Projeto Conte Sua História
Entrevistado por Ana Luiza Uwai e Bruno Pinho
Depoimento de Claudinho Miranda
São Paulo 20/06/2017
Realização Museu da Pessoa
Depoimento HV_590
Transcrito por Ana Luiza Uwai e Bruno Pinho
P/1 ‒ Qual que é seu nome inteiro, local e data de nascimento?
R ‒ Meu nome é Claudio Miranda de Moura, nasci no Jardim ngela, São Paulo, Zona sul de São Paulo, e nasci no ano de 1977.
P/1 ‒ Qual que é o nome dos seus pais?
R ‒ Meu pai chama José Gerson de Moura e minha mãe Neli Miranda de Moura.
P/1 ‒ E que que eles faziam?
R ‒ Olha, meu pai é salva-vida, né, hoje, de profissão e minha mãe é doméstica aposentada, minha mãe fica em casa mais agora cuidando dos neto, né
(risos)
P/1 ‒ E como é que você descreveria seu pai e sua mãe?
R ‒ Olha, são… meu pai, minha mãe, é o amor da minha vida, né. Meu pai, minha mãe, eu devo minha vida a eles, né, porque eles me colocaram no mundo, e além de ter me colocado no mundo me colocou num lugar, hum, né, que foi o Jardim ngela, um dos bairros mais violentos do mundo e cuidou muito bem dos filhos e cuidou de mim, cuidou dos meus irmãos, então devo muito ao meu pai e minha mãe
P/1 ‒ Como é que era a dinâmica de vocês em casa?
R ‒ Como o que?
P/1 ‒ Era a dinâmica de vocês em casa? Como é que foi quando você cresceu?
R ‒ Ah, meu pai e minha mãe sempre foram muito, é, muito justo assim né, com essa coisa de... os quatro filhos, né, a gente que nasceu no Jardim ngela, na região do Jardim Nakamura que é um sub bairro do Jardim ngela, então a gente vivia mais dentro de casa, né, quando era menor, né. Porque a gente não podia muito sair na rua, porque o bairro é o mais violento do mundo, então você não podia sair muito na rua, então, meu pai sempre, enfim, trazia coisas pra a gente, vinha do clube, trazia algumas coisas para a gente se divertir, então a gente criava algumas coisas né, na casa, a gente morava de aluguel, e a gente assista televisão de manhã e ia pra creche a tarde, depois ficava ali o dia inteiro brincando junto, né.
P/1 ‒ E você é mais velho de quatro irmãos?
Eu sou o mais velho de, o mais velho de quatro irmãos.
P/1 ‒ E como que é sua relação com eles?
R ‒ Ah, meu irmão é, tem meus irmãos, né , todos eles eu tenho uma relação muito aberta e muito transparente, a gente fala de tudo. Meu pai criou a gente muito assim de falar sobre tudo que a gente precisa falar. Não tem, é, enfim, tem um nível de confiança muito alto, né, a gente não é só irmãos, a gente entende que a gente também é parceiros de vida, né, e precisa construir relação de uma forma mais aberta e transparente então a gente vem vivenciando essa história de ser mermo irmão de verdade, não só de sangue, né, então a gente, é, tanto que a gente vive junto até hoje. Tipo, ah, a gente tem um quintal que mora eu embaixo, minha irmã em cima, meu irmão atrás e minha irmã na frente, então (risos).
P/1 ‒ Você consegue lembrar de algum momento que você percebeu essa confiança e como que é diferente essa relação com seus irmãos?
R ‒ Olha, eu, eu acho que a partir da hora que a gente, eu e meu irmão principalmente, que é meu irmão, né depois de mim eu sou o mais velho depois vem meu irmão, as outras são um pouco mais novas, mas, a gente criou um propósito de vida junto, que é fazer música, e mudar o olhar através da música, eu acho que a gente passou viver uma relação, todo dia estar junto, todo dia tomar café junto, todo dia, né, enfim, ajudar um ao outro, cooperar um com o outro, porque a gente teve um propósito de vida, né. Um propósito de mudar o lugar onde vive através da música.
P/1 ‒ E quando que vocês decidiram fazer isso juntos?
R ‒ Isso foi, é, em 92, 1992. 89 eu comecei bater lata com a banda, com a banda que eu criei lá, então em 92 a gente oficializou o Poesia, que é a banda que eu toco, Poesia Samba Soul, e aí a gente, enfim, meu pai, né, a gente era tudo menor de idade, então, os, na verdade, assim, uma irmã mais nova ela não tocava com a gente, né, então, minha irmã Valéria, meu irmão Fábio e eu eram os mais velhos, então a gente tocava juntos, estabeleceu fazer música junto pra ir tocar em festival de música, enfim, a relação assim com a música foi muito forte, né, também.
P/2 Você tem alguma história desse primeiro momento, que você lembra, assim, é bem marcante?
R ‒ Cara, assim, eu fui dos dos quatro irmão eu fui o que saiu de casa, né, pra trabalhar cedo. Meu irmão, meu irmão depois de mim, ele foi começar a trabalhar depois já de maior de idade. E eu comecei a trabalhar com nove anos de idade, né, com, de 8 pra 9 anos. Então eu me lembro que eu saía pra ir trabalhar com meu pai no Clube Indiano, que era um dos clubes mais ricos de São Paulo, então eu saía de lá e eu, dos três, né, dos quatro, eu era o único que ia pra esse lugar e voltava, então, eu me lembro que eu queria fazer, eu queria muito ajudar meu irmão a tar lá também, né, que meu irmão tivesse com a gente, então, eu, então meu irmão antes de ser maior de idade ele chegou a trabalhar, com 12 anos eu consegui levar ele pra trabalhar de pegador de bolinha. Então eu me lembro, uma coisa que marcou muito a minha vida foi que quando eu comecei, né, quando tava com eles nessa idade, eu queria ter essa banda também, então eu levei ele pro clube, então ele começou a conviver comigo e a minha irmã também mais nova, né, começou a querer também tá com a gente, mas ela não podia tar no clube, então a gente criou a banda, o Grupo da Amizade, que depois virou a banda Poesia Samba Soul e nessa banda a gente começou, aí começou a ter a relação mesmo, né, eu me lembro que foi uma semana a gente tinha que fazer um show e nenhum dos dois tocava, né, eu tocava já cavaquinho, mas nenhum dos dois tocava instrumento, daí eu tive que aprender a tocar teclado em uma semana e mesmo em uma semana ensinar. Tinha uma semana para aprender e ensinar eles a tocar teclado e baixo. Eu coloquei os dois tocando e a gente foi pra um festival chamado Jardins Bar?, que a gente gravou também uma coletânea, um disco, na época, em 1992, que foi que marcou muito a nossa vida.
P/1 ‒ Por que que te marcou tanto?
R ‒ Porque foi a gente começou a sair, é, a gente começou a virar uma referência na favela, né. A gente começou a ser um ponto de luz lá. Num lugar onde era o bairro mais violento do mundo, a gente começou a fazer música nessa, a gente entrou nesse festival e a gente conseguiu carregar muita gente, a gente carregou quase quatrocentas pessoas em ônibus, em, naquela época isso era impossível, né. Então a música uniu essas pessoas todas e a gente saía com a galera da favela pra ir prum festival de música fora da favela, que era na Robert Kennedy, o Jardins bar ? ficava na final da Robert Kennedy, na Avenida Atlântica, né, antiga Avenida Atlântica, então isso marcou muito pra mim, né, eu tinha, eu já tinha 11, de 12 anos, por aí, isso pra mim já era, era tipo, nossa, como é que a gente conseguia fazer isso, né. Meu pai lógico que ajudava muito, né, meu pai ele ia atrás dos ônibus, organizava, e eu só fazia a parte da música, então marcou porque a gente era, eu fui um ponto de luz que começou a surgir naquele lugar, né.
P/1 ‒ Esse foi o seu primeiro show?
R ‒ Isso, foi o nosso primeiro, não, é, mais ou menos, né, profissional, profissionalmente foi o primeiro show, assim, subir em palco com microfone e tudo ligado foi a primeira vez, eu já tinha tocado antes, né, mas roda de samba, é, no clube ali, informal, né informal ali a gente já fez, né, mas palco, microfone, público foi a primeira vez.
P/1 ‒ E como que você se sentiu depois que você fez esse show?
R ‒ Olha, eu senti que eu era capaz de mudar, de mudar o mundo, de mudar o lugar onde eu tava e mudar o mundo. E mudar, porque eu fazia música, sempre fiz música pra mudar o lugar, ou pra mudar as pessoas, eu nunca pensei em fazer música pra uma questão do ego ou de ser famoso, né, a gente tentou, teve uma época que a gente, “pô a gente vai tocar na televisão”, não sei o que, a gente chegou a tocar numas rádios, né, chegou a ir lá no programa de televisão, lógico que passa pela cabeça assim, po, mas a gente sempre utilizou sempre percebi na minha caminhada hoje, pensando que a gente sempre utilizou da música pra unir as pessoas, pra fazer a ponte entre as pessoas. Pra tar com gente, pra uma pessoa conhecer a outra, pra ter a oportunidade, dar a oportunidade pra outra pessoa tocar também, sabe, e a gente começou a formar bandas na região, depois disso a gente começou a formar um monte de grupo, começou a dar aula de graça pra comunidade toda e começou a formar grupo, então a gente sempre, nessa linha toda pensando hoje, né, a gente sempre utilizou a música pra isso, né.
P/1 ‒ E o que que a música significa na sua vida hoje?
