P/1 – Armando, você pode falar seu nome completo, por favor?
R – Armando de Magalhães Garcia.
P/1 – Qual é a sua data de nascimento?
R – Onze de junho de 1926.
P/1 – Nasceu em que cidade?
R – Rio de Janeiro.
P/1 – E seu pai e sua mãe, são da onde?
R – Mamãe era de Vassoura, também no Rio, papai também do Rio. Meu avô que era português.
P/1 – Seu avô por parte de quem?
R – De pai.
P/1 – E por que ele veio para o Brasil?
R – Meu pai?
P/1 – Seu avô.
R – Meu avô não morreu aqui, morreu lá.
P/1 – Ah, ele não chegou a vim para o Brasil?
R – Não, não.
P/1 – Seu pai que veio?
R – Veio. Veio estudar Medicina, se formou…
P/1 – Com quantos anos seu pai veio para o Brasil?
R – Não sei que idade ele tinha. Sei que ele casou com 25 anos.
P/1 – E ele veio para o Brasil para estudar? Por que ele veio?
R – Para estudar, para ser médico. Se formou aqui e ficou como médico o tempo todo. Bom, também foi para Campos primeiro, 11 meses, 12 meses ele morou em Campos, tanto que o meu irmão nasceu em… eles casaram em 1915 e o meu irmão nasceu em 1916, não! Ao contrário, 1914 o casamento e em 1915, o meu irmão nasceu. Eu tenho a diferença de 11 anos para o meu irmão.
P/1 – Por que ele nasceu em 11 e você nasceu em 26?
R – Ele nasceu em 15 e eu nasci em 26.
P/1 – E seu pai e sua mãe, você sabe como eles se conheceram? Por que eles se conheceram?
R – Não sei. Eu sei que eles se casaram, mamãe com 24 e… com 20 e o meu pai com 25.
P/1 – Sua mãe trabalhava?
R – Não. Só dona de casa, como era? Só ficava… como é que chama?
P/1 – Dona de casa.
R – Dona de casa.
P/1 – Do lar.
R – É, do lar.
P/1 – E aí, eles se mudaram de Campos e vieram…
R – Vieram para o Rio e ficaram aqui, aí quando eu nasci.
P/1 – Qual o seu lugar de nascimento?
R – Rua Barão de Petrópolis, Rio Comprido. Eu nasci ali, quando mamãe engravidou de mim, ainda disse: “Meu Deus, o que vai ser de mim? Eu já nem sei mais segurar criança, 11 anos que eu tive o primeiro filho”. E aí, nunca me dei bem com o meu irmão, sempre fomos pouco amigos, porque a diferença de idade muito grande e papai sempre me contou que ele tinha uma espécie de inveja de mim, porque não sendo filho único, quando eu nasci, diz que encontrou o meu irmão debaixo de um móvel, na sala. “Meu filho, o quê que é isso? O quê que você tá fazendo aí?” “Esse que chegou aí agora”, era eu. Já desde o início, tinha raiva de eu ter nascido. Nunca foi meu amigo, nunca me deu um presente, um par de meia de papai Noel, de Natal, de qualquer coisa. Nunca me deu um presente. Tinha um gênio horroroso, não se dava com ninguém, não falava com ninguém, não recebia um telefonema, não conseguiu casar tão cedo, porque demorou pra burro, acabou se casando com uma moça que era irmã de uma moça que eu namorei lá em Cambuquira. Quando eu vim de Cambuquira com a mamãe no trem, papai estava esperando com ele e a irmã de Elzinha tava também esperando, que é a Eder. Aí, Eder conheceu Thales na estação e começaram a namorar. Ele começou a viver com ela, ela foi com ele o resto da vida, foi para Cambuquira morar com ele, ficou lá quase 22 anos morando com ele, de repente, depois de 22 anos é que ele resolveu botar para o papel, passar… foram para o México e fez um casamento com ela. Papai sempre dizia: “Minha filha, você é a filha que Deus me deu, que graças a Deus, eu tive dois filhos, graças a Deus, você teve uma moça que veio a você. Você é minha filha”, papai adorava ela.
P/1 – Aí nessa casa, onde você morava na infância, quanto tempo você morou nela?
R – Ali, uns três, quatro anos, depois comecei a ir para a casa da minha avó materna… minha avó paterna, vovô e vovó Velhinha, era muito engraçado, o nome dela era Clarinda, mas todo mundo vendo aquele toquinho: “Aí, que gracinha, parece uma velhinha”, ficou Dona Velhinha, só chamavam a vovó de Dona Velhinha até ela morrer. E eu acabei conhecendo como vovó Velhinha, também. Só chamava Vovó Velhinha.
P/1 – Mas você ficava bastante na casa dela, por quê?
R – Não, eu ia passar uns tempos lá para não ficar muito tempo sozinho, né, porque, às vezes, eu ficava meio só. Mamãe precisava sair, qualquer coisa, não tinha com quem, puseram uma babá pra mim, Matilde, que essa viveu comigo 52 anos lá em casa. Morreu lá em casa. Mamãe dizia: “Essa aqui foi que nem minha irmã”. A Matilde ficou sendo da família também, depois de tantos anos, mas a minha babá, a Matilde era muito molenga, uma baiana mole que só Deus sabe. Eu fugia de casa, precisava atravessar a rua para me acompanhar, quase que eu caía e ela também, porque ela não conseguia correr igual a mim. Eu com dois anos, três anos, quatro anos de idade corria mais que ela. Assim era a Matilde.
P/1 – Como que era na sua casa? Quem que exercia a autoridade? Seu pai ou sua mãe?
R – Meu pai. Meu pai era mais autoridade.
P/1 – Como é que ele era? O jeito dele.
R – Baixinho, gordinho, careca, que o meu irmão também ficou careca e eu, desde de 28 de idade que eu tenho esse cabelinho aqui, não saiu andando, mais isso também ficou aí e hoje em dia, cabelo só cresce na orelha e no nariz. Em cima, não volta a crescer, continuo careca, vai ser sempre assim, eu acho e eu tô caindo também muito agora, porque eu vou fazer 90, tô me segurando muito em bengala. Bengala é a minha segurança.
P/1 – Mas ele era como?
R – Papai? Baixinho, gordinho…
P/1 – E o jeito dele?
R – Jeito de andar sempre depressinha e adorava o trabalho dele como médico, eu tinha um orgulho enorme dele. Ele, com 79 anos de idade, estava em cima dos livros estudando, sempre se atualizando, foi cada vez se atualizando mais ainda, porque hoje em dia, você vê os médicos hoje em dia, se formam só querem beber, tomar whisky, ir para a balada, não sei o que, não abrem mais um livro, não sabem nada.
P/1 – Qual que era a especialidade dele?
R – Clínico geral.
P/1 – Ele tinha consultório?
