Depoimento de Armando Rocha
Entrevistado por Márcia Ruiz e Valéria Barbosa
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 31 de outubro de 1994
Transcrita por Wilton Garcia
P - Boa tarde, seu Rocha.
R - Boa tarde.
P - Eu gostaria que o senhor dissesse o nome completo, o local onde o senhor nasceu e a data de nascimento.
R - Começa pelo meu nome, Armando Rocha. Nasci em São Paulo na capital, na Rua de São João, antigamente era Rua de São João, hoje é Avenida São João, perto da Rua Aurora. E quando, naquela ocasião, eles alargaram a Rua de São João, eles alargaram pra passar a ser o que é hoje a Avenida São João, não é? E de lá eu mudei pro Largo do Arouche em 22, e estamos lá até hoje.
P - E qual é a data de seu nascimento?
R - 25 de novembro de 14.
P - Eu queria o nome dos seus pais e o local de nascimento.
R - Meu pai chamava-se Joaquim Rocha, português, de Vila Nova de Gaia, que é Porto, né, em uma aldeia chamada Vila Nova de Gaia; e minha mãe veio da Itália, pequena, eu acho que um ano de idade e se conheceram aqui e depois casaram, né?
P - Qual que era o nome dela?
R - Olga, Olga Rocha.
P - E o senhor sabe qual é a data que ela veio para o Brasil ou não?
R - Mais ou menos 1888, 89... ela veio com minha avó.
P - É, o nome dos avós do senhor?
R - Eu lembro do meu pai chamava-se Antônio. Agora, da parte do meu pai, nome de minha avó eu não me lembro.
P - E da parte da mãe?
R - Da parte da mãe eu lembro da minha avó, Rosina. Agora, o nome do pai eu não lembro.
P - Não tem problema.
R - Não, porque eles morreram lá e nunca mais soube deles, né, então...
P - E qual era a atividade dos avós do senhor, e dos seus pais?
R - Dos meus avós eu não lembro, não sei. E do meu pai ele sempre foi camiseiro, que eu me lembre, ele sempre foi camiseiro. Eu nasci em 14, eu me lembro em 22, até 1920, 21, eu me lembro que eu morava na Rua de São João. Depois mudamos pro Largo do Arouche em 22,...
Continuar leituraDepoimento de Armando Rocha
Entrevistado por Márcia Ruiz e Valéria Barbosa
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 31 de outubro de 1994
Transcrita por Wilton Garcia
P - Boa tarde, seu Rocha.
R - Boa tarde.
P - Eu gostaria que o senhor dissesse o nome completo, o local onde o senhor nasceu e a data de nascimento.
R - Começa pelo meu nome, Armando Rocha. Nasci em São Paulo na capital, na Rua de São João, antigamente era Rua de São João, hoje é Avenida São João, perto da Rua Aurora. E quando, naquela ocasião, eles alargaram a Rua de São João, eles alargaram pra passar a ser o que é hoje a Avenida São João, não é? E de lá eu mudei pro Largo do Arouche em 22, e estamos lá até hoje.
P - E qual é a data de seu nascimento?
R - 25 de novembro de 14.
P - Eu queria o nome dos seus pais e o local de nascimento.
R - Meu pai chamava-se Joaquim Rocha, português, de Vila Nova de Gaia, que é Porto, né, em uma aldeia chamada Vila Nova de Gaia; e minha mãe veio da Itália, pequena, eu acho que um ano de idade e se conheceram aqui e depois casaram, né?
P - Qual que era o nome dela?
R - Olga, Olga Rocha.
P - E o senhor sabe qual é a data que ela veio para o Brasil ou não?
R - Mais ou menos 1888, 89... ela veio com minha avó.
P - É, o nome dos avós do senhor?
R - Eu lembro do meu pai chamava-se Antônio. Agora, da parte do meu pai, nome de minha avó eu não me lembro.
P - E da parte da mãe?
R - Da parte da mãe eu lembro da minha avó, Rosina. Agora, o nome do pai eu não lembro.
P - Não tem problema.
R - Não, porque eles morreram lá e nunca mais soube deles, né, então...
P - E qual era a atividade dos avós do senhor, e dos seus pais?
R - Dos meus avós eu não lembro, não sei. E do meu pai ele sempre foi camiseiro, que eu me lembre, ele sempre foi camiseiro. Eu nasci em 14, eu me lembro em 22, até 1920, 21, eu me lembro que eu morava na Rua de São João. Depois mudamos pro Largo do Arouche em 22, meu pai já era camiseiro.
P - Certo. Eu queria que o senhor descrevesse um pouco da sua infância, dessa lembrança que o senhor tem da Rua São João, e mesmo do Largo do Arouche, eu queria que o senhor descrevesse essa fase.
R - Eu me lembro mais do Largo do Arouche, né? O Largo era muito bonito, era bem maior do que é hoje, então eu jogava bola no Largo. Ia na escola, na Caetano de Campos, sai de lá em 1928, até o quarto ano, depois fui para o Liceu Coração de Jesus, estudei lá mais dois anos. Depois saí de lá e fui estudar na Associação Cristã de Moços, tinha o departamento de intelectual. Então eles tinham aula de comércio, né, e eu entrei lá pra facilitar a minha ida pra escola, que era perto de onde eu trabalhava.
P - Certo. E voltando um pouco antes desta fase de estudos, seu Rocha, como é que eram as brincadeiras, o senhor jogava futebol, o que mais o senhor fazia?