R ‒ Olha, a música pra mim significa evolução. Eu acho que, é, aprender a conviver com pessoas e você respeitar a outra pessoa, a música ela te ensina isso. Quando você aprende a tocar um instrumento, primeiramente, você tá pensando em você e como que você vai aprender a tocar o instrumento, então você tá focado, né, quando você aprende a tocar o instrumento, quando você já domina aquela aquela coisa de se fazer música, você já pensa em como que você vai dar o melhor que você tem para o outro, né. E aí tem uma outra coisa muito louca que quando você começa a tocar bem, e aí você também já começa a acessar o ego, né, e aí você percebe como que você tá tratando a outra pessoa, então a música ela educa você de uma forma, né, ela leva você pra uma dimensão, e eu acho, pra mim acho que a música ela tá ligada com a espiritualidade, ela tá em outro nível, né, ela tá, ela não é, não é uma coisa que cê pega, é uma coisa que você sente. Então, a música significa pra mim evolução.
P/1 ‒ Você lembra qual foi o seu primeiro instrumento?
R ‒ Olha, meu primeiro instrumento foi bem interessante. Era um pandeiro, antigamente a gente tinha uma lata de goiabada que vendia, que era uma lata bem pesada antigamente. Então meu primeiro instrumento foi um pandeiro, com uma lata de goiabada, que é feito, que foi feito com uma lata de goiabada e umas tampinhas e quem construiu isso aí isso aí era eu e o Lu e meu irmão. Meu primeiro amiguinho na rua foi o Lu, nosso primeiro amiguinho. Então a gente juntava as latas e fazia um pandeiro com uma tampinha de tubaína, né, a gente pegava as tubaína no meio da quebrada, tinha aquelas tampinhas as pessoas jogavam fora, a gente pegava, amassava ela com arame, enfiava e fazia pandeiro. Meu primeiro instrumento foi um pandeiro, pandeiro de lata de goiabada e tampinha de tubaína.
(risos)
P/2 ‒ Eu tenho, na verdade, eu queria só retomar um pouco, porque você levou 400 pessoas pro fim da Kennedy, teve que aprender e ensinar em uma semana antes do show a seus irmãos tocarem, você tocar, conta um pouco mais dessa história, por favor, como foi esse show
R ‒ Olha, foi interessante porque a gente ensaiava na garagem, né, a gente tinha uma garagem, a rua era de terra ainda, rua de terra, e aí, é, a gente ensaiava na garagem e lógico, quando a gente saía pra tocar no festival as pessoas já sabiam as música, né, então na época não tinha internet, então a galera aprendia vendo a gente ensaiando ali, aprendia as letras então a gente, quando chegou no festival, né, a gente ganhou todos os festivais que a gente participou porque a galera já sabia a letra então o pessoal pensava que a gente era famoso assim tipo já tava no meio de na comunicação e não era que, a gente ensaiava ali naquele lugar, era o único lugar que tinha onde a pessoas podiam frequentar, então o ensaio vira um show, né, virava um show na garagem, a galera fazia churrasco, fazia festinha ali e aí a gente saía e já todo mundo sabia, então quando a gente subia no palco todo mundo cantava as letras e já cantava tudo o que a gente tava fazendo. A gente, naquela época a gente já cantava músicas independentes, algumas músicas era próprias, né, dos compositores da comunidade, eu compositor ia?, e a gente cantando no palco. Eu me lembro que a primeira vez, né, eu tremia, tremia tudo assim ó, perna, tremia tudo. A perna, tremia, enfim, o fio do cabelo subia pra cima e ficava aquela sensação boa né, você sente uma sensação de medo, mas não era um medo, era um medo gostoso, né, um medo, enfim, é isso, eu acho que é isso, né, a música faz a gente acessar uma coisa que, que é muito, ela é misterioso, pra mim a música sempre teve muito essa coisa do mistério assim, né, porque unia tanta gente, né, e a gente começava, eu saía de uma favela e aí a gente perceber que naquele momento da música as pessoas elas ficavam ali, tipo, todas conectadas, sentindo felicidade, sentindo amor, sentindo alegria, sentindo coisas, assim, impressionante. E aí, lógico, essa energia toda eu recebia e eu ficava ali tremendo, foi a primeira vez que eu subi no palco, num palco profissional, um palco profissional assim, a gente era um grupo de, 10 pessoas, né, o palco era desse tamanhozinho assim, mas pra a gente era um palcão grande. Pra agente… e o palco ficava pendurado, a galera passava por debaixo, entrava e o palco ficava pendurado assim. (risos). e tocava tipo 10 bandas na noite.
P/1 ‒ E você falou muito do Jardim ngela ser considerado o bairro mais violento do mundo, mas, assim, antes da música ou até durante, você via muito dessa violência lá?
R ‒ Olha, eu com 7 anos de idade já presenciei várias pessoas sendo mortas na minha frente. Várias pessoas. Dos 7 anos até meus 22 anos, 23 anos. Eu convivia com isso todo dia. Todo dia eu acordava tinha alguém morto na rua de casa. Quando eu ia tocar no lugar, quando saía do show, sempre a gente encontrava com alguma coisa e aconteceram várias coisas, assim, malucas, né. Da gente, teve uma época que a gente tocava num bar de um policial e aí sumiu uma arma no bar e esses cara botaram a culpa na gente. E aí, enfim, não o cara dono do bar, né, mas o bar é frequentado, antigamente, existia uns cara chamado “pé de pato”, os cara matavam por conta própria na favela, então a gente encontrou esses caras em um desses bar onde a gente tocava, né, frequentava esses espaços, então sumiu essa arma desse cara e esse cara botou a culpa na gente, então esses caras foram matar a gente de dia, todo mundo da banda. E a gente passou por várias, desde, né, esses caras que tentaram pegar a gente e enfim a gente tocava de graça, a gente tocava a troco de fazer música, né, a gente não ganhava nada e tanto que a gente, na volta, né, a gente vinha dentro de um caminhão de feira, que a gente não tinha carona, então, esses eram os botecos que a gente tocava que não era profissionalmente, ali era uma coisa. E aí me lembro até que meu pai falou “não, a gente tem que virar uma banda profissional, a gente tem que entrar em festival de música” foi aí que a gente começou a pensar de uma outra certa, não mudou nada, quando voltava de madrugada ou quando a gente tocava em algum lugar na favela que era palco também grande, sempre tinha essa coisa da violência muito grande. Então a gente, e presenciei isso até meus 25 anos de idade, né, meus 25 anos de idade, dos meus 7 anos até meus 25 anos de idade mais ou menos.
P/1 ‒ E o que que mudou depois dos 25?
R ‒ Olha, eu acho que evoluiu muito a favela, né. E Acho que a economia local cresceu, é, a questão cultural cresceu, né, as lideranças comunitárias começaram a surgir, né, liderança comunitária, associação, começaram a surgir organizações, o povo começou a se organizar também, né, ninguém queria ver violência porque queria, entendeu, então acontecia porque, por brutalidade mesmo, por falta, por ignorância, ignorância, eu acho que era uma ignorância que tinha ali, lógico que também se você pegar um monte de gente, botar num lugar pra viver sem estrutura nenhuma, sem emprego, sem o que comer, né, enfim, você pegar um monte de gente, enfiar no meio de um lugar onde tem uma desigualdade gigantesca, e você atravessava a ponte tinha tudo, que dizer, atravessava a ponte pro outro lado, ponte do socorro a gente fala, ? a gente chamava de extremo sul lá, não tinha nada lá não tinha nada, lá simplesmente era violência pura, o que tinha, a gente, pequenos grupos, que surgiu a gente ali, né, a gente tinha do outro lado lá, o Sérgio Vaz, que começou com a Coperifa e tinha outra galera, então a gente se comunicava assim nos eventos, né, mas era bem, enfim, era uma situação, assim, bem complicada. Começou a evoluir por conta dessa coisa dos coletivos, né, que a gente começar a conversar, a gente começar a bater papo, o crime também se organizou, tudo se organizou (risos). Né, então, não se mata ninguém sem se falar, então, o diálogo começou a ter mais, né. A conversa começou a surgir mais. Eu acho que também a economia local também ajudou muito, porque por exemplo, as pessoas que trabalhavam no Santo Amaro, trabalhavam no Centro, elas começaram a abrir tipo barraquinhas né pra vender, o pessoal montar barraquinha agora virou um mercado dentro da favela, então foi crescendo, foi vendendo , a quantidade de gente é muito grande, foi vendendo barato em quantidade grande, foi crescendo, a economia também ajudou muito, né, a gente tem uma base chamada, Base Militar Jardim Ranieri, que entrou um policial lá, que é Cabo Lora, que agora é Sargento que fez toda uma diferença também, um cara que ganhou o prêmio ? inteiro, faz o policiamento comunitário e que vai lá no estúdio gravar música, e que a gente, então, essas conexões, elas vão, elas vão mudando né, vai evoluindo, né.
P/2 ‒ como você se sentia crescendo, pelo menos até os 25 anos, no meio desse ambiente de violência pura como você falou?
