Museu da Pessoa

Vale a pena sempre lutar

autoria: Museu da Pessoa personagem: Germino Borges dos Anjos

Meu nome é Germino Borges dos Anjos. Nasci em Alagoinhas, no ano de 1952. 28 de maio. Alagoinhas fica na Bahia.
FAMÍLIA
Meu pai é Univalver Menezes dos Anjos, e minha mãe, Almerinda Borges dos Anjos.
Avós do lado do meu pai, é... Manoel Hermógenes dos Anjos e... minha avó, quando eu nasci já era falecida. É... não me lembro mais o nome dela! E do lado da minha mãe era Clara Rosa dos Santos e Joaquim Armando Borges.
Meu avô paterno era comerciante, minha avó paterna era doméstica. Meu avô materno, no caso, eu não sei!

A minha avó materna também era doméstica... Ela fazia alguma coisa de comércio também.
Meu pai era ferroviário. Ferroviário e já está aposentado, e minha mãe também fazia atividades domésticas.
Tenho 11 irmãos.
BRINCADEIRA E TRABALHO
A infância... muita brincadeira, muita criança! A gente brincava muito e também a gente já trabalhava.
Com oito anos minha mãe fazia doce, e eu vendia doce na rua. Os irmãos, de mim para cima, os mais velhos tinham essa atividade. Eu sou o sexto filho.
BAHIA – PARANÁ - BAHIA
Nós morávamos em Alagoinhas. Os meus primeiros cinco irmãos nasceram no Paraná, eu nasci em Alagoinhas. Então de mim para os outros foi em Alagoinhas. A gente morava... A cidade de Alagoinhas era pequena na época, cresceu um pouquinho, e morava perto da estação onde meu pai trabalhava, na oficina, oficina da Leste. Então era assim, uma infância normal, sendo que tinha um pouco de dificuldade financeira, muitos filhos. Meu pai tinha muitos filhos... meus pais. E a gente lutava com alguma dificuldade.
Meus irmãos são do Paraná, meus pais são baianos, porém foram para o Paraná, se conheceram lá e casaram lá. E tiveram cinco filhos... os primeiros. Depois voltaram para Alagoinhas. Não gostaram muito do frio, voltaram para a Bahia e foram morar em Alagoinhas. Meu pai foi para o Paraná trabalhar. Foi trabalhar, chegou lá e trabalhou numa usina de açúcar e álcool. Ele tinha - deixa-me ver -, na faixa aí de uns 30 anos, por aí! Minha mãe é da Bahia, foi para o Paraná morar com uma tia, também no intuito de trabalhar, mas chegou lá, conheceu meu pai, casou e terminou não trabalhando.
Quando meu pai voltou, ele já tinha, ele tinha um curso feito na própria Leste. Um curso de torneiro, torneiro-mecânico,

e quando voltou iniciou... morou, ele morou um pouco em Salvador. Morou alguns meses em Salvador, chegou a trabalhar e depois foi para Alagoinhas, e foi trabalhar na Leste. Leste é a chamada, a antiga Rede Ferroviária. Chamava Leste Brasileiro.
INFÂNCIA
O que a gente gostava mais na época da infância, a gente morava perto de uma estação. E na estação descia, tinha os trens e chegava gado no trem e ia para o matadouro para ser abatido, e a gente acompanhava sempre os vaqueiros transportando esse gado para o matadouro. Outra coisa que a gente gostava bastante era tomar banho de rio.

Mas aí meus pais proibiam, a gente saía escondido para tomar banho de rio. Outra brincadeira que a gente gostava muito era de patinete. A gente mesmo construía o patinete com as chamadas rolimãs, né? De madeira, com madeira e brincava muito. Além de bola, que é o que a turma gosta de brincar, meninos normalmente...
VENDEDORES
A gente, como era vender doce, especialmente cocada. - minha mãe fazia -, a gente vendia charuto também – minha mãe fazia... A gente vendia charuto no trem: que tinha os trens de passageiros. A gente vendia charuto, vendia água também. Tinha uma moringa de barro, e a gente vendia água no trem também. Só que essa água que a gente vendia era para a gente mesmo. Dinheirinho trocadinho para a gente. E a cocada, charuto era para os nossos pais. Para ajudar nas despesas familiares.
A gente não viajava com o trem. A gentia vendia quando ele chegava na estação! Porque a gente morava em frente à estação. Não, não entrava no trem. Porque a gente estudava. Estudava e nos horários, por exemplo, estudava de manhã, vendia à tarde. Como eram muitos irmãos, uns vendiam de manhã, os que estudavam à tarde vendiam de manhã; os que estudavam de manhã vendiam à tarde.
ESCOLA
Sempre. Sempre estudei. Apesar das dificuldades, mas é uma das coisas que meus pais sempre se preocuparam é com a educação. Todos estudaram.
Antigamente tinha a chamada professora leiga. Pessoas não formadas que ensinavam. Então eu me lembro que a professora que eu tive foi Laudicéia. Era uma amiga da família, que ensinava a gente. A gente ia na casa dela. Funcionava na casa dela mesmo! Eram várias crianças. Ali amigos mesmo.... Só que não tinha uma rotina, a gente ia para a casa dela. Num determinado horário, normalmente à tarde - e naquela época tinha o negócio de tomar bolo. Então, quem saía da linha tomava um bolo! E tinha também a sabatina.
Ela fazia perguntas de matemática ou português, e quem não acertava tomava um bolo. E tinha aula todo dia! Só não sábado e domingo. Eu não me lembro exatamente até com que idade estudei com ela. Me parece, até uns sete anos. Até seis, se eu não me engano. Sete eu já fui para a escola normal.
Eu quando era menino era meio perigoso. Gostava muito de brincar, e tal. E como era natural, não gostava muito de estudar, gostava mais de brincar. E tinha as brincadeiras com a turma, de vez em quando eu filava a aula, fazendo de conta que ia para a escola - não ia, ia brincar, jogar bola, fazer esse tipo de peripécia.
Não fiquei muito na mesma escola, eu mudei um pouco. Eu estudei numa escola que era numa associação dos ferroviários. Onde... a atividade que meu pai trabalhava, estudei até o segundo ano. Do segundo ano primário em diante aí eu fui para outra escola. Parece que era a Escola Nossa Senhora de Lourdes. Aí eu estudei até o quarto ano, no caso segundo, terceiro e quarto. Quinto ano primário eu estudei em uma outra escola, e foi Brasilino Viegas. A partir daí... Naquela época tinha admissão, tinha que fazer o concurso de admissão ao ginásio. Eu fiz a admissão, entrei no ginásio particular, era o Ginásio de Alagoinhas. Estudei dois anos, na época era primeira série ginasial e depois segunda. Aí já na terceira série e quarta foi que implantou um Ginásio Estadual em Alagoinhas. Não tinha! Aí eu estudei nesse ginásio a terceira e quarta série ginasial. O segundo grau fiz também nesse mesmo colégio, só que mudou de lugar, e aí já tinha o segundo grau que não tinha também... público, tinha particular. Aí fiz os três anos do segundo grau, que no caso eu fiz desenho técnico. Fiz os três anos, aí universidade eu já fiz em Salvador, já estava morando em Salvador e fiz em Salvador.
Fui direto, assim nos estudos... Mas eu, como brincava muito e tinha lá umas brigas com a professora, terminei perdendo dois anos no primário. Mas depois eu encontrei uma outra professora, que acho que soube trabalhar comigo, eu passei a ser o melhor aluno da sala.

Era chamado CDF. Sempre estava em primeiro lugar na sala.
Com a antiga professora eu brigava porque é como eu falei, era um pouco, gostava de fazer peripécias. Então a professora brigava muito comigo e batia na época, tinha negócio de bater, dar reguadas. Aí isso me antipatizou mais ir para a escola. Eu ficava sem querer ir para a escola, e exatamente por isso eu perdi dois anos. Eu vim melhorar com a professora que eu conheci, que tinha, sabia lidar comigo, então a partir dali que eu passei a ser o melhor da sala.
Na universidade eu fiz o curso de administração de empresas. Foi na Universidade Católica de Salvador.
DITADURA
Nós... no ginásio assim, foi um período assim em que teve o golpe militar, 1964. Então a gente começou a despertar para essa questão política. E quando tinha os movimentos a gente começou a começar a participar, apesar da idade, tinha 12 anos na época. E como eu morava perto da estação, no golpe militar, eles botaram o Exército em cima da estação e não deixavam ninguém subir na estação, interditaram, especialmente o período de greve. Houve greves dos ferroviários, e a gente ficava espantada com aquilo ali. Mas como existiam naquela época os movimentos contra a ditadura militar, a gente ia no meio também.
PASSEATAS E PROTESTOS
Nessa época eu estava no ginásio.Tinha as passeatas que a gente fazia. Depois começou a proibir, a polícia não deixava e... quando era possível fazer a gente fazia, quando a polícia intervinha a gente saía correndo e tal, terminava não fazendo a passeata. E no colegial continuamos! No segundo grau a gente já tinha uma noção mais do que era a questão política e aí teve um episódio: que na formatura nossa de colegial. Já no terceiro ano a escola queria impor um paraninfo, que fosse ligado ao governo, e a gente não aceitou, a gente queria indicar um outro, que era da oposição e nessa disputa, terminou a gente não fazendo a formatura. Suspenderam a formatura, e a gente fez... concluiu o curso sem exatamente a solenidade.
PRISÕES
Na época da ditadura a gente acompanhou algumas prisões. Muitos colegas de meu pai foram presos, e já alguns colegas nossos de sala. Tinha um colega nosso de sala chamado Humberto. Ele foi preso exatamente quando estava estudando com a gente. Estava servindo o Tiro de Guerra... E aquilo tudo a gente ficava acompanhado e protestava, contra aquele negócio. Aquelas prisões que havia... Mas perda não aconteceu. Não, naquela época não me lembro de ninguém que tenha sido... das pessoas de Alagoinhas que tenham sido mortos. Mas já tinha conhecimento de que em outros Estados, em outros locais, em Salvador tinha pessoas que tinham sido assassinadas pelo regime nas prisões.
INGRESSO NA PETROBRAS
Eu fui para Salvador exatamente porque eu tinha feito o concurso da Petrobras, eu trabalhava no pólo petroquímico de Camaçarí, foi meu primeiro emprego assim de carteira. Eu tive um concurso - na realidade a gente tinha uma banca de revista, eu e meus irmãos, e aí eu fiz o concurso, passei para trabalhar no pólo, aí trabalhei um ano no pólo. No Pólo Petroquímico. Aí eu fiz o concurso da Petrobras em 1973 e passei no concurso da Petrobras e fui chamado. E tinha transporte da Refinaria de Alagoinhas para a Refinaria de Mataripe, mas eles queriam tirar, porque achavam que a despesa estava grande, e tal. Aí obrigaram a gente, na prática, a ser transferido para Salvador.
ÔNIBUS
Aí eu fui para Salvador exatamente porque eles iam tirar o transporte de Alagoinhas para a refinaria. O que eles queriam é que a gente morasse em Salvador. Para tirar o transporte de Alagoinhas. Tinha um ônibus. Mas aí eu fui para Salvador e a gente continuou lutando para não tirar o transporte de Alagoinhas - e tem até hoje! Não tiraram, não! Mas eu já estava em Salvador, fiquei lá mesmo e aproveitei para estudar.
BANCA
É... a gente inicialmente a gente vendia doces, vendia charutos, né? Aí tinha outra coisa também: em época de Natal, eu tinha um irmão que tinha habilidade para desenho e estas coisas. Ele fazia umas casinhas de cartolina, e também fazia quadros. Quadro, comprava pronta a moldura. A moldura, não! A tela! Aí a gente fazia a moldura e vendia. Saía de casa em casa vendendo. Tinha também uma vizinha que fazia roupas. Roupas de criança e tal... Então, ela entregava para a gente, e a gente saía de casa em casa. Batia na porta. Para vender. A gente menino, ainda! Então essas coisas que a gente fazia. Aí a gente foi crescendo e tal, e um de meus irmãos trabalhou com uma pessoa que tinha uma banca de revista e cigarros. E depois ele mesmo resolveu implantar uma banca de revista. Aí chamou mais dois irmãos, eu e outro para entrar no negócio. E aí a gente montou uma banca e vendia. Era a atividade nossa.
IRMÃOS SEPARADOS
Nossa convivência era assim, de início a gente brigava muito uns com os outros. Brincava e brigava, mas depois a gente começou a ter mais respeito. A gente foi crescendo. E sempre foi uma convivência boa. E hoje eu digo que não tem nenhum amigo assim brigado um com o outro. Se espalharam um pouco. Eu tenho três irmãos aqui em São Paulo, tenho uma irmã e dois