R - Ah, jogava futebol, mais futebol, né, homem não tem muita brincadeira. Jogava futebol, às vezes fugia ia na várzea lá pros lado do Bom Retiro, era tudo mato, então a gente ficava jogando bola.
P - Como é que era a bola, seu Rocha?
R - Era bola de borracha (riso) não tinha essas bolas que tem hoje.
P - E o senhor ia com seus irmãos, o senhor tinha irmãos ou não, seu Rocha?
R - Tinha irmãos menores, né? Ia com um dos meus irmãos que era um pouco mais novo do que eu e ia também comigo e os amigos, né? Nós íamos escondidos dos pais, nós íamos jogar bola lá. Tempinho bom, né?
P - Que horário que o senhor estudava, seu Rocha?
R - Estudava das 11 e meia às 5, no Liceu Coração de Jesus. Depois, quando eu mudei lá pra ACM, estudava à noite, trabalhava durante o dia e estudava à noite, das 7 às 11 e meia.
P - O primeiro emprego do senhor foi aonde?
R - Sempre trabalhei com meu pai, depois quando eu me formei eu estava sobrando lá no meu serviço, tinha lá empregado trabalhando com meu pai, eu estava sobrando, então eu fui e arranjei emprego na General Motors.
P - E nessa fase que o senhor estava trabalhando com seu pai o que é que o senhor fazia?
R - Aprendi a cortar camisa, fazia entrega, alguma entrega que fazia eu mesmo que ia fazer. Receber conta, pagar conta, e era isso o serviço.
P - Com quantos anos, seu Rocha, o senhor começou a trabalhar com o pai do senhor?
R - Eu já tinha o que, uns 15 anos.
P - 15, e como é que chamava a camisaria dele?
R - Era Joaquim Rocha só, era Joaquim Rocha Camiseiro.
P - E como é que era a confecção das camisas? Ele confeccionava as camisas, as pessoas vinham, encomendavam, ou ele deixava expostas as camisas?
R - Não, era só sob medida, não tinha nada exposto. A pessoa ia lá e encomendava a camisa, tirava a medida e escolhia o pano, fazia a camisa e entregava. E esse o serviço... Ele nunca trabalhou no atacado, nada disso.
P - Antes da gente vir pra cá o senhor estava me contando sobre a questão da importação dos tecidos. Fala um pouquinho sobre isso.
R - Eu era menino, não lembro bem como ele importava. Mas naquela época, em 1919, ele importava os tecidos da Inglaterra. Aí não consta, porque tem uma guia de importação da França, né, mas ele importava da Inglaterra. Então tem um catálogo que eu trouxe, que está lá, por ali pelo catálogo tinha a amostra do pano e o número. Então fazia o pedido por ali e os tecidos vinham. Porque o tecido naquela época, aqui no Brasil, era muito feio e muito vagabundo e quem queria fazer camisa sob medida não ia escolher um pano muito vagabundo, não é?
P - E que tipo de tecido que era mais escolhido?
R - Tricoline. Tricoline, que até hoje usa, né? Depois surgiu (voal?), outros tecidos mais finos, linho, seda... vendi muita camisa de seda. Mas a seda era nacional, seda (lavada, 20 momos, 22 momos?), uma seda muito boa nacional. É uma das melhores do mundo.
P - Naquela época?
R - É, até hoje é. Mesmo assim quase não se vê por aí. É muito bonita e forte. Eu tenho uma camisa dessas de seda, tem 30 anos, está nova ainda, só que ela vai ficando amarela, cada vez que lava ela vai amarelando mais.
P - Na questão dos clientes, por exemplo, do pai do senhor, como é que eram os fregueses?
R - Bem , era tudo gente de posse, né, que podia pagar, não é qualquer um. Que hoje, hoje é diferente. Hoje tem muita gente que vai, que faz uma camisa, uns fazem duas, outros fazem uma dúzia, depende da posse de cada um. Mas naquela época era mais difícil, tinha menos clientes, né? A população era muito menor. Em 1920, 21... a população aqui tinha o quê?, uns 800 mil habitantes. Eu me lembro que minha avó mandava eu ficar na janela e dizia pra mim: "Armando, fica na janela, quando passar um carro toma nota do número que eu quero jogar no bicho." (risos) E talvez eu esperava uma hora pra passar um carro, imagine, no Largo do Arouche, heim.
P - E me diz uma coisa seu Rocha, como é que eram embaladas essas camisas, como elas eram entregues? Elas eram entregues na casa do cliente?
R - Às vezes eles vinham buscar e às vezes eu ia entregar, né? Num papel comum, um papel de embrulho comum, não tão vagabundo, um papel mais ou menos bom. Às vezes ia numa caixa. Ultimamente é que vai mais em caixa, né, vai modernizando as coisas e a gente vai melhorando, né?
P - Me diz uma coisa seu Rocha, como era a forma de pagamento? Era em dinheiro, era à vista, ou era a prazo?
R - Não, era tudo à vista.
P - Era tudo à vista, mesmo naquela época?
R - Às vezes era muito conhecido, entregava e depois ele mandava pagar ou eu ia receber, né, às vezes recebia, às vezes não recebia... era assim.
P - E o que é que fazia quando não recebia?
R - Voltava lá outro dia. Mas acabava recebendo, né?
P - Como é que era a loja na época do seu pai, como é que era a camisaria? Ela tinha uma vitrine... como é que ele fazia para atrair os fregueses?
