Museu da Pessoa

Versátil ao trabalho

autoria: Museu da Pessoa personagem: Ronaldo Rodrigues de Jesus

Projeto: História em Multimídia do São Paulo Futebol Clube
Depoente: Ronaldo Rodrigues de Jesus
Entrevistado por: Valéria, Karen e Rodrigo
São Paulo, 06 de dezembro de 1993
Entrevista nº 020

P - Ronaldo se apresenta, por favor. Fala o seu nome, onde você nasceu, qual o bairro onde você morou, nome dos seus pais.

R - Por etapas, né? Meu nome é Ronaldo Rodrigues de Jesus, nasci no dia 19 de junho de 1965, aqui na capital em São Paulo, bairro do Brooklin... Morei aqui até uns cinco anos, por aí, depois mudei, mudei pra São Bernardo do Campo, fiquei por lá até os 16 anos. Praticamente eu passei a minha infância em São Bernado do Campo, depois aos 17 anos eu fui para São José do Rio Preto jogar futebol e aí começou a carreira né? (Risos) Jogar futebol... E morei três anos em São José do Rio Preto, depois vim para São Paulo, pra capital mesmo em 85 e estou aqui até hoje.

P - Mas desde garoto você jogava bola Ronaldo, quando começou o seu contato com o futebol?

R - Ah, desde garoto, a principal diversão era... Naquele tempo ainda tinha bastante campinho né, no bairro onde eu vivia. Então a gente sempre jogava futebol e eu comecei a jogar, não lembro com quantos anos, eu lembro que... Descalço de manhã, à tarde, à noite... Sempre ficava correndo atrás de bola, e sempre tive uma vontade realmente de jogar futebol profissional.

P - E você falava isso com os seus pais? Na cabeça dos seus pais passava essa idéia do Ronaldo ser jogador de futebol?

R - Eu tinha vontade, falava... Eu lembro de eu ter falado algumas vezes e... Sempre batalhei pra poder jogar mesmo né, mas eu sempre nunca deixei de fazer outras coisas porque se por acaso não desse certo eu nunca estaria desprevenido. Aí deu certo, eu comecei a jogar profissionalmente e tive uma carreira...

P - Ronaldo eu posso pedir que você conte pra gente um pouco como eram seus pais, como eles se chamavam, o que é que seu pai fazia?

R - Bom, primeiramente eu devo dizer que eu venho de uma família humilde, meu pai chama-se Ariesio de Jesus, minha mãe chama Luzia Rodrigues de Jesus, eles são comerciantes, trabalham com... Em indústria de confecção. De vez em quando até eu tinha que ajudar um pouco lá, pegar uma máquina às vezes, cortar... Tinha que trabalhar um pouco e... Eu acho que essa humildade, vem de uma família simples, eu acho que apesar dessa humildade não faltou educação, não faltou uma boa orientação, que você pode levar isso na vida... Levar isso pra vida inteira, então eu acho que nesse ponto eu agradeço muito aos meus pais pela educação que me deram.

P - Foi difícil a sua infância Ronaldo?

R - Eu tive uma infância alegre, com algumas dificuldades como sempre. No Brasil a pessoa que não tem muita condição financeira tem um pouco de dificuldade, mas eu não me arrependo não, eu acho que eu sempre fiz um pouco de tudo, brinquei bastante, tive oportunidade de me divertir bastante, de viajar, então eu não me arrependo. Também tem um detalhe, eu comecei a trabalhar cedo, eu comecei a trabalhar com 13 anos, então eu sei que eu tive... Às vezes eu precisava deixar algum dinheiro em casa, e o que sobrava pra mim, aí eu podia me divertir, podia comprar roupas, podia sair com os amigos... Então nesse aspecto eu tenho que... Que... Não posso me queixar muito, eu tive uma infância que realmente eu aproveitei bastante. Hoje infelizmente as crianças não aproveitam bastante como eu aproveitava naquela época.

P - Você tinha que trabalhar bastante? Como era o dia a dia do Ronaldo?

R- É, tive que trabalhar com 13 anos. Com 13 anos você tem a sua moçada, seus amigos aí, a sua turma, você tem que deixar aquilo pra trabalhar, isso é bem desagradável... Você está trabalhando e de repente você olha lá na janela, pô, meus amigos tão brincando, e eu aqui me matando. Mas tinha que trabalhar porque se não trabalhasse não podia fazer nada, de uma certa forma foi absorvendo aquele impacto de você ter que trabalhar muito cedo e... Acho que foi válido como uma grande experiência de vida.

P - E a escola Ronaldo? Você ia à escola, você estudava?

R - Estudava, estudava à noite. Fiz o primário, tinha grandes amigos né, tive sempre... Você cresce num determinado bairro, você conhece, você vai estudando com as pessoas, vamos dizer desde o primário, vai até a oitava série né, que era o caso desse colégio que sempre estudei. Depois que eu comecei a trabalhar ficou um pouco difícil, você não está muito acostumado a acordar cedo e trabalhar oito horas e depois ir a noite pra escola, aí tive um pouco... Até repeti alguns anos aí, uns dois anos mais ou menos, não me lembro, e perdi um pouco de tempo né, mas eu sempre estudei, nunca deixei de estudar não.

P - Qual era o trabalho que você foi fazer quando você tinha...

R - Eu morava na época em São Bernardo, só podia ser metalúrgico né? (Risos)

P - E como foi que você começou a trabalhar? Quem te levou, você foi sozinho?

