Museu da Pessoa

Trajetória por diversos ramos de atividade

autoria: Museu da Pessoa personagem: Diogo Queiroz Gadelha

Depoimento de Diogo Gadelha
Entrevistado por Valéria Barbosa e Manuel Manrique
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 04 de outubro de 1994
Transcrita por Carlos Alberto Torres Mattos

P - Bom, seu Diogo eu gostaria que o senhor iniciasse falando o nome completo do senhor, o nome dos pais do senhor, onde eles nasceram, a idade do senhor.

R - Pois não. Meu nome é Diogo Queiroz Gadelha, filho de Otávio Queiroz Gadelha e Esther Queiroz Gadelha, ambos os pais são da cidade de, segundo o local, Tapera, município de Aquiraz, Estado do Ceará.

P - E o senhor nasceu...

R - Eu nasci na Aracoiaba, Estado do Ceará também, é outra... uma cidade central do Estado.

P - Qual que é a data de nascimento do senhor?

R - 27 de fevereiro de 25.

P - E os avós do senhor?

R - Os meus avós são... tinha um de nome... chamava-se Raimundo da Costa Gadelha, e o avô paterno, materno, esse é o paterno, e materno se chamava Galdino Clementino de Queiroz.

P - E de onde eles eram?

R - São de Quixadá, cidade de Quixadá, no Estado do Ceará.

P - Seu Diogo, vamos falar um pouquinho da infância do senhor. Como era a cidade do senhor?

R - Filha eu... realmente infância... Papai era um homem que morou, como dizia ele, só com... a casa dele era o chapéu. Onde ele morou em várias cidades, no interior do Ceará, mas sempre com o comércio, né? E eu pequeno, estudando em poucas escolas primária e aí assim. E ele, eu me lembro quando a minha mãe faleceu eu tinha seis anos, seis anos e pouco. E papai fixou a residência dele e foi morar na, na terra primitiva dele, de nascimento dele, chamava-se Tapera, esse local onde ficamos aí até 38. É, foi de 31 à 38, aí quando a mamãe morreu ele veio e tal. E a minha infância foi de trabalho. Comecei a ajudar o papai, trabalho de ajudar o pai, a família, assim na lavoura mesmo. Nós... que nosso forte mesmo na época que é da época da guerra, foi da cera da carnaúba. Colhia, da colheita da palha até extração da cera, tirar a cera do pó, para dá a cera da carnaúba. Na época era um produto que deu bastante, a gente, praticamente, trabalhava seis meses num ano, e seis meses, nos outros seis meses não tinha quase o que fazer. Em relação da lavoura, a necessidade onde o papai e nós morávamos não tínhamos, era pouca lavoura. Então a gente viveu uns anos assim, até 1938. Foi quando nós viemos morar na cidade do Aquiraz. Aí o papai tinha um sítio, alugou um sítio grandão e lá produzia toda lavoura assim, inclusive a cana, a mandioca algum plantio, muito coqueiro. E aí ficamos até 42.

P - Nesse sítio o pai do senhor comercializava os produtos?

R - Comercializava os produtos, sim senhora.

P - E como era?

R - Farinha Para colher farinha ou coco negociava. Era farinha e pouca coisa, o que mais? A nossa produção de coco era pequena e não dava, não vou nem pensar nisso e mais o milho E a... Mas isso aí era, vamos dizer, no período da lavoura, porque no período da... o forte do negócio do meu pai era a carnaúba, a cera da carnaúba. A colheita dava de setembro a dezembro. Começávamos a coleta da palha, mas ficava lá de setembro a dezembro num período de não ter chuva. Mas, de vez em quando tem chuva o ano todo. Mas (risos) a época da colheita da carnaúba, da palha da carnaúba é nesse período, de setembro a dezembro.

P - E o pai do senhor, o senhor falou que ele tinha uma loja de secos e molhados?

R - É... isso foi no começo, quando ele... foi depois que ele enviuvou... que a minha mãe também faleceu , quando ele foi morar nessa cidadezinha, Aquiraz, mas tinha outro negócio pertinho que era, chamava-se Tapera, aí que ele tinha. Foi quando ele, onde ele viveu até muitos anos Até vir para esse sítio, nesse período de 31 a 60. Ah, 38 foi quando ele tinha essa bodega, chamava lá bodega.

P - E como é que era?

R - Era secos e molhados mesmo, filha Era vender farinha, feijão e mais o... carne seca, jabá... (risos) pirarucu... (risos) da época era isso. Um peixe, o pirarucu é um peixe, vem do Amazonas, era um peixe de cheiro muito ruim mesmo, mas só na época da seca, né?

P - E como é que os produtos eram vendidos?

R - Quilo. O tipo de comerciar, né? Comerciar... tudo era a quilo. Não existia, era o peso quilo ou o litro, medida A farinha era medida, o arroz não, o arroz era quilo. Mas a farinha era medida com a medida litro, né? Era medida a farinha era isso, o resto era peso. É isso a pergunta que você perguntou? Eu entendi? Então tudo bem.

P - Isso. Era a forma como eram comercializados os produtos. E o senhor ajudava o pai do senhor nesse, nessa loja de secos e molhados?

R - Não, até que não. Eu nunca participei. Nessa época eu tinha o quê? Oito, dez, oito anos, dez anos? Eu não tinha noção ainda, não nessa época da bodega. Em 38, foi quando ele veio para esse sítio, que ele alugou esse sítio, aí nós começamos a trabalhar na lavoura junto com ele. Ia à escola na cidade, que era a escola primária... A gente ia na cidade de Aquiraz, são mais ou menos uns quatro, seis quilômetros de distância, a gente ia a pé mesmo, que era muita areia, e no verão o calor danado O sol e a areia quente A gente ia com tamanco, a gente ia calçado, né? O tamanco lá era, o que é importante é o clima, o tamanco era por causa do clima. Muito bem. Aí a gente chegava, isso pela manhã, sempre era o horário de escola e quando nós voltávamos, eu tinha outros irmãos, tinha irmão mais velho.

P - Quantos irmãos?

R - Somos seis... quer dizer, então somos cinco, quatro homens e duas mulheres. Geralmente quem trabalhava era sempre eu e o mais velho na lavoura, junto com papai. Chama-se Raimundo.

P - E nessa lavoura, basicamente, qual era o produto?

R - Ah era mandioca, para extrair a farinha durante o ano.

P - E vendia a mandioca?

R - Vendia, vendia a farinha já, vamos dizer assim, explorava a fa... tirava a farinha da mandioca, ou seja, a massa da mandioca para fazer a farinha, né? Aí se vendia a farinha já feita, torrada.

P - E como era esse comércio seu Diogo?

R - Em que venda?

P - Isso...