R - Primeiro era uma casa, muito tempo numa casa. Depois mudamos pegado numa loja, e tinha só uma vitrine. Mas aí já estava conhecido, né?
P - A propaganda era feita como?
R - Meu pai nunca fez propaganda. Tem aqueles papeizinhos, naquele tempo fazia um papel com a metragem de pano que precisava e o preço. Naquele tempo podia fazer isso, durava um ano, dois anos, era sempre o mesmo preço, né? Hoje não se pode mais fazer isso. Então, propaganda eu nunca fiz. Quer dizer, foi feito uma propaganda no tempo do meu pai, isso foi em 1940 e poucos, que até hoje ele faz, é um calendário judáico, até hoje existe isso. Então lá tem o nome da Camisaria Rocha. E eu, em homenagem a meu pai, eu continuo assinando lá esse livrinho, esse calendário. É um livrinho pequeninho, é a única propaganda que foi feita.
P - Me diz uma coisa senhor Rocha, a loja abria que horário e fechava que horário?
R - Há uns anos atrás ficava das 8 às 6 e meia, trabalhava sábado também até às 6 e meia e depois mudou. Mudaram a lei, aí no sábado fechava à 1 hora, então, aos sábados a gente fecha à uma hora, até hoje é assim, das 8 às 6 e meia e sábado até à 1 hora.
P - Nessa época que o senhor trabalhava com o pai do senhor, que tipo de atividade especificamente o senhor fazia. O senhor entregava, o senhor aprendeu a cortar?
R - Não, isso um pouco, depois eu passei a trabalhar lá dentro. Eu cortava as camisas, fazia o modelo, né, aprendi a fazer modelos, atender os clientes que vinham lá. E trabalhava assim junto com meu pai.
P - O senhor lembra de algum cliente especial dessa época?
R - Eu lembro de diversos, mas vou citar o nome? Tem um antigo que outro dia ele esteve lá. Ele está com 90, 91 ou 92 anos, Germano Sampaio... já está meio caduco, coitado...
P - Me diz uma coisa, o senhor disse que teve que sair da loja do seu pai, porque o seu serviço...
R - Bom, isso foi no começo, né?
P - Isso foi mais ou menos em que época?
R - Foi em 34.
P - O senhor teve que sair por que, seu Rocha?
R - Não, eu não tive que sair. Eu quem quis sair porque eu estava sobrando, tinha muita gente trabalhando, não é, muita gente, tinha um outro empregado trabalhando, tinha meu pai e eu não tinha o que fazer. Então eu fui trabalhar fora, mas fiquei dois anos só, depois meu pai me chamou, que o outro empregado foi embora, e eu fiquei lá até hoje.
P - E esse emprego que o senhor teve foi aonde?
R - Na General Motors.
P - E o senhor fazia o que lá?
R - Trabalhava lá na contabilidade. Não era o contador direto, mas trabalhava lá com ele. Fiquei lá dois anos.
P - Seu Rocha, eu queria que o senhor falasse um pouco pra gente das camisas que eram feitas antigamente, a mudança que ocorreu?
R - Teve uma mudança grande. As camisas antigamente eram abertas até aqui assim... daqui pra baixo eram fechadas, então a pessoa vestia a camisa por cima, né? Depois de muitos anos é que surgiu... acho que dos Estados Unidos é que veio essa moda, né, a camisa aberta até em baixo. Então, quando vinha o freguês, eu tinha que perguntar: "O senhor quer camisa aberta até embaixo ou o senhor quer fechada?", (riso) porque uns ainda preferiam ela fechada, né? E outros ainda abotoavam... a camisa vinha aberta até aqui... e aqui tinha uma presilha, ele abotoava na calça, que era pra deixar a camisa esticadinha, entendeu?
P - Isso foi mais ou menos em que época, o senhor lembra quando entrou essa época da camisa aberta toda?
R - Isso foi em 35 por aí. Depois veio... foi simplificando tudo, né? Os punhos eram duplos pra usar com abotoaduras, o colarinho era solto, não era pregado na camisa, tinha uma tirinha - como usa hoje, o pessoal usa essas camisas sem gola, né - tinha aquela golinha e tinha o colarinho solto, prendia aqui atrás com botão e aqui na frente. Então a pessoa fazia uma camisa com três colarinhos, usava a camisa o dia inteiro, à noite ele ia numa festa, em algum lugar, tirava aquele colarinho, punha o colarinho limpo direitinho e saía, entendeu?
P - É mais prático, né?
R - (risos) Naquele tempo acho que não se tomava banho todo dia, (risos) então tinha gente, acho que trocava a camisa uma vez por semana, sei lá.
P - Além das camisas o que mais o senhor fazia?
R - Cuecas, pijamas e robe de chambre. As cuecas antigamente tinham três botões aqui, uns com quatro, uma tira bem larga, assim né, e ia afinando. E atrás, atrás pra abotoar tinha um... pra regular, né, tinha uma presilha com dois botões. Então ele regulava pra mais ou pra menos; engordava muito punha mais pra fora. Agora acabou tudo isso, né?
P - Que tecido que era utilizado pra fazer as cuecas?
R - Geralmente tecido branco. Tricoline branco, alguma cambraia própria pra cueca.
P - E o tecido das camisas, senhor Rocha, eram lisos... qual que era a predominância?
R - Teve uma época, naquela época que você viu da revista até trinta e poucos, usava muito camisa de cor, de listras, xadrez. Depois teve uma época bem grande que só se usava branco, durante muitos anos, em 54, 55, só se usava camisa branca. Depois foi voltando as camisas de cor. E hoje 70% é camisa de cor e 30% camisa branca. Tem gente até hoje que só usa camisa branca.