R - Eu fui procurar emprego, meu pai chegou uma hora e falou: “tá ruim, você tem que procurar emprego, não dá pra você ficar assim a toa, precisa ajudar” e eu peguei e fui, precisando de ajudante de alguma coisa, e comecei a trabalhar. Inclusive eu trabalhava numa firma, numa metalúrgica em Diadema, fazia aqueles escapamentos de fusca, aqueles escapamentos cromados, aqueles silenciadores que usavam no meio do escapamento, esse tipo de coisa. Fazia também... Tinha uma parte que era a parte de móveis, esses móveis, essas mesas que tinham aquelas... Aqueles negócios cromados, aqueles suportes cromados, esse tipo de coisa. É um trabalho um pouco duro viu? Difícil, mas em todo caso né, não nasci em berço de ouro, tinha que trabalhar, e tinha que ir à luta mesmo. Trabalhar, estudar, mas sobrava um tempo pra se divertir, né? Ah, final de semana é, chegava no sábado, na sexta-feira a noite tinha que ir pra escola ainda, sábado e domingo aí pô, é hora de você... De dia a gente jogava bola, chegava sábado à noite eu saía né, ia dançar, namorar.

P - Onde você gostava de ir, que lugar você gostava de freqüentar?

R - Ah, barzinho, em São Bernardo tinha muito barzinho, principalmente com música ao vivo, na época. O ABC tem uma característica que você ouve muito rock and roll, né? E eu sempre aprendi a gostar de muito rock and roll nessa época, quando você ia nos barzinhos você tinha música popular brasileira, Caetano, Chico Buarque, Milton Nascimento, Gil e... Na parte internacional era rock, Led Zepellin, Stones, e eu adoro até hoje. Então era mais ou menos nesse embalo, você ia para os barzinhos assim de sábado, noite de domingo, na minha época, eu era novo, ia no matinê, cinco, seis horas da tarde, dançava até umas oito, depois eu ia descansar, porque segunda-feira era dia de batente.

P - Você dançava bem?

R - É... Mais ou menos né, mais ou menos. (Risos) Não tenho muito jogo de cintura, não tenho muito gingado pra dançar não.

P - Você era uma pessoa tímida Ronaldo?

R - Não sei viu, quando comecei a jogar futebol passei a ficar muito sério, eu acho que eu não era muito assim não, um cara mais solto, mais extrovertido... Depois que eu passei a jogar futebol eu passei a encarar aquilo com muita seriedade, as pessoas me acham muito sério, muito sisudo assim, infelizmente é o meu jeito de ser, pra mim não me incomoda, agora as pessoas: "Pô esse cara é muito sério", mas é minha maneira de ser, é uma maneira de se encarar com seriedade. Agora quando eu estou em momentos de lazer eu descontraio bastante, não fico muito sério.

P - Qual foi o seu primeiro clube Ronaldo?

R - Clube?

P - É.

R - Bom, vou começar da... Desde pequeninho lá... Lá em São Bernardo foi o Nova Petrópolis eu não sei se era Esporte Clube Nova Petrópolis não lembro, era desde do dentinho, dente de leite né, dentinho, dente, dentão... Depois veio o juvenil, no juvenil já mudei de clube. Então esse time aí, esse time que eu comecei a jogar futebol né? No Nova Petrópolis inclusive, nessa escolinha, que era uma escolinha, você ia treinava de quarta-feira lá, depois domingo você ia jogar e pra você jogar você tinha que jogar no campeonato estadual Grande ABC e... São Paulo, então você tinha que ter nota escolar, você não poderia ter duas vermelhas em uma matéria, por exemplo, Língua Portuguesa se tivesse D, D e outro C você não poderia participar, você teria que ter uma azul que era de C, B e A, e uma vermelha, você não poderia ter duas vermelhas seguidas, se não você tava eliminado da competição. Então esse era um dos motivos que eu estudava, porque eu queria jogar, e queria jogar naquele clube que tinha esse regulamento, regulamento, não sei nem se existe o campeonato... Campeonato DEF, o campeonato aqui da Secretaria de Esportes de São Paulo, então isso é um grande incentivo, o garoto tem que estudar, tem que ter nota, e tem que jogar futebol porque adora então... Depois eu com 14, com 15 anos, eu comecei a jogar em Portuguesinha da Paulicéia, um time juvenil, joguei lá seis meses depois. Paulicéia é outro time, é um rival do mesmo bairro... Aí depois eu fui pra São José do Rio Preto, joguei lá no Rio Preto Esporte Clube, se não me engano era divisão intermediária, e depois no São Paulo.

P - Mas você se tornou profissional quando, Ronaldo? Em 86, aqui no São Paulo mesmo? Como é que foi a sua chegada no São Paulo? Conta essa história...

R - Tem um outro detalhe, tem a passagem em Rio Preto. A passagem em Rio Preto foi um... Foi meio difícil para mim, porque eu saí com 17 anos de casa, tinha um grupo de amigos fantástico que saia todo final de semana, viajava todo mundo junto, eu tinha uma turma realmente grande e apareceu... Eu tava jogando até nesse time do Paulicéia e apareceu um cara: “Pô, eu vou levar o Ronaldo” aí pega a passagem do ônibus e vai lá... E São José do Rio Preto são 450 Km de viagem, aí eu fui lá, fiz dois treinos e os caras gostaram, “pode ficar”. E nessa época eu trabalhava, trabalhava na... Em São Paulo eu trabalhava na “brinquedos Trol”. Eu trabalhava na parte de manutenção de máquinas lá e tinha um emprego, ganhava relativamente bem, dava pra me divertir tranquilamente e aí eu falei: “Pô, vou sair”, e os caras pagaram a mesma coisa que eu ganhava aqui, e eu era juvenil naquela época ainda e o time juvenil ganhava um salário razoável, eu larguei meu trabalho e fui jogar futebol em Rio Preto. Então foi um trauma muito grande, você largar a família, os amigos e ir pra São José do Rio Preto sozinho, inclusive eu ia com um amigo, o amigo não passou no teste e eu passei. Fui sozinho mesmo. Então, você vai começa a trabalhar profissionalmente, você começa a viver do futebol, treinar fisicamente, ver a dureza que é o futebol, realmente foi muito difícil, ficar longe da família, longe dos amigos nessa época, adolescente... Pô, é muito duro né e...

P - Alguém te dava apoio?

