Meu nome é Cleonice da Silva Souza. Eu nasci em 24 de Fevereiro de 1973. Nasci na Bahia, em Porto Seguro. Meus pais eram de lá. Aí nós viemos com três anos de idade, viemos embora pra Belo Horizonte. Porque minha mãe tinha um bocadão de filho, e já era mais de idade, aí o médico falou que ela tinha que vir embora pra cá pra ela poder ligar, pra não ter mais filho. Aí que nós viemos, mas depois de mim ainda nasceram mais dois, gêmeos, depois que ela conseguiu ligar. Tenho quatorze irmãos, mas um mataram ele. Mataram meu irmão, que seria o mais velho. Aqui em Rio Acima só eu moro. Meus outros irmãos moram um bocado em Sabará, outros moram na Serra, outros moram no Morro Alto lá em Vespasiano, tudo espalhado. De vez em quando vai uma turma lá em Porto Seguro passear, mas ninguém voltou pra morar. Não me lembro bem dos meus três primeiros anos em Porto Seguro, porque eu era pequena. Eu vim pra cá com três anos, mas depois voltei pra lá. Eu tinha quatorze anos quando voltei. Fui morar lá com uma tia porque eu aprontava muito, então minha mãe me despachou pra lá. Aí eu fiquei lá, arrumei um caminhoneiro, fiquei morando com ele, morei com ele dois anos. Ele era caminhoneiro, ele me levava pra passear. Aí eu briguei com ele lá, pedi dinheiro na rua e vim embora de novo. Então fiquei morando com minha mãe. Depois fiquei sabendo que esse caminhoneiro morreu. Depois eu consertei. Mas nesse época tinha quatorze anos. Antes dos quatorze anos a gente morava no bairro Serra. Lá a gente estudava, mas não foi uma infância muito boa. Meu pai ficava traindo minha mãe. Era muita briga dentro de casa. Eu aprontava também.. aprontava assim, ela mandava eu ir pra escola mas ao invés de ir pra escola eu ia pra casa das colegas. Dormia dois, três dias fora de casa. Não avisava nem nada. Ela ficava preocupada. Falou assim, "então você vai pra lá." E eu fui. Ela me mandou pra lá. Mas assim, eu tinha cabeça né. Eu sabia o que estava...
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Meu nome é Cleonice da Silva Souza. Eu nasci em 24 de Fevereiro de 1973. Nasci na Bahia, em Porto Seguro. Meus pais eram de lá. Aí nós viemos com três anos de idade, viemos embora pra Belo Horizonte. Porque minha mãe tinha um bocadão de filho, e já era mais de idade, aí o médico falou que ela tinha que vir embora pra cá pra ela poder ligar, pra não ter mais filho. Aí que nós viemos, mas depois de mim ainda nasceram mais dois, gêmeos, depois que ela conseguiu ligar. Tenho quatorze irmãos, mas um mataram ele. Mataram meu irmão, que seria o mais velho. Aqui em Rio Acima só eu moro. Meus outros irmãos moram um bocado em Sabará, outros moram na Serra, outros moram no Morro Alto lá em Vespasiano, tudo espalhado. De vez em quando vai uma turma lá em Porto Seguro passear, mas ninguém voltou pra morar. Não me lembro bem dos meus três primeiros anos em Porto Seguro, porque eu era pequena. Eu vim pra cá com três anos, mas depois voltei pra lá. Eu tinha quatorze anos quando voltei. Fui morar lá com uma tia porque eu aprontava muito, então minha mãe me despachou pra lá. Aí eu fiquei lá, arrumei um caminhoneiro, fiquei morando com ele, morei com ele dois anos. Ele era caminhoneiro, ele me levava pra passear. Aí eu briguei com ele lá, pedi dinheiro na rua e vim embora de novo. Então fiquei morando com minha mãe. Depois fiquei sabendo que esse caminhoneiro morreu. Depois eu consertei. Mas nesse época tinha quatorze anos. Antes dos quatorze anos a gente morava no bairro Serra. Lá a gente estudava, mas não foi uma infância muito boa. Meu pai ficava traindo minha mãe. Era muita briga dentro de casa. Eu aprontava também.. aprontava assim, ela mandava eu ir pra escola mas ao invés de ir pra escola eu ia pra casa das colegas. Dormia dois, três dias fora de casa. Não avisava nem nada. Ela ficava preocupada. Falou assim, "então você vai pra lá." E eu fui. Ela me mandou pra lá. Mas assim, eu tinha cabeça né. Eu sabia o que estava fazendo. Morei com esse caminhoneiro dois anos, mas também não tive filho nem nada. Não era boba. Depois voltei pra Belo Horizonte. Com dezessete anos minha mãe faleceu, e depois, logo em seguida, meu pai também. Depois que eles faleceram eu fui morar com minha irmã lá em Sabará. Trabalhei, logo em seguida minha irmã arrumou um emprego pra mim. Fui trabalhar em casa de família, não sabia fazer nada. Fui trabalhar. Minha mãe falou assim, "se você quiser comer e vestir você vai ter que trabalhar".O jeito foi ir. Mas agradeço a ela, porque senão... sabe-se lá o que eu tinha formado hoje. Talvez nem viva eu estava. Agradeço a ela. Em Sabará eu conheci meu ex-marido. Tive três filhos com ele, fiquei com ele 25 anos, depois separei. Meus filhos se chamam Cláudio Henrique, Cleison e Ana Cristina. Ana Cristina vai fazer 27, Cleison tem 25 e o Cláudio tem 