P - E me diz uma coisa senhor Rocha, o senhor disse que no começo os tecidos eram importados. A partir de que época os tecidos nacionais começaram a melhorar, e até que ponto a Segunda Guerra atrapalhou um pouco essa importação?
R - Muito pelo contrário, eu acho que da Segunda Guerra pra cá já tinha tecido bom aqui. E hoje estão melhores ainda, o tecido nacional é muito bom.
P - Isso a partir da Segunda Guerra, o senhor acredita que melhorou?
R - É melhorou. Já antes da Segunda Guerra já tinha melhorado bastante, mas agora melhorou mais.
P - E as camisas de linho começaram a ser usadas quando?
R - Tinha uma época que se usava muito camisa de seda pura, aquela seda que eu falei, usou muito tempo. Agora quase ninguém usa, usam uma camisa de seda, mas é uma seda... parece ser pra lingerie, fininha, não é muito boa. Depois passou a ter camisas de linho, na época muita gente fazia camisa de linho. Mas hoje a maioria faz camisa de algodão, mas fazem camisa de linho, também. Que surgiu muito pano de algodão fininho, né, tem uma cambraia de algodão muito boa, tem voil, que naquele tempo não havia, né? Então tem muita gente que prefere o voil do que o linho, porque o linho amassa muito, né?
P - E os botões, me diz uma coisa, como é que era, qual a mudança que o senhor viu durante esse tempo em termos de botões?
R - Os botões antigamente eram de madrepérolas, existe até hoje mas muito pouco e muito caro. Então surge o botão plástico, né, também foi durante a guerra, um pouco antes da guerra, surgiu esse botão plástico que é muito bom e bonito, né? (tosse)
P - E o senhor morou até quando no Largo do Arouche?
R - Depois que eu casei, eu fui morar na Rua Caetés, Perdizes.
P - E o senhor casou em que ano?
R - Em 52. Depois de uns anos já mudei pra Rua Marquês de Itú com Veridiana. Fiquei lá acho que 20 anos ou mais, e agora moro na Rua Martinico Prado.
P - E como é o nome da esposa do senhor?
R - Yolanda.
P - Ela trabalha com o senhor...ou nunca trabalhou?
R - Não, ela não trabalha.
P - Senhor Rocha, como é que o senhor conheceu a dona Yolanda?
R - No Ipiranga, numa festa.
P - Conta um pouquinho como é que foi...
R - Tinha um amigo meu que a mulher dele deu à luz e ele passou na loja, num sábado, e falou: "Armando, vamos sair juntos hoje?" Eu falei: "Vamos." E ele disse: "Tem uma festa no Ipiranga, Festa da Primavera, você quer ir comigo?" Eu digo: "É, vamos lá." Foi lá que eu conheci minha senhora. Tinha um concurso de dança e eu estava lá assistindo e ela me bateu nas costas e falou: "Quem é que está ganhando?" Que tinham dois pares só, né? Eu falei: "Aquele lá que está ganhando, acho que vai ganhar aquele." Ela falou: "Eu também acho." Foi aí que começou o namoro, entendeu?
P - E quanto tempo o senhor namorou com ela?
R - Acho que um ano, um ano e pouco... logo casei. Eu já estava meio velhinho também, né? (risos) Eu já estava com 35 anos, estava na hora, né?
P - E o senhor teve filhos?
R - Duas filhas.
P - Como é o nome delas?
R - Marisa e Denise.
P - E elas fazem o quê?
R - Elas trabalham comigo. Estudaram e se formaram, casaram e, como à tarde elas não têm o que fazer, os meninos vão pra escola, então elas começaram a vir na loja me ajudar, porque eu queria vender a camisaria, né? "Não pai, não vende, nós vamos tomar conta." Então eu falei: "Então vem." Então elas vieram e pra mim foi bom, que eu vender na época do Funaro, quando o Funaro assumiu, né? Um pouco antes eu ia vender a camisaria, aí elas insistiram: "Não, não vende pai, fica, fica..." E eu fiquei, né? "Então não vamos vender mais." E elas ficaram comigo até hoje. Uma delas, a Marisa, já aprendeu a fazer os moldes, já faz os moldes, atende os clientes, tira medidas... Então, se eu faltar não tem problemas. E a outra fica na parte da contabilidade, é advogada... a Denise.
P - O senhor acha que teve uma mudança do cliente daquela época para o cliente de hoje, senhor Rocha?
R - Eu acho que teve pra melhor.
P - Ah é, por quê?
R - Porque hoje é mais simples, tudo é mais fácil. As camisas hoje são mais folgadas. Antigamente as camisas eram mais justas no corpo, era mais difícil pra fazer. Hoje é mais fácil, bem mais fácil. E tem muita gente nova que vai fazer camisa também ou muito alto. Outra coisa importante que cresceu muito, que eu noto, a população... a população não, as pessoas, os moços de hoje são altos, antigamente era tudo mais baixinho, a geração de hoje é bem mais desenvolvida. Eu me lembro, naquela época uma pessoa de com 1 metro e 80 era difícil de encontrar, hoje, hoje com 1 metro e 90 é fácil, 1 e 85, 1 e 80... Então a mocidade de hoje desenvolveu muito.
P - E o senhor acha que é mais fácil fazer camisa para uma pessoa de estatura alta?