R - É. Se vendia isso chamava-se alqueire, a medida era um alqueire. Cada município, cada cidade ou município tem uma medida para cada um, assim, tantos litros um alqueire. Nesse Município de Aquiraz, um alqueire de farinha era 128 litros. São quatro medidas que a gente põe, quer dizer, 120 quilo nós media nas medidas maiores de 120, divide aí também agora, 120 mais 32, três vezes quatro era 30 e pouco, 32 litros? 128 era, era? (risos). A medida de 32 litros, aí um alqueire, se vendia um alqueire de farinha, não era por saco de 60 quilo, não era comercializado, nessa época não tinha isso.

P - Vendia o alqueire inteiro?

R - O alqueire. É uma carga, quer dizer, um alqueire era, geralmente era dois sacos, era uma carga, põe no animal para gente entregar, porque não havia outro meio de transporte, era (transporte?) mesmo do animal .

P - E até quando que o senhor ficou ajudando o pai do senhor?

R - Eu fiquei nisso aí até... 42. Ficamos nesse sítio até 42. 42, papai saiu desse... entregou o sítio que era alugado, arrendado e veio para cidade, para cidade onde ele nasceu mesmo, chamava-se Tapera. Aí foi realmente explorar só a cera da carnaúba, ele arrendava propriedade de carnaúba para gente explorar naqueles meses do ano. De 42 fiquei até... 45, nesse trabalho. Trabalhava com ele na palha da carnaúba, e lavoura não tinha etc. Isso era só na cera da carnaúba. 45 resolvi ir para Fortaleza, eu e meu outro irmão, mais um outro irmão mais moço, ficamos, e aí arranjamos um emprego e fui trabalhar num balcão de uma padaria chamava-se "Nordestina". Isso eu fiquei lá, mais um ano, dois ano, um ano e pouco. Estava trabalhando no balcão e o papai morando nessa tal Tapera, nesse lugar, no município de Aquiraz. Quando foi mais uns anos depois o papai resolveu também sair dessa cidade, ou desse local, localidade de Tapera, e veio para Fortaleza. Comprou uma mercearia grande na cidade de Parangaba, bairro, subúrbio de Fortaleza. Aí ficamos aí até... e eu já, nessas alturas, eu já pensando em voltar, em vir embora sair e vir embora.

P - Sair do Ceará?

R - Sair de Fortaleza, do Ceará. Já pensei em 46, 45, 46, mas papai não gostava, não queria o filho... então me segurou um ano, por ele não querer que eu viesse. Mas cheguei em 1947 e disse: "Não papai, eu vou embora, vou tratar... aqui não tinha mercado... Fortaleza é pequena." E eu tinha, vamos dizer, família mesmo, por ele, por minha mãe, por outros familiares, inclinação para o comércio, né?

P - Além do pai do senhor existia outros comerciantes na família?

R - É na família era tudo, tem um passado, a família de comércio. Então eu resolvi ir embora, e disse: "Não papai, vou." Então conclusão: aí eu tratei de viagem, tirei documento, identidade, tudo que naquele tempo... Aí eu consegui, resolvi vir embora. No dia 13 de junho de 47 embarquei num navio, porque eu vim de navio. Aí tem (risos) uma brincadeira que eu sempre, eu comento: o outro pergunta: "É você veio..." "Eu vim de navio, eu vim de terceira porque não tinha quarta" (risos) Então eu vim para o Rio, cheguei no Rio 13 dias após, no dia 26 no mesmo mês, fiquei uns.... trouxe umas carta, trazia uma carta de uma recomendação para uma pessoa, um conhecido lá, porque eu fiquei também ... de primo também, na época fiquei hospedado um mês na casa desse primo. Então eu trazia uma carta para uma pessoa que é cunhado do meu tio. O meu tio era o Genésio Queiroz, que é o pai do Edson Queiroz, do Ceará. Então, ele trabalhava, era funcionário público da Prefeitura do Rio, e trabalhava à tarde e à noite no Rei do Pão de Queijo, numa padaria. E aí foi quando ele até me arranjou, eu trabalhei lá um mês, dois meses, que eu trabalhei lá, aí foi que eu fui para camisaria, não gostei do ramo. Então eu passei uns dois meses na padaria no Rei, no balcão mesmo. Aí foi quando eu fui convidado para essa camisaria, essa padaria foi coisa passageira, rápida. Aí vim, vim para essa camisaria. Quer dizer, o primeiro contato com essa pessoa, passei esses dois meses, daí eu fiz um conhecimento, inclusive esse cearense, que era o gerente, que me convidava, me convidou várias vezes, porque o tal português que era o patrão dele, o dono da loja, nessa época ainda era pequena, tinha três vendedores que da qual ele só punha cearense, porque ele era casado com uma cearense (risos) também e, ele se adaptou bem... os cearenses no comércio, e só saia um para por outro cearense. Então eu fui um dos talvez, últimos.

P - Como é que era o nome dessa camisaria, o senhor lembra?

R - Casa Félix.

P - E quanto tempo o senhor ficou lá?

R - Fiquei lá quatro anos.

P - E como é que era o comércio?

R - Olha, era um comércio só vendas... só camisas de colarinho, naquele tempo, principalmente no Rio de Janeiro, comerciava muito paletó e gravata, né? Camisa se falava em venda, camisa esporte nem se falava, era camisa para por gravata, colarinho. Camisa, alguma coisa de cueca que a gente vendia, porque não tinha outra coisa. Não tinha bermuda ou short de banho e era só, não tinha muita variedade. Existia os lates como chamava eles, uns blusões de algodão e brim, assim, para substituir o paletó. Pessoas que para fazer... mas era só, o comércio era muito restrito, a variedade de roupa naquele tempo.

P - Como é que era a embalagem? Existia papel de presente?

R - Existia.

P - Como é que era?

R - Existia, existia, folha de papel de presente existia, e era... Mas cada camisa vinha numa caixa, né, como ainda hoje vem. Não é usado aqui mas vem sempre em caixa. Ou então vinha num envelope plástico, papel de seda como nós chamávamos antes.

P - E o senhor ficou então nessa camisaria...

R - Fiquei. Fiquei nessa camisaria quatro anos e tanto. Aí foi o tempo que eu, isso é, foi de 47, já era 60, 51. Em 51 vim conhecer São Paulo, passear. Fiquei hospedado nesse tal lugar (risos), no mesmo local aonde eu vim trabalhar depois.

P - Conta como é que foi.

