Projeto Memórias do Comércio de Ribeirão Preto
Entrevista de Miriam Moreira
Entrevistado por: Luís e William
São José do Rio Preto, 25 de março de 2021
Entrevista MC_HV076
Transcrita por Selma Paiva
P1 - Bom, Miriam, pra começar, eu gostaria que você dissesse o seu nome completo, a data de nascimento e o local de nascimento.
R1 – Meu nome é Miriam Moreira, eu nasci sete de abril de 1974, aqui em São José do Rio Preto.
P1 – Legal. E, já que você estava com a sua companheira, sócia, fala o nome dela também, pra já dar o start.
R1 – A Juliana Cinara da Silva, minha sócia, companheira há 18 anos.
P1 – Sim. Ela também é de Rio Preto?
R1 – Ela nasceu em Cedral, que é uma cidade vizinha, mas mora em São José do Rio Preto há alguns anos, bastante anos.
P1 – Legal. E qual o nome do seu pai e da sua mãe?
R1 – Meu pai é Orlando Moreira, também nascido aqui em São José do Rio Preto e Isonilda de Oliveira Moreira, também nascida aqui em São José do Rio Preto.
P1 – Sim. E você conheceu seus avós? Você tem avós ainda?
R1 – Infelizmente não tenho mais, né? Mas a minha vó materna... você quer que eu fale o nome? Alguma coisa da história?
P1 – Se possível.
R1 – Minha vó materna é de uma cidade vizinha aqui, Planalto. Lá ela e minha bisavó eram parteiras e ficaram bastante tempo lá e vieram pra cá depois, em torno de 1960, por aí e aqui continuaram a trilha da vida. O meu avô materno, o Miguel Domingos de Oliveira, também já não está mais aqui, mas também era de Planalto, veio pra cá com a minha avó. A minha avó paterna, Alice Franco Sales, nascida numa cidade também aqui próxima, que é São Francisco de Sales, Palmeira D´Oeste, veio pra cá também em torno de 1940, acredito, pelo que eu já vi nas certidões. E meu avô, que era funcionário da prefeitura aqui de São José do Rio Preto, também era da mesma região da minha avó, que é o ‘seu’ João Moreira, que há muitos anos já é falecido.
P1 – Legal. E, Miriam, você sabe a origem deles? Eles vieram de origem de outro país, muitos imigrantes, eles moravam...
R1 – Sim. Bom, vamos começar da ordem que eu comecei: a minha avó materna, Guiomar Melo de Oliveira, a mãe dela é italiana, Dona Adélia Castelani, vieram pro estado de São Paulo durante aquela imigração grande que houve e o pai dela, o Dino Merlo, na verdade tinha o sobrenome original, que era Merlo. Aqui virou Mero, né? Ele é de Údine, na Itália. Nós temos alguns registros de parentes na Itália, dele e eles eram viúvos, tinham onze filhos. Eram viúvos, os dois e depois acho que um tinha quatro, o outro quatro, uma coisa assim, eram quatro e quatro e aí se casaram, já com uma idade mais avançada. Essa minha bisavó, que era parteira em Planalto. Tinha uma pensão, era parteira, farmacêuticos, (risos) eles eram, na época, praticamente. E eles se casaram e tiveram três filhos: a minha avó e o meu tio, que eram gêmeos e o meu tio Moreti. Depois de alguns anos, quando eles nasceram, a minha bisavó e o meu bisavô Dino os apelidaram, porque a minha vó era grande e o irmão dela era muito pequenininho, então era Biuca e Pit. Então, a minha vó, aqui em Rio Preto, é conhecida como Dona Biuca, Irmã Biuca, que ela era evangélica. Então, muita gente a conhece como Biuca. Ela foi o grande amor da minha vida. (risos) E o meu avô, que se casou com ela, o pai dele veio da Bahia a pé, pro estado de São Paulo. Ele é baiano, por isso que eu tenho algumas características, (risos) até fortes e eles vieram a pé da Bahia. E aqui fizeram a história deles. Da parte do meu pai, a minha avó Alice era filha de escravos, ali na região de fazendas: Jales, Palmeira D’Oeste, mais pra região indo pro Mato Grosso. Ela era filha de escravos e aí trabalhou em fazendas lá, ela era bem mulata, mesmo. E o marido dela é filho de calabrês. Olha que mistura! (risos) Mistura.
P1 – Boa.
R1 – Mistura boa. E é isso. Até onde eu sei se casaram, viveram a toda juntos e aí meu pai e minha mãe se conheceram aqui em São José do Rio Preto. Bom, aí é outra história, já. Vamos lá!
P1 – E dessa mistura toda que você contou, você viveu algumas tradições, assim, por exemplo: comida italiana, comida que tem origem africana, música, alguma coisa desse tipo, alguma festa que tenha a ver com essas descendências suas?
R1 - Olha, aqui a gente viveu mais a parte italiana da coisa, que era sopa de fubá com ovos em fios, que minha avó fazia, com couve; era polenta, minha vó era muito polenteira. Minha vó Biuca, Guiomar, era muito polenteira. De mais a minestra que ela fazia, que é aquela sopa e depois existia a minestra também, que eu não sei se por influência, eu nunca pesquisei... eu gosto muito de pesquisar sobre a história da gastronomia, mas ela fazia uma minestra também, que virou praticamente uma sopa paraguaia, que era um bolo. Daquela minestra que faz sopa, ela fazia também a minestra tipo torta. E muito macarrão, ela fazia massas e aí acredito que, com as influências daqui, ela fazia o colorau. Eu lembro que o colorau da minha vó era o melhor do mundo. Que é uma coisa já mais regional, nossa, mas ela fazia também, sabia pilar certinho, tirar o extrato no pilão mesmo. O que mais, menino? Agora você me pegou de surpresa, um pouco. (risos) E, assim, aquela coisa de calor, né, de abraço, de beijo. A gente sempre foi, tanto das duas partes... eu convivi mais com a família da minha mãe e essa parte de culinária era mais com a minha avó, mesmo. Da carne de lata. Africanos eu posso dizer que não tivemos muito, foi mais a influência da culinária italiana, mesmo, de fazer... eu não sabia o nome na época, aquela focaccia, ela fazia. (risos) Eu não me ligava, mas eu chamava de bolo de forno, né? Bolo de forma, que é a focaccia. Mais essa parte, mesmo, italiana.
P1 – Legal. E, Miriam, você sabe como seus pais, seu pai e sua mãe se conheceram, aí em Rio Preto? E qual era a profissão deles? O que eles faziam?
R1 – O meu pai foi um dos primeiros formandos do Senai aqui em São José do Rio Preto, então ele era mecânico e ele foi mecânico até aposentar. Está vivo ainda, graças a Deus, mas aposentado. E a minha mãe era de uma criação muito mais simples, mais rigorosa, vamos dizer assim: o meu avô mandava em tudo. Então, quando os meus pais se conheceram, minha mãe era muito nova e meu pai precisou roubá-la. (risos) Ele a roubou. (risos) Roubou, mesmo. Foi embora com ela, ficaram uns dias numa cidade vizinha e depois foram morar na casa dos pais dele, porque meu avô não permitia o namoro e tudo o mais. E aí estão juntos há... menino, faz tempo! (risos) Eu tenho 47, minha irmã mais velha tem 52... 55 anos eles estão juntos, casados.
P1 – Legal, Miriam. Eu conheci São José do Rio Preto o ano passado e ano retrasado, quando começou o projeto e é uma cidade grande, cheia de avenidas, de prédios, mas acredito que, quando você nasceu, lá em 1974, era uma cidade muito diferente de hoje. O que você lembra da sua infância?