irmãos. Os outros moram na Bahia, mas moram: dois em Alagoinhas, tem uma irmã que mora na cidade de Dias D’Ávila, também na Bahia, e os outros em Salvador. A maioria foi para Salvador.
FACULDADE E PETROBRAS
Então, fui para Salvador trabalhar inicialmente. Na Petrobras... Aí fiz o vestibular e entrei na Universidade Católica. Quando eu fiz o vestibular, a primeira vez eu perdi. No segundo, eu tomei o cursinho, aí passei na Federal e na Católica. Mas como eu trabalhava de turno, a Católica era melhor, porque tinha o curso à noite. Aí eu optei por ficar na Católica, que é particular.Mas já estava trabalhando, podia pagar. Era solteiro.
Escolhi o curso de administração, porque eu gostava... Eu tinha, como eu trabalhava e eu sempre questionava as coisas assim, o tratamento que os trabalhadores tinham e a parte de recursos humanos era a que mais lidava com a gente, eu achava muita coisa assim errada eu aí optei por fazer administração de empresas. Para exatamente tentar trabalhar nessa área de recursos humanos, mas como eu aprendi na universidade, eu... na época tinha, tinha o decreto-lei 477 que proibia as atividades estudantis, mas aí nós recriamos os Diretórios Acadêmicos. Nós levantamos um movimento na universidade, de recriar os Diretórios Acadêmicos. E o Diretório de Administração nós criamos e eu fui um dos primeiros diretores. É. Eu já fazia um pouco de atividade política durante o período de ginásio e segundo grau e continuei na universidade.
Como a gente estava num regime militar, isso foi...,- entrei na universidade em 1976 -, então não atrapalhava? A gente fazia a atividade política e estudava ao mesmo tempo! Agora a gente tinha uma dificuldade lá na Católica, que era o número de vagas. As vagas eram poucas, e às vezes a gente tinha até que ficar, dormir na porta da universidade para poder pegar as matérias no outro dia. Isso até atrasou um pouco mais meu curso. Pretendia fazer num tempo menor, terminei fazendo um pouquinho mais. Mesmo você estando lá como aluno tinha que fazer esse tipo de coisa,

porque o número de vagas para o número de alunos era pouco. Como tinha questão de pré-requisitos também, então algumas matérias que a gente queria pegar, se não chegasse cedo, terminava não achando. Então, por exemplo, em média eu pegava cinco matérias num semestre, aí teve um semestre que eu peguei somente três. Exatamente por causa da dificuldade.
DERRUBANDO O REITOR
Mas a atividade política foi importante porque a gente reviveu o movimento estudantil, que tinha sido proibido durante o regime militar. Tivemos muitas dificuldades, mas fizemos uns movimentos interessantes lá com relação aos valores da mensalidade, e também a forma de administração que tinha. Na época o reitor era Eugênio Veiga, era uma família que comandava, dirigia a universidade. Nós fizemos um movimento forte que acabou tirando o reitor.
MDB, PT
O movimento... A gente tinha é..., isto foi em 1976 que nós começamos, 1977... Outra coisa que nós, já no final dos anos 1978/79 a gente já discutia a formação de um partido político.
E aí nas discussões que havia a nível nacional lá na Bahia, nós começamos a discutir a formação do PT. E nós fomos fundadores lá. Fizemos uma discussão lá na universidade, a gente saía para os sindicatos discutir com os trabalhadores. Como já era trabalhador também, então eu puxei essa discussão também no nosso sindicato.
É... na época teve o problema que só existiam dois partidos no Brasil, era a Arena e o MDB, que não tinha nem nome de partido. Então, não tinha outras formas de organização assim da esquerda, e aí a gente discutia com pessoas da própria universidade, com trabalhadores, formas de atuação. E a forma que tinha de atuação política era dentro do MDB, que era considerado de oposição na época. Então tinha essa atividade, e tinha as organizações clandestinas também, que até buscavam a gente no movimento estudantil e

no movimento operário para que a gente fizesse essa atividade política. E a gente fazia, discutia com o pessoal, tinha as passeatas, os protestos e era isso... Enfrentando polícia, cachorro... eles botavam os cachorro em cima da gente e tal. Foi um processo muito rico, de discussão, porque a gente questionava o... Na realidade, por exemplo, o MDB que era o partido da oposição ele tinha uma linha que era realmente oposição e tinha uma linha que era chamado adesista, que era o MDB adesista, que aderia ao governo. Então a gente não se sentia bem, tendo dentro da mesma agremiação pessoas que pensavam como o governo.
Eu não cheguei me filiar ao MDB na época. Eu atuava junto com pessoas do MDB, mas não tinha. Eu não achava que devia entrar num partido que não representava o pensamento dos trabalhadores e dos estudantes também. É por isso que quando surgiu a questão do PT a gente entrou de cabeça nesse processo. Dentro do MDB a gente tinha um grupo jovem, e o grupo jovem atuava com pessoas que eram de organizações clandestinas. No caso, eu não cheguei a participar de organização clandestina. Discutia com os companheiros, mas não tinha... não era assim... orgânico, de... dessas entidades clandestinas. Mas a gente tinha essa atividade e onde a gente, por exemplo, quando ia fazer uma manifestação, uma passeata, a gente organizava com esses grupos. E depois aí foi toda aquela discussão de formação do PT... Foi uma discussão que eu considero assim muito boa, porque foi a época assim que o PT tinha uma atuação mais de base. A gente fundava os núcleos e tinha a divisão dos núcleos, depois tinha as zonais e tinha a zonal e o diretório no caso. Tinha o Diretório Municipal e o Estadual. Então, era uma instância que a gente conseguia interferir. E na época a gente discutia se o PT era um partido revolucionário ou não. Essa discussão... E aí... Na época, como tinha pessoas que não defendiam a revolução, quer dizer, a revolução dos trabalhadores, não era a chamada revolução dos militares. E... o que ficava, o consenso era de que era um partido socialista, mas nunca tinha uma resolução se era revolucionário ou não. Aí tinha os embates, exatamente nas discussões das tendências. Tinha as tendências com uma forte atuação e tinha os independentes, que na época eram desorganizados. Então tinha um número grande de independentes, como eu por exemplo era independente, e a gente tinha esse processo de discussão. Aí é que entra a história da criação da Articulação. A Articulação eram os independentes, que terminou reunindo os chamados 113. E dos 113 formaram a Articulação. Quando formou a Articulação, como eu sempre fiz uma crítica às tendências, da forma como atuavam, então eu continuei independente. Eu me afastei do grupo que formou a Articulação. Porque as tendências, elas em vez de discutir por exemplo, e trazer pessoas novas para formar o PT enquanto partido, ou no caso quando fundamos a CUT em 1983, a atuação dentro da CUT para construir a Central Única dos Trabalhadores, eles discutiam mais a formação dos seus grupos, das suas tendências... Então, trazia a pessoa para atuar na tendência,

e não no partido ou na central. Então eu achava isso errado, porque ficava uma disputa interna, quando o nosso inimigo – era na época a ditadura militar, empresariado e tal – e a gente gastava energia brigando entre nós.

Então eu achava que a gente devia ter uma unidade maior, embora eu entenda que as pessoas devem se organizar enquanto forma de pensar, mas a forma de atuação eu tinha uma crítica. Fiquei independente e continuo independente até hoje. Continuo independente. A gente faz alianças com as tendências, como a gente fazia na época, mas a independência sempre foi um...
UNIFICAÇÃO DE SINDICATOS
Na Bahia a gente sempre atuou enquanto independente. E hoje tem um grupo... hoje tem um grupo que a gente chama Frente Independente. Que atua enquanto grupo, mas sem a conotação de tendência. Nós, por exemplo, é, no ano de 1996, no ano de 1996 nós tínhamos... Os Independentes chegaram a um ponto de organização que nós disputamos a direção do Sindicato da Bahia. Na época era o antigo Sindipetro, quem traba... a gente estava trabalhando já a unificação com o antigo Stiep. Que tinha o Sindipetro, que era o sindicato que reunia os trabalhadores da refinaria, e o Stiep reunia os trabalhadores da região de produção. E tinha o Sindiquímica também, que reúne os trabalhadores químicos e petroquímicos. Então, a gente já discutia a unificação dos três sindicatos. E aí em 1996 nós disputamos, na época com um grupo, na época era a Força Socialista que estava na direção do sindicato, e nós partimos para disputar com eles. Aí nessa disputa, como nós já visávamos a unificação com o Stiep, que era o outro sindicato de petróleo e lá quem era maioria era a Articulação, nós tivemos que fazer uma aliança com a Articulação para poder fazer a unificação e ganhar a direção do sindicato. A chapa que concorria, na época eles diziam que eram a favor da unificação, mas aí como tinha uma disputa... Inclusive tinha um outro sindicato que eles queriam que entrasse também na unificação, que era o Siticcan, que era o Sindicato de Construção Civil de Candeias. No fundo, para as forças políticas manterem sua hegemonia, queriam fazer a unificação com sindicatos que dessem a maioria à sua tendência. E como nós não entrávamos nessa discussão de tendência, a gente queria era fazer o sindicato avançar! E isto significava exatamente a unificação dos sindicatos de petróleo, para fortalecer, e depois a gente defendia posteriormente a unificação com o Sindiquímica. Mas primeiro a gente achava que deveria unir os sindicatos de petróleo e depois com o Sindiquímica. Essa união com o Sindiquímica foi polêmica na época... Porque os petroleiros têm uma visão um pouco corporativa. Eles achavam que unificando com os petroquímicos ia dispersar assim, a história e a luta dos petroleiros. Mas nós fizemos um trabalho bem discutido na época, e antes de fazer a unificação nós fizemos... um... porque a gente fazer a unificação seria num plebiscito, numa assembléia e num congresso nosso. Nós fizemos então um plebiscito com a categoria dos petroleiros... e eles aprovaram. Nós fizemos um processo de discussão... Na época foi só na Bahia. Mas teve um processo parecido em Sergipe, Sergipe