R – Tinha consultório. Cobrava um absurdo. Cobrava sabe quanto a consulta? Dez reais para fazer ele passar para vinte reais, eu e o meu irmão ficamos suando para conseguir fazer ele passar, saiba que era um bobo. Enquanto isso, os médicos estavam cobrando 400, 500 reais a consulta e ele cobrava dez, vinte reais. passou para vinte. Morreu pobre, deixou pouca coisa pra gente. A casa de Toneleiros, esquina de Santa Clara de três andares, que na época, ele comprou um terreno lá e construiu a casa, uma casa de três andares muito boa, de pedra, foi alugada por um primo nosso, alugou para a Prefeitura do Rio de Janeiro, foi o erro nosso, não podia botar para fora, porque era da prefeitura, nossa, para vender foi um custo, conseguimos vender. Vendemos para o Circulo Militar, na mesma hora que o Círculo Militar resolveu mexer nos papéis para poder botar a casa abaixo, fez um prédio, não deu nem um apartamento para nós, não deu nada. Nós vendemos essa casa quando o papai morreu por 360 mil cruzeiros, né, na época, reais, reais mesmo, naquela época eram réis, 360 mil. Aí, foi 170 para cada um. Dos 170, peguei 20, apliquei 150 e com 20 troquei meu carro, comecei a trocar sempre o carro. E o meu irmão e eu aplicamos o dinheiro que nos sobrou para um cliente de papai, que era 40 anos cliente de papai, mas ele teve um problema e a firma dele faliu, dois meses depois, nós estávamos lá, aí aplicamos o dinheiro na casa dele, ficamos com o dinheiro preso lá. Durante dois, três anos para resolver a situação dele nos pagar, queria nos pagar um réis, sei lá, um absurdo, não aceitamos! Quando chegou quatro meses depois da casa estar com eles lá, eles me telefonaram dizendo: “Vem aqui apanhar a papelada aqui, porque a firma faliu”, ficaram quase que 20 anos sem nos pagar, não pagaram quase nada! Não pagaram nunca, 20 anos depois, mais ou menos, resolveram pagar um pinguinho de dinheiro. Nós aplicamos esse dinheiro, conforme peguei 20 reais para trocar o carro, botei pra o lado 20 mil e esses 150 mil aplicamos na firma dele, como houve esse… como se diz? Esse…
P/1 – Promissória?
R – Não, concordata…
P/1 – Ele abriu concordata.
R – Abriu concordata. Aí, ficou sem nos pagar, nos pagaram depois de muitos anos, resolveram pagar dessa maneira. Aplicamos o dinheiro e perdemos o dinheiro todo, porque nós botamos no… vendi meu apartamento quando eu fui para…
P/1 – Só voltar pra gente não perder a história. Quais eram as suas brincadeiras de infância?
R – Brincadeira normal de criança, né, sempre a mesma coisa, as mesmas coisas de sempre.
P/1 – Você tinha amigos?
R – Muitos. Sempre tive muitos amigos. Eu era muito querido, porque o meu irmão era esse, tinha esse gênio horroroso, fechado como ele era. Papai como médico, ele não procurava o papai para dizer que ele tava com dor no rim, ele tinha pedra no rim, acabou falando com o papai, quando o papai foi fazer exame nele, ele tava cheio de pedra no rim, começou a botar remédio para quebrar pedra, ele expeliu pela uretra um caroço de azeitona, não sei como conseguiu passar de dor, doeu pra chuchu para expelir aquela pedra. E olha como ele sempre sofreu calado sem dizer nada a ninguém!
P/1 – Com quantos anos você entrou na escola?
R – No colégio? Eu acho que com quatro, cinco anos eu já tava entrando, já tava no colégio, quatro anos, já devia estar.
P/1 – Como que era a sua escola?
R – Ah, não me lembro mais.
P/1 – Lembra de algum professor?
R – Dona Gilda, professora de francês, até hoje eu me lembro que eu tinha lá, ela era muito legal, gostava muito dela. A professora de inglês, eu não gostava dela, não, ela era chata, mas enfim…
P/1 – Você gostava de aprender francês?
R – Eu gostava, sempre gostei de aprender línguas, cheguei a falar muito bem o francês, inglês, espanhol, o italiano, eu viajei muito de navio, de modo que só de ouvir, aprendi a entender as palavras do italiano, mas não falava, mas entendia tudo. Nessa época que eu vivia, mais jovem, a época em que eu estava trabalhando também em teatro, que era já aposentado do Banco do Brasil, eu trabalhei numa agência de viagens, de modo que a minha chefe dizia: “Armando, tem um promoção aí, você quer?” “Me dá que eu compro”, comprova a promoção, fazia 12, 13 cruzeiros por ano. Cheguei a conhecer 63 navios, 63. Viajei um bocado!
P/1 – Vamos falar das viagens também. Você teve educação religiosa?
R – Sempre fui religioso. Católica. Religião católica.
P/1 – Sua mãe ia na missa? Como é que era?
R – Mamãe não era muito de ir à missa, não, mas rezava muito, sempre rezando muito, gostava muito de rezar. Papai não muito, não. A mamãe era muito religiosa, papai não ia muito a missa.
P/1 – E de politica, vocês falavam na sua casa?
R – Na época de Getúlio, né, falava muito, porque ninguém gostava de Getúlio, como também nunca gostei. Governo dele era mais ou menos parecido com esse que nós estamos agora, roubo e corrupção tinha muito. Essa época… política não era muito falado em casa.
P/1 – E o quê que você lembra da casa da sua avó, onde você ia?
R – Era rua Conde Bonfim, 42. Era perto da segunda feira na Tijuca. Lembro que era ali, mas não me lembro mais da casa, como era, não. Vovó era muito irônica, muito engraçada, ria muito, se divertia muito, coitada, também não andava mais direito, mas tinha umas empregadas que viviam há muitos anos lá, que ela gostava de rir com aquelas empregadas, diziam bobagens, besteiras pra chuchu e vovó era moleca, chamava os filhos todos para ouvir as bobagens que Alexandrina dizia. Alexandrina era de uma ignorância total, coitada, foi limpar os vidros da casa, fez tanta força que se cortou toda, quebrou o vidro, se corou toda, aí minha tia chega: “Alexandrina, como é que você faz força desse jeito a ponto de quebrar o vidro?” “Não fiz força nenhuma, não, o vidro tá podre”, imagina, vidro podre, só ela. Vovó morria de rir com as coisas.
P/1 – E na juventude, quais eram os seus programas na juventude? O quê que você fazia quando jovem?
R – Muito pouca coisa, porque a minha ideia era sempre teatro, conforme eu te falei, queria sempre fazer teatro, porque eu gostava muito de teatro, vivia em teatro, vivia com gente de teatro. E o meu pai era contra isso…
P/1 – Mas quem que te levou para o teatro? Como é que você começou a gostar?
R – Porque eu sempre fui, eu já nasci com esse dom de ser ator, vontade de me apresentar. Tive vontade, sempre, de fazer isso. Quando fui falar com o meu pai, ele ficou danado da vida, querendo que não acontecesse isso, que eu ia desonrar a vida dele. Ele achava que ser ator era pederasta e, se mulher, era prostituta e homem era pederasta. Digo: “Papai, não é assim, teatro é cultura, é outra mentalidade, não é isso que você tá pensando, não”, ele não acreditou. Até que um dia, eu tava namorando uma moça que fazia teatro comigo, levei lá em casa, o velho Garcia olhou para a moça, começou a se encantar com ele e ela ele com ela, ela falou assim: “Armando, vou convidar seu pai para ir ver nossa matinê de domingo”, disse: “Não chama o papai, porque ele não vai. Ele ficou seis meses sem falar comigo, ele não vai”, na hora do convite dela, na mesma hora: “Eu vou”, aceitou e foi. Viu peça, era matinê, acabou o espetáculo, eu fui lá dentro para os bastidores, apresentei para Tônia, para o Paulo Autran, para o Celi, para Marilia Rei, para o Loureiro, pessoal todo da peça, aí ele ficou encantado: “Realmente, você tem razão, um pessoal culto, uma conversa boa, o bate-papo foi… eu posso assistir o espetáculo logo mais à noite?” “Pode”, dei outro ingresso para ele, ele assistiu duas vezes o espetáculo. Depois desse dia, nunca mais faltou a um espetáculo meu, foi ver tudo.
P/1 – Vamos voltar um pouquinho. Antes de você entrar no teatro, você prestou concurso para o Banco do Brasil?
R – Foi.
P/1 – Por quê que você decidiu prestar concurso para o Banco do Brasil?