R - Aí foi uma história comprida. Aí foi uns contatos que eu vim passear com mais uns amigos, que moravam na mesma pensão do Rio. Que um deles era acadêmico de Direito e filho desse casal que morava aí e nos convidou enfim. Entusiasmamos e viemos numa data, dessas próximas do feriado de finados. Passei uns, passamos uns três, quatro dias aí, e o final foi a minha vinda à São Paulo, definitiva, foi quando esse senhor da casa que ficamos hospedados. Era um comerciante, tinha uma loja de cama e mesa muito bonita, grande, lá na Celso Garcia, o número eu já citei para vocês, em frente à Igreja São João Batista, isso já passou, não existe mais a casa. Aí ele... foi num dia que... eles gostavam, eu não, eu nunca gostei de passar a noite sem dormir. Poucas noites sem dormir na minha vida eu passei. Não passei, até ontem, não passei meia dúzia, não consigo. Conclusão: naquele dia eu tinha passado uma e outra, ido dormir muito tarde, então conclusão: quando foi no dia da véspera da viagem, ir embora, foi quando eu, eles inventaram lá de ir no cinema às sete horas da noite, jantar lá. E eu digo: "Eu não vou." Eu não agüentava mais. Conclusão: eu não fui e eles foram, mas nisso fiquei conversando com o patrão, o pai dele, o tal dono da casa, que era o dono da loja, eu já tinha conhecido a loja. Eu fui e fiquei conversando com ele, conclusão: desse sono que estava aí, 7 horas da noite e eu dormindo na mesa, fui dormir era 1 hora da manhã, conversando com o português. Mas, nada eu pensei em sentido diferente, pensava de vir. Voltamos no dia seguinte para o Rio, passei o mês de novembro todo no Rio, no dia 29 de novembro viajei para Fortaleza, de férias. Já tinha saído do emprego, o compromisso na loja já tinha acabado, já estava desempregado e vim, para isso que vim nesse passeio, então eu fui passear. Eu fui para o Ceará, havia cinco anos que eu não via meus pais, meu pai, né, minha mãe eu não tinha mais. Então eu fui, passei um mês em Fortaleza e voltei. Quando eu cheguei ao Rio, em janeiro de 52, estava aí um convite dele e um telefonema, um telegrama, naquele tempo era muito difícil telefone. Ele me convidando para vir para São Paulo trabalhar com ele. E eu tinha, recente, estava chegando de volta, sem ainda local certo de trabalho, eu tinha gostado também de São Paulo, não só pelo São Paulo, pelo clima, porque o clima de São Paulo quando eu cheguei aqui, como eu sempre digo, em novembro, eu dormia coberto porque lá no Rio era diferente. Conclusão: ai eu cheguei, vi o convite, analisei que podia me servir. Então vim conversar com ele em São Paulo, eu vim em São Paulo, logo isso no fim, no princípio de fevereiro, antes do carnaval. Aí vim, acertei com ele, ele me fez uma proposta boa, não digo boa em termos de salário porque, nesse tempo, era conveniência de si mesmo. Eu sei que você, eu morava na pensão, mas eu havia sido o primeiro hóspede na pensão, era uma pensão boa, e um ambiente bom, então quando eu cheguei aqui, ele falou assim: "Olha, eu sei que você... pensão aqui em São Paulo... - na época naquela região do Brás - não tinha igual a sua que você mora lá, da qual morava o filho dele também, que era acadêmico de Direito. Então ele: "Não, não, não posso, nós aqui não temos, então eu vou lhe oferecer, o senhor vem trabalhar e vai morar conosco com cama e mesa." Então, ainda melhor, porque facilitou tudo, né? Conclusão: cheguei, fui ao Rio, me desfiz de algumas coisas que tinha trazido lá. Veio um irmão comigo nessa viagem, quando eu vim de passeio, fui a passeio, veio um irmão comigo, que ainda hoje, continua comigo lá na loja. Então desfiz, voltei, marquei logo até cheguei aqui na véspera de carnaval, não quis nem mais ficar no Rio. Carnaval, tinha ficado quatro anos no Rio, não quis mais outro carnaval no Rio. Aí tem uma história que não tem nada com a minha...mas eu vou até mencionar. Que nesse dia, nesse carnaval de 52, eu estava recém-chegado, não conhecia ninguém, não conhecia São Paulo, eu estava num... chovendo, porque ali naquela Avenida Celso Garcia, naquele tempo tinha muito público, muita gente passeando, carnaval, os bondes cheios, etc., etc. Nisso estava... agora eu estou passando de uma coisa para outra (risos), mas agora eu vou falar... chovendo, e a loja que eu trabalhava, a gente tinha um recuo que, morava também lá, né, nos fundos era a nossa residência. E ia passando... chovendo... aí entrou três moças. Olhei as três moças, aí eu levantei, ofereci a cadeira, olhei para elas, ofereci a cadeira para uma. Não Não quiseram. Aí me levantei e ofereci minha cadeira para uma delas. Conclusão: aceitou, ou não aceitou, não sei, essa mulher, essa moça hoje, é minha mulher (risos) e há 40 anos de casado 39 de casado É, isso logo no primeiro dia de São Paulo. Conclusão: eu fiquei nessa loja, vim para aí e fiquei cinco anos nessa loja.

P - Como é que era o nome dessa loja?

R - Casa Lince, na Avenida Celso Garcia. Então eu fiquei um homem, o tal português, um homem muito competente, muito honesto, aí adoeceu ficou com... teve derrame. Aí a pessoa mudou. Mudou tudo Mudou não só a fisionomia e também mas queria praticar outras coisas com empregados. Aí eu falei: "Não senhor Mesquita, não foi assim que o senhor me ensinou." Então, naquele dia que eu fazia cinco anos, eu pedi demissão. Saí, saí e ele acertou tudo comigo, eu era gerente, tinha uma participação nas vendas geral. Então eu saí e fui arranjar emprego, já casado, eu me casei em 55, não sei se precisava falar disso.

P - Pode falar, sim.

R - Pois é, eu era casado nesse tempo e nascia... logo depois, aí veio essa menina que está aí (risos) Que ela veio em 65, em 58. É, eu me casei em 55 e ela nasceu em 58.

P - A Maria Clélia?