R - É, tinham algumas pessoas lá que davam um apoio, mas não... A maioria das pessoas não. Não tinha nível suficiente pra te colocar num bom caminho. Você ia praticamente num bom caminho devido a sua boa educação que você teve em casa, porque se não, se você fosse seguir o que, o que realmente a divisão intermediária no interior de São Paulo lhe proporciona, você estaria na marginalidade, drogas, e outras coisas, infelizmente é o retrato do futebol, é um pouco, é... Mais pobre do futebol, mais carente, que é intermediário, um futebol onde o atleta não tem estrutura, então é meio difícil. E nessa época eu sofri muito, com más companhias e tudo, então eu tive muita cabeça nessa época, eu comecei a jogar no profissional em 85, em Rio Preto eu era juvenil ainda, e... Eu comecei a jogar, passei pro profissional joguei uma temporada inteira na... Na divisão intermediária fui considerado o melhor jogador do torneio, ganhei chuteira de ouro.

P - Você estava jogando em que posição nessa época?

R - Quarto zagueiro. Quarto zagueiro no Rio Preto... E pra você vencer numa situação dessas é muito difícil, então eu tive realmente muita força de vontade e consegui vencer, aí cheguei em São Paulo, né? Pô, vamos buscar o Ronaldo aí... Cheguei em São Paulo. Cheguei em 85, o São Paulo tava classificando-se para as semifinais do Paulista em 85. Eu cheguei aqui, Pita Careca , Dario, Oscar, eu via os caras na televisão e eu torcia pros caras, e de repente eu tava treinando com eles e foi... Realmente foi bom, eu queria, quando eu cheguei em Rio Preto eu fiz o seguinte, falei assim: “Pô, eu quero trabalhar muito pra sair daqui o mais rápido possível”, e eu fiquei três anos ainda, né. Demorou...

P - É uma barra lá, né?

R - É uma barra, é muito difícil.

P - O que acontecia?

R - O time não tinha estrutura, pô... Tinha problema de alimentação, problema de alojamento, problema de material, problema de campo pra treinar, material pra treinar, tinha realmente vez que atrasava o pagamento, então você, é... Duro você viver numa situação dessas, eu trabalhava na indústria, na indústria você sabe, sofri pelo menos dia dez... É dia dez, pagava-se o salário e tudo bem... Agora lá eram 30 dias, 60 dias pra pagar um salário, então é difícil você trabalhar dessa forma, você realmente consegue vencer na vontade, foi o que aconteceu comigo eu tive um destaque muito grande, comecei a jogar num time profissional juvenil na idade de... Eu tava com 19, 18, 19 anos e começou a despertar interesse do Palmeiras, do São Paulo, do Flamengo. O São Paulo foi mais esperto nessa época e me trouxe pra cá. (Risos) Tenho que assim... Eu tenho que admitir que eles foram mais espertos, eles fizeram um... No começo do campeonato, eles fizeram uma carta de prioridades e acabando o campeonato ele vem pra cá, os outros times todos atrás, e o São Paulo quietinho, né? E aí chegou no final, eu nem sonhava em jogar no São Paulo na época, inclusive eu nem tinha feito teste aqui no São Paulo e nada eu tinha ido no Palmeiras, no Corinthians, mas algo muito vago, né, então eu sonhava voltar nesses times. No Corinthians ou no Palmeiras, no Palmeiras eu quase voltei né, quase me levaram pra lá, aí o São Paulo mais esperto me trouxe, acho que fez um bom negócio.

P - Ronaldo, quando garoto, você pensava em jogar em algum time especial? Qual era o seu time de infância?

R - São Paulo, o meu time era o São Paulo... Que teve uma época que ganhava praticamente tudo aí no começo dos anos 80, depois o Corinthians também ganhou dois campeonatos seguidos, então eu sempre tava aí no Corinthians, no São Paulo, no Flamengo... Eu gostava muito desses times, mas não tinha assim um time muito fixo.

P - Você se lembra da sua estréia no São Paulo, a primeira vez que colocou a camisa e jogou pelo time?

R - Pelo campeonato foi contra a Ferroviária no Morumbi, foi uma quarta-feira a noite, um frio, o Morumbi vazio. (Risos) É... Foi uma experiência... Não foi muito gostosa, não foi com aquela vontade, mas depois teve... Depois teve o primeiro clássico que foi com Santos, nós ganhamos de três a um no Morumbi, e realmente estava lotado, aí valeu, aí foi a minha estréia realmente.

P - Qual é a sensação assim de ver o estádio cheio, a torcida gritando...

R - Não dá tempo de pensar muito nessas coisas, porque... Você, por exemplo, jogando na defesa você não pode ter um minuto de... De descuido, que você pode entregar o jogo, você pode ter uma falha fatal e acabar com, é... Estragando um trabalho todo... A emoção é grande, quando você vê todo aquele público, quando você entra em campo, mas quando começa o jogo realmente você fica ligado e não dá pra ter muita atenção no que acontece fora, porque o jogo requer muita atenção.

P - Me diga uma coisa, Ronaldo... Nesse tempo você jogou como quarto zagueiro, você jogou como lateral esquerdo... Como é que foi até se fixar numa posição na defesa?

R - Minha posição sempre foi quarto zagueiro, mas como era um jogador que era útil ao grupo, eu era exigido em outras posições, por exemplo, um jogador se machucava, era suspenso e não tinha jogador... O Ronaldo ia lá jogar... Em 87, mais ou menos, comecei a jogar de lateral esquerdo, posição que eu jogava quando era... Quando eu tinha 13 anos era bem mais, bem mais... É... Novo, pequeno, menor, eu não era tão alto assim, então eu era meio magro, agilidade era bem fácil agora, eu com um metro e 87, jogar lateral esquerda era... Não ajudava muito, era muito difícil, mas... Foi um bom ano, nós fomos até campeão esse ano, campeão em cima do Corinthians, e graças a um lance meu, que foi uma jogada na linha de fundo contra o Santos, no Morumbi saiu um gol e o time foi pra final com... Com o Corinthians, então eu tive uma passagem na lateral esquerda muito boa, fomos campeões. Depois eu tive uma passagem em 91 no meio-campo como médio volante e eu acho que jogando em outras posições... Eu ajudei bastante, mas foi realmente na minha posição, na quarta zaga que foi realmente um estouro, eu consegui chegar até na Seleção Brasileira.

