazendo, não tem nem tempo de parar, aí, quando você escuta uma coisa dessas, sabe, ele: “Pô, transformou minha vida. Hoje eu tenho trabalho, eu trabalho no Exército, eu sou formado”. É muito legal você ver isso, sabe? E não é caridade. As pessoas acham que você tem que, a pessoa que tem poder aquisitivo acha que dar o dinheiro resolve; não é assim, é agir, atitude que você tem perante a sua vida, sociedade, de que forma você pode. Porque é muito fácil a gente falar assim: “Mas isso não é responsabilidade minha, isso é responsabilidade do Estado. Você tá fazendo uma coisa que não é sua responsabilidade”. Eu sei disso, eu sei que a gente, às vezes, fica estressado porque é complicado você ter apoio, às vezes você não tem apoio. São 15 anos, imagina o que eu já passei. Graças a Deus, a minha mãe, meu pai, meu irmão, meu marido e a minha família, todo mundo me ajuda, todo mundo se envolve de alguma forma. Mas realmente a gente passou muitos momentos difíceis, sabe? Porque como não é uma responsabilidade sua é difícil você fazer com que as pessoas entendam um pouco, entendeu? E parece que não é muito incentivável no nosso país você fazer com que você transforme as pessoas. Porque elas viram pessoas inteligentes, elas têm discernimento, elas não vão votar em qualquer pessoa, elas são mais esclarecidas, elas têm cultura, elas têm raça, elas têm vontade própria. Elas lutam pelo que elas querem. Então, pra pessoa que governa e quer enganar os outros, essa pessoa não vai ser boa, porque ela não vai ser enganada, entendeu? Então eu formo guerreiros lá. Mas não é guerreiro pra sair batendo, lutando, quebrando nada, guerreiros são pessoas que entendem quais são os direitos e deveres deles. Eles sabem as obrigações, o esporte passa muito isso. Então, essa é um pouco a missão, você contribuir pra interferir na sociedade, dentro da sua possibilidade. Eu sei que eu sou um beija-flor, eu sei que é uma gotinha, mas eu faço minha parte.
P/1 – Qual é a faixa etária e o perfil do público do Instituto, Fernanda?
R – Nós atendemos no instituto crianças entre sete e 18 anos, na realidade 18, 19, 20, porque são alunos que já estavam, não entra com 19, mas são alunos que começaram cedo e que, por causa da bolsa de estudos na universidade, eles permanecem ainda porque eles estão cursando a universidade. Então, quando tem evento, que a gente leva pra competir em várias competições de triathlon, de corrida, aí eles vão representando a gente, o Instituto.
P/1 – E como é que é selecionado esse público? É uma inscrição?
R – A inscrição é gratuita, geralmente são crianças das escolas públicas que fazem as inscrições. Tendo vaga pode entrar quem quiser, entendeu? Até lotarem as turmas.
P/1 – Mas ser de escola pública é uma obrigatoriedade, ou não?
R – Geralmente, porque são crianças que não têm acesso. A gente prioriza as crianças que não podem pagar, que não teriam como fazer esporte de forma alguma. Tendo mais vagas a gente abre, mas geralmente é bem focado em um público que vive em área de risco, das comunidades mais carentes, que não têm muito acesso. Que aliás essa palavra eu nem gosto, não sei nem porque eu falei agora assim, porque eu acho que carente todos nós somos, né, são comunidades menos favorecidas, comunidades que não têm tanto acesso a uma boa educação e ao esporte.
P/1 – E as atividades são feitas no contraturno escolar? Eu queria só que você contasse que tipo de atividades, ou como são organizadas as aulas pra gente entender.