R - É, é a filha mais velha. Bom, conclusão, ela já era nascida, não, ela não era nascida, ela nasceu em 65, em 58. Aí eu digo: "Eu não vou mais." Andei... arranjei um emprego ainda aí na... aí na... Santana, por intermédio de um cearense amigo meu que tinha trabalhado lá nessa mesma loja, onde só trabalhava cearense (risos) no Rio de Janeiro. Por coincidência eu não vi mais essa pessoa, muitos anos. Ele me arranjou um emprego lá em Santana para vender tecido, camisaria, só roupas, só tecido por metro. E eu fui, fiquei lá três meses, mas vi que não me adaptava. O homem lá era muito... não sabia ganhar dinheiro não. Só trabalhava assim: ele comprava por dez marcava 12, vamos dizer, dou um exemplo. Mas, se não saía, ia baixando, baixando, até vender por nove. Custou dez vendendo por 12, mas não saindo ele ia baixando até chegar a nove, não ganhava dinheiro ele nem eu. Então eu, aí eu senti que isso não ia ser nunca... Depois, não sei, ele quis me dar uma loja, uma gerência de loja em Osasco, eu disse: "Não meu filho, não é meu tipo de negócio não, eu gosto de vender coisa de ganhar dinheiro." Sentindo aquilo ali... Fiquei três meses, no dia em que eu pedi minha demissão ele falou:"Não seu fulano, não vou, seu Gouveia." É da família da Paraíba que se chamava-se Gouveia, faz tempo também, também eu sei que ele faleceu. Bom, conclusão, fiquei três meses, saí, aí comecei pensar em não ser mais empregado. Tinha um capitalzinho... tinha economizado um capital esses anos, como antes de casado que eu fiquei morando com cama e mesa, minha filha, nem pasta de dente eu comprava Então eu fiquei, tinha um capital aí aplicado, morava com minha sogra, né, a renda que eu recebia, de renda, de receita do dinheiro aplicado, aplicado em termo, né, não deixa de ser aplicado, mas estava emprestado. É que naquele tempo (risos) (tinham confiança?) Aí eu... dava para viver e dava para pagar a pensão de minha sogra, já casado. Fiquei lá morando com ela uns anos. Depois saí, passei um mês, dois e até que eu cheguei um dia e ela, grávida dessa menina, estava chorando. 6 horas eu cheguei. Estava procurando, pensei. Mexi com tudo para ver como era o negócio que surgia, inclusive até merceariazinha, naquele tempo existia muita mercearia em São Paulo, depois eu vi que o dinheiro não dava, saí da mercearia e, por força do destino, um dia eu passando ali, pela... A história é interessante, é. Eu passando pela Praça da Sé, ali ao lado, olhando da Praça para a esquerda, tinha uns prédio muito velho, onde tinha o cinema Santa Helena, coisas assim, esses prédios escuros, aqueles corredores escurão e lá no fundo e aí um dia, um calor, aquele sábado e eu ia: "Deixa eu entrar aqui para tomar um guaraná." Eu cheguei no balcão e pedi um guaraná, e lá no fundo tinha um cara, uma charutariazinha, pequenininha, o cara lá, aí eu vi lá, e eu olhando, tomando guaraná, observei aquilo. Aí eu olhei, vi que ali era um ...mas todo mundo: "Me dá isso de fumo, me dá uma palha para fazer cigarro." Chamava-se columi, dava isso, era uma porção de coisas que eles iam pedir. E eu só olhando. E vi que... e dinheiro entrando, tudo barato naquela época lá. E eu estava em pé assim, e o homem já tinha atendido todos os clientes e ele me dirigiu-se para mim e perguntou: "E o senhor? Senhor ou você, como queira dizer." Aí ele... e eu disse: "Nada Eu estou observando. O senhor vende isso?" Eu estava na época procurando negócio, né? Aí ele me respondeu assim, com muito irônico, com ..."Vendo por 70 conto e à vista" Bom, já vi que aquela não me servia porque não era meu negócio, queria uma coisa melhor. Aí eu saí atrás de charutaria, aquela foi a... me abriu a idéia, foi aquela ali. Aí saí atrás, passei dois, três meses vendo uma e vendo outra, e outros dizendo que não prestava, encontrei uns amigo, não conhecido, conheciam o ramo, que até um alagoano e ele soube que eu estava comprando essa na Xavier de Toledo, ali onde estava Restaurante Ferrari, Rotisserie Ferrari. Aí ele: Ah mas lá não presta, é vizinho do Imposto de Renda Mas enquanto isso eu esperei e procurei outras, porque disseram que lá não prestava, que tinha alguém que tinha falido lá Tá bom, passei um mês procurando outra, mas não encontrei nada que me agradasse. Um mês depois eu vi um anúncio no jornal, o mesmo anúncio, a mesma charutaria o cara pôs à venda. Eu já conhecia, já, aí eu digo: "Tá bom." Voltei lá. Fulano não sei o que, o senhor Manoel, o português. "É, tá sim senhor, tá. O negócio é réis... Naquele tempo era cento e tanto, e agora eu lhe faço 130 conto. Nesse tempo era conto, né? Aí disse: "Está bom, está bom." Aí eu, como sabendo o negócio como era, era de cômodo fechado era o que estivesse dentro, né? Aí eu: "Tá bom." Saí, saí por ali, peguei o ônibus, naturalmente, né, e vim em casa e peguei uma parte de dinheiro e cheguei 6 horas e: "Tá bom, vamos fechar negócio" "Não", precisava chamar o dono do... Enfim, acertamos o negócio, eu paguei aquela parte e ia pagar o resto na entrega, com oito, dez dias ou 30 dias para ... Porque ele ficou, eu não conhecia nada, eu não fumava. Como não fumo, fumo cachimbo hoje para promover o produto, na época. Então não sabia nem que existia cigarro americano, não sabia de nada. Aí ele disse: "Não, eu fico", disse que ficava 30 dias comigo para me ensinar.

P - E o que é que o senhor vendia, basicamente, ali?

R - Ah era o cigarro

P - Fumo de rolo?

R - 90% da venda era cigarro, filha, e 80% desse cigarro era Souza Cruz.(risos) Conclusão: aí eu fiquei, bati o martelo naquele dia e no dia seguinte, que era 19 ou 21 de junho, de julho, de junho, que era festa móvel, era feriado no dia seguinte. Eu fechei o negócio, assumi no dia 22, 23. Aí ele ficou lá um mês. Mas com oito dias depois eu já senti falta lá de um negócio, até de uma marca de gilete (Tim?). Era uns pacotes de gilete assim. Mas eu vi que ele já não sabia onde estava mais nada, quando aí ele foi chegando naquele dia para ajudar, aí eu não deixei ele entrar mais. "Então Manoel, eu o chamava por senhor Manoel... Não, pode deixar. Não, Não. Não precisa mais, eu já sei tudo, já conheço já Se ele entendeu o por quê, não sei. Mas, aí também eu assumi e fiquei . Essa charutaria, eu fiquei 12 anos com ela.

P - Seu Diogo, quem é que era a clientela dessa charutaria?

R - Ah era bom, era fiscal de Imposto de Renda... naquele tempo ali vizinho, de Imposto de Renda, que era turma do Imposto de Renda. Os tais que tiveram problema depois com a Receita Federal, que naquele tempo era fiscal de consumo, também né? Mas lá era só Imposto de Renda. E era o pessoal de bares, escritórios, por ali tinha restaurantes, tinha o bar também, mas a clientela boa era essa. Boa, quer dizer, é por isso que eu digo, eu sou, eu me adaptei a vender aí, vendendo coisas de cigarros, digamos dos mais caros, vamos dizer, pouca gente comprava, lá não tinha cigarro para comprar, aquele cigarrozinho barato que era da... como é que chamava? É, era uma freguesia boa, boa, educada, era gente de... IPASE e Imposto de Renda que eram os dois prédios ali vizinhos. Então aí eu fiquei com essa charutaria... nesses 12 anos que eu fiquei na charutaria, mas antes disso foi quando eu abri a loja da tabacaria, isso foi em 63. Em 68 foi quando eu desfiz das duas, né? Vendi a charutaria e a tabacaria, foi quando eu já fui para o Shopping.