P - Você falou de 87, né? Ronaldo, o título contra Corinthians, tem um sabor especial esse título, como é que foi?

R - Não, não tem, porque no jogo final eu não joguei, fiquei no banco, fiquei lá, louco pra entrar e não podia... Aí, então, infelizmente, mas foi é... Foi no segundo título, o primeiro tinha sido em 86 no Brasileiro, contra o Guarani, mas uma final contra o Corinthians, aquela torcida toda é foi gratificante, realmente, você vencer o Corinthians e a sua torcida é... Não é fácil, eu ainda tava... Tava no segundo ano no São Paulo, tava lá adquirindo experiência e acho que a partir daquele ano pra frente foi... Foi tudo mais fácil.

P – Hoje, né Ronaldo, você é capitão do time, já foi até pra seleção, o começo no São Paulo às vezes a torcida pega um pouco no pé, né? Ronaldo o grande, o "Armário", você tinha alguma insegurança em relação a isso? Quer dizer, um jogador avantajado fisicamente, mas o pessoal cobrava técnica...

R - Isso aí é... Isso aí é intriga da oposição, eu vou fazer o que? As pessoas não gostavam de mim naquela época, hoje as mesmas pessoas que não gostavam, gostam. Como disse eu era quarto zagueiro, jogava em outras posições e os caras caiam de pau.

P - Ronaldo você tava falando né, da... Você conquistando a sua posição, intriga da oposição, o pessoal criticava você, e... Você se mostrou, mostrou o seu valor né, fala um pouco mais disso.

R - É uma fase, é tudo uma questão de fase. As pessoas falavam que não conheciam o Ronaldo na verdadeira posição que é a quarta zaga, nessa época eles falavam muito, se o jogador não tiver um pouco de estrutura, um pouco de... De cabeça no lugar, ele não agüenta a pressão, pega as malas e vai embora. Eu sabia que eu tinha condições, sabia que poderia vencer na minha posição que era a quarta zaga, continuei, aguentei, ganhei títulos em outras posições, ganhei título Paulista como lateral esquerdo, ganhei o Brasileiro em 91 como médio volante, e as pessoas não acreditavam... No final todo mundo falou. No final do ano dava eu, os caras dando a volta olímpica, e pô... Os caras metiam o pau e eu lá, caçaram o tesoureiro, o vice tava... Tava guardado entendeu? E os caras falavam, e eu fazia o que? Vou chorar, não, vou jogar futebol, ficava tranqüilo, ficava no meu lugar, dava as respostas na medida certa porque eu sou uma pessoa... Que uma pessoa fala alguma coisa e eu não vou chegar “é, para aí”, não vou concordar, e vou discordar do que ele está falando e assim... E realmente eu respondia ao que eles diziam, então eles passaram, passaram a respeitar. Eles falavam alguma coisa pô, se tava... Se eles falassem alguma coisa certa tudo bem, eu aceitaria, mas na maioria das vezes estavam errados, e nesse momento eu sempre falava: “vocês estão errados, não é assim. Vocês não sabem nada”, e é assim que eu fui contundente a essas críticas, não deixava por menos, respondia, não abaixava a cabeça, eu acho que essa personalidade... Personalidade forte foi o fator principal pra eu poder vencer dentro do São Paulo.

P - A que você atribui essa personalidade forte?

R - É aquilo que eu disse no começo da entrevista, a vontade de querer vencer jogando futebol, eu quero vencer, então eu não vou deixar uma pessoa que tá de fora, tá sentado na sua cadeirinha, comendo a sua coxinha tomando refrigerante e com o microfone, querer falar besteira... Eu trabalhando de baixo do sol, o Brasil inteiro vendo, o mundo inteiro na televisão, o rapaz está lá sentado, é fácil falar, então desse tipo de coisa, como é que pode... Então eu discordava e provava o contrário dentro de campo, eu acho que era essa receita simples aí, falta muita personalidade pra muitos jogadores nesse caso. Eu conheci casos que não vou nem citar nomes de jogadores que não aguentam a pressão realmente e vão embora, porque pô, é difícil jogar no São Paulo, pô, é lógico que é difícil, tem que ter personalidade, se não tiver não vence.

P - Conta um pouco Ronaldo, como é que é o dia de um jogo, né? Você tá lá no vestiário, apreensão, aquecimento... Quando você entra em campo, a sua preparação, a hora que você se concentra o que faz?

R - É, eu gostaria de chegar lá no campo e jogar, colocar a roupa, ir pro campo e jogar. Realmente no jogo demora muito, você chega uma hora e meia, duas horas antes do jogo no vestiário, e você fica... Tira uma meia, tira o calção, tira a roupa, aí vai, se arruma... Aí você olha no relógio e falta meia hora, 40 minutos pro jogo, tudo isso ainda. Eu acho que às vezes, no começo, tudo é festa, depois que você vai ficando saturado, vai chegando final de ano, agora, dezembro, o cara começa a ficar mais cansado, mas a preparação existe. Você chega na concentração e tem que procurar alguma coisa pra fazer né, nesse caso você... O mais aconselhável, o mais interessante no meu caso é uma leitura, você se... Compenetra-se numa leitura agradável, num livro e... Eu acho que a hora voa rapidinho.

P - Que coisas você gosta de ler?

R - Romances, livros de história... gosto de ler livros informativos, livros de pessoas que... Pessoas que já passaram, pessoas famosas, presidentes, biografias. Eu tô lendo agora, no caso minha atual leitura, a vida so... A vida de Nelson Rodrigues, interessantíssimo, um livro grosso, eu tô acabando agora. Eu acho que é dessa maneira, tem leituras que acrescenta alguma coisa a mais no seu conhecimento.