R1 – Sim. Eu lembro de muita coisa e eu posso te dizer o que os meus pais me contam e os meus avós me contavam. A gente se estabeleceu ali, meus pais e meus avós, na região do Parque Industrial, que hoje é Parque Industrial. Que o antigo distrito industrial, o primeiro distrito industrial de Rio Preto, hoje é um bairro residencial, um tanto comercial, mas ainda não era chamado Parque Industrial. Bom, essa região é perto da basílica, perto da Ceagesp aqui em Rio Preto. Dos silos - não a Ceagesp hortifruti – da Ceagesp. Então, o que os meus avós me contam é: coincidentemente, os meus avós paternos e os meus avós maternos moravam ali quando jovens, quando eles vieram pra Rio Preto. Então, a minha avó, a Biuca, a Guiomar, me contava que, na rua da minha casa era estrada boiadeira e ali era tudo chão. Eu consigo visualizar isso, porque eu vivi naquele lugar a vida inteira, uma grande parte da minha vida e era estrada boiadeira, eles moravam ali na esquina, a gente sabe quais são as primeiras casas que tinham lá, que é a casa da esquina ali e sei que era uma região, assim: Rio Preto ia até a parte ali um pouquinho pra cima da Bady Bassit e um pouquinho pra cima da Alberto Andaló. Não ia muito mais que isso. Aí tinha a parte da curva da galinha, que virou Curva da Galinha, que era a zona do meretrício, por isso hoje se chama Curva da Galinha. E algumas outras regiões: a Vila Toninho, que era uma viagem pra ir, hoje é um bairro aqui, mas parecia outra cidade. Eu costumo dizer: quando a gente ia até a Vila Toninho, que meu avô tinha algumas casas lá, meu avô materno, a gente fazia até lanche pra ir, porque era muito longe. (risos) Hoje, não. Hoje você pega uma avenida e está ali, é muito rápido, né? Mas é curioso como as coisas mudam e a nossa percepção de distância também muda, né? Aí, de quando eu era criança, eu me lembro ainda do bairro, né, que eu nasci na Rua Visconde de Ouro Preto, entre a Silva Jardim e a Jorge Tibiriçá, até hoje meus pais têm casa lá, que é na direção da basílica, quase chegando na Ceagesp, nos silos, lá. Então, naquela época, a maioria dos quarteirões a gente atravessava a pé, por trilhas, né? Não tinham casas. A maioria do quarteirão não tinha tanta casa e eram as fábricas do lado debaixo: Móveis Primor, que era uma potência em São José do Rio Preto; tinha a Francal, que era têxtil, eu acho que era de papel, indústria de celulose; tinham várias indústrias ali, principalmente moveleiras. Tinha a Móveis Primor e várias outras moveleiras ali na nossa região e ali onde eu morava, mais pra cima, eram mais casas, oficinas, onde meu pai trabalhou muitos anos lá com oficina mecânica, em um terreno do lado da minha casa. E tudo mudou, né? As moveleiras fecharam, viraram igrejas; agência de Inss; outras, escola, porque são galpões imensos que tem ali. Muito grandes. Outros até hoje estão desocupados, até nos dias de hoje, infelizmente e tudo mudou, a cidade foi crescendo, crescendo. Eu, de vez em quando, dou uma volta numa avenida nova, só pra passar, porque eu gosto de saber como está Rio Preto, sabe? Eu gosto muito dessa cidade, nasci aqui e a gente vai vendo as mudanças, mas muita, muita. Tem mais, assim, casas. Às vezes a gente se surpreende, né? “Ah, vou entrar nessa avenida aqui, porque eu quero saber, eu não conheço esse cantinho de Rio Preto” e a gente vai (risos) só pra ver e fica assim, né: “Nossa, gente, eu não conheço mais essa cidade”.
P1 – Miriam, você pegou a época do trem? Eu sei que o trem passa em Rio Preto toda hora ainda, né, mas é de carga. Vocês iam na estação de trem, pra passear?
R1 – O trem é uma história. Você sabe que eu sonho constantemente com o trem. O trem é uma influência que eu amo, porque eu morava a três quarteirões da Estação Rio Preto Paulista. Onde eu morava, ali, são três quarteirões da Estação Rio Preto Paulista. E ali tinha trem de passageiro. E era uma delícia viajar pra São Paulo de trem. (risos) Era a coisa mais gostosa do mundo, mesmo que fosse a segunda classe, mas a gente ia, né? Quando a gente conseguia pegar na Estação Rio Preto Paulista, a gente conseguia lugar no trem tranquilamente, porque eram três quarteirões de casa e a gente conseguia. Mas já na estação original, mesmo, do trem, no Centro de Rio Preto, tinha dias que era muito difícil. Então, eu era bem pequenininha, ainda sou, minha mãe me colocava na janela com a mala (risos) e eu pegava o lugar no trem, junto com as malas, depois minha mãe entrava. E ela fazia compras em São Paulo. Ela fazia compras no Brás e vendia roupas aqui em Rio Preto, uma época, antes dela ser enfermeira. Auxiliar, né? E aí eu ia muito com ela pra São Paulo e o trem era muito gostoso, o trem tinha uma vida, né, que hoje, na pandemia, meu Deus! Que pena, né, que a gente não pode mais, mas já, já vai passar. O trem tinha aquele cheiro, tinha o cara do guaraná: “Olha o guaraná”. Tinha o cara do café. E aquele bilheteiro que vinha toda hora. Eu viajei muito de trem. Dormi muito embaixo, no colchãozinho que a minha mãe levava, no trem.
P1 – Muito bom! E, Miriam, quando você era pequena, lá no seu bairro, pra cima da basílica, também era um mundo muito diferente do de hoje.
R1 – Sim.
P1 – Vocês foram criadas na rua, gostavam de brincar do quê? Eram brincadeiras diferentes? Aí, quando você nasceu, a rua já era asfaltada, né? Ou não, ainda era terra?
R1 – Quando eu nasci ainda não era asfaltada, mas eu acho que eu tinha uns quatro anos, por aí, que eu me lembro da rua sendo asfaltada, da pavimentação da rua, das obras e tudo o mais. Aí asfaltou a rua e aí era muito gostoso, porque era tijolo na mão, amarelinha, caracol. Caracol, não sei, pra quem não viveu, é uma amarelinha também, só que ela é feita em caracol, é tipo aquele joguinho de você levar o carrinho. Aí você volta, se você erra, volta tanto, tinha umas regras que hoje eu não me lembro mais, (risos) mas era essa mecânica que a gente usava. E a gente desenhava também na rua e era bola queimada, que eu nunca me dei muito bem, (risos) porque era muito pequenininha e eu acabava levando muita bolada e acabava virando o famoso copo de leite. (risos) Eu era o copo de leite, não valia na bola queimada, mas jogava muita bola queimada e corda, bastante corda. Depois, na época já que eu estava com nove, dez anos, a gente brincava muito de elástico, que é uma brincadeira... devia voltar essas brincadeiras agora, na pandemia, né, porque a gente, em casa, sozinha, colocava, às vezes numa máquina de costura, que tem as pernas mais abertas e brincava em duas de elástico. Essas brincadeiras: _________ (25:39), essas coisas todas, ciranda, serve já era uma coisa meio proibida, a gente brincava, às vezes, meio escondido. O serve é aquele que passa o anel. Que aí dá beijo na boca, abraço (risos) e tudo o mais. Mas eram essas brincadeiras que a gente brincava. De vez em quando pegava uma boneca, mas a maioria eram essas brincadeiras de rua, coletivas, mesmo. Pique-esconde. Essas brincadeiras.
P1 – Legal, Miriam. E, pra passear, você, na época, nessa época, anos setenta, assim, era mais ir no Centro da cidade, passear lá na praça da catedral? O que vocês faziam pra passear? Iam ao cinema?