R – Pra poder atender ao maior número de crianças, as crianças que estão na faixa etária de sete a dez, 12 anos, elas fazem duas vezes por semana. Tem turma pela manhã e turma à tarde, dependendo do horário que a criança vai à escola, ela vai no outro turno. Se ela estuda de manhã ela vai à tarde e vice-versa. E as crianças que são as que a gente chama do Grupo Competir, que já é mais velha, que estuda, elas vão quase todo dia, de segunda à quinta, que é o funcionamento. Os professores dão aula de natação, de ciclismo, de corrida, mas principalmente a gente tem um trabalho psicológico, educacional, conversa, ouve. Agora com o trabalho da Nestlé a gente tem uma nutricionista acompanhando, a gente faz uma avaliação com as crianças pra encaixar ela num perfil pra ver se ela tá com obesidade ou desnutrida pra poder fazer um trabalho junto com os médicos da universidade, da UFF, os nutricionistas, pra ela poder ter uma assitência maior, pra além dela fazer esporte, ela melhorar na saúde, né? Porque é impressionante, mas quando as pessoas começam a melhorar um pouco de vida, a ter um pouco mais de dinheiro, elas começam a comprar uma alimentação pior, coisas que engordam muito. E por muitas não fazerem muita atividade a obesidade infantil tem aumentado muito. E a gente conseguiu transformar a vida de tanto menino! Eu digo assim, que eles começam todos tímidos. E é bacana porque, como a nutricionista faz uma entrevista, a psicóloga, individual com cada criança, eles ficam mais à vontade de poder dividir um pouco e não fica aquela coisa muito de: “Ah, você precisa emagrecer”, é mais ouvir um pouco da criança e ajudá-la, ela entende que ela tá sendo ajudada e eles aceitam muito bem. E aí eles entram com a baixa autoestima, né? Aí eu falo que depois melhora até demais porque eles começam a ficar tudo fortinho, sarado e aí se acham também. Eu falo: “Nossa, aquele ali foi demais, agora ele tá se achando o mais gostosão do pedaço”, mas é divertido você ver o resultado positivo, você ver a criança acreditar mais nela, se achar mais bonita, sabe? Todo mundo gosta de ser elogiado, né? Então, você vê que mexe muito com a pessoa.
P/1 – Acho que tem um bem-estar também, né, assim, vai melhorando não só a vaidade, mas um...
R – Com certeza, com certeza. Porque a obesidade não é só a questão da pessoa não conseguir vestir uma roupa bacana e cair bem, o pior é que a pessoa não está saudável. Geralmente quando você tá obeso, os seus níveis saudáveis, em números, você vai fazer um exame de sangue, você não tá equilibrado. Então, você tem riscos de ter diabetes, colesterol, tem vários fatores que não são saudáveis e que interferem. Então, quando a pessoa perde peso ela se sente mais leve pra fazer tudo, sabe? Realmente é carregar um peso, você está obeso, aquele peso interfere muito no bem-estar da pessoa.
P/1 – Eu queria entrar mais nessa questão de nutrição pra gente falar um pouquinho sobre o Programa Nutrir. Primeiro, como é que você conheceu o Programa, como foi esse primeiro contato do instituto com a Nestlé, mais especificamente com o Programa Nutrir?
R – Bom, nós participamos de um edital tem uns quatro anos, eu acredito, e nós fomos o único projeto que tinha relacionado a esporte selecionado. Foi muito bacana, porque apesar do nosso projeto ter o esporte também, a nossa consciência é ampla, não é um projeto apenas pra formar atletas. É pra formar pessoas através do esporte e é pra levar o máximo possível de informação, de possibilidades através do esporte. Então, você fazer um trabalho de nutrição através do esporte é muito legal. A gente já fez trabalhos relacionados à cozinha. A Cozinha Brasil foi dar dicas de alimentação saudável. A gente já fez projeto de natureza, de ecologia com esporte. Então, são várias, a gente pode caminhar através do esporte, fazer essa ligação. A gente fez trabalho com o Daniel Azulay de desenho, a gente vai interagindo ao máximo. Quando surgiu essa oportunidade a gente achou muito bacana, até porque quando a gente participou do edital, o legal era que a gente aprendia muito, não era uma coisa assim, a gente foi selecionado pela credibilidade do trabalho. Depois, ao invés da gente ter que dizer como ia ser feito, não, a gente foi fazendo junto. Existe uma equipe da Nestlé que interage o tempo inteiro com a gente e vai dando as diretrizes junto com o trabalho que a gente vai fazendo. Então, muitas vezes, não só na parte de essência, de conteúdo, de troca, mas na parte burocrática, de estrutura. Eu acho que isso também que foi muito importante pra gente nesse projeto, foi ter aprendido muito, poder tirar dúvida, poder seguir um caminho onde a gente pudesse estar ouvindo outras experiências e aprendendo com elas também, levando toda a nossa expertise, todo o nosso know-how adquirido durante tantos anos, com esse trabalho com as crianças com o esporte, mas recebendo essa oportunidade. E foi muito legal porque a gente conseguiu envolver médico de família, universidade federal, prefeitura, exército, médicos, laboratórios, todo mundo entrou contribuindo com a sua parte, tornando o projeto mais sustentável e fazendo com que fosse possível a gente realizar através de parcerias.