R ‒ Olha, foi uma escola de vida pra mim impressionante, cara. Que eu ia pra escola e eu via os cara, os jovens, os caras armados dentro da sala de aula, então eu tinha que conviver com aquilo, e aí eu tinha que arrumar uma forma daquelas pessoas me respeitar e a música é um ponto pra mim, porque todos eles me respeitavam por conta da música, né, e também se me matasse quem ia tocar na favela pra eles? Ninguém, então ? respeito comigo e aí eu usava, eu eu tentava, eu me lembro que eu, tudo o que eu desenvolvia, é, se eu fazia, tocava um instrumento aí todo mundo admirava, então meu pai fala uma coisa que é muito interessante, “você com um violão na mão, nas costas, passa numa favela ou qualquer lugar no mundo você é amigo de todo mundo”. Então, eu mandava o meu cavaquinho, o meu violão nas costa e fazia amizade com todo mundo, então, eu tentava ser amigo de todo mundo, né. É, passar a cumprimentar todo mundo independente, é, não olhar com preconceito, olhar com, não olhar com preconceito, né, porque eu também sempre achei que a gente também acabou virando vítima também de um sistema que não funciona, né, e que claro, depois passando por tudo isso que eu passei, né, e ver meu filho hoje, minha filha, é, minha filha tem 15 anos, minha filha nunca viu ninguém sendo morta na frente dela, então pra mim isso, o resultado de tudo isso, o trabalho que eu fiz na minha vida, né, e que eu venho fazendo, era pra isso, né, que é, meus filhos não visse o que eu vi, a ignorância que eu vivenciei naquela época. Então, eu me considero privilegiado de ter nascido lá também, porque lá me ensinou muita coisa. Olha, eu perdi muito amigo naquela época, a gente perdeu muito amigo. Muitos jovens foram embora, se você pegar hoje, né, o Jardim São Luís, mas eu não sei mais a porcentagem, mas a maior porcentagem de jovens hoje enterrados no São Luís é de, foi de menor de idade na época, principalmente na época que eu vivi lá. Então a gente perdeu muito amigo por conta da violência, muito amigo, eu perdi vários. Então me considero um sobrevivente, né, e, enfim, sou respeitado na comunidade, respeitado onde eu vou, as pessoas me respeitam, me admiram, eu admiro as pessoas, eu amo as pessoas também, então tá tudo certo, sabe, então, eu aprendi muito com isso, eu aprendi muito vivendo naquele lugar. Lógico que eu tento para que meus filhos hoje, meus amigos, os filhos dos meus amigos, as pessoas que frequentam o espaço, o projeto que a gente tá lá, que eles não precisam passar por isso pra ser alguém, entendeu, pra ser melhor.
P/1 ‒ E quando você tava crescendo, assim, você começou já com a música, mas você teve algum outro trabalho, você fez alguma outra coisa?
R ‒ Eu fiz. Eu fiz vários trabalhos, eu fui pegador de bolinha, virei rebatedor de tênis, entrei em campeonato de tênis, entrei na Federação Paulista de Tênis, dei aula de tênis na favela, no meio do barro, depois fui office boy, fui pin boy, não sei se você sabe o que é pin boy. pin boy é uma profissão que não sei se existe mais, eu trabalhava no Clube Banespa e não tinha máquina de boliche, sabe boliche não tinha máquina, então eu era o cara que levantava os pinos e aí, tipo, limpava a pista e jogava a bola. E eu ficava lá com as perninha pendurada assim, os cara jogava assim, a gente tinha que levantar a perna pro pino não pegar na canela, então eu fui pin boy, eu fui office boy, eu fui manobrista, né, trabalhei na feira também, quando eu era pequeninho também cheguei a trabalhar na feira, na feira de fruta, né, na barraca de fruta.
P/1 ‒ Mas a música sempre foi em primeiro lugar?
R ‒ Mas a música pra mim sempre foi, eu nunca tive a música como hobby, né, sempre tive a música como um propósito de alguma mudança, de, da minha vida, eu, a música eu sou um ser musical, né, primeiramente um ser musical, depois um ser do mundo, mas primeiro eu me considero uma pessoa da música, né. Se você falar pra qualquer pessoa na favela, “ah o Claudinho, o Claudinho, o Claudinho músico”, né, então, quem me deu o título de músico foi a comunidade então, Eu gosto, minha primeira história mesmo é fazer música, eu fazia as outras coisas pra complementar música, então, todo o dinheiro que eu ganhava era pra comprar instrumento pra dar aula, eu comprava o computador pra montar um estúdio, então, tudo o que eu ganhava aqui eu fazia pra isso.
P/1 ‒ Mas e o tênis, você entrou na Federação, era uma coisa que você gostava muito? Esporte, música, como é que é?
R ‒ Olha, eu gostava muito de tênis, mas na época que eu comecei a jogar tênis, né, hoje você vai na favela o que mais você tem na rua lá onde eu moro é tenista e músico. E vira e mexe você passa lá você vê um moleque com a raquete nas costas ou vai dar aula ou vai não sei o que, mas na época que eu comecei a, no tênis, tênis era um esporte só pra rico, né, ainda continua sendo, né, pra quem tem muita grana porque o esporte é caro, você tem que pagar raquete é cara, quadra de tênis você não vai achar na quebrada, não tem na favela, você não vai achar quadra de tênis, então é um esporte caro. Então na época era muito mais ainda, era muito mais difícil, então por exemplo eu enfrentei algumas coisa assim na época, tipo, por exemplo, eu participava de campeonato de tênis eu era sempre o cabeça de chave que ninguém acreditava que eu ia ganhar e eu chegava na final, entendeu. Jogava umas coisas assim, e eu não tinha raquete, eu ganhei, a raquete que eu tinha eu ganhava, tava rachada, trincada, meus tênis era furado, era tudo uma situação que eu entrava, jogava tênis, mas numa situação muito difícil, né, então eu competia com cara, com menino jovem que já tinha tudo, que já tinha, tem, tinha aula e eu ficava batendo, eu treinada no paredão, eu ficava, não tinha professor de tênis, né. Eu batia oito horas de paredão, eu ficava fazendo paredão, eu ficava ali até a bolinha estourar, sabe. Então, o meu esporte, assim, eu jogo bola, eu jogo outros esportes, mas, basquete também jogo vôlei, mas meu esporte preferido é o tênis, né. Eu ainda jogo, de vez em quando eu ainda jogo.
P/1 ‒ Pra a gente passar da fase da infância, conta um pouquinho do seu amigo, seu primeiro amigo
R ‒ Ah, o meu primeiro amigo foi o Lu, né. A gente se comunicava através de uma grade, né, porque ele frequentava a rua, né, a rua e eu cheguei nessa rua aí que foi uma das ruas na época uma das ruas mais violentas do Jardim ngela, né, onde a gente mora ali tem 3 bases militar porque foi colocado ali mesmo porque ali era o bairro onde, porque o Jardim ngela, você tem o Jardim ngela, você tem os subbairros, então a gente mora no sub bairro chamado nakamura, nakamura por conta de era uma fazenda de um japonês, de uma família japonesa , eles for loteando e foram vendendo lá. Hoje é uma, enfim, só onde eu moro são 2.500 pessoas, em ? são 500 mil habitantes. Então é muita gente lá convivendo, então quando eu comecei a, queria frequentar a rua, esse meu amiguinho já frequentava, O Lu tem 42 anos de idade, eu tenho 40. Então a gente se comunicava através da grade, porque meu pai tinha um portão, meu pai ia trabalhar, ele não deixava a gente sair na rua porque a rua era perigosa, então ele começou a frequentar minha casa, então ele, pedia pra ele ficar em casa, pedia pra mãe dele, meu pai pedia pra mãe dele, então ele começou a frequentar lá, então a gente começou a criar, assim sabe, tipo, pirar assim, sonhar, ser músico, sonhar um dia ter uma banda, e a gente sonhava jogar tênis, ele já foi pegador de bolinha comigo e eu comecei a levar todos os moleque da rua pra ser pegador de bolinha, é, tipo, tanto que essa rua tem um monte de gente que joga por conta disso, porque eles foram tudo pegadores de bolinha. Então é, assim, é um amigo irmão que eu tenho né, o Lu é um irmão que eu tenho, tocou comigo 10 anos na banda, criou a banda comigo Poesia Samba Soul em 1989, a gente começou junto, nesse show ele tava junto comigo todas essas histórias todas ele tava junto comigo. Tocou com a gente 10 anos, não, tocou com a gente 15 anos, né, na banda. E aí ele foi pai muito cedo, então ele teve que parar com a música porque teve que trabalhar pra sustentar a família. E isso foi um baque na vida dele muito pesado, porque, é, a gente, por mais que a gente mora na mesma rua, né, eu comecei a seguir um caminho e ele começou a seguir outro, ele começou, ele virou office boy, não office boy, não, motoboy, e aí ele quase não parava lá e eu comecei a dedicar à música sempre e ele parou de se dedicar à música. Quando foi no ano de 2009 resolvi criar um projeto pra ele tocar. Chamei ele, falei vamos montar uma roda de samba aqui na quebrada a gente vai celebrar o Jardim ngela. Celebrar o Jardim ngela, a gente vai celebrar porque virou uma referência né, a gente já abriu um instituto, que virou uma referência, e ele falou “será, cara? eu vou voltar a tocar? não sei, pra mim é difícil e tal” e aí em 2009 eu convidei ele, insisti pra ele, hoje ele é uma liderança comunitária também, o projeto chamado Samba na 2, uma iniciativa do instituto Favela da Paz, uma das iniciativas, que a gente todo segundo domingo do mês a gente faz uma roda de samba pra comemorar o Jardim ngela, pra comemorar a vida, pra comemorar a amizade, e aí, a unidade monta as barraquinhas, então tem comida típica, tem o Yakisamba, né, que é o yakisoba, virou o yakisamba. Tem artesanato, a gente junta ali quase 500, 600 pessoas todo samba que a gente faz. Teve um samba que deu 2000 pessoas porque a gente gravou o DVD de uma senhora de 70 anos que canta barbaridade, então acabou virando palco, abre espaço para cantoras de samba, principalmente mulheres e, enfim, e ele toca esse projeto, hoje a gente se aproximou mais e de novo, né, por conta desse projeto, que é o projeto agora que foi contemplado pelo VAI pela primeira vez. É isso.
P/1 ‒ Que ótimo. E aí em 2009 você já era casado?