R1 – Passeio, normalmente, era sorveteria. O passeio era sorveteria. Eu, da minha infância mesmo... eu falo ‘a minha infância’, eu casei com 15 anos, então eu tive uma infância forte, mas pequena. (risos) E a gente ia muito na sorveteria, eu passeava muito na casa da minha avó. Mas, assim, eu estou lembrando, a gente tinha, também, um passeio muito legal, que era o Bosque Municipal. Que a gente fazia lanchinho pra levar também. Na casa da minha avó paterna eu passeava bastante e lá eu brincava muito dessas brincadeiras aí que eu citei anteriormente. Mas, assim, tinha o Bosque Municipal, que tinha balanço, playground, piscina, os animais pra gente ver. Na Vila Toninho, onde meu avô e minha avó maternos moravam, tinha a represa, que é o Rio Preto, ali, perto da nascente do Rio Preto. Então, ali no fundo da Vila Toninho tinha uma represa onde a gente brincava, nadava, via olho d’água, sonho em ver um olho d’água, (risos) nunca mais eu vi. Mas a gente brincava, porque a gente enfiava a mão no olho d’água, assim, ia enfiando a mão, era areia movediça, a gente chamava, né? Brincava muito com Dorme João. E esses eram os passeios. Era o bosque, a represa lá da Vila Toninho, na casa da vó e a sorveteria. Dia de ir na sorveteria era uma festa. (risos)
P1 – Legal. Era uma vida muito diferente, né, de hoje.
R1 – Muito diferente.
P1 – Pra criança era uma maravilha. E na escola, você ia a pé, como era, onde era a escola?
R1 – Eu estudei, até essa escola eu vi a construção dela porque, na verdade, nesse período que eu morei em Rio Preto, que eu nasci em Rio Preto, eu morei dois anos em Osasco, dos meus cinco aos sete anos. Nesse período a escola foi construída, que é a Escola Voluntários de 32. Ela era ali na Rua São João, aí foi feita uma escola nova, porque a escola era antiga, não ia abrigar todas as crianças que precisavam de escola, foi feita uma outra Voluntários de 32 na Rua Dom Pedro, que era a dois quarteirões da minha casa. E aí eu estudei lá durante bastante... até os meus 15 anos... até os 14 anos e ali eu ia a pé, porque era dois quarteirões de casa. Então, era muito próxima.
P1 – E aí tinha matérias, disciplinas que você se dava melhor, que já apontou um pouco pro seu futuro como comerciante ou não, você pensava em ser outra coisa?
R1 – Olha, minha mãe sempre quis que eu fosse da área da Saúde, que fosse enfermeira ou médica, mas era um sonho praticamente impossível. Eu falo hoje: deveria ter seguido o conselho da minha mãe. (risos) Eu gostaria muito de estar... é uma área que eu também gosto. Me interesso muito, pesquiso, estou sempre atenta pra essa área. Eu não sabia o que eu queria ser, não. (risos) Eu vou te falar a verdade: não. E eu sempre me interessei por vários assuntos e não tinha muito... eu gostava muito de Ciências, gostava muito de História, sempre gostei muito de História. Matemática ali eu me virava, mas sempre tirava notas boas, mas também não era a minha praia. Exatas, jamais, né? E aí eu gostava muito de Artes, da aula de Artes, fazia teatro na escola, amava. O que eu queria ser era da área de Artes. (risos) Mas aí eu fiquei grávida aos 15 anos, então a minha vida mudou muito, né? (risos) E aí eu voltei a estudar, eu trabalhei... quem direcionou a minha vida profissional foram os meus trabalhos, porque aí eu entrei na área comercial, eu era demonstradora, promotora de vendas. Aí fui mais pra essa área do merchandising e marketing e aí que eu fui me desenvolvendo profissionalmente. Mas eu mudei bastante. Acho que a área de Artes que eu queria seguir era disso aí. (risos) Acabei fazendo, porque eu tive bastante mudanças na minha vida, profissionais.
P1 – Você se casou aos 15 anos, né?
R1 – Me casei aos 15 anos.
P1 – E você ainda está com o pai da sua filha?
R1 – Eu me casei aos 15 anos, fiquei casada até os vinte anos, tive uma separação e, aos 23, eu me casei novamente com a mesma pessoa. (risos) Com o pai do meu filho. (risos) E aí eu fiquei casada novamente até os 27, mas infelizmente não fluiu, não deu certo. Tentamos, duas vezes. (risos)
P1 – Mas aí, por isso que você parou de estudar um tempo e foi atrás dos empregos, dessas colocações, que já foram te dando esses vários nortes aí e como é que foi a consequência disso? Porque o bar Vila Aurora veio bem depois, né?
R1 – É. O Vila Aurora veio bem depois. Nós estamos aqui, agora, há 11 anos. Mas antes do Vila Aurora, eu e minha sócia, que é a Juliana, tivemos uma distribuidora de carvão, porque caiu na nossa mão ali, foi uma coisa que aconteceu, uma oportunidade que veio, mas também não deu certo. Aí, depois, eu fiquei um tempo numa distribuidora da Nestlé, não sei se pode falar...
P1 – Pode.
R1 – ... uma distribuidora de alimentos. E ali eu conheci algumas pessoas e vi uma oportunidade de um nicho que estava sem... vamos dizer assim, em aberto, que estava precisando de alguém pra investir. Então nós fizemos um bar alternativo. Desse barzinho virou uma casa noturna, onde a gente já recebeu, por noite, mil e duzentas pessoas numa noite, então ficamos cinco anos com esse bar, que acabou virando uma casa noturna, porque já não era mais um barzinho, né? Antes a gente tinha voz e violão, depois a gente tinha voz e violão de entrada e banda e depois eu tinha que colocar um DJ ali, porque tinha um público grande. Era uma média de oitocentas pessoas/noite e ainda era um lugar muito tranquilo, porque eram pessoas que a gente conhecia, que a gente também protegia ali na diversão, pra ficarem tranquilos, sem nenhum tipo de bullying, preconceito e tudo o mais e tivemos, chamava Enquanto Houver Lua.
P1 – E onde era?
R1 – Era na Marginal da Rodovia, perto do Carrefour. E ali foi muito gostoso, foi muito divertido. A gente abria só de sexta-feira, um dia na semana, mas muita gente se conheceu, as pessoas têm saudade ainda, aqui da região. Tem até uma história curiosa sobre o Enquanto Houver Lua, que eu fui ao Rio de Janeiro, no Encontro da Fátima Bernardes e eu cheguei lá pra maquiar e eu estava maquiando e o menino falou pra mim: “De onde você é?”, eu falei: “De São José do Rio Preto”, ele falou: “Ah, eu sou de Paranaíba. Nossa, mas eu ia muito em Rio Preto, eu ia num barzinho lá superlegal, no Lua”, que as pessoas chamavam de Lua, né? Eu falei: “Você ia no Lua? O Lua era meu”. Menino, ele fez uma maquiagem em mim (risos) maravilhosa! Então, assim: lá no Rio de Janeiro encontrei um cliente do Lua e ele falou muito bem, as pessoas gostavam muito, eu gostava muito do Lua, mas infelizmente a gente tem um tempo pra começar e pra terminar, né? Aí a gente parou com o Lua, depois de quatro anos de funcionamento, por questões pessoais. A gente ficou, ainda, um ano lá no mesmo espaço, com uma locação, a gente locava o local e fazia parceria, chamava Espaço All. E ali a gente ficou e fez vários tipos de eventos, mas já estávamos com o Vila Aurora. Nós compramos o Vila Aurora, ele já existia e aí a gente ficou esse um ano, por questões de contrato de locação, aí a gente entregou o prédio e ficamos só no Vila Aurora. Aí é que começa a história do Vila Aurora. A minha sócia, Juliana, queria muito ter um bar diferente, viver uma vida mais tranquiiiiiila, porque a vida noturna é um tanto desgastante, né? A gente vivia muito intensamente no Lua. E aí ela queria um lugar mais tranquilo, trabalhar com um público mais variado. Ela queria. Aí comprou o Vila Aurora. Só que o Vila Aurora tinha muitos problemas, que a gente não identificou no início, né? Aí foi um tanto difícil, mas a gente foi passando, passando e aprendemos muito com o Vila Aurora. Muito, muito mesmo. E aqui estamos, há 11 anos. (risos)
P1 – Não, muito legal a história. Vocês não tiveram medo, porque vocês tinham empregos assalariados, né?
R1 – Sim.