P/1 – Você disse que a Nestlé veio também com um conhecimento pra dividir. Como é que foi essa implementação dentro do Instituto, uma coisa meio passo a passo mesmo, teve uma capacitação, uma formação? Como a equipe de vocês, do Instituto, e a da Nestlé se envolveram pra fazer isso acontecer no instituto?
P/1 – A capacitação foi na época do edital, quando a gente foi selecionado. A gente já foi várias vezes participar de congressos, conferências, a gente recebe a visita das pessoas da parte social da Nestlé que vão visitar o Instituto. A gente faz relatório, recebe as interferências pra poder trabalhar em sintonia, então é uma coisa, o tempo inteiro assim, a gente não fica isolado fazendo o que a gente pensa e acabou. A gente tá sempre passando pra eles, recebendo visita, vendo. Porque é muito diferente quando você escreve num papel, quando as pessoas vão lá ver o trabalho, ver a ação, ver acontecer, é uma diferença muito grande. Eu acho que quando você vê realmente o que é feito, o impacto é maior porque você tem como, é São Tomé sabe, ver pra crer? Então quando você vai lá e você... Quando eu falo que uma criança entrou com 80 quilos e hoje ela perdeu 20 quilos você não tem noção, quando você vê a foto, você vê a pessoa ao vivo, vê a transformação e você vê a mudança, você vê o comportamento, você vê as crianças treinando, é um outro impacto, né? E aí a interferência é o tempo inteiro, tanto a gente dizendo o que a gente vai fazer, quais são as nossas ideias, participando dos congressos. São vários congressos, são várias capacitações, a gente já foi representar a Nestlé duas vezes na Conferência Mundial de Saúde Infantil e Valor Compartilhado, uma foi a minha coordenadora pedagógica que foi a Washington e a outra, que aconteceu em Londres, eu fui representando. Foi superimportante, a gente aprende muito porque a gente ouve depoimentos de pessoas que também trabalham o lado social na Índia, na Europa, na África e ver de que forma essa ação, ou ações distintas são feitas, né? O que mais me impressiona é que hoje é obrigado ter o cuidado com tudo, com a água, porque sem água, a água é sagrada, então, a Nestlé tem trabalho que se preocupa com a água. O cultivo pro café, então tem preocupação de estar junto da fonte, da onde vem, as pessoas que plantam, está dando subsídio, tá ensinando. Então, porque se não tiver isso, se a gente não compartilhar isso, vai se perder e ninguém vai conseguir chegar a lugar nenhum, nem o cara que tá lá quebrando cabeça, e nem a Nestlé vai ter a melhor entrega do melhor produto. Então, eles se preocupam desde a fonte, a origem. E aí vão surgindo os projetos sociais, porque existe aquela consciência global da estrutura, pra você chegar a ser uma referência. É importante você ter essa consciência de valores e de poder compartilhar pra você receber e poder interagir, pra você interagir na sociedade de uma forma consciente, sabe? Então, não é nada assim, não é nada do nada, tudo tem sempre uma linha a ser seguida.
P/1 – Conta pra gente alguma ação, ou algumas ações, dentro do Instituto, dentro da esfera do Nutrir. Pra gente entender um pouco que atividades estão envolvidas nisso, que atividades com a equipe, que atividades com as crianças, alguns exemplos mais concretos.