e Alagoas. Que lá tinha Sindiquímica e Sindipetro, e unificou também. Me parece que unificou até antes da gente. É, porque o Sindiquímica lá tem algumas diferenças. Por exemplo, em Sergipe o Sindiquímica abrangia os trabalhadores da Fafen. Que hoje, antiga Nitrofértil, que foi absorvida pela Petrobras. Hoje a Fafen faz parte do sistema Petrobras. Na época não era. Era uma subsidiária dela, da Petrobras. Então como eles eram subsidiários da Petrobras e os outros eram petroleiros da Petrobras, eram da Petrobras, então no processo foi até uma coisa natural a unificação. Já na Bahia, além da Nitrofértil, que tinha também Nitrofértil na Bahia, tinha empresas privadas. Tinha, por exemplo, a Ciquine, a... é... e outras empresas, que eram privadas. Então, tinha uma outra noção, porque nós Petrobras éramos ligados ao governo, como bem estatal, e tinha o setor privado, que eram as outras empresas. E aí tinha um pouco mais de dificuldade. Quer dizer, a unificação teve um pouco mais de dificuldade para ser feita. É, no caso tem os plásticos. Os plásticos, o pessoal da área de borracha, vidro que são abrangidos também pelo Sindiquímica. Então, tinha essa discussão também. A abrangência do Sindiquímica fazia o petroleiro, o pessoal da Petrobras fica meio, mas entendia que era importante fazer a unificação. Pela questão da estruturação do sindicato e também a gente... A estruturação significa é... o sindicato tem melhor estrutura, mais condições até financeiras de

fazer um enfrentamento. Quem estava saindo de um regime militar, entrando aí num governo já que não era militar, no caso Sarney, depois os outros, o Itamar. E sempre houve uma política de... a discussão sempre de privatização da Petrobras. A outra coisa era a penetração no Brasil de empresas multinacionais de petróleo, e no caso específico lá da Bahia, por exemplo a Copene, ela passou também a... principalmente no momento em que se discutia a regulamentação do setor de petróleo, a quebra do monopólio. Essas empresas passaram também a produzir derivados de petróleo, então a gente entendia que a luta não devia ficar corporativa, por empresa, mas ser aberta em relação ao setor químico... Exatamente para fazer frente às investidas tanto do governo da época, quanto dos próprios patrões, e também tinha a semelhança entre as atividades, por exemplo, eu como operador de processo eu tinha a mesma atividade no Pólo Petroquímico e na área da Petrobras. Não justificava a gente ficar trabalhando separado quando a questão, vamos dizer assim, a luta dos trabalhadores era única, porque a exploração, a forma de ataque dos patrões era o mesmo. Nós fizemos o plebiscito, na época nós não éramos nem da direção, ainda atuávamos fora da direção, e no plebiscito a esmagadora... a esmagadora maioria dos trabalhadores optou pela unificação. De imediato com o Stiep. Sindipetro e Stiep, o setor petróleo e depois com o Sindiquímica. E a gente encaminhou dessa forma. O Sindiquímica fez também, o Stiep também fez e a maioria esmagadora aprovou a unificação. Aí nós fizemos. Isso foi em 1996. Mas a gente entende que é o seguinte, que a unificação é um processo. Não é porque juntou tudo e fez um estatuto único que acabou. Ainda hoje a gente discute com os trabalhadores que a unificação ela permanece, estamos construindo ela ainda. É. A gente hoje ainda está no processo. A coisa não é estanque, e as negociações funcionam normalmente. Agora, normalmente a gente divide por setor. Por exemplo, eu sou da refinaria, então as negociações da refinaria são comigo e os companheiros da refinaria. A região de produção, as negociações com a gerência da área de produção são com os trabalhadores daquela área e diretores daquela área. E o setor petroquímico também! As negociações com o setor petroquímico se dão com os trabalhadores da área petroquímica. Aí entram os plásticos também e tal... E a gente ajuda, sempre mescla para poder todos participarem. E a empresa reconhece esse sindicato.
EVITANDO A DIVISÃO
De início as empresas tentaram criar resistência a esta unificação e tal, mas a gente venceu isso na prática. A gente fazia movimentos conjuntos, por exemplo, quando a gente queria parar os trabalhadores da Petrobras e os trabalhadores do Pólo Petroquímico a gente parava na estrada, na BR 324. Então parava todo mundo junto. Em época de campanha salarial. Fechava a estrada, pegava os ônibus, desviava para o local e ali reunia todo mundo conjuntamente. Então nós começamos a fazer campanhas conjuntas, e isso tem assim fortalecido a unificação. Na Bahia, nós tivemos problemas assim, que foi de setores mais atrasados, que estão hoje na Força Sindical... Eles perderam processo eleitoral para a gente e aí tentaram criar outros sindicatos. Sindicatos paralelos. Mas nós, na prática, conseguimos barrar esse processo. Eles tentaram até juridicamente registrar esses sindicatos, mas a gente conseguiu barrar também juridicamente, na prática, no dia-a-dia e também na Justiça.
INGRESSO NA PETROBRAS
Bem, eu tinha... como eu morava em Alagoinhas, Alagoinhas na época era a cidade que mais produzia petróleo e eu via os petroleiros lá, eu tinha vizinhos petroleiros, então eu já garoto eu já pensava em trabalhar na Petrobras. Bem, na época eu via o seguinte: eu enquanto criança eu via, por exemplo, o pessoal que trabalhava na Petrobras, eu via ter uma melhor condição de vida, que tinha melhores salários. E eu achava bonito também os movimentos que já existiam de petróleo naquela época. Aí eu tinha intenção de trabalhar na Petrobras, eu digo: “Quando eu crescer eu vou ser petroleiro!”Aí no início, como eu falei, comecei trabalhando no pólo... foi em 1972. Eu fiz um concurso e comecei a trabalhar no pólo. Eu trabalhei não foi exatamente numa empresa química, foi numa empresa têxtil, era a Fisiba. E eu trabalhava nessa atividade de operador de processamento, quando surgiu o primeiro concurso na Petrobras para essa atividade. Eu fiz, e passei no concurso, e aí fui, saí do pólo petroquímico. No caso, da Fisiba, e fui para a Petrobras. E comecei em 1973, em novembro de 1973. De início fiquei entusiasmado. Fui ser operador de processamento. Era a mesma atividade que eu já exercia no pólo, de operador de processamento. O operador, ele trabalha em processo petroquímico, processo de transformação químico, petroquímico ou de petróleo... No caso da Petrobras, a gente pega o petróleo bruto, coloca em processo e nesse processo a gente retira os derivados, que é o GLP – gás de cozinha – a gasolina, o diesel, os subprodutos do petróleo: a parafina, o óleo combustível, o óleo lubrificante. Então essa atividade... O operador ele faz isso.
RECEPÇÃO FRIA
Nós entramos em 1973... e... era uma turma nova, porque só tinha pessoas mais antigas, inclusive quando nós começamos, o pessoal mais antigo eles se fechavam porque achavam que a turma nova que chegou ia tomar o lugar deles. Porque a turma que chegou era na maioria estudantes, até universitários, e aquele pessoal que não tinha o nível universitário achava que era uma ameaça para eles, mas depois a gente foi derrubando essa imagem e tivemos um bom entrosamento. A gente tinha, por exemplo, o operador, pela formação do operador ele conhece, por exemplo, bombas, tanques, equipamentos, compressores, etc, mas o processo de uma empresa é diferente de outra. Então você tem que aprender o processo. Por exemplo, de onde sai o produto, por onde passa, onde sai. E a gente tem que aprender! A formação de um operador em média, para ele ser mesmo um operador, dura dois anos. Dentro da empresa. E para ele conhecer bem o processo daquele setor que ele trabalha aí é no mínimo três anos! Ou seja, ele poder dar partida na unidade, fazer uma parada inclusive de emergência. E como eu falei, os antigos tinham o receio de ensinar a gente, porque a gente aprendia na prática. Tem o curso de operador, que ensina as coisas básicas, mas a prática a gente aprende lá trabalhando. E eles tinham receio de ensinar a gente. Aí se amarravam, para ensinar... Aí a gente foi fazendo amizade e tal, a convivência terminou passando por cima disso. E aí nós conseguimos aprender as unidades e tal... E nesse período, eu falei que eu entrei em 1973, eles contavam muito as histórias lá, de como foi criada a refinaria, por exemplo, que tinha os alojamentos, que eles ficavam nos alojamentos. Eles contavam, por exemplo, que lá na refinaria tinha os americanos que vieram para implantar a refinaria, e separava os americanos dos brasileiros. Tinha a rua dos americanos no alojamento... Um alojamento com casas. E tinha o alojamento em que ficavam os americanos e os brasileiros. Os americanos eram proibidos... Os brasileiros eram proibidos de passar nas ruas dos americanos! E tinha... esses fatos que eles contavam, e às vezes como protesto eles passavam pela rua dos americanos, reunidos. E tinha separação dos chefes e do pessoal nível médio. Por exemplo, tinha um clube dos engenheiros, tinham a sede lá, um clube, e tinha a outra dos trabalhadores. Então tinha essa segregação. O pessoal contava... E nós participamos daquela história toda. E tem também a história que eles contavam de como se deu o golpe militar dentro da refinaria. Tinha o..., eles contavam as histórias das pessoas que se destacaram no movimento sindical, e tinha um que eles citavam lá, que era o Mário Lima. Citavam assim como se fosse um herói. Eu, como não conhecia o Mário Lima, para mim era realmente um herói! Eu então: “Bom, então vamos juntar com essas pessoas para a gente fazer um trabalho sindical.?”