R ‒ 2009 eu já era casado. Eu casei, eu casei em 2000, 2000 eu casei. Daí tive, eu fiquei, vivi até os 2004 mais ou menos e tive dois filhos com a primeira mulher, que é a Sabrina e o Felipe. E depois eu conheci a Ellen, em 2004, foi minha aluna também 2005 mais ou menos foi minha aluna e aí a gente, enfim, ela tá comigo até hoje, tem 15 anos, mais ou menos uns 15 anos que ela tá comigo e a gente tem dois filhos, essa minha filha mais nova também conviveu com a gente, ela que criou a menina, porque a menina que ficou comigo e o menino ficou com a minha ex-mulher, que também frequenta minha casa, que mora na rua de cima, então aqui tá todo mundo em casa. E a gente, é, e aí eu e a Ellen a gente construiu tudo também uma história de vida junto, porque, enfim, quando ela me conheceu eu tinha acabado de separar, eu tava vivendo dentro do estúdio improvisado, dormia em cima de umas espumas no quintal da minha casa, meu pai cedeu o espaço lá pra a gente fazer o estúdio então eu morava dentro de um estúdio, eu não saía do estúdio, eu arrumei uma forma de gravar, um vídeo cassete, uma mesinha, então eu cortava a fita, gravava um instrumento, depois grava outro. E ela ficava comigo ali, ela foi minha aluna no início de música e a gente começou conviver nessa época, né. E ela entrou na banda nesse mesmo ano, nesse mesmo ano e tá com a gente até hoje. Enfim, é um companheira aí, que me apoiou muito nessa caminhada e me acompanha até hoje.
P/1 ‒ Mas conta, assim, como que vocês se apaixonaram, como que vocês começaram a ficar juntos?
Olha, ela já era fã da banda, né. Falo isso pra ela, mas ela fica “ah…” mas ela já era fã da banda. Ela foi num show da banda e aí, muito engraçado porque ela foi no show e ela chegou, ela, ela era, ouviu, ela cantava, antes dela cantar com a gente, ela cantava nos grupos de samba na comunidade e esses grupos falava muito da gente, queria muito seguir o que a gente fazia, então a gente era muito já falado, né. Porque a banda que começou em 89, a gente ficou uma referência na comunidade, para as outras bandas, pros outros grupos. Então ela tocou num grupo que a gente era referência desse grupo, tava vendo a gente, tava doida pra encontrar a gente. Então ela foi num show da gente no Jardim ngela e a gente tocou no palco e ela tava lá e chegou, olhou pra, olhou pra pra banda, olhou pra mim, olhei pra ela e eu falei pronto, foi amor à primeira vista. Quando eu olhei pra ela eu falei nossa, quem é essa menina, né, que é muito bonita e tal. Ela olhou pra mim, a gente se, né ela foi até a beira do palco, falou assim “ó, eu quero um CD”, aí no dia eu também não tinha, eu tinha dado o CD tudo, acabou e ela ficou brava comigo, me xingou depois, saiu, e aí ela conseguiu CD com uma outra pessoa, viajou pra Minas e falou que um dia quando voltasse ia ser, eu ia ser o esposo dela, e com certeza, ela fez isso, ela voltou, já, foi muito, foi ser minha aluna, já sabia, foi ser minha aluna de música e a gente se reencontrou e a gente começou a viver junto, ela morou comigo muito tempo dentro do estúdio, a gente morou no estúdio, né, a gente dormia em cima das espumas e a gente gravava as bandas, cobrava 5 reais na época para poder comprar equipamento, quem tinha microfone dava o microfone e gravava. Então a gente gravava as bandas região com um computador 486, que foi um dos primeiros aí que surgiu, que demorava não sei quanto tempo pra poder fazer um bounce de uma música, tipo uns 10 minutos pra fazer um bounce de uma música de 1 minuto. E a gente ficava lá no estúdio lá, sabe, dormiu durante um ano, morou dentro do estúdio e ela me apoiando sempre, ela perdeu a mãe muito cedo, então ela foi morar comigo. Enfim, ela era muito nova, eu também era muito novo e a gente começou a viver uma história de apoio mesmo e de confiar, de… e aí, é muito interessante que depois disso tudo eu, enfim, 2009 eu viajei pra Tamera e já tinha filhos, né, mas 2009 viajei pra uma organização chamada Tamera e ela tava grávida do meu primeiro filho, né, e aí eu, eu tenho uma energia ? no pesquisar né, de o que que é aquele lugar, o que eu vou fazer lá, eu entendo como um chamado,né, eu vou, e eu gosto da surpresa. Então é a mesma coisa aqui, eu vim, sem nem mesmo saber, entender muito bem o que eu vim fazer aqui, eu vim dar entrevista, eu falei eu vou lá, entendeu, porque eu gosto de conhecer pessoas, então em 2009 eu recebi um comunicado pra ir pra Portugal e eu fui pra uma comunidade e essa comunidade, enfim, depois que eu tava um tempo lá, não entendia inglês, mas depois falou sobre o amor livre, eu tava lá, eu olhei pro lado assim, eu falei “caramba, como que eu vou explicar isso pra mim mulher, né, pra minha esposa agora?” Eu liguei em casa ela tava grávida e tudo, então, é que a gente criou uma relação muito de transparência, de confiança, então, quando eu falei pra ela eu acho que ela ficou um pouquinho nervosa, né, mas depois acabou entendendo e a gente acabou muito evoluindo nesse sentido, né. A gente tem uma vida muito, muito louca, assim. Tem uma vida de, a gente acabou virando um casal vinte de exemplo, o casal vinte, esa história de casal vinte, mas nem sei o que que é casal vinte, mas o pessoal que ficou falando “ah o casalzinho vinte,” a gente chega lá e a gente acabou virando uma referência, né, porque a gente acabou que, a gente acabou estudando sobre o amor junto, nessa comunidade, como viver essa relação de transparência e confiança, a gente acabou virando uma referência pra outros casais e a gente faz encontro também, então a gente conversa sobre a questão do amor como que a gente respeita o outro ser humano, como que a gente, enfim. É muito difícil você ver eu e a minha mulher discutir por causa de ciúme por exemplo, né, então a gente discute mais pelos projetos que a gente vai desenvolver do que, porque a gente acabou virando uma relação, porque você imagina, né, o músico, ela musicista também, e a gente viaja, às vezes fica longe, viaja três meses, fica fora vai, viaja à noite, tem os filhos e tal. Se você não tiver uma base de amor, se não tiver uma base de confiança muito forte, você não vive junto, não tem como viver junto. Então essa relação com ela foi muito forte, pra mim foi muito forte. Encontrei ela, foi muito fácil depois que ela, ela, se tem uma pessoa que te apoia, né, eu tenho meus pais que me apoiam desde pequeno, mas quando você tem uma pessoa que vive também do teu lado, que te apoia e que te entende, né, é, você desmancha, você vai embora. E por conta disso aí, que foi pra mais de 13 países, um monte de lugar, 20 cidades, já rodamos 20 cidades do mundo inteiro. Do Oiapoque ao Chuí, né, a gente fala na música, do Oiapoque ao Chuí. (risos).
P/1 ‒ Qual que foi o primeiro lugar que você viajou?
R ‒ Olha, o primeiro lugar foi Tamera, essa organização. Que foi a primeira vez que eu peguei um avião. Viajei 9 horas de avião. Saí daqui, né, eu tenho um amigo, a gente tem alguns anjos que aparecem na nossa vida, né. Tem um anjo que apareceu na minha que chama Marcelo Cavalcante. É um maluco também, tudo maluco. Esse cara, ele era de um programa chamado Artemisia. Ele foi um dos diretores da Artemisia, eu entrei lá em 2007, eu conheci ele, ele falou “Cláudio, olha, você quer viajar?” Em 2009 ele ligou pra mim, ele é padrinho do meu filho, né. Ele falou “Você quer viajar pra Europa? Tem um lugar pra você ir lá chamado Tamera”, eu falei eu vou, ele falou “você tem certeza?’ eu falei não, eu vou cara. Ele falou “você tem certeza vai mudar sua vida, cara?” Eu falei “Meu, pior do que eu já passei aqui na favela, né, que vivenciei, não deve ser pior, deve ser bom demais, eu vou lá”. E aí ele pagou a passagem, eu fui, cara. E aí eu saí daqui, peguei um avião, nunca tinha pegado um avião daqui pro Rio de Janeiro, peguei um avião daqui pra Portugal, nunca tinha viajado de avião, entrei num avião, aí cheguei, eu fazia escala em Espanha, né, em Madri. E aí, só que quando chegou em Madri meu vôo foi trocado pro outro dia e eu não entendia nada de espanhol. Eu tava num aeroporto maior que o Jardim ngela, que você tem que pegar um trem dentro pra poder sair pro outro lugar, eu tinha que ir pro hotel, e aí toda essa coisa que eu aprendi na favela que é legal, sabe. O sentir, comunicar, e aí eu fui ali caçando alguém que falava português, né, achei um casal, uma, duas mulheres que vivem juntas, são parceiras, e ela são brasileiras, né, e elas tavam lá e moravam em Portugal, elas tavam de, tavam indo pra lá, eu cheguei nelas e falei assim “olha, eu sou lá do Jardim ngela, lá de São Paulo, tô perdido, eu não tô entendendo nada”. E ela falou “não, vem com a gente”, não sei o que. Fiquei com elas e enfim. Aí no outro dia peguei o avião, olha, é uma história maluca, vou contar porque é uma história bem maluca.