R – Bom, a gente começou apenas com um trabalho com as crianças. A gente recebia as crianças, no nosso grupo tinha quase 400 crianças. Dessas crianças, a primeira ação feita, nós selecionamos quase 100 crianças, 80, por aí, que tinham que ser tratadas especificamente pela questão de desnutrição e obesidade, que era o nosso foco principal. Selecionado esse grupo, a gente fez toda uma anamnese com os professores de educação física que trabalham no Instituto, com os médicos que fizeram os exames, todos os exames laboratoriais, e com os nutricionistas, psicólogos e os assistentes sociais. Então, a gente fez todo um acompanhamento durante todo o período, que durou um ano, e mediu, acompanhou, avaliou essas crianças sistematicamente para obter o resultado que seria em alguns casos, ganhar o peso, quem estava desnutrido, e fazer com que a criança obesa conseguisse chegar ao peso ideal. A maioria conseguiu, mas a gente teve uma dificuldade muito grande em relação aos familiares, porque a criança recebia uma orientação nutricional e, às vezes, ela chegava em casa e tinha dificuldade porque ela era a única que ia comer saudável. Então, na segunda etapa a gente fez um envolvendo a família, a gente pôde trazer os pais pra fazerem atividades e fizemos palestras para a família explicando, falando sobre a nutrição, sobre a importância da criança estar sendo bem alimentada, escolher os alimentos mais saudáveis. E muitas vezes, a maioria das vezes, esses alimentos tinham até um custo mais baixo do que os alimentos que eles estavam querendo utilizar. Porque existe também uma adequação, você não pode prescrever uma dieta com suplementos que a criança não vai ter acesso por causa da questão financeira. Então, a gente tem que fazer um trabalho específico praquele grupo. Aí, deu mais certo ainda porque a gente teve a família envolvida, então você não só você criava uma história com a relação familiar, mas também com a criança, mas também com a família. Aí, foram vários projetos. A gente também teve um trabalho onde a gente fez uma ação com a cidade, com a comunidade toda. A gente fez uma corrida e uma caminhada pras pessoas terem a consciência do trabalho que a gente tava fazendo. E nesse dia tinha a gente teve todos os nossos parceiros, médicos, nutricionistas nas tendas fazendo as avaliações, falando da importância de uma boa nutrição, envolvendo a comunidade. Como a corrida é um esporte que tá muito em moda atualmente, essa foi a nossa forma de ter bastante gente participando, não só conhecendo o trabalho do Nutrir com o Instituto Fernanda Keller, mas se motivando também. Agora, a nova temporada que a gente vai fazer... Vai focar muito nas ações de corrida pra que a gente possa levar o nosso grupo pra representar a gente nas corridas diversas que têm por aí, no Rio, onde quer que seja. E vamos fazer ações na cidade, em Niterói também, com as crianças, além das aulas, aulas que outras pessoas possam ser convidadas a participar pra conhecer o nosso trabalho, interagir e também que a gente possa atingir um número maior ainda de pessoas. Porque mesmo que ela não treine com o nosso grupo, ela vai poder interagir através do site e poder acompanhar as nossas dicas e poder participar desses treinos especiais. E a gente vai ter como acompanhar a evolução dela, porque no momento que ela se cadastra pra receber o primeiro kit, que seria uma camiseta e uma inscrição pra participar de uma aula junto com as crianças e os jovens que já são as crianças que participam de segunda à quinta, essa pessoa vai poder se cadastrar e a gente vai sugerir que ela também treine dentro da... Com o treinador dela, em outros grupos. E aí a gente vai começar a fazer uma corrente grande que a gente possa estar atingindo milhares de pessoas, que elas se sintam motivadas a participar, a compreender melhor a importância de uma boa nutrição e da prática esportiva na vida das pessoas, no dia a dia, que é um bem-estar, a saúde, o rendimento em todos os sentidos, profissional, pessoal. Então, a gente vai levar essa informação e incentivar também.
P/1 – Essas informações que a equipe recebia, as crianças ou os familiares, nessa etapa que vocês envolveram, tinha estratégias, além de palestras ou aulas, momentos em que vocês cozinhavam no Instituto, ou gincanas, ou alguma brincadeira?
R – A gente não tem cozinha no Instituto.
P/1 – Então nunca...
R – A gente não cozinha no Instituto. A gente oferece frutas. Porque ela faz duas horas, uma hora de atividade, ela não fica lá o dia inteiro. Ela fica na escola durante esse tempo. A gente tentou fazer nas escolas um trabalho de trabalhar junto com as merendeiras, explicar um pouco, foi muito legal, mas foi muito difícil você conseguir entrar numa escola e mudar os hábitos. A gente conseguiu fazer, não são todas as escolas que as diretoras estão abertas a receber esse tipo de contribuição. Então, nem todas estão... Não é sempre bem-vindo você. Então, é mais fácil você levar as pessoas até o Instituto e treinar e receber essa informação lá do que você... Elas se sentem um pouco invadidas. A gente fez essa parte nas escolas durante um período, foi muito bacana, a gente optou em fazer o contrário: ir lá, convidar e porque é mais bem recebido.
P/1 – E eles aceitam o convite assim?
R – Claro, claro. É lotado, as crianças vão todas, todas as nossas crianças vêm das escolas.
P/1 – Mas as merendeiras, essa equipe que trabalha com a cozinha nas escolas, elas não.
R – Não.
P/1 – Só as crianças, é um trabalho direto com as crianças.
R – Isso, e os pais.
P/1 – E essa coisa de passar pras crianças as informações sobre alimento, sobre nutrição, normalmente é uma aula?