P - A tabacaria onde é que era?

R - Na Sete de Abril, na Rua 7 de Abril , 125, loja 31.

P - E era o mesmo estilo da...

P - É. Era o mesmo estilo não. Quando eu montei essa tabacaria não era igual ao da charutaria. Lá era mais... era para vender cachimbo, vender isqueiro, caneta... e peças assim mais, como o cachimbo, porque o cachimbo precisava ter um balcão maior. Era uma loja mesmo, específica mesmo para fumar assim, como tinha espaço. E vendia né, lá eu acho que nem cigarro, tinha cigarro lá, mas não era venda de cigarro. Lá era, charuto, o sortimento de charuto era muito grande, os charutos eram... naquele tempo que tinha começado, que existia era o Caruzo. Caruzo era uma grande tabacaria da época Quando eu comecei ele estava terminando, porque ele já estava. Então, conclusão: o Caruzo, a Tabacaria Caruzo antiga, mas acabou também. Ainda hoje tem uma loja de uma filha dele aí na Augusta, uma travessa da Augusta, mas não foi aquilo como era antes. E era somente vender só para fumante, só cachimbo, isqueiro e fumo para cachimbo, fumo importado, na época havia importação. Depois foi exatamente quando eu saí, quando eu vim para, mudei de... saí para Xavier de Toledo de lá para o Iguatemi, onde depois parou as importações. É isso que me preocupo tanto, com a liberação de produtos importados, que não venha acontecer o que aconteceu nessa década, nessa época de 70 até 70 e pouco e aí acabou. Aí ficamos trabalhando com mercadorias de reposição, de reposições etc. Aí eu também acabei e vendi as duas lojas. Mas aí eu já tinha comprado a loja, a Center Sport.

P - Tá. Como é que foi essa história? Vamos voltar um pouquinho. O senhor estava na Sete de Abril?

R - É, aí surgiu os clientes, você também, heim? (risos) Surgiu os cliente, onde tinha um senhor que era até um jurista do Estado, doutor Rubens Gomes de Souza, era uma pessoa maravilhosa, educado, falava com uma maciez, era um senhor, vinha comprar, ele vinha comprar cachimbo, fumo. Isso, aos sábados ele vinha, porque naquele tempo se chegou uma época que o comércio aos sábados, o comércio abria um período do sábado, mas ficava, liberava as ruas e estacionamentos, podia estacionar como hoje também parece que é assim, voltou isso agora. Aos sábados é liberado todo o estacionamento. Então vinha, mas tornou-se difícil, ir lá era difícil já também. Nisso existia a Rua Augusta já com, no auge da Rua Augusta. A Augusta passou um tempo no auge, né? E nisso surgiu o Iguatemi. Isso já 65, sessenta e... é, inaugurou em sessenta e sete... e oito 66 inaugurou o shopping. Então, ele: "E aí senhor Diogo, o senhor vai para Augusta, ou vai para o shopping?" E eu, como tinha, como tenho ainda, umas cota inicial, eu sou, fui comprando, eu comprei umas 30 cotas do Iguatemi ainda diretamente da construtora, por intermédio de corretor, pagando em 20 meses, pagava 200, 20 cruzeiro por mês, por cada cota. Então eu fiquei, porque já tinha e ia incentivar. Aí eu digo: não era pelas cotas que eu quis ir não. Eu fui lá, fui conhecer o shopping, já inaugurado, já não tinha. Chego lá encontrei um amigo que, da qual, era do imposto de renda da época da Xavier de Toledo mesmo, com a loja. Aí essas lojas, na época, era muito, vamos dizer, ninguém acreditava porque, o shopping para inaugurar isso, primeiramente foi vendido as ações, assim, individual assim. Olha, para você ter uma idéia, o shopping inaugurou em 66, quando inaugurou o shopping tinha 18 mil acionista e estes acionistas, em termos, que eu chamo acionista, tinha uma cota, duas, três. Uma cotinha que tinha sido, custado inicial 290 cruzeiros, cruzeiros real, cruzeiro. Muito bem, e eu tinha comprado aquelas 30 e estava pagando. Aí depois eu comecei a comprar, foi me entusiasmando e fui comprando de outras desistências e aí passei a comprar mais barato do que o preço de lançamento. Acabei comprando e fui lá conhecer esse shopping. Cheguei lá, encontrei essa pessoa e ele já pôs logo à venda quando ele soube que eu estava perguntando. E aí: "Eu vendo a minha Diogo etc., etc." Aí fiquei por ali. E ali eu fiquei mais uns meses estudando. Indo lá, não ia nem lá falar com ele para ele pensar que eu estava indo lá atrás da loja dele. E eu fiquei sentindo o negócio.

P - Qual que era a loja dele, senhor Diogo?