R - Alta? É claro Quer dizer, é a mesma coisa, só que gasta mais tecido, mas é mais fácil.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, tem mulheres que procuram...
R - Tem, fazem blusas, né, tipo camisa de homem, tem uma freguesia grande de mulheres.
P - E quais são as exigências dos clientes? Qual é a maior exigência com relação...
R - A maioria é o colarinho. A maioria está sempre satisfeita, um ou outro que reclama: "Aqui faz um defeito... Mas é muito difícil, a maioria sai de lá satisfeita. E quando a gente erra, porque de vez em quando a gente erra, então a gente corrige, né, e acerta.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, antigamente as camisas feitas industrialmente eram em muito menos quantidade, né? Afetou muito na loja do senhor a concorrência da industrialização?
R - Não, porque... Se bem que as camisas de hoje, as camisas prontas são muito bem feitas. Essas camisas de indústrias são muito bem feitas. Mas tem gente que não acerta porque ou o pescoço é grosso demais, se ele vai comprar camisa para acertar no pescoço fica grande no corpo ou se fica certa no corpo, fica grande no pescoço... Ou quando dá certo, a manga é curta ou a manga é comprida, entendeu? Então eles têm que fazer sob medida. A maioria que gosta da camisa bem feita faz sob medida. Que não é pra todo mundo que serve a camisa pronta, né?
P - O senhor tem um molde pra cada pessoa?
R - Cada cliente tem um molde. Eu tiro a medida, faço o modelo no papel e depois vai para o corte. Tem um cortador lá que corta, pelo modelo ele corta a camisa e depois têm as costureiras que costuram. E depois a gente examina, fiscaliza se está tudo certo, aí manda passar, casear e pronto.
P - E o senhor tem um cadastro sobre esses clientes?
R - Cada cliente tem uma ficha com o nome, endereço, telefone tudo guardadinho no envelope, né? Agora, aqueles antigos, do tempo do meu pai, não. Eu... a gente não pode guardar tudo, porque não tem lugar pra guardar.
P - E o senhor procura entrar em contato sempre com esses clientes ou não? O senhor faz algum trabalho nesse sentido de...
R - Não, nunca fiz, mas vou começar a fazer, é importante isso. Nunca fiz mas isso é uma coisa boa, né, de vez em quando telefonar: "Esqueceu de mim, tal... Não quer fazer umas camisas?" (risos)
P - Como é que o senhor acha que a sociedade vê o comerciante hoje, senhor Rocha? O senhor acha que houve alguma mudança em relação ao passado?
R - Não, eu acho que, depois do real eu até pensei que a turma ia... não gostar muito do preço, né? Não, ninguém reclamou nada, até hoje. Um ou outro é que acha a camisa cara, mas acaba fazendo. Mas não tem... é melhor hoje do que há alguns anos atrás. Porque antigamente camisas hoje custavam dez, daí uma semana custava 12, 15. Agora, com o Plano Real eu acho que melhorou muito.
P - Quem são os maiores fornecedores do senhor hoje? Mudou essa quantidade de fornecedores, aumentou, são sempre os mesmos? Como é que é a questão...
R - Não, antigamente tinha mais, comprava de mais firmas. Tem muita firma antiga que fechou, de tecidos fecharam. Então, eu compro mais aqui de... aqui temos duas tecelagens boas, posso citar o nome?
P - É claro.
R - Tecelagem Ataquara e Tecelagem Nossa Senhora da Penha, são as melhores. E depois tem um ou outro que vende tecidos da Cataguases, uma outra firma do Rio. E tinha a Nova América que era muito bom o tecido, mas ela vendeu aquilo para outra firma que eles fazem tecidos de segunda, né? Então eu não compro mais deles. É dessas firmas que eu compro, esses tem uma variedade grande de panos, né?
P - E isso já vem há quanto tempo? São os mesmos fornecedores do senhor já há algum tempo?
R - Há muitos anos, há mais de 20 anos. São as duas firmas boas.
P - E a forma de pagamento do senhor também é à vista?
R - Às vezes à vista, às vezes a 30 dias, às vezes 15 dias, depende.
P - E o senhor hoje ainda continua cobrando à vista ou o senhor ainda dá prazo?
R - Não, continuo cobrando à vista.
P - E o senhor não trabalha com cartão de crédito?
R - Não, de jeito nenhum.
P - Senhor Rocha, o senhor estava me contando sobre a embalagem das gravatas. Eu queria que o senhor falasse sobre isso.
R - É, mas isso é coisa de 1940 e poucos, né? Quando meu pai encomendava as gravatas, elas vinham em uma caixinha de madeira, caixinha bonita de madeira, cada gravata vinha em uma caixinha de madeira. Hoje não, eles vendem as gravatas e entrega só as gravatas, entendeu? Era mais... naquele tempo era mais difícil pra vender, então pouca gente comprava e eles agradavam, vinha numa caixinha.
P - Então o senhor tinha, além das camisas, o pai do senhor também comercializa gravatas, pijamas...
R - Pronto, tinha só gravatas, meias e lenços. Mas eu fui acabando com tudo, porque eu fiquei sozinho na loja e eu não tinha tempo para ficar lá, pra resolver isso. Ou eu me dedicava à indústria lá dentro ou ficava na loja, né? Então eu liqüidei a parte de comércio ali da loja, só fiquei com a camisaria. Então não tem nada pra vender, só camisa. Camisa, cueca e o pijama.
P - Na verdade o senhor acabou foi com a revenda, né, desses produtos?