P/1 ‒ Conta, conta
R ‒ É bem engraçada também. E aí eu, peguei, peguei o avião com elas, depois eu perdi a carona, né, porque eu ia pra sul do Portugal e é quatro horas de trem. Então, de Lisboa até esse lugar onde eu ia, essa comunidade, essa ecovila, era quatro horas de viagem de trem e eu perdi a carona, tinha uma carona que ia me levar de carro. E aí quando eu cheguei em Lisboa, ao invés delas, de eu ir direto pra lá, porque eu não sabia nada do endereço nada, elas me levou pra casa delas em Evora que é sentido contrário. E aí eu fui pra casa delas, elas falaram “Não, você dorme lá, passa um final de semana com a gente”. Aí virei amigo, né. “Não passa lá, a gente vai ter um lugar vazio que a gente vai fazer música”. Eu falei, “ah, vamo lá então”. Já tinha até esquecido da comunidade lá, e fui parar na casa delas e tal e aí, o que acontece: minha mala não chegou. Minha mala foi extraviada e aí minha roupa, eu não botei roupa na mochila, eu botei tudo a roupa lá na mala e eu não tinha tanto dinheiro, normalmente eu vou pros lugar sem dinheiro, eu prefiro ir sem dinheiro, porque eu ? é essa coisa de você conhecer a pessoas, eu prefiro conhecer as pessoas e eu vou conseguindo aqui uma coisa, uma coisa ali. E eu tinha, tinha tinha cem euros no bolso e aí eu fui pra casa delas e minha mala não chegava, por isso que eu fiquei na casa delas dois dias, porque minha mala ia chegar. E não chegava mala, mala, até hoje não apareceu. E aí elas falou “Claudinho a gente tem umas roupa aqui né, e uma mala”, e a mala rosa e umas roupas de mulher, porque elas elas não tinha, elas eram parceira, viviam junto, mas não tinham roupa masculina. E eu tinha cem euros e eu não podia gastar porque eu tinha que pegar trem pra chegar lá no outro lado. E elas fizeram uma mala com a roupa rosa e aí eu usei uma calça apertadinha que elas tinha lá, usei uma camiseta delas apertada que elas tinha lá e foi, o sapato eu usei o mesmo, né, a meia era rosa mas enfiei por baixo do coiso e fui. E aí eu cheguei dez e um pra pegar o metrô, o metrô já tinha passado dez horas. Eu não sabia dessa história, né, que Europa sempre dez hora, não tem, dez hora é dez hora, deu dez e um o trem não tá mais lá. E a gente acostumado aqui, né, tipo você chega no lugar, dois minuto, o cara te espera. Por dois minuto. O trem não tava. Eu peguei ? Peguei um táxi, eu não entendia nada que o cara falava também. O cara me levou quatro, cem euros eu dei pro cara, dei cem euros, aí, fui, cheguei nesse lugar, nessa comunidade, nessa vila chamada Funcheira. Cheguei no Funcheira não tinha ninguém. Aí tinha que viajar mais meia hora pra chegar nesse lugar. Aí eu tava com um telefone que eu fui apertar lá o telefone não funcionava, aí tinha um tiozinho com palito na boca, um celular desse tamanho, fui falar com o tiozinho, eu não entendia nada que o tiozinho falava. Eu falei esse pessoal, esse taxista me deixou em outro país. O tiozinho ele era de lá, mas ele era do interior, então ele falava um português que eu não entendi e ele ligou pra Tamera, ninguém falava português em Tamera, eu peguei o telefone dele, falei, deixa eu falar lá, falei “eu tô aqui, sou do Brasil, sou da favela lá do Jardim ngela, tô aqui, tô aqui perdido”. Aí o pessoal me levou, quando eu cheguei na comunidade, era uma comunidade, uma ecovila. Você imagina, eu saí de um selva de pedra, fui pra uma selva de verdade. Em Tamera, no sul de portugal. Cheguei lá, tive que dormir com mais de, sei lá, quarenta jovens, que não falava, ninguém falava português. Eu cheguei de noite, né, enfiei a mala rosa debaixo do coiso aí sentei, deitei no meio assim, uma pessoa, duas pessoas dormiam do meu lado.
P/1 - Você gosta de viajar?
R - Olha, eu gosto de viajar, mas também sinto muita falta daqui. Eu sinto muita falta do lugar onde eu vivo. Então, eu vou pra Suíça mas quero voltar correndo pra cá. Eu vou pra Colômbia, pra Palestina, mas eu quero voltar correndo pra cá. Porque a gente entende que a viagem hoje é mais pra uma troca de relação, de aprendizado de vida. De como eu posso levar o que aprendi pra essas pessoas e posso trazer o que as outras pessoas sabem pra cá. Então eu percebi que é isso, eu viajo pra isso. Eu não vou lá só pra fazer música, entendeu? A música é uma ferramenta de comunicação, uma troca, então a gente tem criado família no mundo inteiro. Eu tenho o Instituto, então a gente não tem as pessoas que apoiam o Instituto como apoiadores, a gente tem como família. Elas são família, são parte disso. São parte do que a gente desenvolve e a gente também é parte do que eles desenvolvem lá. Acabou que virou família, é um propósito de vida, a gente tá trabalhando pela paz, trabalhando para elevar o nível de consciência e ser um ser humano melhor. Então, é isso.
P/2 - Sobre Tamera, como foi ficar dois meses lá? Não só longe do Jardim ngela, mas, principalmente longe da sua esposa que tava grávida.
R - Cara, foi uma experiência muito louca. Eu tive uma das maiores experiências da minha vida, porque como eu falei, é uma selva de verdade. E aí Tamera é um mundo dentro do outro. É um planeta dentro do planeta terra (risos). Porque eles vivenciam coisas lá que o mundo ainda tá processando ainda. Como é que eu ia voltar pra quebrada e falar ‘olha, eu estive em um lugar de amor livre’, entendeu? Você imagina. O Brasil ainda tem essa coisa cristã, essa coisa muito enraizada, a coisa das religiões. E aí como eu ia chegar aqui em e falar “ah, eu tô em um lugar que vive amor livre. E aí tem uma coisa muito louca, porque Tamera fala que enquanto existir guerra no amor vai existir guerra no mundo. Eu comecei a processar isso dentro de mim também, eles falam sobre amor e sexualidade livre. Eu vivencio hoje a história do amor livre com minha esposa, porque eu converso com ela de tudo. Eu falo de tudo. Falo das minhas sensações, dos meus sentimentos, de tudo que eu penso. Quando eu vejo uma mulher bonita eu falo pra ela. Eu não vou falar pra um amigo, eu vou falar pra ela, porque ela que precisa ouvir isso. Ela faz a mesma coisa. Então a gente troca, vê o belo de uma forma diferente. De uma forma real. Eu vejo uma pessoa bela e é bela, tá tudo certo. Não tem problema nenhum em ver isso. A gente começou a conviver dessa forma porque a gente começou a ter aula lá dentro. A banda foi depois de dois mil e dez, e lógico, no início teve uma certa resistência, mas depois a gente começou a perceber o quanto é bonito isso. Lógico, Tamera vive a relação de sexualidade livre muito forte também porque eles tem uma comunidade e a comunidade apoia. E isso é uma forma muito bonita do jeito que eles vivem lá. Porque tem muita gente que vai lá achando que é oba-oba, e chega lá e não é nada disso. É um nível de consciência, uma elevação de nível de consciência muita ferrada. Então eu comecei a aprender muito com isso também, isso foi um tema que, (VERIFICAR) pra mim, os outros temas foram mais fáceis, esse tema pra mim foi um pouco mais difícil. Porque eu falava “meu, como vou chegar na favela e falar que tava em um lugar que vive amor livre”. Como você vai (pausa), tipo, como eu vou falar isso lá, entendeu. Não foi uma tarefa tão fácil. E eu também fui aprendendo muita coisa lá, e fui fa(pausa), fui também, entende, a Helen foi depois, minha esposa, a banda foi e a gente começou a viver tudo com isso. Mas Tamera, viver esses dois meses lá, foi muito louco, porque você imagina, lá é escuro de noite, não tinha iluminação. Tinha a lua e aquele céu lindo. Então, às vezes eu andava a noite olhando se saia alguém dos matos, alguém armado, porque eu vivenciei muito essa história. Teve até uma brincadeira que um pessoal fez comigo lá, que eu cheguei e tinha um cara no chão, assim, de cara pro chão. Eu falei “caraca, mano, tem alguém morto aqui” e eu entrei em pânico já, peguei o cara e comecei a arrastar pra algum lugar pra saber se tava morto, já enfiei a mão aqui (gesto, VERIFICAR). Aí o cara olhou pra mim e faz assim, “AH!”. Tomei um susto, pra mim (pausa), aí depois acabou virando um fórum isso aí. Porque na realidade, a gente começou (pausa), é uma troca, eles também nunca tiveram contato com isso. Então, falar (pausa), eu acho que se for falar com o pessoal de Tamera eles são muito gratos porque a gente trouxe uma outra visão, de uma outra forma. O calor humano, a gente é muito caloroso. A gente abraça. Primeira vez eu lembro que fui abraçar um cara lá e ele fez assim pra mim (gesto), eu falei “vem abraçar, cara, que não vem abraçar não”, e eu abraçava e ele ficava assim (gesto), porque cultura alemã, uma questão diferenciada. Foi uma troca assim. Comecei a conviver com outras pessoas, tem uma coisa que eles fazem lá, que é uma ferramenta chamada Fórum. Eles fazem um encontro, uma roda, que as pessoas entram na roda e expressam o que estão sentindo. Então a comunidade apoia tudo aquilo ali, que é lindo demais. Um bebê quando nasce, eles escolhem (pausa), porque nasce na comunidade parto natural e todo mundo vai assistir o parto. Cantar a noite toda pra mulher. Cara, é lindo. Tamera, eu falei, é um lugar lindo. Um planeta dentro de outro planeta. Então pra mim, isso me ajudou muito a evoluir. Eu evolui muito, conheci muita gente de outras comunidades. A gente foi pra ______, que é a comunidade mais antiga da Escócia, lá em (Abid?). Depois a gente foi pra Suíça também, conhecemos a ______. Todo ano a gente tava lá com os Maias, conheceu os Maias, os Lakotas, participou de encontros espirituais, de música, de conversas, rodas de homens, rodas de mulheres. Participou de coisa no mundo inteiro. Acho que é essa coisa de tá aberto mesmo para as possibilidades, quando me chamam eu vou. Se me chamar pra ir na sua casa eu vou, entendeu? Acho que é isso. Pra aprender, a gente tá aí aberto pra aprender.