P1 – Então, quando você ganha salário, você tem uma certeza que aquele dinheiro vai cair ali. O mundo do comércio já dá um medo maior, né? Porque você vai ter que contabilizar tudo, saber quanto é que pode comprar disso e daquilo, o preço que você vai vender. Como vocês aprenderam isso, desde a época do início?
R1 – ________ (39:00), CMV e parara e parara, né? (risos) Tudo isso, que no início a gente não sabia, mesmo. Aprendemos um tanto disso lá no Enquanto Houver Lua, mas não dessa forma que é necessária hoje, porque você sabe que a maioria dos comércios que vieram até dez anos atrás, não tinha muito que... né? Vivia-se muito, mas hoje tem que ser tudo muito metricamente colocado. Então, a gente veio aprendendo isso na necessidade. Aí, quando você me pergunta do medo: eu estava nessa distribuidora de alimentos e eu queria empreender, mudar. É onde eu te falei que eu mudei um tanto, né? Trabalhei bastante tempo em três multinacionais: uma três anos, outra quatro anos, outra seis anos. Eu comecei a trabalhar cedo. (risos) E ali eu tinha vontade de ter um negócio próprio. Sabia que seria difícil, a gente sabe. Muito medo. Eu só me enfiei de cabeça, mesmo, quando eu vi que aquele nicho que eu ia trabalhar estava muito desfalcado. Ele estava necessitando. As pessoas necessitavam de um local legal pra ir. E, assim, a gente se deu muito bem nessa hora, porque realmente a coisa veio de setenta pessoas/noite, pra setecentas, oitocentas, né? Então, foi muito boa essa história e nos rendeu um lucro bom, um esteio bom. Tanto que, quando nós tivemos todos os problemas no Vila Aurora, já, a gente conseguiu segurar a onda ali dois anos, porque a gente tinha um capital de giro bom, por conta do sucesso do Enquanto Houver Lua. Que a gente desistiu num momento bom, saímos por questões pessoais, mas conseguimos nos segurar nesse mercado de barzinho, mesmo, que é muito mais difícil. Tem um mix maior, é muito mais complexo.
P1 – E o bar anterior, Enquanto Houver Lua, cobrava portaria? O pessoal pagava pra entrar?
R1 – Sim, tinha portaria. Era bem diferente, né, do que a gente vive hoje.
P1 – E o público do primeiro bar já era bem diferente desse Vila Aurora?
R1 – Bem diferente. Aí entra uma história das dificuldades que nós tivemos, de diversificar o nosso público. Aí essa história é bem interessante porque, além do universo de bar ser machista, não machista no sentido ruim, não. Hoje, há alguns anos isso tem mudado muito, mas assim: nunca foi coisa pra mulher. Bar não é coisa pra mulher. (risos) E a gente teve uma dificuldade grande, bastante grande, mas persistimos. Eu sempre dizia, falava assim: “Um dia essas pessoas vão sentar aqui”. E elas sentaram e elas sentam. Não estão sentando, por conta da pandemia, né, meu Pai, mas elas se sentam, sabe? E um lugar que fosse de comum e de aceitação e aí foi muito legal porque, por causa dessa dificuldade, é que eu comecei a seguir pra parte gastronômica, que eu descobri que eu precisava me especializar nisso, que bar não é um lugar só pras pessoas beberem, que ele tem que ter coisas boas pra comer e assim você vai atingir todo tipo de público, um público mais diversificado. E assim você consegue aumentar seu ticket médio, toda aquela coisa do Sebrae. (risos) Toda aquela coisa que a gente tinha falado agora há pouco. Então, aí, nessas dificuldades, eu comecei a estudar Gastronomia, a fazer outros cursos, pesquisar cardápio, aprender os termos técnicos de coisa que eu nunca imaginava e aí foi o nosso up, né? Foi onde a gente conseguiu um respeito que a gente não tinha, uma visibilidade e uma visão, pra nós, diferente.
P1 – E como vocês acharam o ponto e escolheram? Eu estou vendo no seu fundo aí o estilo da decoração, com as garrafas, super aconchegante. Vocês que criam ou já estava assim?
R1 – Aí tem uma outra história de mudança, né? Esse bar aqui não era aqui. O primeiro Vila Aurora era a cinco quarteirões daqui. Ele era na Rua Aristides Serpa, número 5, que é próximo ao Bom Jesus, próximo ao Atacadão, ao Colégio Santo André. Lá nós compramos o Vila Aurora, ficamos sete anos e já vai pra quatro anos que estamos aqui, nesse novo local. O primeiro local era uma casinha, gostosinho, mas ainda lá não era esse estilo aqui. Era, assim, visual fora, era... como eu vou te falar? Era uma casa. Então, toda essa decoração aqui ficava lá, mas ninguém via, né? Nós precisamos mudar, por conta de contrato de locação e aí eu falei: “Eu preciso de um lugar que eu possa fazer a coisa do jeito que eu gostaria que fosse. Eu quero mostrar as garrafinhas”. Depois eu te mostro ali: tem umas garrafinhas miniaturas em paspatur, coisinhas que eu fui criando, tinha guardado, a gente foi colocando na parede. E aí nós achamos esse salão aqui, próximo, que são cinco quarteirões, mas é na Avenida Potirendaba, aqui, bem perto da rodovia. Cheguei aqui e falei: “Eu preciso de uma picareta”, porque a nossa fachada é de tijolo de demolição à vista. Peguei uma picareta, (risos) aqui é tudo de tijolo, aí entrei no salão, amei e aí nós fizemos uma reforma, fizemos uma varanda, fizemos uma estrutura, que é essa que você está vendo aqui. Então, esse é o segundo. Foi outra mudança. (risos) A gente mudou pra cá há quase quatro anos.
P1 – Que legal! E aí, pra chamar o público? Tanto no primeiro, quanto nesse. O que vocês fizeram de chamariz? Tem que pôr no jornal? Ou de boca a boca vocês já tinham público? Como é que foi isso?
R1 – Nós tivemos uma história ali embaixo – eu costumo dizer ali embaixo, porque é mais pra baixo daqui – no primeiro Vila Aurora, muito forte, assim. A gente estava num local onde, na época, era considerado uma Vila Madalena de Rio Preto e só a gente não tinha movimento. Não tinha. A gente esperava as pessoas saírem dos outros bares ou não terem lugar pra sentar, pra ir no nosso. (risos) E ali nós ficamos dois anos, assim e aí veio um tanto de público, a gente vai conquistando alguns clientes, vai devagar, mas é bem devagar, bem devagar. Aí, em 2013, nós ganhamos um concurso, que é o Comida Di Buteco.
P1 – Eu conheço.