Pensava nisso, uma vez que eu já fazia também o movimento estudantil. E com essas histórias a gente foi se envolvendo também no sindicato,

e tentando chamar outras pessoas a participarem. E aí a gente formou essa discussão do sindicato, mas nós só fomos entrar efetivamente na atividade sindical já lá para os anos 1979, 1979 mais ou menos...
MOBILIZAÇÃO
Eu só fui conhecer Mário Lima em 1982. Foi a época em que ele estava... Houve a anistia em 1979, o Mário Lima era cassado, aí eu vim conhecer ele em 1982, quando a gente estava fazendo já uma chapa para disputar a direção do sindicato. Tinha um pessoal que a gente chama atrasado lá na direção do sindicato, em 1982, e nós formamos uma chapa, um grupo, e o grupo foi denominado de Mobilização. Por que a gente formou esse Mobilização? Porque tinha a direção do sindicato, e a gente já discutia a formação da CUT e tal, e como a gente achava a direção do sindicato atrasada, os movimentos que a gente passou a fazer naquele período, que era greve de fome, essas coisas assim... Dentro da refinaria!

Ai a gente, como sabia que a diretoria não ia encaminhar o trabalho como a gente achava que devia ser, a gente formou um grupo de Mobilização, que era um grupo de apoio à direção do sindicato, para fazer o trabalho de mobilização da categoria. E a gente respaldava, dava respaldo à diretoria para fazer os movimentos. E aí a gente conseguiu reunir militantes sindicais, e tal... E a gente conseguiu avançar a luta. Fizemos movimentos fortes na época.
PELA SEGURANÇA
É, de início a gente fazia o enfrentamento no aspecto assim de segurança, por exemplo, a gente entrava na Cipa, que é a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, e a gente olhava o aspecto de segurança dos trabalhadores e em cima da questão da segurança... Para você entender: na época do regime militar a gente não tinha negociação salarial. O governo determinava o reajuste: “É esse!” E era isso que era implantado. Então a gente trabalhava no sentido de negociar também o salário. Negociava outras coisas: condições de trabalho, assistência médica, mas não negociava o salário! A gente queria negociar também o salário. Mas o governo não permitia: existia a lei que o governo é quem determinava o reajuste. Aí a gente conseguiu um avanço, mais ou menos no período de 1979. É que aí a gente já tinha uma negociação com a Petrobras, mas a Petrobras ainda mantinha o mesmo reajuste que era determinado pelo governo, então o movimento era mais nesse sentido: a gente fazia os movimentos de segurança, é por exemplo, as pessoas não tinham coragem às vezes... tinha um perigo, a unidade estava em perigo e não tinha condições de manter operando, então a gente fazia o movimento de chamar os trabalhadores e pressionava, no caso, a superintendência para parar aquela unidade e fazer a manutenção. Para evitar exatamente risco de acidente, e às vezes tinha dia que prejudicava tanto os trabalhadores como também a própria empresa.

Então, esses foram os primeiros movimentos de que a gente participou.
REFÚGIO NA CIPA
Na época do regime militar essa relação dos movimentos, ou dos trabalhadores com a empresa era uma relação difícil... Havia um problema que era o seguinte: quando eles percebiam que um determinado trabalhador se destacava eles demitiam. Demitiam e...

Mesmo concursado. Demitiam e não tinha acordo! Não tinha alegação! Diziam que a pessoa... normalmente eles alegavam desempenho! Que a empresa não tinha mais interesse no trabalho daquela pessoa e demitiam. Então a gente - uma forma de segurança que a gente tinha era entrar na Cipa. Porque a Cipa dava estabilidade, então era uma forma da gente se proteger da demissão. E quando chegou mais próximo do período eleitoral do sindicato, porque a gente achava que para poder fazer um trabalho melhor tinha que estar na direção do sindicato, embora a gente achava que para trabalhar exatamente a categoria não precisava ser diretor de sindicato! A gente sempre teve essa visão!


PELA LUTA
O fato é que os sindicatos na época eram chamados domesticados. Ele não puxava nenhum movimento com medo, porque eram proibidos de fazer greve. As leis da época proibiam - atividades chamadas essenciais, que eram por exemplo, petróleo, é... hospitais, polícia, as chamadas atividades essenciais, transporte não podiam fazer greve. Então, se fizesse a greve a diretoria era cassada e haveria intervenção do Ministério do Trabalho no sindicato. Então, a gente para fazer um movimento achava que devia entrar no sindicato, para poder ter exatamente a proteção da estabilidade. E isso a gente só foi conseguir em 1982. Mas antes a gente fazia essas atividades através das Cipas, que era a forma que a gente achava de ter a garantia de não ser demitido. E as direções na época eram atrasadas, não faziam esse enfrentamento, e por exemplo, o sindicato cuidava de escola, tinha escola, o sindicato tinha barbearia, tinha médicos, assistência odontológica, salão de beleza, e a gente era contra isso! A gente sabe que a finalidade do sindicato não era essa!

Era exatamente fazer a luta dos trabalhadores.
GREVE DE FOME EM 81
A primeira greve de fome que nós fizemos foi... ah! Foi na campanha salarial de 1981. Que a gente conseguiu fazer movimento assim mais, e no caso, eu trabalhava de turno. A gente organizou junto com a direção do sindicato fazer esse movimento da greve de fome. Coisa que a gente de 1964 nós... Havia tido um movimento em 1968. Houve um movimento em 1968, mas de 1968 para diante não tinha tido nenhum movimento mais na Petrobras. Qualquer movimento... Em 1968 houve uma greve, também não foi uma greve de paralisação. Então foi uma greve de fome também! O pessoal fez lá na Bahia, na própria refinaria.
CONCLAT
Nesse período não tinha uma organização nacional ainda. A organização nacional começou exatamente nesse período de 1970. Na época era... era... Tinha o chamado Encontro de Dirigentes Sindicais da Área de Petróleo, que eles tinham coordenador, escolhiam o coordenador e faziam um trabalho. Era uma tentativa de organização de trabalho nacional.
Na época de 1970. Antes não tinha essa forma de organização. E esse grupo que se reunia nacionalmente não tinha atividade nacional. Então, quando nós fizemos esse trabalho lá na Bahia, foi um trabalho específico da Bahia. Já existiam outros Estados que já faziam o movimento semelhante, mas não tinham essa organização. E foi nesse período de 1981... Foi 1981, me parece que foi o primeiro, que teve o primeiro congresso para a criação da CUT , chamado Conclat , foi em Praia Grande, é que a gente já fortaleceu essa forma nossa de organização nacional. E aí discutimos com os outros sindicatos fazer movimentos, e um desses movimentos foi esse: a greve de fome. Que teve uma repercussão grande lá na Bahia.
GREVE DE FOME – SEM FOME
A gente fez uma assembléia... Como a gente chamava normalmente os trabalhadores para o sindicato e não iam muitos, a gente fez uma assembléia na própria refinaria, do lado de fora. Fizemos a assembléia, que deu um número maior de pessoas e aí nós organizamos essa greve de fome. Mas a idéia da greve de fome, que as pessoas não tinham experiência em fazer, nós alertamos que era o seguinte, que era não comer a alimentação da refinaria, mas levar comida de casa. Não precisava ficar com fome. Como houve uma repressão forte da superintendência, das gerências, porque foram nas unidades e ameaçou os trabalhadores que fizessem a greve de fome de demissão, nós aí organizamos, tiramos grupos e os grupos foram para as unidades orientando os trabalhadores de como fazer a greve, de ninguém ir para o refeitório. E fizemos um piquete no refeitório! Montamos um grupo de pessoas para não deixar as pessoas entrarem no refeitório. Aí o superintendente foi para o refeitório, ameaçou as pessoas que estavam fazendo o piquete, mandou os gerentes irem para as unidades para chamar as pessoas para irem para o refeitório, mas o pessoal segurou firme. Inclusive na época eu fui ameaçado de demissão também. Porque eu dei até entrevista a um canal de televisão lá na Bahia, embora não fosse diretor. Aí me ameaçaram de demissão, até me tiraram do turno, me botaram no horário vespertino para ficar sob o controle dele, mas a gente conseguiu administrar direitinho isso aí.
Esse grupo que eu falo eram os próprios trabalhadores. Eram exatamente os próprios trabalhadores. Porque no horário de meio-dia tinha um intervalo de almoço, era de 11h45

a 12h45, então nesse horário, o pessoal administrativo e de manutenção podiam fazer, era um horário livre para eles. E nós que éramos da operação, na realidade estávamos em horário de trabalho, mas a gente saía para organizar, organizar o movimento. Então, teve uma repercussão boa isso, essa greve de fome. Uma adesão boa também, muito grande. A greve foi só um dia. Teve uma boa participação. E isso deixou as gerências recuadas, porque eles viram que não conseguiram impedir a greve de fome. E... como nós estávamos em negociação com a Petrobras, a gente conseguiu alguns avanços razoáveis nessa época. Aí nós aprendemos a fazer movimento, em 1981. A partir de 1981 nós fizemos outras greves de fome, outros tipos de manifestação, tipo por exemplo, virar o crachá. A gente, ao invés de usar o crachá com a foto para frente, a gente virava para trás. Uma forma de protesto. Outro que a gente fazia era usar uma tarja negra, uma fita como forma de mostrar à direção da empresa que a gente não estava satisfeito com o que estava acontecendo, na Petrobras. Outra forma que nós tínhamos era também atraso. A gente parava os ônibus antes de chegar na refinaria, fazia o pessoal descer, tinha uma resistenciazinha de alguns. A gente descia todo o mundo e isso atrasava uma hora, duas horas o início do expediente.
SAÍDAS CRIATIVAS
A gente decidia nas assembléias que tipo de movimento ia fazer. A gente só não dizia o dia, porque na época, se você fosse dizer o dia à empresa se preparava, botava a polícia,