R - Era, chamava-se Multi Sport, no mesmo local daquela, só que era menor, ali eram duas lojas, a atual hoje ali eram duas. Aí ele pegou e eu cheguei um dia mesmo e fui lá. Cheguei e falei com meu irmão, eu disse: "Olha, o negócio aqui, acho que nós vamos mesmo vender e vamos para o Iguatemi. Existe isso, isso, isso." E eu fiz, pedi uma opinião, até para um português que ainda tem uma lojinha em frente, foi eu que trouxe ele. Aí ele, aí todo mundo me apoiava, né? Bom, chegou um ponto que aí eu cheguei um dia lá com essa loja, fomos lá fazer negócio. Aí o homem sentiu que eu ia comprar, comprar, aí entusiasmou. Aí eu quis dar um sinal e ele não aceitou: "Ah, porque tinha estoque." Eu disse: "Tá bom. E o estoque é no balanço." Aceitei tudo, tudo como ele quis, mas para... eu só disse que eu aceitei mesmo no dia que consegui dar um sinal para ele, para segurar negócio. Eu fiquei com medo, porque aí não era, porque tinha muitas outras, podia ter outras, mas um local daquele ali, onde eu estou hoje, não era, não tinha. Tamanho, espaçosa e um local bom, uma boa vitrine etc. Então eu fiquei nessa loja, e aí comprei essa loja demos o balanço. Isso já foi em 68. Em março de 68, dia 15 de março de 68. Demos o balanço e assumi a loja no mesmo dia. Paguei para ele o custo do balanço, que naquele dia daquele balanço era 15, era 16 de março de 68, que era sábado. E o moço, e o moço que me vendeu fez questão, naquele sábado eu assumi até as vendas, para facilitar balanço, para dividir o aluguel direitinho, pôr tudo na proporção. Aí eu vi que o cara não era, porque fez questão, tanto... muito minucioso, entendeu? E não... Naquele mesmo dia eu ganhei dinheiro Choveu e na hora que estava dando balanço, eu senti como estava arrependido. Aí ele trouxe, pôs no balanço coisa quebrada, coisa suja, inclusive eu sempre falo para outras, (risos) que existia um chaveirinho nessa época, chaveirinho, chamava-se Mooug, chaveirinho, e ele trouxe lá uma porção daquilo tudo sujo "Mas fulano, isso aqui... Chama-se Castro Reis."Não, não, Castro Reis era o outro, João Alves. É o Castro Reis. Aí eu disse: "Ah, isso aqui" "Ah, não Diogo." Aí foi quando ele: "Você quer dar, você quer dez mil para desistir do negócio?" E eu disse: "Não" Aí eu entrei com outra jogada e lembro: eu tinha um irmão que tinha tido um problema de enfarte. Aí eu disse: "Não, isso daqui eu comprei porque meu irmão vem, está morando aqui perto, é para ele." Porque ele morava aqui perto do shopping. Aí eu senti que o homem, se eu apertasse mais abria o bico. Aí eu aceitei tudo que ele trouxe, até quebrado e paguei tudo direitinho. Não tive... (risos) Quando eu senti que ele ia abrir o bico, que já estava... aí eu... pronto, não aceitei mais. Nesse mesmo dia assumimos a loja de esporte. Mas eu, a minha finalidade era pôr produto de fumante, como eu tinha na cidade e de fato eu trouxe. Chegou a um ponto de ter uma vitrine enorme só artigo de fumante. Passou a ser uma loja, o atual Center Sport na época, sempre foi Center Sport, era 90%, 80%... Eu cheguei uma época olhar paras vitrina, cheguei a contar: tinha 2% do produto nacional. Então naquele tempo não vendia quase roupa de esporte, a raquete que existia era importadas. Tudo na linha de fumante, tudo era importado, a não ser o cigarro, era Souza Cruz, mas cigarro era mixaria. Então eu aí, eu me estendi no ramo, fui aumentando para o... cheguei mesmo ficar com 80% artigos de fumantes, mas presentes também, né? Aí, apareceu muita importações, com essa liberação de importações, apareceu muita coisa, né? Até hoje me aconteceu um caso que hoje, deixei na pasta, nem fui levar lá para o Isaac, para o Isaac (risos) consertar. Eu fui sair de casa, um relógio que eu tinha na época, um relógio digital, a minha empregada disse: "Seu Diogo, aí o relógio." O que é dona Elizabeth?" "Ah, o relógio." "Mas dona Elizabeth, isso não tem mais conserto" "É seu Diogo, foi quando eu cheguei. Faz 23 anos que eu estou aqui e o relógio está funcionando" (risos) Eu dizia e eu comecei a trabalhar com tudo isso que aparecia na época: balança para banheiro, olha, foi um absurdo

P - Tudo importado?

R - Tudo importado. Depois, aí fechou as importações. Foi acabando. E aparecia uma coisa: reposição, aquele jeito, né? Uma parte com nota, outra não tinha mais nota, era sem nota mesmo. O que podia se fazer, mas peças grandes acabou. Aí, eu resolvi o quê? Parar e voltar estritamente ao esporte. Foi no auge do esporte E eu peguei o esporte no auge. Procópio é o homem no sinônimo de Procópio, no esporte técnico. E ele tinha uma loja no Iguatemi e ele um dia ele achou que apareceu um comprador, precisava vender, o preço que ele me pediu não tinha quem pagasse, mas ele achou que eu tinha de pagar um "x" para ele, que esse "x" com 5 milhões, que ele estava pedindo, esse "x" correspondia a um milhão que seria 20% para mim pagar para ele, com um ou melhor, cooperar com o comprador da loja que era para outro ramo, e eu ficar sozinho com esporte só no Shopping Iguatemi. No auge do esporte. E eu não fui brigar com ele porque eu nunca entendi de onde é que ele foi tirar isso Nunca se conversou isso Nunca pensei que existia estas condições, ou melhor essa chance E aí quando ele me propôs isso sim aí, mas eu não desmenti ele, não podia dizer que ele sonhou, qualquer coisa, não. Eu senti que o negócio é, era bom, então: "Muito bem, vamos conversar" E de fato, conversamos acertei e paguei um milhão de cruzeiro à época para completar a Breno Rossi completar, foi a Breno Rossi que comprou, que pagou os cinco milhões para ele.

P - Já naquela época vendia camisa de time?

R - Tudo Já E quando eu abri eu entrei no esporte e já tinha tudo. Não é uma loja de esporte assim como na cidade, vende muita camisa de futebol para time de rua, de várzea, como chamavam, né, ou chamam, não sei. Não O meu caso era como é hoje. Era mais para garotada dali, daquela região. Só mocinho rico, garotos ricos, mas vender mesmo... O que eu sempre digo: tinha... tem loja que ainda hoje que, o que eles vendem num mês de artigo de camisa para futebol assim, de várzea, eu não vendia nem em um ano É, meu negócio era vender coisa assim, mais, vamos dizer, mais clássico, mais, vamos dizer, camisa da CBF, camisa de um time, mas não assim, vendia camisa para bordar Eu não mandava bordar, ninguém e eles tinham... Ah Porque de repente vendiam, como vendia dez, 12, 15 jogos, como tem ainda hoje. Mas eles vendem as camisa, mandam bordar. Eu não, não tinha estrutura para isso e eu nunca quis. Então eu fiquei mesmo com, só com o varejo, estritamente o varejo para atender o cliente, que, em outras palavras, classe A do Iguatemi. Nessa época era isso. Aí eu saí de todos os produtos importados e fiquei, e aí disse: Não vou, até eu dei um emprego a um irmão que é muito apaixonado pelo artigo de fumante, como adoro um cachimbo etc. Entendeu? Mas ele não quis nunca entrar num... e quando dava: "Não, Geraldo, não dá." Vamos voltar para o esporte mesmo e... Aí entramos, como se diz, com corpo e alma no negócio Aí fiquei, aí a pouco tempo saiu o Procópio e eu fiquei cinco anos sozinho no Iguatemi E só tinha de shopping o Iguatemi, porque o Ibirapuera veio depois, né? Em 77 parece que inaugurou o Ibirapuera, por aí, eu lembro mais ou menos, veio depois o Ibirapuera. Aí, filha, eu fiquei sozinho. Eu já tinha até, vamos dizer, de não poder ver aquilo, aquilo era cheio, o comércio era uma coisa tremenda O clima, a nossa loja era cheia, de sábado era um inferno E na época que não se podia trabalhar por causa de horário, aí chegava uma hora tinha que fechar. A Prefeitura chegava: "pam", tinha que pagar depois a multa. Eu andei comprando fiscal, comprando não, ficar um pouco aberto até duas hora ou quando tinha gente. Olha foi uma coisa assim, que veio uns anos de negócio e eu aproveitei Aproveitei e investi e não passeei não, porque não tinha nem tempo. Até por sinal, e eu comprando cotas no Iguatemi, aparecia e eu investia comprando cotas. Todo mundo... aí com o tempo foi crescendo... aí os outros shopping, o povo, os outros lojistas... iam para os shopping comprando lojas e eu fiquei só no Iguatemi, e investindo assim, em loja e em alguns imóveis, também. Mas no shopping as cotas do Iguatemi. Digamos assim, eu passei épocas, anos e anos só eu que era comprador. Aí começaram a sentir e a aparecer um ou dois, três ou um lojista comprar e eles começaram a sentir que eu estava... Então surgiu, quando surgiu já bem depois, quando foi vendido o shopping para o Carlos Jereissatti, que era da La Fonte, isso já foi em 79 parece, é 79 eram 12, 13 anos que ele tá lá. E ele entrou lá, comprou a administração para administrar e comprou o outro, que a própria empresa do Alfredo Mathias estava em situação difícil e comprou um outro shopping deles, em Campinas. Lá era propriedade dele uma parte, 70% e aqui era desse jeito; que estava ainda, vamos dizer, quando o Carlos Jereissatti entrou não tinha os 18 mil proprietários mais, mas não tinha menos de 15, porque o único comprador era eu na época, né? E foi aparecendo um ou outro comprando umas cotas, depois que o Carlos entrou, o Carlos também, nem ele interessou também, o Carlos Jereissatti que eu falei que era da La Fonte. Depois que ele sentiu, que ele pensava que Campinas era a menina dos olhos, que ia ser um show. Aí ele sentiu que o Iguatemi que era , aí ele começou a comprar cota.