R – Porque eu precisava trabalhar, eu tinha 16 anos quando eu comecei a fazer Santa Rosa, no fim do curso…
P/1 – Santa Rosa, o quê que é?
R – Era para fazer concurso para o Banco do Brasil. Aí, eu fiz e passei. Aí fui morar em São Paulo, fui nomeado e fui trabalhar em São Paulo.
P/1 – Com 16 anos?
R – É, 16 para 17, né, eu já tinha quase 17 e passei lá 11 meses, aí consegui transferência para o Rio e voltei para o Rio.
P/1 – Como é que foi chegar em São Paulo?
R – Fiquei sozinho, no tempo da garoa, que tinha muita garoa lá, o meu sapato sempre encharcado de água, molhado da chuva, não tinha um sapato para botar no pé que tivesse seco, tudo molhado. Foram 11 meses de desespero e chuvisco em cima de mim. Eu detesto chuva, detesto inverno, gosto de verão. Passei mal com o diabo naquele período.
P/1 – Mas que lugar de São Paulo você foi morar?
R – Na capital, mesmo.
P/1 – Lembra o bairro?
R – Não, perto do centro. O Banco do Brasil era no centro, né, não me lembro mais, parece que era Bento Lisboa, alguma coisa assim, acho que era Bento Lisboa o nome da rua, não me lembro mais qual era o nome da rua, não. São Paulo sempre foi aquela chuvarada, tem aquela época de chuvisco o tempo todo. Não era fácil.
P/1 – Aí, você voltou porque você arrumou uma vaga aqui, como é que foi?
R – Consegui uma vaga aqui no Rio e vim para o Rio e fiquei morando e trabalhando no centro do Banco, na rua Primeiro de Março, desde que cheguei até quase 11 anos antes de eu me aposentar, eu fui nomeado para ir para o Banco do Brasil dos Catetes, na rua do Catete, aí fui para lá, fiquei os 11 meses últimos lá, lá só tinham 84 funcionários, tanto que as pessoas chegavam pra mim: “Papai trabalhou no Banco do Brasil, fulano de tal, você conheceu?” “Não conheci, minha filha, há 11 anos que eu não tô com ninguém dentro da agência, sempre na direção geral, no modo que eu tô aqui nessa metropolitana com 84 funcionários, não conheço mais ninguém”, fiquei 11 anos lá, quando me aposentei, foi em…
P/1 – Qual que era o seu cargo no Banco do Brasil?
R – Trabalhava na compensação de cheques, primeiro. No começo, compensação de cheques, foi na época que a gente ainda somava cheque por cheque com o dedinho, hoje em dia, essa facilidade com o negócio da internet, eu tô vendo as pessoas, se fosse mexer hoje em dia naquele negócio, não sabia mexer naquilo nunca! Não sei como é que pode. Agora, quando dava uma diferença de um centavo, a gente ficava procurando aquele um centavo até uma hora da manhã, uma e meia, duas horas da manhã, até aparecer a diferença onde era, consertava, fechava o banco e ia embora.
P/1 – E com quantos anos você foi fazer teatro? O curso?
R – Trinta e três anos… não, que eu comecei a fazer teatro, com 33 anos, o curso eu estava fazendo durante uns dez anos depois de estar trabalhando.
P/1 – Mas com 33 anos, como é que você fazia teatro e o Banco do Brasil?
R – Fazia Banco do Brasil das sete da manhã à uma da tarde. À uma da tarde, saía, almoçava, ia para o teatro para começar a ensaiar a nova peça que nós íamos fazer, às nove horas, fazíamos a peça que estava em cartaz, 11 horas, saía e ia para o Grande Teatro Castro Muniz, na TV Rio, no Posto 6, íamos para lá ensaiar, ensaiávamos até três, quatro horas da manhã, chegava em casa às quatro horas, dormia de quatro às seis, às seis, estava tocando o despertador, correndo, pegar o carro para ir para o Banco do Brasil, outra vez, de seis à uma, à uma hora… aquilo tudo, durante seis anos foi essa vida minha, dormindo duas, três horas por noite.
P/1 – Qual foi a primeira peça que você atuou?
R – Que eu fiz? Foi com o Paulo Autran, Tônia Carrero e o Celi no teatro Mesbla, foi uma peça de Pirandello, “Seis personagens à procura de um autor”, peça italiana, fizemos essa peça lá, hoje em dia não tem mais esse teatro, acabou.
P/1 – Como é que foi o convite para você fazer?
R – O Paulo e a Tônia eram muitos meus amigos, iam muito lá em casa, jogar tranca comigo, jogar buraco, né, na época era buraco, nem era tranca naquela época, jogava buraco. E com isso, me convidaram. Mas antes disso, eu já me dava com o Morineau, esse pessoal todo do teatro, muitos deles…
P/1 – Como é que você foi conhecendo essas pessoas?
R – Raul Cortez era meu amigão de todo dia ir quase em casa almoçar comigo. Conheci indo ao teatro, sempre no teatro e procurando, ia falar com as pessoas, depois do teatro conversar, bater papo, ficava muito amigo de todos eles, sempre. Paulo Autran era meu amigão de eu ligar todo ano… fazia anos dia sete de setembro, ligava para ele todo ano. A última vez que eu liguei para ele, ele disse: “Armando, eu tô muito cansado, tô sentindo que eu não vou muito longe”, eu: “Nada, você tá ótimo”, tava ótimo de cabeça, realmente, tava muito bem, mas ele fumava muito. Eu perguntei: “Você tá fumando ainda?”, que eu fumei muito também, fumei desde os 11 anos de idade até um ano e 11 meses atrás que eu deixei de fumar, agora, não boto mais nem um cigarro na boca, não suporto mais cigarro, mas por força de vontade que eu parei, porque senão, não parava, não. E ele, Paulo Autran: “Continuo fumando. Sou da turma do burro”, eu: “Por quê?” “Burro que não larga o cigarro”, ele realmente não largava, foi até o final fumando muito.
P/1 – Mas voltando, essa primeira peça, como é que foi? Vocês ensaiaram quanto tempo?
R – Foi um mês e meio de ensaio, estreamos a peça, fizemos a peça.
P/1 – Qual que era o seu papel?
R – Era dos seis personagens que estavam assistindo, eu estava procurando fazer o papel principal da peça, eu era… que prestava atenção, o primeiro ator. Eu fiz todo o tempo assim, a Tônia, eu achava Paulo Autran um grande ator, mas a Tônia, sempre achei ela muito exagerada, exagerando muito, super representando. E um dia, houve uma coisa muito engraçada comigo, quando eu tava fazendo essa primeira peça, ela disse: “A próxima peça pra mim vai ser a ‘A visita da velha senhora’, deve ter papel para você porque são 32 atores, muita gente na peça”, ela nunca montou essa peça, continuou fazendo uma porção de peças, eu também fazendo outras coisas. Vinte e tantos anos depois, ela resolve montar… a que eu falei agora…
P/1 – Essa peça, “A procura da velha senhora”?