R – Isso é pelo professor, pelas palestras diárias, pela conversa. Não existe uma classe que a pessoa senta, né, elas vão sempre recebendo isso durante os treinos, durante o momento que eles sentam pra conversar, interagir, no momento que as crianças são entrevistadas pelos nutricionistas, pelos psicólogos, eles têm essa oportunidade de fazer essa... Porque o que acontece? Quando você fala de uma forma geral, ampla, você fala: “Olha, é importante a alimentação com legumes”, a criança não acha que é com ela, é diferente quando você senta e fala com a pessoa: “Olha, você precisa...”, é completamente diferente. Você pode pensar: “Ah não, mas uma palestra eu to falando com milhares de pessoas”. Você tá falando com milhares, mas você não tá conseguindo realmente mudar milhares de pessoas, elas ouvem, mas entra por aqui e sai por aqui. Quando você fala de uma coisa que é pra ela fazer, que ela tem que fazer, que ela vai seguir um plano, tem um trabalho para ela, ela vai ser acompanhada, aí ela vai se envolver mais. Então, dessa forma, a família se envolve, a criança se envolve, porque isso é feito periodicamente. Então, as palestras, quando a gente faz com as famílias e tal, são feitas juntamente, ao mesmo tempo com acompanhamento individual, porque senão ele não faz muito sentido, sozinho. Pra você ter o resultado efetivo. Se você pega o Mickey Mouse, que é um cara carérrimo, vai ter um cachê caríssimo pra ele falar: “Crianças, não se alimentem de forma que não é muito saudável, comam legumes”, as crianças vão achar lindo o Mickey, mas elas não vão achar que ele tá falando: “O Mickey tá falando pra eu comer legumes, mas eu como”, mesmo que ela não coma assim, sabe? Então, não adianta você colocar quem quer que seja, é diferente assim.
P/1 – Direto mesmo, né?
R – Direto.
P/1 – Quando você faz um balanço de antes do programa entrar, antes de vocês serem parceiros da Nestlé e do Nutrir entrar no Instituto e hoje, o que você acha que mudou, que se transformou, tanto em termos da equipe de vocês, quanto do público que vocês atendem, das crianças e dos jovens?
R – Eu acho que nessa consciência de trabalhar multidisciplinar, né? Você sair um pouco daquela área do esporte e pegar mais responsabilidade numa questão, a questão multidisciplinar, né? Porque o esporte precisa da nutrição, que precisa da psicóloga, que precisa do médico, sabe? E isso é fundamental, porque não dá pra caminhar só pro lado do esporte, ou só pro lado da educação. É tudo integrado. Eu acho que isso foi uma, veio com o Nutrir essa responsabilidade, essa consciência, essa necessidade de interagir pra que a gente tivesse a resposta que a gente precisa ter, pra gente conseguir atingir o número de pessoas que a gente pretende, sempre o maior possível. Então, a gente não se restringiu, a gente passou a ter uma, um outro panorama, muito maior e muito mais amplo, sabe? A gente passou a ter o nosso universo expandido, tanto de conhecimento, responsabilidade, de ter aquela, de querer fazer mais, querer mostrar mais. Porque quando você recebe um incentivo como a gente recebe da Nestlé, é bacana porque a gente também se esforça mais como instituição, porque é um privilégio pra gente poder ter a honra de trabalhar com uma instituição como a Nestlé, é uma instituição tão séria, tão reconhecida, sabe? Nos dá uma credibilidade também, como instituição. A gente precisa ser mais ainda referência do que a gente já é. A gente exige um patamar de excelência no que a gente faz, não pode... Nada assim é feito por fazer, sem ter dados, sem ter anotações, sem ter registros, tudo precisa ser acompanhado e muito bem registrado, sabe? A gente precisa depois prestar contas de uma forma, pra mim eu acho ótimo isso porque é um desafio maior. A gente já tinha um desafio que era enorme, que é o de sobreviver e fazer um trabalho bacana, aí a gente passa a ter um desafio ainda maior, que pra gente é motivante como instituição.
P/1 – E dentro desse contexto do Programa, dessa relação com a Nestlé e do Nutrir, você se lembra de alguma história específica, mais marcante, alguma coisa, alguma história com uma criança ou uma família, com uma mãe?