P/2 - Ah, incrível. Eu queria voltar agora um pouquinho no tempo, uns cinco, seis anos, e que você contasse um pouco mais sobre esse primeiro ano morando com sua mulher num estúdio. Que história marcante você lembra desse período que você pode contar pra gente?
R - Cara, eu me lembro que a gente desmaiava de tanto que trabalhava dentro do estúdio. Porque a gente não comia, não parava pra comer. Porque era tanta banda que ia lá e queria oportunidade. Eu me lembro que uma vez eu desmaiei e acordei com ela me arrastando. E teve uma vez que ela desmaiou, eu acor(pausa), porque a gente trabalhava horas e horas na frente do computador. O computador tinha acabado de chegar e a gente gravava aquele monte de banda. Mas você sabe que foi um dos melhores momentos da minha vida? Eu me lembro até hoje, a gente tinha uma televisãozinha preto e branco, que assistia Silvio Santos. Botava a televisão lá, e quando acabava de gravar todo mundo a gente ia lá pra aquele colchãozinho de espuma, aquela (Sonex?), né?, tipo caixa de ovo. A gente esticava, deitava lá e “e aí, vamos assistir o Silvio Santos”, comprava um paõzinho e sentava lá. E a gente tinha gravado o dia inteiro, feito música. Então era bom fazer música, era bom dar oportunidade. E a noite a gente curtia, assistia um Silvio Santos, né? Ficava ali. Namorava. Enfim, eu me lembro que uma vez eu fui sair pra pegar um ônibus, e eu fiquei tanto nessa vida louca de tá dentro de um estúdio durante um ano e pouco, quase dois anos. E ainda continuei depois, mas quase durante um ano e pouco, dois anos a gente foi pegar um ônibus e eu não sabia se pegava a porta da frente ou a porta de trás, cara. Porque eu vivi ali aquele momento, e eu me lembro até hoje que foi um dos melhores momentos da minha vida. Que eu passei com ela. Melhor ainda do que ter ido pra Suíça, pra esses lugar tudo chique aí. Porque era vida (pausa), era uma coisa simples e tão (pausa), né?, a gente dava tanta oportunidade as pessoas. Lógico, a gente faz isso hoje, mas de uma forma muito maior, é muito mais gente, tem muito mais pessoas, depois que a gente abriu o instituto, que é o Instituto Favela da Paz, a gente começou a fazer isso de uma forma muito grandiosa, também bonita, atinge muito mais pessoas, vem gente do mundo inteiro pra esse lugar lá, ficar com a gente. Mas é aquela coisa simples, de você viver o simples. O simples é muito bom, cara. Viver o simples é muito bom.
P/1 - E, enfim, pensando no Jardim ngela agora e o nome do seu instituto, o que significa pra você viver em paz?
R - Olha, viver (pausa), Eu acho que viver em paz pra mim é você viver tudo intensamente. Alegria, tristeza, tudo. Tudo faz parte do seu corpo, da sua mente, do seu espírito, de tudo. Então viver intensamente pra mim é importante. Por isso que a gente esse nome favela da paz. Porque a favela ela borbulha de coisas, de informação. O tempo inteiro. É gente que (pausa), hoje acordei de manhã e tinha trinta pessoas lá em casa, numa mesa fazendo (VGA?), o projeto de comida vegetariana que a Helen desenvolveu. Tinha trinta pessoas lá. Embaixo, no estúdio, tinha um pessoal da Índia que tinha não sei o quê. Então, eu acho que viver isso, viver em comunidade, viver com pessoas, conhecer gente, entendeu?, é você se permitir a chorar, a dar risada, a aprender, se permitir também, às vezes, julgar outra pessoa e dizer “puxa, acho que tô passando dos nível”. Acho que é viver tudo intensamente. Viver em paz, eu acho que, enfim, eu não me veria vivendo em paz meditando. Porque eu não sou muito dessa pegada de meditar e ficar “aun”. Eu respeito, acho muito louco essa conexão, mas meditar pra mim é você viver num bom _____, entendeu? Com as pessoas do lado, aprendendo um com o outro, dando oportunidade pro outro e você também tendo oportunidade. De falar, de aprender, de, sabe, amar, sei lá. Sentir coisas. Acho que o ser humano precisa ser, (pausa), quando ele para de sentir ele não tá vivendo, ele tá vegetando. Então você precisa sentir pra viver. Você precisa tá sentindo todo dia uma coisa, né?, diferente. Se permitir para o novo. Eu sou uma pessoa muito intuitiva, tá?, eu praticamente acredito mais na intuição que na razão. Se eu ver uma coisa, a pessoa falar “isso aqui não sei e tal” e minha intuição disser, (pausa), eu acredito muito mais. Porque eu acesso muito mais esse mundo da música, da arte, nesse nível. Eu gosto de acessar esse mundo do invisível, do oculto. Eu adoro o oculto. Adoro o invisível (risos). Eu acho que as coisas estão ali, sabe? Elas não estão muito aqui na matéria. Então eu acesso muito o invisível, o oculto, eu sempre tô ali na intuição, né?. Tudo que a gente desenvolveu até hoje e que foi desenvolvendo, intuitivamente eu fui. A banda acabou virando uma banda intuitiva também. Então, por exemplo, eu quando fui fazer um show, estive na Palestina, e embaixo do palco eu mandei rasgar o repertório, os meninos falou “(daora?), vamos rasgar”. Então rasgamos o repertório e fizemos outro show. E aí deu tudo certo. A conexão com as pessoas foi muito boa. Então eu acredito muito na intuição. Eu sou uma pessoa muito intuitiva. Então, intuição pra mim é sentir e estar vivo. Paz pra mim é isso, é você se conectar com seu sagrado, com o que vim fazer aqui, com minha alma, com o que eu tô fazendo aqui, sabe? O que eu vim fazer no mundo? Seguir o propósito de vida, né?, hoje as empresas estão botando propósito de vida, tirando missão e pondo propósito de vida (risos). Se tivesse botando propósito de vida lá atrás o mundo tava melhor. Mas propósito de vida, pra mim, quando você segue um propósito de vida você já tá vivendo em paz contigo mesmo. Independente dos desafios.
P/1 - O que sua intuição diz que é seu propósito de vida hoje?
R - Olha, meu propósito de vida hoje, eu sinto que tô no caminho certo. Então, tem algumas coisas que eu poderia falar daqui uns cinco anos, tem coisas que eu poderia falar daqui dez anos, mas daqui vinte anos talvez não, só sentir. Tem coisas que eu sinto. Eu sinto, né, que viver em comunidade é o futuro. Pra mim, viver em comunidades, com pessoas, é o futuro. Apoio mútuo, confiança, tudo isso pra mim é o futuro. Minha intuição diz isso. Então tudo que eu desenvolvo, ou tudo que eu faço, eu sempre incluo os outros. Eu nunca incluo a mim mesmo só. Lógico, eu sempre tô, mas se eu faço uma coisa que só serve pra mim então ela não serve. Eu sempre penso de que forma eu posso compartilhar o que eu tô desenvolvendo com o outro.
P/1 - Mas de que forma você acha que passa isso pra sua família? Por exemplo, pro seu filho?
R - Sim, meu filho, ele já nasceu e eu falo que ele nasceu com um chip diferente do meu, né?, que ele é mais evoluído que eu. E ele nasceu num mundo de oportunidades que eu não tinha. Então, ele é um menino que é o seguinte: se ele for ali no bar, e comprar cinco pirulitos e tiver cinco pessoas aqui dentro, seis com ele, ele dá os cinco pirulitos pra todo mundo. Ele faz isso direto, ele vai lá, dá o pirulito pra todo mundo, fica sem. Só que ele não vai ficar sem, porque alguém que ele deu pirulito vai comprar mais dois pirulitos pra ele. E ele tem essa sensação, ele já é intuitivo. Muito intuitivo. Então, ele chega num lugar e já sabe compartilhar. Já sabe. Porque ele vive num ambiente que as pessoas compartilham. Ele vive num ambiente onde hoje tinha trinta pessoas lá e cada um levou uma feirinha, uma coisinha, e a gente sentou e fez comida juntos. Almoçamos juntos. Cada um levou um pouquinho. Então, ele já vive nesse ambiente. Pra ele tá tudo certo. Pra ele, acho, eu acredito que ele vai fazer muito além, vai muito além do que eu desenvolvi na minha vida. Porque ele tem muito mais capacidade do que eu. E que eu sou só uma ponte, e não só pra ele, mas pras crianças que estão na comunidade, ou pro mundo, eu sou só uma ponte. A gente tá vivendo num mundo hoje onde as pessoas tão pensando em querer logo o resultado, pra ser feliz e tal. Ou resultado pra melhorar o mundo, melhorar a economia, melhor não sei o que, tal. Eu acredito que não sei se vou ver isso, entendeu?, mas eu tô vivendo isso intensamente pra que as pessoas possam viver isso, pra que meu filho possa viver isso, pra que o amiguinho dele possa viver isso, pra que o mundo possa viver isso. Então eu já me sinto feliz, já me sinto realizado. Em ser uma ponte pra isso.