R – É, ela montou a peça e eu fui ver a peça, ela tava já ruim, com dificuldade de andar no palco. Aí fui falar com ela: “Olha, Tônia, tô brigado com você, você me disse que quando ia montar ‘A visita da velha senhora’, tinha papel para mim, que você ia me chamar, passaram 30 anos, você montou a peça agora e nem lembrou de me chamar”, ela virou: “Você ainda é ator?”, eu virei para ela e falei assim: “Você ainda não é atriz?”, ela calou a boca. Ela era muito convencida. Não era uma pessoa agradável. Vera Fischer, eu adorei trabalhar com ela, trabalhei um ano com ela, fiz todo o Brasil, teatro com ela, fiz “Negócios de Estado”, uma peça muito boa. muito engraçado, é comedia. E a Vera estava magnífica, com o Perry Salles, o Perry morreu logo depois, ficou muito meu amigo também, ficou com câncer e ela, apesar de ter se separado do Perry, no final do Perry, ela fez tudo para salvar o Perry, inclusive, botou Perry morando em casa dela e ela cuidando dele, ela sempre foi muito amiga do ex-marido. Primeira filha dela foi com ele. Depois se meteu com aquele… Camargo, né? Felipe Camargo, se meteu em droga, foi uma desgraça, os dois mandando aquelas drogas… briga todo dia, briga de faca, jornal dando que eles estavam brigando na rua, tava horrível. De repente, agora, pararam, todos os dois pararam com o negócio de droga, até o Felipe Camargo, como ela.
P/1 – Deixa eu perguntar, aí você fez essa primeira peça “Os seis personagens à procura de um autor”, e trabalhava no banco?
R – Estava ainda trabalhando no banco, fazendo aquilo que eu falei, aquele programão que eu tive.
P/1 – Depois você fez qual peça?
R – Eu fui para o Teatro Jovem com um diretor que era o Kleber Santos, que me convidou e eu fiz algumas peças lá: “Aconteceu em Irkutsk”, que foi muito engraçado, quando eu cheguei aqui no Retiro, de repente, teve uma pessoa que falou assim: “Aconteceu em Irkutsk”, eu disse: “Eu fiz essa peça”, vira-se ele: “Eu também”. “Quem é você?” “Arthur Maia”. “Arturzinho, não é possível que 53 anos depois, eu chego aqui no Retiro e venho encontrar você aqui” “Estou aqui já há uns 11 anos que eu tô aqui”, morreu, coitado, no ano passado, morreu de câncer. Mas você vê só que coincidência, me encontrar com ele aqui desse jeito e ele dizendo isso, eu disse: “Já fiz essa peça”. “Eu também”, foi assim que nós nos encontramos.
P/1 – Como é o nome dele?
R – Arthur Maia.
P/1 – E o nome da peça?
R – “Aconteceu em Irkutsk”, Irkutsk era uma cidade da Rússia. Acho que era de Aleksei Arbuzov, se eu não me engano, Aleksei Arbuzov, a peça. São uns nomes que eu não sei, pra conseguir gravar isso até hoje, ficar com isso na cabeça.
P/1 – Como que era essa peça?
R – Eu fazia o papel principal dessa peça.
P/1 – Qual que era?
R – Aleksei Arbuzov, fazia o paizão, chamavam de paizão, eu era o dono de uma estivadora e todo mundo me adorava, era amigão de todos e foi a peça que me colocou como grande ator, porque eu conseguia… tinha uma cena que fazia no proscênio, sentado numa cadeira, que o meu texto fazia de tal forma que as lagrimas vinham que escorriam e emocionava muito a plateia, a plateia pegava lenço para ficar chorando junto comigo, de modo que foi uma coisa que, para mim, foi muito bom, daí pra frente, foi só…
P/1 – Lembra algum trecho dela?
R – Não lembro mais nada. São 50… são… quantos anos? Cinquenta e três, 53 anos… passou muito tempo, não me lembro mais nada.
P/1 – Aí, você começou a fazer sucesso?
R – Depois disso, fiz teatro com Vera Fischer, fiz Brasil todo, fiz o Brasil todo também com Maria Della Costa que morreu agora esse ano, há pouco tempo…
P/1 – Qual peça com a Maria… essa foi primeiro com a Vera Fischer, que você contou…
R – Não. Primeiro foi com a Maria Della Costa.
P/1 – Qual peça foi?
R – Foi “Tudo no Jardim”, não me lembro de quem era. com o João Carlos Barroso que agora tá na Globo, depois eu entrei para a Globo, que a Tônia que me colocou na Globo, eu não acreditei que ela fizesse força para me colocar lá, tudo mais, digo: “Agora vou para casa”, fui para casa, cheguei em casa, seis horas da tarde, bate o telefone, era a Globo: “Seu Armando, tem um papel para o senhor na próxima peça, o senhor pode vir amanhã gravar”. Primeira peça que eu fiz na Globo foi “Carinhoso”…
P/1 – Primeira novela!
R – Primeira novela! “Carinhoso”, eu fazia o pai da Débora Duarte. Foi um papel grande, de modo que tinha texto para decorar todo dia, todo dia, aquele negócio, detestei aquela história de cena de televisão, eu gostava era de teatro. Aí, cada vez que chegavam pra mim, depois dessa época: “Seu Armando, tem papel para o senhor na próxima novela, o senhor vai querer?”, eu perguntava: “Tem continuidade?” “Tem”. “Então, não vou”, só ia quando era um, dois capítulos, fazer um Juiz, um padre, não sei o que, eu ainda ia. E fiz mil e não sei quantas novelas na Globo, tudo pequenininho, papéis pequenos, não fiz papel grande mais nenhum.
P/1 – Por quê?
R – Porque não gostava de televisão, achava chato. Ficar todo dia decorando papel para no dia seguinte dizer, chegava lá, repetia, repetia, repetia… eu decorava, os outros não decoravam, tava errado, repete, tava errado, repete, eu detestei aquilo.
PAUSA
P/1 – Armando, vamos voltar antes do “Carinhoso”, qual foi essa peça que você fez com a Maria Della Costa?
R – Com a Maria Della Costa, foi “Tudo no Jardim”, com o João Carlos Barroso, com… no me lembra mais a outra, já morreu, o nome da outra, Suzana Miranda, parece.
P/1 – Qual era o seu papel?
R – Era de um… como é que chamava? Era politico, era um politico. A Vera tava… a primeira peça?
P/1 – A com a Maria Della Costa.
R – Com a Maria Della Costa, não, eu não me lembro mais, eu fiz o papel do Moacyr Deriquém, que faleceu, não pode mais viajar, é por isso que eu fui substituí-lo, o Moacyr Deriquém, e fiz essa peça no lugar dele, não me lembro bem qual era o papel.
P/1 – Você viajou pelo Brasil com essa peça?
R – Viajei.
P/1 – Como que era a convivência com a Maria Della Costa?
R – Muito boa. Maria sempre foi muito legal comigo. A Maria viajou… encontrei com ela no navio várias vezes e uma das vezes, eu usava um blazer vermelho, que ela achava lindo. Numa noite de gala, ela levou pouca roupa de gala, chegou pra mim: “Armando, você me empresta aquele seu blazer vermelho?”, botou a calça dessas largas, que elas usam, preta, né, aquele blazer, tava elegantérrima, foi chiquérrima, nunca esqueceu isso. Há pouco tempo, quando eu fui visiáa-la, ela lembrou dessa história, que usou o meu blazer vermelho. Até hoje eu tenho esse blazer aí.
P/1 – Essas viagens que você fazia de navio eram excursão, o quê que era?
R – É como eu disse a você, trabalhando em agência de viagens, a minha chefe dizia: “Tem promoção”…
P/1 – Isso, depois do Banco do Brasil?
R – Depois do Banco do Brasil, quando acabou o Banco do Brasil que eu entrei trabalhando em casa de viagens, setor de viagens, né? E a Katia me dizia: “Tem promoção, você quer ir?” “Quanto tá pagando?” “Tanto, paga tanto”, eu achei baratíssimo, resolvi fazer, tudo que ela me dizia, eu aceitava. E também como eu trabalhava com agência de viagens, se eu vendesse mais de 20 passagens, eu tinha direito a uma passagem de graça. Tanto que eu fiz o Queen Elisabeth, aquela volta ao mundo, 104 dias, era dez mil a minha passagem, eu paguei cinco mil, paguei metade, eu vendi 26 passagens. Paguei metade.