P - Ronaldo você disse que é casado, eu queria que você falasse um pouco sobre seu casamento, seus filhos... Como é que foi que você conheceu a sua esposa?

R - Minha esposa eu conheci... Minha vida para você ver, começa tudo no São Paulo né? Conheci minha esposa no São Paulo, ela era prima de um fisioterapeuta que hoje trabalha no Bragantino, e ela era bailarina na época então ela foi fazer um passo e torceu o joelho. Ela foi fazer tratamento no São Paulo e eu tinha torcido o tornozelo, eu estava lá assim, fazendo gelo, e ela lá, fazendo exercício, um olhando pro outro assim, aí eu bati na perna dela: você tá... Tá ficando boa já? Aí começou conversando, conversa vai, conversa vem, foi em 87, aí nós fomos campeões em 87, iamos a uma festa no Gallery e ela estava no Gallery nesse dia, foi convidada não sei por quem, acho que pelo primo dela e tava na festa, aí: “Oi, tudo bem?” Começamos a conversar, depois ela... Passou. Aí começou o campeonato brasileiro na época, começamos a namorar, ficamos noivos, ficamos dois anos namorando e noivos, e casamos, casamos em 89. Aí começou, começou a nossa vida de casado né? Acho que... Pra você vencer, por exemplo, ter uma vida de jogador, é uma vida muito difícil. Acho que a pessoa que está ao seu lado precisa saber no que está entrando, a gente passa muito tempo em viagem, em concentração, e a mulher precisa ter estrutura, então eu vi que ela tinha estrutura pra agüentar tudo aquilo, casamos e estamos nos dando muito bem. Depois veio logo o Rodriguinho né, meu primeiro filho, minha conquista de campeão quando eu o conheci. Depois quando fui campeão em 91, nascia o meu filho Rodrigo né, depois em 92, nasceu o Ro... Em 93 nasceu o meu filho Ronaldinho também. Então vai ser tudo campeão, espero que continuemos assim. Vai indo né, na medida do possível a gente vai aumentando a família, vai vivendo, vai adquirindo condições de mantê-los até o momento de não podermos mais jogar futebol.

P - Se os seus filhos tiverem vontade de seguir no futebol você topa?

R - Eu não vou... Eles vão ter um grande exemplo em casa que vai ser o pai, eu vou mostrar todos os lados que eles quiserem seguir, eu vou dar total apoio, sem dúvida nenhuma. Eu acho que se a pessoa tem personalidade, se ele tiver força de aguentar, espero que não precise sofrer o que eu sofri né... Espero que comecem já num time grande, que tenha estrutura, que não precise passar pelas dificuldades que eu passei, se ele quiser realmente jogar futebol, eu dou total apoio.

P - Você tem muitas saudades da família aqui na concentração? Que é tanta concentração...

R – É... Faz falta. Eu sinto falta dos meus filhos, da minha mulher. Recentemente nós fomos pra EUA, México e Espanha, ficamos praticamente um mês fora de casa, é duro, chega uma hora que você... Concentração, Hotel, e não tem mais o que fazer, e a gente desgasta um pouco, e a família nessa hora é um suporte que você tem, você pega o telefone e liga, mesmo pelo telefone você pode falar alguma coisa e quando realmente eu não tô jogando tem que dá um pouco de atenção pra família, porque realmente eles ficam, sentem muito a minha ausência principalmente os meus filhos. O Rodriguinho, que é o mais velho, ele chegou até a brincar comigo no carro, ele falou sério, ele até falou sério: “você mora aqui papai?” (Risos) Tava vindo pra concentração, vinha me trazer, é aqui que papai trabalha, a gente explica mas é duro né, filho também tem que ter um pouco de paciência. Agora só mais um mesinho, saindo de férias, sou todo deles.

P - E a Seleção hein Ronaldo, como é que foi quando você foi chamado na primeira convocação?

R - Minha primeira convocação foi engraçada, tava pra ser campeão também, pra você ter uma idéia como é que é, diante do Corinthians, foi no Paulista de 91... Nós tínhamos sido campeões Brasileiro, e depois em dezembro campeões Paulista, tinha classificado pra final e teve a convocação da seleção, eu tava indo treinar, parei o carro ali, de repente estou entrando e começa vir um monte de repórter... “Pô, que é que tá acontecendo?” Eu tava em casa com meu filho e a minha mulher, e não tava ouvindo o radio, eu não ouço rádio AM, ai eu cheguei aqui: “O que aconteceu?” “Você foi convocado pra seleção.” “Eu? Tem certeza? Não é o Ronaldo do Corinthians?” “Não, é você mesmo”. Ai eu fiquei surpreso, que surpresa, eu não tava sabendo, então minha... Minha primeira convocação foi dessa forma, eu não... E também pelo cansaço físico, nós tínhamos jogado no domingo contra o Corinthians na final do Campeonato Brasileiro debaixo de chuva e ficamos comemorando até quatro, cinco horas da manhã. Logo de manhã viajamos pra Goiânia, treinamos à tarde, depois, na quarta-feira jogamos, e era final de ano, era o último jogo do ano, né? E o meu era primeiro jogo, primeiro jogo na Seleção Brasileira realmente, a hora que você coloca a camisa da Seleção Brasileira você sente uma emoção muito grande. Agora é o tal negócio, a hora que você está em campo não tem que ver camisa, não tem que ver nada, tem é que jogar futebol e fazer o que você sabe e bem, porque é o futebol brasileiro, é a seleção, você tem que, você tem que dar o máximo.

P - Você tem esperança de jogar a Copa do Mundo né?

R - Tenho, tenho, lógico. Essa esperança existe mesmo, e espero que futuramente eu volte.

P - Você é um jogador de defesa, né? Um zagueiro, que faz gol. Eu queria saber qual a sensação de você fazer um gol?

R - Fazer um gol...

P - Que é que você sente?