R1 – Aí, em 2013, nós ganhamos em três categorias o Comida Di Buteco. Que foi, assim... quando eu falo surpresa, as pessoas: “Mas você não confiava no seu trabalho?” Sim, por isso eu ganhei. Mas, assim, você fala: “Gente, eu não acredito”, né? Porque era o segundo ano que a gente participava e a gente fez tudo muito certinho, se profissionalizou muito na coisa, de atendimento principalmente e da cozinha, de logística, de tudo, mas principalmente atendimento. Aí nós ficamos assim, né? Até sem... daí o público começou a nos olhar com um olhar diferente. Mas ainda demorou um pouquinho. (risos) Participamos em 2014, pegamos acho que sexto lugar, está ótimo, foi tudo muito bom, eu aprendi com os erros que eu... porque assim: em 2013, quando a gente ganhou, a gente fez tudo pra ganhar. Tudo certinho, pra ganhar. Só que nós não imaginávamos que nós fossemos ganhar e eu costumo dizer: “Troféu na parede é só responsabilidade, ele não significa nada, é só responsabilidade”. A gente não se preparou pro pós. A gente se preparou pra ganhar, mas não pra vencer, vamos dizer assim. E dar uma continuidade no nosso trabalho. Então, aí a gente pecou, porque eu não fiz essa equipe pra mim, eu tive um público que eu não consegui atender como eu gosto de atender e como eu deveria atender. Então, aí, em 2015, o meu prato não foi aquele que era pra ser. 2016 eu tive um insight da Colherada. Eu falei pro moço que trabalhava com a gente assim: “Eu não sei”, porque o bar, o carro-chefe dele é a costela desossada. E o prato que ganhou em 2013 é o Entrevero e, no meio desse Entrevero, ia a costela. E aí eu falei assim: “Eu queria fazer um Escondidinho, porque o Escondidinho de Costela eu já fiz aqui no bar e o pessoal gosta muito, mas eu queria fazer de uma maneira diferente”. Eu fiquei pensando, pensando, pensando e falei: “Será que é possível montar um Escondidinho numa colher?” Ele falou assim: “Vamos tentar”. Aí eu montei, chama Colherada, um Escondidinho de Costela na colher. Até ele falou pra mim assim: “Mas como que a gente vai gratinar isso?” Eu falei: “E maçarico? Vamos pegar um maçarico e vamos testar?” Pegamos o maçarico, testamos e fica pssssssssss, muito gostoso, muito bom. (risos) E aí eu procurei acompanhamento: geleia de pimenta, gente! Aquela combinação da costela, o catupiry, o purê de mandioca e a geleia - o maçarico, que dá, fica defumado – de pimenta, ficou muito bom. E aí, com esse prato, a gente foi campeão em Rio Preto e vice-campeão nacional do Comida Di Buteco.
P1 – E onde foi o campeonato nacional?
R1 – O nacional acontecia em cada bar, mas a final dele foi no Rio de Janeiro, com passagem pra entrevista da Fátima Bernardes, no Encontro. (risos) E aí, lógico, né, você tem uma mídia nacional, é uma coisa muito forte e que tem um alcance. Aí é que nós viramos, encorpamos mesmo, tomamos corpo, né? E aí foi uma história forte, bem legal. Aí, no outro ano, nós fomos segundo lugar em Rio Preto e no outro ano que participamos, também. Mas aí, no último ano a gente já estava aqui, nesse novo ponto. Então, esse público todo, a gente foi divulgando durante quatro meses, que a gente iria mudar de local. Fizemos assim: boca a boca, um a um, que a gente foi falando: “Olha, o novo local é aqui perto, o endereço”. Fizemos também, tivemos assessoria de imprensa da Sabrina Braga, que foi muito importante, que ela ajudou muito nisso, ótima profissional também. E aí veio o dia da inauguração, (risos) eu falei: “Meu Deus, será que alguém vem?” e vieram, graças a Deus vieram, lotou e ficamos aqui um ano e, depois de um ano e pouco, veio a pandemia, né? (risos) Então, aí já não é mais parâmetro pra nada. (risos) Assim, só resistir, mesmo.
P1 – Ô, Miriam, aí o seu público se estabeleceu, depois você pegou a fama nacional, inclusive. Primeiro a fama municipal, que ganhou aqui, depois a fama nacional. E seu público aí já virou um público, assim, de mais condições financeiras, o pessoal que vai mais pra comer, mas que bebe aquelas cervejas mais especiais? Que público que é agora?
R1 – Na verdade, o público ficou uma faixa etária mais madura, vamos dizer assim. É o que você falou: que vem pra comer, com cervejas diferenciadas e tudo o mais. Realmente, mudou um tanto, um pouco, né?
P1 – E a música ao vivo vocês ainda continuam tendo?
R1 – Sim, sim. Até, no último decreto que pôde ter música ao vivo, que é uma marca muito forte aqui também, a gente sempre... nós estamos numa cidade muito sertaneja e eu até gosto de churrasco com sertanejo, mas a gente tem uma linha MPB, pop rock, uma linha musical focada em outros estilos, que não o sertanejo. E aí eu tenho também um público por conta disso, né? Porque, apesar da gente estar numa cidade muito sertaneja, as tribos não se misturam muito bem. (risos)
P1 – Não, eu ia perguntar exatamente nesse sentido, né? A música ao vivo faz muita diferença num bar, ela traz gente que quer ouvir música, né?
R1 – Traz. A música ao vivo alegra muito. Esses últimos meses que a gente trabalhou aqui em Rio Preto, que a gente conseguiu trabalhar, porque a gente é restaurante, né? Hoje até está prevista aí uma mudança, a hora que passar tudo isso, a gente vai fazer uma mudança na logo, a gente está mudando também o nosso cardápio pra restaurante, porque se não fôssemos também, hoje não poderíamos trabalhar, de jeito nenhum. E há alguns meses também não poderíamos. Mas a música ao vivo, mesmo sendo restaurante, traz uma alegria, mesmo. Traz um público que gosta. O músico é parte do bar, né, do contexto. Ele é anfitrião. Os músicos aqui, eu vou citar um, o Luís Dillah, que parece que o bar é dele. (risos) E é, de verdade. Naquela noite, é. Eles se sentem em casa e fazem a recepção da casa. É muito gostoso trabalhar com eles.
P2 – Ia perguntar: se teve, então, com a música ao vivo aí, revelação, algum cantor revelação, alguma coisa assim?
R1 – Você fala...
P2 – Um novo talento.
R1 – Eu não sei te dizer agora, assim, porque aqui em Rio Preto tem bastante gente que participa dos festivais, vocês devem saber disso. A gente viu algumas pessoas aqui, o pessoal do Chá de Lua se despontando. A cena musical aqui em Rio Preto é muito legal. Ela não é só de um bar, né? Ela não é só de um local. Eles vão fazendo... o Dillah é antigo, já, mas o André Fernandes, o Zeca Barreto trabalham aqui e estão sempre fazendo a cena musical de Rio Preto, né? A Jaqueline Cardoso trabalhou comigo, ela era minha cozinheira, a gente cozinhava juntas. Aprendi muito com ela, mas é uma excelente cantora e ela... talvez a Jaqueline, mesmo, que depois saiu do bar enquanto trabalho, foi pro teatro e aí tomou uma nova cena na vida dela, cantora e atriz. (risos) Pode ser a Jaque, a Jaqueline Cardoso, que é uma querida e que a gente viu a história dela mudar, vamos dizer assim, né? Se diversificar, melhorar, modificar.
P1 – Legal. Ô, Miriam, e quando chegou a pandemia, o que você pensou que ia acontecer? Porque foi um baque pra todo mundo, pro comerciante foi mais ainda, pra todos. O que vocês adaptaram pra continuar conseguir funcionar ou não adaptaram? O que vocês fizeram? Como vocês enfrentaram esse desafio da pandemia?
R1 – Estamos enfrentando ainda, né? Estamos agora na pior fase da pandemia e não tem sido fácil, né? No começo da pandemia, onde a gente achou que fosse lá um mês, um mês e meio e tudo o mais, a gente começou a fazer marmitas no almoço. Fizemos até dezembro. Ficou um tanto inviável organizar - porque aí teve a reabertura, em setembro – o nosso dia e a nossa noite e mais os custos desse dia, porque os insumos, ingredientes, embalagens subiram absurdamente e, pra contratação de equipe... eu observo muito os números da pandemia, então eu sempre dizia, lá em dezembro: “Não acabou. Nós vamos até maio, junho”. Então, eu não tive a certeza que eu poderia montar uma equipe, pra manter esse dia e essa noite. Então, optei em parar com o almoço, por conta de concorrência, também, muita gente fazendo, e focar mais no meu e-commerce, nas minhas vendas, no marketing, curso. De manhã, ao invés de eu fazer marmita, que não está dando lucro, eu preciso fazer alguns cursos, me especializar nessa parte de e-commerce, de marketing. E aí, em dezembro nós paramos e ficamos só com a noite. Aí, à noite já fechou um tanto e agora está fechado, só no delivery. Porém, as nossas vendas no delivery, apesar de não manter a situação, o negócio, estão em crescimento, por conta dessas ferramentas novas que eu aprendi a utilizar. Mas está muito difícil. (risos) Está bem difícil. Nós ficamos aí um ano escoando recursos e vamos dizer assim que está todo mundo já no último suspiro. Acaba que a gente está esperando pra ver o que, de verdade, vai acontecer.