P/1 – Mas você ia sozinho?
R – Sozinho. Ia sozinho.
P/1 – Vamos voltar. Aí, você viajou com a Maria Della Costa e você tava trabalhando no banco? Como é que você saía para fazer as peças, trabalhando no banco?
R – Teve uma briga danada! Quase que me botam para fora do banco, porque eu pedi licença-prêmio para viajar, que eu ia viajar com Maria Della Costa. Aí, o meu gerente, que era uma pessoa indesejável, ninguém suportava ele, todo mundo detestava ele, tinha uma implicância com todo mundo, comigo então, mais ainda: “O senhor não pode sair, imagina só se eu vou lhe dar licença para o senhor viajar com essa beleza de mulher?” “Meu amigo, é cultura! Eu tô no teatro para fazer cultura, não tô de caso com ela, não”, disse para ele na cara dele. Mas ele fez tantas comigo, que eu tinha ensaiado de tarde, mudei o meu horário de tarde para de manhã, das sete à uma. Primeiro dia que eu entrei, cheguei para o Gilson, que era meu chefe de sessão, pisquei o olho para o Gilson e comecei a falar alto porque sabia que o gerente tava ouvindo, né: “Graças a Deus que mudaram o meu horário da manhã, que hoje acordei tarde, já almocei, cheguei aqui descansado”, ele ouviu aquilo, na mesma hora foi lá em cima e falou para o gerente: “Olha, o Armando Garcia vai voltar para o horário das seis horas da manhã”, para me atrapalhar nos ensaios. Tudo ele fazia para atrapalhar. Ele me deu a licença para eu ir, eu fui. Aí, vi que ia passar mais tempo, quando eu tava com Maria lá em Garanhuns, acabou a minha licença, eu tive que vir aqui para poder pedir aumento da licença que eu estava, mais seis meses. Quando eu desci para isso, em Garanhuns, voltei para lá, cheguei em cima da hora em Garanhuns, Maria estava num desespero tremendo, porque o avião atrasou e não chegava, não chegava, cheguei em cima da hora para fazer a peça, fiz a peça. Saiu tudo legal, não teve problema nenhum, mas de qualquer maneira, você veja que ele perturbava. Quando eu sai do Banco do Brasil, que…
P/1 – O dinheiro que você recebia no teatro não dava para você largar o banco?
R – Se quisesse, dava, estava pagando de mil a mil e quinhentos reais por papelzinho que eu ia fazer, não era um papel tão grande assim, e tava dando para eu poder fazer, né, porque pagavam pra mim hotel, pagavam tudo, pagavam a passagem, pagavam tudo, então era um dinheiro que me sobrava, até. Eu comecei a aplicar dinheiro e assim foi a minha vida.
P/1 – Aí, depois dessa peça, você foi para a televisão também?
R – Depois dessa peça, eu comecei a fazer televisão também, foi quando… quando eu vim pra cá, quem me colocou aqui foi Rosa Maria Murtinho, que é muito minha amiga, Rosa Maria e Mauro Mendonça, os dois, o casal e o Mauro me ligou me convidando para as Bodas de Ouro deles, eu fui às Bodas de Ouro, fizeram um festão grande, maravilhoso, eu fui também. Aí me disseram assim: “Rosinha não vai conseguir… Rosa Maria não vai conseguir você entrar no Retiro, não sei o que, se você fosse um ator muito conhecido, Paulo Gracindo…”, eu trabalhei com Paulo Gracindo também, fiz festa com ele, era muito meu amigo. “…mas ela não vai conseguir, não”, não demorou três semanas, ligaram para mim e disseram: “Passa lá no Retiro, que o seu nome já tá lá para você entrar”, passei aqui, entrei, assinei e fiquei aqui. Dia dois de setembro de 2013.
P/1 – Aí, você entrou no “Carinhoso”, você tinha namorada nessa época?
R – Eu sempre era muito livre, sempre vivia mudando de namorada o tempo todo, achava muito bom ser livre.
P/1 – Qual foi a sua primeira paixão?
R – De quê?
P/1 – Sua primeira grande peixão?
R – Olha, até hoje, seria a mesma, foi Norma, que já faleceu e ela acabou se casando com o meu primo irmão e ficou sendo minha prima irmã. Teve oito filhos.
P/1 – Você namorou com ela?
R – Namorei com ela uma época…
P/1 – Como foi? Quantos anos?
R – Muito bom, durante uns dois anos.
P/1 – Que ano que foi? Você tinha quantos anos?
R – Ah, faz tempo. Eu tinha 19, 20 anos, 22 anos, por aí, 21 anos, por aí.
P/1 – E por quê que ela se separou de você e casou com o seu primo?
R – Nós separamos porque brigávamos muito, ela era muito ciumenta e aquilo me chateava, porque eu tava no ônibus com ela, às vezes, ela cismava que eu tava olhando para uma menina que tava passando: “Você acaba de me chatear com esse troço”, brigava tanto com ela, que acabei desistindo, separei, acabou. Gosto muito da minha liberdade.
P/1 – Depois você namorou… namorou alguma atriz?
R – Não…
P/1 – Essa que você levou seu pai na peça?
R – Teresa, namorei Teresa, Teresinha. Mas depois, no teatro, não procurei namoro com ninguém, não. Sempre quis muito a minha independência.
P/1 – Quando que você se casou?
R – Em 2006, imagina você, vou fazer agora dez anos de casado.
P/1 – Você tá casado?
R – Tô.
P/1 – E onde mora a sua esposa?
R – Com os pais. Nós estamos dando um tempo separado, porque ela tem metade da minha idade. Quando eu fiz 80, ela tinha 40, casamos.
P/1 – Casou no papel, tudo?
R – Casei no papel, na Igreja.
P/1 – Onde vocês se conheceram?
R – Muitos anos que a gente se conhece, que o pai dela foi colega meu de banco, trabalhava na Tesouraria do Banco do Brasil também e eu conheci por intermédio dele a família deles, Cassia e Paulo são meus sogros, hoje em dia.
P/1 – E como é que foi? Como é que vocês começaram a namorar?
R – Nessa época, nós namoramos sempre, saíamos juntos, tudo mais, pessoal todo saía, família dela ia lá para casa, pro Tribobó, para essa minha casa, onde tinha piscina, ficava tomando banho de piscina, conversando, batendo papo, almoço, tudo, fazia almoço todo domingo lá em casa, eles iam sempre e quando ela fez 15 anos, fez uma festança lá em casa no Tribobó, uma festa linda em volta da piscina, fez uma festa enorme, decorou aquela varanda toda com as coisas de 15 anos, né?
P/1 – Você tinha 55 anos na festa dela?
R – Exato. Por aí.
P/1 – Porque o pai era amigo e aí, te pediu a casa emprestada…
R – Não, essa casa foi a que eu comprei, o terreno que eu comprei e botei, fiz a casa pré-fabricada…
P/1 – Quando que você comprou?
R – Ah isso foi em 70 e… 74, 73…
P/1 – Foi quando você se aposentou do banco?