P - Senhor Diogo...

R - Comprando cota, comprando cota, aí ele foi... quando, eu sempre digo: Eu vivia tão bem no Iguatemi Porque, de cearense só tinha eu., no comércio só tinha eu. Tinha empregados, tinha, mas como lojista só tinha eu, e comprando cotas. Mas, aí quando surgiu o Carlos Jereissatti, que é cearense, aí eles disseram: "Ah, acabou." Cearense é como ir para São Caetano, só outro para arriscar, entrou outro, aí ele faliu. (risos) Acabou, ele ficou liderando o negócio, mas até hoje eu vou indo bem.

P - Senhor Diogo, eu queria que o senhor... Bom, o senhor ficou, trabalhou muitos anos no centro, quando tinha tabacaria e foi para o shopping; quer dizer, o senhor tem esses dois momentos...

R - Foi esses dois locais, a não ser aquele emprego que tive lá no Brás, naquela loja.

P - Isso, eu queria que o senhor falasse um pouco sobre isso: as diferenças. Como é que o senhor vê essa, se o senhor vê diferença?

R - Eu não vejo, não vejo nada diferente As oportunidades existem para todos, como há hoje, sendo até mais fácil, porque você hoje entra num negócio desse, e aí vem um, nessa época, no período da inflação, vamos dizer de 120 dias para cá que não tem inflação, você comprava a mercadoria por dez, no dia seguinte valia 12 e assim ia e foi uma facilidade que eu digo, sempre foi muito melhor. E nessa época que eu comecei não, não existia isso. Existia era um trabalho assim, vamos dizer que fiz alguma coisa no ramo, pequeno, eu comecei pequeno e continuo, mas um trabalho mesmo feito com muita honestidade e economia. Eu sempre fui um homem econômico. Não passava fome na minha casa, graças a Deus até hoje, foi sempre... mas eu? Passar fim de semana, ir para Guarujá sem eu poder? Essa que tá aí passou, ela veio gozar período de férias ela tinha 12 anos, que eu já era dono da Center Sport e morava na Avenida Pereira de Barros, numa casa que até hoje tá lá e que eu estou até vendendo. (risos) Conclusão: eu, mas foi assim a dificuldade, não houve, não houve dificuldade. Que por sinal no shopping ainda, muita gente ainda diz: "É, o primeiro dois ano ninguém, ninguém ganhava dinheiro." E eu disse: "Não, eu comprei com 14 meses de existência do shopping e ganhei dinheiro no primeiro dia, e não no primeiro mês." Agora eu pus mercadoria, eu trabalhei. Eu ficava lá, para pagar o aluguel é de acordo com as venda. Comprava sem nota e vendia sem nota e o pouco que acontecia, eles tinham medo de pouco... porque tudo bem, não forçava muito porque não pagava aluguel. Se não vender não tinha aluguel para pagar, então... E eu, quando eu entrei não, quando eu senti o negócio, foi exatamente quando entrei, entrei assim para valer Eu disse: "Não." Aí pus mercadoria na loja. O homem que me vendeu ficou louco, assim logo poucos meses já... Aí pouco tempo, quando eu vim, aliás fechei, foi quando eu vendi as lojas da cidade, a tabacaria e a charutaria porque ficou um ano lá com meu irmão, mas ali pisando para sentir o problema, aí fui sentindo que dava, aí eu mandava alguma coisa e ele vendia, e sempre tá lá. E eu disse: "Não, então se um ano depois, agora vamos liquidar a cidade e vamos fixar mesmo o negócio só no Iguatemi." Mas eu não vi, assim, não vi nada, não sei se a sua pergunta, o que é que você queria saber? Eu tive esse trabalho, lutei muito, chegava a abrir às 6 horas da manhã para atender as companhias de cigarro que entregava os cigarros e que era 6 horas porque depois das 7 não podia entrar mais carros na cidade, para entrega, eu chegava às 6 e fazia direto até às 9 horas da noite, sozinho; depois é que surgiu um empregado. Arranjei um empregado, um vizinho, mas em pouco tempo o vizinho, acho que associou-se, acho que (risos) acabou. Fiquei só novamente, isso já com mais de ano, dois anos. Depois disso surgiu nessa própria charutaria, que foi a charutaria primeira, o meu irmão que veio, esse que veio comigo, que tinha ficado no Rio, que ele trabalhava no Instituto de Açúcar e do Álcool, o IAA. Aí eu falei: "Eu comprei uma charutaria, na Xavier, lá na (Leiteria Pereira?) na rua São Bento. Que aliás, telefonei para ele e falei: "Olha, então faça isso, isso, isso, se você quiser vir para cá." Aí ele pediu transferência do emprego para cá para São Paulo e conseguiu e passou a me ajudar na charutaria, nessa que eu comprei porque essa durou pouco, no Cine Vieira, durou pouco, vendi logo, não sei. Aí passamos nós dois, ele, como ele trabalhava meio dia, entrava na repartição pública lá do governo, o Instituto de Açúcar e do Álcool, eu chegava mais tarde 6 horas, 7 horas, 8 horas e ele abria; meio dia ele ia embora para o serviço dele. Aí eu assumia e ia até 9 da noite. E assim ficamos anos, ele abrindo e eu fechando. Aí foi. Depois pusemos mais um empregado para ajudar assim num período, mas não deixando na mão de empregado Tudo, pequeno negócio, naquele tempo, charutaria é fácil, não tem controle, não tem E na época não tinha mesmo Eu disse: "Não." Ficava ali ou do lado de dentro um funcionário, ou eu ou ele do lado de fora também, ficamos ali anos com isso. Aí foi quando eu senti o que já estou, foi quando eu pensei montar essa tabacaria, isso já foi em 63, de 57 a 63 fiquei só com a charutaria. Aí começou a fazer um investimentozinho, comprei uns lotes de terreno aí na região do Sul, não lá onde eu morava, no Belém, porque eu morava no Belém com minha sogra lá, como eu falei. Então, nunca tive negócio lá no, para o Norte eu fiquei mais no Sul. Acabei comprando umas propriedadezinhas, uns terreninhos etc., etc., dois, três, não lembro bem. E quando surgiu o Iguatemi aí foi que nós vendemos, aí eu digo: "Mas, precisava comprar essa loja." A loja já era grande: "Vamos comprar a segunda loja." Aí eu disse: "Olha, vamos vender esses terrenos que eu tinha na Xavier de... nessa região." Eu me lembro bem que eram três terrenos, pequenos, mas valorizados na época, né, pelo valor e aí eu apliquei tudo na loja Aí foi quando eu reformei a loja, isso já foi em 69. Em 68 eu disse: "Não." E logo em seguida quando eu comprei a... não, e um ano depois, em 69 eu comprei depois a outra loja, aí eu demoli, fechei o... e fiquei trabalhando todo dia, todo dia. Se eu perdi nesse abrir e fechando de fim de semana só perdi dois dias de trabalho para a loja, só dois dias Foi na última limpeza que não podia trabalhar. Mas eu passei esses dois ou três meses, fechava de fim de semana, fazia, cada hora tirava de um lugar, punha no outro, sujava a mercadoria, mas a gente trabalhava e tinha para quem vender. Só tinha um shopping, né, o Iguatemi nessa época. Então foi aí que eu pude aumentar a loja e ficar conhecido, como eu tinha dito já tinha partido só para esporte. Só estritamente o esporte. Aí acabei com... chegou um ponto que eu acabei com fumo, isqueiro, cachimbo, tudo, tudo, tudo, tudo. Não tive mais nada. Aí fiquei só no esporte muito tempo e ainda continuo, ainda continuo.