R - No brasileiro eu não marquei nenhum. Não marquei nenhum esse ano no brasileiro né, mas eu tive agora fora do país, nos EUA, México e Espanha, eu fiz quatro gols, voltei como artilheiro do time, zagueiro, fiz quatro gols e nós jogamos um jogo, prá você ter uma idéia... Jogamos um jogo lá em Guadalajara, onde a Seleção vai jogar agora, em dezembro entre o... A equipe mais tradicional do México, a equipe, como se fosse o Corinthians do México, a maior torcida, nós estávamos perdendo de um a zero, empatamos o jogo aos 46 do segundo tempo por causa do acréscimo, eu que fiz o gol. A bola sobrou, dei uma pancada de esquerda, ela entrou num ângulo e... Tinha acho que 86 mil pessoas no estádio, e de repente foi um silêncio geral, ai nós batemos os pênaltis, aí nos pênaltis ganhamos o torneio, mas era uma emoção muito forte, muito gostoso ver a bola entrando com um toque final seu, eu acho que é o lance do gol, é coroamento de um esforço dentro de campo, de você colocar, fazer gol e ver aquele público te aplaudindo, eu acho que é... No futebol é a coisa mais gostosa, acho que quem sente mais isso são os atacantes que estão constantemente fazendo gols e na cara do goleiro.

P - Como é que você define, quando você começa a jogar futebol? Como você acaba definindo a sua posição? Como você decide que a sua posição é uma ou outra?

R - Minha posição, minha posição é... Tem muita importância. Eu acho que uma equipe pra ser campeã tem que ter uma defesa, uma defesa forte. Tem que ter um grande goleiro e uma defesa forte. Eu acho que sem isso, a equipe não consegue chegar, porque pode ter um meio de campo bom, um ataque bom, mas se a defesa não for forte, não adianta... Eu acho que o defensor ali atrás ele enfrenta grandes jogadores e se não tiver um bom posicionamento, uma marcação forte você coloca um trabalho todo a perder, então eu... Eu atribuo o jogador de defesa, um jogador de suma importância dentro de esquema do futebol, porque sem ele eu acho que equipe nenhuma conseguiria sempre atacar, atacar, e ter sempre na retaguarda, ou estaria tomando um gol e aí não teria função no futebol.

P - O defensor tem que fazer falta também?

R - É inevitável. É inevitável, né? Se você está marcando um adversário, você tem que ter um contato físico com ele, é inevitável. Não é que você queira fazer a falta não, às vezes você é... Você é obrigado a fazer a falta e às vezes acontece de você dar um... Apoiar com o ombro, com a mão um jogador empurrar pra se proteger, e você acaba fazendo falta. A falta infelizmente nesse caso, pro jogador de defesa, ela acontece porque você tem que marcar o adversário, você marcando uma pessoa, você tem que ter um atrito físico, e isso às vezes é encarado como uma falta pelo árbitro.

P – Ronaldo, o que é que foi a maior alegria que o São Paulo te deu? O maior título? Todos, né, que você conquistou, qual foi o mais especial?

R - Por enquanto foi o de Tóquio, né, no mundial. Aquele título foi importante, eu acho que foi o maior título que eu conquistei no São Paulo até agora. Eu acho que não vai ter outro, em termos de clube não vai ter outro, só se for o bicampeonato, né, agora pra ter realmente a mesma emoção. Agora título em termos de conquistas, o maior no futebol inter... No futebol de clubes mesmo é o Título Mundial, então, eu acho que esse que você chega é o maior, é o topo, é o máximo, só se inventarem outro título de outro planeta, Título de Marte ou alguma coisa, porque no Brasil, no mundo, na Terra, é o título do mundo. Então nós já conquistamos.

P - O que é que passava na tua cabeça lá em Tóquio segurando a taça? Com o Toyota?

R - Passava emoção, alegria de ter conquistado o título máximo do futebol mundial. Eu acho que depois que o juiz apitou a final nós ganhamos aquela invasão toda, nunca tinha acontecido aquilo na história do Estádio em Tóquio, eu acho que foi assim ó: ganhamos e entramos pra história do futebol mundial. Acho que a primeira coisa que passou pela minha cabeça foi isso.

P - Me diz uma coisa Ronaldo, tem algum adversário que você tem preferência? Jogar contra e ganhar, algum time?

R - Não, não tenho não... Eu acho que tem os clássicos aí que você joga, Flamengo, Palmeiras, Corinthians, Santos... são jogos realmente que emocionam bastante, mas eu por exemplo sou um cara muito sério, e não tenho um time assim determinado, eu gosto de jogar, pra ganhar, ganhando tanto de time pequeno quanto de grande. Você tem que fazer realmente o máximo, porque senão se não tiver ganhando, você não está ganhando a classificação, não está ganhando um pouco mais de prestígio, então, acho que em todo jogo deve-se encarar com o máximo de seriedade.

P - E as derrotas, Ronaldo? Não dá pra ganhar todas, né? O São Paulo perdeu títulos, teve algum que foi mais dolorido?

R - Teve o Brasileiro de 90, eu estava jogando como titular e sai da equipe. A equipe teve uma subida, e depois chegou na final e perdeu para o Corinthians, eu podia estar jogando, e podia ter evitado alguma coisa né, em jogo. Eu estava no banco de reservas, não pude entrar e perdeu o título. Eu acho que foi um título que o time podia ter... Podia ser ganho, mas infelizmente, de fora você não pode fazer muita coisa a não ser torcer. Tem também o de 89, nós perdemos do Vasco lá no Morumbi também, acontece... Eu acho que quem ganha também tem direito, tem que perder também, isso é normal, mas eu jogando, graças a Deus, ainda não perdi nenhum. Os que eu joguei sempre ganhei.

P - Como foi que você se tornou capitão do time?

R - Foi com a saída do Raí, é... Na época mesmo quando o Raí estava jogando ele... Às vezes, quando ele não jogava, ficava ausente, o Telê dava a tarja de capitão pra mim, porque dentro de campo eu sempre falava bastante, antes do jogo eu sempre dou um... Falo alguma coisa pro grupo, um pouco mais de atenção, e por coincidência esse tipo de coisa dentro do campo, principalmente, o treinador observa e vê o jogador que tem condições de realmente falar pros outros jogadores, poder falar dentro de campo. No caso ele escolheu a mim.