e impedia a gente de fazer o movimento. Na época a polícia batia, prendia. E nós conseguíamos fazer dessa forma esses movimentos.
DEFESA DE DIREITOS
Bem, esses movimentos menores a gente fez em 1981/82. O grande movimento que nós conseguimos fazer, e aí nós já estávamos na direção do sindicato. Nós formamos uma chapa em 1982, ganhamos a eleição, tudo de militante, de pessoas novas, eu inclusive fui eleito presidente, e a gente começou a preparar a categoria para uma paralisação mesmo! Uma greve. Houve na época, por sermos estatais, os trabalhadores das estatais eram considerados marajás, eles chamavam os privilegiados, e a imprensa atacava direto a gente, como se a gente tivesse um salário muito alto... Chegaram a divulgar, por exemplo, quem entrava na realidade na Petrobras não tinha um salário lá alto, mas quem tinha 20 anos, 25, já pelas promoções e tal, já tinha um salário razoável. Não era salário alto, mas razoável. Mas eles publicavam nos jornais, nas revistas... A “Veja” mesmo chegou a publicar salários nossos, e jogando assim a opinião pública contra a gente. Aí o governo começou a estudar uma forma de retirar nossos direitos e começou a trabalhar isso. E ameaçava retirar conquistas que a gente já tinha. Então a gente começou a discutir com os trabalhadores que nós não poderíamos perder essas conquistas, esses direitos.
GREVE DE 83
Quando já, no ano de 1983, o presidente era o Figueiredo, o presidente da Petrobras era Shigeaki Ueki, eles aí elaboraram um decreto chamado 2036, o chamado decreto das estatais. Esse decreto retirava diversos direitos dos trabalhadores, além de ameaçar reduzir o número de trabalhadores, ou seja, haveria demissões. Na época nós nos organizamos, começamos a fazer movimentos, inclusive chamamos além dos petroleiros, chamamos o pessoal da área de energia, telefônicos, bancários – do Banco do Brasil, Caixa Econômica -, na época o setor petroquímico, que tinha a Copene, a Nitrofértil, que era estatal, e tentamos fazer um trabalho conjunto na Bahia. E em nível nacional chamamos esses grupos para trabalhar. É... e aí nós marcamos uma greve caso esse decreto passasse. Quando foi mais ou menos em junho, que saiu a elaboração do decreto, esse decreto 2036. E aí nós fizemos um documento na época, assinado por essas entidades sindicais e encaminhamos para o ministro das Minas e Energia, que era o César Cals na época, o presidente da Petrobras, que era o Shigeaki Ueki, para o presidente, que era o Figueiredo. Exatamente essas pessoas. E colocamos claro que se houvesse, através desse decreto qualquer retirada de direitos dos trabalhadores, que nós faríamos uma greve nacional. Mas eles parecem que não acreditam na gente, não acreditaram, e nós organizamos essa greve para julho. No dia 29 de junho saiu esse decreto, o 2036, e aí nós estávamos, os petroleiros, estavam reunidos no Rio de Janeiro, no Sindipetro-RJ, e lá nós decidimos fazer a greve, todo o sindicato de petróleo, me parece que na época eram 15 sindicatos. Aí nós fomos para a Bahia, voltamos para a Bahia, já tinha um trabalho de organização e fizemos uma assembléia com esses outros sindicatos, uma assembléia unificada com o pessoal da área de energia, telefone, bancos e petroquímicos, e o outro sindicato de petróleo, no caso o Stiep. Mas na hora da assembléia disseram que não estavam preparados para a greve, ou seja, não levaram a coisa adiante, enquanto que a gente tinha efetivamente construído o movimento. Aí na assembléia disseram que não estavam preparados e que não iam fazer

greve, nós aí separamos o nosso pessoal do Sindipetro para outro, para uma sala, para discutir como efetivamente fazer a greve, e aí partimos para fazer a greve. É, a greve que nós marcamos para começar no dia 7 de julho. No dia 6 o pessoal de Campinas começou a greve, começou a greve no dia 6. Se tentou negociar na época com Murilo Macedo, presidente da Petrobras. O presidente da Petrobras chegou a divulgar um documento dizendo que não faria demissões, etc., mas o decreto trazia o seguinte: mantinha os direitos de quem estava trabalhando, mas quem entrasse a partir daí não tinha esses direitos. Por exemplo, gratificação de férias, a MAS, que era a assistência médica supletiva, não tinha direito aos anuênios. Na época era triênio. Não tinha direito a triênios, os salários seriam mais baixos, por exemplo, o operador entrava no nível 25, eles rebaixaram para o nível 17. Então, quem entrasse a partir dali entrava no nível 17. Então a gente vendo isso: “Não, então vamos fazer um movimento.” E aí fizemos essa organização. Campinas entrou no dia 6, no dia 7 nós entramos. A idéia nossa, lá na Bahia, para fazer a greve, era o pessoal entrar e esse pessoal que entrasse, era a terceira turma na época, nós paramos os ônibus, botamos um adesivo na frente do ônibus, de greve, e orientamos a essas pessoas, os trabalhadores que estavam entrando, para paralisar, ou seja, parar a refinaria de forma técnica, ou seja, parar sem precisar... Uma refinaria se parar de vez ela tem problema! Pode haver incêndio, explosões, acidentes. Então, por exemplo, tem unidades assim que são 24 horas para parar, por etapa, então nós orientamos os trabalhadores a fazer a paralisação dessa forma. Isso foi no dia 7 à tarde, o pessoal que entrava às 4 horas da tarde para trabalhar, o pessoal do turno. O que é que a empresa fez? Com medo da paralisação eles tentaram segurar a turma que ia sair, para ficarem duas turmas lá dentro e eles continuarem o processo sem parar. E também seguraram algumas pessoas da manutenção e do administrativo. Quando nós fomos para a refinaria - eu era liberado -, quando nós fomos para a refinaria eles tentaram proibir a nossa entrada, e aí nós nos comunicamos com o pessoal interno, porque tinha diretores fora e diretores dentro e os militantes também. Aí nós orientamos o pessoal a segurar os ônibus e não deixar sair, ficar todo mundo lá dentro, dentro da refinaria. Exatamente para fazer uma greve de ocupação. E aí os ônibus do turno que iam sair às 4 horas não saíram, e o administrativo que ia sair às 5 também não saiu. Eles tentaram mandar o pessoal embora, aí nós, os nossos diretores internos e os militantes ficaram na frente dos ônibus e não deixaram sair, segurou todo mundo lá dentro. E a partir dali nós ocupamos a refinaria. Nós que estávamos de fora, que estávamos proibidos de entrar, entramos também... A turma que ia entrar entrou também. E aí ficamos dentro da refinaria, fizemos assembléia lá dentro, no refeitório. O refeitório tem uma área grande, fizemos a assembléia e decidimos todos os passos que nós daríamos lá dentro. Aí os operadores que começaram a parar as unidades, os gerentes foram para as unidades e impediram. Impediram ameaçando os trabalhadores. Aí nós reunimos o grupo assim de 10, 15, 20 pessoas para cada grupo daquele e para as unidades, para garantir a greve, garantir a paralisação, a parada das unidades. E aí esses grupos foram para as unidades e tiraram o chefe de dentro, expulsaram, e aí os operadores pararam todas as unidades. E houve a paralisação.
LINHA DURA NA REFINARIA
A gente enquanto estava fazendo a greve tem um sentimento de vitória. Por quê? Antes do... antes desse superintendente que tinha em 1983, tinha um superintendente chamado Normélio Moura da Costa. O Normélio, ele era um adepto mesmo do regime militar. Tanto que ele tinha um curso da Escola Superior de Guerra e ele botava assim no quadro, na parede. E ele tinha uma linha dura. Linha militarista. Por exemplo, ele queria separar os trabalhadores dos gerentes supervisores, e aí, por exemplo, o pessoal nível técnico tinha um crachá vermelho, o pessoal de supervisão tinha um crachá azul, ele que criou isso! Também no capacete do supervisor tinha escrito supervisor, na camisa, na farda tinha escrito também supervisor. Então, ele queria fazer essa separação, como se fosse peão e chefe. Então a gente combatia muito isso. Tinha um outro fato que era o seguinte: na diretoria anterior, para distribuir boletim dentro da refinaria, o superintendente tinha que autorizar assinando o boletim. Ele dava uma rubrica, aí as pessoas entravam para distribuir. Eu, quando nós assumimos a direção do sindicato nós dissemos a ele que aquilo não seria possível. Porque a gente não estava ali para fazer o que o gerente da refinaria queria, e sim o trabalho sindical, que é independente. E a gente não podia distribuir um boletim assinado, porque quando ele não concordava, se fosse por exemplo, uma crítica a ele, ele não concordava, não distribuía... Aí eu disse para ele que a gente ia romper com aquilo. Aí um dia nós fomos para a refinaria dispostos a romper com isso. Aí nós pegamos os boletins e botamos embaixo do banco do carro e entramos normal na refinaria como quem não ia distribuir boletim, ai nós ao entrarmos na Refinaria, no horário de meio dia, que era horário de almoço, e começamos a distribuir. Ele aí soube que a gente estava distribuindo o boletim através da vigilância, mandou chamar a gente. Mandou suspender a distribuição e chamar a gente. “Não. Nós vamos conversar com ele depois que distribuir!” Aí fomos e distribuímos boletim com todo o mundo e depois que distribuímos fomos conversar com ele. Ele aí disse que nós traímos a confiança dele, e proibiu a gente de entrar na refinaria! É... mas aí nós fizemos um movimento nacional, paramos os trabalhadores e tal e ele teve que voltar atrás. Terminou ele saindo da refinaria porque entrou em atrito direto com a gente. Então, existia um clima de revolta na categoria grande, contra essa forma assim de gerenciamento.
CASSAÇÃO PRÉVIA
Aí entrou esse outro gerente, na época da greve, que era o Anchieta, que era, ele era assim diferente do outro na maneira de lidar, tratava a gente educadamente, mas as diretrizes eram as mesmas, então, como havia uma revolta grande dos trabalhadores a greve foi assim fácil de fazer. É exatamente. E o trabalho que a gente fazia, que a gente estava lá todos os dias conversando com o pessoal, a gente promovia cursos de sindicalismo, então investia muito no trabalho de mobilização, então a greve foi fácil. Agora difícil foi acabar a greve! Teve uma hora mesmo que nós fizemos uma assembléia dentro da refinaria: “Nós vamos parar!” Durou cinco dias. Campinas começou a greve no dia 6, e nós no dia 7. Era para fazer todos os sindicatos juntos! Mas os sindicatos recuaram, os outros recuaram. Porque como eu falei anteriormente, o sindicato que fizesse greve na época era - que tivesse atividade essencial - era considerado proibido, era proibida a greve. E aí eles cassavam a diretoria, como cassaram a gente! Houve a intervenção no sindicato do Ministério do Trabalho, do governo. É... o nosso sindicato foi invadido pela Polícia Militar, Polícia Federal e Polícia Civil, e eles botaram um interventor lá no sindicato. Nós fomos também demitidos da

empresa. Houve 198 demissões lá na Bahia, e 152 demissões aqui em Campinas. E eles já publicaram, por exemplo, nós começamos a greve no dia 7, no Diário Oficial do dia 6 já tinha saído a nossa cassação. A intervenção e a cassação do sindicato! Isso nós tentamos até juridicamente derrubar, mas na época de regime militar não se conseguia. Então nós fizemos a greve, paramos as unidades e teve, como eu falei, uma assembléia dentro da refinaria. Porque nós fomos parar a Unidade 1, tem a Unidade 1 e 2