P1 – O que vocês vendem, pra entregar no delivery? Aqui em Bauru, por exemplo – eu estou em Bauru hoje – tem bar vendendo até drinks no delivery. Eu peguei um exemplo aqui: tem um bar aqui de Bauru que vende até drinks no delivery. O que vocês vendem aí, que dá certo?
R1 – Eu tenho modificado, feito alguns testes e, dentro desses testes, eu comecei a montar alguns pratos pra janta, mesmo. Inclusive, no meu cardápio, está assim: para o seu jantar. Porque eu percebi que as pessoas, às vezes, não querem muita bobeira, sabe? O que se vende é pizza, lanche, mas isso é para o jantar. E porções as vendas não são fortes no delivery. Porções, petiscos não são um cardápio pra delivery. Definitivamente. (risos) Então, usei muito... esse campeão de 2013, que é o que eu mais vendo no delivery hoje, que chama Vaca Atrelada, que é a costela com linguiça chapeada e mandioca frita. Que ela serve pra jantar e pra tomar com cerveja também, pra petiscar também. Eu vendo muito a Vaca Atrelada, hoje é o campeão de vendas. E aí introduzi - porque a gente tem a berinjela à parmegiana, que o pessoal gosta muito – os filés à parmegiana pra duas, quatro pessoas e, pra semana que vem, porque essa semana nós estamos com bastante dificuldade em fazer compras aqui. Eu fiz alguns anos, logo depois do Comida di Buteco, um festivalzinho interno, chamava Sabores do Brasil. Então, tem um prato, até, dele que é o fígado com jiló, que também é muito procurado. Então, eu fazia comidas típicas regionais que tinham alguma história, algum contexto de história. Fiz Entrevero, Barreado, Sopa Paraguaia, Chica Doida, a Panelinha Goiana, fiz o Chambari também, uma época, aqui e, na semana que vem eu quero entrar com esses pratos pra janta. São pratos de jantar, mesmo: feijão tropeiro, dobradinha. Isso já pra almoço, sábado e domingo. Dobradinha à noite não vai dar. (risos) Feijoada. Então, eu acho que as coisas... eu acho não, o que eu tenho pesquisado: as refeições têm vendido mais no delivery, porque é aquela pirâmide, né? Esqueci o nome. É a pirâmide, mesmo, as necessidades básicas: comer. Então, não é muito a besteirinha que as pessoas estão procurando. Eu acho que mais as refeições, mesmo.
P1 – O pessoal pede cerveja delivery ou não?
R1 – Cerveja, não. É muito difícil vender no delivery, porque o supermercado tem as latas, os latões, serv festa e, pra levar garrafa e tudo o mais, eles têm um preço que a gente não consegue competir, então cerveja, definitivamente, é um ou outro, que está atrasado, que não foi, que pede. Hoje, nesses 15 dias, está proibida a venda de cerveja nos supermercados, de qualquer forma. Então, não se vende cerveja.
P1 – Entendi. Ô, Miriam, bom, graças a Deus todo mundo sabe que isso vai acabar, né? A pandemia vai acabar uma hora. (risos) Então, teremos um futuro. O que você pensa pro futuro do Vila Aurora, da sua vida, da sua sócia também, que vocês fazem tudo em conjunto aí, mas o que vocês pensam? Tem muito comerciante que tem o sonho de ampliar o seu negócio, de abrir uma filial do outro lado da cidade, ou em outra cidade, montar uma franquia. Tem gente que tem sonhos ______ (01:07:56) assim. O que vocês pensam pro futuro do negócio?
R1 – Existem vários projetos ali que eu deixo na minha gavetinha, né? Que, nesse momento, a gente não tem como. Hoje, de um primeiro momento, é se manter. A palavra é se manter. Se manter firme no mercado. Pra um futuro eu acredito que muita coisa vai mudar. O comportamento do cliente, já nessa primeira reabertura, foi diferente. Como nós temos uma história aí já de mais de dez anos e o nosso público vai amadurecendo e o público que vem do nosso público são os filhos que hoje estão casados, com filhos pequenos, isso a gente já tem observado, o futuro do Vila Aurora é ir pra um caminho mais restaurante, mais gastronomia mesmo, mais comida. E aí, a gente conseguir manter isso, conseguir fazer com que isso aconteça e tirar aqueles projetinhos da gavetinha, né? (risos) Acho que é isso que a gente espera agora. Mas esperar isso passar, esperar essa vacina vir urgente, porque a gente sabe que... eu ficava, em dezembro, entre essa dúvida: “Será que teremos vacina? Em março a gente abre. Mas, se não tivermos vacina, só lá em setembro, novamente”. E é isso que está acontecendo.
P1 – Legal. Ô, Wiliam, você tem mais alguma pergunta pra fazer?
P2 – Eu tenho algumas perguntas pra fazer.
R1 – Tá ok.
P2 – Você falou do seu outro bar, casa noturna, o Lua. O público lá, o jovem é diferente nessas duas experiências que você tem, hoje e no passado?
R1 – É, é diferente. Você fala no passado, no meu antigo bar? No meu primeiro bar?
P2 – Isso.
R1 – Totalmente diferente. Eu posso te dizer que hoje, remanescente do meu outro público, eu tenho quem se casou e hoje está tranquilo, entendeu? (risos) Vem sentar, conversar. Lá, não, era mais agitação, eram as pessoas estarem se conhecendo, encontros. Era totalmente diferente. Então, hoje, você perguntou os jovens... é isso que você perguntou? Se eu tenho jovens que eu tinha lá, mais velhos, aqui ou não?
P2 – Também.
R1 – Tem alguns, sim. Mas aqueles que estão, assim, casadinhos e tranquilos porque, realmente, aqui no Vila Aurora é um lugar de pessoas mais tranquilas, entendeu? Não uma balada, por exemplo.
P2 – Sim. Então, o comportamento da bebida também acabou mudando?
R1 – Acabou mudando, sim.
P2 – E vocês têm bastante funcionários? Como é que é isso?
R1 – Hoje, por conta da pandemia, nós estamos com dois funcionários, somente. Mas chegamos a trabalhar, entre funcionários e freelancers, com 15.
P2 – Com 15? Bastante!
R1 – É porque eu tenho uma calçada ampla aqui, né? Então, em dias de calor e de Luís Dillah, por exemplo, (risos) enche mais. O distanciamento não era tão grande, então tinha bastante movimento. Trabalhava com até cinquenta mesas.
P2 – Bastante.
P1 – Cabem quantas pessoas, então, a lotação aí?
R1 – Vamos dizer que, em rodízio, a lotação aqui, no distanciamento anterior, oitenta pessoas, noventa, até cem. Na reabertura a gente estava trabalhando com trinta pessoas, porque o distanciamento, aqui, é de dois metros. E eu tenho os pilares, então acabei perdendo mais, porque eu acabo chegando num pilar onde é o distanciamento, eu não consigo montar a mesa. Então, a gente vende... já trabalhamos com até cinquenta, mas o normal eram quarenta mesas. A gente chegou a trabalhar com 12 mesas, 15 mesas, no máximo.
P1 – Mas antes da pandemia cabia muito mais.
R1 – Muito mais, muito mais. E as pessoas saíam, porque o que acontece também, eu costumo dizer: os bares que tiveram muita lotação na reabertura parcial são bares que vão jovens, porque os jovens, realmente, estão mais despreocupados com essa questão da contaminação. O meu público aqui, o nosso público aqui é diferente. Ele tem essa consciência, o filho não deixa sair ou ele tem medo, realmente, de sair. E o público que vinha aqui, vinha porque estava se sentindo seguro. Isso eu sempre ouvia: “Olha, vocês estão fazendo tudo certinho, por isso que eu venho aqui”. (risos) Mas aí você acaba tendo menos gente. Você tem que ter menos gente, pra ter um público, né? É isso aí.