R – Me aposentei, é. Eu cheguei a comprar um apartamento pelo Banco do Brasil na Princesa Isabel, ao lado do Hotel Meridien, era uma cobertura, comprei por 135 reais, barato pra chuchu, vendi por cinco milhões e oitocentos. Peguei os 800, fui ao Banco do Brasil, paguei o negócio para tirar do inventário, para poder ficar livre com cinco milhões para aplicar, me disseram: “Aplica no Banco de Crédito Comercial que é muito bom”, me apresentaram o gerente dele, eu fui lá: “Como é que eu posso aplicar esses cinco milhões?” “Depende, se o senhor quiser aplicar com um ano de seguro, sem poder mexer nele, pode se render para 11 milhões, seiscentos e pouco”, digo: “Eu quero isso”, claro que eu vou querer. Três meses depois, me telefonam de lá me dizendo que era para eu pegar a coisa que eu assinei, a papelada que eu assinei lá, que o banco ia fechar. Aí fui lá: ‘Vai fechar por quê?”, fui lá saber: “Porque eles disseram em comum acordo com a…”, aquilo que era do Paim, até hoje ninguém… até hoje, não recebi nenhum dinheiro. Aí perguntei… como é que era o nome disso aí? Não há meio de eu lembrar agora.
P/1 – Não faz mal.
R – Eu sei que eu fui nessa firma, perguntei: “Mas quanto é que eu tenho que receber agora?” “No momento, o senhor tá para receber 189 mil reais”. “E quando é que eu receberia isso?” “O senhor quer que eu seja sincero? O senhor não vai receber isso nunca, nunca mais nós…”, meu Deus do céu, quase que me vem o nome da firma… não lembro o nome da firma. Paim do Sul que era lá do Rio Grande do Sul, que era o chefe de lá, não pagou nada a ninguém, ficou devendo a todo mundo. Como é que era? Não lembro o nome, meu Deus do céu!
P/1 – Não tem importância, eu entendi a história.
R – Eu sei que foi mais uma aplicação que eu fiz que eu perdi o meu dinheiro também de novo, tudo que eu fiz de aplicação, foi a casa que papai me deixou, foi o meu apartamento, que quando eu vendi por cinco milhões e 800, me disseram assim: “Olha, tem um apartamento do lado lá do seu que é igual ao seu, pergunta, quem sabe seu amigo não quer vender?”, não digo que era meu amigo, esse cara: “Tô querendo comprar o seu apartamento, você me venderia outra vez?” “Olha, Armando, apartamento igual ao seu foi vendido mês passado por 30 milhões”, eu vendi ele por cinco milhões e 800, desisti de pensar em comprar o apartamento, não tinha condições, mais.
P/1 – E aí, você foi morar onde?
R – Fiquei num flat até vim para cá, comecei a procurar casas de idosos para ir, mas sempre tudo cheio, tudo lotado…
P/1 – Mas e a outra casa de…
R – Do Tribobó?
P/1 – É.
R – EU vendi, porque quando eu estava morando lá, aluguei meu apartamento mobiliado aqui, sabe para quem? Elza Soares, uma vigarista que nunca me pagou, cinco meses sem me pagar, aí botei ela para fora de lá, não tinha como… como é que chama esse negócio que a gente bota quando…
P/1 – Despejo.
R – Não, eu despejei ela, porque, além de tudo, mobiliado que eu aluguei, ela quebrou tudo, arrancou papel de parede, fez o diabo, eu tinha uma bala de canhão que tinham me dado para botar guarda-chuva em dia de chuva ali no hall de entrada, aí cheguei ali, olhei: “Meu Deus do céu, até isso aqui essa mulher acabou”, vira essa vizinha: “Não, seu Armando, eu tirei daí porque urinavam até a boca todo dia aqui, até às seis horas da manhã. aquele mundaréu de gente puxando maconha aí com ela e depois urinavam aqui nesse tubo de guarda-chuvas aqui, eu botei aqui em casa, tá aqui em casa”, a vizinha lá que tirou. Imagina você, que safadeza que conseguiu fazer!
P/1 – E aí, você precisou vender a casa?
R – Vendi a casa. Vendi a casa por isso, foi quando… vendi desse jeito, vendi mal para burro também. Essa casa eu comprei mais porque o Antônio, que morava sempre comigo, que alugava apartamento de sociedade comigo, tanta bandalheira desde os 18, 19 anos, que nós tínhamos apartamento alugado, né, o Antônio faleceu, mas antes de falecer, ele tava lá, entregou comigo quando foi para lá, descobriu esse pomar, era um pomar, eram quatro casas, era a dele mais quatro lotes e eu comprei o lote ao lado, joguei o muro abaixo, ficaram cinco lotes nossos. Eu e o Antônio em sociedade, ele me disse: “Quando eu morrer… se for gramar tudo isso, botar piscina, fazer tudo, né, vamos, o dia que eu morrer, metade será seu”, pois bem, ele morreu antes, a irmã também já morreu, mas foi lá e vendeu os cinco lotes, sabe o que ela fez? Me deu o preço de um lote, os quatro ficaram para o Antônio e o quinto lote, ela me deu o preço do quinto, dividiu por cinco e deu da venda que fez lá. Eu entrei no cano. Antônio já tinha morrido, não tinha nada escrito, como é que eu ia provar isso?
P/1 – Vamos voltar? No “Carinhoso”.
R – O quê que tem?
P/1 – Você fez um teste, como que foi? A Tônia Carrero te indicou?
R – A Tônia Carrero me indicou e eu já tinha feito…
P/1 – Nunca tinha feito TV?
R – Não. TV, não, só teatro, muito teatro. Bastante teatro, bastante peças antes. Os nomes das peças que eu não me lembro mais, eu fiz uma porção de peças.
P/1 – Aí, ela te indicou…
R – Me indicou, a Globo logo me ligou em seguida me dizendo que era para ir lá… pegado o papel…
P/1 – Quem que era o diretor, você lembra?
R – Não me lembro. Não me lembro mais, não.
P/1 – E aí, você fez teste?
R – Setenta e três foi isso. Não, já me chamaram seguros para me dar o papel, não precisei fazer nem teste, porque eu já tinha currículo bastante para poder… de teatro para poder fazer televisão, né? Hoje em dia, você vê, TV Globo tá chamando qualquer pessoa, basta ser bonitinha, bonitinho, vai ser ator. Às vezes, um canastrão de primeira qualidade! São atores que estão trabalhando lá, não precisa mais de teatro, não precisa mais de curso de teatro, fazer nada. Hoje em dia, eles contratam qualquer um.
P/1 – E quando você tava fazendo “Carinhoso”, depois que você saiu, você voltou fazer qual peça?
R – Não parei de fazer teatro nunca, sempre fiz teatro. Se me chamassem para fazer um papel curto, dizer: “O jantar tá servido”, de um mordomo, eu ia, só para dizer: “O jantar está servido”, eu ia, era só me chamar que eu ia. Para teatro, eu vou para qualquer coisa. Agora, televisão, pode me chamar, que eu não vou, não quero ir.
P/1 – De todas as peças que você fez, qual foi a que mais te marcou?
R – O “Aconteceu em Irkutsk” foi a que mais me marcou, a peça que eu fiz no Teatro Jovem, porque essa daí foi um papel principal que eu fiz e um papel que eu consegui arrancar emoção da plateia, plateia precisava abrir a bolsa para pegar lenço para assoar o nariz, porque estava chorando junto comigo. E eu dizendo o texto com uma facilidade danada que eu tinha de chorar só com o texto que eu tava falando. Foi o papel que mais me marcou.
P/1 – Qual foi a última peça que você fez?
R – A última, acho que foi em 86, quando eu fiz com Vera Fischer, o Brasil todo, que eu fui substituindo um ator que não pode ir, peguei o papel e fui, viajei. Foi “Negócios de Estado”, uma comédia com a Vera Fischer, foi a última que eu fiz.
P/1 – E depois, por quê que você não fez mais?
R – Depois, comecei a ficar já velho, em 86, 87, eu pensei em não fazer mais nada de teatro.
P/1 – Mas por que você não quis?
R – Porque eu não quis, eu não tava querendo mais nada.
P/1 – Você começou a recursar?