P - Senhor Diogo, como é que o senhor acha que a sociedade brasileira vê o comerciante, assim, a imagem do comerciante? Que é que o senhor...

R - Olha filha, não vê mal, não vê com maus olhos não. Eu pelo menos nunca recebi uma, vamos dizer uma piada, uma brincadeira vinda de algum cliente. Não vê maus olhos Eu, o comércio que eu me refiro, quer dizer, é o comerciante do meu caso o varejista. Agora, o que é que o outro pode pensar, vamos dizer em outras palavras, rouba, cobra caro. Bom, eu tenho nome de cobrar caro, mas só leva... o preço está marcado, freguês tá sabendo o quanto tá levando, quanto tá pagando, não é nada depois que embrulha que dá o preço, não. Que eu lembro muito bem que alguns anos, muitos anos atrás tinha um freguês olhando a mercadoria na vitrine aí ele entrou para me falar isso: "Não, eu não vou levar, não, mas gostei porque sua mercadoria estão todas marcadas os preços, não é, não deixa, onde se vende gato por lebre." Porque que era comum no comércio que existia na época e mudou. Hoje não, hoje até por sinal a Sunab fiscaliza muito isso, hoje você tem que por na vitrine e o preço marcado. Mas eu não vejo, por esse meio assim não. Não vejo nada que o consumidor, o cliente, o freguês tenha o comércio assim, o comerciante assim, com maus olhos. (pausa)

P - Bom, o senhor, só para gente concluir. Atualmente o senhor está com uma loja no shopping e o senhor trabalha?

R - É ali... meu horário é restrito. Hoje eu chego na hora que abre... abre... A loja tem hoje, tá com escriturário, tem empregado, para isso também. Chego 9:30 mais ou menos, 9 horas e 6 horas vou embora. À noite não faço mais nada e lá fica aberto. Mas eu estruturei, fica um gerente. Não sei se está dando lucro (risos) Mas pelo menos o meu trabalho, à noite eu saio fora. Já faz anos e aí não dava mais e nem tampouco posso mais. Não tenho, a gente se cansa mesmo, mesmo que não queira, as coisas vão aparecendo sem querer. Hoje mesmo foi um dos dia... eu cheguei e até falei com a dona Georgina (risos) disse: "É, dona Georgina, estou com as pernas que me doem, eu não sei, não corri, eu não fiz... não faz ginástica, não faz nada" E ela disse: É, seu Diogo, fica velho, é tal, é a época da condor, com a dor.(risos) É verdade Eu não, hoje eu não tenho nada. Hoje eu me restringi os meus horário, e eu tenho a loja, mas hoje eu não sei nem se dá lucro. Tem mês que pode dar, algum mês andou dando, nessas crises aí para trás eu andei trabalhando no vermelho, eu fazia um levantamento e sentia. Mas como a loja tem uma participação do shopping, vamos dizer, em termos de receita, que essa receita ao invés de eu pagar para o governo que seria imposto de renda, eu pago, me cobre os custo do que se me dava prejuízo alguns meses. Então ali eu cobro e eu pago imposto de renda do que sobrar, que eu tiro cobrindo o uso, tendo da onde tirar para cobrir o prejuízo de um lado, mas ainda havia alguma sobra que ia para esse imposto de renda também. E assim, cheguei ao ponto que nem quis outra. Olha, eu fui muito solicitado por outros shoppings e (eu disse não?) e foi difícil entenderem. Hoje nem me telefonam mais. Entenderam que eu não queria. E isso eu falo mesmo Até um dia eu dei uma resposta meia deselegante para um corretor desses de shopping. Ele queria que eu... me vender uma loja. E eu disse: "Meu filho eu não quero, eu só tenho essa, eu não quero, eu não tenho estrutura para outra, eu só tenho uma, eu só quero trabalhar nessa daqui, do jeito que eu vou até o fim, mas não quero" "Ah, mas não acredito, o senhor..." Aí eu disse: "Oh menino por favor, eu só lhe digo o seguinte: de graça para mim é caro" "Mas não senhor..." "Sim senhor, de graça para mim é caro, se me der de graça para mim ir lá trabalhar..." Porque quando eu assumo em um negócio desses, é para trabalhar e dar conta do recado. Eu não quero, então para mim de graça é caro

P - Senhor Diogo, desculpe interromper, mas, eu acho que a gente podia encerrar.

R - Encerrar? Ótimo.

P - Muito obrigada

R - Pois não, eu é que fiquei satisfeito... (risos) fiquei até, vamos dizer, honrado, de ter, de ser lembrado. Alguém que falou no meu nome. Eu não tive, eu pareci com outros. Não tive, não vivo em sociedade, não tenho não. Meu negócio é o trabalho mesmo. Tá bom?

P - Muito obrigado, senhor Diogo.

R - Pois não, às ordens.