R - É, isso.
P - Quantos funcionários o senhor tem atualmente, seu Rocha?
R - São três, cinco, sete... são nove. É uma passadeira, uma que caseia, tem dois cortadores e um ajudante e as costureiras, e aquela mocinha que fica no balcão na frente.
P - No caso dessa que está no balcão, tem quanto tempo que ela está com o senhor?
R - Tem 33 anos, e tem uma mais antiga, acho que tem 40 anos lá. É uma portuguesa, ela veio de Portugal, trabalhou lá e ficou até hoje. Já está aposentada, mas está trabalhando.
P - E ela faz o que lá?
R - Faz camisas, costura.
P - No caso da oficina, falando um pouco da oficina, estava vendo a tesoura que o senhor trabalha com ela, né? Fala um pouquinho da oficina, das máquinas... Tem máquinas que eram do pai do senhor?
R - Não, não tem. Agora é mais moderna, né, fui trocando. Mas não é moderna, moderna. Porque têm umas máquinas de casear pra indústria, que faz uma casa... num segundo faz uma casa. A minha é mais lenta, mas é um caseado mais bonito, né? Deve ter uns 30 anos a máquina, mas máquina de casear com 30 anos não é velha, entendeu?, que faz as casas. Tem uma de pregar botão e depois a menina arremata para o botão não cair, né? E tem uma máquina, uma prensa, pra prensar o colarinho que hoje, hoje tem aquele forro plastificado, né, pra colar na máquina e o colarinho ficar lisinho assim, não ter rugas, né, é uma máquina especial pra isso. Depois tem as costureiras.
P - E essa máquina de prensar o colarinho, ela sempre existiu ou não?
R - Se sempre existiu? Não, surgiu depois que surgiu essa entretela plástica, né? Mas já faz uns 20 anos que existe isso.
P - E como era feito antes, seu Rocha.
R - Era uma entretela comum, mas por mais que a a gente procurasse trabalhar nela ela sempre enrrugava um pouco, entendeu, hoje não.
P - E a barbatana, pra que servia?
R - Para o colarinho não virar, a minha não tem barbatana, mas vira, ele vira assim, né? É para o colarinho ficar direito. Mas antigamente, antigamente que eu digo, em 29, 30, as camisas tinham um cadarço aqui dentro, pequeninho, a gravata passava por dentro para o colarinho ficar assim, mas sempre amassava, né? Aqui dentro tinha um cadarço, a gravata passava por aqui para o colarinho não levantar.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, a camisa e a gravata... houve muita mudança da gravata com esse tempo também que o senhor pôde observar, acompanhou a mudança nos modelos de camisa, também? Porque o colarinho a gente percebe que teve uma época que...
R - É, usava muito comprido...
P - Isso foi mudando a partir de que época e que modelo foi surgindo?
R - Tudo mais ou menos igual, antigamente usava uns bem comprido, mais comprido do que esse. Agora tem uns pequenos, agora está voltando outra vez comprido. E tem aqueles bem aberto que é do tempo do Collor, aqueles bem abertos, né? Todo mundo queria aquilo, agora não querem mais. (risos)
P - Qual é o mais fácil de ser feito?
R - O pequeno, esses compridos assim dá mais trabalho, mais difícil, né? Os pequenos são mais fáceis.
P - Seu Rocha, desse cadastramento do senhor em relação aos clientes, qual é o número que o senhor chegou a cadastrar?
R - Eu não contei, mas eu devo ter lá mais ou menos uns... que eu vou renovando, vou jogando fora os antigos, que às vezes a pessoa não vem mais, eu jogo fora. Eu devo ter hoje lá de três a quatro mil moldes. Mas não são todos que vão fazer camisa ao mesmo tempo, varia, né? Vem hoje faz duas camisas, daí há um ano ele volta. Outro dia veio um lá pra mim trocar os colarinhos de umas camisas que ele fez lá há 20 anos atrás.
P - Ah, e o senhor troca o colarinho?
R - Troco o colarinho. Camisas brancas que ele fez há 20 anos atrás, eram dez camisas. Ele falou: "Ó Rocha, essas camisas têm 20 anos, dá pra aproveitar?" Eu olhei e digo: "Dá, então vamos trocar o colarinho e o punho, fica nova a camisa. Essas camisas vão durar mais dez..." (risos)
P - Senhor Rocha, hoje o senhor fica o tempo todo na camisaria?
R - Não, hoje não. Antigamente eu ficava o dia inteiro, mas depois que minhas filhas foram pra lá - que agora elas estão assumindo aquilo direito - eu fico meio dia só. O outro meio dia eu saio, eu vou no clube, ou fico em casa, vou ao cinema com a minha senhora. E elas ficam na loja e eu só vou de manhã, das 8 ao meio dia eu estou lá, todos os dias, quando não viajo, né?
P - E quais são atividades assim que o senhor faz à tarde? O senhor disse que vai ao cinema, vai no clube. O que é que o senhor gosta de fazer no clube?
R - Tomar sauna. É um clube no Centro da cidade, né?
P - Qual clube que é?
R - Clube Cidade de São Paulo. Eu vou lá, tomo uma sauna, jogo cartas, passar tempo, né, não é a dinheiro. Tomamos uma cerveja, 6 e meia, 7 horas eu vou pra casa. Essa é a minha vida, ou quando não saio com ela, com a minha senhora.
P - Que é que o senhor gosta de comprar, senhor Rocha?