juntos, nós fomos parar, aí chegou o gerente de... - no caso era o superintendente de produção junto com outro gerente. E aí ele não queria que a gente parasse as unidades, mas nós dissemos que íamos parar. Ele aí propôs que a gente deixasse duas unidades funcionando: era a Unidade 6, que era uma unidade que tinha uma capacidade grande de produção, e a Casa de Força. Casa de Força é que fornece vapor, energia, ar de instrumento, o chamado ar comprimido, água também – água de refrigeração. Então, eles não queriam que parassem essa parte. Mas nós dissemos: “Vai parar a refinaria toda!”. Aí houve uma assembléia, ele participou da assembléia, discutindo com a gente, mas os trabalhadores: “Não, vamos parar tudo!” E aprovou na frente dele, a paralisação total da refinaria. E aí nós ficamos lá na refinaria, aí já era noite, ficamos a noite inteira, todo mundo acordado, e quando foi 6 horas da manhã o superintendente, o Anchieta, chamou a gente e falou assim: “Vocês me derrotaram! A refinaria está realmente parada.” Aí na hora eu falei para ele: “Não, nós não viemos aqui para derrotar você, nós viemos aqui para manter as conquistas e os direitos dos trabalhadores, e para mim não tem derrotados aqui, todo ganham com isso!” Ai ele: “Não, vocês não eram para parar a refinaria, vocês pararam e tal...”. E consolidamos ali a paralisação. Quando foi

de tarde, aí nós estávamos com a comunicação com as pessoas que estavam lá fora e a gente soube que a polícia ia invadir a refinaria. E nós tínhamos montado um esquema de segurança, segurança para nós. Eu era, por exemplo, presidente e aí nós montamos uma diretoria alternativa caso a gente fosse presa, então essa diretoria alternativa tomaria a frente no movimento. E aí, eu por exemplo já estava com muito sono, já tinha dois dias que não dormia, porque além da preparação da greve, a própria greve, aí nós decidimos que eu mais os outros diretores liberados íamos sair da refinaria para evitar a prisão, porque eles iam para prender a gente também, e aí saímos da refinaria, mas os outros diretores continuaram lá. E aí foram 1.200 policiais invadir a refinaria, segundo informações de um capitão que era conhecido nosso. Que eles foram de ônibus, não tinha carro para levar todo o mundo, então eles foram de ônibus. Invadiram a refinaria, até teve operação de guerra, porque entraram por debaixo da cerca, teve um grupo que entrou pelo portão. Tem dois portões a refinaria, um portão chamado Portão 1, que é o da maioria de entrada, e tem o Portão 2 que é do outro lado, então entraram pelos dois portões. A gente tinha um piquete lá, nosso, exatamente era, por exemplo, de noite eles tentaram entrar e nós impedimos, ficamos na frente da polícia, não deixamos entrar. Foram dois carros da polícia e duas motos. Eles tentaram entrar e a gente não deixou. Na época a refinaria tinha 1.700 trabalhadores. E 1.200 policiais. Como tinha o pessoal de turno, e três turmas... Na época eram quatro turmas, então tinha duas turmas fora. Naquela época uma turma dava aí em torno de 200 pessoas, em torno de 200 pessoas, então na realidade a gente tinha lá dentro 1.300 pessoas. Aí invadiram, fizeram operação de guerra e tal. E aí consolidaram a demissões. Nós saímos. Não tinha como resistir, com a polícia... Aí o pessoal saiu e nós começamos a fazer piquete fora da refinaria nos pontos, porque eles botaram o seguinte: eles botaram ônibus, dentro do ônibus dois policiais e um carro da polícia na frente, outro carro atrás. Quem se aproximava para conversar com os trabalhadores eles iam lá e prendiam. Ai a gente passou a conversar com os trabalhadores no ponto de pegar ônibus. Antes do ônibus passar a gente ia, e aí a gente teve ajuda do movimento estudantil, de outros sindicatos, porque era muita gente. E até nesse momento, quando a gente estava lá conversando com o pessoal, a polícia vinha e ameaçava de prisão mesmo! E aí a gente conseguiu segurar a greve cinco dias. Conversamos com eles para não entrar no ônibus, para não ir para a refinaria, porque se entrasse a polícia não deixa descer, então, nós conseguimos segurar cinco dias esse movimento. Quando foi na segunda-feira que a gente percebeu que não tinha mais condições de segurar. A polícia não deixava a gente se aproximar, a lista de demissão saiu nos jornais, saíram nos jornais, saiu na Rede Globo, na época, e aí não tinha mais como segurar o movimento. Aí para evitar mais demissões nós resolvemos suspender a greve na segunda-feira... Aí já tinha as demissões, 198 demissões... Então o que a gente via era como a partir dali como reintegrar os trabalhadores. Então a nossa luta a partir desse momento, a gente manteve os trabalhadores unidos, organizados, e como o número foi grande de demissões a gente também estava vendo formas de manter esses trabalhadores unidos. E aí buscamos apoios de personalidades na época, como dom Avelar Brandão, que era o cardeal de lá da Bahia, da Igreja, buscamos parlamentares daquele período, e começamos a nos movimentar. De arrumar forma de arrecadação de dinheiro para pelo menos manter essas pessoas, que estavam demitidas...
LUTAR, SEMPRE
De imediato o decreto passou a vigorar. Mas depois, na prática ele começou a ser furado, porque as empresas não conseguiam manter aquelas..., a retirada daqueles direitos. Então, por exemplo, até quem entrou em 1984 na Petrobras perdeu alguns desses direitos, mas depois recuperou, porque a gente continuou nos movimentos, fazendo pressão, e o governo ficou desgastado.
O aprendizado que a gente sempre teve com essa greve foi o seguinte: que vale a pena sempre lutar. Às vezes a gente encontra dificuldades num determinado momento, pela repressão e tal, mas à medida que a gente deixa passar uma opressão, uma forma de opressão, uma imposição da empresa ou do governo a gente perde terreno e é difícil recuperar. Então, esse enfrentamento é sempre necessário! E mesmo que eu saiba que pode haver, como na época da ditadura militar, pode haver prisões, demissões, mas a gente sabia que tinha que fazer aquilo, aquele enfrentamento. Mesmo porque a categoria petroleira já tinha uma história de luta, tinha uma greve histórica que tinha sido feita em 1962, que os trabalhadores falavam muito, que era a greve do “Equipara ou Aqui Pára!”. Porque na época, os trabalhadores aqui do sul, São Paulo e Rio, ganhavam o dobro do que os trabalhadores da Bahia e de outros Estados ganhavam. Então, na época o pessoal descobriu isso, aí fez uma greve, uma grande paralisação com esse slogan: “Ou Equipara ou Aqui Pára!” Então, para manter acesa essa luta dos trabalhadores, exatamente para não perder direitos a gente fez essa luta, mesmo sabendo que poderia ter essas conseqüências. Nós criamos na época lá uma forma de manter os trabalhadores a ABCPB (Associação Beneficente Cultural dos Petroleiros da Bahia), e a gente buscava o apoio de outros sindicatos. É forma de arrecadar dinheiro dos próprios trabalhadores da refinaria, uma contribuição para a gente pagar luz, água e uma cesta básica para cada trabalhador.
REINTEGRAÇÃO
Entramos com ação na Justiça de reintegração de todos, e ganhamos! Tivemos uma vitória assim histórica, porque as questões jurídicas da Petrobras eram resolvidas na cidade de Santo Amaro, e tinha o juiz lá, o doutor Valdomiro, assim muito bom, ele deu uma sentença, uma sentença que a gente considera assim histórica, reintegrando todos os trabalhadores! Isso já em 1980...isto já em 1980 e... não! A primeira vitória foi em 1983 mesmo! Mandando reintegrar os trabalhadores, e enquanto não reintegrasse, ele mandou que pagasse os salários dos trabalhadores com uma medida cautelar, que nós entramos. Mas aí a Petrobras recorreu, mas foi histórica essa vitória. Eles recorreram. Nós ganhamos também no Tribunal Regional, aí foi quando começou a campanha das Diretas Já, que nós participamos. E teve eleição, quer dizer, não passaram as Diretas Já, mas teve uma eleição no Colégio Eleitoral e ganhou o Tancredo Neves. E aí nós procuramos o Tancredo Neves na época e negociamos nosso retorno, e ele garantiu que reintegraria todos nós, os trabalhadores. Na justiça o processo continuava... Então quando foi a posse do governo, nós fomos até Brasília para participar da posse, mas fomos surpreendidos com a doença de Tancredo Neves,

e aí o Tancredo não assumiu, quem assumiu foi o Sarney. Nós procuramos o Sarney e procuramos o Aureliano Chaves, que era o ministro das Minas e Energia, colocamos o compromisso que o Tancredo tinha tido conosco e o Aureliano Chaves garantiu, junto com o Sarney, que seria reintegrado, que nós seríamos reintegrados, os trabalhadores. E a partir dali começou a reintegração. Na realidade, era para reintegrar todo o mundo, já em 1985, mas a direção da Petrobras começou a selecionar quem deveria voltar e quem não deveria! E aí dividiu os trabalhadores. Primeiro voltou um número de 40, aí depois foi voltando assim: 10...10... no final ficaram 9 e esses 9 eles diziam que não aceitavam. Eu estava incluso entre os nove. Não aceitava de volta para a Petrobras, que iria transferir para outros locais, outros Estados, outras unidades ... Os outros voltaram. Voltaram para a refinaria, alguns optaram mesmo por ir para a região de produção...
Outros foram para outros Estados... E esses 9 eles disseram: “Esses nós não aceitamos!” Aí: “Ou vocês aceitam ir para outra Unidade, ou a gente até paga o período que vocês tem.” Isto já em 1986, já no ano seguinte, 1986. Já tínhamos três anos de afastados, eles queriam pagar três anos como se a gente estivesse trabalhando, e a gente rescindia o contrato. Desses 9, 8 aceitaram ir para a Nitrofértil, que era hoje a Fafen, mas eu não aceitei. Eu disse - eu estava com um processo na Justiça, vinha ganhando -, eu digo: “Não, eu prefiro esperar a decisão judicial, porque eu não vou aceitar ir para outro lugar, não cometi nenhum crime e para mim tem que ser uma vitória política! Voltar para o mesmo lugar em que eu fui demitido!” Aí esses oito foram para a refinaria, então eu fiquei sozinho. Mas continuei brigando. Com a Nitrofértil, eles foram para a Nitrofértil e eu continuei brigando, e em 1990, já depois da Constituição de 1988, que houve uma anistia na Constituição. Então, em cima do processo de anistia, eu estava com um processo já na Justiça, aí eu fui chamado pela empresa para fazer um acordo e ser reintegrado na refinaria. Então eu voltei em setembro de 90. Fui o último lá da Bahia a voltar, em 1990 e no meu retorno ao sindicato já era um pessoal... eu não podia... Tinha um detalhe que é o seguinte: quem era cassado não podia mais ser diretor de sindicato.
BARRADO NO SINDICATO
Durante o período da cassação não podia ser diretor de sindicato. Então, por exemplo, nós tentamos concorrer à eleição em 1984, um ano depois da cassação, e o nosso nome foi vetado pelo Ministério do Trabalho de participar da chapa. A cédula..., embora nós fizemos a eleição. No caso, quem fez a eleição foram os interventores do Ministério do Trabalho, e o nosso nome não constou. Daí a gente perdeu a eleição! Porque esse Mário Lima, que tinha sido um ex-líder, mas era ligado ao governo, aí é que nós passamos a saber quem era Mário Lima. A gente pensava, a gente tinha ele como herói, mas na realidade era um cara assim com o governo! E que ao invés de dar apoio à gente e formar uma chapa com a gente - a gente até admitia a participação dele, embora já sabendo quem era a pessoa -, mas ele não aceitou! Ele queria tomar a frente do sindicato. E aí fez uma campanha assim chamando a gente, nós e os dirigentes que fizemos a greve, de irresponsáveis. O mesmo discurso do governo! “Os irresponsáveis que causaram essas demissões, coisa e tal.” E aí como a gente não pôde constar na chapa, a gente botou pessoas novas, pessoas diferentes, e a maioria dos militantes, os militantes foram demitidos, os 198, então a gente teve que conseguir pessoas novas, que tiveram coragem até de sair na chapa. E aí nós perdemos essa eleição de 84 para Mário Lima, ele ganhou a eleição. Três anos depois em 87 ele novamente foi reeleito, nós perdemos novamente a eleição, também a gente não pôde concorrer de novo... Não pudemos concorrer, e nós fomos ganhar a eleição já em 1990. Que aí a gente retirou o Mário Lima de dentro do sindicato, e demos um novo impulso.
PRISÕES
Não fui preso nessa greve de 1983, eu fui preso antes. Eu fui preso em janeiro de 1983. A gente estava fazendo um movimento contra o governo, contra a ditadura militar, e eu estava com o carro do sindicato, fazendo a propaganda na rua, chamando os trabalhadores para participar,