E eu acho... No começo eu falei: “Pô, tudo bem, é capitão, não quer dizer muita coisa também, depois vem a responsabilidade, se acontece alguma coisinha, ou tem que falar com o treinador, com a diretoria...” É sempre o capitão, sempre o capitão. Então você acaba tendo uma função até fora de campo, um porta-voz dos jogadores com a diretoria, com a comissão técnica. No meu caso não sobrecarrega muito não, eu acho que ser capitão do São Paulo pra mim é uma honra e eu me sinto orgulhoso de... de poder ser capitão do São Paulo, campeão da Supercopa, ser campeão da Recopa, se Deus quiser vem aí mais dois títulos pela frente em Tóquio, e o Brasileiro.

P - Ronaldo qual o atacante mais difícil que você enfrentou? Mais difícil de marcar e de desarmar. Esses tantos aí...

R - Atualmente ou no passado?

P - Na sua carreira, que você enfrentou né?

R - Teve o Mirandinha, teve o Sérginho Chulapa, teve... O Jorginho do Palmeiras, que jogava no Palmeiras na época, jogou no Corinthians. Tantos jogadores aí... O Gaúcho do Flamengo, o Renato Gaúcho ponta direita tá na ativa ainda aí. O Edmundo, vários jogadores aí, o futebol brasileiro tem realmente bons atacantes... Então é o que eu digo pra você, não dá pra você por exemplo, não conhecer um jogador que não tenha nome nenhum, você pá, não conheço o jogador, esse é mole, o cara vem, atropela você e sai artilheiro do jogo, sai, sai com geladeira, televisão, microondas, ganha tudo numa hora em campo e você sai. Pô, da onde esse cara veio? Então, pra evitar esse tipo de surpresa eu encaro qualquer jogador com o máximo de seriedade, vou marcá-lo, e fazer a minha parte porque é a tal coisa, pra evitar esse tipo de problema, ser surpreendido por subestimar o adversário, coisa que jamais eu fiz e jamais vou fazer no decorrer da minha carreira.

P - Você acha mais difícil jogar, enfrentar um jogador estrangeiro europeu ou brasileiro?

R - Ah, a dificuldade do jogador europeu é que você não tá, não tem contato direto com o jogador. Você não sabe o que ele vai fazer, por exemplo se o cara... Vai dar um pique, vai sair correndo lá na frente, se ele vai dominar e partir para jogada individual e esse é um fator que é... Atrapalha um pouco, esse tipo de coisa. O brasileiro você já sabe a cara... A característica dos jogadores... Se é um jogador veloz, se é um jogador que dribla, se é um jogador que cabeceia. Bem, agora o jogador europeu você não sabe, você assiste pela televisão, mas dentro do campo a coisa muda, então é difícil. Mas nós já enfrentamos muitos jogadores aí, nós fomos agora na Espanha, enfrentamos o Sampdoria, Valência e o... Com jogadores aí de renome internacional e chega dentro de campo é... São onze contra onze, não tem jeito, você tem que procurar fazer a sua, e futebol acaba dentro de campo, acaba sendo igual a todo lugar, não tem jeito.

P - Você tem vontade de ir pra Europa?

R - Tenho, tenho muita vontade... Tive várias oportunidades de sair, infelizmente não foram concretizadas, espero que num futuro bem próximo que esta transferência ainda aconteça. Eu acho que está na hora já. Eu acho que em termos de São Paulo eu já ganhei tudo que eu tinha de ganhar, já fiz o máximo em nome do clube, agora eu acho que eu tenho oportunidade. Se eu tiver oportunidade de ter uma vida melhor fora do Brasil, vou tentar uma estabilidade melhor para minha família. Eu acho que o clube não vai se opor de maneira nenhuma, acho que todos iriam compreender, porque a minha estada dentro do São Paulo foi o máximo de bem possível, foi muito bem recompensada de ter minha passagem, minha contribuição foi muito boa ao clube. Como você disse a vontade de jogar fora do Brasil é muito grande. Vamos agora aguardar se acontece alguma coisa.

P - Tem algum lugar que você gostaria de conhecer mais?

R - Eu tive com a Seleção Brasileira em Paris, na França, e achei lindo, gostaria muito de jogar, não em Paris, mas tem algumas cidades na França que eu gostaria de jogar. É um futebol que me atrai muito e tem também a Espanha, porque a Espanha eu posso dizer que eu conheço mais, nós fomos três vezes pra a Espanha. Conheço a Espanha de ponta a ponta, e eu acho que é o país que mais parece mesmo com o Brasil, a Espanha pelo clima, pelo povo, pelo clima eu acho que o Brasil, que a Espanha realmente, nesse caso, seria o melhor país, Espanha e França né?

P - Ronaldo, você vive futebol, come futebol, dorme futebol, você se preocupa com outras coisas, política, por exemplo... que é que você acha dela hein?