R – A gente tem várias, né? Quando teve aquela época da enchente, que as crianças perderam as casas em Niterói, que o Morro do Bumba foi abaixo, que morreram pessoas. A gente tinha casos de crianças que estavam morando de favor em colégio, igrejas e elas não faltavam, sabe? Elas iam. Era muito emocionante, sabe? Elas tinham perdido tudo, elas não tinham dinheiro pra nada, mas elas não faltavam porque essa consciência que elas tinham do bem que elas estavam fazendo pros filhos, então as mães levavam as crianças de qualquer jeito. A gente tem o caso do Carlinhos, que é uma referência no nosso trabalho Nutrir porque ele tem diabetes, ele parou de tomar insulina, hoje ele é um rapaz saudável, sarado; ele era um menino gordinho e tinha esse problema da saúde. Ele foi um dos desabrigados. Então, tem histórias muito marcantes, sabe, que tipo, vale a pena. Eles também estão comprando a briga com a gente. Porque não adianta, eu falo sempre: “Não é uma caridade, vocês são responsáveis. Eu não posso querer dar pra você a minha melhor parte se você não quer receber”. Então, tem que ter reciprocidade, eles têm que entender que a Nestlé, que o Instituto, tá todo mundo fazendo um trabalho, que é um trabalho em comum e a parte deles é a parte principal, participar, sem a participação deles não tem resultados. E eles são muito bacanas. Você não tem noção, palestras aos sábados, as pessoas: “Nossa, os pais não vão sábado de manhã pra uma palestra, eles vão pra praia”, eles iam pra uma palestra, entendeu? Às vezes, senhoras saindo da comunidade, levando várias crianças que não são nem filhos dela pra participar, emociona você ver isso, o envolvimento das pessoas. Acho que isso é o que mais marca a gente, sabe? E a consciência dessas pessoas porque a gente fala assim: “Mas as pessoas não dão valor, elas moram lá”. É porque muitas não têm acesso, porque no momento que elas têm acesso, elas passam a ter essa consciência, elas valorizam, mas valorizam muito, entendeu? Infelizmente nem todos têm acesso.
P/1 – Fernanda, eu queria saber um pouco como é a sua relação com alimentação. Como são as refeições na sua casa, se é você que escolhe seus alimentos.
R – Eu, Fernanda, né?
P/1 – Isso.
R – O que eu me alimento? Bom, eu sou atleta há 30 anos, comemorei 30 anos seguidos de carreira como triatleta, meu esporte é o Ironman, tenho que nadar três mil e 800 metros, pedalar 180 quilômetros e correr a maratona. Então, eu venho fazendo isso há muitos anos. Na minha casa sempre teve uma alimentação brasileira, normal, e eu fiz Educação Física. Quando eu comecei a estudar Educação Física e comecei a fazer corrida e triathlon, eu comecei a ter um pouco mais de consciência e selecionar um pouco melhor o que eu ia escolher pra me alimentar, porque eu comecei a sentir a diferença nos treinos. Quando você faz uma alimentação mais balanceada, mais adequada pro esporte, você se sente mais leve e você rende mais. Então de cara, com 15, 16 anos, eu não me alimentava mais com carne vermelha porque demorava a digestão e eu treinava dois turnos, aquilo demorava muito e eu fiz a opção por carne branca. Não comer fritura de forma alguma, até hoje, sei lá, são 200 mil anos que eu não como fritura. E não tem exceção, não tem essa coisa de: “Ah, vou numa festa”, não como. Doce eu como, mas equilibradamente. Eu acho que a dica da minha alimentação é mais equilíbrio. Hoje eu vejo um monte de dieta mais louca possível, pessoas que não têm alergia a nada, porque tá na moda não comer glúten, elas nem sabem o que é glúten, elas começam a comprar coisas sem glúten, nem sabem porque elas estão fazendo isso, porque ouviu alguém dizer. Então, eu sempre... Eu faço consultas com nutricionista, mas não pra ele prescrever uma dieta específica, é mais para eu ter conhecimento, saber um pouco. E eu vou sempre ao médico fazer check-up anual e ela me acompanha dizendo pra mim, por eu fazer tantas horas de treino, às vezes é necessária uma suplementação extra, mas é sempre orientada por um médico. E a minha dieta, eu já ouvi nutricionistas e tenho meu discernimento. E meu pai na minha casa sempre fez muitos sucos de frutas naturais, então, eu nunca troco uma bebida