R – Comecei a recusar. Às vezes… não me convidavam muito também, porque a gente ficando velho, só chamam você para fazer pai, fazer juiz, avô, só coisa… não tem mais papel para você, só tem pontinha para fazer. Para fazer papel que não me agradava, também não ia. A gente, chega uma certa idade, fica cansado.
P/1 – Você tem filhos?
R – Eu tive um filho, que é o meu filho de criação, com uma mulher que engravidou: “Melhor você tirar esse filho”. “Não, eu quero ter esse filho”. “Você se garante?” “Eu me garanto”…
P/1 – Uma mulher que engravidou de você?
R – Engravidou de mim.
P/1 – Que mulher?
R – Uma mulher que eu conheci na vida. Aí, eu disse a ela: “Não, eu vou te botar numa pensão, você vai querer criar essa criança, durante um tempo, eu vou te ajudar”, botei. Um mês depois, eu cheguei lá para pagar a pensão: “Ainda bem que o senhor apareceu aqui, porque a menina sumiu e deixou criança aqui há três dias que a criança tá chorando feito uma louca, querendo mamar e não sabe como”, botei uma ama de leite, chamei a crioulinha para morar lá comigo, levei o menino lá para casa e criei o Paulo. É um filho de criação, praticamente, filho meu, mas não foi registrado, porque ela registrou só com o nome dela, tanto que ele não tem o meu nome.
P/1 – E ela sumiu?
R – Sumiu, desapareceu, nunca mais soube dessa mulher.
P/1 – Nunca mais?
R – Nunca mais soube…
P/1 – E até quantos anos esse filho morou com você?
R – Ele vai fazer 64 anos agora, imagina você!
P/1 – Mas ele morou até se casar com você?
R – Não. Com 24, 25 anos, ele casou com uma cearense e aí, a cearense levou ele para Fortaleza e lá, eu tive três… ele teve três filhos, são três netos que eu tenho, uma menina e dói homens e tô com cinco bisnetos, todos nascidos lá.
P/1 – No Ceará, eles moram?
R – Na casa de Paulo. Paulo comprou esse apartamento lá.
P/1 – E ele te visita aqui?
R – Visita. Ele telefona para mim quase todo dia. Ele andou bebendo muito, me chateei com isso pra burro, falei com ele: “Você vai acabar tendo cirrose…”, não deu outra, soube que ele tava com cirrose, médico falou: “Se tomar mais um gole de álcool, você morre”, parou completamente, mudou de vida. Liga para mim todo dia, com cuidado danado comigo, agora. Reconheceu. Hoje em dia, eu sou… hoje mesmo, ainda não ligou, mas volta e meia, ele liga. Toda hora, ele liga para mim. Ontem, ligou umas duas vezes. É assim, a minha vida.
P/1 – Se você pudesse fazer alguma coisa, mudar alguma coisa na sua trajetória de vida, você mudaria?
R – Atualmente, eu acho que não. Atualmente, eu vivo pedindo a Deus que me leve, que eu acho que eu já tô devendo, 90 anos já é muita coisa, é viver muito. Pra mim, já chega.
P/1 – Você tem sonhos?
R – Sonho? Sonho com alguma coisa? Atualmente, eu não tenho mais nenhum. Mais nenhum. Às vezes, eu tenho o sonho de voltar a fazer um cruzeiro, mas acontece que eu não tenho mais condição, que eu sinto que eu não posso mais andar, não tenho confiança na minha… andar para algum lugar, se eu for fazer algum cruzeiro, eu tinha que levar uma pessoa para me empurrar na cadeira de rodas e isso eu não quero.
P/1 – Dessas viagens, desses cruzeiros que você fez, qual que foi o mais marcante?
R – Foi o da volta ao mundo, 104 dias, no Queen Elisabeth.
P/1 – Como é que foi?
R – Queen Elisabeth era um navio de um luxo maravilhoso, eu sozinho numa cabine era dez mil reais a cabine para ir. Era um navio que tinha um salão de dança grande, com 17 pessoas, figurantes da orquestra, tocava música o tempo todo. Agora, era uma viagem cara, e por ser cara, logicamente que os pais não levavam nem filhos, nem netos, nem nada, então, ia muita gente idosa. Então, era uma viagem engraçada, porque tinha uma senhora de 91 anos que dançava a noite inteira, forte pra chuchu, não tinha nada. E tinha outros, que de repente, quando chegava… cada vez que o navio parava, tinha três, quatro mortos na geladeira, porque morria gente pra chuchu durante a viagem. Agora, coquetéis, tinha de saída e de chegada. de manhã, tinha de saída do pessoal que eia embora e de tarde, tinha outro para o pessoal que chegou, que entrou com champanhe à vontade, tudo de graça. Com candelabros de velas, muito lindo, sempre muito bem arrumado, muito chique, muito alinhado. Eu aí com muita gente conhecida, porque conhecia muita gente que comprava a passagem comigo, quando eu falava que eu ia nessa viagem, todo mundo queria ir, que era um grupo grande, umas 24…
P/1 – Quem eram essas pessoas?
R – Umas 24, 26 pessoas…
P/1 – Mas da onde eram essas pessoas?
R – Do Rio. Geralmente, do Rio.
P/1 – Mas o quê? Do banco, amigos?
R – Amigos que eu conheci nos navios, acabava ficando meus amigos, também. Quando eu dava festa de aniversário, ia todo esse pessoal do navio também, além do pessoal de banco, amigos meus, gente de tranca, que jogava tranca comigo também ia. Todo ano, eu faço. Minha afilhada é no mesmo dia, vou fazer 90, ela: “Vamos fechar já os 90 anos aqui em casa”, ela tem um apartamento grande, bom que todo ano, eu faço festa lá e vai todo mundo, Rosa Maria Murtinho, Mauro Mendonça, Natália Timberland é minha amigona, vai sempre, também, não deixa de ir e várias pessoas de teatro também aparecem lá. Eu chamo todo mundo, vai todo mundo, gente que fez teatro comigo, que viajou comigo, que jogou comigo, tem tudo lá. Esse ano, vou até mais cedo, vou no dia 11, que cai sábado, ela quer fazer a festa dia 12, que é dia dos namorados, 12 de junho, quer fazer às seis horas da tarde, que é uma hora mais cedo, que agora todo mundo já tá com medo de sair de casa de noite, então, muita gente não quer ir porque tem que sair… tem um casal amigo meu que já ligou pra mim: “Armando, você vai me desculpar, mas eu não vou mais no seu aniversário, que eu não saio mais de casa de noite, hora nenhuma”, mas seis horas, quando chega às 11 horas, bota o bolo lá, acende a vela e todo mundo vai embora às 11 horas.
P/1 – Você gosta de comemorar seu aniversário?
R – Eu gosto, porque é um momento que eu tô sempre com os meus amigos juntos, né? Você vê, esse meu filho de Fortaleza, ele já comprou passagem, vem todo ano para o meu aniversário, para a festa aqui. Natália também, eu falei com ela esse ano: “Natália, como vai ser esse ano? Você fazendo teatro…”, que o Wolf Maya deu um teatro para ela, eu fui ver a peça dela, ela me ligou, me mandou convite, eu fui ver. Mas eu tô numa situação, que você sabe que, às vezes, no teatro, eu escuto a pessoa falando e não entendo o que a pessoa tá falando, eu não sei o que tá acontecendo comigo, que eu tô com dificuldade de audição. E aí, disse pra ela: “Olha, Natália…”, quando ela acabou a peça, nem comentei sobre a peça, porque eu não sei nem do que se tratava a peça, depois é que eu falando com a Vera que a Vera me explicou o que era, porque eu não tava sabendo o quê que tinha acontecido. Ela falou comigo: “Oi, Armando…”, eu digo: “Ah, Natália, que prazer saber que você ganhou um teatro com o seu nome, muito merecido”, é lá na Barra o teatro dela. Wolf Maya que deu, Teatro Natália Timberland. Natália é muito minha amiga, me dá presentes maravilhosos, me deu de presente no ano passado, uma manta aveludada, parece um veludo, uma manta para o inverno, eu durmo enrolado nela o tempo todo no inverno.