P1 – Fala, Wiliam.
P2 – Assim, em dias normais, pré pandemia, como eram as datas comemorativas? Quando enchia mais o bar?
R1- Às sextas-feiras e sábados. Principalmente na sexta-feira, que tem o happy hour, do saco cheio da semana e as pessoas chegam mais cedo. E os sábados também, porque as pessoas se arrumam, vêm. Normalmente sábado tinha rock, né? E aí vem aquele público bem mais arrumado e tal, na sexta-feira e no sábado, antes da pandemia. Os feriados, aqui em Rio Preto, são muito fuga: muita chácara, muito rancho, muita praia. Então, não era tão forte quanto as sextas-feiras e sábados normais.
P2 – Em bar se vê muito a questão do futebol, a televisão. Tem isso aí? Você vê que isso é interessante?
R1 – Tem também. Não é tão forte, mas também trabalhamos com futebol. Tem a galera que vem no meio da semana, na quarta-feira, né, normalmente, assistir futebol, porque os finais de semana, até quando tem jogo e tal, o pessoal vem mais focado na música. Então, não tem tanta relevância.
P2 – Na Copa do Mundo, como é que foi? Teve bastante pessoas? (risos)
R1 – Teve.
P2 - Porque é diferente nesses dias.
R1 – É. Eu sou face sol aqui, né? Então, na Copa do Mundo eu tive um pouco de dificuldade, mas encheu bastante, porque os jogos foram durante o dia, mas encheu bastante, deu uma galera, foi muito gostoso, muito legal. Parou no meio do caminho, porque o Brasil perdeu. (risos) Ai, mas foi legal, enquanto tiveram as boas colocações, ali.
P2 – E também você falou que não gostava muito de Matemática, mais das Humanas e como é que foi isso, de administrar um bar, as finanças, tudo?
R1 – Então, essa parte de controle, mesmo, fica mais com a Juliana, minha sócia. Eu também acabo me envolvendo, mas não sou muito boa nisso, não. (risos) Não sou, não.
P2 – Você falou que sua vó fazia alguns pratos: focaccia, minestra. Como são esses pratos? Podia contar pra quem não conhece?
R1 – A minestra é uma sopa. Ela fazia, menino... Ju...
R2 – Arroz...
R1 – A mãe da Juliana, que também é uma italianona, também fazia minestra. Ela é tipo um mexidão, mas é uma sopa.
R2 – Vai queijo...
R1 – Queijo fresco, o queijo que tem, vão vários ingredientes. Tem gente que faz de um jeito, tem gente que faz de outro. E a focaccia é um pão como se fosse uma massa de pizza, vamos dizer assim. Ela vai fermento em pó, então ela cresce, você coloca o dedo, assim e alguns temperos, né e a faz no forno e ela vira um bolão, assim, sabe? E fica com aqueles buracos, onde você colocou o dedo, assim. A gente tempera com alecrim e sal grosso, mas elas usavam outros temperos. Minha vó usava muito orégano.
P2 – Você falou que sua vó e acho que sua mãe também, eram parteiras, né?
R1 – A minha bisavó e a minha vó eram parteiras, em Planalto.
P2 – E é diferente, uma coisa que quase não se tem mais, hoje em dia, né?
R1 – É. Na verdade, isso foi... minha vó é de 1923. A minha bisavó deve ter nascido... eu não me lembro a data, mas elas eram parteiras até os anos setenta, ali na região. Inclusive, na prefeitura de Planalto tem uma homenagem pra minha bisavó, porque ali ela que povoou a região. (risos) Então, ela tem lá, Dona Adélia Castelani, uma homenagem pra ela, que ela era parteira de toda a região. Eu já encontrei pessoas que ela ‘pegou’. Eu encontrei uma vez uma pessoa que... sabe o que é ‘pegou’, né? Ela que fez o parto. (risos)
P2 – Ela que fez o parto, ‘pegou’. Hum hum.
R1 – Esqueci agora o nome. Um dia eu estava cantando com um pessoal num bar, que uma época da minha vida eu cantei em bar também, antes do Lua... Maria Eugênia... e essa Maria Eugênia estava cantando com os violeiros. Eu fui num bar de violeiros e ela estava lá cantando divinamente bem e aí ela falou: “Eu sou de Planalto” e eu falei: “Você é de Planalto? A minha bisavó e minha vó eram de Planalto” e a minha vó, a parteira que fez o parto dela e ela amava minha bisavó, Dona Adélia, chorou muito quando ficou sabendo que eu era bisneta dela e me contou algumas histórias que ela cantava debaixo de uma árvore, no quintal, que ela era vizinha da minha bisavó e a minha bisavó sempre a ficava olhando e gostava dela, a descreveu e tudo o mais.
P2 – Olha só! Então, povoou, mesmo, o lugar. (risos)
R1 – As pessoas de mais de sessenta, setenta anos, não sei agora te falar quanto, todos nasceram na mão dela, porque elas iam pra todo canto ali, depois a minha vó também começou a ser auxiliar dela e também foi parteira.
P2 – Sim. E você falou que cantava também?
R1 – Eu cantava. (risos) Hoje eu tenho um nódulo, né? Eu parei de cantar porque eu tenho um nódulo de corda vocal, importante. E aí que eu montei o Enquanto Houver Lua. Mas eu cantei um tempo aqui em Rio Preto, com alguns músicos, até, que cantam aqui na casa. Brinquei um pouquinho aí. (risos)
P2 – Quais estilos você cantava?
R1 – Eu cantava bastante MPB, samba, já cantei com o pessoal do sertanejo também. (risos) Eu sou bem versátil, mas eu cantava mais MPB.
P2 – Você tocava também algum instrumento ou não?
R1 – Eu comecei a cantar porque, depois da minha segunda separação, eu passei por uma depressão muito forte e aí comecei a fazer terapia e o terapeuta me indicou alguma coisa. E eu sempre tive vontade de aprender tocar violão, porque meu pai - eu sempre convivi com a música dentro de casa – é músico da igreja evangélica, mas a vida inteira, minha mãe canta, sempre cantou na igreja e eu tive vontade, peguei um violão lá do meu pai e comecei a fazer aula. E aí minha professora falou assim: “Nossa, Miriam, como você é afinada!” (risos) Eu falei: “Nossa, que legal!” E aí eu comecei a tocar um pouco, porque eu toco bem pouco, mas comecei mais a cantar e aí eu era convidada pra cantar aqui, cantar ali, foi onde eu misturei muito, em várias tribos musicais, porque um me convidava ali e eu fiquei criada, muito, com música sertaneja, então sabia cantar música sertaneja e aí comecei a conhecer mais a MPB, mais o rock, mais outros gêneros. Aí eu cantei um tempo aí, depois me deu esse nódulo, eu fiquei sem voz por um tempo, aí, nos tratamentos, minha voz voltou, mas agora eu tenho bar, não tem como cantar (risos) e ter bar.
P2 – E cantava você e mais quem? Ou era sozinha, assim? Ou tinha uma banda...
R1 – Eu, normalmente, tinha... eu cantei muito com um menino que chama Rubens Rocha, ele me acompanhou durante um tempo, que é músico, porque eu não toco bem, assim. Toco só pra brincar, em casa. Então, ele me acompanhou muito, com teclado, é ótimo tecladista. Aí, depois, eu conheci o Ito, que é um músico que tem aqui em Rio Preto, que toca cavaco e ele me apresentou pra várias pessoas da cena do samba e aí, lá eu brincava muito, a gente cantava, fazia muito sarau, muita... às vezes... não era profissional a coisa, a gente se reunia muito pra cantar e tocar, vários músicos, mas eu sozinha, tocar... a Marisa Roveroni também tocou comigo um tempo, pra eu cantar, porque sozinha eu não ia, não. (risos) Não consigo.
P2 – Você disse que casou aos 15, engravidou também aos 15?
R1 – Engravidei também.
P2 – Como foi isso? Gravidez na adolescência e tal, conciliar com _________ (01:25:01).