artificial por um suco natural feito na hora, né? Eu tenho centrífuga, liquidificador, eu faço vitaminas com as frutas mesmo, eu misturo um monte de coisa, eu faço com couve, cenoura, maçã, gengibre, laranja. Eu faço vários sucos bem ricos nessas vitaminas, eu tomo na hora que eu faço e isso é bem legal, porque você sente que consegue absorver os nutrientes que você precisa. Eu como a comida brasileira arroz, feijão, normal. Os legumes geralmente são grelhados ou no vapor. E algumas coisas eu faço assada também, mas acho que a forma de você fazer o cozimento dos alimentos sem perder as vitaminas é o melhor possível, né, pra você manter. Então, às vezes os legumes semi cru. O que mais? Eu acho que é isso. Mas eu como pão, geleia sem açúcar, mas tem umas que parecem até que têm açúcar. O que mais? Eu tomo leite, iogurte, não tem nada disso. Eu vejo assim: “Ah, faz mal”. Faz mal pra quem tem problema de alguma alergia à lactose, eu não tenho, então. Eu adoro leite assim, iogurte, todos os derivados, queijo. E a mesma coisa do glúten. Cara, você não poder comer um bolinho? Não tem nada a ver, a não ser que você tenha algum problema, entendeu? Como eu não tenho nenhuma restrição, assim, que a minha médica nunca: “Ah, você tem alergia a isso”. E quem faz exercício, atividade física, é justamente pra você se alimentar, poder se alimentar bem, entendeu? É meio matemática, você precisa de um combustível que você tira da sua alimentação e quanto mais saudável e mais nutritivo ele for, melhor vai ser o combustível e mais energia você vai ter, é meio pra vida. Pra mim como atleta é fundamental pro meu desempenho, mas como pessoa também. Então, se a pessoa tem uma nutrição, a pele dela vai ficar melhor, a disposição dela pras coisas, então só vai fazer bem pra ela. E quando você adquire esse hábito, você passa a... Aí, você passa mal ao contrário, com as coisas mais gordurosas, mais pesadas, assim. Você começa a comer e fala: “Nossa”. Até chocolate. Quando eu tinha 17 anos, 16, eu acho que eu comia muito brigadeiro, até hoje eu como, mas hoje eu como dois, três, tá ótimo, antes eu comia uma caixa. Eu adoro chocolate, mas hoje eu não consigo comer a mesma quantidade que eu comia, como um pouco e já fico feliz, entendeu? Então doce, as pessoas falam: “Não pode comer doce que o açúcar é um veneno pra saúde”. Tá, tudo bem, o açúcar não é a coisa mais indicada, mas eu não vou ficar sem comer açúcar totalmente. Ele não é o alimento que você vai comer de forma descontrolada, mas se eu não tenho diabetes, não tenho nenhum problema com açúcar eu posso comer um pouco, então eu como. E também se você ficar muito radical você acaba passando mal, você vai num lugar, não tem outra coisa pra comer, aí... Eu acho que eu sempre consigo encontrar alguma coisa pra eu me alimentar em qualquer situação, entendeu?
P/1 – E com o Nutrir teve alguma coisa de novo que você aprendeu com nutrição ou alguma modificação? É que você cuida disso há muitos anos, né, mas teve algum...
R – Na realidade foi mais como passar isso de uma forma, não da minha opinião, de uma forma mais técnica, levar... Com o Nutrir eu aprendi como passar isso tecnicamente para as outras crianças e jovens. Porque o que eu faço é bom pra mim, então eu acho que o que a pessoa tem que fazer é o acompanhamento médico, do nutricionista, e saber o que é bom pra ela. Foi como eu falei, não to falando que todo mundo tem que tomar leite se o cara tem alergia, entendeu? Às vezes, um alimento que eu como muito pode fazer mal pra outra pessoa, então é importante ela ter um médico ou um acompanhamento. E às vezes acontece, a pessoa tem um negócio que ela não se sente bem e, às vezes, ela não sabe o que é. Aí ela vai ver, ela não consegue digerir determinado alimento e aquilo faz mal pra ela, causa desconforto, até às vezes ânsia ou alguma coisa na pele. E ela descobre isso, ela passa a ser outra pessoa. Então, você não pode achar que a sua alimentação é ideal pra população.
P/1 – É, um caso a caso.
R – Caso a caso, é.
P/1 – E aí eu vou me encaminhando pras perguntas finais, mas queria saber antes disso se tem alguma coisa que a gente não perguntou e você gostaria de dizer.