P/1 – Como foi o processo de você vim para o Retiro dos Artistas?
R – Desse jeito, porque eu fiquei num flat, procurando casas de idosos, mas não conseguia nunca, de repente, veio esse telefonema para eu vim para cá que eu podia entrar e que o meu nome já estava aqui para eu entrar. Vim para cá e entrei.
P/1 – Mas você preferia morar aqui do que ficar alugando um apartamento?
R – Claro, imagina só! E aqui, você sabe que ninguém paga nada, né, se não tiver… não precisa pagar, o que acontece é que eu me sinto mal de não pagar, de modo que eu comecei dando mil reais para ajudar aqui o Retiro. Fiquei três meses dando mil reais, quando chegou no Natal, teve 13º, não sei o que, dei mil e quinhentos, passou para mil e quinhentos. Mas tem gente aqui que dá 300, dá 500, tem gente que não dá nada. A Vitória que mora aqui há 30 anos, nunca deu um tostão aqui, reclama tudo, fala mal do Retiro, não se dá bem com ninguém, é uma chata até com a irmã dela, que é a Doroti, simpaticíssima, educada pra burro, a outra, não, a Vitoria é mal educada. Quando eu cheguei aqui, me apresentei: “Sou Armando Garcia, sou o novo residente, qual é o seu nome?” “Vitória” “Muito prazer”, no dia seguinte, quando cheguei: “Bom dia, Vitória”, ela me olhou e não me respondeu, nunca mais falei com ela, nunca mais liguei para ela, não tomo conhecimento da pessoa aqui dentro.
P/1 – Mas e aí? Aí, você veio para cá e tá há três anos?
R – Três anos, tô aqui nesse quarto aqui, que eu achei ótimo o lugar que me deram, muito melhor do que uma casa maior com dois quartos, sala, banheiro, cozinha… eu não quero nada disso, aqui tá ótimo, tendo banheiro, esse quarto tá ótimo. Comprei um… como é que chama? Um forno de micro-ondas para esquentar a minha comida, quando às vezes, eu quero pegar a minha comida, não quero comer lá, trago, esquento no micro ondas aqui e como.
P/1 – Você tem amigos aqui?
R – Poucos, né? O Ênio, que é da diretoria daqui e as pessoas… a Vera… Vera… sobrinha da (?) que mora aqui em cima. Aqui em cima de mim morava o Sorriso, olha o nome de gente, Sorriso, trabalhou em circo, tava aqui como morador e ajudante de moradia dos outros aqui, ele era… ajudava a Eloá, a Eloá tinha 37 gatos, imagina você. Ela morreu agora há pouco tempo, deram os gatos todos, sumiram com os gatos, ainda tem seis ou quatro gatos que ainda vivem por aqui, morrendo, morrem de fome, ninguém dá comida para eles e ele foi embora. Graças a Deus que ele foi embora. Ele tem mania de planta, encheu a casa de planta, de vasos de plantas, era um tal de arrastar planta em cima de mim, eu não aguentava mais. Um dia, eu falei com a Cida, diretora daqui: “Olha, o Sorriso tá me enchendo a paciência com o barulho a qualquer hora da madrugada para andar dentro do quarto dele, tem que mexer em não sei quantos vasos, então, arrasta coisa no chão, me acorda o tempo todo”. Foi embora, graças a Deus. Sorriso. São os amigos que eu não tive aqui… eu cheguei aqui, parecia o J Maia, todo mundo aqui detesta ele, um sujeito mal caráter, fez uma festa quando eu cheguei aqui: “Armando Garcia, me lembro que você fez um almoço, uma feijoada que você deu lá no Tribobó, na sua casa, varanda bonita, uma piscina na frente”, fez uma festa comigo, me deu um abraço. No dia seguinte, foi dizer para a Vitória que eu era viado. Como é que são essas pessoas… sabe o que eu fiz? Nem reclamei, não falei nunca mais com ele. Não dirigi a palavra a ele, ele passou a não falar comigo também. Estamos até hoje sem falar um com o outro, graças a Deus. Não suporto. Ele é um sujeito que incomoda todo mundo, ele fica com o rádio de pilha ligado alto pra burro na hora de tomar café, entra com aquele troço alto, tocando, todo mundo irritado e eu tomando o meu café, e ele continua com aquele negócio, ele não respeita ninguém. Ele se julga dono daqui. A Claire um dia falou com ele, porque ele começou a trazer garotos para cá, trouxe garotos, morou nessa última porta ali, ele morou ali, eu não tinha chegado aqui ainda, me contaram essa história. Ele prometeu um violão para um garoto e não deu, aí o garoto pegou um violão que tinha aí, quebrou na cara dele, ele pulou a janela ali, nu, com a cara toda ensanguentada… e o garoto: “Cadê a minha bicicleta que você falou que ia dar?”, disse que foi assim o negócio, que ele pulou ali, não tinha para onde ir, foi pedir ao (?) para ficar, deram uma casa para ele para ele ficar aqui, tá aí.
P/1 – Tem alguma coisa na entrevista que a gente não falou? Devem ter várias coisas na sua trajetória, que você acha importante deixar registrado?
R – Eu acho melhor não contar essa história do J Maia, que eu não quero que ele saiba que eu contei.
P/1 – Tá, a gente tira.
R – J Maia é uma pessoa indesejável, ele é indesejável!
P/1 – A gente tira, claro!
R – Todo mundo não suporta ele.
P/1 – Olhando a sua trajetória assim, o quê que a gente não falou que é importante deixar registrado?
R – Acho que nós falamos tudo. Falamos tudo.
P/1 – O quê que você achou de dar essa entrevista?
R – Muito bom, sempre bom falar do passado da gente é sempre bom falar. Mas é isso, Vocês são uns amores, todos vocês. Suzana, Luana e Daniel. Não é Daniel? Minha cabeça tá boa que lembra de todos os nomes de todo mundo e olha que a gente tem conhecido gente ultimamente, é um tal de chegar gente aqui: “Qual é o seu nome?” “Qual é oi seu nome?”…
P/1 – Você sabe que essa entrevista é a Globo que tá fazendo, mas vai também para o Museu da Pessoa.
R – Claro que vai.
P/1 – Museu de história de vida.
R – Isso aí.
P/1 – Vai fazer parte do Museu da Pessoa.
R – Muito bom. Acho ótimo!
P/1 – Obrigada.
R – Eu que agradeço a vocês.
FINAL DA ENTREVISTA
Dúvidas:
Mas antes disso, eu já me dava com o ___00:21:27___, esse pessoal todo do teatro, muitos deles… – Página 07.
[…] aquilo que era do ___00:42:41___, até hoje ninguém… até hoje, não recebi nenhum dinheiro. Aí perguntei… como é que era o nome disso aí? Não há meio de eu lembrar agora. – Página 13.
R – Pouco, né? O Ênio, que é da diretoria daqui e as pessoas… a Vera… Vera… sobrinha da ___01:01:58___ que mora aqui em cima. – Página 19.
[…] disse que foi assim o negócio, que ele pulou ali, não tinha para onde ir, foi pedir ao __01:04:54___ para ficar, deram uma casa para ele para ele ficar aqui, tá aí. – Página 19.
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