P/2 - Eu queria falar um pouco no tempo de novo, assim, porque a gente já falou muito sobre comunidade, falou muito sobre o Jardim ngela, falou também como fez seu primeiro instrumento e também como conheceu o Lu. Mas algo que a gente não conversou, foi em que momento você começou a desbravar, porque antes você só ficava em casa, mas em que momento você começou a sair com o Lu e seu irmão pra pegar as latinhas e fazer esse instrumento, pra conhecer a cidade e o bairro?
R - Olha, acho que foi quando eu senti a vontade de trabalhar de pegador de bolinha com meu pai. Eu senti vontade de ir no clube. Meu pai trabalha no clube, de salva-vidas, tem quarenta e cinco anos. Ele é aposentado e continua trabalhando de salva-vidas. E quando eu tinha noves anos meu pai saia, né?, pra trabalhar e eu ficava vendo. Eu falava “nossa, quero ir trabalhar com meu pai, não sei o quê”. Meu pai tinha um fusca, na época um 147 e depois ele teve um fusca. Eu tinha vontade de andar no carro com ele, de ir lá no clube, conhecer o clube. Aí quando ele me levou uma vez, numa festa de fim de ano, que a gente podia tá lá e recebia aqueles brinquedos, aqueles brinquedos novinhos, que eu falava “caramba, a gente tá ganhando brinquedo”. Aí me deu uma curiosidade de ver como as pessoas gostavam dele, entendeu?, meu pai sempre foi o boa praça. Ele chega num lugar, botava o violão na mão, tocava, e aquele monte de gente, né?, ele trabalhava de salva vidas com o violão tocando. Quando morria alguém ele (pausa), morria não, né?, alguém se afogava, porque nunca morreu ninguém com ele, mas alguém se afogava ele soltava o violão e “tchubumt”, pegava a pessoa e depois voltava. E toca o violão. E a galera juntava. Eu ficava vendo aquilo, então acho que foi aí, sabe?, quando eu comecei a perceber que eu podia ser igual a ele, que eu podia ser igual meu pai. Ai eu falei “quando eu ____, vou ser igual meu pai”. Começou a despertar essa coisa. Aí o Lu foi meu primeiro amigo, e com o Lu eu já comecei a montar esse grupo, ai meu pai, né, eu me lembro que a gente tocou, na primeira vez que a gente fez uma rodinha de samba, em cima da casa do Lu. A rua era de terra, de barro ainda. A gente tava ali na laje da casa dele, e meu pai olhou, do outro lado, e falou assim “eu vou ajudar esses meninos, vou botar esses meninos pra fazer show”. E aíb foi que meu pai, né, foi quando a gente começou a sair mesmo assim. E a gente fazia muito show, cara, e às vezes eu não tinha nem tempo de pensar. Eu só pensava em música. Ou trabalhava. E quarta, quinta, sexta, sábado e domingo a gente tocava. A gente tocava terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo. Tocava direto. Então, eu ia trabalhar de dia e a noite tocava. Chegava, às vezes, de madrugada e ia direto pro trabalho. Maior feliz assim. E é isso. Acho que foi quando meu pai teve essa história de me levar pro clube, ter contato com outras pessoas também, porque era um clube rico na época. Hoje, não é tanto, tá um pouco mais misturado. Mas na época era só quem era sócio. Tipo, gente que tinha muita grana. Rivelino, Casa Grande, os caras frequentavam lá. O Pelé foi lá uma vez fazer comercial. Era um lugar bem (pausa), né? E aí eu ia pra esse lugar, e olha uma coisa interessante, eu via arma lá também. Porque os seguranças andavam armados. E eu ia na favela e via arma também, e não entendia porque tá aqui. E toda essa história foi porque eu queria que meus amiguinhos daqui fossem pra lá, os do Indiano, e meus amiguinhos aqui da favela fossem pra lá. Então, eu sempre quis quebrar esse muro, sabe?, do rico, do pobre, sabe essas coisas?, quem é daqui não pode ir pra lá, quem é de lá não pode tá aqui. Então, já que eu não podia levar os meninos do clube pra lá, eu botei os molequinhos tudo pra pegar bolinha lá. Eu pedia pro meu pai, falava “pai, pede pra eles trazer os meninos. Tá faltando gente pra pegar bolinha”, e aí meu pai conversava com o Seu Agenor na época, que era o coordenador lá. A gente levou e quando fui ver tinha uns dez moleques pegando bolinha, tudo lá do Jardim ngela. E foi isso, né?
P/1 - E você fazia amizade com os meninos que frequentavam o clube também?
R - Também. Porque eu jogava com eles também, né? Teve uma época que eu virei rebatedor, eles não tinham com quem jogar, chegavam lá e não tinha parceiro e eu jogava com eles. E aí eu fazia amizade com eles também. E eu sempre tive amigos. Tipo, a gente tem um termo, que eles falam, “da ponte pra lá, da ponte pra cá”, né?, pra mim essa coisa da ponte só serve pra (pausa), a ponte serve pra você atravessar ela, né? Mas eles falam o povo de lá é o povo de lá, o povo daqui (pausa) Tipo, essa coisa do preconceito, né? E eu sempre atravessei a ponte. Eu sempre gostei de atravessar a ponte. Trazer o povo de lá pra cá, o povo daqui pra lá. Tanto que hoje com o espaço que a gente mora, e tem o projeto, o Instituto, recebe gente do mundo inteiro. Já foi gente do mundo inteiro lá. Desde de, sei lá, da África, Israel, Palestina, Colômbia. Vem gente do mundo inteiro. Estados Unidos, Europa, gente de tudo que é continente tá lá. Porque é isso que eu queria, sabe? E eu consegui. Fazer com que as pessoas transitassem, chegassem até o Jardim ngela
Enquanto você respondia você ficou mexendo na tatuagem, que é justamente do grupo, do Poesia.
R - É cara, essa tatuagem tem uma história muito (pausa). Aqui o Poesia Samba Soul, a banda que a gente começou em 1989 e a gente tem essa banda até hoje. E esse cara aqui é o meu tio. Ele é primo do meu pai. Na época, meu pai veio do Nordeste e trouxe os primos, né? Quem trouxe meu pai foi o irmão dele. E depois ele trouxe os primos. Aí morava minha mãe e os primos com meu pai, tudo numa casinha pequenininha. E meu tio, ele era muito generoso. Meu tio era uma pessoa muito generosa. Sempre foi uma pessoa muito generosa. E ele andava com a gente, assim, pro campo de futebol. Botava eu aqui, meu irmão aqui e andava comigo na mão. Tomava umas cachaças, umas ______. Ia pra beira do campo, aí comprava aquele monte de doces e tal. E ele tinha um black power, calça boca de sino. Por isso a gente chama Poesia Samba Soul, porque ele ouvia muito Soul Music, e meu pai sempre ouvia muito Chorinho, Samba. Então, é influência dos dois. E meu tio, cara, teve uma época que ele sumiu. Ele sumiu e a gente não sabia aonde ele tava. E ele apareceu. Tava trabalhando no Mato Grosso do Sul. E ele sempre foi uma pessoa que tudo que é dele ele dava pros outros. Sempre muito generoso. Dava tudo pros outros, tudo que ele tinha. Dava roupa, dava tudo que ele tinha. Ficava sem e dava pros outros. E ele chegou uma vez lá, na favela, e isso foi em oitenta e oito, mais ou menos, por aí, coisa de oitenta e oito, começo de oitenta e nove, e ele foi o cara que comprou o primeiro pandeiro pra gente. De verdade. Porque ele pegou todo o dinheiro que ele ganhou lá, que não era muito, e comprou um pandeiro e uma timba. Na época, era timba. Deu pra gente de presente e sumiu de novo. Ele sumiu. Ele bebia muito, né?, então ele pegou todo o dinheiro, comprou e sumiu. E aí, você imagina, de oitenta e nove esse meu tio nunca mais apareceu. Aí a gente resolveu colocar o símbolo dele. Da generosidade. Ele é muito generoso. Então, teve um cara que foi lá uma vez e desenhou. Fez um desenho, a gente colocou Poesia Samba Soul, né?, no início era Poesia do Samba, como grupo de Samba. Em dois mil passou a ser Poesia Samba Soul. Aí em dois mil, o cara fez um desenho que era igualzinho meu tio. Eu falei, cara, com boca de sino e tal, eu falei “faz um logo pra mim”. Ele desenhava. Tipo acabado de sair da cadeia, e foi direto pro estúdio. Porque falaram na cadeia que ele podia gravar no estúdio lá e ele queria chegar com uma música pra mãe dele. E ele chegou e eu falei “o que você sabe fazer?”, e ele falou “sei pintar”. Falei “então, pinta pra mim um quadro e eu gravo você, cara”. Ele fazia beatbox, cantava um rap e tal. Hoje esse cara é chefe de cozinha, de comida italiana. Pra você ter a história. Ele entrou lá e falou tá aqui o desenho, e quando ele virou o quadro eu falei: “é meu tio, cara”. Comecei a chorar, fiquei emocionado pra caramba, lembrei do meu tio. Enfim, isso foi em dois mil mais ou menos. E aí meu tio nunca mais apareceu e a gente tentou achar ele em tudo que é lugar. E eu sempre, a minha intuição, “ele tá vivo”. E eu sonhava com ele, cara. Falava: “esse cara tá vivo”. Eu falava:“Pai, meu tio tá vivo”. E ele falava: “Tá não, rapaz, você é doido. Ele bebia muito. Deve tá morto”. Porque ele bebia muito mesmo. Ele andava (pausa), e ele não fazia mal pra ninguém. Pensa