R - Pra mim... para o meu uso?
P - É, é...
R - Sapato. (risos)
P - Mas o senhor procura também sob medida ou não?
R - Sob medida, eu tenho tanto sapato que eu não tenho onde pôr. Tem sapato que eu nem usei ainda, está lá há uns dois anos, mania, né?
P - E o que é que o senhor não gosta de comprar, seu Rocha?
R - É roupa... roupa eu não gosto. Tem que ir no alfaiate, prova... e eu não gosto. Roupa pronta eu não compro, só mando fazer. E eu não gosto de estar indo no alfaiate, experimenta... É como cara quando vem fazer camisa, né, tem uns que não gostam, às vezes vai lá e encomenda oito camisas ou seis ou quatro. Eu faço uma de prova, né? "É, mas eu tenho que provar?" "Tem, né, se não ficar boa, é uma que eu perco, não são quatro." E tem uns que não gostam, quer que faça todas. E eu às vezes faço, mas dá certo, né, sempre dá certo.
P - Senhor Rocha, em relação às compras, o senhor falou que gosta de comprar sapatos...
R - Ah, e gosto de fazer compras de tecidos. Mesmo quando meu pai estava vivo, ele queria comprar cinco, eu já queria comprar dez. E ele falava: "Não, vamos comprar... tem dinheiro compra, não tem dinheiro não compra." Eu já pensava diferente, né, eu já comprava. Até hoje, se depender de eu comprar eu compro mais do que devia... uma mania que eu tenho, né, de comprar tecidos. Às vezes a minha mulher diz pra mim: "Escuta, você quando vir pra casa me compra quatro pãezinhos, viu?" Eu compro oito, entendeu? (risos) Não sou capaz de comprar quatro. Doces, comprar doces, só eu e ela só, né, eu compro uma dúzia... Ela fica brava comigo.(risos)
P - O senhor tem alguma rua, aqui em São Paulo, algum lugar especial que o senhor gosta de fazer compras?
R - Não, não tenho.
P - Já teve algum lugar que o senhor gostava de...
R - Eu quase não saia da loja, né? Tudo que eu comprava era lá dentro, mesmo tecido de casimira pra terno, eu comprava tudo lá dentro.
P - E sapato, o senhor falou que o senhor faz sob encomenda. Quem faz os sapatos para o senhor?
R - É ali na Rua Rêgo Freitas, são dois, um na Rêgo Freitas e um na General Jardim. Eu vou lá e encomendo sapato, às vezes esqueço, depois vou lá buscar, ele me telefona, entende. É isso.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, quais as transformações que o senhor viu da cidade e no comércio, que o senhor acha que foram benéficas e aquelas que o senhor acha que não foram?
R - Em que sentido?
P - Assim, para o consumidor. O senhor acha, por exemplo, que... o Largo do Arouche o senhor disse que era mais tranqüilo e tal, então, o que o senhor acha que mudou na cidade, a transformação da cidade, que facilitou ou não o comércio? O que foi benéfico ao comércio?
R - Eu acho que no Centro piorou, o comércio no Centro piorou bastante, funciona mais no Jardins, nos shoppings também, né?
P - Por que é que o senhor acha isso?
R - Mesmo ali no Largo do Arouche, onde eu estou, se depender do comércio do Largo do Arouche eu não vendo nada. É que eu tenho clientes que moram longe, né, que me conhecem e vão lá. Tem uns que moram no Jardins, tem uns que moram na Lapa, tem uns que moram na Penha, na Mooca, em Brasília, em Mato Grosso, em Curitiba, são fregueses que me conhecem e que vão fazer camisa lá, entendeu? Tem um até que foi para os Estados Unidos, transferido pra lá numa firma, ele todo ano vem pra cá, todo ano ele vai lá fazer camisa. Eu acho que o comércio, ali o ponto não é muito bom não, é mais pro Jardins. O Largo do Arouche já foi muito bom há muitos anos atrás, hoje não é mais. Tem a Rua do Arouche que tem muito movimento também, mas o comércio lá está fracassando. O pessoal vai mais nos shoppings, né? Tem muitos shoppings, é mais fácil, tem de tudo nos shoppings, tem tudo que você quer comprar, tem lá, né?
P - Então o senhor acha que é por uma questão de facilidade?
R - Facilidade, é mais fácil. O sujeito vai no shopping, ele está com vontade de comprar um short, chega lá ele compra uma camisa, não é isso?, ou compra um sapato... sei lá. Tem muita variedade pra compra, né?
R - O senhor tem netos, seu Rocha?
R - Tenho dois netos, uma menina com 18 e um neto com 16.
P - E eles fazem o quê?
R - Estudam.
P - O senhor gostaria que eles fossem para o comércio, ou não?
R - Não, eu quero que eles estudem primeiro, depois... a menina vai fazer vestibular agora.
P - Como que é o nome dela?
R - Marcela. Vai tentar em quatro faculdades.
P - Ela vai tentar o quê?
R - É... como é? Administração. Em duas ela vai... Ela vai tentar Administração e Ginástica... como é?
P - Educação Física.
R - Educação Física, que o pai tem... tem um... não é um ginásio...
P - Uma escola de ....
R - Musculação...
P - Academia.
R - Academia, tem uma academia. E ela pretende tomar conta da academia do pai. Então ela quer fazer Educação Física e... o que eu falei agora?, Administração. Ela quer fazer as duas faculdades de uma vez. Não sei se ela vai agüentar, né?
P - E o menino?