a polícia fechou nosso carro e prendeu a gente, eu e mais quatro companheiros. Tinha na época, tinha mais um dirigente sindical que era do sindicato dos Músicos, chamado Franklin, tinha um trabalhador do pólo petroquímico que estava comigo dentro do carro, e um estudante. Aí fomos presos os quatro. Levaram a gente para o quartel, o Quartel dos Aflitos, e depois nós fomos para uma delegacia fora da cidade,

que eles não deixavam que ninguém soubesse o local. Nós fomos presos, ficamos dois dias presos. Inclusive prenderam a gente numa cela comum. Na época eu até aleguei que além de ser dirigente sindical, que tinha direito à prisão especial eu era também..., tinha nível superior. Mas aí a delegada que efetuou a nossa prisão, mandou botar, chamou o carcereiro e disse: “Ó escreva na cela deles ‘Cela Especial’.” Quer dizer, naquela época tinha dessas coisas. Aí ficamos presos dois dias, depois fomos soltos. Fizemos um... Os trabalhadores fizeram um movimento, foram para a porta da delegacia, levaram parlamentares, houve interferência do cardeal, na época, então liberaram a gente no outro dia. Aí eu fiquei respondendo processo na Justiça. Depois eu fui preso também numa greve geral. A greve geral foi 1990...não lembro se foi em 1991 ou 1992, não lembro bem o ano. Ai eu voltei em 1990, mas eu não estava na direção do sindicato. Nós fomos fazer uma paralisação em Candeias, na cidade de Candeias. Fechamos o comércio, os bancos, e aí a polícia fechou os... Fechamos... a gente fez um grupo grande, com carro de som e saímos pela cidade numa passeata. E onde a gente passava, fechava o comércio, as lojas, os bancos... Era um movimento nacional dos trabalhadores. Foi a greve geral... E aí chegando na praça de Candeias a polícia cercou a gente e queria barrar o nosso trabalho, e aí começou um tumulto da polícia com os trabalhadores. Os trabalhadores pegaram pedra, apedrejaram os carros da polícia. Aí os caras começaram a dar tiros. E como eu era uma das lideranças, me seguraram logo! Me prenderam e levaram para a delegacia. Aí os trabalhadores começaram novamente a se movimentar e foram para a porta da delegacia. Aí chamamos advogados, parlamentares, etc., e resolveram me soltar. Eu fui solto no mesmo dia, fui preso de manhã e solto à tarde. Foi a segunda vez que eu fui preso. A história se repetia. Exatamente.
PERSEGUIÇÃO
A gente entendia, nesse período inclusive que eu fiquei afastado, que eu fui demitido em 1983, nós tentamos trabalhar em diversos lugares e ninguém dava emprego para a gente. A gente era tido como subversivo, como terrorista. Eu, por exemplo, teve uma empresa que eu fiz um concurso lá no pólo para trabalhar na área de operação e eu passei em primeiro lugar. Eles me pediram o documento, eu levei o documento. Isto na sexta-feira. Disseram que eu ia trabalhar na segunda-feira já. Aí quando foi no domingo ligaram para mim e disseram que eu não ia, que eu não fosse mais. Aí eu procurei saber através de pessoas que estavam lá, e as informações, que a Petrobras tinha dado era para que não me admitissem lá. Aí contaram meu histórico, e tal... Aí eu não pude trabalhar, tive que buscar meu documento de volta.
Quando o governo Sarney começou, nós aí colocamos para ele que a gente estava sem trabalhar porque não tinha como, tinha essa lista com os nossos nomes que as empresas não nos admitiam. Ai, em 1986, na época foi até o..., nós conversamos com o ministro do Trabalho, que era o Almir Pazzianoto, ele aí junto com o governo lá colocou que para não haver mais essa exceção nossa. Aí em 1986 eu trabalhei numa empresa do pólo, entrei numa empresa chamada Nitronor. Entrei e comecei a trabalhar, uma vez que na refinaria haviam sido reintegrado alguns. Então comecei a trabalhar e como não sabiam meu histórico, fiquei lá tranqüilo. Aí, quando já foi em 1996... Não. 1986...
FAMÍLIA
Na época eu era casado. Eu casei em 1978 e tenho filhos. Três filhos. Eu sou casado e sou separado. Casei com essa companheira, foi em 1978, aí tive três filhos com ela, passamos dificuldades mesmo nesse período da demissão. Aquela situação realmente dificílima, não tinha uma forma de sustentação, não conseguia emprego e tal... Aí tive ajuda de colegas. Tive um irmão que me ajudou muito, meus irmãos me ajudaram muito! Minha companheira não trabalhava. Ai nesse período eu cheguei a colocar... Na época eu tinha uma filha. Quando começou a greve eu tinha uma filha, minha mulher estava grávida. A greve foi em julho, 7 de julho, no dia 8 de agosto nasceu o meu filho, o segundo. E uma terceira filha nasceu já em 1989. Então eu tenho três filhos com essa primeira mulher, que eu me separei em 1998. 1998 eu me separei, 20 anos depois...Fiquei casado 20 anos.
NITRONOR
Foi um momento difícil que a gente passou. A gente buscava forma de sustentação, cheguei a trabalhar em diversas atividades assim, e com pessoas conhecidas. Fui vendedor nesse período, fui marceneiro, um bocado de atividades que a gente arrumou. É... é... botamos coisa para vender na feira, vender peixe. Fomos vender peixe na feira. Buscando diversas formas de atuação. Como eu falei, em 1986 eu consegui esse emprego no pólo, consegui o emprego, aí começamos a trabalhar, e a empresa ia bem, quando foi em 1988... 1988 eles começaram a ter dificuldades, aí queriam reduzir os trabalhadores, o número de trabalhadores, aí a proposta deles era reduzir 30%. Aí eu já era supervisor na empresa. Me deram a lista para eu fazer a demissão do meu grupo. Eu disse para eles que eu não ia fazer! Chamei o gerente e disse: “Ö, eu não vou fazer demissão. Se vocês querem demitir, façam vocês a lista!” “Mas você é supervisor! Você tem que cumprir a determinação da empresa!” Eu digo: “Vocês me nomearam supervisor, vocês tiram a minha supervisão, mas eu não vou fazer essa lista de demissão.” Eles ficaram naquela, aí quando foi no... a gente...Este foi um fim-de-semana, eles queriam demitir as pessoas na segunda-feira, no domingo eu chamei os trabalhadores e a gente fez uma... A gente tinha um baba dos trabalhadores na praia. Aí eu chamei os trabalhadores, a gente fez uma assembléia na praia. Todo mundo sentado no chão, e aí decidimos fazer uma paralisação nessa empresa na segunda-feira. Aí chamamos o sindicato. A gente decidiu entre nós mesmos, chamamos o sindicato para fazer a negociação com a empresa. Aí na segunda nós já... já não entrou mais ninguém. A gente segurou o pessoal do lado de fora, e aí fizemos uma greve. Essa greve foi interessante, porque essa greve durou cinco dias também, lá nessa empresa, Nitronor. Essa empresa não tinha relação com a Petrobras, era empresa privada. E nós discutimos com todos os trabalhadores, mas aí as demissões eles queriam fazer na área da operação, então o pessoal da manutenção e do administrativo não quis entrar na greve. Ai só fizemos com o pessoal da operação. E aí, como nós fizemos o movimento forte na porta da empresa, fizemos piquete, tal, eles botaram polícia, mas a gente conseguiu segurar. O superintendente ficou com raiva da gente, me ameaçou e chegou uma hora que ele foi lá fora. Eu entrei, já no último dia que a gente encerrou a greve, e fizemos um acordo. Mas o acordo que a gente fez garantia o seguinte: as pessoas que fossem sair, que tivesse, eram seis meses de assistência médica e seis meses de salário enquanto arrumava emprego lá fora, e a própria empresa ia indicar essas pessoas para trabalhar em outras empresas. Como nós fizemos o movimento da operação, eles fizeram a maior parte das demissões nas pessoas que não paralisaram, que foi o pessoal administrativo, e teve um número menor de demitidos na operação. Aí o superintendente ficou com raiva. Inclusive na hora que eu entrei para negociar com ele já o fim da greve, e eu tratava ele de você, ele era engenheiro e tal... Ele aí perguntou assim: “Por que é que você me trata de você?” Aí eu digo: “Trato porque para mim você é uma pessoa como eu, como um outro trabalhador qualquer.” ‘’É, mas eu sou... Você tem que me tratar de doutor.” “Por que eu tenho de lhe tratar por doutor? Eu acho que o tratamento, o respeito não está no tratamento, o respeito está, pronome de tratamento, está na forma de tratar, então eu trato você porque eu acho você igual a mim e igual a qualquer trabalhador.” Ele aí levantou assim da mesa e mandou que eu saísse da mesa dele. Eu digo: “Tá bom, quer que saia de sua empresa, eu vou sair.” Aí fui saindo, ele aí veio atrás de mim. Aí eu fui para o meio dos trabalhadores que estavam reunidos lá fora. Ele veio assim me ameaçando e tal, para não entrar mais na empresa dele, e não sei o quê, só a trabalho. E eu era cipista na época, dessa empresa. Ele falou assim: “Não quero que você entre mais na minha empresa a não ser trabalhando.” Eu digo: “Rapaz, eu pensei que lhe conhecia, mas agora estou vendo quem é a peça!” Aí ele partiu para me agredir. Partiu para me agredir, aí ele ia me dar um murro. Aí parei assim, olhei para ele e ele me empurrou. Me empurrou, aí eu fui para cima dele, segurei assim, aí quando eu ia bater a turma me segurou e tal, a turma do deixa-disso. Eu trabalhava de turno nessa empresa, era supervisor, me tiraram da supervisão, me tiraram do turno também e me botaram numa sala para trabalhar isolado lá. E como eu tenho a estabilidade da Cipa, chegou um ano depois ele me demitiram. Eu fiquei ainda no administrativo, aí cortaram meus adicionais, fui perseguido muito dentro da empresa...
SOLIDARIEDADE
A família dava apoio. Por exemplo, meus irmãos sempre davam apoio. Ficavam preocupados, com essa atuação... Eu tinha um outro irmão que era sindicalista também, do Sindicato dos Bancários, ele trabalha aí no Banco do Brasil. Esse foi o que me deu muito apoio durante a greve. Por exemplo, ele tinha... teve um período lá que ele estava com uma reserva de recurso que ele queria comprar uma casa, aí ele me deu esse dinheiro para comprar um bar... um barzinho que foi um período em que eu me mantive, de 1983 até 1986, mais ou menos três anos aí nesse bar. Não. Foi de 1984. Em 1984. De 1984 a 1986. Eu me mantive nesse bar. E era um bar em que a gente reunia até os sindicalistas. Um barzinho pequenininho mas o pessoal ia lá sempre, os sindicalistas... Inclusive teve uma greve em 1985 no pólo petroquímico, a primeira vez que parou o pólo, e... é... a gente deu apoio ao movimento, e os trabalhadores se reuniam lá no bar. De algumas fábricas. A gente reunia para discutir... A minha esposa na época era muito preocupada, ela tinha medo... ela tinha passado por um período bem difícil, que foi o início da demissão da Petrobras, mas ela não... Como ela via a minha persistência e a minha segurança em fazer os movimentos, ela não tentava me impedir. Mas colocava a preocupação com a questão da família. Por exemplo, quando eu saí da Petrobras, minha filha ainda estava estudando o pré, a pré-escola e eu não tinha como manter e eu tive que tirá-la da escola. Isso foi logo em 1983. Não tinha condições de continuar pagando, aí eu tirei ela da escola, a mais velha. O outro nasceu naquele ano. Aí fiquei até devendo na época muita coisa, e tive que tentar negociar esses débitos, para pagar depois, meu nome foi para o SPC. Uma série de problemas, e a gente conseguiu administrar, mas eu tinha esse negócio de que eu, eu achava que qualquer trabalho era trabalho, então eu sempre busquei pelo menos o essencial. O essencial da família, de manter a família.
CUT
É eu tinha dito que a gente continuou no movimento sindical, fazendo oposição. Aí teve a criação da CUT, e no próprio ano de 1983 a gente participou ativamente da... Eu participei da direção, da primeira direção da CUT Nacional! Eu fui... eu fiz parte da direção nacional e também estadual. É, como eu falei, tinha sido fundador do PT, participei também da Direção Nacional do PT