R – Ah, do Nutrir, eu acho, o legado que deixa pra essa criançada que participa do projeto, eles têm muito orgulho de fazer parte desse trabalho, eles se sentem muito prestigiados. Todo mundo quer ser prestigiado, é uma honra pra eles receberem a visita da Nestlé quando a Nestlé vai lá. Eles se sentem, da mesma forma que o Instituto se sente prestigiado, esses jovens se sentem prestigiados. Então, eles não vestem uma camisa qualquer, eles vestem uma camisa e eles têm orgulho daquilo, então, quando eles vão pra uma corrida, quando eles treinam com a camisa do Nestlé Nutrir, isso pra eles é um incentivo maior. E isso dessa forma, você realmente transforma essa criança, você faz com que ela acredite mais no projeto, no trabalho que tá sendo feito, porque é um trabalho para ela, não é um patrocinador.
TROCA DE FITA
P/1 – Só retomando, Fernanda, você tava falando da importância dessas crianças, jovens, como se sentem valorizadas.
R – Porque a diferença de você ter um apoio, ter um incentivo de uma empresa que se envolve é completamente diferente de você ter o incentivo de uma empresa que apenas financia, mas não se envolve. Então, eu acho que as crianças também pegam pra ela a responsabilidade. Porque elas precisam não só fazer a atividade, mas corresponder, então elas se sentem motivadas, é bacana isso.
P/1 – E pra fechar, são as nossas duas perguntas finais. Quais são os seus sonhos hoje, de qualquer natureza.
R – Ah, meu sonho na vida é poder sempre manter a minha essência, fazer as coisas sempre, ter discernimento sempre nas escolhas. Não fugir, jamais, do que eu amo fazer, do meu esporte, que é a minha vida. Tudo o que eu faço tem a ver com esporte, todas as missões que eu assumo pra mim são relacionadas à Fernanda atleta, porque eu não sou atleta, o meu espírito é de atleta, tenho alma de atleta. Então, eu tenho espírito campeão, de uma pessoa que não só venceu e vence no esporte, mas que vive isso no dia a dia, sabe? Eu acho que eu tomo pra mim essa responsabilidade. Então, que eu jamais perca essa minha essência e que ela seja uma essência que eu possa contribuir, que não seja uma coisa de vaidade, que ela seja muito mais voltada para fazer alguma coisa que seja boa, sabe? Porque hoje é muito difícil, por questões de trabalho, às vezes, você não pode trabalhar no que você mais gosta de fazer. E minha vida é um sonho, eu tenho 50 anos e trabalhei a vida inteira no que mais amo. Então, muitas vezes se confunde o seu trabalho, com sua essência e com seu lazer porque se você gosta tanto do seu trabalho, do que você faz. E que Deus me ajude para que eu nunca perca essa oportunidade de trabalhar com o que eu gosto, que eu acho que é só dessa forma que você consegue ter sucesso, não só o sucesso financeiro que é importante pra gente sobreviver, mas o sucesso de realização, de fazer sua vida valer a pena, sabe? Tipo, se você for amanhã fala: “Putz, valeu a pena”, entendeu? Porque todos os momentos da sua vida você se dedicou 100% a fazer o que você acreditou, então meu sonho é esse, fazer sempre coisas, ter a chance de fazer sempre coisas que eu acredito.
P/1 – E por fim, como é que foi contar sua história?
R – Contar minha história foi emocionante, porque foram momentos importantes na minha vida, teve momentos que eu comecei até a chorar porque eu lembrei de coisas que, você passa a viver de novo aquilo, você sente aquilo de novo, você passa pelos mesmos sentimentos. Porque eu acho assim, quando você vive coisas muito fortes na sua vida e que são muito importantes pra você como pessoa, não importa quantas vezes você vai ter essa oportunidade, mas você vai poder viver ela a vida inteira. Que quando eu tiver 80 anos, eu vou sentar numa praia deserta, vou fechar meus olhos e vou viver aquilo tudo de novo. Porque é aquilo que eu falei, vai ter valido a pena, sabe? Eu vou ter a mesma sensação, então assim, no momento que eu lembrar do Instituto, de tudo o que eu fiz, das vitórias, eu vou ganhar tudo de novo. Porque você faz o que você tem paixão e você vai se emocionando. Então, eu acho que só vale a pena viver quando a gente tem uma entrega, 100%. A gente não pode ter nada preso aqui, tem que cortar o fio e ir embora, não ter medo. Não ter medo de se arriscar. O Dalai Lama que fala assim, que as grandes conquistas na vida envolvem riscos enormes, você tem que se arriscar muito pra você ter grandes conquistas, grandes amores, envolve muito risco. E se não tiver esse risco não vale a pena viver.
P/1 – Tá certo, muito obrigada!
R – Imagina!
FINAL DA ENTREVISTA
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