R - No momento? Por exemplo, no nosso caso... Somos jogadores de futebol, estamos sempre jogando, mas temos muito tempo à toa em concentração, então você tem que ler um jornal, tem que ler uma revista de informação, não uma revista de futilidades, revista de fofocas, que não traz nada. Que tenha alguma coisa que traga informação, então a gente tem que acompanhar a situação política do país, a situação econômica. Você mexe com dinheiro, você está sempre recebendo dinheiro, você tem que saber o que você faz com seu dinheiro, então você tem que se manter informado, no mercado financeiro, na aplicação, onde aplicar, onde não aplicar, em quê que você vai ter que comprar futuramente, em imóveis, carros, propriedades, então você tem que se informar. Eu, no meu caso, procuro me informar ao máximo. As pessoas mais jovens que estão começando, procuram um pouco de informação com jogadores que tem mais tempo na atividade como no meu caso, caso do Zetti, caso do Palhinha, Neto... então a gente sempre passa pros mais novos, em vez de assistir a novela das oito, para de assistir, compra o jornal, não lê só a parte de esporte, lê a parte de política, de economia... você tem que saber disso toda hora. Como o São Paulo é um time vencedor, tá sempre ganhando título e tudo, você tá sempre com dinheiro, você tem que saber o que você fez com o seu dinheiro, em vez de comprar roupa, e só essas coisas, e colocar na poupança essa coisa, você tem que procurar diversificar suas aplicações, por isso eu procuro me informar e... não tô formado em economia, não tenho consultoria com nenhum economista, apenas me informo com leitura assistindo os telejornais, me informando também, aqui dentro do São Paulo tem pessoas... Isso aqui é um clube que têm empresários bem sucedidos, donos de empresas, pessoas que mexem com muito dinheiro e você tem que saber encostar na pessoa certa, e isso aqui no São Paulo é que não falta.

P - Que é que você acha do Brasil hoje em dia, hein Ronaldo?

R - O Brasil hoje em dia? O Brasil tá atravessando um momento delicado, onde as instituições políticas estão realmente num processo de limpeza geral, espero que seja assim, porque o que foi feito de corrupção espero que tenha parado por aí. Teve o escândalo do INSS, caso do Collor, o caso da CPI da corrupção... Eu acho que o Brasil tá muito, de uma maneira... tá muito corrupto né? E isso não é um país como o nosso, um país tão grande, tão forte economicamente com uma riqueza tão grande que tem o nosso país não pode conviver com essa vergonha que é essa política atual do Brasil. Eu acho que o Brasil tem tudo pra ser um excelente país, a gente que já viajou por vários lugares do mundo acompanha as dificuldades dos outros países, às vezes em países menores que o nosso, com poder econômico bem menor, as pessoas vivem magnificamente bem. No Brasil, com essa potência aqui continental que é o Brasil, vamos ver se consegue sair dessa crise, acabar com essa inflação, os políticos só roubando, e fica esse temor aí de ter alguma coisa na política, um golpe aí, porque tivemos uma ditadura muito longa. Aí veio a democracia e os democratas passaram a roubar mais do que não sei o quê, então o Brasil ainda não se encontrou politicamente, eu acho que no momento em que o Brasil se encontrar politicamente o Brasil vai ser, vai desenvolver realmente uma potência mundial.

P - Ronaldo, deixa eu te fazer uma pergunta pra gente finalizar: Você lembra da coisa que você acha foi mais marcante na vida, vários momentos, um ou dois momentos mais marcantes da sua vida?

R - Marcantes como você quer dizer, profissional?

P - Não, tanto faz...

P - De toda sua vida.

R - Bom, o que eu posso dizer... Muito marcante foi o primeiro momento que eu pude ter uma proposta para jogar futebol quando tinha 17 anos né? Tipo assim, eu acho que quando dormia, ia chegar algum dia alguém ia me chamar para jogar futebol. Aí eu falei: “pô, apareceu uma pessoa. A oportunidade que eu queria!”, apareceu lá em São José do Rio Preto. Longe pacas, aí eu fui e venci, consegui chegar aonde eu estou. Foi esse meu momento marcante, no início de tudo. O segundo momento marcante foi quando nasceu o meu primeiro filho, o Rodrigo, foi um momento único, um momento que naquele momento seria uma alegria muito grande né? Saber como ele era, como é que ele veio... foi muito bonito, muito marcante. Eu acho que pode ser esses dois por enquanto. Acho que a vida da gente na realidade é tantas coisas, né? Uma dentro da profissão também. Tem um momento, também eu vou citar o terceiro, você falou dois, mas tem mais um vai. Não custa nada que é o momento de Tóquio também, nós ganhamos o Título de Mundial. Foi o título máximo que nós ganhamos, porque nós ganhamos inúmeros títulos no Brasil e fora do Brasil... Todos os torneios, mas o Mundial é o título máximo que eu já tive na minha carreira. Agora estamos próximos de repetir de novo esse feito é... espero que seja mais um momento marcante.

P - Você ainda tem um sonho na sua vida Ronaldo?

R - Tenho um sonho, sonho morar fora do Brasil um tempo, curtir uma outra cultura, um outro povo. Eu tenho essa intenção de morar pelo menos cinco anos fora do Brasil e vê realmente como é lá fora, vivendo. Porque a gente vai lá, fica lá um mês, é muito pouco tempo. Eu quero viver alguns anos pra saber como é que é. Eu acho que esse é o meu plano maior de vida atualmente, que é morar fora do Brasil.

P - Ronaldo, pra terminar, quem é o Ronaldo?

R - Um cara determinado. Um cara forte. Um cara muito forte que atualmente tem uma personalidade muito forte, que quer vencer na sua carreira, quer vencer na sua vida, quer dar o máximo de conforto e saúde a sua família.

P - Só pra... Pra concluir, se você pudesse mudar alguma coisa na sua vida, o que é que você mudaria?

R - Na profissão, se eu pudesse mudar eu gostaria de ser centro-avante. Só pra fazer gol. (Risos) Porque aí seria... Nesse caso o atacante é muito mais fácil, tá na cara do gol e tal, tá lá fazendo gol, ganha mais, tem mais chance de ser vendido pra fora. Isso é uma brincadeira. Eu acho que não teria muito o que mudar não. Eu acho que eu não posso reclamar da minha vida, tenho saúde, tenho uma estabilidade hoje conseguida dentro do que eu escolhi pra fazer, que é o futebol. Consigo dar estabilidade a minha família, consegui realmente tirar a minha família do aluguel, uma casa pros meus pais morarem e tudo... Então eu acho que eu venho vencendo e quero continuar vencendo, eu acho que, pra começar tudo de novo eu acho que só não precisaria sofrer tanto assim, mais maleável, seria mais ideal.

P - Tem mais alguma coisa que você acha importante dizer?

R - Não, eu acho que está perfeito.

P - Então muito obrigado.