Estava escuro, era noite. Havia muitas pessoas dentro das suas casas, eu podia ouví-las mas não as via. Eu seguia correndo sozinha no meio da rua. Senti um impacto no meiu corpo pelas costas. Algo grande me atropelou, acho que era algo maior que um carro. Passou por cima de mim mas não o vi. Me machucou muito, ralei as pernas e os braços, fiquei deitada no chão sem forças para levantar. Ouvi as pessoas de dentro de uma casa gritando e me perguntando se eu estava bem. Eu não estava. Doía demais e tudo sangrava. Me levantei, continuei andando toda machucada. Senti medo mas não podia parar. Ouvia o barulho do carro novamente, corri. Doía. Mas não parei. Acordei.
Que associações você faz entre seu sonho e o momento de pandemia?
Relacionei a muitas coisas.l: estou longe da minha família, há algum tempo não os vejo pois continuo trabalhando e eles fazem parte do grupo de risco. Eles me perguntam o tempo todo como estou, digo que estou bem. Não estou! Estou cansada e com medo mas não quero dizer a eles nada disso para não se preocuparem comigo. Sou trabalhadora da Saúde Mental, sigo trabalhando, acolhendo, escutando as pessoas que buscam ajuda. É tanta pulsão de morte. Isso tem me cansado de uma forma que não sei explicar. Não temos estruturas físicas para manter os atendimentos necessários mas sigo escutando, mesmo com medo. Cansada. Machucada. Sei que não posso parar de caminhar, sei que não.posso parar de escutar. Tô na rua e escuto. Isso é o que preciso fazer.