e tal. Então a gente continuava aquela luta. Teve a fundação da CUT, nós participamos.
EM BRASÍLIA
A greve de 1985 no pólo, nós demos apoio, participamos também! Participamos da campanha das Diretas Já! Todo esse movimento a gente sempre participando, a Constituição de 1988, a gente se movimentou, viemos a Brasília, dando respaldo aos parlamentares, passando informações de como as questões principais para a gente.Uma das coisas que a gente se bateu muito foi a criação de quinta turma de turno. O pessoal do turno, regime de seis horas. Então a gente continuou participando. Continuamos fazendo um trabalho lá no sindicato, no sindicato nosso mesmo, de oposição, porque quem tinha ganho a eleição era o Mário Lima, como eu falei, nós fomos ganhar eleição novamente em 1990. Então a gente continuou esse trabalho.
VITÓRIA!
A nossa reintegração se deu em parte pelo trabalho político que a gente vinha fazendo, porque foi a anistia de 1988 e pelo processo que a gente ganhou na Justiça também. Aí houve o acordo. Eu fiz um acordo, por exemplo, eu não recebi 100% do que eu tinha direito a receber, eu recebi 80% para voltar, porque para mim a preocupação não era o dinheiro, era o fato político de eu voltar para a própria refinaria em que eu sempre trabalhei. E aí como a direção do sindicato, era uma direção que a gente apoiou - eu não quis entrar na direção na época. Nós apoiamos, organizamos o pessoal e fizemos a chapa, aí nós fizemos um ato público no meu retorno. Houve uma parada do pessoal na entrada da refinaria, e foi assim um sentimento de vitória, tanto para mim como para a categoria. Porque via a... Mesmo quando a gente parava lá que eu ia dar apoio à greve, aí os gerentes chegavam para mim: “O que é que você quer aqui rapaz? Você não é mais da Petrobras!” Eu digo: “Não sou agora, mas vou voltar! E vocês vão me ver entrar aí!” Então, quando eu entrei na refinaria estavam todos eles lá, e eu mostrei: “Tá vendo? Eu estou de volta!” Foi assim um sentimento de vitória para a gente. Eu continuei trabalhando, meu interesse era voltar até para a própria Unidade. Mas aí eles alegaram que a minha Unidade não tinha mais, mas o meu interesse era voltar para a refinaria...
APOSENTADORIA
Eu fui trabalhar em outra Unidade. Era o mesmo setor, mas em outra Unidade de processo. Aí continuei trabalhando até 1995. 1995 eu me aposentei. E lá dentro mesmo eu continuei fazendo o movimento, embora eu não fosse das direções sindicais, mas participando de todos os movimentos, das greves, dos piquetes.
GREVES CONSECUTIVAS
Esqueci de contar um detalhe: que a greve de 1983, nós fizemos aquela, voltamos a fazer outra greve só em 1988. Então em 1988 nós fizemos já a primeira, a segunda greve depois do período militar. E de 1988 para cá a gente fez greve todos os anos, até 1995. Então nós fizemos greve em 1988, 1989, 1990, 1991 até 1995 fizemos movimentos.
GREVE DE 95
Em 1995 foi a greve de 32 dias. Estava trabalhando. Aí tomamos uma cacetada também! Muita demissão. Houve muitas demissões, perdemos os dias. Foi um enfrentamento com o governo Fernando Henrique, exatamente porque nós tínhamos assinado um acordo com Itamar Franco. Itamar Franco saiu e Fernando Henrique não cumpriu, aí nós fizemos aquela greve que foi também histórica, só que aí foi uma greve mais forte, nacional, praticamente todos os sindicatos de petróleo paralisaram. Foi uma coisa histórica também.
APOSENTADORIA
E nesse ano de 1995, depois da greve eu me aposentei, já em

setembro. A greve foi em maio, aí me aposentei em 1995.
VOLTA AO SINDICATO
É, eu continuei no movimento, e inclusive eu sempre pensei assim: que não há necessidade de ser diretor para fazer o trabalho sindical, mas os companheiros lá me cobravam a presença na direção, eu continuei. Eu voltei à direção em 1996, já na unificação dos sindicatos. Aí entrei na direção do sindicato e continuo até hoje! Mas não pretendo continuar, pretendo sair.

Já para o ano deve ter eleição lá no nosso sindicato.
AULAS
Inclusive eu estou estudando, voltei a estudar, estou estudando matemática, licenciatura...
E estou ensinando também. Sou professor de matemática. Que eu também aproveito para fazer o trabalho político, nas escolas onde eu ensino.
FILHOS
Aí como eu falei, eu me separei em 1998, aí casei novamente e tenho mais dois filhos, inclusive tenho um que vai fazer um ano agora dia 20 de julho, o mais novo.
MEMÓRIA DOS TRABALHADORES
A entrevista eu acho bom! A memória da luta. Não a memória de si, da pessoa, mas do que a pessoa representou em termos de luta, porque eu tenho uma preocupação, por exemplo,

quando nós entramos no sindicato nós trabalhamos no sentido de acabar com o presidente.
Do sindicato! É... porque a gente acha que o líder é uma coisa, são aquelas pessoas que vão aparecer naturalmente pela sua capacidade de trabalho, pela sua capacidade de intervenção, e às vezes a gente bota alguém como presidente e não é o mais adequado. Ao mesmo tempo, quando você tem o presidente todo mundo disputa chegar lá à presidência, então se trata de uma disputa até pessoal, ou um culto ao personalismo, e nós somos contra isso. A gente acha que a sociedade tem que ser igualitária e nessa discussão a gente não acha que tem que ter presidente, nada disso. Então nós, o nosso sindicato, por exemplo é uma diretoria colegiada em que todos são iguais. Não tem nem coordenador! Tem coordenações. As coordenações são por departamento. Então esse é o estilo de sociedade que a gente defende, que a gente implantou no nosso sindicato. Até quando eu fui do movimento estudantil foi a mesma coisa, a gente praticou isso no movimento estudantil. Não tinha presidente do diretório! Tinha coordenações também. Então eu acho que é essa prática que a gente tem levado. E agora eu acho que a história dos trabalhadores tem que ser viva e mantida, porque sempre quem contou a história foram os poderosos, e o trabalhador só é poderoso quando ele se junta ao demais. Então, perde aquela questão de ser um poderoso, mas são todos juntos a força dos trabalhadores. E essa história tem de ser contada. O evento que nós fizemos da greve de 1983 é nesse sentido, de manter acesa a história dos trabalhadores.
Foi num congresso aqui em Campinas. E é isso que a gente defende, essa sociedade igualitária, e sobre o aprendizado que eu tenho tido nessa luta é de sempre, a gente só consegue alguma coisa lutando, e os enfrentamentos têm de ser feitos, porque senão hoje quem sempre mandou e sempre manda, não é o poder político, é o poder financeiro! Poder do capital. E se nós não lutarmos, esse vai prevalecer! E a medida que a gente faz o enfrentamento, não no sentido de assim de destruir, mas construir uma sociedade igualitária, sem exploração e sem exploradores. Então é essa é a nossa busca e o que a gente almeja alcançar, talvez se a gente não alcançar talvez nossos filhos ou netos vão alcançar essa luta.