23. Casei com dezessete anos, com vinte e um anos já tinha os três. O pai deles, meu ex-marido, me batia demais. Eu ficava correndo dele pra ele não me matar, matar os meninos. Foram 25 anos. Cinco anos foram bem, mas o resto... Foi bem porque tive meus três filhos. No segundo filho eu quase morri, tive que tomar sangue dos outros. Tive que ficar internada um bom tempo. Mas graças a Deus, depois que separei dele... Foi polícia, polícia, ele corria atrás de mim e dos meninos pra me matar. Eu apanhava demais. Ele bebe e usa droga até hoje. E eu que era o homem e a mulher dentro de casa. Aí meus filhos cresceram, o meu filho do meio queria matar o pai. Nossa! Entrei em depressão, fiquei tomando remédio controlado. Até hoje ainda vou no psiquiatra. Mas tendo em visto o que eu era, hoje estou cem por cento. Tem quatro anos que eu estou aqui em Rio Acima, com meu marido atual, e graças a Deus hoje estou vivendo. Separei do meu ex-marido, fiquei quatro meses separada, aí conheci meu marido agora. Trabalhei muito tempo em casa de família. Depois de casa de família trabalhei no Hospital Santa Tereza e no Biocor de auxiliar de cozinha. Por último agora trabalhei no Extra, supermercado. Perdi o movimento dessa mão, fiz cirurgia, trabalhei trinta dias e me mandaram embora. Me recuperei, graças a Deus. Agora que estou forçando muito pra estudar às vezes dói. Parei de estudar com quatorze anos. Quando eu estava com o encosto do meu ex-marido, eu tentava estudar, ficava um mês, ele ia lá na porta da escola, me batia na porta da escola. Falava que eu estava com homem lá. Duas vezes eu voltei mas não consegui, porque ele não deixava. Essa é a terceira vez que eu volto a estudar. Só que dessa vez agora o meu marido me deu a maior força. Está um pouco difícil, mas estou levando né. Eu saí na terceira série, e agora me jogam na sexta! Mas estou conseguindo. Eu fiz uma prova. Se eu fiz a prova e consegui passar, é um sinal que eu dou conta. Estou gostando, quero chegar onde eu queria. Eu quero formar pelo menos no segundo grau, se Deus quiser. Porque em muitos lugares que vou fazer entrevista, fazer inscrição de serviço, eles pedem segundo grau. Em muitos lugares não faço por causa disso, por causa da escola. Os momentos mais difíceis da minha vida foram com meu ex-marido. Eu saía de madrugada correndo, com menino pequeno, ele querendo me matar, matar os meninos. Até fome nós já passamos. Foi muito sofrido. Tinha vez que meus meninos choravam com fome e não tinha nada pra dar. Tinha que sair na casa dos outros, pedindo. Hoje meus filhos estão bem. O do meio não conversa com o pai, direto fica querendo matar o pai. Porque quando ele tinha nove anos o pai dele bateu nele na rua, fez ele fazer cocô e xixi no meio da rua, todo mundo ficou olhando. Então ele falou, "quando eu estiver grande você vai ver, você não vai fazer isso comigo." Teve uma vez que ele pegou o pai dele e quase matou. Duas pedradas na cabeça do pai dele. O pai dele foi pro hospital. Ele falou assim, "olha, agora eu quero ver você fazer comigo igual você fez, eu fazer cocô e xixi na roupa. Faz isso de novo pra você ver." O pai dele levou quatro pontos na cabeça. Até hoje os dois não conversam. Como meu ex-marido bebe e usa muita droga, tem vezes que ele dá uma de valentão lá em Sabará. Minha menina liga e fala, "olha mãe, ele está assim". Eu digo, "não me fala nada não." Foi muito difícil. Por isso que eu faço tratamento até hoje. Eu começo a lembrar das coisas... Eu perdi minha mãe e meu pai muito nova, com dezessete eu fui morar com ele. Ele tinha quinze anos, e eu dezessete. Nós começamos a morar juntos. Cinco anos só foram bem, e depois começou. Eu falei assim, "não vou largar, porque é o pai dos meus filhos." Aí foi ficando, ficando, ficando. Ele disse, "quando eu tiver quarenta anos vou consertar." Ele só foi piorando. Mesmo assim fiquei com ele 25 anos. Aos trancos e barrancos, sendo o homem e a mulher dentro de casa. Mas graças a Deus estou aqui. Ele já foi preso, a polícia prendeu ele, prendia direto. Depois saía. Teve uma vez que ele virou pastor. Ele foi pra igreja, aceitou, batizou. Me falou, "vou mudar". Eu falei, "então tá." Aí eu voltei pra ele, não foi um mês e começou tudo de novo. Falei, "agora não aguento mais não... os meninos estão todos grandes." Às vezes fico olhando assim, as ocorrências. Tem um tanto de coisa registrada, que ele fazia comigo. Eu ia na delegacia, registrava. Até Maria da Penha, eu fui. Eu ia trabalhar, chegava do serviço, ele olhava minha roupa todinha pra ver se eu não estava com homem. Pro meu futuro, se Deus quiser, vai se abrir uma porta de serviço bom pra mim. E quero continuar aqui em Rio Acima, porque eu amo Rio Acima. E os moradores também. Eu gosto do pessoal daqui.
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