R1 – Foi muito bom pra mim. Espera só um pouquinho, menino. É que meu filho faleceu o ano passado, então desculpa. (choro)
P2 - Tudo bem. Se não quiser falar, também, não tem problema, viu?
R1 – Não, eu posso falar, sim. Só me dá um momentinho. (choro) Espera só um pouquinho. É bom falar, eu gosto de falar dele. E da experiência que eu tive, que eu não me arrependo em momento nenhum. De ter sido mãe, a graça que Deus me deu, de ter sido mãe, sabe? Eu tive um filho com 15 anos e foi a melhor época da minha vida. Foi uma época mágica, ótima. Eu tinha uma energia. Eu trabalhava na farmácia Galênica, aqui em Rio Preto, junto com a Creusa Manzalli, que é uma mulher que eu admiro muito. E lá eu tinha força, sabe? Eu tinha uma disposição imensa. Não tive medo em momento algum de ter tido esse filho e aproveitei (risos) bastante a vida dele e a gente foi muito feliz. Apesar de ter limitado muitas coisas na minha vida. Eu esqueci o seu nome, menino.
P2 – Wiliam.
R1 – Viu, Wiliam, a experiência que eu tive, apesar de ter sido difícil, limitadora de uma forma, foi muito gostosa, porque um filho dentro da gente é uma coisa, uma energia muito boa, sabe? E nos ensina muita coisa. Eu aprendi a ter uma responsabilidade diferente na minha vida, a ter focos. Pulei uma etapa na minha vida? Pode ser, mas foi muito bom pra mim também. Eu sempre dizia isso pro meu filho, que ele me ensinou muita coisa. Ele não sabe, mas ele me ensinou muito. Ele me fez evoluir muito como pessoa. Vamos lá!
P2 – E como ele era?
R1 – O Davi era um menino calmo, tranquilo, zen, totalmente zen, ele era TI e era um menino bom, bom, bom, muito bom. Um coração bonito, (risos) ótimo, me deu um neto, que é o Pedro Henrique, que hoje está com... vai fazer dez anos, que também é uma maravilha, que me deixa muito feliz. O meu filho me fez muito feliz, a gente era muito próximo e ele era muito responsável, um menino bom, muito bom.
P1 – Legal. Miriam...
R1 – Oi.
P2 – O Davi, o que ele gostava de fazer?
R1 – Ele gostava de pescar; de programar, que ele era TI, era viciado em trabalho; (risos) gostava muito de jogar, tinha os joguinhos dele; gostava muito da natureza, muito, extremamente, então cachoeira, água, gostava muito de água, pesquisava muito sobre plantas, gostava muito de plantar, estava sempre com as plantinhas dele, fazendo mudinha, pesquisa, sabia: “Mãe, isso aqui é bom pra isso. Você está muito nervosa, toma isso, (risos) um chá disso. Essa dor na articulação que você tem, mãe, é porque esse chá é muito bom, ele libera...”, ele falava tudo pra mim, sobre as plantas e as coisas e tudo. Ele gostava muito dessa área.
P2 – Eu passo a palavra pro Luís falar.
P1 - Ô, Miriam, bom...
R1 – Oi.
P1 – Eu queria saber o que você faz, quando você não está trabalhando?
R1 – Quando eu não estou trabalhando?
P1 – Agora.
R1 – Hoje, atualmente eu moro em cima do bar, fiz uma quitinete, que tinha um depósito em cima, por conta da pandemia e do deslocamento, porque eu moro em chácara. E hoje eu tenho ido uma vez por semana só, na minha casa, né? Eu falo minha casa de verdade. (risos) Mas quando eu estou lá eu gosto de pintar meus pallets, fazer alguma coisa diferente, plantar, a Juliana também poda, gosta muito da parte de jardinagem, a gente tem se distraído muito com essa parte de jardinagem. Além de limpar a piscina, a casa. (risos) E, por conta da pandemia, também, a gente tem assistido bastante noticiário, pelo menos uma vez por dia, pra estar por dentro, até pra se programar pro futuro, assistimos filmes e a gente também gosta de tomar uma cervejinha quando está lá na chácara. Às vezes joga um baralho, toma uma cerveja. (risos) É isso o que a gente tem feito hoje.
P1 – Legal. E como você conheceu a Juliana?
R1 – A Juliana era minha vizinha. Teve um período que o Davi, meu filho, morou com o pai dele e eu estava ali sozinha e tinha um barzinho na esquina de casa e aí eu cantava muito. Nessa época eu estava morando sozinha, eu cantava ali e ela sempre quis saber quem era aquela voz bonita, falava que minha voz era bonita. E aí ela comentou, nesse bar, com uns amigos meus, que eram em comum dela, eram amigos em comum, mas a gente não se conhecia: “Nossa, tem uma moça que canta e tem uma voz tão bonita!” “É a Miriam”, porque a maioria das pessoas me chama de Miriam, tanto minha família, como meus amigos. “É a Miriam, ela mora ali” e tal. (risos) Aí me chamaram pra descer e me apresentaram pra Ju. E assim que a gente se conheceu.
P1 – Legal, muito bom. Miriam, tem alguma coisa que você ainda queira falar, que a gente não perguntou, que tenha a ver com o bar, que tenha a ver com a sua vida, que você gostaria de dizer? E que tenha a ver com a Juliana.
R1 – Eu quero dizer, primeiro, que eu preciso falar pra vocês, que eu agradeço muito o convite, por participar desse programa, desse evento e que eu fiquei muito feliz, porque a gente tem seguido uma história, eu e a Juliana, totalmente na contramão do que se é, do que foi colocado pra nós, né? A gente vive num universo que era masculino, que é de bebida e a gente conseguiu - às vezes aprendendo com os erros, nas dificuldades – mudar um pouco o contexto de tudo isso. Duas mulheres fazerem com que o bar fosse uma extensão da casa, mesmo e que duas mulheres colocam um prisma feminino, mesmo, um ambiente feminino, de um cuidado feminino, as pessoas conseguiram enxergar o cuidado feminino. Não que vocês, homens, não estou criticando vocês, mas a gente tem um acolhimento diferente, né? Então, a gente conseguiu entrar nesse universo masculino e, principalmente, vencer todos os tabus que tinham de duas mulheres estarem à frente de um negócio, bar e transformar esse bar e ver a transformação desse bar pra, também, o restaurante descontraído. Então, eu quero agradecer muito vocês, porque vocês estão nos dando essa oportunidade de mostrar isso e quero que nós possamos resistir a essa pandemia, que vai ser um desafio muito difícil e espero nos vermos ao longo desse ano e espero que a gente resista a tudo isso. Acho que é isso, né, Ju? Acho que é isso mesmo. E um prazer estar com vocês...
P1 – O prazer foi nosso.
R1 - ... e que eu possa levar alguma coisa pra alguém, ou da história de Rio Preto, pela visão de uma menina simples, que morou ali na Rua Visconde de Ouro Preto e que não teve oportunidade de estudar enquanto nova, mas teve um filho maravilhoso e que viveu essa experiência, que agora a história, o ciclo se fechou ali, quando eu falei do meu filho, né? E que, mesmo que ele não esteja aqui hoje, mas ele ainda me traz muita força. E espero que as pessoas possam, aí, em todas essas perdas que elas têm sofrido, muita gente, encontrar força, porque a gente sabe que a vida não acaba aqui.
P1 – Miriam, a gente gostaria de agradecer mais ainda você. Esse projeto é muito antigo, já, do Sesc e do Museu da Pessoa, desde os anos noventa, já passou por muitas cidades que tem Sesc. Eu gostei muito da sua cidade. Eu conheci por causa do trabalho, que eu não conhecia, um lugar muito legal e espero que dê tudo certo pra vocês e te desejo tudo de bom. E nosso fotógrafo vai ligar pra você esses dias, não hoje, daqui uns dias, quando você puder ele marca um horário aí e liga pra fazer um ensaio fotográfico aí no bar, pra poder servir de material, tanto pro site, quanto...
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