uma pessoa que via o caminho da formiga e dava a volta. Ele dava a volta. Andava quilômetros pra não passar em cima do caminho da formiga. Uma pessoa muito generosa, muito generosa. Quando foi em dois mil e quinze, eu tava na Suíça. Com a banda. Eu e meu irmão. Meu irmão é apaixonado por ele também. Minha família toda apaixonada por ele. Minha mãe me liga, chorando, e fala pra mim: “Claúdio, Seu Valdir apareceu”. Em dois mil e quinze. Eu entrei em um estado de que eu queria pegar a passagem, trocar minha passagem. Queria vir embora, queria vir embora. Meu irmão “calma, calma, calma” e não sei o que. Eu comecei a entrar em um estado assim que (pausa), enfim, entrei em contato com quando eu pequeno, né, cara? De novo. Eu comecei a chorar. Eu sempre senti que ele tava vivo, mas ninguém acreditava. Minha intuição falava esse cara tá vivo. Tá vivo. Tá em algum lugar. E eu tentava achar ele. Eu era o único ainda que tentava achar ele. E aí, peguei a passagem. Quando cheguei em casa, ele tava lá. (pausa) Cara, você imagina? De oitenta e nove até dois mil e quinze, eu vi ele só em dois mil e quinze. De oitenta e nove a dois mil e quinze, eu tive esperança que um dia ele voltasse. E eu contei a história dele no mundo inteiro. Eu contava a história dele onde eu passava. Porque as pessoas me perguntavam, e eu contava história no mundo inteiro dele. E aí, enfim, ele (pausa), ele chegou lá e você imagina, ele saiu da favela em oitenta e nove. Dois mil e quinze a favela é outra. Tem até banco, tem supermercado. Não tinha nada quando ele morava lá. Tinha rua de terra, né?, violência total. E ele voltou lá e eram várias casas e ele não sabia onde eu morava. Ele chegou lá com uma maleta. Ele vendeu tudo o que tinha no Mato Grosso do Sul. Ele chegou lá com uma maleta, na ponta do escadão. Porque a gente mora num vale, e tem um escadão. E ele manca da perna, então ele tem um problema na perna, no joelho. E aí ele chegou, e você vê, ele chegou lá com sessenta e seis anos de idade. Ele saiu era novo, era bem novo. E ele chegou pra um cara lá em cima e falou: “Ó, Gerson mora aí, Gerson, Claudinho filho de Gerson”, com o jeito nordestino dele de falar, “filho de Gerson, o Fabinho”. Ele fala Claudinho, Fabinho. Ai o cara falou: “Ih, meu, esses moleques não estão aí mais não. Esses caras é famoso. Esses caras só vive viajando pra Europa”. Você imagina, ele ficou todo né, meu? Ele resolveu ainda voltar. E aí ele pegou um cara lá e deu um dinheiro pro cara. Olha pra você ver como ele confia, como ele confiava nas pessoas. Ele deu um dinheiro pro cara, pro cara levar a mala dele até lá embaixo, porque ele não conseguia carregar. E o cara desceu com a mala e ele foi descendo atrás, devagar. E o cara deixou realmente a mala lá. Ele encontrou com meus tios primeiro. Meus tio falou assim, meu tio falou pra ele, tem um barzinho do lado, e ele falou: “Oi, tudo bem? Sou o Seu Valdir”, e ele falou: “Seu valdir hoje tá morto, cara”. E ele falou: “Não, eu sou o Seu Valdir” e ele teve que pegar o RG e provar que é o Seu Valdir. Porque ele saiu de lá novo. Então, ele tava vivendo num lugar, ele ainda estava sendo escravizado. Numa fábrica. Ele trabalhava em uma fábrica de cana, pra fazer álcool. Ele bebia o álcool puro. Ele bebeu álcool durante esses anos todos. Teve um dia que ele lembrou da gente e ele parou de beber. E nesse dia que ele parou de beber ele sentiu vontade de voltar pra casa. E ele tava no mesmo lugar, no Mato Grosso do Sul. Aí ele voltou, e quando eu encontrei com ele foi um encontro, assim (pausa), ele morou com a gente por um tempo, e o sonho dele era voltar pro Nordeste. Pra Carrapicho. Onde meu pai nasceu. E lá é uma cidade plana. Ele tava andando de bengala. Então, a gente cuidou dele. A gente cuidou dele pra caramba. Deu uma casa pra ele lá no quintal. Arrumamos a casa pra ele. Montamos móveis, montamos tudo. E ele super feliz. Aí quando ele, você imagina, ele viu a banda, ele canta samba, né?, e ele viu a roda de samba no meio da rua, viu os projetos acontecendo, ele viu a gente, ali. “Nossa, mas vocês são famosos, né, cara?”. E a gente botava um vídeo e ele: “Nossa, é eu aí?” e eu falei “é você, a gente ficou te esperando, cara, esse tempo todo”. Você imagina. O encontro foi belíssimo. E aí como eu contei a história dele no mundo inteiro, ele queria voltar pro Nordeste, e eu contei a história dele na rede. Falei ele tá aqui, meu tio tá aqui. Todo mundo ficou sabendo. Fora do país, era sucesso fora do país. E eu falei: “ele quer voltar pro Nordeste”. O pessoal me ajudou. Comprou passagem, comprou tudo, e a gente aposentou ele. Conseguiu aposentar ele. E aí ele foi pro Nordeste e tá lá, morando na beira do Rio São Francisco, comendo peixe todo dia. Me liga todo dia. Tem Whatsapp. Ele tem Whatsapp, porque não tinha Whatsapp. Ele fala: “Olha, Claudinho, eu tenho Whatsapp. Posso falar com você todo dia”. E eu falo que é isso aí. Tá lá feliz, cara. Vou encontrar ele esse ano. Meu pai já foi lá, viajou, encontrou com ele. Tá vivendo uma vida maravilhosa. Então, é isso. É uma história e eu acho que essa generosidade toda a gente tem. Porque a gente aprendeu com ele, aprendeu com meu pai, com minha mãe. Então, a banda não é só uma banda de música, é uma filosofia de vida. A gente adotou uma filosofia de vida. Não é uma banda de música só. Tem toda uma coisa por trás, que é muito maior do que ser uma banda de música. É uma filosofia de vida, que a gente aprendeu com essas pessoas aí.
P/1 - É uma história linda.
R - Obrigado.
P/1 - Antes da gente acabar queria te fazer uma pergunta. Uma pergunta assim, uma proposta. Eu vi que você trouxe seu cavaquinho. Você não quer tocar um pouquinho pra gente?
R - Eu quero, trouxe pra isso mesmo.
(pausa)
R - Esse cavaquinho eu ganhei ele em mil novecentos e noventa e seis. A comunidade me deu esse cavaquinho. Porque em oitenta e nove, até noventa e seis, eu fiz tanto pela comunidade, mas tanto. Eu dava aula pra todo mundo. Eu tinha um pandeiro e dava aula para trinta pessoas. Um pandeiro só. Então, a gente dividia tudo que a gente tinha. A casa, a casa que a gente tem. Meu pai sempre foi muito assim. Então, em noventa e seis a comunidade se juntou e me deu esse cavaquinho. E foi no dia do meu aniversário. No dia dezenove do quatro de mil novecentos e noventa e seis. Esse cavaquinho é como se custasse hoje uns dois mil reais. Imagina, é muito dinheiro, na época. Então, eles fizeram um rateio na comunidade, e aí, enfim, cada um deu um pouquinho. Meu pai também organizou tudo. O pessoal da banda organizou tudo. E eu tenho esse cavaquinho. E esse cavaquinho viajou o mundo comigo já. Ele já foi do Oiapoque ao Chui. (risos). E meu instrumento de corda foi cavaquinho, né? (pausa) Vou cantar uma música aqui. Uma música, um samba soul que a gente toca. (pausa) Essa música é do Lu de Oliveira, um compositor da comunidade, é um cara também super especial. (pausa)
P/1 - Maravilhoso
P/2 - Incrível
R- É isso. É uma música da banda, do Poesia Samba Soul
P/1 - Lindo. Lindo, lindo, lindo.
P/2 - Qual o nome da música
R - Não morra na ilusão. Não morra na ilusão.
P/1 - Nossa, muito lindo. E o que você achou de contar sua história pra gente?
R - Olha, pra mim foi muito emocionante também. Porque a gente entra em contato com a criança interior. Você contar sua história você acaba entrando em contato com sua criança. A gente sempre tem uma criança que acompanha a gente. Desde de pequeno. E você fazer isso é divino. É o maior presente que a gente pode receber. É você entrar em contato com sua criança. Contar história pra mim, do que eu fiz, do que eu vivenciei, de onde eu cheguei e como eu tô me faz pensar que o mundo é possível. Um mundo melhor é possível. Existe um mundo melhor que tá acontecendo, e a gente só precisa tá atento a isso. E conectando com a criança a gente consegue se conectar com um mundo melhor. E pra mim foi um presente estar com vocês aqui. Na realidade, a gente acha que sempre o presente é quando a gente tá com uma pessoal e, “ah, aquela pessoa é especial”. Não é nada. O presente, na realidade, é quando a gente tem oportunidade de falar e contactar as pessoas. Quando você fazia uma pergunta, você me fazia entrar em contato com meu eu interior. Então, na realidade, você que tá me dando um presente. Não sou eu que tô dando um presente pra vocês. Eu tô sendo presenteado hoje aqui. De pode contar minha história. É um presente que vocês estão me dando.
P/1 - A gente tá te dando mas a gente que agradece. Sua história é linda.
R - Eu que agradeço.
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