R - O menino está com 16 anos agora, acho que passou pra segunda série, ou terceira série, não sei.
P - Como é o nome dele?
R - É...às vezes me falha... Eduardo. Os dois são bons alunos.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, se o senhor pudesse mudar alguma coisa na sua trajetória de vida, o que é que o senhor mudaria?
R - Eu acho que nada. Continuava como eu estou hoje, eu acho que fiz bem, não me arrependo de nada. E é um serviço que eu gosto de fazer, entendeu? Então, se eu gosto disso, eu nem pensei em mudar.
P - No caso desse trabalho do senhor, o que é que o senhor mais gosta de fazer? Porque o senhor faz o corte das camisas, vende...
R - Faço os moldes... eu gosto de fazer os moldes.
P - E tratar com os clientes, o senhor gosta ou não?
R - Gosto, trato todo mundo bem. Todos me tratam bem também. Eu trato todo mundo bem, o que vai fazer uma camisa, o que vai fazer uma dúzia. Eu trato todo mundo igual, eu não tenho queixa de ninguém.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, o que é que o senhor gostaria de realizar ainda?
R - Eu? Acho que nada, não tenho mais nada pra realizar. O que eu fiz na vida eu estou contente, não me arrependo de nada. A única coisa que eu não queria fazer e eu fiz, que a minha mulher quis, fazer uma viagem, agora, que eu fui, voltei em setembro. Fui pra Europa, né, mas uma maratona, aquilo não é viajar. Uma excursão, fui numa excursão, ela disse: "Vamos numa excursão outra vez ou vamos sozinhos?" Então fui, Portugal, Itália, Espanha, Alemanha, França, Suécia... onde mais... Suíça. Depois fui pra Londres, fui pra Escócia, fui pra Tirol. Depois voltamos pra Paris e depois viemos embora pra São Paulo. Se perguntar o que eu conheço lá, eu não conheço nada Conheço igreja e museu e palácios de rei. É isso... (risos) e uma canseira danada, viu
P - O senhor voltaria agora sozinho com ela, ou não?
R - Talvez não viu, ela quer voltar mas eu não volto. Ela, depois disso, foi, depois disso a questão de ... ela chegou quarta-feira passada, foi com uma sobrinha minha, foram pra Jerusalém. Surgiu uma oportunidade e ela quis ir eu digo: "Vai.", foi com uma sobrinha, né? Ficaram 15 dias, estiveram no Cairo, Egito e Tel Aviv e voltaram. Voltaram quarta-feira passada. Eu não pretendo viajar mais, não gosto de viajar, prefiro ficar por aqui mesmo.
P - Me diz uma coisa, seu Rocha, o que significou para o senhor dar esse depoimento para o Museu da Pessoa?
R - Eu estou contente, eu estou contente porque acho que é uma coisa útil, útil para todos que querem saber. É uma novidade isso, não existia isso, o Museu da Pessoa não tinha, né? Eu acho uma coisa interessante viu, muito bom mesmo. Estou contente, estou feliz por isso. E me sinto orgulhoso de ter sido escolhido. E quero agradecer ao Museu da Pessoa, eu não sei a quem me dirigir. Estou satisfeito.
P - Me diz uma coisa, senhor Rocha, mais uma pergunta. O que é que marcou na sua vida inteira, qual foi o fato que mais lhe marcou na vida?
R - Pra mim? Foi o meu casamento, que mudou um pouco a minha vida. Foi isso.
P - Ela mudou em que sentido?
R - Pra melhor. Porque antes eu saía toda noite, né, encontrar os amigos... uma vida meio estúpida. Depois que eu casei eu... foi bem melhor pra mim.
P - E hoje o senhor vive sozinho com sua esposa?
R - Eu e ela só, as filhas casaram. Morava junto comigo a minha sogra, né? Minha sogra faleceu então ficou eu e ela só. E estamos felizes. (riso)
P - Eu queria fazer mais uma pergunta para o senhor. Como é que o senhor gostaria que fossem os comerciantes hoje, em São Paulo? Como é que o senhor vê essa coisa dos comerciantes, o senhor acha que eles teriam que mudar... o que é que o senhor acrescentaria para melhorar essa atividade?
R - Eu acho que o comerciante brasileiro é muito bom porque, agora lá na Europa, eu vi, eles são... não atendem bem, não se interessam pra vender. Nós fomos numa loja, estávamos mais ou menos em 15, fecha ao meio-dia. Lá fecha ao meio-dia e abre às 3. Acho que faltava cinco pra meio-dia, nós fomos lá, uma senhora queria comprar não sei o que dele, a outra queria comprar perfume, umas coisas assim, ele não atendeu: "Não, agora eu vou fechar, só abro só às 3 horas." Ele ia fazer uma venda pra umas dez pessoas, não atendeu foi embora. Se fosse aqui, o sujeito abria a porta e ia atender, não é isso? Aqui, o brasileiro faz isso e lá não. Por isso que eu acho os comerciantes aqui bons, são bons comerciantes. Inclusive os balconistas das lojas também são melhores que os de lá. Essa é uma opinião minha do que eu vi. Agora, se aqui é todo mundo igual eu não sei, mas a maioria é assim.
P - Tá bom então, seu Rocha, a gente queria agradecer...
R - Não por isso, quem agradece sou eu.
P - ...pela sua presença, foi muito bom ter o senhor conosco.
R - Muito obrigado. E tudo de bom pra vocês também.
P - Muito obrigada.
Recolher